Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00509/16.4BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/28/2019
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Helena Canelas
Descritores:SUBSÍDIO DE DESEMPREGO, MEMBRO DE ÓRGÃO ESTATUTÁRIO, SITUAÇÃO CONTRIBUTIVA REGULARIZADA
Sumário:
I – A eventualidade que dá origem à proteção social de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração nos termos do DL. nº 12/2013, de 25 de janeiro, é o encerramento da empresa ou cessação da atividade profissional de forma involuntária (cfr. artigos 2º, 6º e 7º); razão pela qual o prazo de 90 dias a partir do qual deve ser apresentado o requerimento para atribuição das respetivas prestações por desemprego se conta a partir da data do encerramento da empresa ou da cessação da atividade profissional (cfr. artigo 12º nº 1); e razão pela qual também deve ser acompanhado dos respetivos elementos instrutórios comprovativos “… da involuntariedade do encerramento da empresa ou da cessação da atividade profissional e da data a que se reporta, em modelo próprio” (cfr. artigos 12º e 13º nº 1).
II – Das disposições conjugadas dos artigos 5º e 8º do DL. nº 12/2013, resulta que a aferição sobre a verificação das condições de atribuição das prestações por desemprego, de natureza cumulativa, haverá de fazer-se por referência à data da cessação da atividade, correspondendo esta ao dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária.
III – Entre as condições exigidas para a atribuição das prestações por desemprego constantes no nº 1 do artigo 7º do DL. nº 12/2013 é enunciada sob a alínea c) a “situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa”. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP
Recorrido 1:IMJFP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Julgar a acção improcedente
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso com revogação da sentença recorrida
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
O INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP réu na ação administrativa que contra si foi instaurada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu por IMJFP (devidamente identificada nos autos) – na qual a autora impugnou a decisão de indeferimento do requerimento de proteção no desemprego, cuja anulação peticionou, com substituição por outra que deferisse a sua pretensão – inconformado com a sentença de 31/05/2018 do Tribunal a quo que julgando procedente a ação anulou o ato impugnado, condenando o réu a praticar os atos necessários que defiram a pretensão da autora, com as devidas consequências legais, dela interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
A. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo tribunal "a quo" que julgou a presente ação procedente e, em consequência, anulou o ato praticado pelo Réu, ora Recorrente, na medida em que considerou que "a A. sempre teve a sua situação contributiva regularizada, quem não leve a situação contributiva em dia foi a sociedade".
B. Relembre-se que o ato administrativo impugnado consubstanciou-se no indeferimento da prestação de desemprego, requerida pela A., na qualidade de membro de órgão estatutário, adiante designado MOE, cuja matéria é regulada pelo Decreto-Lei n.° 12/2013, de 25.01.
C. A decisão, ora em crise, afigura-se ao Réu que incorre em erro de julgamento, por errada interpretação dos factos e do direito aplicável e, em consequência, em falta de fundamentação de facto e de direito e, por fim, em violação de lei.
D. Dado que tais vícios afetam formal e intrinsecamente a validade da sentença proferida, gerando, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e d), do n.° 1 do artigo 615.º do CPC, aplicáveis ex vi do disposto no artigo 140.º, n.º 3 do CPTA, a sua nulidade, deve a mesma, por consequência, ser revogada.
Vejamos:
E. A sentença, aqui em crise, estabeleceu, com interesse para a decisão a proferir, 15 factos dados como provados, entre os quais os n.ºs 1), 7), 9), 10), 1 1 ), 12) e 15), estes com especial relevância para o presente recurso, cujo teor se transcreve, por facilidade de leitura, a saber:
"1) A Autora (A.) a 12 de Julho de 2016, junto dos Serviços da Segurança Social de Lamego, requereu a proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
(...)
7) Dissolução que ocorreu em 11 de Julho de 2016, data em que foi participada e devidamente registada na Conservatória do Registo Comercial de Lamego, com a inscrição n.° 4, AP1/20160711 - cfr. doc. n.° 4 que se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
(...)
9) A Autora, após a dissolução da sociedade apresentou, a 12 de Julho de 2016, nos Serviços da Segurança Social de Lamego, o requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
10) Em 18 Agosto de 2016, foi informada pela contabilidade que o pagamento das contribuições da Sociedade à Segurança Social, referentes aos meses de Abril, Maio e Junho todos do ano 2016, não estavam correctos, havia pago parte das quantias, e não a totalidade.
11) Por esse motivo, no mesmo dia, solicitou à contabilidade a emissão da respectiva guia de pagamento para proceder à regularização, e assim o fez de imediato - cfr. doc. n.° 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
12) No dia 19 de Agosto de 2016, a A. recebeu uma notificação da segurança social, referente ao requerimento de proteção no desemprego, onde é informada que tinha sido proposto o indeferimento por não apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social, se no prazo de 5 dias úteis não oferecesse resposta por escrito, com os elementos e meios de prova que pudessem impedir o indeferimento, aqui junto sob o doc. n.º 1.
(...)
15) A sociedade sempre pagou, não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016 - cfr. doc. n.º 8 (certidão de não dívida) que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos eleitos legais."
F. Refere a sentença que "A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos aos autos pelas partes e pelo confronto das posições das partes assumidas nos respetivos articulados." - o negrito é o nosso.
G. Acrescenta ainda, que "Todos os factos, com interesse para a decisão da causa, constantes dos presentes autos, designadamente, os documentos juntos e o processo administrativo, foram objeto de análise concreta, não se provando os que não constam da factualidade descrita, por não ler sido produzido prova que lograsse firmar a convicção noutro sentido." - o negrito é o nosso.
H. Ora, entende o Recorrente que há factos que foram incorretamente julgados e cuja relevância, quer "de per si", quer em articulação uns com os outros, é determinante para a boa decisão da causa e para a descoberta da verdade material. Pelo que, ao contrário do mencionado na douta sentença, não foram objeto de suficiente e maturada análise concreta, a saber, os factos dados como provados sob os n.ºs 1), 7), 9), 10), 11), 12) e 15).
I. Tão pouco foram objeto de análise crítica, como determina o n.° 4, do artigo 607.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
J. Também a sua subsunção à legislação aplicável, designadamente a constante da alínea c), do n.° 1, do artigo 7.º, do Decreto-Lei n.° 12/2013 de 25.01, resulta prejudicada por essa circunstância, a qual analisaremos mais adiante.
K. Na verdade, se bem se verificar, o juiz "a quo", apesar de ter dado como provados:
- o facto da dissolução da empresa ter ocorrido em 11.07.2016;
- o facto da A., ora Recorrida, ter em 12.07.2016 apresentado "requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário";
- o facto de em 1.8.08.2016 ter tomado conhecimento de que "o pagamento das contribuições da Sociedade à Segurança Social, referentes aos meses de Abril, Maio e Junho iodos de 2016, não estavam correctos, havia pago parte das quantias, e não a totalidade.";
- o facto de, "no mesmo dia", (i.e., em 18.08.2016) ter procedido à regularização; - o facto de no dia 19.08.2016 ter recebido a notificação de que o seu pedido de proteção no desemprego "tinha sido proposto o indeferimento por não apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social";
- o facto de que "A sociedade sempre pagou, não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016" ainda assim, e apesar dos mesmos factos, concluiu que "A situação contributiva da A. sempre esteve regularizada e o fundamento do indeferimento é relativo a um facto imputável, exclusivamente à Sociedade (...)" (a fls. 11 da douta sentença) para decidir, como é consabido, a favor da então A. e em violação da lei, corno mais adiante se demonstrará - o sublinhado e o negrito são os nossos.
L. Ora, s.m.o., a decidir como fez, o juiz "a quo" não podia retirar daqueles factos provados a conclusão supra indicada, como se verá.
M. Entende, ainda, o Recorrente que o M.mo Juiz "a quo" não podia, como fez, por abusivo, dado ser uma conclusão que o mesmo retira de um documento, ter considerado como facto provado que "A sociedade sempre pagou não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016" - facto provado sob o n.° 15) - pois trata-se de uma conclusão que nem sequer se pode retirar do documento invocado, ou seja, do documento n.° 8 junto com a PI (certidão de não dívida), pois, desse documento só se pode considerar provado, conforme resulta do próprio, que à data de 14.10.2016 "(...) a entidade contribuinte acima identificada (MLFJ LD) tem a sua situação contributiva regularizada perante a Segurança Social." - o sublinhado e o negrito são os nossos.
N. O mesmo documento refere que "A presente declaração não constitui instrumento de quitação de dívida de contribuições e ou juros de mora, nem prejudica ulteriores apuramentos (…)", ou seja, a regularização de dívidas à segurança social, não significa uma situação de não dívida - o negrito é o nosso.
O. A este propósito, é importante esclarecer que uma situação contributiva regularizada perante a Segurança Social, não é sinónimo de não dívida, a qual, ainda assim, pode existir.
P. Contudo, no que respeita a este facto dado como provado sob o n.° 15, é entendimento do Recorrente que o mesmo não é relevante para a situação controvertida nos autos, tendo como referência a data indicada de 14.10.2016. De facto, o que o Recorrente entende ser relevante, para a boa decisão da causa, s.m.o. e com todo o respeito que o douto tribunal lhe merece, é a verificação ou não do preenchimento das condições legalmente estipuladas para a atribuição do requerido subsídio de desemprego à data da cessação da atividade, e não outra qualquer data, conforme se estabelece na legislação aplicável.
Q. Relembre-se que a dissolução da empresa, em causa nos autos, ocorreu em 11.07.2016, conforme o facto dado como provado sob o n.° 7.
R. Nesta medida, importa ter em atenção a prova documental carreada para os autos, designadamente a constante do respetivo processo administrativo, doravante PA.
S. Se bem se verificar, e nos termos da norma aplicável ao caso concreto - a alínea c), do n.° 1, do artigo 7.°, conjugado com os artigos 5.° e 8.º, todos do Decreto-Lei n.° 12/2013, de 25 de janeiro -, a data relevante, para a mencionada verificação, ou não, do preenchimento das condições para atribuição do requerido subsídio de desemprego, é "o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária", ou seja, "in casu", o dia 12.07.2016.
T. Ora, para a boa decisão da questão controvertida levada a julgamento do douto tribunal, importante era que o juiz "a quo" tivesse fixado a data de 12.07.2016 como a data legalmente relevante para a aferição de estarem ou não reunidas as condições legais para a atribuição da prestação de desemprego requerida pela ora Recorrida, o que não fez.
U. Quanto ao facto dado como provado sob o n.° 10, constam, do referido PA, enviado pelo ora Recorrente aos autos, factos que contrariam a interpretação que o douto juiz "a quo" fez, os quais se reputam relevantes para o apuramento da verdade material e que demonstram que a outras conclusões e a outra decisão deveria a sentença, ora em causa, ter chegado, a saber:
- de fls. 92 do PA consta um e-mail, datado de 09.08.2016, dirigido aos serviços do Recorrente, no qual se refere que "como a contabilidade tem obrigações fiscais para cumprir, não se conseguiu dissolver a empresa com eleitos imediatos, a dissolução tornou-se efectiva no dia 11 de Julho.";
- de fls. 91 do PA consta um e-mail dos serviços do Recorrente, datado de 11.08.2016, no qual se refere que "os MOE's - (...) tem que descontar 30 dias e pelo menos sobre o valor IAS (...). Deverá assim, proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas." - o sublinhado e o negrito são os nossos;
- de fls. 91 do 'PA consta o e-mail de resposta aos serviços do Recorrente, datado de 18.08.2016, no qual se refere que "foram submetidos formulários vazios colocando as remunerações em falta nos meses de Abril, Maio e Junho. Assim, junto em anexo o documento que originou as contribuições a pagar, bem como os juros acrescidos e o pagamento dos montantes em falta." - o sublinhado e o negrito são os nossos.
V. Ora, destes documentos resulta que foram os serviços do Recorrente, pelo menos, em 11.08.2016, que notificaram a A., através dos seus serviços de contabilidade, de que estavam por pagar contribuições relativas a declarações de remunerações enviadas.
W. Pelo que não é verdade, o que se afirma a fls. 10 da sentença, de que "(...) a Sociedade nunca falhou com o pagamento das contribuições sociais, (...) tendo regularizado a situação logo que se apercebeu do lapso e não tendo sido a segurança social a pedir a regularização." - o negrito e o sublinhado são os nossos.
X. Tal como não é verdade, que "(...) nunca a sociedade, nem a A., em momento algum, foram notificadas da existência de qualquer irregularidade no pagamento das contribuições sociais, tendo a situação sido imediatamente regularizada, com o alerta dado pela sua contabilidade e mesmo antes de ter sido proferida a decisão de indeferimento, "- a fls. 10 da sentença.
Y. Tal como continua a não corresponder à verdade dos factos o que se menciona a fls. 11 da sentença, a saber: "Como resulta dos autos, as contribuições em causa não estavam em falta, mas apenas pagas parcialmente, sendo que o pagamento integral foi feito voluntariamente mesmo antes de qualquer notificação da Segurança Social."
Z. Estes factos têm relevância para a causa, dados os pressupostos legais estipulados para a atribuição da prestação de desemprego requerida pela ora Recorrida.
AA. A Recorrida deveria ter, nos termos da legislação aplicável reunido "as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade", o que não se verificou, de facto.
BB. Facto que o tribunal desvalorizou, não lhe atribuindo a relevância e efeitos legais devidos, no entender do Recorrente.
CC. Deste modo, dever-se-iam ter fixado como factos provados para a boa decisão da causa, os seguintes:
- à data da cessação da atividade, isto é, em 12.07.2016 - "o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de ,forma involuntária", nos termos do artigo 8.º do decreto-lei aplicável - que é a mesma do requerimento para proteção no desemprego da A., ora Recorrida, na qualidade de MOE - , a situação contributiva da empresa não estava regularizada perante a segurança social;
- a situação contributiva da empresa só foi regularizada em 18.08.2016;
- apesar dos serviços da segurança social terem, pelo menos, em 11.08.2016, notificado os serviços de contabilidade da, então, A. de que teriam que proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas.
DD. De facto, a data relevante para aferir de que estão ou não reunidas as condições de atribuição, do subsídio de desemprego, é, conforme já se mencionou antes, a da cessação da atividade, conforme se determina no artigo 5.° do diploma legal aplicável.
EE. Deste modo, evidenciados que foram os pontos de facto em que se considera ter existido incorreto julgamento, e alegados, também, os concretos meios probatórios constantes dos autos, impunha-se decisão diversa da adotada pela decisão ora recorrida, isto é, a improcedência dos pedidos formulados.
FF.A legislação aplicável à situação da então A., ora Recorrida, é, como já se referiu antes, a constante do Decreto-Lei n.° 12/2013, de 25 de janeiro que estabeleceu, no âmbito do sistema providencial, o regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos trabalhadores independentes com atividade empresarial e dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas.
GG. No artigo 5.°, é reconhecida aos beneficiários a titularidade do direito aos subsídios previstos no artigo 4.° daquele mesmo diploma legal, desde que "reúnam as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade". - o negrito e o sublinhado são nossos.
HH. Ora, a data da cessação da atividade é considerada pelo mesmo diploma legal "o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária" - cfr. o artigo 8.".
II. Conforme se verificou supra, a data da cessação da atividade, no presente caso, é o dia 12.07.2016.
JJ. Estabelece o n.° 1 do artigo 7.° daquele diploma legal, as condições legais cumulativas, para a atribuição dos subsídios previstos no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 12/2013, de 25 de janeiro, designadamente as seguintes:
"(...)
d) Situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa.,
(...)
KK. No caso concreto da A., à data da cessação da atividade, que ocorreu em 12.07.2016, conforme decorre do doc. 4 apresentado, pela mesma, com a PI e dado como facto provado na presente sentença recorrida, nos termos da legislação vinda de citar, aquela não tinha, àquela data, a sua situação contributiva regularizada perante a Segurança Social a qual é, nos termos daquela alínea c) uma das condições para o reconhecimento do direito aos subsídios por cessação de atividade - cfr. o doe. 6 junto com a PI.
LL. Tal regularização só ocorreu em 18.08.2016, conforme doc. 6 junto com a PI e dado como facto provado sob os n.° 10 e 11 na sentença ora recorrida
MM. Ainda que o juiz "a quo" tenha subsumido os factos concretos à norma aplicável, não interpretou adequada e convenientemente a norma, porquanto não considerou serem cumulativas as condições fixadas e dissociou-as de modo a acomodar a decisão final tomada.
NN. Deste modo, o juiz "a quo" tinha que considerar que em 12.07.2016 não estavam reunidas aquelas condições legais, (as constantes da alínea c) do n.º 1 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 12/13, de 25.02) para a atribuição das requeridas prestações de desemprego.
OO. Assim, o juiz "a quo" errou na subsunção dos factos à norma aplicável, pois em 12.07.2016, a A., ora Recorrida, não tinha a sua situação regularizada perante a segurança social, conforme, aliás, se estabelece no facto provado sob o n.° 10) da sentença,
PP. Verificado o incorreto e erróneo julgamento dos factos em apreço nos presentes autos, falece a fundamentação da decisão tomada pelo douto tribunal "a quo".
QQ. Com efeito, refere a sentença que "A convicção do tribunal firmou-se com base no teor dos documentos juntos aos autos pelas partes e pelo confronto das posições das partes assumidas nos respetivos articulados."
RR. No entanto, do teor dos documentos juntos aos autos não podia decorrer a decisão ora recorrida. Não existiam fundamentos de facto bastantes para o juiz "a quo" ter decidido corno decidiu. Ou seja, não se verificava a situação contributiva regularizada perante a segurança social da empresa à data relevante para o efeito que, no caso em apreço, foi o dia 12.07.2016, como se disse. Logo, não estavam preenchidos os pressupostos de facto para a atribuição da prestação de desemprego à A., ora Recorrida.
SS. Ademais, para a elaboração da sentença, impendia sobre o douto tribunal, nos termos do artigo 607.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, a obrigação de, designadamente, analisar criticamente as provas, "indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção" e "compatibilizando toda a matéria facto adquirida e extraindo dos ,factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência."
TT. O juiz "a quo" não analisou criticamente as provas, tendo-se limitado a expor os argumentos de ambas as partes - vide a sentença a fls. 2 a 6, para depois, a fls. 10 e 11, voltar a concluir como a A. nas suas alegações escritas.
UU. Estabelecendo, ainda, o legislador, naquele artigo que apesar da prova ser objeto de livre apreciação pelo juiz, deve o mesmo fazê-lo "segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto".
VV. A sentença, ora em crise, baseou erradamente a sua convicção em factos não relevantes, e em especial num facto não relevante, isto é que "A A. (...) fica prejudicada por factos que, apenas e só, dizem respeito à Sociedade (...)" e "É que a A. sempre leve a sua situação contributiva regularizada, quem não teve a situação contributiva em dia foi a sociedade (...) conforme se explicitou antes - cfr. fls. 10 da sentença.
WW. Ora, o legislador não distinguiu a situação da empresa, da situação "do próprio", razão pela qual entende o Recorrente que não cabe ao intérprete distinguir o que o legislador não distinguiu.
XX. Bem como, não teve a sentença recorrida em consideração outros factos constantes do processo administrativo que são decisivos para a boa tomada de decisão sobre o caso em apreço e para a descoberta da verdade material, conforme se teve oportunidade de mencionar antes.
YY. Acresce, no entendimento do Recorrente, que a douta sentença não compatibilizou toda a matéria facto adquirida nos autos.
ZZ. Assim, tendo em consideração tudo o que antecede, entende o Recorrente que o juiz "a quo" não fundamentou de facto a sua decisão, em virtude de ter dado relevância a factos que não a tinham e ter desconsiderado factos que são relevantes para a boa decisão da causa, não estando, deste modo, fundamentada a decisão tomada.
AAA. A douta sentença não avaliou, não valorizou, nem analisou criticamente Os factos, padecendo a decisão, ora recorrida, de erro manifesto no julgamento da matéria de facto e do seu valor probatório, nos termos e com os fundamentos do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC aplicáveis ex vi artigo 1.º do CPTA.
BBB. Acresce que a sentença prolatada está em oposição com invocados fundamentos — se a empresa à data de 12.07.2016 não tinha a situação contributiva regularizada perante a segurança social, não se verificou uma das condições legalmente fixadas para a atribuição da prestação de desemprego da Recorrida.
CCC. Verifica-se, também, que a decisão proferida não se pronunciou sobre questões que devia apreciar, designadamente, as consequências legais que deveria ter retirado do facto da empresa à data de 12.07.2016 não ter a sua situação contributiva regularizada perante a segurança social.
DDD. Deste modo, a sentença é nula nos termos do disposto nas alíneas b), c) e d) do n.° 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º e n.° 3 do artigo 140.° do CPTA.
EEE. Verifica-se que o tribunal "a quo" não fundamentou legal e adequadamente a sua decisão, violando a lei, porquanto, a mesma não encontra respaldo nas normas invocadas para "in fine" julgar procedente a ação intentada pela, então, A.
FFF. A sentença inicia-se pelo Relatório que, conforme se estabelece no n.° 2 do artigo 607.° do CPC ex vi artigo 1.º do CPTA, "começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar."
GGG. Estipula o n.° 3 do mesmo artigo que "Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final" - o negrito é o nosso.
HHH. Assim, considerou o douto tribunal "a quo" que "Com interesse para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:", em número de 15, como se mencionou supra e quanto aos factos não provados, fixou o douto tribunal que "(...) não se provando os que não constam da factualidade descrita, por não ter sido produzida prova que lograsse formar a convicção noutro sentido.
III.A sentença, ora em crise, deveria ter submetido todos esses factos a tratamento jurídico adequado, isto é, ter identificado as regras de direito aplicáveis, ter interpretado essas regras, e ter determinado os correspondentes efeitos jurídicos. O que não fez.
JJJ. Neste sentido, deveria a douta sentença ter começado pela qualificação jurídica que consiste em determinar a previsão legal a que se ajustam os factos provados (subsunção), para depois, encontrada a norma aplicável ao caso concreto, proceder à sua interpretação, fixando o seu sentido e extensão. Por fim, deveria a sentença, ora em crise, ter feito a aplicação da norma, estabelecendo-se o efeito jurídico que, segundo a mesma, se deveria atribuir à situação litigiosa, em causa nos autos.
KKK. A verdade é que a douta sentença, faz uma errada aplicação da legislação ao caso concreto dos autos, interpretando-a de modo abusivo, distinguindo onde o legislador não distingue, violando, assim, o disposto no n.° 3 do artigo 607.° do CPC ex vi artigo 1.° do CPTA e as normas conjugadas dos artigos S.°, 2.ª parte "(...) que reúnam as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade (...)" e 7.°, n.° 1, alínea c), do Decreto-Lei n.° 12/13, de 25.02.
LLL. Efetivamente, considera o Recorrente que a decisão recorrida enferma de nulidade, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e cl) do n.° 1 do artigo 615.° CPC ex vi artigo 1.° do CPTA, dado que não podia o juiz "a quo" considerar como verificado o requisito de "situação contributiva regularizada perante a segurança social" do "próprio" e desconsiderar o requisito de "situação contributiva regularizada perante a segurança social" da "empresa", quando o legislador estabelece deverem ser as duas situações, cumulativamente consideradas, como condições/requisitos para efeitos de atribuição de subsídio de desemprego a MOE, nos termos da al. e) do n.° 1 do artigo 7.º supramencionado.
MMM. A decisão aqui em crise não se encontra fundamentada quer de facto, quer de Direito, no entendimento do Recorrente.
NNN. Aliás, afronta o princípio da legalidade.
OOO. Não se podendo conformar com a decisão "a quo" e porque a lei aplicável impunha uma solução diferente da adotada, entende o ora Recorrente que aquela enferma de grave erro de julgamento e de violação de lei, pelo que requer que tal sentença seja considerada NULA E DE NENHUM EFEITO na ordem jurídica, devendo determinar-se a sua revogação, por deficiente e insuficiente fundamentação e a sua substituição por outra que, dando provimento ao recurso, julgue a ação totalmente improcedente, por não provada, absolvendo o Recorrente do pedido.
PPP. A exigência de fundamentação legal da sentença determina que a sua falta, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e d) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC ex vi artigo 1.º do CPTA, conduz à nulidade, o que se invoca.
*
A recorrida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, formulando a final o seguinte quadro conclusivo:
1ª) A Recorrida, junto dos Serviços da Segurança Social de Lamego, requereu a proteção no desemprego para membros de órgão estatutário, que lhe foi indeferida com o fundamento de não “apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social”.
2ª) A Recorrida, em conjunto com o seu marido, era sócia gerente da Sociedade “MLFJ, Lda”, que no final do ano de 2015, devido à redução da actividade, começou a atravessar graves dificuldades económico-financeiras, tendo os dois sócios gerentes deliberado a sua dissolução.
3ª) Após a dissolução da Sociedade, a Recorrida apresentou, a 12 de Julho de 2016, nos Serviços da Segurança Social de Lamego, o requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
4ª) Entretanto, a 18 de Agosto de 2016, foi a Recorrida informada pela contabilidade que havia um lapso no pagamento das contribuições da Segurança Social da Sociedade, relativamente aos meses de Abril, Maio e Junho, todos do ano 2016, uma vez que apenas tinha sido paga parte das quantias, e não a totalidade, lapso que, no mesmo dia, como ficou provado documentalmente, foi regularizado, pois nunca foi pretensão falhar qualquer pagamento.
5ª) Porém, a 1 de setembro de 2016, a Recorrida foi notificada do indeferimento do seu requerimento de proteção no desemprego.
6ª) Na verdade a Sociedade nunca falhou com o pagamento das contribuições sociais, sendo que, apenas por lapso, pagou parte das contribuições dos meses de Abril, Maio e Junho, todos de 2016, tendo regularizado a situação logo que se apercebeu da situação.
7ª) E pagar mal, pois apenas estava paga uma parte, não é, nem pode ser, a mesma coisa que não pagar.
8ª) Aliás, a prova de que se tratou de um lapso, é que nunca a sociedade, nem a Recorrida, em momento algum, foram notificadas da existência de qualquer irregularidade no pagamento das contribuições sociais, tendo a situação sido imediatamente regularizada, com o alerta dado pela sua contabilidade.
9ª) Veio agora, em sede de recurso, o Recorrente dizer que os seus serviços “notificaram a A., através dos seus serviços de contabilidade, de que estavam por pagar contribuições relativas a declarações de remuneração enviadas.”
10ª) Ora é, s.m.o., inadmissível que o Recorrente entenda que notificou validamente a Recorrida nos moldes que refere.
11ª) Pois a contabilidade não tem legitimidade para ser notificada em nome de ninguém, pois se tal fosse possível, abrir-se-ia um precedente extremamente perigoso e violador de direitos intransmissíveis.
12ª) E, se assim não se entender, quem teria de ser notificada era a Sociedade e não a Recorrida, pois foram as suas contribuições que estavam pagas por metade.
13ª) É preciso não esquecer que não eram as contribuições referentes à Recorrida, que estava mal pagas, e sim as contribuições da Sociedade que só foram pagas em parte.
14ª) Por um lado temos Recorrida enquanto pessoa singular e, por outro, temos a Recorrida enquanto sócia gerente da Sociedade “MLFJ, Lda”.
15ª) O que aqui se discute é um direito da Recorrida enquanto pessoa singular, titular de direitos sociais constitucionalmente consagrados.
16ª) No nosso entender e s.m.o., esta decisão de indeferimento afecta, apenas e só, a Recorrida, enquanto pessoa singular, titular de direitos constitucionalmente consagrados, principalmente os direitos adquiridos, incluído direito social de proteção no desemprego.
17ª) É que a Recorrida sempre teve a sua situação contributiva regularizada, quem não teve a situação contributiva em dia, parcial e temporariamente, foi a sociedade.
18ª) A Recorrida, enquanto pessoa singular, dotada de personalidade jurídica e, por isso, detentora de direitos sociais, com o indeferimento da proteção no desemprego, fica prejudicada por factos que, apenas e só, dizem respeito à Sociedade.
19ª) A Sociedade enquanto pessoa colectiva dotada de personalidade jurídica é a única e exclusiva responsável pelos seus actos e omissões, pelo que nunca a Recorrida poderá ser prejudicada pelos actos ou omissões que aquela praticou, pois, como já se disse, a situação contributiva da Recorrida sempre esteve regularizada.
20ª) Na verdade, o fundamento do indeferimento é relativo a um facto imputável, exclusivamente, à Sociedade, mas que lesa, apenas e só, os direitos sociais constitucionalmente consagrados da Recorrida, designadamente o direito fundamental à segurança social e solidariedade, previsto no art. 63º da Constituição da República Portuguesa, bem como o direito ao desemprego, previsto no art. 59º, n.º1, al. e) do mesmo dispositivo legal.
21ª) Mas não só, tal indeferimento viola também o mais elementar dos direitos fundamentais dos cidadãos, que é o princípio dos direitos adquiridos, uma vez que, à data da dissolução da sociedade, a Recorrida enquanto pessoa singular, já há muito reunia todas as condições legais necessárias para beneficiar da prestação que requereu.
22ª) A Recorrida enquanto pessoa singular titular do direito fundamental à segurança social e solidariedade e também do direito ao desemprego, não se conforma que, por factos que não lhe dizem respeito, e sem que tenha contribuído para eles, o seu requerimento de proteção no desemprego lhe seja indeferido, pois assim sendo estaremos perante uma clara violação do princípio dos direitos adquiridos.
23ª) Reforçando sempre a ideia de que as contribuições não estavam em falta, mas apenas pagas parcialmente, sendo que o pagamento integral foi feito voluntariamente mesmo antes de qualquer notificação da Segurança Social.
24ª) Pelo que, no nosso entender, esteve irrepreensível o Tribunal “a quo” quando julgou procedente a ação, anulando o acto de indeferimento do requerimento da proteção no desemprego da Recorrida, condenando o Recorrente a praticar os actos necessários que defiram a pretensão da Recorrida, com as devidas consequências legais.
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Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso com revogação da sentença recorrida, nos seguintes termos:
«Alega o recorrente que a decisão recorrida “incorre em erro de julgamento, por errada interpretação dos factos e do direito aplicável e, em consequência, em falta de fundamentação de facto e de direito e, por fim, em violação de lei”.
Entende a recorrente há factos que foram incorrectamente julgados e cuja relevância, em articulação uns com os outros, é determinante para a boa decisão da causa e para a descoberta da verdade material. Pelo que, ao contrário do mencionado na douta sentença, não foram objecto de suficiente e maturada análise concreta, a saber, os factos dados como provados sob os n.ºs 1), 7), 9), 10), 11), 12) e 15).
Alinhamos com a argumentação da recorrente quanto à alteração da matéria de facto a operar pelo TCAN, tendo em conta os elementos constantes do Processo Administrativo.
Assim, resulta claramente dos autos que, à data cessação da actividade, a situação contributiva da empresa não estava regularizada perante a segurança social. Tal regularização só ocorreu em 18 de Agosto de 2006.
E este facto é determinante para a decisão da causa.
Com efeito, data relevante para aferir se estão ou não reunidas as condições de atribuição do subsídio de desemprego, é a da cessação da actividade, conforme se determina no artigo 5.º do DL nº 12/2013 de 25 de Janeiro, ao estabelecer que é reconhecida aos beneficiários a titularidade do direito aos subsídios previstos no artigo 4.° desde que “reúnam as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade”.
Sendo que, a data da cessação da actividade é considerada pelo mesmo dispositivo legal “o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária”- cfr. o artigo 8.
Deste modo, sendo uma das condições cumulativas, para a atribuição dos subsídios previstos no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 12/2013, de 25 de Janeiro, a situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa [al. c)], não estavam reunidas as condições para a recorrida beneficiar da atribuição das requeridas prestações de desemprego
Sendo que dele notificadas as partes, veio a recorrida responder, manifestando a sua discordância, pugnando dever ser negado provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida.
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Após redistribuição (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelo recorrente as conclusões de recurso, as questões essenciais a decidir são:
- saber se a sentença recorrida padece das causas de nulidade previstas no artigo 615º nº 1 alíneas b), c) e d) do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA, imputadas pelo recorrente;
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto, nos termos propugnados pelo recorrente;
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à solução jurídica da causa, seja por errada subsunção dos factos ao direito, seja por errada interpretação e aplicação do quadro normativo convocado.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida no acórdão recorrido, ipsis verbis:
1) A Autora (A.) a 12 de Julho de 2016, junto dos Serviços da Segurança Social de Lamego, requereu a proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
2) No dia 19 de Agosto de 2016, a A. foi notificada do despacho da Segurança Social datado de 17 de Agosto de 2016, com a proposta de indeferimento, com o fundamento de não “apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social”, - cfr. doc. n.º1 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3) A A., em conjunto com o seu marido, Fernando Jorge da Conceição Pinto, era sócia gerente da Sociedade por quotas “MLFJ, Lda”, NIPC 5xxx93, registada na Conservatória do Registo Comercial de Lamego com a matricula n.º 503812293, com sede na Senhora G…, em M…, Lamego, e NISS 11xxx23,
4) A sociedade exerceu a sua actividade desde o início do ano de 1997, até ao ano de 2016.
5) Os dois sócios gerentes reuniram em assembleia geral extraordinária, a 31 de Maio de 2016, onde deliberaram unanimemente, “dissolver a sociedade por manifesta incapacidade económica e financeira para manter o objeto social e que entra de imediato em liquidação.”, deliberando ainda “Que o processo de liquidação esteja terminado no prazo máximo de dois meses.” – cfr. acta n.º 22 que se junta sob doc. n.º 2 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
6) Assim, em 31 de Junho de 2016, os dois sócios gerente reuniram nova assembleia geral extraordinária, e deliberaram por unanimidade a “Dissolução e liquidação imediata da sociedade, por não existência de ativos e passivos.”- cfr. acta n.º 23 que se junta sob doc. n.º 3 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
7) Dissolução que ocorreu em 11 de Julho de 2016, data em que foi participada e devidamente registada na Conservatória do Registo Comercial de Lamego, com a inscrição n.º 4, AP 1/20160711 – cfr. doc. n.º 4 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
8) A participação e registo da dissolução da sociedade na Conservatória do Registo Comercial de Lamego, surtiu efeitos, igualmente, para cessação de IVA e IRC . cfr. doc. n.º 5 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
9) A Autora, após a dissolução da sociedade apresentou, a 12 de Julho de 2016, nos Serviços da Segurança Social de Lamego, o requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
10) Em 18 de Agosto de 2016, foi informada pela contabilidade que o pagamento das contribuições da Sociedade à Segurança Social, referentes aos meses de Abril, Maio e Junho todos do ano 2016, não estavam correctos, havia pago parte das quantias, e não a totalidade.
11) Por esse motivo, no mesmo dia, solicitou à contabilidade a emissão da respectiva guia de pagamento para proceder à regularização, e assim o fez de imediato - cfr.doc. n.º 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
12) No dia 19 de Agosto de 2016, a A. recebeu uma notificação da segurança social, referente ao requerimento de proteção no desemprego, onde é informada que tinha sido proposto o indeferimento por não apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social, se no prazo de 5 dias úteis não oferecesse resposta por escrito, com os elementos e meios de prova que pudessem impedir o indeferimento, aqui junto sob o doc. n.º1.
13) Em 19 de Agosto de 2016, a situação contributiva perante a Segurança Social já estava devidamente regularizada, pelo que a Requerente (Autora), em 24 de Agosto de 2016 respondeu e juntou os respectivos comprovativos de pagamento – cfr. doc. n.º 6.
14) Por despacho do Chefe de Equipa de Prestações de Desemprego, datado de 1 de setembro de 2016, viu o seu requerimento de proteção no desemprego ser indeferido, com o mesmo fundamento da proposta anteriormente notificada - cfr. doc. n.º 7 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
15) A sociedade sempre pagou, não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016 - cfr. doc. n.º 8 (certidão de não dívida) que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
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B – De direito
1. Da decisão recorrida
O Tribunal a quo, julgando a ação procedente anulou o ato impugnado, condenando o réu a praticar os atos necessários que defiram a pretensão da autora, com as devidas consequências legais.
Decisão que tendo por base a matéria de facto que foi dada como provada, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«Ora, a legislação aplicável à situação da A. é a constante do Decreto-Lei n.º 12/2013, de 25 de janeiro que estabeleceu, no âmbito do sistema providencial, o regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos trabalhadores independentes com atividade empresarial e dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas.
Nos termos do disposto no artigo 2.º “(…) é considerado desemprego toda a situação de perda de rendimentos decorrente de encerramento de empresa ou de cessação de atividade profissional de forma involuntária do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho e inscrito para emprego no centro de emprego.”
No artigo 5.º, é reconhecida aos beneficiários a titularidade do direito aos subsídios previstos no artigo 4.º daquele mesmo diploma legal, desde que “reúnam as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade”.
Sendo que, a data da cessação da atividade é considerada pelo mesmo dispositivo legal “o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária”- cfr. o artigo 8.º.
São condições legais cumulativas, para a atribuição dos subsídios previstos no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 12/2013, de 25 de janeiro, as seguintes:
a) Encerramento da empresa ou cessação da atividade profissional de forma involuntária;
b) Cumprimento do prazo de garantia;
c) Situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa;
d) Perda de rendimentos que determine a cessação de atividade;
e) Inscrição no centro de emprego da área de residência, para efeitos de emprego.
Ora, resulta da matéria provada que no seguimento da dissolução da Sociedade, a A. apresentou, a 12 de Julho de 2016, nos Serviços da Segurança Social de Lamego, o requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
Entretanto, a 18 de Agosto de 2016, foi a A. informada pela contabilidade que havia um lapso no pagamento das contribuições da Segurança Social da Sociedade, relativamente aos meses de Abril, Maio e Junho, todos do ano 2016, uma vez que apenas tinha sido paga parte das quantias, e não a totalidade - lapso que, no mesmo dia, foi regularizado.
Porém, em 1 de setembro de 2016, a A. foi notificada do indeferimento do seu pedido de proteção no desemprego, com o fundamento de que a situação contributiva não estava regularizada perante a Segurança Social.
Na verdade a Sociedade nunca falhou com o pagamento das contribuições sociais, sendo que, apenas por lapso, pagou parte das contribuições dos meses de Abril, Maio e Junho, todos de 2016, tendo regularizado a situação logo que se apercebeu do lapso e não tendo sido a segurança social a pedir a regularização.
Sendo que, nunca a sociedade, nem a A., em momento algum, foram notificadas da existência de qualquer irregularidade no pagamento das contribuições sociais, tendo a situação sido imediatamente regularizada, com o alerta dado pela sua contabilidade e mesmo antes de ter sido proferida a decisão de indeferimento.
Ora, dúvidas inexistem em como esta decisão de indeferimento afecta a A., enquanto pessoa singular, titular de direitos constitucionalmente consagrados, principalmente o dos direitos adquiridos, incluído nos direitos sociais.
É que a A. sempre teve a sua situação contributiva regularizada, quem não teve a situação contributiva em dia foi a sociedade, mas apenas parcialmente.
A A., enquanto pessoa singular, dotada de personalidade jurídica, e por isso detentora de direitos sociais, com o indeferimento da proteção no desemprego, fica prejudicada por factos que, apenas e só, dizem respeito à Sociedade, violando-se assim o princípio da justiça.
A Sociedade enquanto pessoa colectiva dotada de personalidade jurídica é a única e exclusiva responsável pelos seus actos e omissões, pelo que nunca a A. poderá ser prejudicada pelos actos ou omissões que aquela praticou.
A situação contributiva da A. sempre esteve regularizada e o fundamento do indeferimento é relativo a um facto imputável, exclusivamente, à Sociedade, mas que lesa, apenas e só, os direitos sociais constitucionalmente consagrados da A., designadamente, o direito fundamental à segurança social e solidariedade, previsto no art. 63º da Constituição da República Portuguesa, bem como o direito ao desemprego, previsto no art. 59º, n.º1, al. e) do mesmo dispositivo legal.
Mas não só, tal indeferimento viola também o mais elementar dos direitos fundamentais dos cidadãos, que é o princípio dos direitos adquiridos, uma vez que, à data da dissolução da sociedade, a A. enquanto pessoa singular, já há muito reunia todas as condições legais necessárias para beneficiar da prestação que requereu.
Como resulta dos autos, as contribuições em causa não estavam em falta, mas apenas pagas parcialmente, sendo que o pagamento integral foi feito voluntariamente mesmo antes de qualquer notificação da Segurança Social.
Assim sendo, deveria ter sido proferida decisão de deferimento do requerimento de proteção no desemprego da A., bem como os demais actos posteriores praticados pelo Instituto da Segurança Social, substituindo-se por outra decisão que defira a pretensão da A..»
2. Das invocadas nulidades da sentença
2.1 O recorrente invoca indistintamente, ao longo do seu recurso, padecer a sentença recorrida das causas de nulidade previstas no artigo 615º nº 1 alíneas b), c) e d) do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA - (vide designadamente conclusões D), BBB), CCC), DDD), EEE), LLL), MMM), OOO) E PPP) das alegações de recurso).
2.2 Mas como se verá essa alegação não procede, fazendo o recorrente confusão entre as situações que motivam a nulidade da sentença (nulidade decisória) e as que constituem erro de julgamento, seja de facto seja de direito.
2.3 Com efeito as situações de nulidade da sentença encontram-se legalmente tipificadas no artigo 615º nº 1 do CPC novo (Lei nº 41/2013), cuja enumeração é taxativa, que dispõe o seguinte: “É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”
2.4 Quanto à invocada falta de fundamentação da sentença recorrida comece por dizer-se que em sintonia com o comando constitucional inserto no artigo 205º nº 1 da CRP dispõe o artigo 154º nº 1 do CPC novo, que “…as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, e que nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do citado artigo 615º do CPC apenas ocorre nulidade da decisão quando ela não especifique os fundamentos de facto e de direito que a justificam.
Significa, isto, que só tal falta – da especificação dos fundamentos, de facto e de direito – constituirá causa de nulidade da sentença. E, como é consensual na Doutrina e na Jurisprudência, a falta de motivação (quer de facto quer de direito) suscetível de integrar a nulidade de sentença a que se reporta a citada alínea b) é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos (vide, entre outros, os Acórdãos do STA de 14/07/2008, Proc. n.º 510/08; de 03/12/2008, Proc. n.º 540/08; de 01/09/2010, Proc. n.º 653/10; de 07/12/2010, Proc. n.º 1075/09; de 02/03/2011, Proc. n.º 881/10; de 07/11/2012, Proc. n.º 1109/12; de 29/01/2014, Proc. n.º 1182/12; de 12/03/2014, Proc. n.º 1404/13, in, www.dgsi.pt/jsta).
2.5 A sentença recorrida explicita os respetivos fundamentos, quer de facto, através da enunciação dos que nela foram dados como provados, quer de direito, encontrando-se, assim, a decisão fundamentada.
Se o Tribunal a quo não selecionou corretamente os factos relevantes para a decisão ou não analisou corretamente a prova produzida ou se não fez uma correta subsunção dos factos ao direito, ou ainda se fez uma incorreta interpretação e/ou aplicação da lei, o que ocorrerá é erro de julgamento, não nulidade da sentença por falta de fundamentação.
2.6 Simultaneamente a fundamentação das decisões jurisdicionais, para além de visar persuadir os interessados sobre a correção da solução legal encontrada pelo Estado, através do seu órgão jurisdicional, tem como finalidade elucidar as partes sobre as razões por que não obtiveram ganho de causa, para as poderem impugnar perante o tribunal superior, desde que a sentença admita recurso, e também para este tribunal poder apreciar essas razoes no momento do julgamento.
2.7 Nessa decorrência a nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC novo tem como premissa a violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial.
Com efeito entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. De modo que se o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, tal oposição será causa de nulidade da sentença – vide a este respeito Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, Coimbra Editora; Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, págs. 689 ss; José Lebre de Freitas, in “Código de Processo civil Anotado”, 2º Vol., Coimbra Editora, 2001, pág. 670, e Luís Filipe Brites Lameiras, in, “Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil”, Almedina, 2009, pág. 36 ss..
2.8 Para que ocorra nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º tem que se estar perante um paradoxo ou incoerência de raciocínio, de modo que as premissas consideradas (fundamentos) não poderiam conduzir, de forma lógica, à conclusão (decisão) a que se chegou, mas a outra, oposta ou divergente.
2.9 Mas, como é bom de ver, não existe qualquer contraposição entre o decidido na sentença recorrida e os respetivos fundamentos nela externados, não ocorrendo por isso a invocada nulidade decisória.
2.10 Vejamos, por último, a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
2.11 A nulidade da sentença por omissão de pronúncia, está diretamente relacionada com o comando inserto na primeira parte do nº 2 do artigo 608º do CPC novo, de acordo com o qual o juiz “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada para a solução dada a outras”.
Tal nulidade serve assim de cominação ao desrespeito de tal dever e só ocorre quando o juiz não conheça de questões essenciais para dirimir a lide que as partes tenham submetido à sua apreciação, traduzidas no binómio pedido/causa de pedir e cujo conhecimento não esteja prejudicado pela decisão dada a outras (vide a este respeito, entre outros, os Acórdãos deste TCA de 11/02/2010, Proc. 05531/09 e de 09/07/2009, Proc. 03804/08, in, www.dgsi.pt/jtcas e o Acórdão do STA de 11/02/2009, Proc. 0217/08, in, www.dgsi.pt/jsta).
Trata-se, como diz Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221, do “corolário do princípio da disponibilidade objetiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º, 2.ª parte)” que “significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.”
2.12 Ora, decorre do teor da sentença recorrida que a Mmª Juíza do Tribunal a quo enfrentou o pedido impugnatório dirigido na ação à decisão administrativa que indeferiu o requerimento de proteção no desemprego da autora, apreciando os fundamentos da ação, e da defesa. Não se vendo qual o aspeto ou questão que tenha ficado por apreciar e o devesse ter sido, nem o recorrente tão pouco o identifica ou concretiza.
Pelo que tem também que concluir-se não ocorrer a invocada nulidade da sentença.
2.13 Improcede, pois, neste aspeto, o recurso, não ocorrendo qualquer das nulidades apontadas à sentença recorrida.
3. Do invocado erro de julgamento quanto à matéria de facto
3.1 O recorrente invoca também, de modo disseminado ao longo do seu recurso, existirem factos que foram incorretamente julgados, identificando-os como sendo esses os contidos nos pontos 1), 7), 9), 10), 11), 12) e 15) dos factos dados como provados na sentença recorrida – (vide designadamente, conclusões H), L), M), N), O), T), U), V), W), X) Y), Z) e CC)).
3.2 Os factos em causa foram elencados do seguinte modo na sentença recorrida:
1) A Autora (A.) a 12 de Julho de 2016, junto dos Serviços da Segurança Social de Lamego, requereu a proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
7) Dissolução que ocorreu em 11 de Julho de 2016, data em que foi participada e devidamente registada na Conservatória do Registo Comercial de Lamego, com a inscrição n.º 4, AP 1/20160711 – cfr. doc. n.º 4 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
9) A Autora, após a dissolução da sociedade apresentou, a 12 de Julho de 2016, nos Serviços da Segurança Social de Lamego, o requerimento de proteção no desemprego para membros de órgão estatutário.
10) Em 18 de Agosto de 2016, foi informada pela contabilidade que o pagamento das contribuições da Sociedade à Segurança Social, referentes aos meses de Abril, Maio e Junho todos do ano 2016, não estavam correctos, havia pago parte das quantias, e não a totalidade.
11) Por esse motivo, no mesmo dia, solicitou à contabilidade a emissão da respectiva guia de pagamento para proceder à regularização, e assim o fez de imediato - cfr.doc. n.º 6 que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
12) No dia 19 de Agosto de 2016, a A. recebeu uma notificação da segurança social, referente ao requerimento de proteção no desemprego, onde é informada que tinha sido proposto o indeferimento por não apresentar a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social, se no prazo de 5 dias úteis não oferecesse resposta por escrito, com os elementos e meios de prova que pudessem impedir o indeferimento, aqui junto sob o doc. n.º1.
15) A sociedade sempre pagou, não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016 - cfr. doc. n.º 8 (certidão de não dívida) que se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
3.3 Sustenta o recorrente que tais factos foram incorretamente julgados, sendo relevantes, quer "de per si", quer em articulação uns com os outros, para a boa decisão da causa e para a descoberta da verdade material e que ao contrário do mencionado na sentença recorrida não foram objeto de suficiente e maturada análise concreta.
3.4 Reportando-se ao facto dado como provado em 10) do probatório da sentença recorrida, o recorrente diz que constam do PA factos que contrariam a interpretação que a juíza a quo fez, os quais se reputam relevantes para o apuramento da verdade material e que demonstram que a outras conclusões e a outra decisão deveria a sentença ter chegado, e que assim identifica: i) a fls. 92 do PA consta um e-mail, datado de 09/08/2016, dirigido aos serviços do Recorrente, no qual se refere que «como a contabilidade tem obrigações fiscais para cumprir, não se conseguiu dissolver a empresa com efeitos imediatos, a dissolução tornou-se efetiva no dia 11 de Julho.»; ii) a fls. 91 do PA consta um e-mail dos serviços do Recorrente, datado de 11/08/2016, no qual se refere que «os MOE's - (...) tem que descontar 30 dias e pelo menos sobre o valor IAS (...). Deverá assim, proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas.»; iii) a fls. 91 do PA consta o e-mail de resposta aos serviços do Recorrente, datado de 18/08/2016, no qual se refere que «foram submetidos formulários vazios colocando as remunerações em falta nos meses de Abril, Maio e Junho. Assim, junto em anexo o documento que originou as contribuições a pagar, bem como os juros acrescidos e o pagamento dos montantes em falta.»; que destes documentos resulta que foram os serviços do Recorrente, pelo menos, em 11/08/2016, que notificaram a autora, através dos seus serviços de contabilidade, de que estavam por pagar contribuições relativas a declarações de remunerações enviadas e que assim não é verdade o que se afirma a fls. 10 da sentença, de que «(...) a Sociedade nunca falhou com o pagamento das contribuições sociais, (...) tendo regularizado a situação logo que se apercebeu do lapso e não tendo sido a segurança social a pedir a regularização.»; como não é verdade a afirmação de que «(...) nunca a sociedade, nem a A., em momento algum, foram notificadas da existência de qualquer irregularidade no pagamento das contribuições sociais, tendo a situação sido imediatamente regularizada, com o alerta dado pela sua contabilidade e mesmo antes de ter sido proferida a decisão de indeferimento» (cfr. fls. 10 da sentença); como ainda corresponde à verdade dos factos a afirmação feita a fls. 11 da sentença de que «Como resulta dos autos, as contribuições em causa não estavam em falta, mas apenas pagas parcialmente, sendo que o pagamento integral foi feito voluntariamente mesmo antes de qualquer notificação da Segurança Social.» - (vide, designadamente, conclusões U), V), W), X) Y) e Z) das suas alegações de recurso).
3.5 E referindo-se ao facto dado como provado em 15) do probatório da sentença recorrida, o recorrente diz que a Mmª Juíza a quo não podia ter considerado como facto provado que «A sociedade sempre pagou não existindo qualquer valor em dívida, em 14/10/2016», por se tratar de uma conclusão que a mesmo retira de um documento; que de todo o modo nem sequer se pode retirar essa conclusão do documento invocado (isto é, o Doc. n.° 8 junto com a PI) por desse documento (certidão de não dívida) só se pode considerar provado, conforme resulta do próprio, que à data de 14/10/2016 «(...) a entidade contribuinte acima identificada (MLFJ LD) tem a sua situação contributiva regularizada perante a Segurança Social.»; que esse mesmo documento (Doc. nº 8 junto com a PI) refere que «A presente declaração não constitui instrumento de quitação de dívida de contribuições e ou juros de mora, nem prejudica ulteriores apuramentos (…)», ou seja, a regularização de dívidas à segurança social não significa uma situação de não dívida; e que uma situação contributiva regularizada perante a Segurança Social não é sinónimo de não dívida, a qual, ainda assim, pode existir; que de todo o modo o facto elencado sob o ponto 15) não é relevante para a situação controvertida nos autos, tendo como referência a data indicada de 14/10/2016, por na verdade o que é relevante para a boa decisão da causa é a verificação ou não do preenchimento das condições legalmente estipuladas para a atribuição do requerido subsídio de desemprego à data da cessação da atividade, e não outra qualquer data, conforme se estabelece na legislação aplicável (vide, designadamente, conclusões M), N), O) e P) das suas alegações de recurso).
3.6 Propugnando o recorrente que, assim, e sendo a data relevante para aferir de que estavam ou não reunidas as condições de atribuição do subsídio de desemprego a da cessação da atividade, nos termos do diploma legal aplicável, dever-se-iam ter fixado como factos provados para a boa decisão da causa, os seguintes - (vide conclusão CC) e DD) das suas alegações de recurso):
- à data da cessação da atividade, isto é, em 12/07/2016 - "o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de ,forma involuntária", nos termos do artigo 8.º do decreto-lei aplicável - que é a mesma do requerimento para proteção no desemprego da A., ora Recorrida, na qualidade de MOE - , a situação contributiva da empresa não estava regularizada perante a segurança social;
- a situação contributiva da empresa só foi regularizada em 18/08/2016;
- apesar dos serviços da segurança social terem, pelo menos, em 11/08/2016, notificado os serviços de contabilidade da, então, A. de que teriam que proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas.
3.7 Cientes de que a modificação da decisão da matéria de facto em sede de recurso está dependente da iniciativa da parte interessada e deve limitar-se aos pontos de facto especificamente indicados, com observância dos respetivos requisitos formais (cfr. artigo 640º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA), comece por dizer-se que muito embora o recorrente tenha indicado no seu recurso terem sido incorretamente julgados os factos contidos nos pontos 1), 7), 9), 10), 11), 12) e 15) no probatório da sentença recorrida, a verdade é que não procede a uma verdadeira e operante impugnação da matéria de facto dada como provada sob os pontos 1), 7), 9), 11) e 12) do probatório da sentença recorrida, mas apenas o que nele foi dado como provado sob os pontos 10) e 15).
3.8 Pelo que é apenas por referência a estes identificados dois pontos do probatório da sentença recorrida – a saber, os pontos 10) e 15) do probatório – que importa aferir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto em termos que em substituição do assim ali vertido devia, ao invés, ter sido dado como provada a factualidade que o recorrente agora enuncia, em termos que deva proceder-se à modificação do julgamento quanto àquela matéria de facto nos termos propugnados pelo recorrente.
3.9 No que respeita ao ponto 10) do probatório da sentença recorrida, diga-se que a argumentação esgrimida pelo recorrente neste desiderato respeita não só à correção dos termos em que o circunstancialismo factual que havia sido alegado pela autora na petição inicial da ação (vide artigos 17º, 18º e 19º da PI) foi dada como provado na sentença (vide pontos 10) e 11) do probatório), mas também às ilações e efeitos jurídicos a que, a partir dele, chegou a sentença recorrida.
3.10 Significando, assim, que o recorrente se insurge não só quanto à solução jurídica dada pela sentença, mas também, e ao mesmo tempo, ao acolhimento feito na sentença recorrida da versão que a autora havia apresentado na sua petição inicial quanto ao contexto factual que motivou o pagamento de contribuições referentes aos meses de Abril, Maio e Junho daquele ano de 2016 efetuado em 18/08/2019.
3.11 O recorrente alega que decorre dos identificados documentos, constantes do Processo Administrativo, que foram os serviços da Segurança Social que, pelo menos em 11/08/2016, notificaram a autora, através dos seus serviços de contabilidade, de que estavam por pagar contribuições relativas a declarações de remunerações enviadas.
3.12 E impõe-se efetivamente, que seja aditada a realidade factual revelada pelos documentos constantes do Processo Administrativo, que foi oportunamente remetido e apenso aos autos, do que a autora foi devida e oportunamente notificada (cfr. fls. 48 SITAF), mas já não, obviamente, qualquer conclusão jurídica a que seja de chegar, por ela comportar já um julgamento de direito a fazer à luz do quadro normativo aplicável.
Bem como, simultaneamente, clarificar e objetivar a redação do probatório, apropriando-se o Tribunal da realidade factual, depuradas conclusões jurídicas.
3.13 Mas isso não implica que não deva manter-se como provado o que consta do ponto 10) do probatório, mas apenas aditar à factualidade provada que os serviços da Segurança Social enviaram em 11/08/2016 uma comunicação por correio eletrónico aos serviços de contabilidade da sociedade da autora da autora no qual se refere que «os MOE's - (...) tem que descontar 30 dias e pelo menos sobre o valor IAS (...). Deverá assim, proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas» (cfr. fls. 91 do PA).
Isto porque não é há aí qualquer contradição entre tais factos, permitindo estes a possibilidade de contextualizar a circunstância em que ocorreu a emissão da guia e o pagamento efetuado em 18/08/2019, conforme Doc. nº 6 que foi junto pela autora com a sua Petição Inicial e a que se refere o ponto 11) do probatório.
3.14 E no que respeita ao ponto 15) do probatório haverá apenas que expurgar a menção «…sociedade sempre pagou…» que dele consta, na medida em que do documento em que se suporta (a certidão junta sob Doc. nº 8 com a Petição Inicial) apenas se poder retirar que à data (14/10/2016), a sociedade não tinha qualquer valor em dívida à Segurança Social.
Pelo que o ponto 15) do probatório deve ser mantido apenas com a afirmação do facto, que aquele documento, de que em 14/10/2016 a sociedade não tinha qualquer valor em dívida à Segurança Social.
3.15 É, pois, nesta medida, e por estas razões, que deve proceder-se às seguintes modificação do julgamento da matéria de facto feito pelo Tribunal a quo:
i) expurga-se ao ponto 15) do probatório a menção «…a sociedade sempre pagou…» que dele consta, passando a sua redação a ser a seguinte:
15) Em 14/10/2016 não existia qualquer valor em dívida da sociedade à Segurança Social - cfr. certidão junta sob Doc. n.º 8 com a Petição Inicial.
ii) adita-se o seguinte ponto 16) ao probatório:
16) Os serviços da Segurança Social enviaram em 11/08/2016 uma comunicação por correio eletrónico aos serviços de contabilidade da sociedade, na qual se refere: «os MOE's - (...) tem que descontar 30 dias e pelo menos sobre o valor IAS (...). Deverá assim, proceder à regularização das declarações de remunerações enviadas» - cfr. fls. 91 do PA.
4. Do invocado erro de julgamento quanto à solução jurídica da causa
4.1 Na situação dos autos está em causa a decisão de indeferimento que recaiu sobre o requerimento da autora com vista à atribuição de prestações por desemprego enquanto membro de órgão estatutário.
Atentemos, pois, antes do mais, no enquadramento normativo convocado.
4.2 É o DL. nº 12/2013, de 25 de janeiro, estabelece o regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração (cfr. artigos 1º e 3º nº 1 alínea b)).
Nele é caracterizada a eventualidade de desemprego como “…toda a situação de perda de rendimentos decorrente de encerramento de empresa ou de cessação de atividade profissional de forma involuntária do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho e inscrito para emprego no centro de emprego” (artigo 2º), efetivando-se a proteção social mediante a atribuição do “…subsídio por cessação de atividade profissional e do subsídio parcial por cessação de atividade profissional, que visam compensar a perda de rendimentos dos trabalhadores independentes com atividade empresarial, bem como dos gerentes e dos administradores das pessoas coletivas, em consequência da cessação de atividade profissional por motivos justificados que determinam o encerramento da empresa” (artigo 4º).
Nos termos do disposto no artigo 5º daquele diploma titularidade do direito àquelas prestações por desemprego é reconhecida “…aos beneficiários que integram o âmbito pessoal do presente diploma que reúnam as respetivas condições de atribuição à data da cessação da atividade e residam em território nacional”, considerando-se como data da cessação de atividade “…o dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária” (cfr. artigo 8º).
São condições de atribuição das prestações por desemprego, de preenchimento cumulativo, as seguintes, assim enunciadas no nº 1 do artigo 7º:
a) Encerramento da empresa ou cessação da atividade profissional de forma involuntária;
b) Cumprimento do prazo de garantia;
c) Situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa;
d) Perda de rendimentos que determine a cessação de atividade;
e) Inscrição no centro de emprego da área de residência, para efeitos de emprego”.
Sendo que na situação de encerramento da empresa, a que se refere a alínea a) do nº 1 do artigo 7º, os membros dos órgãos estatutários devem ainda comprovar a cessação do respetivo enquadramento, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 70.º do Código dos Regimes Contributivos. E que nos termos do artigo 6º nº 1 se considera involuntário o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional sempre que o mesmo decorra de “…redução significativa do volume de negócios que determine o encerramento da empresa ou a cessação da atividade para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado” (artigo 6º º 1 alínea a)); de “…sentença de declaração da insolvência nas situações em que seja determinada a cessação da atividade dos gerentes ou administradores ou em que o processo de insolvência culmine com o encerramento total e definitivo da empresa”, desde que desde que a insolvência não tenha sido qualificada como culposa em consequência de atuação dolosa ou com culpa grave dos gerentes ou administradores (cfr. artigo 6º nº 1 alínea b) e nº 2); de 2…ocorrência de motivos económicos, técnicos, produtivos e organizativos que inviabilizem a continuação da atividade económica ou profissional” (artigo 6º º 1 alínea c)); de “…motivos de força maior determinante da cessação da atividade económica ou profissional” (artigo 6º º 1 alínea d)) ou de “…perda de licença administrativa sempre que esta seja exigida para o exercício da atividade e desde que essa perda não seja motivada por incumprimentos contratuais ou pela prática de infração administrativa ou delito imputável ao próprio” (artigo 6º º 1 alínea d)).
A eventualidade que dá origem à proteção social de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração nos termos do DL. nº 12/2013, de 25 de janeiro, é, pois, o encerramento da empresa ou cessação da atividade profissional de forma involuntária (cfr. artigos 2º, 6º e 7º). Razão pela qual o prazo de 90 dias a partir do qual deve ser apresentado o requerimento para atribuição das respetivas prestações por desemprego se conta a partir da data do encerramento da empresa ou da cessação da atividade profissional (cfr. artigo 12º nº 1), e razão pela qual também deve ser acompanhado dos respetivos elementos instrutórios comprovativos “… da involuntariedade do encerramento da empresa ou da cessação da atividade profissional e da data a que se reporta, em modelo próprio” (cfr. artigos 12º e 13º nº 1).
4.3 Do regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração constante do DL. nº 12/2013, de 25 de janeiro, supra percorrido, resulta desde logo clara uma primeira conclusão: a de que a aferição sobre a verificação das condições de atribuição das prestações por desemprego ali previstas, de natureza cumulativa, haverá de fazer-se por referência à data da cessação da atividade, correspondendo esta ao dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária, como resulta das disposições conjugadas dos artigos 5º e 8º do DL. nº 12/2013.
Entre as condições exigidas para a atribuição das prestações por desemprego constantes no nº 1 do artigo 7º do DL. nº 12/2013 é enunciada sob a alínea c) a “situação contributiva regularizada perante a segurança social, do próprio e da empresa”.
Tal significa que o preenchimento do requisito «situação contributiva regularizada» exigido pela alínea c) do nº 1 do artigo 7º do DL. nº 12/2013 se haverá de reportar, como condição para o acesso às prestações por desemprego reguladas neste diploma, à data da cessação da atividade, correspondendo esta ao dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da empresa ou a cessação da atividade profissional de forma involuntária.
4.4 Perante o que se acaba se ver tem que reconhecer-se razão ao recorrente quando sustenta que na situação dos autos a data relevante para a verificação, ou não, do preenchimento das condições para atribuição do requerido subsídio de desemprego, era a de 12/07/2016 (dia imediatamente subsequente àquele em que se verificou o encerramento da sociedade), data em que a autora deveria ter reunido as respetivas condições, e não qualquer momento posterior (vide, designadamente, conclusões S), T), AA), GG) e II) das alegações de recurso).
4.5 Resta, então, saber se se encontrava verificado, ou não, àquela data (12/07/2016) o requisito da «situação contributiva regularizada» a que se reporta a alínea c) do nº 1 do artigo 7º do DL. nº 12/2013.
4.6 A decisão administrativa de indeferimento do subsídio de desemprego requerido pela autora assentou, na consideração de que tal não se verificava, como resulta da respetiva fundamentação (cfr. 12) do probatório):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
4.7 A sentença recorrida, aderindo à argumentação aduzida pela autora na ação, entendeu que «…a Sociedade nunca falhou com o pagamento das contribuições sociais, sendo que, apenas por lapso, pagou parte das contribuições dos meses de Abril, Maio e Junho, todos de 2016, tendo regularizado a situação logo que se apercebeu do lapso e não tendo sido a segurança social a pedir a regularização», que «…nunca a sociedade, nem a A., em momento algum, foram notificadas da existência de qualquer irregularidade no pagamento das contribuições sociais, tendo a situação sido imediatamente regularizada, com o alerta dado pela sua contabilidade e mesmo antes de ter sido proferida a decisão de indeferimento»; que esta decisão de indeferimento «…afeta a A., enquanto pessoa singular, titular de direitos constitucionalmente consagrados, principalmente o dos direitos adquiridos, incluído nos direitos sociais» porque «…a A. sempre teve a sua situação contributiva regularizada, quem não teve a situação contributiva em dia foi a sociedade, mas apenas parcialmente»; que «…a A., enquanto pessoa singular, dotada de personalidade jurídica, e por isso detentora de direitos sociais, com o indeferimento da proteção no desemprego, fica prejudicada por factos que, apenas e só, dizem respeito à Sociedade, violando-se assim o princípio da justiça»; que «…a Sociedade enquanto pessoa coletiva dotada de personalidade jurídica é a única e exclusiva responsável pelos seus atos e omissões» e que assim «…nunca a A. poderá ser prejudicada pelos atos ou omissões que aquela praticou»; que «…a situação contributiva da A. sempre esteve regularizada» sendo «…o fundamento do indeferimento é relativo a um facto imputável, exclusivamente, à Sociedade, mas que lesa, apenas e só, os direitos sociais constitucionalmente consagrados da A.» e que assim a decisão de indeferimento «…viola também o mais elementar dos direitos fundamentais dos cidadãos, que é o princípio dos direitos adquiridos, uma vez que, à data da dissolução da sociedade, a A. enquanto pessoa singular, já há muito reunia todas as condições legais necessárias para beneficiar da prestação que requereu»; que «…as contribuições em causa não estavam em falta, mas apenas pagas parcialmente, sendo que o pagamento integral foi feito voluntariamente mesmo antes de qualquer notificação da Segurança Social» e que assim «…deveria ter sido proferida decisão de deferimento do requerimento de proteção no desemprego da A.».
4.8 Ora, como é bom de ver, o assim entendido na sentença recorrida não pode ser mantido.
4.9 Neste aspeto há que fazer apelo ao quadro normativo constante do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro.
4.10 Nos termos do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei n.º 110/2009) a obrigação contributiva tem por objeto “…o pagamento regular de contribuições e de quotizações por parte das pessoas singulares e coletivas que se relacionam com o sistema previdencial de segurança social”, sendo as «contribuições» da responsabilidade das entidades empregadoras, dos trabalhadores independentes, das entidades contratantes e dos beneficiários do seguro social voluntário, consoante os casos e as «quotizações» da responsabilidade dos trabalhadores, nos termos previstos no Código, destinando-se umas e outras (as contribuições e as quotizações) ao financiamento do sistema previdencial, que tem por base uma relação sinalagmática direta entre a obrigação legal de contribuir e o direito às prestações (cfr. artigo 11º nºs 1, 2 e 3).
Nos termos do disposto no artigo 61º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei n.º 110/2009), são obrigatoriamente abrangidos pelo regime geral, na qualidade de beneficiários, os membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas e entidades equiparadas, ainda que sejam seus sócios ou membros, com as especificidades ali previstas, entendendo-se designadamente como membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas ou equiparadas (cfr. artigo 62º):
a) os administradores, diretores e gerentes das sociedades e das cooperativas;
b) os administradores de pessoas coletivas gestoras ou administradoras de outras pessoas coletivas, quando contratados a título de mandato para aí exercerem funções de administração, desde que a responsabilidade pelo pagamento das respetivas remunerações seja assumida pela entidade administrada;
c) os gestores de empresas públicas ou de outras pessoas coletivas, qualquer que seja o fim prosseguido, que não se encontrem obrigatoriamente abrangidos pelo regime de proteção social convergente dos trabalhadores em funções públicas e que não tenham optado, nos termos legais, por diferente regime de proteção social de inscrição obrigatória;
d) os membros dos órgãos internos de fiscalização das pessoas coletivas, qualquer que seja o fim prosseguido, que não se encontrem obrigatoriamente abrangidos pelo regime de proteção social convergente dos trabalhadores em funções públicas e que não tenham optado, nos termos legais, por diferente regime de proteção social de inscrição obrigatória; (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)
e) os membros dos demais órgãos estatutários das pessoas coletivas, qualquer que seja o fim prosseguido, que não se encontrem obrigatoriamente abrangidos pelo regime de proteção social convergente dos trabalhadores em funções públicas e que não tenham optado, nos termos legais, por diferente regime de proteção social de inscrição obrigatória. (Redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro).
4.11 Ali é, desde logo, reconhecido que os membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas e entidades equiparadas “…têm direito à proteção nas eventualidades de doença, parentalidade, doenças profissionais, invalidez, velhice e morte” (cfr. artigo 65º nº 1).
4.12 Todavia, o direito à proteção na eventualidade de desemprego, é reconhecido apenas ao “…membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração” nos termos de legislação própria (cfr. artigo 65º nº 2).
O que nos remete, na situação dos autos, para o regime jurídico de proteção social na eventualidade de desemprego dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas que exerçam funções de gerência ou de administração constante do DL. nº 12/2013, de 25 de janeiro, já supra percorrido.
4.13 O Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei n.º 110/2009), estabelece a base de incidência contributiva dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas e entidades equiparadas, que faz corresponder “…ao valor das remunerações efetivamente auferidas em cada uma das pessoas coletivas em que exerçam atividade, com o limite mínimo igual ao valor do IAS” (cfr. artigo 66º nº 1) e as respetivas taxas contributivas, para as entidades empregadoras e para os trabalhadores (cfr. artigo 69º nº 2).
4.14 O montante a pagar, seja pelas contribuições (a cargo da entidade empregadora ou equiparada) seja pelas quotizações (a cargo dos trabalhadores, ou, como no caso, pelos membros dos órgãos estatutários) é determinado pela aplicação da taxa contributiva às remunerações que constituem base de incidência contributiva, como resulta, aliás, do artigo 13º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei n.º 110/2009), que expressamente dispõe que “…o montante das contribuições e das quotizações é determinado pela aplicação da taxa contributiva às remunerações que constituem base de incidência contributiva, nos termos previstos no presente Código”.
4.15 É à entidade empregadora (ou equiparada) que cumpre entregar, mensalmente, à Segurança Social as declarações de remunerações procedendo simultaneamente à autoliquidação das contribuições e das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço, e ao seu pagamento, porque são responsáveis, descontando nas remunerações dos trabalhadores ao seu serviço o valor das quotizações por estes devidas e remetem-no, juntamente com o da sua própria contribuição, à instituição de segurança social competente (cfr. artigos 40º, 41º, 42º e 43º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social).
4.16 O apuramento dos montantes a pagar, seja a título de contribuições (a cargo da entidade patronal) seja a título de quotizações (a cargo do trabalhador, e assim descontada na respetiva remuneração), é, pois, feito pela entidade patronal.
4.17 Se esse apuramento é feito incorretamente, sendo pagos montantes inferiores aos que eram devidos nos termos da lei, ocorre situação de incumprimento de obrigação contributiva.
E não é necessário que exista um ato administrativo ou tributário prévio definidor da situação de obrigação, não é legalmente imposta a notificação de qualquer ato declarativo ou certificativo da situação de incumprimento da obrigação contributiva. Posto é que ela exista e não tenha sido oportunamente liquidada e paga.
A este propósito vide, entre outros:
- o acórdão do STA de 06/02/2014, Proc. nº 01481/13, in, www.dgsi.pt/jsta, onde, entre o demais, se sumariou: «I - Por norma as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar, aplicando as percentagens legais às remunerações, numa figura próxima da autoliquidação. (…)»;
- o acórdão do TCA Sul de 28/09/2017, Proc. nº 235/13.6BEFUN, disponível in, www.dgsi.pt/jtca, onde, entre o demais, se sumariou: «1) Por regra, as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar (mediante aplicação das percentagens fixadas na lei sobre as remunerações). (…); 3) Competem à entidade empregadora as obrigações de declaração de remunerações dos trabalhadores a seu cargo, de registo e de liquidação das correspondentes contribuições, bem como o pagamento das contribuições e quotizações dos trabalhadores ao seu serviço. (…)»;
- o acórdão deste TCA Norte de 27/03/2014, Proc. nº 00551/12.4BEBRG, disponível in, www.dgsi.pt/jtcn, em que se sumariou entre o demais que «I) Por norma as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar, aplicando as percentagens legais às remunerações, numa figura próxima da autoliquidação.(…)».
4.18 Na situação dos autos resulta que relativamente aos meses de abril, maio e junho, todos do ano 2016, não foram liquidados pela sociedade os montantes devidos, tendo sido apuradas e pagas quantias inferiores, o que foi posteriormente regularizado em 18/08/2016, data em que a sociedade, procedeu ao pagamento de um total de 571,74€ referente a contribuições e quotizações respeitantes aos meses de abril, maio e junho do ano de 2016 e respetivos juros de mora (vertidos no Doc. nº 6 junto com a PI) corrigindo os valores anteriormente declarados, apurados e pagos (vide 10), 11) e 16) do probatório).
4.19 Neste circunstancialismo, não pode proceder a tese da autora, ora recorrida.
Não tendo sido oportunamente autoliquidados e pagos os montantes de contribuições e quotizações que eram os legalmente devidos, relativamente aos identificados meses de abril, maio e junho, o que autora não põe aliás em causa, tem que reconhecer-se que à data de 12/07/2016 (data em que a autora deveria ter reunido as condições para a atribuição das prestações por desemprego), a situação contributiva perante a segurança social não se encontrava regularizada, precisamente por os pagamentos e descontos que tinham sido efetuados o terem sido em montantes inferiores aos legalmente devidos, não estando assim verificada a condição exigida na alínea c) do nº 1 do artigo 7º do DL. nº 12/2013.
4.20 E não se vê, também, como possa colher o argumento de que tal entendimento conduz a que a autora seja prejudicada por erro que não lhe é imputável, mas à sociedade.
Por um lado, e desde logo, a entidade administrativa estava sujeita e vinculada aos pressupostos de atuação definitos na lei (cfr. artigo 3º do CPA). E não se verifica, nos termos sobre vistos, que tenha incorrido, ao proferir a decisão administrativa de indeferimento em erro nos pressupostos, seja de facto seja de direito.
Por outro lado, a autora, requerente da atribuição de prestações sociais por desemprego enquanto membro de órgão estatutário, era sócia-gerente da identificada sociedade, pelo que não se vê como possa entender-se, como se fez na sentença recorrida, que a sociedade «é a única e exclusiva responsável pelos seus atos e omissões» e que assim «…nunca a A. poderá ser prejudicada pelos atos ou omissões que aquela praticou».
4.21 Aqui chegados, tem que concluir-se pela procedência do recurso, devendo a sentença recorrida ser revogada, por erro de julgamento no que tange à interpretação e aplicação do direito e respetiva subsunção factual, não podendo, assim, manter-se a solução jurídica que deu à causa através da procedência da ação, a qual deve, ao invés, ser julgada improcedente, com manutenção da decisão administrativa impugnada.
O que se decide.
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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, e julgando-se, pelos fundamentos expostos supra, improcedente a ação.
Custas pela recorrida, sem prejuízo do apoio judiciário que demonstre beneficiar - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo, artigos 7º e 12º nº 2 do RCP e artigo 189º nº 2 do CPTA.
Notifique.
D.N.
Porto, 28 de junho de 2019
Ass. Helena Canelas
Ass. Isabel Costa
Ass. João Beato