Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02138/12.2BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/19/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Helena Canelas
Descritores:URBANISMO – COMUNICAÇÃO PRÉVIA – NULIDADE
Sumário:I - Os atos nulos não são suscetíveis de revogação, nem de ratificação, reforma ou conversão (cfr. artigos 137º nº 1 e 139º nº 1 do CPA/91).

II – Os atos nulos não produzem quaisquer efeitos jurídicos – ainda que sem prejuízo da possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto deles decorrentes, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito – e a sua nulidade, sendo invocável a todo o tempo, pode também ser declarada a todo o tempo seja pelo tribunal seja pela Administração (cfr. artigo 134º do CPA/91).

III – Verificada a desconformidade do projeto para edificação da garagem com a planta síntese do loteamento titulado pelo alvará nº 26/89, e reconhecida a nulidade do despacho de 10/07/2012 que admitiu a comunicação prévia, por efeito do artigo 68º alínea a) do RJUE, por violação das prescrições do alvará, não tendo essa mesma nulidade sido declarada pela Administração, impunha-se que o Tribunal, perante quem esse pedido foi, aliás, formulado, o fizesse. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:F. e Outra
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE (...) e Outros
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

F. e Outra (devidamente identificados nos autos), autores na ação administrativa especial que instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga contra o MUNICÍPIO DE (...), sendo contra-interessados S. e R. (ambos devidamente identificados nos autos) – na qual impugnaram os dois despachos, que ali identificaram ser o despacho datado de 10/07/2012 da divisão de serviços técnicos do MUNICÍPIO DE (...) que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal admitiu a comunicação prévia para a construção de anexo lateral para garagem efetuada pelo contra-interessado S. e o despacho datado de 14/08/2012 da mesma divisão de serviços técnicos que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal, e após proposta de revogação da supra referida comunicação prévia e apresentação pelo contrainteressado de aditamento ao projeto, admitiu a comunicação prévia, despachos cuja declaração de nulidade ou anulação peticionaram – inconformados com a sentença datada de 26/07/2019 (fls. 270 SITAF) que julgou a ação improcedente absolvendo o réu do pedido, dele interpuseram o presente recurso de apelação (fls. 303 SITAF), formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
1. A sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia nos termos do preceituado no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA pois não se pronunciou quanto ao vício invocado pelos AA., em concreto, de que actos impugnados ao admitirem a comunicação prévia para a construção de uma garagem por parte dos CI padecem de vício de nulidade, nos termos do disposto nos artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, pois violam as prescrições do alvará de loteamento que prevêm a construção de uma única garagem por fracção.
2. Em função do alegado pelos CI no artigo 3.º da contestação deve ser aditado o seguinte facto à matéria de facto provada, com relevância para a boa decisão da causa: AA. e os antecessores (antigos proprietários da fracção) dos CI alteraram a finalidade dos anexos de um piso – ao fundo – no limite Nascente do referido Lote X – adaptando-os a garagem.
3. Tanto a fracção dos AA. como a dos CI já possuem uma garagem e, como tal, os actos impugnados ao admitirem a comunicação prévia para a construção de uma garagem por parte dos CI padecem de vício de nulidade, nos termos do disposto nos artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, pois violam as prescrições do alvará de loteamento que prevêm a construção de uma única garagem por fracção.
4. Mas ainda que se considere que não constitui matéria assente que tanto fracção dos AA. como a do CI têm já uma garagem construída e que tal facto constitui matéria controvertida, o que apenas se alega por extrema cautela e mero dever de patrocínio, importa apurar se, na verdade, as fracções em causa têm já uma garagem cada, de molde a aquilatar da eventual violação das prescrições do alvará de loteamento.
5. Nesse caso, deve este Venerando Tribunal, nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1, al. c) do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA, anular a decisão de 1.ª instância, tendente à ampliação da matéria de facto, para apurar se as fracções de AA. e CI têm já uma garagem cada.
6. Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a preterição de audiência prévia no caso em apreço não pode degradar-se em formalidade não essencial.
7. É que não é o conteúdo vinculado dos actos, só por si, que permite recusar o efeito invalidante da preterição de audiência prévia - a este propósito, veja-se, o Acórdão do STA datado de 22-05-2002, proferido no processo 047163:
8. É também necessário que se conclua, com inteira segurança, num juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível – cf. Acórdão do TCA Norte datado de 17-11-2011, proferida no processo 247/07.9BEVIS.
9. A Meritíssima Juiz a quo não verificou que houve uma alteração ao loteamento original aprovada por despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de (...), datado de 13.10.89, (cf. Documento 7 junto com a petição inicial) em que se modificou o local em que as garagens iriam ser implantadas em relação ao que estava previsto no loteamento original.
10. É a construção da garagem tal como pretendida pelos CI é que não respeita as prescrições do alvará de loteamento tal como foi aprovado aquando da alteração em 1989.
11. Acresce o facto de, como se disse, cada fracção já ter uma garagem, limite máximo previsto nas prescrições do alvará de loteamento.
12. Mas, para além destas, há ainda outras questões que poderiam ser aventadas pelos AA. em sede de audiência prévia e que poderiam determinar o indeferimento da pretensão dos CI, tais como:
- o facto de com a construção pretendida poder ser largamente ultrapassado, o que certamente iria suceder, o índice de construção previsto no alvará de loteamento;
- o facto de a garagem a construir distar menos de 3 metros da janela de um compartimento de habitação dos AA., em clara violação do artigo 73.º do RGEU;
- o facto poder ser um acto que viole o direito de propriedade dos condóminos, na medida em que a garagem iria ser construída numa rampa de acesso às garagens que constitui parte comum do condomínio;
- o facto de poder ser um acto que viole o direito dos AA. acederem à sua garagem com os seus veículos conforme explicado nos artigos 58.º a 70.º da petição inicial.
13. Assim, num juízo de prognose póstuma jamais se pode afirmar que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível – bem longe disso.
14. Esta é uma situação típica e notória de que deve ser concedido o direito de audiência prévia a quem possa vir a ser lesado com o acto a praticar; ainda mais quando antes de terem sido trazidos ao processo estes novos elementos (novos desenhos) os AA. já tinham enviado aos RR. uma exposição a pedir a revogação do primeiro acto que admitiu a comunicação prévia.
15. Não existem quaisquer dúvidas que nos primeiros desenhos apresentados a garagem estava deslocada em relação ao previsto na planta síntese do loteamento e, assim, o acto que admitiu a comunicação prévia é um acto nulo, nos termos do disposto no artigo 68.º, al. a) do RJUE.
16. Ao tempo do procedimento administrativo em causa estava em vigor, ainda, o antigo Código do Procedimento Administrativo e, assim, em obediência ao princípio tempus regit actum, são as normas desta versão do CPA as que têm que ser aplicadas ao caso vertente.
17. Assim, conforme se refere, e bem, no Parecer do Exmo. Sr. Magistrado do Ministério Público proferido em 1.ª instância, com a legislação então em vigor, o acto nulo não produz qualquer efeito (artigo 134.º, n.º 1 do CPA) e é insanável quer pelo decurso do tempo, quer por ratificação, reforma ou conversão (artigos 134.º, n.ºs 1 e 2 e 137.º do CPA).
18. Assim, impunha-se que o Município declarasse a nulidade desse acto que admitiu a comunicação prévia e não decidir manter a admissibilidade da comunicação prévia previamente concedida, uma vez que o ora Contra-Interessado veio sanar a ilegalidade que motivou a proposta de declaração de nulidade do acto – cf. alínea Q) do elenco de factos provados.
19. Conforme preceituava o anterior artigo 139.º, n .º 1, al. a) do CPA, os actos nulos são insusceptíveis de revogação, quer por revogação extintiva quer por revogação por substituição – cf. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e João Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, Comentado, 2.ª edição, Almedina, pág. 674.
20. Ou seja, o R., ao invés de ter decidido manter a comunicação prévia, tinha que ter declarado a nulidade do acto que admitiu a comunicação prévia e podiam, depois, os CI, eventualmente, formular novo pedido de comunicação prévia com base em elementos novos.
21. A sentença recorrida enferma de nulidade nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA e, para além disso, viola os artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, artigos 100.º, 134.º, 137.º e 139.º, n .º 1, al. a) do CPA, na sua versão aprovada pelo DL 442/91, de 15 de Novembro, alterado pelo DL 6/96, de 31 de Janeiro.

Apenas os contra-interessados contra-alegaram (fls. 325 SITAF), pugnando pela improcedência do recurso com manutenção da decisão recorrido, formulando o seguinte quadro conclusivo:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
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Remetidos os autos a este Tribunal em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, a Digna Magistrada do Ministério Público não emitiu Parecer (fls. 1349 SITAF).
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Com dispensa de vistos, foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DOS RECURSOS/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
Em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as suas conclusões de recurso, são as seguintes as questões essenciais a decidir:
- saber se a sentença recorrida incorreu em nulidade por omissão de pronúncia nos termos do artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC, por não se ter pronunciado quanto ao vício de nulidade assacado ao ato impugnado, nos termos do disposto nos artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, por violação das prescrições do alvará de loteamento que preveem a construção de uma única garagem por fração – (conclusão 1ª das alegações de recurso);
- saber se deve ser modificado o julgamento da matéria de facto feito pelo Tribunal a quo, aditando aos factos provados que «AA. e os antecessores (antigos proprietários da fração) dos CI alteraram a finalidade dos anexos de um piso – ao fundo – no limite Nascente do referido Lote X – adaptando-os a garagem» – (conclusões 2ª e 3ª das alegações de recurso);
- saber se mesmo que se considere que não constitui matéria assente que tanto a fração dos autores como a dos contra-interessados têm já uma garagem construída, constituindo assim tal facto matéria controvertida, deve ser anulada a sentença recorrida, nos termos do artigo 662º nº 1 alínea c) do CPC, ex vi artigo 1º do CPTA, com baixa dos autos à 1ª instância com vista à sua averiguação e ampliação da matéria de facto – (conclusões 4ª e 5ª das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, de direito, quanto à solução jurídica da causa – (vide conclusões 6ª a 21ª das alegações de recurso).
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto

O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida ipsis verbis na sentença recorrida:

A) Os Autores são donos e legítimos possuidores da fracção sita na Urbanização (...), (...), (...) – cf. documento de fls. 40 e ss. dos autos de providência cautelar n.º 1838/12.1 BEBBRG em apenso.
B) Os Contra-interessados, por sua vez, são donos e legítimos possuidores da fracção sita Urbanização (...), Bloco 7, 1.º esquerdo, (...), (...) - cf. documento de fls. 40 e ss. dos autos de providência cautelar n.º 1838/12.1 BEBBRG em apenso.
C) Que adquiriram a A. (irmão do A. marido) e mulher E., por escritura pública de compra e venda datada de 9 de Junho de 2003 – cf. documento de fls. 48 e ss. da providência cautelar n.º 1838/12.1 BEBBRG em apenso.

D) Ambas as fracções estão integradas no prédio urbano sito no lugar de (...), da freguesia de (...), do concelho de (...), descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 320 – por acordo.
E) Tal prédio urbano foi construído no âmbito da operação de Loteamento n.º 26/89, estando o mesmo construído no Lote X – cf. documentos de fls. 1171 e 1172 do PA .

F) No âmbito dessa operação de loteamento, o Lote X destinava-se a edifício de habitações colectivas, com cave rés-do-chão e um andar, bem como a garagens individuais e anexos de um piso – cf. de fls. 1211 e ss. do processo administrativo.
G) Construído o edifício mãe – a compreender as fracções destinadas à habitação, os Serviços do Município emitiram licença de habitação – cf. depoimento das Testemunhas A., A-. e M..
H) Foram construídos dois anexos de um piso – ao fundo – no limite Nascente do referido Lote X - cf. depoimento das Testemunhas A., A-. e M..
I) De acordo com o Alvará de Loteamento, os anexos a construir apenas poderiam ter uma utilização: arrumos - cf. depoimento das Testemunhas A., A-. e M..

J) O Alvará de Loteamento permite ainda a construção de duas garagens - cf. depoimento das Testemunhas A., A-. e M., cf. ainda documentos de fls. 1323, 1431, 1178, 1179, 1346, 1398 todos do PA.
K) O Contra-interessado dirige ao Presidente da Câmara Municipal de (...) comunicação prévia para construção de uma garagem, instruindo tal pedido com uma planta datada de Maio de 2011 - cf. de fls. 31 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
L) Tendo tal comunicação prévia sido admitida por despacho datado de 10.07.2012 da Divisão de Serviços Técnicos de (...) por subdelegação de poderes concedida por decisão do Presidente da Câmara de (...) – cf. documento de fls. 1352 do processo administrativo.

M) Os Autores não foram convocados para participarem no procedimento administrativo até ao despacho de 10.07.2012 – cf. PA.

N) O Autor dirigiu uma exposição ao Presidente da Câmara Municipal de (...) a solicitar a revogação do acto que admitiu a referida comunicação prévia apresentada pelo Contra-interessado – cf. documento de fls. 1358 e ss. do PA.
O) Em sede de apreciação da reclamação, os serviços do Município Réu propuseram, após audiência prévia do interessado, a declaração de nulidade do acto que admitiu a comunicação prévia, conforme segue:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cf. documento de fls. 33 e ss. dos autos de providência cautelar n.º 1838/12.1 BEBBRG, em apenso, e 1375 do PA

P) Em audiência prévia, o Contra-interessado apresentou requerimento conforme segue:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- cf. de fls. 31 dos autos, cujo teor se dá aqui por integral.
P) Este aditamento foi instruído com uma Planta datada de Agosto de 2012, cujo desenho respeita o Alvará de Loteamento – cf. planta de fls. 1388 e ss. dos autos.
Q) Por despacho de 14.08.2012 da Divisão de Serviços Técnicos por subdelegação de poderes concedida por decisão do Presidente da Câmara de (...), foi decidido manter a admissibilidade da comunicação prévia previamente concedida, uma vez que o ora Contra-interessado veio sanar a ilegalidade que motivou a proposta de declaração de nulidade do acto – cf. documento de fls. 26 dos autos de providência cautelar n.º 1838/12.1 BEBBRG, em apenso.
R) Em 13/08/2012, e em resultado de uma queixa apresentada contra a construção localizada no Bairro, o MUNICÍPIO DE (...) respondeu nos termos que, em parte, se transcreve: “Quanto à impossibilidade de acesso ao anexo posterior a que o Requerente alude, esse acesso está prejudicado pela execução no local de uma escada de acesso à Cave, escada essa que não consta no projecto licenciado e como tal se supõe serem clandestinas. Pelo exposto, informa-se que o projecto apresentado cumpre o alvará de loteamento” – cf. documento de fls. 1383 dos autos.
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B – De direito
1. Da decisão recorrida
Os autores impugnaram na ação dois despachos, que ali identificaram ser o despacho datado de 10/07/2012 da divisão de serviços técnicos do MUNICÍPIO DE (...) que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal admitiu a comunicação prévia para a construção de anexo lateral para garagem efetuada pelo contra-interessado S. e o despacho datado de 14/08/2012 da mesma divisão de serviços técnicos que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal, e após proposta de revogação da supra referida comunicação prévia e após audiência prévia do contra-interessado manteve a admissibilidade da referida comunicação prévia, despachos cuja declaração de nulidade ou anulação peticionaram.
Pela sentença recorrida, datada de 26/07/2019 (fls. 270 SITAF) a Mmª Juíza a quo julgou a ação improcedente absolvendo o réu do pedido.

2. Da análise e apreciação do recurso
2.1 Da invocada nulidade da sentença, por omissão de pronuncia
2.1.1 Começam os recorrentes por invocar que a sentença recorrida incorreu em nulidade por omissão de pronúncia nos termos do artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC, por não se ter pronunciado quanto ao vício de nulidade assacado ao ato impugnado, nos termos do disposto nos artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, por violação das prescrições do alvará de loteamento que preveem a construção de uma única garagem por fração – (conclusão 1ª das alegações de recurso).
Sustentam a tal propósito que alegaram na Petição Inicial da ação que atos impugnados ao admitirem a comunicação prévia para a construção de garagem por parte do Contra-Interessado, ficando este, desta forma, a usufruir de duas garagens quando a cada fração só corresponde uma garagem segundo as prescrições do alvará de loteamento, padecem os atos impugnados de vício de violação de lei, em concreto os artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, e mas que todavia na fundamentação fáctico jurídica da sentença nem uma única palavra é tecida acerca do apontado vício, nada dizendo em relação ao facto de os contra-interessados terem já uma garagem construída, o que releva para conhecer do vício aponto pelos autores, e que essa omissão de pronúncia é tão notória que certamente se deveu a mera distração da Mmª Juíza a quo.
Vejamos.
2.1.2 A Mmª Juíza a quo identificou na sentença virem invocados na ação como fundamentos de invalidade «(i) vício de forma: falta de audiência prévia (cf. artigo 100.º do CPA) dos habitantes do prédio urbano correspondente ao Lote X, de entre os quais se encontram os Autores, bem como (ii) vício material por violação de lei – artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, e 68.º, alínea a), do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação
E começou, aliás, por apreciar «…se a decisão que admitiu a comunicação prévia para construção de anexo lateral destinado a garagem, pretensão administrativa formulada por S., aqui Contra-interessado, padece de vício material por violação de lei – artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, e 68.º, alínea a), do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação», por ter entendido que constituindo um vício material que, a proceder, ditaria a nulidade do ato, devia esse conhecimento anteceder logicamente o vício de forma, por falta de audiência prévia, que também vinha invocado na ação como causa de invalidade (anulabilidade) do ato impugnado (vide pág. 9 da sentença).
O que fez nos seguintes termos, que se passam a transcrever:
«(…)
Resulta da matéria de facto que os Autores e os Contra-interessados são donos e legítimos possuidores de fracções integradas num prédio urbano sito no Lugar (...), freguesia de (...), concelho de (...).
O prédio urbano foi construído - por referência à Operação de Loteamento n.º 26/89 - no Lote X, que admitia, para além do edifício mãe (fracções destinadas a habitação), dois anexos no limite Nascente desse mesmo Lote e duas garagens.
Em 2012, o Contra-interessado dirige ao Presidente da Câmara Municipal de (...) comunicação prévia destinada à construção de anexo lateral para garagem. Esta primeira pretensão foi admitida por despacho datado de 10/07/2012.
Porém, na sequência de reclamação, os Serviços do Município reanalisaram o despacho de 10/07/2012, tendo concluído que a garagem apresentada em projecto estava efectivamente deslocada em relação ao previsto na planta síntese de loteamento (alvará de loteamento 26/89).
Pela razão exposta, os Serviços do Município anunciaram que iriam propor, em bom rigor, a declaração de nulidade do acto, por força do artigo 68.º, alínea a) do RJUE.
O Contra-interessado foi notificado em sede de audiência prévia, tendo-lhe sido concedido prazo de 15 dias para apresentar novo projecto de acordo com as prescrições do alvará de loteamento.
Usando dessa mesma faculdade, deu entrada nos Serviços do Município pedido de aditamento/correcção/substituição do projecto de arquitectura, agora, com uma Planta datada de Agosto de 2012.
A questão essencial é a de saber se o aditamento/correcção/substituição se mostrava insuficiente para se afirmar que o projecto de arquitectura de construção da garagem respeita todas as prescrições relativas às condições de construção vertida na Planta do Loteamento de 26/89.
Ora, provou-se o diametralmente oposto. Provou-se que os Contra-interessados, com a nova planta, corrigiram a situação, respeitando todas as prescrições resultantes do Alvará de Loteamento.
Não havendo qualquer desrespeito pela planta de loteamento, nada há a apontar ao acto que, em 14/8/2012, admitiu a comunicação prévia instruída com a planta de Agosto de 2012. E importa destacar que a natureza deste acto não é confirmativa, mas inovatória, porquanto, partiu de um pressuposto de facto distinto daquele que sustentou o acto proferido em 10/07/2012, pese embora ter sido emitido à luz do mesmo bloco de legalidade. No caso concreto, cada um dos actos praticados sustentou-se em diferentes projectos de arquitectura, em que o segundo (ao contrário do primeiro) respeitou a planta de loteamento, tendo-se operado uma revogação por substituição. Ou seja, a revogação veio acompanhada de uma nova definição da situação jurídica, caso em que ditou não uma mera revogação extintiva, mas uma revogação por substituição.
Pelo que improcede o vício material apontado
2.1.3 Note-se também que já em sede da audiência prévia levada a cabo em 20/06/2016 (ata de fls. 188 SITAF) a Mmª Juíza a quo havia identificado como invocados pelos autores os mesmos fundamentos do pedido impugnatório, nos seguintes termos «(i) vício de forma: falta de audiência prévia (cf. artigo 100.º do CPTA) dos habitantes do prédio urbano inseridos no Lote X, de entre os quais se encontram os Autores; (ii) vício material por violação de lei – artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91 e 68.º, alínea a), do Regime Jurídico da Urbanização Edificação».
Tendo, ato contínuo, selecionado como único tema da prova o de «…saber se a garagem representada no projeto que sustenta o pedido de comunicação prévia se encontra deslocada em relação ao previsto na planta de síntese do loteamento de 26/89».
2.1.4 E foi sobre esse tema da prova que incidiram as diligências instrutórias, incluindo a inspeção judicial ao local (vide ata da audiência prévia de 20/06/2016 - fls. 188 SITAF) e a prova testemunhal levada a cabo na audiência final de 17/01/2017 (cfr. ata de fls. 228 SITAF), para além da consideração dos documentos juntos aos autos pelas partes e do Processo Administrativo oficiosamente solicitado pelo Tribunal (cfr. ata de fls. 228 SITAF).
2.1.3 No julgamento factual feito pelo Tribunal a quo, vertido supra, foi tido em consideração essa pluralidade de meios probatórios produzidos, explanando a Mmª Juíza a quo na sentença recorrida, nos seguintes termos, a respetiva motivação:
«A convicção deste Tribunal quanto aos factos provados alicerçou-se nos documentos para os quais remete o probatório, atenta a fé que tais documentos merecem, além de não terem sido impugnados. O Tribunal deslocou-se ao local. Ouviu, ainda, as seguintes Testemunhas:
(i) P., Engenheira Civil, sobrinha dos Autores. A Testemunha demonstrou que pouco sabia com respeito a factos. É certo que a Testemunha iniciou o seu depoimento alicerçado em conhecimentos técnicos, tendo respondido de forma espontânea, mas admitiu – bem a final do seu depoimento – que não seria a pessoa mais indicada para responder à questão de saber se a garagem representada no projecto se encontra deslocada em relação ao previsto na planta síntese do Loteamento de 26/89, razão pela qual o Tribunal não considerou o depoimento desta Testemunha, uma vez que não contribuiu para a descoberta da verdade material.
(ii) A., Arquitecta que trabalha actualmente para a Câmara Municipal de (...), interveio no procedimento administrativo em substituição do próprio Director Municipal. Prestou um depoimento claro, preciso, minucioso, demonstrando ter conhecimento não só da factualidade em discussão nos presentes autos, como da componente técnica necessária à boa decisão administrativa. Admitiu que, na sequência de reclamações, teve que reanalisar a pretensão administrativa. Na Sala de Audiências, e com referência ao Lote X, expôs o raciocínio que seguiu e as medições que realizou para concluir que garagem representada no projecto inicial se encontrava, efectivamente, deslocada em relação ao previsto na planta síntese do Loteamento de 26/89, razão pela qual – por ainda estar em tempo – propôs a revogação anulatória/declaração de nulidade do acto que havia admitido a comunicação prévia. Porém, os Contra-interessados apresentaram nova planta, corrigindo a situação, fazendo corresponder o projecto da garagem com a planta síntese do Loteamento. Esta Testemunha não só demonstrou conhecer bem o local – cf. fotografias de fls. 1431 do PA, como reconheceu espontaneamente a planta síntese do Loteamento de 26/89 – cf. de fls. 1178 e 1179 do PA, bem como com a planta datada de Maio de 2012 – cf. de fls. 1346 e ss. do PA, tornando evidente que esta planta que sustentava a comunicação prévia estava deslocada em relação à Planta de Loteamento, ao contrário da planta de Agosto de 2012 – de fls. 1398 dos autos. Mais, respondeu com objectividade, riqueza de detalhes e consistência, as razões de facto que actualmente impedem os Autores de acesso a elementos há muito construídos de forma clandestina.
(iii) Testemunha A-., Arquitecta que prestou Informação Técnica ao longo do procedimento administrativo. Esta Testemunha demonstrou absoluto conhecimento dos factos que sustentaram cada um dos actos praticados, bem como conhecimentos técnicos. Convenceu o Tribunal que o Loteamento permite a construção de anexos destinados a garagens e que o segundo projecto respeita a Planta de Loteamento. Igualmente convenceu o Tribunal que a habitação dos Autores sofreu modificações, que nunca foram legalizadas – porta, escadas laterais e pilar que sustenta um alpendre – e que constituem alteração ao Alvará de Loteamento. O Tribunal ficou convicto que, tendo em conta o Alvará de Loteamento, os anexos ao fundo apenas poderiam ser utilizados para arrumos.
(iv) Testemunha M., Engenheira Civil, em funções nos Serviços do Município, em concreto, no Departamento Urbanístico da Câmara Municipal, analisa todos os dias projectos submetidos à apreciação desse mesmo Departamento. Não interveio no procedimento, mas deslocou-se ao local. Confirmou o teor dos depoimentos anteriores. Com pertinência, destacou que – à data – a licença de habitação era concedida com a construção do edifício mãe – a habitação. Os anexos figuravam como complemento da habitação, não podendo ser destinados para garagens. Destacou – e bem – que, a partir de 2012, a licença de habitação só poderia ser concedida quando construídas as respectivas garagens de harmonia com Alvará de Loteamento. À data da factualidade em discussão, a licença de habitação era concedida antes mesmo da construção dos restantes elementos previstos no Alvará de Loteamento. Acrescentou, convencendo o Tribunal, que a dimensão dos anexos, construídos no limite Nascente, não respeitava o Alvará de Loteamento.»
2.1.3 Compulsada a Petição Inicial constata-se que efetivamente os autores suportaram a invocação da nulidade dos despachos impugnados nos termos dos artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de novembro, e 68.º, alínea a) do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (DL. nº 555/99), precisamente por violação da licença de loteamento na medida em que com a edificação da garagem objeto da comunicação prévia ficariam os contra-interessados a usufruir de duas garagens, quando nos termos do alvará de loteamento a cada fração só corresponde uma garagem, na medida em que no Lote X cada fração já há muito que tem construída a sua garagem, incluindo a fração dos contra-interessados (vide, designadamente, artigos 44º a 55º da PI).
2.1.4 Nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC novo (Lei nº 41/2013), aqui aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, a sentença é nula por omissão de pronúncia quando “…o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.
A nulidade da sentença por omissão de pronúncia está diretamente relacionada com o comando inserto na primeira parte do nº 2 do artigo 608º do CPC de acordo com o qual o juiz “…deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada para a solução dada a outras”. E por conseguinte também, no que tange às ações administrativas especiais, de estrutura impugnatória, ao comando inserto no artigo 95º do CPTA (na versão temporalmente aplicável) nos termos do qual nos processos impugnatórios “…o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o ato impugnado”.
Tal nulidade serve, assim, de cominação ao desrespeito de tal dever de conhecimento e apreciação das questões essenciais submetidas à apreciação do juiz, traduzidas no binómio pedido/causa de pedir.
Trata-se, como diz Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221, do “corolário do princípio da disponibilidade objetiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º, 2.ª parte)” que “significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.” Porém, como acrescenta este autor “o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa”.
2.1.5 Na situação presente, ainda que à primeira vista pudesse parecer que a Mmª Juíza a quo se havia omitido de aferir se a fração dos contrainteressados já possuía uma garagem, e que através da comunicação prévia, que foi admitida pelo réu Município, se estava a permitir a construção de uma segunda garagem, em desrespeito ao alvará de loteamento, essa omissão é apenas aparente, já que na verdade, a Mmª Juíza a quo entendeu, como decorre do externado na sentença, que nos termos do alvará de loteamento os anexos a localizar ao fundo do lote (limite nascente) apenas poderiam ser utilizados para arrumos, que não para garagem, admitindo ainda a construção de garagem a localizar nos termos definidos na planta-síntese do alvará de loteamento.
E foi neste contexto que entendeu que a construção dessa garagem, com a localização definida na nova planta apresentada pelos contra-interessados (a referida na alínea P) do probatório), era admitida pelo alvará de loteamento, que a Mmª Juíza a quo considerou que as prescrições do alvará foram observadas, não se verificando, por conseguinte, a nulidade prevista nos artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, e 68.º, alínea a) do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (DL. nº 555/99).
2.1.5 Não é, assim, de concluir verificar-se omissão de pronúncia geradora da nulidade da sentença.
Pelo que não colhe, neste aspeto, o recurso.

2.2 Do invocado erro de julgamento quanto à matéria de facto
2.2.1 Os recorrentes pugnam também que deve ser modificado o julgamento da matéria de facto feito pelo Tribunal a quo, aditando aos factos provados que «AA. e os antecessores (antigos proprietários da fracção) dos CI alteraram a finalidade dos anexos de um piso – ao fundo – no limite Nascente do referido Lote X – adaptando-os a garagem», ou então, pelo menos, que se averigue se tanto a fração dos autores como a dos contrainteressados têm já uma garagem construída, e que constituindo tal facto matéria controvertida, deve ser anulada a sentença baixando os autos à 1ª instância com vista à sua averiguação e ampliação da matéria de facto - (conclusões 2ª a 5ª das alegações de recurso).
2.2.2 Como é sabido, sendo imputado erro de julgamento quanto à matéria de facto não é exigido ao Tribunal de recurso que, de motu proprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos a livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio foram valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. As modificações a operar devem respeitar, em primeiro lugar, o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão da matéria de facto, indicou nas respetivas alegações que servem para circunscreverem o objeto do recurso. De modo que a modificação da decisão da matéria de facto está dependente da iniciativa da parte interessada e deve limitar-se aos pontos de facto especificamente indicados, com observância dos respetivos requisitos formais, atualmente previstos no artigo 640º do CPC novo (correspondente ao anterior artigo 685º-A do CPC antigo). Isto sem embargo das modificações que podem ser oficiosamente operadas pelo Tribunal de recurso relativamente a determinados factos cuja decisão esteja eivada de erro de direito, por violação de regras de direito probatório material (vide, neste sentido, Abrantes Geraldes, in, “Recursos no Novo Processo Civil”, Almedina, 2014, pág. 238 ss.).
2.2.3 Os recorrentes sustentam, em suma, que na contestação apresentada os contrainteressados afirmam (no artigo 3.º daquele articulado) que quer os autores, quer o seu irmão deste, anterior proprietário da fração que hoje é dos contrainteressados, alteraram a finalidade dos anexos, adaptando-os a garagem, e pretendem, a partir dessa afirmação, e bem assim, do Doc. nº 11 junto a petição da providência cautelar apensa aos presentes autos, que seja aditado o seguinte facto à matéria de facto provada: - «AA. e os antecessores (antigos proprietários da fração) dos CI alteraram a finalidade dos anexos de um piso – ao fundo – no limite Nascente do referido Lote X – adaptando-os a garagem». Ou então, que pelo menos, se averigue se tanto a fração dos autores como a dos contrainteressados têm já uma garagem construída, de molde a aquilatar da eventual violação das prescrições do alvará de loteamento.
2.2.4 Sucede que tal factualidade, verifique-se ou não, sempre será irrelevante para a solução jurídica da causa. É que o objeto da ação administrativa se centra na ilegalidade dos identificados despachos impugnados, atinentes, como se viu, à comunicação prévia para a edificação de garagem no identificado Lote X.
De modo que se os anexos destinados a arrumos previstos no alvará de loteamento para aquele lote, passaram, em momento anterior, a ser afetados ao uso de garagem, e se foram eventualmente adaptados a tal fim, tal não releva, nem tem efeitos sobre a legalidade ou ilegalidade da admissão da comunicação prévia para construção de garagem, nos termos em que estava prevista no loteamento, mas que ainda não tinha sido edificada.
A eventual discrepância que poderá verificar-se é quanto aos ditos anexos se os atos quanto à sua edificação e/ou utilização não estão conforme com o respetivo alvará.
Razão pela qual, e bem, tal factualidade não foi erigida como relevante, não tendo sido abrangida pelos temas da prova tal como foram definidos em sede de audiência prévia, não tendo, assim, sido submetida a instrução, nem o devia ser, nem deve, tão pouco, ser aditada ao probatório.
2.2.5 Não colhe, por conseguinte, também nesta parte o recurso.

2.3 Do invocado erro de julgamento quanto à solução jurídica
2.3.1 Sustentam também os recorrentes que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, de direito, quanto à solução jurídica da causa – (vide conclusões 6ª a 21ª das alegações de recurso).
Alegam para tanto, nos termos que vertem nas alegações de recurso e reconduzem às respetivas conclusões, que contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a preterição de audiência prévia no caso em apreço não pode degradar-se em formalidade não essencial; que não é o conteúdo vinculado dos atos, só por si, que permite recusar o efeito invalidante da preterição de audiência prévia, sendo também necessário que se conclua, com inteira segurança, num juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível; que a Meritíssima Juiz a quo não verificou que houve uma alteração ao loteamento original aprovada por despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de (...), datado de 13.10.89, em que se modificou o local em que as garagens iriam ser implantadas em relação ao que estava previsto no loteamento original; que é a construção da garagem tal como pretendida pelos contra-interessados que não respeita as prescrições do alvará de loteamento tal como foi aprovado aquando da alteração em 1989; que acresce o facto de cada fração já ter uma garagem, limite máximo previsto nas prescrições do alvará de loteamento; que para além destas, há ainda outras questões que poderiam ser aventadas pelos autores em sede de audiência prévia e que poderiam determinar o indeferimento da pretensão dos contra-interessados, tais como o facto de com a construção pretendida poder ser largamente ultrapassado, o que certamente iria suceder, o índice de construção previsto no alvará de loteamento; que o facto de a garagem a construir distar menos de 3 metros da janela de um compartimento de habitação dos autores, em clara violação do artigo 73.º do RGEU; o facto de poder ser um ato que viole o direito de propriedade dos condóminos, na medida em que a garagem iria ser construída numa rampa de acesso às garagens que constitui parte comum do condomínio; o facto de poder ser um ato que viole o direito dos autores acederem à sua garagem com os seus veículos conforme explicado nos artigos 58.º a 70.º da petição inicial; que assim, num juízo de prognose póstuma, jamais se pode afirmar que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível, bem longe disso; que esta é uma situação típica e notória de que deve ser concedido o direito de audiência prévia a quem possa vir a ser lesado com o ato a praticar; ainda mais quando antes de terem sido trazidos ao processo estes novos elementos (novos desenhos) os autores já tinham enviado aos réus uma exposição a pedir a revogação do primeiro ato que admitiu a comunicação prévia; que não existem quaisquer dúvidas que nos primeiros desenhos apresentados a garagem estava deslocada em relação ao previsto na planta síntese do loteamento e, assim, o ato que admitiu a comunicação prévia é um ato nulo, nos termos do disposto no artigo 68.º, al. a) do RJUE; que ao tempo do procedimento administrativo em causa estava em vigor, ainda, o antigo Código do Procedimento Administrativo e, assim, em obediência ao princípio tempus regit actum, são as normas desta versão do CPA as que têm que ser aplicadas ao caso vertente, pelo que como refere o Parecer do Exmo. Sr. Magistrado do Ministério Público proferido em 1.ª instância, com a legislação então em vigor, o ato nulo não produz qualquer efeito (artigo 134.º, n.º 1 do CPA) e é insanável quer pelo decurso do tempo, quer por ratificação, reforma ou conversão (artigos 134.º, n.ºs 1 e 2 e 137.º do CPA); que se impunha, assim, que o Município declarasse a nulidade desse ato que admitiu a comunicação prévia e não decidir manter a admissibilidade da comunicação prévia previamente concedida, uma vez que o ora Contra-Interessado veio sanar a ilegalidade que motivou a proposta de declaração de nulidade do ato; que conforme preceituava o anterior artigo 139.º, n .º 1, al. a) do CPA, os actos nulos são insusceptíveis de revogação, quer por revogação extintiva quer por revogação por substituição, pelo que o réu, ao invés de ter decidido manter a comunicação prévia, tinha que ter declarado a nulidade do ato que admitiu a comunicação prévia e podiam, depois, os contra-interessados, eventualmente, formular novo pedido de comunicação prévia com base em elementos novos, concluindo pugnado que a sentença recorrida viola os artigos 52.º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro e 68.º, alínea a) do RJUE, artigos 100.º, 134.º, 137.º e 139.º, n .º 1, al. a) do CPA, na sua versão aprovada pelo DL 442/91, de 15 de Novembro, alterado pelo DL 6/96, de 31 de Janeiro.
Vejamos.
2.3.2 Os autores impugnaram na ação dois despachos, que ali identificaram ser o despacho datado de 10/07/2012 da divisão de serviços técnicos do MUNICÍPIO DE (...) que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal admitiu a comunicação prévia para a construção de anexo lateral para garagem efetuada pelo contra-interessado S. e o despacho datado de 14/08/2012 da mesma divisão de serviços técnicos que por subdelegação de poderes concedida pelo Presidente da Câmara Municipal, e após proposta de revogação da supra referida comunicação prévia e apresentação pelo contrainteressado de aditamento ao projeto, admitiu a comunicação prévia, despachos cuja declaração de nulidade ou anulação peticionaram.
2.3.3 Tal como foi identificado pela Mmª Juíza a quo na sentença recorrida, foram invocados na ação como fundamentos de invalidade os seguintes vícios:
i) vício de forma, por falta de audiência prévia (cf. artigo 100.º do CPA) dos habitantes do prédio urbano correspondente ao Lote X, de entre os quais se encontram os autores;
ii) vício material por violação de lei por violação artigos 52.º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de novembro, e 68.º, alínea a), do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação.
2.3.4 A sentença começou por apreciar o segundo destes fundamentos, por ter entendido que constituindo um vício material que, a proceder, ditaria a nulidade do ato, devia esse conhecimento anteceder logicamente o vício de forma, por falta de audiência prévia, que também vinha invocado na ação como causa de invalidade (anulabilidade) do ato impugnado.
Apreciação que fez nos seguintes termos, que se passam a transcrever:
«(…)
Resulta da matéria de facto que os Autores e os Contra-interessados são donos e legítimos possuidores de fracções integradas num prédio urbano sito no Lugar (...), freguesia de (...), concelho de (...).
O prédio urbano foi construído - por referência à Operação de Loteamento n.º 26/89 - no Lote X, que admitia, para além do edifício mãe (fracções destinadas a habitação), dois anexos no limite Nascente desse mesmo Lote e duas garagens.
Em 2012, o Contra-interessado dirige ao Presidente da Câmara Municipal de (...) comunicação prévia destinada à construção de anexo lateral para garagem. Esta primeira pretensão foi admitida por despacho datado de 10/07/2012.
Porém, na sequência de reclamação, os Serviços do Município reanalisaram o despacho de 10/07/2012, tendo concluído que a garagem apresentada em projecto estava efectivamente deslocada em relação ao previsto na planta síntese de loteamento (alvará de loteamento 26/89).
Pela razão exposta, os Serviços do Município anunciaram que iriam propor, em bom rigor, a declaração de nulidade do acto, por força do artigo 68.º, alínea a) do RJUE.
O Contra-interessado foi notificado em sede de audiência prévia, tendo-lhe sido concedido prazo de 15 dias para apresentar novo projecto de acordo com as prescrições do alvará de loteamento.
Usando dessa mesma faculdade, deu entrada nos Serviços do Município pedido de aditamento/correcção/substituição do projecto de arquitectura, agora, com uma Planta datada de Agosto de 2012.
A questão essencial é a de saber se o aditamento/correcção/substituição se mostrava insuficiente para se afirmar que o projecto de arquitectura de construção da garagem respeita todas as prescrições relativas às condições de construção vertida na Planta do Loteamento de 26/89.
Ora, provou-se o diametralmente oposto. Provou-se que os Contra-interessados, com a nova planta, corrigiram a situação, respeitando todas as prescrições resultantes do Alvará de Loteamento.
Não havendo qualquer desrespeito pela planta de loteamento, nada há a apontar ao acto que, em 14/8/2012, admitiu a comunicação prévia instruída com a planta de Agosto de 2012. E importa destacar que a natureza deste acto não é confirmativa, mas inovatória, porquanto, partiu de um pressuposto de facto distinto daquele que sustentou o acto proferido em 10/07/2012, pese embora ter sido emitido à luz do mesmo bloco de legalidade. No caso concreto, cada um dos actos praticados sustentou-se em diferentes projectos de arquitectura, em que o segundo (ao contrário do primeiro) respeitou a planta de loteamento, tendo-se operado uma revogação por substituição. Ou seja, a revogação veio acompanhada de uma nova definição da situação jurídica, caso em que ditou não uma mera revogação extintiva, mas uma revogação por substituição.
Pelo que improcede o vício material apontado
2.3.5 Resulta do probatório que o contrainteressado dirigiu ao Presidente da Câmara Municipal de (...) comunicação prévia para construção de uma garagem no Lote X da Urbanização (...), instruindo tal pedido com a planta datada de maio de 2011, comunicação prévia que foi admitida por despacho datado de 10/07/2012 da Divisão de Serviços Técnicos de (...) por subdelegação de poderes concedida por decisão do Presidente da Câmara de (...) (cfr. pontos K) e L) do probatório).
2.3.6 Mas na sequência de exposição dirigida pelo autor ao Presidente da Câmara Municipal de (...) solicitando a revogação daquele ato os serviços do réu Município Réu aventaram, após audiência prévia daquele contrainteressado ser aquele ato nulo nos termos do artigo 68º alínea a) do RJUE, por a garagem objeto da comunicação prévia estar deslocada em projeto em relação ao previsto na planta síntese do loteamento titulado pelo alvará nº 26/89, não cumprindo, assim, as prescrições do respetivo alvará.
2.3.7 Todavia, a entidade administrativa, em vez de retirar daí a consequência própria, que era a de declarar ao abrigo do artigo 134º nºs 1 e 2 do CPA/91 (temporalmente aplicável, porque em vigor à data), a nulidade daquele despacho de 10/07/2012 que admitiu a comunicação prévia, desencadeou o mecanismo da revogação com fundamento em invalidade do ato, convocando do artigo 141º do CPA/91.
Socorreu-se, assim, do instrumento da revogação anulatória. Mas mal.
2.3.8 Com efeito, nos termos do disposto no artigo 139º nº 1 do CPA/91 “não são suscetíveis de revogação (…) os atos nulos ou inexistentes”.
Isto porque nos termos do artigo 134º do CPA/91, os atos nulos não produzem quaisquer efeitos jurídicos (nº 1) – ainda que sem prejuízo da possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto deles decorrentes, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito (cfr. nº 3) – e a sua nulidade, sendo invocável a todo o tempo, pode também ser declarada a todo o tempo seja pelo tribunal seja pela Administração (nº 2).
Tudo significando que a possibilidade de revogação dos atos administrativos inválidos com fundamento na sua invalidade, tal como prevista no artigo 141º do CPA/91, se encontra reservada para os atos cuja invalidade seja sancionada com a mera anulabilidade (cfr. artigo 135º do CPA/91), como aliás expressamente dispõe o artigo 136º do CPA/91.
Não sendo também os atos nulos suscetíveis de ratificação, reforma ou conversão (cfr. artigo 137º nº 1 do CPA/91).
2.3.9 Sucede que, no caso, uma vez notificado para se pronunciar sobre a aventada «revogação» do despacho que admitiu a comunicação prévia, o contrainteressado apresentou um pedido de «aditamento» que instruiu com a planta datada de agosto de 2012.
E perante esse dito «aditamento» a Divisão de Serviços Técnicos por subdelegação de poderes concedida por decisão do Presidente da Câmara de (...), decidiu por despacho de 14/08/2012 manter a admissibilidade da comunicação prévia anteriormente concedida, entendendo que o ali interessado tinha vindo sanar a ilegalidade que motivou a proposta de declaração de nulidade do ato, através da correção quanto à inserção da garagem a edificar, agora em conformidade com a planta síntese do alvará de loteamento (vide pontos P) e Q) do probatório).
2.3.10 O Tribunal a quo enfrentando na sentença recorrida a questão de saber se o «aditamento/correção/substituição» se mostrava ou não suficiente para se afirmar que o projeto de arquitetura de construção da garagem respeita todas as prescrições relativas às condições de construção vertida na Planta do Loteamento de 26/89, entendeu que o contrainteressado, com a nova planta, corrigiu a situação, respeitando, agora, todas as prescrições resultantes do alvará de loteamento. E que não havendo qualquer desrespeito pela planta de loteamento, nada havia a apontar ao despacho de 14/08/2012 que admitiu a comunicação prévia instruída com a planta de agosto de 2012.
Acrescentando, ainda, que a natureza deste ato de 14/08/2012 não é confirmativa, mas inovatória, por ter partido de um pressuposto de facto distinto daquele que sustentou o anterior ato proferido em 10/07/2012. E que no presente caso, cada um dos atos praticados se sustentou em diferentes projetos de arquitetura, em que o segundo (ao contrário do primeiro) respeitou a planta de loteamento.
2.3.11 No entanto a sentença avançou dizendo que através do despacho de 14/08/2012 se operou «uma revogação por substituição» ou seja, e nas suas palavras, «a revogação veio acompanhada de uma nova definição da situação jurídica, caso em que ditou não uma mera revogação extintiva, mas uma revogação por substituição».
2.3.12 Mas não se pode subscrever, à luz do regime da nulidade dos atos supra percorrido, o entendimento assim feito pelo Tribunal a quo.
2.3.13 E aí assiste, em parte, razão aos recorrentes, na medida em que verificada a desconformidade do primitivo projeto para edificação da garagem com a planta síntese do loteamento titulado pelo alvará nº 26/89, e reconhecida a nulidade do despacho de 10/07/2012 que admitiu a comunicação prévia, por efeito do artigo 68º alínea a) do RJUE, por violação das prescrições do alvará, e não tendo sido declarada pela Administração essa mesma nulidade, impunha-se que o Tribunal o fizesse.
Incorreu, pois, em erro de julgamento a sentença recorrida, ao julgar improcedente este pedido, que foi expressamente formulado na ação, e que devia, assim, ter sido julgado procedente, com declaração da nulidade daquele despacho de 10/07/2012.
O que agora de decide e declara.
2.3.14 Isto não implica, porém, que também o posterior despacho de 14/08/2012 devesse ser declarado nulo. Isto pela singela razão de que não se verificam as apontadas desconformidades face ao alvará de loteamento.
Sendo que, por outro lado nenhuma outra causa de invalidade lhe foi assacada para além do vício de forma por falta de audiência prévia. E a ele já passaremos.

2.3.15 Enfrentando o invocado vício de forma, por falta de audiência prévia (cf. artigo 100.º do CPA) dos habitantes do prédio urbano correspondente ao Lote X, de entre os quais se encontram os autores, a sentença recorrida discorreu o seguinte, que se passa a transcrever:
«(…)
Por sua vez, e já entrando na análise do vício formal, não há dúvida de que o acto em crise tem que ser qualificado como acto vinculado, quer quanto aos pressupostos, quer quanto aos efeitos jurídicos.
O loteamento é um instrumento que define a potencialidade edificatória e respectivos parâmetros, conferindo aos adquirentes dos lotes o direito de concretizarem a edificabilidade neles prevista. A concretização da edificabilidade está sujeita tão-só a uma comunicação prévia. Por conseguinte, o acto de admissão é vinculado, limitando-se a verificar o respeito, por parte do projecto, das prescrições do loteamento.
Quando nada é desrespeitado, a Administração não se pode opor ao exercício de direitos pré-existentes, pelo que a eventual falta de audiência prévia degradar-se-ia, atenta a total vinculatividade do agir administrativo, traduzido na obrigação de admitir a comunicação prévia, o que dita irremediavelmente o naufrágio do vício formal invocado.»
2.3.16 Os recorrentes defendem no recurso que contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a preterição de audiência prévia no caso em apreço não pode degradar-se em formalidade não essencial, sustentando que não é o conteúdo vinculado dos atos, só por si, que permite recusar o efeito invalidante da preterição de audiência prévia, sendo também necessário que se conclua, com inteira segurança, num juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível; que há questões que poderiam ser aventadas pelos autores em sede de audiência prévia e que poderiam determinar o indeferimento da pretensão dos contrainteressados, que enuncia, e que assim, num juízo de prognose póstuma jamais se pode afirmar que a decisão administrativa impugnada seja a única concretamente possível, bem longe disso, e que, assim, esta é uma situação típica e notória de que deve ser concedido o direito de audiência prévia a quem possa vir a ser lesado com o ato a praticar, ainda mais quando antes de terem sido trazidos ao processo estes novos elementos (novos desenhos) os autores já tinham enviado ao réu uma exposição a pedir a revogação do primeiro ato que admitiu a comunicação prévia.
2.3.17 Não lhes assiste, todavia, razão. É que desde logo a circunstância de os autores serem donos e legítimos possuidores da fração sita no Rés-do-Chão (...) (Lote X), não conduz a que estes constituam «interessados» no procedimento de comunicação prévia desencadeado pelos donos e legítimos possuidores da fração sita no 1.º esquerdo do mesmo Bloco, com vista à edificação de uma garagem naquele Lote, a qual já se encontrava prevista no alvará de loteamento mas que ainda não tinha sido edificada. Até porque não são destinatários do ato.
2.3.18 Simultaneamente, a eventual circunstância de o ato de admissão da comunicação prévia poder estar ferido de invalidade, designadamente por eventual violação das prescrições do alvará de loteamento, não converte os proprietários dos outros lotes ou frações em interessados. Estarão, é certo, legitimados a impugnarem, administrativa ou contenciosamente, esse ato administrativo com fundamento na sua invalidade, que foi o que fizeram. Mas essa legitimidade processual, que efetivamente possuem, não abrange, nem implica, a necessária participação naquele procedimento, nem, por conseguinte, a sua audição prévia.
2.3.19 Não assiste, pois, neste aspeto, razão aos recorrentes. Improcedendo nesta parte o recurso.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder parcial provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido de declaração da nulidade do ato de 10/07/2012, e em sua substituição declarar a nulidade daquele ato; e não colhendo quanto ao mais o recurso, manter, ainda que não exatamente com a mesma fundamentação, a decisão de improcedência do pedido impugnatório dirigido ao ato de 14/08/2012.

Custas a cargo de ambas as partes, em igual proporção - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), artigos 7º e 12º nº 2 do RCP e artigo 189º nº 2 do CPTA.
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Notifique.
D.N.
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Porto, 19 de junho de 2020


M. Helena Canelas
Isabel Costa
João Beato