Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01159/04.3BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/23/2021
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Cristina da Nova
Descritores:REVISÃO DE ATO TRIBUTÁRIO DE LIQUIDAÇÃO, IMPOSTO AUTOMÓVEL, PRAZO,
Sumário:1- A jurisprudência do STA é no sentido de que o direito de revisão e o direito de reembolso têm a mesma natureza, não obstando, de acordo com o art. 101.º da RA, ao direito de revisão do ato de liquidação se aplique a regulamentação comunitária em vigor, a ele respeitante. O pedido de revisão condicente à anulação do ato de liquidação não pode deixar de implicar o reembolso das quantias em causa (nas liquidações feitas pelas autoridades aduaneiras).

2-Em termos de direito comunitário o pedido de reembolso corresponde, na sua finalidade, ao pedido de revisão do direito nacional. Deste modo a concretização das referidas disposições da regulamentação comunitária há-de encontrar-se no art. 236.º, n.º2 do CAC o qual estabelece que “O reembolso ou dispensa de pagamento dos direitos de importação ou dos direitos de exportação será concedido, mediante pedido apresentado na instância aduaneira competente, antes do termo do prazo de três anos a contar da data da comunicação dos referidos direitos do devedor.
O direito de reembolso caduca se não for exercido no prazo de três anos.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:G., LDA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:N/A
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO

G., Lda., vêm recorrer da sentença que julgou improcedente a ação administrativa especial, com fundamento em extemporaneidade do pedido de revisão dos atos de liquidação do imposto automóvel submetido ao Diretor da Alfândega de Aveiro.
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Formula a recorrente, G., Lda., nas respetivas alegações as seguintes conclusões, que se reproduzem:

«1 - A sentença recorrida é nula porque não especifica todos os fundamentos de facto que justificam a decisão. Com efeito, embora especifique as datas em que se verificaram as liquidações do IA, não especifica a data em que ocorreu a sua comunicação ao contribuinte, para que, assim, começasse a ser contado o prazo legal para o respectivo pagamento e, a partir do termo final deste, o prazo para a apresentação do pedido de revisão da liquidação do imposto à Administração Aduaneira.
2 - Desconhecendo-se o termo a quo para a contagem do prazo estabelecido para o pedido de revisão, também se desconhece o seu termo ad quem e, por consequência, não se sabe se foi ou não respeitado o prazo para formular validamente o pedido de revisão do acto de liquidação do IA.
3 - Impunha-se ao julgador, para decidir no sentido em que decidiu, que tivesse sido dada como provada a data em que se verificou a notificação de cada uma das liquidações do IA, o que não sucedeu.
4 - Assim, é sem fundamento suficiente de factos que o julgador concluiu e decidiu que os pedidos de revisão foram apresentados fora de prazo, pois se ignora quando terminava o prazo para formular tais pedidos.
5 - Tal vício consubstancia causa de nulidade de sentença, prevista na al. B) do n.º 1 do art. 669.º do CPC, por sua vez, determina a anulação do julgamento.
6 - Por outro lado, a sentença recorrida incorreu em erro quanto à matéria de direito, no tocante ao prazo aplicável ao pedido de revisão do acto de liquidação do IA, ao não aplicar o prazo de 4 anos, previsto no art. 78.º n.º 1 da LGT para os pedidos de revisão de um acto tributário, considerando aplicável, em seu lugar, o n.º 2 do art. 236.º do CAC, que estipula para o prazo de 3 anos para os casos de reembolso em que seja aplicável.
7 - Porém, a mencionada norma do CAC não é aplicável, por várias razões, passando-se a elencar algumas delas.
a) - porque o próprio CAC não é aplicável ao caso de reembolsos de IA de veículos usados importados de outros Estados Membros da EU, pois que, como determina o n.º 1 do seu art. 1.º, aquele compêndio de direito comunitário apenas se aplica às trocas entre a Comunidade e países terceiros.
b) - o prazo de três anos fixados no art. 236 n.º 2 do CAC diz respeito à comunicação do montante dos direitos ao devedor, sendo um prazo de caducidade da iniciativa de cobrança; ora, o que aqui se passa diz respeito ao prazo em que a AT pode revogar um acto ilegal, acto esse que já foi de cobrança e, assim, pressupostamente eficaz, como não é qualquer acto praticado para além de qualquer prazo de caducidade.
c) - o prazo aplicável é o de quatro anos, previsto ao artigo 78.º da LGT, cujas norma se aplicam em geral às relações jurídico tributárias sem prejuízo da aplicação das normas especificas vigentes para o direito comunitário e noutras normas de direito internacional vigentes na nossa ordem jurídica interna, encontrando-se estas numa relação de especialidade com as normas da LGT, detendo primazia de aplicação nos concretos casos que regulam de acordo com o regime instituído na norma do art. 7.º n.º 3 do CC que determina que a lei geral não revoga a lei especial, excepto se for outra a inteção inequívoca do legislador.
d) - a norma do art. 236.º do CAC, que prevê o prazo de três anos para requerer o reembolso de direitos ilegalmente liquidados, não é aplicável aqui ao caso, por a mesma apenas abarcar o regime dos reembolsos dos direitos de importação ou exportação de mercadorias, não abarcando no seu âmbito o Imposto Automóvel (IA) como imposto interno que é, que, por isso, se encontra fora do seu campo de aplicação, e a que se aplicam as normas gerais sobre esta matéria, como a do art. 78.º da LGT.
e) - mesmo que se pudesse entender que ao caso era aplicável a norma do n.º 2 do art. 236.º do CAC, o que apenas se admite como necessidade de raciocínio, ainda assim a pretensão da recorrente merecia provimento, pois que o prazo de três anos tem o seu termo inicial, não com o acto de registo da liquidação, mas sim a contar da data da comunicação dos referidos direitos ao devedor, como expressamente o n.º 2 do art.º 236.º impõe.
Ora, o registo de liquidação ou inscrição contabilística da liquidação não é constitutivo dessa liquidação, mas sim o acto de contagem dos direitos pela autoridade aduaneira, o qual só é eficaz após a notificação ao responsável pelo seu pagamento.
Como os pedidos de revisão dos actos de liquidação do IA foram apresentados à AT no prazo de 4 anos, a contar da própria liquidação do imposto, foi respeitada a norma aplicável, que é o n.º 1 do art. 78.º da LGT, pelo que, ao preferir o prazo de 3 anos, previsto em norma inaplicável, o art. 236.º do CAC e, em consequência, considerar extemporâneos os pedidos de revisão, o julgador incorreu em erro de direito.
f) - o DL n.º 398/98, nos n.ºs 5 e 6 do art. 5.º, determina a aplicação retroactiva dos prazos de caducidade do direito de liquidação e de revisão do acto tributário aos factos ocorridos a partir de 01.01.1998, sem distinguir entre a revisão de actos tributários aduaneiros e não aduaneiros, pelo que a interpretação natural desta norma é a de que se aplica a todos os actos, uma vez que a LGT, por ele aprovada, está vocacionada para regular a generalidade das relações jurídicas tributárias, inclusivamente as aduaneiras, como expressamente se refere nos n.ºs 1, 2 e 3 do seu art. 1.º.
g) - à face do art. 78.º da LGT e da regra especialíssima do art. 5.º do DL n.º 398/98, impõe-se concluir que o «reembolso» previsto no art 101.º da RA desapareceu, sendo substituído pelo novo regime, mais garantístico em relação aos direitos do contribuinte, mais consentâneo com a acentuação das preocupações legislativas com as garantias dos contribuintes, que são a directriz primacial da LGT.
h) - a LGT é aplicável aos pedidos de revisão de actos tributários praticados pelas autoridades aduaneiras, uma vez que o seu art. 1.º determina a sua aplicação às relações jurídicas tributárias, englobando no conceito de administração tributária a DGAIEC e as demais entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança dos tributos.
Não se pode afastar do campo da sua aplicação as normas tributárias contidas na RA, com base na ressalva da «legislação especial» feita na parte final do n.º 1 do art. 1.º da LGT, pois a RA e o RAL eram os diplomas gerais que regulavam as relações jurídicas estabelecidas com as autoridades aduaneiras que não eram reguladas pelo direito comunitário, isto é, os diplomas aplicáveis à generalidade das relações desse tipo sempre que não houvesse norma aduaneira especial.
i) - a RA e o RAL são diplomas tão «gerais» como o era o CPT (o diploma «geral» para as relações jurídicas não aduaneiras) e, seguramente, mais «gerais» do que o CIRS, ou o CIVA, ou CIRC ou o CCA.
Se se entendesse que a LGT não revogou as normas da RA e do RAL que com ela fossem incompatíveis, também se teria de concluir que não teria revogado as normas também incompatíveis contidas em todos estes códigos dos impostos, o que conduziria à conclusão de que as novas soluções contidas na LGT, que o legislador pretendia que fossem aplicadas generalizadamente, teriam um campo de aplicação bastante exíguo.
j) - o art. 101.º da RA nem sequer é aplicável, por não se verificar, para requisito de que depende a sua aplicação, que sejam devidos simultaneamente «direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfândega».
Não é aceitável afirmar-se que é «comum, na linguagem jurídica, a troca da disjuntiva pela copulativa». Tal cominação equivale a negar a interpretação correcta, em que tem de presumir-se que o legislador sabe exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9.º n.º 3, do CC). E naturalmente que, perante o arrolamento de vários requisitos ligados pela disjuntiva, se está perante requisitos alternativos e no caso de uso da copulativa se está perante requisitos cumulativos. E isso que se tem de presumir, uma vez que a interpretação das normas se faz à luz dos critérios enunciados no art. 9.º do CC.
l) - sendo a hipótese prevista no art. 101.º da RA, na redacção dada pelo DL n.º 472/99, de 8 de Novembro, a de que «em consequência do mesmo facto tributário, forem devidos direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfândega», o campo de aplicação desta norma são as situações em que cumulativamente são devidos direito de importação e impostos nacionais e não a de apenas serem devidos estes, pois, se se pretendesse abranger ambas as situações, naturalmente se utilizaria a expressão «forem devidos direitos de importação ou outros impostos a cobrar pela alfândega» ou, simplesmente se faria referência apenas aos impostos nacionais, pois em relação aos direitos de importação, sendo receita tributária regulada pelo CAC, é-lhe aplicável directamente este diploma, sendo por isso, inútil qualquer referência à aplicação da regulamentação comunitária.
m) - a restrição do campo de aplicação da norma do art. l01.º aos casos em que cumulativamente são cobrados direitos de importação e direitos nacionais, e não apenas estes, tem uma explicação evidente: tendo primazia o direito comunitário sobre o direito nacional (art. 8.º, n.º 4 da CRP), quando são liquidados direitos de importação (comunitários) tem de aplicar-se ao acto o regime comunitário; por isso, quando pelo mesmo facto tributário e num mesmo acto de liquidação são liquidados ambos os tributos, compreende-se que se faça a aplicação do regime comunitário aos impostos nacionais, pois seria algo incongruente que a uma parte do acto fosse aplicado um regime substantivo e procedimental de revisão (e caducidade ao direito de liquidação) e à outra um regime diferente.
n) - a preocupação de harmonização do legislador do DL n.º 472/99, nesta situação, não podia deixar de se materializar em aplicar o regime comunitário aos impostos nacionais.
Porém, quando são apenas devidos impostos nacionais, deixa de valer essa razão para aplicar o regime comunitário, pois será mais congruente aplicar o mesmo regime que se prevê para os restantes impostos nacionais.
A harmonização a fazer, nestes casos, é aplicar aos impostos nacionais o regime de revisão do acto tributário que é aplicável à generalidade dos outros impostos nacionais.
o) - é este mesmo regime que foi reafirmado pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que deu nova redacção ao referido art.101.º, em que, mais uma vez, se restringe o campo de aplicação da norma aos casos em que «em consequência do mesmo facto tributário, as mercadorias sejam sujeitas a direitos de importação e a outros impostos a cobrar pelos serviços aduaneiros». Isto é, a hipótese da norma abrange os casos de cumulação dessas imposições e não aqueles em que apenas esteja em causa a liquidação de impostos nacionais.
q) - é de presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados e quando, por duas vezes, referiu as situações de cumulação de direitos de importação com impostos nacionais, há, decerto, uma reforçada razão para presumir que não quis abranger no campo de aplicação da norma as situações em que apenas está em causa a revisão de actos em que apenas foram liquidados impostos nacionais, pois tal conclusão teria de assentar na conclusão de que o legislador se teria exprimido mal duas vezes, utilizando a copulativa «e» em vez da disjuntiva «ou».
O que significa que, fora dos casos em que há cumulação de liquidação de direitos de importação e impostos nacionais, em que razões de harmonização justificam a aplicação do regime comunitário à globalidade dos actos de liquidação, o legislador, após a entrada em vigor da LGT, nunca quis aplicar à revisão dos actos de liquidação de impostos nacionais outro regime que nãofosse o previsto nesta Lei.
8 - Por errada interpretação ou aplicação, a sentença recorrida violou o disposto nos arts. 7.º n.º 3 e 9.º n.º 3 e 297.º n.º 1 do CC, art. 668.º n.º 1 al. b) do CPC, arts 1.º n.º 1, 77.º n.º 6 e 78.º n.º 1 da LGT, arts. 1.º n.º 1 e 236.º n.º 3 do CAC, art.º 5.º n.ºs 5 e 6.º do DL n.º 398/98, art. 1.º nº 1 do DL n.º 40/93. art. 1.º n.ºs 1 e 2 da RA e o DL n.º 472/99, bem como a jurisprudência deste TCAN, do TCAS e do STA.
Termos em que, e nos do douto suprimento, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, declarar-se nula a sentença, por não especificar todos os fundamentos de facto para decidir no sentido em que decidiu; ou, quando assim se não entenda, deve a mesma ser revogada, por incorrer em erro de direito quanto à interpretação e aplicação das normas que devem reger o caso sub judice, como acto de inteira JUSTIÇA.»
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A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.
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Sem vistos dos Exmos. Juízes adjuntos, por assim se ter acordado, foi o processo à Conferência para julgamento.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações:
[a]Saber se a sentença padece de nulidade por não ter especificado a data da notificação de cada uma das liquidações e bem assim o términus do prazo de pagamento voluntário, de acordo com o art. 669., n. º1, al. b) do CPC;
[b] Erro de julgamento de direito no tocante ao prazo aplicável ao pedido de revisão oficiosa da liquidação do Imposto Automóvel.
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3. FUNDAMENTOS DE FACTO
Em sede de probatório, a 1.ª Instância fixou os seguintes factos:
«1. A recorrente efectuou a Declaração de Veículo Ligeiro n.º 2000/0007471, em 1/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação nº 2000/0019348, e o montante de Imposto Automóvel de 1.142.570$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0009970, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025070, e o montante de Imposto Automóvel de 1.465.839$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0009997, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025097, e o montante de Imposto Automóvel de 543.417$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0009997, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025097, e o montante de Imposto Automóvel de 543.417$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0009989, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025089, e o montante de Imposto Automóvel de 1.363.282$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0010316, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025461, e o montante de Imposto Automóvel de 1.058.967$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0010359, em 9/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0025488, e o montante de Imposto Automóvel de 1.363.282$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0011061, em 1/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0026778, e o montante de Imposto Automóvel de 1.142.570$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0012424, em 15/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0029149, e o montante de Imposto Automóvel de 146.263$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0012432, em 15/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0029157, e o montante de Imposto Automóvel de 146.263$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0012580, em 16/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0029440, e o montante de Imposto Automóvel de 163.471$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0015970, em 29/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0036609, e o montante de Imposto Automóvel de 511.343$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0015989, em 29/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0036617, e o montante de Imposto Automóvel de 1.465.839$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0015997, em 29/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0036625, e o montante de Imposto Automóvel de 604.314$00; a Declaração de Veículo Ligeiro nº 2000/0016004, em 29/2/2000, a que coube o Registo de Liquidação n.º 2000/0036633, e o montante de Imposto Automóvel de 947.497$00, todos a pagar nas datas aí mencionadas que se dão por integralmente reproduzidas.
2. Em 4/2/2004, a recorrente requereu ao Director da Alfândega de Aveiro a revisão dos Actos de Liquidação aludidos em 1, emitidos pela Alfândega de Aveiro.
3. Por despacho do Director da Alfândega de Aveiro, de 22/10/2004, foi determinado o arquivamento do pedido de revisão com base no seguinte parecer:
“Considerando que os pedidos de revisão de actos de liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, têm que ser apresentados no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo de pagamento voluntário (cfr. n.º. 1 do art. 78.º da LGT e os art.(s) 70.º e 102.º do CPPT) e que, se tiver sido ultrapassado esse prazo, não existe dever de decisão, face ao disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 56.º da LGT, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão deverá ser arquivado com esse fundamento de direito, uma vez que foi apresentado em 04-02-2004 e o prazo para pagamento voluntário do I.A. liquidado nas D.A.V.’s a que se reporta, expirou nas datas que se discriminam:
D.A.V. nº 2000/747.1 expirou em 17/3/2000;
D.A.V. nº 2000/997.0 expirou em 25/3/2000;
D.A.V. nº 2000/998.9 expirou em 25/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1031.6 expirou em 25/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1035.9 expirou em 25/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1106.1 expirou em 27/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1598.9 expirou em 14/4/2000;
D.A.V. nº 2000/999.7 expirou em 25/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1242.4 expirou em 31/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1243.2 expirou em 31/3/2000;
D.A.V. nº 2000/1258.0 expirou em 1/4/2000;
D.A.V. nº 2000/1597.0 expirou em 14/4/2000;
D.A.V. nº 2000/1599.7 expirou em 14/4/2000;
D.A.V. nº 2000/1600.4 expirou em 14/4/2000;”.
4. A presente petição inicial foi apresentada em 20/9/2004.
FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito.»
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4. APRECIAÇÃO JURÍDICA DO RECURSO

4.1.A Recorrente aponta o vício da nulidade da sentença por ter omitido na especificação dos factos as datas em que ocorreram as notificações das liquidações ao contribuinte, para assim se aferir do prazo para o respetivo pagamento, e a partir do seu termo, contar o prazo para o pedido de revisão da liquidação.

Ora estando em causa a nulidade da sentença, este vício tem, naturalmente, prioridade sobre os demais fundamentos do recurso, pelo que se irá dar primazia no seu conhecimento.

Sobre a nulidade pronunciou-se o Senhor Juiz do tribunal a quo, aliás, em termos que nos merece a nossa concordância, pois que, vem alegar facto que o próprio não invocou em sede de impugnação, para dai concluir haver omissão de pronúncia.

Na verdade, o juiz do processo apenas tem o dever de tomar posição sobre a matéria alegada, e dentro desta não tem o dever de tomar posição sobre toda essa matéria, apenas tem o dever de selecionar a que interessa para a decisão segundo as várias soluções plausíveis de direito [cfr. o art. 508.º -A, n.º1 al. e), 511.º e 659.º do CPC, no NCPC art. 591.º e 596.º e 607.º].
Além de que a nulidade do dever de pronúncia só existe se houver uma efetiva violação dos deveres de pronúncia pelo tribunal, ou seja, relativa a questões que deva apreciar, ora a questão suscitada foi apreciada face ao pedido que foi formulado, de estar ou não em tempo para pedir a revisão oficiosa das liquidações do I.A.

A questão que suscita poderia contender com o erro de julgamento mas, no caso, manifestamente, não ocorre na medida em que os elementos factuais disponíveis no processo e levados ao probatório, como as datas em que terminou o prazo do pagamento voluntários do imposto, permitem aferir se o pedido estava ou não em prazo.

4.2. Erro de julgamento de direito no tocante ao prazo aplicável ao pedido de revisão oficiosa para o Imposto Automóvel.

A Recorrente discorda da sentença quanto ao prazo aplicável para o pedido de revisão oficiosa na medida em que afasta o regime do Código Aduaneiro Comunitário, o seu art. 236.º, n.º 2, ex vi do art. 101.º da Reforma Aduaneira, aplicando-se o prazo de 4 anos que decorre do art. 78.º da Lei Geral Tributária, pelo facto de a Reforma Aduaneira ser uma lei geral em relação à LGT, sendo esta uma norma especial, e encontrar-se aquela revogada pela LGT; o facto de não ser aceitável e contrária à de interpretação do art. 9.º do C.C., a interpretação jurisprudencial de na “linguagem jurídica” ser comum a troca da disjuntiva pela copulativa, quando se refere ao art. 101.º da Reforma Aduaneira [na redação do Decreto-Lei n.º 472/99 de 8 de Novembro] no que tange à palavra “e” “Quando, em consequência do mesmo facto tributário, forem devidos direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfândega, observar-se-á o disposto na regulamentação comunitária, designadamente no que respeita ao prazo de caducidade do direito à liquidação, à cobrança a posteriori, ao reembolso e à dispensa do pagamento.”
A sentença afastou a aplicação do prazo do art. 78.º da LGT, convocando a jurisprudência do STA máxime a explanada no acórdão de 11-10-2006, no processo 0621/06.

Na verdade, a jurisprudência do STA tem sido maioritariamente no sentido da aplicação das normas do CAC por força do art. 101.º da Reforma Aduaneira (RA), à exceção dos acórdãos de 25-01-2006 no processo 01153/06, 16-02-2005, no processo 0960/04 e de 02-04-2003, no processo 1171/02, tendo em face de tal divergência, no seguimento do acórdão no processo n.º 01153/06, vindo a ser proferido em 08-11-2006 Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA em 08-11-2006 no qual se estabilizou a jurisprudência com a seguinte fundamentação:(…) 1. A..., identificado nos autos, interpôs recurso para este Pleno do acórdão desta Secção, proferido em 8 de Março de 2006, que concedendo provimento a um recurso jurisdicional da Fazenda Pública, negou provimento ao recurso contencioso por si interposto para o TAF de Viseu, que teve como objecto o acto de indeferimento do pedido de revisão do acto de liquidação do IA, praticado pelo Director de Alfândega de Aveiro. Alegou oposição deste acórdão com acórdão proferido na mesma Secção em 16 de Fevereiro de 2005.
O Mm. Juiz relator julgou verificada a oposição de acórdãos.
Notificado para apresentar alegações sobre o mérito do recurso, o recorrente apresentou-as, tendo concluído do modo seguinte: I. A doutrina tradicional, expressa no acórdão fundamento - que consideramos a correcta - vai no sentido de que, sendo o IA um imposto interno, o prazo de revisão do acto tributário da sua liquidação será, como para os demais impostos internos, o previsto na LGT ou no CPT, consoante a data do acto; enquanto que o acórdão recorrido chegou à aplicação do prazo de 3 anos, previsto no n. 2 do art. 236º do CAC, a partir da aplicação do art. 101º da RA, na versão do DL n. 244/87, disposições cuja aplicação sempre foi rejeitada pela corrente tradicional.
II. O prazo de três anos, do art. 236º do CAC, considerado aplicável pelo acórdão recorrido, a chamamento do art. 101º da RA, reporta-se aos reembolsos e à dispensa de pagamentos relativos a "direitos de importação" ou de "exportação", no sentido que lhes foi atribuído pelo art. 4º do CAC. Ora, não é essa a situação aqui em causa.
III. Para chegar à aplicação do art. 236º do CAC, é errado partir do art. 101º (na versão do DL n. 472/99) da RA, porque este é inovador em relação ao art. 101º do DL 244/87 e só é aplicável quando forem devidos "direitos de importação" e, simultaneamente, (a norma diz "e" e não "ou") "outros impostos" (comunitários ou nacionais) originados por um mesmo facto tributário. Ora, nem sempre de um mesmo facto tributário resulta a liquidação de "direitos de importação" e de "outros impostos", como é a situação aqui em causa. Nestes casos, é inaplicável o art. 101º da RA e, por conseguinte, também não é aplicável o art. 236º do CAC. IV. O prazo do reembolso, se a ele houver lugar, não pode confundir-se com o prazo previsto na lei para a revisão oficiosa do acto tributário, embora esta possa visar a concretização daquele. V. O acórdão recorrido contraria as exigências do DC, por quatro ordens de razões: 1ª - porque compete à ordem jurídica da cada EM regular as modalidades processuais e prazos das acções de restituição do indevido; 2ª - porque o legislador comunitário limitou claramente o âmbito de aplicação do CAC às "trocas com países terceiros"; 3ª - porque o art. 245º do CAC e, em geral, as normas do seu Título VIII, afastam a aplicação do art. 236º, já que o legislador comunitário deixou para os EM a regulamentação do procedimento dos "recursos" (em sentido amplo), incluindo a matéria dos prazos, pois que apenas excluiu da competência dos EM a fixação dos efeitos dos recursos (art. 244º) e as decisões tomadas ao abrigo de legislação penal (art. 246º); finalmente, por respeito ao princípio do primado do DC, não é o direito interno que pode mandar aplicar o DC, mas é este que pode mandar aplicar o direito interno dos EM.
VI. Segundo o art. 4º do CAC, só são "direitos de importação" «os direitos aduaneiros e os encargos de efeito equivalente previstos na importação de mercadorias e as imposições à importação instituídas no âmbito de regimes específicos aplicáveis a determinadas mercadorias resultantes da transferência de produtos agrícolas». Ora, o IA está fora da previsão do CAC porque é um imposto interno especial, monofásico, que não incide sobre a "importação" de automóveis, mas sobre a sua "entrada no consumo" nacional, quer eles sejam provenientes do estrangeiro, quer do território nacional. Por não ser um "direito de importação", no sentido do CAC, não cabe na sua previsão legal este diploma comunitário.
De todo o modo este STA, se dúvidas subsistirem, pode auscultar o TJCE.
VII. Com o CPT, o instituto da caducidade passou a ser um instituto geral do direito fiscal e a abranger também as relações jurídico-aduaneiras e o mesmo se passou com a LGT. Por isso, não é legítimo recorrer à RA para, a partir dela e, nomeadamente, do seu art. 101º, tentar alcançar o art. 236º do CAC, pelo facto de o IA ser um imposto administrado pelas alfândegas. Isso conduziria, em nome de um critério orgânico e não material, a uma multiplicidade de prazos de caducidade a que já o CPT mas, sobretudo, a LGT intentaram pôr fim, mas que, agora, o acórdão recorrido e os que lhe seguiram o rasto parece pretender ressuscitar, depois, de por tanto tempo e tão pacificamente, ter decidido em sentido contrário, pela pena e pelo voto de alguns dos seus egrégios Conselheiros.
VIII. O n. 2 do art. 236º do CAC não pode ser aplicado a chamamento do art. 101º da RA, na versão do DL n. 244/87, porque esta norma já não estava em vigor quando foi apresentado o pedido de revisão do IA; e não pode ser aplicado a chamamento do art. 101º da RA, na versão do DL n. 472/99, porque este só é aplicável quando, em consequência do mesmo facto tributário, forem devidos direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfândega, o que não é o caso dos autos.
IX. O douto acórdão recorrido, contrariou, por errada interpretação ou aplicação, o disposto nos artºs. 94º n. 2 al. b) do CPT, 78º n. 1 da LGT, n. 6 do art. 5º do DL n. 398/98, 101º da RA (quer na versão do DL n. 244/87, quer na versão do DL. n. 742/99), 9º e 10º do CC, 1º, 2º, 4º n. 10, n. 2 do 236º, 243º, 245º e 246º do CAC, assim como a jurisprudência firmada por este STA. Contra-alegou a recorrida, que finalizou as suas contra-alegações no seguinte quadro conclusivo: I. À luz do critério orgânico, o IA é uma receita aduaneira; II. E para além de ser uma receita aduaneira, o imposto automóvel, é um imposto interno, especial, específico, não harmonizado a nível comunitário, monofásico que assenta na cilindrada dos veículos automóveis ligeiros e cujo facto gerador é a admissão ou importação de veículos ligeiros novos ou usados destinados a matrícula, nos termos do número 1 do art.1° do DL 40/93, de 18 de Fevereiro;
III. O momento determinante para a definição do direito aplicável em matéria de revisão do acto tributário é a data em que ocorreu o facto gerador, conforme jurisprudência unânime e doutrina autorizada; IV. Ora, no caso sub judice o facto gerador ocorreu em 14 de Abril de 1997, data da numeração da DVL; V. Ao tempo, vigorava o disposto no art. 101º da Reforma Aduaneira, na redacção dada pelo Decreto-Lei n. 244/87, de 16 de Junho, que remetia a disciplina do reembolso de quaisquer imposições cobradas pelas Alfândegas para a regulamentação comunitária; VI. O mesmo é dizer que subordinava o pedido de anulação do acto de liquidação de imposto não legalmente devido ao prazo de três anos, cfr. art. 236º do Código Aduaneiro Comunitário;

VII. Sendo que, o reembolso previsto no art. 236º do CAC é o instituto equivalente ao da revisão do acto tributário, ao tempo genericamente previsto no art. 94º do CPT, uma vez que visa a anulação do acto de liquidação e consequente restituição de imposto não legalmente devido; VIII. Existindo lei especial, o pedido de revisão do acto de liquidação de IA, estava subordinado à observância do prazo nela fixado, de três anos;
IX. Pelo que bem decidiu o acórdão recorrido, cuja tese tem sido, aliás, reiteradamente seguida em inúmeros acórdãos desse Alto Tribunal;
O EPGA junto deste Supremo Tribunal defende que o acórdão recorrido deve ser confirmado, negando-se, pois, provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir. 2. Foi fixada a seguinte factualidade:
A. Em Abril de 1997, o recorrente comprou na Alemanha por PTE 1.000.000$00, o automóvel ligeiro de passageiros, usado, da marca Mercedes-Benz, de 1.997 cc., a gasóleo, que tinha sido posto em circulação naquele país, em 1990.07.20, e procedeu à sua importação, tendo a Alfândega liquidado o IA que fixou em PTE 669.340$00 (conforme RLQ. 97/0068042);

B. E em 1997.04.14 foi emitida a declaração de veículo ligeiro (DVL) n. 97/0034601, relativa a este veículo (a fls. 39 dos autos);
C. Em 2002.04.15, o recorrente pediu a revisão do acto (a fls. 35 dos autos);
D. Em 2002.04.22, na informação elaborada pelo Núcleo de Procedimentos Aduaneiros e Fiscais, o Director da Alfândega de Aveiro exarou o seguinte despacho: Concordo. Determino o arquivamento do pedido de revisão nos termos do parecer emitido. Dê-se conhecimento ao interessado (fls. 34 dos autos);

E. Este despacho foi notificado em 2002.05.20 (certidão de notificação a fls. 33 dos autos);
F. Do parecer emitido naquela informação transcreve-se: considerando que os pedidos de revisão dos actos de liquidação, por iniciativa do sujeito passivo, têm de ser apresentados no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo para pagamento voluntário (cfr n. 1 do artigo 78.ºda LGT e os artigos 70.º e 102.º do CPPT) e que, se tiver sido ultrapassado esse prazo, não existe dever de decisão, face ao disposto na alínea b) do n. 2 do artigo 56º da LGT, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão deverá ser arquivado com esse fundamento de direito, uma vez que foi apresentado em 2002.04.15 e o prazo para pagamento voluntário do IA liquidado na DVL n. 1997/3460.1, expirou em 1997.06.29 (a fls. 36 dos autos);
G. Em 2002.09.16, a petição inicial deu entrada no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Aveiro.
3. Estamos perante um recurso por oposição de acórdãos.
A questão a resolver é esta: Qual o prazo para o pedido de revisão do acto de liquidação do imposto automóvel, antes da vigência da LGT, e nomeadamente antes de 1 de Janeiro de 1998?

Será o prazo de 5 anos previsto no artigo 94º do CPT?
Ou antes, o prazo de 3 anos previsto no artigo 236º, 2, do CAC?
O acórdão fundamento decidiu que o prazo era de 5 anos, por aplicação do citado art. 94º do CPT.

Por sua vez, o acórdão recorrido entendeu aplicável o art. 236º do CAC, logo o prazo será de 3 anos.
Daí a oposição de acórdãos, como reconheceu já o Mm. Juiz relator da Secção.
Quid juris?


Vejamos.
A LGT não é aplicável, uma vez que, nos termos do art. 5º, nºs. 5 e 6 do DL n. 398/98, de 17/12, o prazo para a revisão oficiosa previsto na LGT só se aplica "aos factos tributários ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998", e os factos tributários, aqui a considerar, ocorreram no ano de 1997.


Ao tempo vigorava, isso sim, o art. 94º do CPT, que, na alínea b) do seu n. 1, dispunha que a revisão oficiosa dos actos tributários teria lugar, quando a favor do contribuinte, "nos cinco anos posteriores ao termo do prazo do pagamento voluntário ou à data da notificação do acto a rever, e, ainda, no decurso do processo de execução fiscal".
Tanto basta para considerar que, se for este o preceito aplicável, a razão está do lado do recorrente. Mas não é esta a norma aplicável.


Como veremos de seguida. Na verdade, estamos perante uma dívida aduaneira liquidada pela Alfândega, pelo que, no caso de imposto automóvel, há que ter em conta a Reforma Aduaneira (RA). Dispõe o art. 101º do referido diploma, na redacção do DL n. 244/87, de16/6: "O reembolso ou a dispensa de pagamento de quaisquer imposições que não constituam recursos próprios ou direitos residuais regula-se pelas disposições da regulamentação comunitária em vigor". Ora, o imposto automóvel não constitui um recurso próprio da comunidade, mas antes um imposto interno, apesar de ter adaptado, como logo resulta do preâmbulo do DL n. 40/93, de 18/2, a sua estrutura "aos procedimentos aduaneiros decorrentes da realização do mercado interno". - cfr., definindo os recursos próprios da Comunidade, o art. 2 da decisão do Conselho da União Europeia, de 31/10/94, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias, publicado no respectivo Jornal Oficial de 12/11/94, bem como a de 29/9/2000, ibidem de 7/10/2000.

Dir-se-á, numa interpretação literal, que a norma do art. 101º da RA estende o seu âmbito de aplicação somente ao reembolso e à dispensa de pagamento (das imposições que não constituam recursos próprios ou direitos residuais da Comunidade), e na questão dos autos está em causa o prazo de caducidade do direito à revisão de um acto de liquidação.
Ora, a revisão é um meio de impugnação administrativa, que visa obter a correcção de uma prévia decisão final de um procedimento de liquidação.


Já o reembolso, na definição do art. 235º, a) do Código Aduaneiro Comunitário (CAC) é a "restituição total ou parcial dos direitos de importação ou dos direitos de exportação que tenham sido pagos" e um dos seus fundamentos é, também a liquidação ilegal (art. 236º, 1, primeiro parágrafo, in fine do CAC). Ou seja: O pedido de revisão de um acto de liquidação, por iniciativa do contribuinte, é um pedido de reembolso do montante do imposto pago em excesso. O direito de revisão e o direito de reembolso têm a mesma natureza, pelo que nada obsta a que, nos termos do art. 101º da Reforma Aduaneira, ao direito de revisão do acto de liquidação a efectuar pelas autoridades aduaneiras se aplique a regulamentação comunitária em vigor, a ele respeitante. Acórdão de 26/04/2006 (Rec. n.º 86/06). De qualquer modo, o pedido de revisão, conducente à anulação do acto de liquidação não pode deixar de implicar o reembolso das quantias em causa (art. 100º da LGT). Pelo que, em termos de direito comunitário, o pedido de reembolso corresponde na sua finalidade, ao pedido de revisão do direito nacional.

Assim, a concretização das referidas "disposições da regulamentação comunitária" há-de encontrar-se no art. 236º, 2, do CAC, que dispõe: "O reembolso ou a dispensa de pagamento dos direitos de importação ou dos direitos de exportação será concedido, mediante pedido apresentado na instância aduaneira competente, antes do termo do prazo de três anos a contar da data da comunicação dos referidos direitos do devedor". Ou seja: o direito de reembolso caduca se não for exercido no prazo de três anos. Revertendo agora à hipótese dos autos, logo vemos que a liquidação ocorreu no ano de 1997, tendo o pedido de revisão sido apresentado em 15 de Abril de 2002, ou seja, muito depois do referido prazo de 3 anos. A pretensão do recorrente não é assim de atender.
É esta uma firme orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal, podendo citar-se, a título meramente exemplificativo, os acórdãos deste STA de 8/3/2006 (rec. n. 1154/05), de 5/4/2006 (rec. n. 62/06), de 17/5/2006 (rec. n. 1215/05) e de 28/6/2006 (Rec. n. 61/06).
E sendo esta a interpretação que fazemos dos normativos aqui chamados à colação, é óbvio que os argumentos aduzidos pela recorrente, em tudo contrários a este desenvolvimento hermenêutico, não obtêm o acordo deste Supremo Tribunal.

Nem importa dizer, como faz o recorrente que "compete à ordem jurídica de cada EM regular as modalidades processuais e prazos das acções de restituição do indevido". Como é compreensível, isso não pode colidir com a eventual remissão de uma norma interna para um prazo consagrado em norma comunitária. Nem se diga que "o legislador comunitário limitou claramente o âmbito de aplicação do CAC às "trocas com países terceiros", pois isso, como é compreensível, não pode deixar de ser compatível com a possibilidade de o legislador nacional remeter para um prazo previsto em norma comunitária. E, pela mesma razão não vale dizer, "que o art. 245º do CAC e, em geral, as normas do seu Título VIII, afastam a aplicação do art. 236º ", uma vez que tais normas não impedem - nem podem impedir - que o direito nacional remeta para elas.
Finalmente não se diga, como o faz o recorrente, que "por respeito ao princípio do primado do DC, não é o direito interno que pode mandar aplicar o DC, mas é este que pode mandar aplicar o direito interno dos EM". Na verdade, é o próprio art. 101º da RA, na redacção do DL n. 244/87, de 16/6, que faz apelo à regulamentação comunitária. E não se vê como isto possa colidir com o direito comunitário.
Nem será caso de chamar à colação o TJCE, por isso que não está em causa a interpretação de qualquer norma comunitária, não se vendo como pode esta interpretação violar norma desse tipo.”


Na verdade, as conclusões de recurso e no que tange à interpretação do art. 101.º da RA assentam no fundamental no voto de vencido do Conselheiro Lopes de Sousa no processo 0127/08 de 14-07-2008, que não logrou vingar no seio daquele tribunal.

Com efeito, a jurisprudência do STA é no sentido de que o direito de revisão e o direito de reembolso têm a mesma natureza, não obstando, de acordo com o art. 101.º da RA, ao direito de revisão do ato de liquidação se aplique a regulamentação comunitária em vigor, a ele respeitante. O pedido de revisão condicente à anulação do ato de liquidação não pode deixar de implicar o reembolso das quantias em causa (nas liquidações feitas pelas autoridades aduaneiras). Em termos de direito comunitário o pedido de reembolso corresponde, na sua finalidade, ao pedido de revisão do direito nacional. Deste modo a concretização das referidas disposições da regulamentação comunitária há-de encontrar-se no art. 236.º, n. º2 do CAC o qual estabelece que “O reembolso ou dispensa de pagamento dos direitos de importação ou dos direitos de exportação será concedido, mediante pedido apresentado na instância aduaneira competente, antes do termo do prazo de três anos a contar da data da comunicação dos referidos direitos do devedor.” Quer dizer que o direito de reembolso caduca se não for exercido no prazo de três anos.

No caso em apreço os atos de registo liquidação do IA datam de 2000 e o prazo de pagamento ocorreu em 2000, tendo sido pago. Ora, sendo o pedido de revisão de 04-02-2004 é claro que havia já decorrido o prazo de 3 anos a contar da data da comunicação dos referidos direitos do devedor.

Por conseguinte, o recurso improcede na sua totalidade por não se verificar que a sentença ao decidir pela improcedência da ação tenha incorrido em erro de julgamento.
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5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Notifique-se.
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Porto, 23 de junho de 2021

Cristina da Nova
Ana Paula Santos
Margarida Reis