Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01610/10.3BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/25/2018
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Barbara Tavares Teles
Descritores:EMBARGOS DE TERCEIRO
CONDENAÇÃO EM CUSTAS
Sumário:1. As situações em que se entende que o Reu não deu causa à acção estão definidas no supra citado artigo 449º nº 2 do CPC e são, a saber, a) Quando o autor se proponha exercer um mero direito potestativo, que não tenha origem em qualquer facto ilícito praticado pelo réu;
2. No caso em concreto verifica-se que a Fazenda Publica, praticou um acto ilícito quanto efectuou uma penhora ilegal assim como reconhece que o Recorrido era, à data da penhora, o dono e legítimo possuidor do veículo automóvel penhorado, e que a penhora efectuada ofendeu a sua posse e propriedade. A Fazenda Publica deu efectivamente causa à acção, independentemente da eventual actuação negligente do Recorrido ao não proceder à alteração a seu favor do registo de propriedade sobre o bem.
3. Por sua vez o Embargante, embora não tenha efectuado atempadamente o respectivo registo limitou-se, perante tal penhora, a exercer um direito que a lei lhe confere para demonstrar que efectivamente era à data da diligência o proprietário do bem penhorado. Utilizou para tanto o meio processual adequado e único legalmente previsto para reagir a um acto de penhora que ofendia a sua posse e propriedade.
4. Face à taxatividade legal dos casos em que se considera que o Reu não deu causa à acção – os mencionados no citado art. 449º nº 2 do CPC – deve entender-se que a situação descrita nos autos não se enquadra em nenhuma das hipóteses contempladas no predito normativo legal. Consequentemente, será ilegal de excluir a FP da responsabilidade pelo pagamento das custas, já que decaiu na acção.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:M... e A...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
A Fazenda Publica, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, na parte em que condenou a Recorrente em custas, veio dela veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES:
1.ª – Salvo melhor opinião, atenta a matéria de facto que, pelo presente recurso, se espera venha a ser dada como provada, a FP não podia ser condenada no pagamento das custas processuais, ao abrigo do artigo 449º, nº1 e nº2, alínea a), ambos do CPC (Código Processo Civil).
2.ª – São requisitos de cuja verificação cumulativa depende a condenação do autor, aqui recorrido, no pagamento de custas processuais, os seguintes: (i) que o réu não tenha contestado a acção e (ii) que o réu não tenha dado causa à acção – cfr. artigo 449º, nº1 e nº2, alínea a), ambos do CPC.

3.ª – Quanto ao requisito supra enunciado em primeiro lugar, a FP não contestou os embargos de terceiro dos presentes autos – aliás, da parte introdutória da douta decisão em recurso consta não só que a FP não contestou, mas também que realizada que foi diligência de inquirição de testemunhas, a FP não ofereceu alegações.

4.ª – Quanto ao requisito supra enunciado em segundo lugar, nos casos em que o autor se propõe a exercer um mero direito potestativo que não tenha origem em qualquer acto ilícito praticado pelo réu, entendeu o legislador que o réu não deu causa à acção – cfr. alínea a), do nº2, do artigo 449º, do CPC.

5.ª – No caso concreto dos autos, o requerente dos embargos de terceiro (autor) exerceu um direito potestativo e a FP nunca praticou qualquer acto ilícito.

6.ª – Os factos dados como provados na douta decisão em recurso demonstram o exercício de um direito potestativo por parte do recorrido – designadamente, ponto 1 a 4 e ponto 6 dos factos provados daquela decisão

7.ª – Os factos do processo de execução fiscal demonstram que a FP não praticou qualquer facto ilícito, saber:

a) Os embargos de terceiros dos presentes autos foram apresentados na sequência de notificação remetida em 16.07.2010 que se encontra a fls. 41 dos presentes autos;
b) Pela notificação de fls 41, o recorrido foi, em síntese: (i) informado de que em processo de execução fiscal, no qual era executado por reversão A…, tinha sido efectuada a penhora do veiculo com a matricula XL, de marca Mercedes-Benz; (ii) informado de que, posteriormente, pelo tomador do seguro, se verificou que o proprietário do veiculo não era o executado – “(…)V.EXª é o actual proprietário (…)” – e (iii) foi solicitado que se dignasse informar, com a maior brevidade possível, o que soubesse sobre o assunto;
c) De harmonia com a notificação de fls. 41 foi solicitado ao recorrido – ainda que se possa entender de forma imperfeita por eventual excesso de informação – que informa-se se continuava a ser proprietário do veiculo e desde quando detinha a propriedade do mesmo.
8.ª – A notificação de fls. 41 foi remetida ao recorrido por terem sido realizadas várias diligências pelo SF, a saber:

a) Pedido de apreensão do veiculo à GNR, em 31.12.2009, que veio a ser infrutífera por o executado ter informado aquela autoridade que, por volta do ano de 2004, tinha vendido o mesmo – fls. 32 a 34 dos presentes autos;
b) Pesquisa sobre possibilidade do veículo se encontrar seguro, realizada em 11.03.2010, a qual indicou a companhia de seguros G… – fls. 35 dos autos;
c) Pedido de informação àquela companhia para efeito de existência de seguro válido em vigor, bem como, da identificação do segurado, a qual, em 06.07.2010, identificou como tomador de seguro Clube Antigo 06.07.2010, identificou como tomador de seguro Clube Antigo…– fls. 36 a 38 dos autos;
d) Pedido de informação ao Clube Antigo…, em 08.07.2010, para efeito de identificação do proprietário do veiculo, tendo aquela entidade identificado o recorrido como sócio e informado que ele se tinha filiado no Clube em 24.05.2007, data em que tinha efectuado o seguro da viatura em causa – fls.39 e 40 dos autos.

9.ª – A matéria de facto elencada nas várias alíneas da 7.ª e 8.ª conclusões deste recurso, interessa à boa e justa decisão da causa para efeito de condenação no pagamento de custas processuais pelo que deve ser dada como provada, sendo aditada à douta decisão em recurso.

10.ª – Retomando a análise do 2º requisito consagrado no artigo 449º, nº1 e nº2, alínea a), do CPC (que o réu não tenha dado causa à acção, o que se verifica quando o autor exerce um direito potestativo sem origem em facto ilícito praticado pelo réu) e, sem esquecer a posição de JOÃO ANTUNES VARELA in Das Obrigações em Geral, 7ª Edição, I Volume, pag.54 e ss. (transcrita parcialmente na motivação deste recurso) o poder conferido ao recorrido, pelo exercício do seu direito de propriedade, de obter a anulação da penhora implicava, para o SF, um estado de sujeição.

11.ª – O recorrido exerceu um direito potestativo que não teve origem em qualquer acto ilícito praticado pelo SF – aliás, pelo último acto praticado pelo SF solicitava-se a colaboração do recorrido.

12.ª – Perante os documentos de fls. 8 e fls. 10 dos presentes autos, que titulavam a propriedade sobre o veículo (e que o recorrido optou por apresentar, não no SF como lhe fora solicitado, mas no Tribunal) imponha-se a anulação da penhora pelo que ao recorrer a acção judicial de embargos de terceiro, o recorrido deu causa à acção, deve suportar as custas processuais dessa acção e não possui qualquer fundamento legal para impor ao SF os encargos decorrentes da sua inércia – os factos demonstram que se o recorrido tivesse procedido ao registo do seu direito de propriedade aquando da aquisição do veículo (10.04.2007), o registo da penhora nunca se teria concretizada (21.05.2007) pois a presunção (legal) de propriedade decorrente do registo teria frustrado a penhora de bens que não pertenciam ao executado.

13.ª – A douta decisão em recurso desvalorizou toda o circunstancialismo fáctico anterior à apresentação dos embargos de terceiro e violou o artigo 449º, nº1 e nº2, alínea), do CPC.

Nestes termos e nos mais de direito que serão doutamente supridos por Vs. Exas. deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, a douta decisão recorrida revogada, na parte que condenou a FP no pagamento das custas processuais.”


*
O Recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma

A douta sentença proferida não merece qualquer reparo devendo manter-se a condenação da recorrente Fazenda Nacional nas custas do processo.”


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Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, defendendo a procedência parcial do recurso.
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Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
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Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
A questão suscitada pelo Recorrente consiste em apreciar se a sentença a quo errou ao condenar a Fazenda Publica no pagamento das custas processuais.

II.FUNDAMENTAÇÃO
II.1. Matéria de facto
A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto:
“Pelos documentos juntos aos autos com relevância para o caso, considero provados os seguintes factos:
1. Foi instaurado no Serviço de Finanças de Braga - 2, a execução fiscal n.° 3425200501051725, no qual é executado A…, para cobrança de dívidas de IVA, no valor de 1 386 326,90 €. (cfr. fls. 13 dos autos);
2. Em 18 de Maio de 2007, foi ordenada, no processo de execução fiscal, a penhora do veículo, de marca Mercedes-Benz com matricula - XI, tendo sido registada a favor da Fazenda Pública, através da inscrição Ap. 5324 de 21.05.2007 (cfr. fls. 21/25 dos autos);
3. O embargante adquiriu ao executado, através de contrato verbal de compra e venda, constante de fls. 10 dos autos, e na qual consta a data de 10.04.2007, documento que aqui se dá por integralmente por reproduzido;
4. O embargante inscreveu o veículo no Clube Automóvel… a 24.05.2007, efectuando o seguro e pagando os respectivos prémios (fls.8 dos autos);
5. O embargante procedeu ao pagamento dos impostos, realizou inspecções, contratou seguros pagou os respectivos prémios;
6. Em 27.08.2010, o embargante remeteu os presentes embargos de terceiro, através de telecópia, ao Serviço de Finanças (cfr. fls. 1 dos autos).

2.2 MOTIVAÇÃO DA PROVA
A factualidade considerada assente no n.° 1 e 4, decorre dos documentos do processo administrativo junto pela Fazenda Pública aos autos.
Relativamente ao facto discriminado como provado no n.° 5 resulta a convicção do tribunal da prova documental bem como da prova testemunhal apresentada, a qual mereceu credibilidade ao Tribunal.
Da qual resultou que o embargante, desde data da compra do veiculo esteve na sua posse e procedeu ao pagamento dos impostos, realizou inspecções, contratou seguros pagou e respectivos prémios.
Nada mais resulta provado com interesse para a presente decisão. “

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Consta ainda da decisão recorrida, os seguintes factos que à questão respeita.
7. A sentença a quo julgou procedentes os embargos de terceiro intentados por M…, aqui Recorrido e, em consequência, ordenou o levantamento da penhora efectuada no processo de execução fiscal nº 3425200501051125, e respectivos apensos, sobre o veículo penhorado, condenou a Fazenda Publica nas custas.
8. Na condenação das custas faz menção aos arts. 446º, nºs 1 e 2 do CPC e art. 7º, n.º3 do RCP.

II.2. Do Direito
As questões suscitadas nas conclusões de recurso prendem-se só com a discordância com a decisão relativamente às custas processuais. A este propósito vem a Recorrente invocar, em sede de alegações e conclusões de recurso, que a decisão em recurso desvalorizou toda o circunstancialismo fáctico anterior à apresentação dos embargos de terceiro e que, perante os documentos que titulavam a propriedade sobre o veículo (e que o recorrido optou por apresentar, não no SF como lhe fora solicitado, mas no Tribunal) se impunha desde logo a anulação da penhora, pelo que ao recorrer a acção judicial de embargos de terceiro, o recorrido deu causa à acção e por esse facto deve suportar as custas processuais. Remata dizendo que a sentença em análise, na sua condenação em custas, violou o artigo 449º, nº1 e nº2, alínea), do CPC.

Face ao que vem exposto no presente recurso conclui-se que a Fazenda Publica aceita, no demais, a douta sentença proferida que julgou procedentes os embargos de terceiro deduzidos, reconhecendo que o ora Recorrido é dono e legítimo possuidor do veículo automóvel penhorado desde 10/04/2007 e que a penhora efectuada é ilegal porque ofendeu a sua posse e propriedade.

A sentença a quo proferiu a seguinte decisão:
“Ora, a embargante, não sendo manifestamente parte no processo de execução fiscal de onde emana a penhora, por não ter nele por qualquer modo intervindo, por si ou em representação de outrem, tem a posição de terceiro.
Nessa qualidade, alegou e demonstrou que é titular do direito de propriedade sobre veículo penhorado identificadas no ponto n.° 2 dos factos provados, direito que, como resulta do n.° 4, lhe adveio por efeito do correspondente contrato verbal de compra e venda cuja existência comprovou.
O embargante inscreveu o veículo no Clube Automóvel… a 24.05.2007, pagando os respectivos prémios bem como procedeu ao pagamento dos impostos, realizou inspecções, contratou seguros pagou os respectivos prémios.
Nos termos conjugados dos art.°s 1316.º e alínea a) 1317.º, Código Civil (CC) direito de propriedade adquire-se por contrato.
Nos termos do art.° 1251.º do Código Civil (CC) a posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou outro direito real.
Como decorre do art.° 1251.° do CC, a posse integra um corpus ou elemento objectivo (um poder de facto sobre a coisa no sentido da sua submissão à vontade do sujeito de dela poder usar, fruir ou dispor como bem entender) e um animus ou elemento subjectivo (a intenção por parte do sujeito de, ao exercer tal poder de facto, actuar como titular do correspondente direito real de gozo).
E logrou ainda provar a anterioridade do seu direito de propriedade em relação à penhora, evidenciando que adquiriu o veículo antes da realização desta diligência no processo de execução fiscal movido contra a executada que, na qualidade de proprietário, a fruía na plenitude.
Assim sendo, o direito de propriedade de que o embargante demonstrou ser titular contende com a realização e o âmbito da penhora sub iudice não podendo subsistir a penhora efectuada sobre o veiculo, por violar o direito de propriedade e posse, cuja titularidade esta logrou demonstrar nos presentes autos, terão proceder os presentes embargos.
“3. DECISÃO
“Nos termos e com os fundamentos supra expostos, julgo procedentes os presentes embargos de terceiro e em consequência, ordeno o levantamento da penhora efectuada no processo de execução fiscal nº 3425200501051125, e respectivos apensos, sobre o veículo penhorado.
Custas pela Fazenda Pública, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 446º do Código de Processo Civil por força do artigo 7.° n.° 3, do Regulamento das Custas Processuais. “

Vejamos, começando por analisar as normas aqui em causa:

Estabelecem os artigos 446º e 449º do CPC, do modo seguinte:
Artº 446.º do CPC

(Regra geral em matéria de custas)

1. A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

2. Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

3. Tendo ficado vencidos vários autores ou vários réus, respondem pelas custas em partes iguais, salvo se houver diferença sensível quanto à participação de cada um deles na acção, porque nesse caso as custas serão distribuídas segundo a medida da sua participação; no caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas.

Artº 449.º

(Responsabilidade do autor pelas custas)

1. Quando o réu não tenha dado causa à acção e a não conteste, são as custas pagas pelo autor.

2. Entende-se que o réu não deu causa à acção:

a) Quando o autor se proponha exercer um mero direito potestativo, que não tenha origem em qualquer facto ilícito praticado pelo réu;

b) Quando a obrigação do réu só se vencer com a citação ou depois de proposta a acção;

c) Quando o autor, munido de um título com manifesta força executiva, use sem necessidade do processo de declaração.

d) Quando o autor, podendo logo interpor o recurso de revisão, use sem necessidade do processo de declaração.

3. Ainda que o autor se proponha exercer um mero direito potestativo, as custas são pagas pelo réu vencido, quando seja de protecção a este a finalidade legal da acção. “

Por outro lado, dispõe o artº 237º do CPPT que:

Artº 237.º

(Função do incidente dos embargos de terceiro. Disposições aplicáveis)

1 - Quando o arresto, a penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular um terceiro, pode este fazê-lo valer por meio de embargos de terceiro.

2 - Os embargos são deduzidos junto do órgão da execução fiscal.

3 - O prazo para dedução de embargos de terceiro é de 30 dias contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respectivos bens terem sido vendidos.”.

Nos termos do citado artigo 449º do CPC a responsabilidade do Autor pelas custas depende da exigência cumulativa de “a) O Reu não ter dado causa à acção” e “b) Não ter deduzido contestação.”

A verificação do 2º requisito não vem sequer questionado pelo que se impõe apenas apreciar se o Reu deu ou não causa à presente acção de embargos.

As situações em que se entende que o Reu não deu causa à acção estão definidas no supra citado artigo 449º nº 2 do CPC e são, a saber, a) Quando o autor se proponha exercer um mero direito potestativo, que não tenha origem em qualquer facto ilícito praticado pelo réu; b) Quando a obrigação do réu só se vencer com a citação ou depois de proposta a acção; c) Quando o autor, munido de um título com manifesta força executiva, use sem necessidade do processo de declaração. d) Quando o autor, podendo logo interpor o recurso de revisão, use sem necessidade do processo de declaração.

Conforme se retira das conclusões supra transcritas, entende a Fazenda Publica que o autor, neste caso o embargante, exerceu um mero direito potestativo, que não teve origem em qualquer facto ilícito praticado pelo reu.

Fazendo apelo à jurisprudência deste TCA acerca desta questão, recuperamos o plasmado no acórdão de 13/09/2005, proferido no processo 690/05.8 BEGRG, onde se diz que:

norma do artigo 449º/2/a) do CPC, estatui que o réu não dá causa à acção «Quando o autor se proponha exercer um mero direito potestativo, que não tenha origem em qualquer facto ilícito praticado pelo réu.»

Em primeiro lugar, o Recorrente contesta a qualificação como direito potestativo (…) estribando-se para tanto na definição daquela figura jurídica fornecida pelo Prof. Antunes Varela em “Das Obrigações em Geral”: «Poder conferido a determinadas pessoas de introduzirem uma modificação na esfera jurídica de outra pessoa – criando, modificando ou extinguindo direitos – sem a cooperação destas».

Mas esta argumentação enquanto apenas baseada no facto de réu ter participado activamente na formação da causa de pedir não é convincente, uma vez que da própria norma em análise decorre que o direito potestativo pode ter origem em facto ilícito praticado pelo réu, o que significa que a participação activa na formação da causa de pedir não é factor capaz de, só por si, descaracterizar o “direito potestativo”.

A dificuldade desta temática advém, a par da expectável flutuação doutrinal, da inexistência na nossa ordem jurídica de uma sistematização do conceito e regime dos direitos potestativos.

De todo o modo, afigura-se mais sugestiva no caso a noção exposta pelo Prof. Mota Pinto (Teoria Geral, 3ª edição, pág. 174), por admitir a hipótese da intermediação necessária dos Tribunais: «Os direitos potestativos são poderes jurídicos de, por um acto livre de vontade, só de per si ou integrado por uma decisão judicial, produzir efeitos jurídicos que inelutavelmente se impõem à contraparte.» (…)

como se lê no sumário do Ac. da RL de 10-11-88, Col. Jur. 1988, 5º-108, «A expressão “um mero direito potestativo” referida na al. a) do art. 449º do CPC, deve ser interpretada em termos latos. Corresponde à expressão “um mero poder legal” usada no Código de 1939.» Neste ponto a sentença não é criticável.

Porém, não menos certo é que o “poder-dever” exercido pelo MP teve origem em facto ilícito praticado pelo réu.

Ilícito porquê?

Porque, pretendendo a lei que os membros dos órgãos autárquicos exerçam efectivamente os cargos para os quais foram eleitos, lhes impôs o dever de comparecerem às respectivas sessões e reuniões e sancionou o incumprimento desse dever com a perda do mandato. Deste modo, o absentismo injustificado é decerto um facto ilícito de índole administrativa.

Daí se retira, como conclusão final, que o réu deu efectivamente causa à acção ao praticar aquele facto ilícito, não podendo subsistir a sentença que adoptou a solução oposta.”

No caso em concreto também se verifica que efectivamente o Reu, a Fazenda Publica, praticou um acto ilícito quanto efectuou uma penhora ilegal assim como reconhece que o ora Recorrido era, à data da penhora, o dono e legítimo possuidor do veículo automóvel penhorado, desde 10/04/2007, e que a penhora efectuada ofendeu a sua posse e propriedade. A Fazenda Publica deu efectivamente causa à acção, independentemente da eventual actuação negligente do Recorrido ao não proceder à alteração a seu favor do registo de propriedade sobre o bem.

Face ao exposto, seria indiferente trazer aos autos os factos que a Recorrente invoca nas suas conclusões 6º, 7º e 8º. Ao aceitar a ilegalidade da penhora tornam-se indiferente as diligencias efectuadas em período posterior à mesma.

Por sua vez o Embargante, aqui Recorrido, embora não tenha efectuado atempadamente o respectivo registo limitou-se, perante tal penhora, a exercer um direito que a lei lhe confere para demonstrar que efectivamente era à data da diligência o proprietário do bem penhorado. Utilizou para tanto o meio processual adequado e único legalmente previsto para reagir a um acto de penhora que ofendia a sua posse e propriedade.

Assim sendo, tal como diz o Exmo. Magistrado do Ministério Publico junto deste Tribunal, “Porém, face à taxatividade legal dos casos em que se considera que o Reu não deu causa à acção – os mencionados no citado art. 449º nº 2 do CPC – deve entender-se que a situação descrita nos autos não se enquadra em nenhuma das hipóteses contempladas no predito normativo legal. Consequentemente, será ilegal de excluir a FP da responsabilidade pelo pagamento das custas, já que decaiu na acção”,

Resta pois concluir pela total improcedência das alegações e conclusões de recurso.

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III. DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Norte, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Porto, 25 de janeiro de 2018.
Ass. Barbara Tavares Teles
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina da Nova