Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00101/2002.TFPRT.21
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/10/2018
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:IVA
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
Sumário:I – O princípio da livre apreciação das provas, contido no artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.
II - Por força do princípio da imediação, a tarefa de reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorre erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo.
III - Estão isentas de IVA as prestações de serviços e as transmissões de bens estreitamente conexas, efectuadas no exercício da sua actividade habitual por creches, jardins de infância, centros de actividade de tempos livres, estabelecimentos para crianças e jovens desprovidos de meio familiar normal, lares residenciais, casas de trabalho, estabelecimentos para crianças e jovens deficientes, centros de reabilitação de inválidos, lares de idosos, centros de dia e centros de convívio para idosos, colónias de férias, albergues de juventude ou outros equipamentos sociais pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou instituições particulares de solidariedade social ou cuja utilidade social seja, em qualquer caso, reconhecida pelas autoridades competentes – cfr. artigo 9.º, n.º 8 do Código do IVA.
IV – Só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas – cfr. artigo 20.º, n.º 1 alínea a) do Código do IVA.
V - Como corolário do princípio da colaboração da Administração, em geral, com os particulares (cfr. artigo 7.º, do Código de Procedimento Administrativo), o artigo 59.º, n.º 3, al. e), da Lei Geral Tributária, prevê a cooperação da Administração Tributária com os contribuintes consubstanciada, além do mais, na emissão de informação vinculativa sobre situações tributárias concretas (cfr. artigo 68.º da Lei Geral Tributária).
VI - Nos termos da lei (cfr. artigo 57.º, n.º 1, do C.P.P.T.), uma vez prestada a informação sobre a situação do contribuinte, ficam os serviços tributários vinculados a não proceder de forma diversa, caso se verifiquem os factos identificados e previstos na lei, salvo em cumprimento de decisão judicial. O C.P.P.T. não fixa qualquer prazo de validade à informação prestada, é preciso notar que ela tem, no entanto, dois termos de referência. Por um lado, ela reporta-se aos factos enunciados pelo contribuinte; por outro, reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços.
VII - A informação prestada perde qualquer validade se os factos ocorrerem em termos diversos daqueles que foram apresentados aos serviços, nomeadamente se ocorrerem com contornos que lhe tenham sido ocultados. Do mesmo modo, a informação prestada perde validade se as normas jurídicas que serviram à qualificação tributária dos factos vierem, entretanto, a ser alteradas. Por último, se a Fazenda Pública proceder de forma diversa do sentido que constar de informação vinculativa prestada, o acto que praticar enfermará de vício de violação de lei, sendo gerador da sua anulabilidade.
VIII - Por força do preceituado no artigo 266.° da Constituição da República Portuguesa, a actividade da administração tributária tem de ser levada a cabo em subordinação à Constituição e à lei e deve respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos (princípio da legalidade) e os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
IX - Actualmente, deve entender-se que princípios como o da justiça e da boa-fé são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais.
X - Na densificação do princípio da actividade administrativa relevam sobretudo dois subprincípios concretizadores da boa-fé: o princípio da primazia da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança.
XI - A Lei Geral Tributária concretiza a aplicação do princípio da boa-fé ao estabelecer o regime das informações vinculativas.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:Associação...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 14/07/2017, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela Associação…, com o NIPC 5…e sede na Rua…, Paços de Ferreira, contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, referentes aos anos de 1996 a 2000 e primeiro trimestre de 2001.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou os autos procedentes, anulando as liquidações adicionais de IVA, dos anos de 1996 a 2000, cujos fundamentos da impugnação são a caducidade do direito à liquidação relativamente ao ano de 1996 e a irregularidade do enquadramento da impugnante no regime normal trimestral de IVA, efectuado pelos serviços da AT.
B. Os actos tributários controvertidos resultaram de uma acção inspectiva levada a efeito pelos competentes SIT aos reembolsos relativos aos períodos de 9603T, 9606T, 9612T, 9703T, 9706T, 9709T, 9712T, 9803T, 9806T e 9809T.
C. Proferida primeira decisão nos autos, veio o TCAN a pronunciar-se, na sequência do recurso interposto pela FP, no Acórdão proferido em 2008/06/19, no processo nº 00101/2002.TFPRT.21, no sentido de que se impunha a sua anulação e a baixa do processo ao Tribunal recorrido para ampliação da matéria de facto e nova decisão.
D. Assim, o Tribunal a quo, notificou as partes para procederem à junção aos autos da declaração de início de actividade que tivessem em seu poder, bem como para esclarecerem quem preencheu o Quadro 11 da supra citada declaração e porque o fizeram.
E. Em resposta à notificação, a impugnante respondeu “que foi o Serviço de Finanças de Paços de Ferreira”, e o SF, informou não ser possível saber quem preencheu o Quadro 11 da referida declaração, atendendo ao tempo decorrido, acrescentando que a responsabilidade pelo preenchimento da declaração é do sujeito passivo ora impugnante.
F. Assente nestes factos, o Mmo Juiz do Tribunal a quo procedeu à ampliação da matéria de facto, acrescentando apenas ao probatório a alínea O), da qual consta que “O campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante”.
G. O Tribunal a quo alicerçou a sua convicção “nos documentos e nos depoimentos das testemunhas indicados em cada uma das alíneas dele - mais concretamente na circunstância de os referidos documentos não terem sido impugnados nem ostentarem quaisquer sinais que afectem a sua força probatória e de as testemunhas terem deposto de forma objectiva e segura. A prova do elencado em O) do probatório baseia-se no que sobre a matéria adiante se dirá na fundamentação da decisão de mérito da impugnação”.
H. Concluiu a douta sentença em análise que, “o campo 11 do impresso não foi preenchido por qualquer representante da impugnante. Mas mesmo que tivesse sido a representante da impugnante a preencher o campo 11 da declaração (e só por erro o poderia ter feito (...)), o funcionário do Serviço de Finanças que recebeu o impresso tinha o dever, diante de toda a informação que lhe foi fornecida pela representante da impugnante, de tê-la alertado para o erro e corrigido o enquadramento - tudo por força dos princípios da cooperação e da boa-fé”.
I. O Tribunal a quo observa ainda que “A dissemelhança, no traço, da cruz (“x”) aposta no campo 11 em relação à colocada nos restantes campos do impresso modelo de declaração preenchidos é um indício que legitima a suposição de que as mesmas foram apostas por pessoas diferentes, (...) fazendo todo o sentido que o campo 11 tenha sido preenchido pelo funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração (por caber à Administração Fiscal fazer o enquadramento no regime de IVA aplicável e por não se representar que outra pessoa o poderia ter feito) e os campos restantes ao sujeito passivo” e que, “Sublinhe-se que a A.F. não nega o preenchimento do campo 11 da declaração, que lhe é imputado pela impugnante”.
J. Refere ainda a douta sentença do Tribunal a quo que, “Por princípio, os serviços da A.F., melhor do que ninguém (pelo menos melhor do que o contribuinte comum) conhecem ou têm a obrigação de conhecer a legislação fiscal, (...). Têm, por isso, em todos os casos, a obrigação, decorrente do dever de recíproca colaboração entre a A.F. e os contribuintes (art.°s 7º do CPA e 48º do CPPT), de esclarecer os contribuintes, oficiosamente ou a requerimento, sobre a existência, conteúdo e alcance dos seus direitos, bem como sobre as condições e implicações do seu exercício”.
K. Concluindo, assim, o Mmo Juiz do Tribunal a quo pela procedência nos autos, porquanto “Se é verdade que a escolha do tipo de enquadramento em termos de IVA cabe, em princípio, ao contribuinte, também o é que o erro no enquadramento verificado no impresso oficial próprio, em desconformidade com informação complementar fornecida pelo contribuinte só à A.F. pode ser imputado. Por isso, as consequências do errado enquadramento da impugnante no regime normal trimestral, traduzidas na indevida restituição do IVA, só à A.F. podem ser imputadas”.
L. Mais conclui o Tribunal a quo que, ‘Exigir agora o imposto seria abuso do direito, na espécie «venire contra factum proprium», violador do principio da boa-fé (art.ºs 266°, n.º 2, da Constituição e 6°-A do CPA, ou pelo menos do princípio da tutela da confiança, tanto mais quanto é certo que a impugnante, por não ser IPSS, mas simples «instituição de utilidade social», não tem direito à restituição de IVA ao abrigo do Decreto-Lei n.º 20/90, de 13 de Fevereiro, mesmo nesta última qualidade”.
M. Com o devido respeito, por melhor opinião, entende a Fazenda Pública, que a douta sentença sob recurso enferma de erro de julgamento de facto, por défice instrutório, bem como porque levou ao probatório factos que não resultam como assentes face à prova produzida e ainda por deficiente valoração dos factos dados como provados, enfermando ainda de nulidade, por falta de exame crítico das provas, que acarreta a sua falta de fundamentação.
N. Os autos baixaram à 1ª instância, com um único objectivo - a ampliação da matéria de facto, face à indispensabilidade de “obter todos os elementos que suportem a decisão de direito”, com vista a “apurar quem preencheu o referido quadro 11 da declaração de início de actividade” apresentada pela impugnante, questão esta que, com o devido respeito, não foi claramente observada pelo Tribunal a quo, pelo que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, porquanto foi proferida com manifesto défice instrutório, face ao determinado na decisão proferida pelo TCAN, no processo nº 00101/2002.TFPRT.21.
O. É desta decisão do TCAN (para além do disposto no artº 114 do CPPT), que resulta para o Tribunal a quo o ónus de ordenar a realização de provas adicionais, face às dúvidas quanto às várias soluções plausíveis.
P. Face a tal decisão e na tentativa de cumprir o determinado pelo Tribunal superior, ordenou o Tribunal a quo a notificação das partes para juntarem aos autos a declaração de início de actividade que tivessem em seu poder, bem como para esclarecerem quem preencheu o Quadro 11 da supra citada declaração e porque o fizeram, procedendo com base nas respostas recebidas à ampliação da matéria de facto, acrescentando, tão só, ao probatório a alínea O), onde deu como assente o facto de que “O campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante”.
Q. Tendo em conta que o supracitado aresto considerou não se encontrar provado, na primeira decisão proferida nos autos, que “grande parte da declaração de início de actividade, incluindo o quadro 11 da mesma, foi levado sem preenchimento para o serviço de finanças (...), que o contribuinte apresentou todos os documentos de que dispunha e esclareceu integralmente que operações iria praticar no âmbito da sua actividade, que foi a análise e informações dos serviços fiscais que levaram ao esclarecimento das dúvidas do contribuinte, não se revelando falhas na cooperação e nas informações prestadas pelo contribuinte e que não foi este que preencheu os campos em falta”,
R. considera a FP, com o devido respeito por melhor opinião, que tais factos continuam por provar, não se afigurando à FP que a ampliação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal a quo lograsse o “esclarecimento, mais completo possível, dos aspectos apontados como deficitariamente instruídos, no sentido de averiguar esses factos, levando os mesmos ao probatório”, como era pretendido.
S. Entende ainda a FP, sempre com o devido respeito por melhor opinião que não pode o Tribunal a quo concluir, como concluiu, que a actuação da AT violou os princípios da boa-fé e da tutela da confiança, nem pode a douta sentença recorrida dar como provado o facto levado à alínea O) do probatório, porquanto o mesmo não resulta dos elementos tidos nos autos, levando ao probatório factos que não resultam como assentes face à prova produzida.
T. Atento o princípio da colaboração, é certo que a AT, no desempenho das funções que lhe são incumbidas deve prestar toda a colaboração aos contribuintes, nomeadamente, o esclarecimento das dúvidas e demais situações que lhe sejam colocadas (cfr. artº 48 do CPPT), sendo no entanto tal dever recíproco, devendo também o contribuinte “cooperar de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso”.
U. Seguindo ainda de perto o citado acórdão do TCAN, de 2016/03/10, proferido no processo 00101/2002.TFPRT. 21, importará esclarecer e provar, designadamente, “que o contribuinte apresentou todos os documentos de que dispunha e esclareceu integralmente que operações iria praticar no âmbito da sua actividade, que foi a análise e informações dos serviços fiscais que levaram ao esclarecimento das dúvidas do contribuinte, não se revelando falhas na cooperação e nas informações prestadas pelo contribuinte e que não foi este que preencheu os campos em falta”.
V. Ali se salienta ainda que (1), “0 princípio da boa-fé está consagrado no art. 266°, 2 CRP e no art. 6°-A CPA, que alargou o seu âmbito subjectivo de aplicação, de modo a vincular não apenas a administração mas também os particulares que com ela se relacionem” e que a tutela da confiança, “pressupõe a verificação de diversas circunstâncias (...)”, sendo que ‘Estes pressupostos devem ser encarados de modo global: a não verificação de um deles será em princípio relevante, mas pode ser superada pela maior intensidade de outro ou por outras circunstâncias pertinentes”.
W. Continua que, “In casu, este princípio da tutela da confiança assume especial relevância, dado que visa, precisamente (...), salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem”, e que, “a factualidade assente não permite, com a amplitude necessária, verificar se estão reunidas as diversas circunstâncias que subjazem ao princípio da tutela da confiança, uma vez que o enquadramento da impugnante em regime do IVA sempre estaria acometido aos serviços da AT (cfr. quadro 10 da declaração de início de actividade: uso exclusivo dos serviços), pressupondo, previamente, que o declarante dê a conhecer à AT toda a actividade, conforme se exige nos restantes quadros da declaração, designadamente, no quadro 11 da declaração de início de actividade - daí a importância de apurar quem preencheu este quadro”.
X. Importa ainda salientar que, não nos parece que o dever de recíproca colaboração previsto no artigo 48° do CPPT e, alegadamente violado pela AT, se estenda à definição dos próprios dados da actividade desenvolvida ou a desenvolver (no caso de início de actividade) pelos contribuintes, pois a AT carece de legitimidade para intervir nessa matéria, dado tratar-se de uma questão de reserva de privacidade, bem como de decisões de gestão privada dos sujeitos passivos.
Y. Acresce ainda que, a douta sentença sob recurso dá como assentes factos que não se mostram sujeitos a devida análise crítica e de credibilidade (cfr. nº 4 do artº 607º do CPC e 2 do artº 123º do CPPT), sendo que, o princípio da livre apreciação das provas ou da prova livre impõe ao juiz exercer sobre todas as provas produzidas a sua atividade crítica e mover-se, na sua apreciação, com inteira liberdade e sem outros limites que não sejam os que lhe são impostos pela sua convicção íntima ou pelo seu próprio juízo, não bastando ao Tribunal indicar as provas que serviram de base à decisão para formar a sua convicção, sendo necessário efetuar uma verdadeira reconstituição e análise crítica do iter que conduziu a considerar cada facto como provado ou não provado.
Z. Impõe-se, pois, que da sentença proferida resulte qual o processo lógico-mental que serviu de suporte ao conteúdo da decisão tomada, sendo que, no que respeita à prova documental, impõe-se efectuar uma apreciação crítica, principalmente quando existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios; quanto à prova testemunhal, será indispensável, a sua apreciação crítica, com indicação das razões por que foi dado ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a uns elementos em prejuízo de outros, para que a decisão se considere fundamentada.
AA. Porém, da douta sentença recorrida não se vislumbra qual o quadro factológico considerado pelo Mmo Juiz do Tribunal a quo como não provado, nem por que motivo, tendo em conta a decisão tomada a final, foram considerados provados os factos levados ao probatório e não outros e por que motivo não considerou factos não provados, resultantes dos elementos tidos nos autos, nem resulta qualquer análise crítica da prova produzida e na qual se baseou para tomar a sua decisão, faltando não só a discriminação dos factos provados e não provados (cfr. n2 2 do art2 123 do CPPT), como também falta o exame crítico das provas (cfr. n23 do art2 659 do CPC), sendo que, no contencioso tributário, a falta de discriminação da matéria de facto não provada, no domínio do contencioso tributário, será equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada, para efeitos da nulidade prevista no art° 125°, n° 1 do CPPT.
BB. Pelo que, entende ainda a Fazenda Pública que enferma a douta sentença sob recurso de nulidade, por falta de exame crítico das provas, o que implica a sua falta de fundamentação (artºs 125, nº 1 do CPPT e 615, nº 1, al. b) do CPC).
CC. Ademais, padece a sentença recorrida de erro de julgamento da matéria de facto, porquanto os factos levados ao probatório não permitem concluir, como se concluiu na douta sentença ora em crise, que faz todo o sentido que tenha sido o funcionário do Serviço de Finanças quem preencheu o Quadro 11 da declaração de início de atividade e que, consequentemente, é à AT que deve ser imputado o erro no enquadramento em sede de IVA,
DD. considerando a FP que a dissemelhança, no traço, da cruz (“X”) aposta no Quadro 11 da declaração, em relação aos restantes campos da declaração preenchidos e o facto da TOC, F…, ter afirmado ter entregue pessoalmente a declaração só parcialmente preenchida, não legitimam as conclusões do Tribunal a quo, não se podendo afirmar que “O campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante” e que faz todo o sentido que tenha sido o funcionário do Serviço de Finanças quem preencheu o Quadro 11 da declaração de início de actividade.
EE. Poder-se-á até admitir que a declaração em causa tivesse sido preenchida por pessoas diferentes, mas desconhece-se por quem, tanto mais que o seu preenchimento é da responsabilidade do sujeito passivo e não do Serviço de Finanças, pelo que entende a FP que a sentença recorrida padece ainda de erro de julgamento, porquanto errou na valoração dos factos dados como assentes e levados ao probatório.
FF. Compete aos sujeitos passivos de IVA a obrigação de declarar o seu enquadramento para efeitos fiscais, nomeadamente quanto à obrigatoriedade de liquidar e deduzir ou não o imposto, sem prejuízo de a administração tributária fiscalizar se estão verificados os pressupostos legais de que o sujeito passivo se arroga, logo o preenchimento do Quadro 11 - tipo de operações - da declaração de início de actividade é da inteira responsabilidade do sujeito passivo e, consequentemente, do seu preenchimento resulta o enquadramento a efectuar pelos Serviços.
GG. Assim, não pode o Tribunal a quo concluir, como concluiu, que a AT nega o preenchimento do Quadro 11 da declaração controvertida, apenas porque informou que face ao lapso de tempo decorrido, não é possível saber quem preencheu o referido Quadro 11, o que atendendo ao decurso de tempo, à movimentação de funcionários pelos vários serviços da AT e ao fluxo de contribuintes ao balcão de um SF, é compreensível, pois ainda que se conseguisse identificar o funcionário que recepcionou a declaração, o mais normal é que aquele não se recordasse daquela declaração/situação em concreto.
HH. A verdade é que, na declaração de início de actividade, o Quadro 10 é reservado ao preenchimento por parte dos serviços da AT e nele se efectua, o enquadramento do contribuinte no regime do IVA, mas esse enquadramento só será efectuado pelos serviços mediante o preenchimento do Quadro 11 da referida declaração pelo contribuinte, reflectindo assim o tipo de operações subjacentes ao exercício da sua actividade, sendo, aliás, o que resulta do douto Acórdão do TCAN, de 2016/03/10, proferido no processo 00101/2002.TFPRT.21, supra citado.
II. Na realidade, os serviços da AT devem conhecer a lei que aplicam, no entanto igual obrigação recai sobre todas as demais pessoas e entidades públicas e privadas e, inclusive, sobre os particulares, pois o desconhecimento da lei, seja ela fiscal, seja de qualquer outra natureza, não justifica o seu incumprimento, nem isenta as pessoas das sanções nelas estabelecidas - cfr. artigo 6° do Código Civil, descurando a douta sentença recorrida, com o respeito devido por melhor opinião, que a declaração de início de actividade foi entregue, pessoalmente, pela TQC da impugnante, juntamente com o escriturário no gabinete de contabilidade que fazia o tratamento contabilístico da sociedade, os quais, estariam dotados dos conhecimentos técnicos para esse efeito.
JJ. A um TOC é-lhe exigível determinadas competências e diligências no exercício das suas funções, nomeadamente, no que respeita aos pressupostos e enquadramento fiscal dos sujeitos passivos em sede de IVA, aos pagamentos ao Estado dos impostos devidos, mas também se lhes impõe uma aplicação judiciosa e consciente das normas fiscais e contabilísticas, exigindo-se-lhes ainda um especial dever de informação sobre a forma como as obrigações fiscais dos clientes devem ser cumpridas.
KK. No que alude à TOC da impugnante, impunha-se um dever de cuidado, diligência e responsabilidade, no exercício das suas funções, pois ao assinar a declaração de início de actividade, demonstra a sua concordância com o teor da mesma e o seu perfeito conhecimento das opções assinaladas, que se repercutem na esfera jurídica dos seus clientes, pelo que lhe era exigível a verificação da similitude entre os campos assinalados na declaração e à informação transmitida ao funcionário que recebeu a declaração (declaração essa que assinou e manteve em seu poder durante todos este anos).
LL. Importa ainda salientar que, mesmo que dúvidas restassem à impugnante quanto ao seu enquadramento, as mesmas ficariam dissipadas aquando da informação dada pelo Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social, em 1994, onde foi determinado que não reunia as condições para adquirir o estatuto de IPSS, assim como quando em 2001, foi emitida declaração atestando que a aqui impugnante foi considerada de utilidade social, logo ao abrigo dos princípios da boa-fé e da cooperação, impunha-se que efectuasse a correcção ao seu enquadramento mediante a apresentação de uma declaração de alteração de actividade, pois a validação da declaração de início de actividade apresentada pela impugnante, por parte da AT, não obsta que, posteriormente, o enquadramento para efeitos de IVA, possa ser alterado, ao abrigo dos princípios da legalidade, da justiça e da verdade material - cfr. artigo 55º da LGT.
MM. A intervenção da AT, no momento da declaração do início de actividade dos contribuintes, tem por base a realidade que lhe é apresentada pelos interessados, incumbindo-lhe sempre proceder às correcções necessárias em momento posterior, sempre que verifique ter ocorrido uma desconformidade que implique o não pagamento, ou pagamento de menos imposto, do que aquele que seria devido,
NN. Assim o limite a tal correcção será sempre o momento coincidente com o fim do prazo a que alude o artigo 45º da LGT, ou seja, o momento limite até ao qual a Lei permite à AT proceder à liquidação ou correcção da liquidação do imposto respectivo, ou seja a AT não pode, por via de um erro, ficar impedida de posteriormente proceder à sua correcção, se entender que existe fundamento de facto ou de direito que o imponha.
OO.É entendimento da Fazenda Pública que só haverá lugar à tutela da confiança do contribuinte na actuação da AT, de acordo com os ditames da boa-fé, quando o princípio da legalidade seja assegurado, pois este limita os princípios da boa-fé e da tutela da confiança, não sendo merecedora de tutela a confiança suscitada nos contribuintes aquando de actuação ilegal da Administração.
PP. No caso sub judice a AT procedeu a vários reembolsos de IVA, todavia, aquando do procedimento inspectivo desencadeado à impugnante, verificou que a sua actuação era ilegal, porquanto os reembolsos efectuados eram indevidos, uma vez que a actividade desenvolvida pela impugnante não conferia tal direito, logo, a AT não poderia continuar a proceder de forma ilegal.
QQ. Nesta medida, tendo o Tribunal a quo decidido da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de nulidade e de erro de julgamento, nos parâmetros acima apontados.
RR. Padece de nulidade, por falta de exame crítico das provas, o que implica a sua falta de fundamentação, em conformidade com o disposto nos artºs 125, nº 1 do CPPT e 615, nº 1, al. b) do CPC e,
SS. enferma de erro de julgamento, porquanto foi proferida com manifesto défice instrutório, uma vez que se lhe impunha obter mais elementos de suporte à decisão de direito, essenciais para a boa decisão da causa.
TT. Padece ainda a decisão recorrida de erro de julgamento da matéria de facto, porquanto levou ao probatório factos que não resultam como assentes face à prova produzida e que conduziram o Tribunal a quo a errar no sentido da sua decisão final e ainda porque os factos levados ao probatório não permitem chegar à decisão tomada a final, porquanto os invocados erros conduziram a que o Tribunal a quo tomasse a final uma decisão contrária à que se impunha face aos elementos tidos nos autos.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser considerada nula a douta sentença recorrida, com as legais consequências ou,
Caso assim não se entenda
Deve ser revogada a douta sentença recorrida, por erro de julgamento, com as legais consequências.”
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A Recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
“1ª) Pelas razões aduzidas no ponto 1 das alegações do presente recurso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, sendo claro e inequívoco que da sentença recorrida consta a indicação dos meios de prova e as razões pelas quais os mesmos conduzem e sustentam a decisão de se considerarem provados os factos nela elencados como tal, máxime quanto a cada um dos factos nela considerados provados, permitindo, assim, aferir, quanto a cada um desses factos, de forma cabal, o porquê dessa decisão e o processo lógico formal que conduziu e suporta a mesma, não se verifica a alegada falta de exame critico das provas e, por maioria de razão, a alegada falta de fundamentação da sentença recorrida nos termos do Art°. 615, n°. 1, al. b), do CPC, e do Art°. 125°, n°. 1, do CPPT, pelo que, padece de fundamento e sentido a invocada nulidade da sentença recorrida por faltas fundamentação.
2) Pelas razões aduzidas no ponto II das alegações do presente recurso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, é manifesto que os elementos probatórios carreados e existentes nos autos constituem suporte bastante para fundamentar a decisão proferida pelo Tribunal a quo de dar como provado que” o campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante”, não havendo outros elementos de prova a carrear para os autos e que pudessem esclarecer e fundamentar decisão diversa desta, e, muito menos, que fossem necessários para suportar outra decisão de direito diversa da proferida na sentença recorrida, pelo que padece de fundamento o invocado/alegado erro de julgamento por manifesto défice instrutório, por insuficiência de elementos de suporte à decisão de direito proferida na sentença recorrida.
3) Pelas razões aduzidas no ponto III das alegações do presente recurso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, é manifesto que a sentença recorrida não apenas decidiu de acordo com os factos apurados como, sobretudo, decidiu bem, ainda que essa decisão possa não agradar à Impugnada/Recorrente, padecendo, por isso, de fundamento o alegado erro de julgamento da matéria de facto.
4) Como atrás se referiu, o Tribunal a quo decidiu, quanto à matéria de facto, de acordo com aquela que foi a sua livre apreciação critica dos meios de prova carreados e produzidos nos autos, considerados suficientes e bastantes para, em cumprimento do ordenado pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, apurar quem foi o autor do preenchimento do quadro/campo 11 da declaração de inicio de actividade da Impugnante/recorrida, designadamente, para apurar se esse preenchimento foi efectuado por algum representante ou colaborador desta, a própria sentença recorrida, no que à matéria de facto provada diz respeito, espelha as razões e o processo logico-formal, que conduziram e em que se sustenta cada um dos factos nela dados como provado, maxime o que quanto a essas matéria deu como provado, a mesma espelha também as razões e o processo que, partindo dos factos dados como provados, conduz e fundamenta a decisão final de direito nela proferida, a qual está de acordo com aqueles factos, e à qual, em termos de direito, nada há a apontar, pelo que, estando a mesma devidamente fundamentada em termos de facto e de direito, deve a sentença recorrida ser confirmada e mantida nos seus exactos termos.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO,
Deve o recurso interposto pela Impugnada/Recorrente ser julgado improcedente, em consequência deve a sentença ora recorrida ser confirmada e mantida nos seus exactos termos, assim fazendo V. Exªs. a habitual JUSTIÇA. ”
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida enferma de nulidade, por falta de fundamentação, de exame crítico das provas e de discriminação da matéria de facto não provada, e se incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por défice instrutório e por ter considerado que a Administração Fiscal violou o dever de recíproca colaboração previsto no artigo 48.º do CPPT e o princípio da boa-fé.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“1 - Factos provados
Resulta do acórdão do TCAN que ordenou a baixa dos autos à 1ª instância que objecto da ampliação da matéria de facto é unicamente a questão de saber quem preencheu o campo 11 da declaração de início de actividade apresentada pela impugnante, pelo que se considera que a restante matéria considerada provada se mantém, visto que não foi impugnada.
Com interesse para a decisão consideram-se, pois, provados os seguintes factos:
A) A impugnante foi constituída como instituição particular de solidariedade social (IPSS), conforme publicação no Diário da República, III série, n.° 256, de 5 de Novembro de 1992 [fls. 77 do processo administrativo (P.A.) apenso aos autos];
B) A impugnante não tem fins lucrativos, vive dos donativos dos associados, bem como das comparticipações dos utentes a quem presta serviços no âmbito social e ainda de subsídios dos organismos adiante indicados em G), destinando-se as receitas a fazer face às despesas de funcionamento na luta contra a exclusão social - v. declaração do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social, de 9 de Outubro de 2001, a fis. 112 dos autos, os estatutos da impugnante a fls. 189 a 206 dos autos e os depoimentos das testemunhas B…, assistente social e Coordenadora na impugnante desde Junho de 2004, P…, Presidente da Câmara Municipal de Paços de Ferreira, uma das entidades que estiveram presentes na fundação da impugnante e F…, técnica oficial de contas (TOC) da impugnante;
C) Tendo construído o Centro Comunitário…, comparticipado em 60% pelo PIDAC e financiado pelo Montepio Geral mediante um empréstimo no montante de esc. 40 000 000$00 (v. fls. 101 a 111 e depoimentos de P…, Presidente da Câmara Municipal de Paços de Ferreira, uma das entidades que estiveram presentes na fundação da impugnante, e de F…, TOC da impugnante);
D) Pelo ofício n.° 119268, de 27 de Dezembro de 1994, que se dá por reproduzido, a Segurança Social comunicou à impugnante que esta não reunia as condições para adquirir o estatuto de IPSS (fls. 77 do P.A.; cfr. no mesmo sentido a declaração passada pelo Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social do Porto em 9 de Outubro de 2001, junta a fls. 112 dos autos);
E) E que para o conseguir a impugnante podia “optar por alterar/rectificar o acto de constituição, por forma a que os sócios fundadores sejam unicamente entidades particulares para o que será de celebrar nova escritura pública para este efeito” (último § do ofício n.° 119268 cit.);
F) Entretanto, o Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social do Porto emitiu, em 9 de Outubro de 2001, declaração atestando que “a instituição [ora impugnante] tem as suas actividades licenciadas através dos alvarás n.ºs 177 e 233, pelo que é considerada de utilidade social, nos termos do n.° 2 do artigo 6.º do Decreto Lei 133-A/97, de 30 de Maio” (fls. 112 dos autos);
G) Apesar de não ser considerada IPSS, a impugnante recebeu acordos de cooperação e verbas do PIDAC como se o fosse, bem como subsídios de organismos públicos, tais como o Centro Regional de Segurança Social, com os acordos dos Centros de Convívio, A.T.L., Jardins de Infância, Programa de Luta Contra a Pobreza, Centro de Emprego das “Univas, cursos de formação”, fundos comunitários, quando do Integrar (lis. 72 a 86 e depoimentos das testemunhas B…, assistente social e Coordenadora na impugnante desde Junho de 2004, P…, Presidente da Câmara Municipal de Paços de Ferreira, uma das entidades que estiveram presentes na fundação da impugnante e F…, técnica oficial de contas (TOC) da impugnante);
H) Aquando da entrega da declaração de início de actividade na Repartição de Finanças de Paços de Ferreira, acompanhada dos estatutos e Diário da República, foi explicado ao funcionário receptor em exercício o que a impugnante ia fazer, a actividade que exercia, o seu objecto social e de onde vinham as verbas que iria receber (depoimento de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade, e C…, escriturário no Gabinete de Contabilidade F…, que faz o tratamento contabilístico da impugnante);
I) Foram os serviços fiscais quem fez o enquadramento da impugnante no regime normal trimestral do IVA (depoimento de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade);
J) Depois da entrega da declaração de início de actividade, a impugnante passou a receber as declarações de IVA (depoimento de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade);
K) Tendo sempre recebido reembolsos trimestrais de IVA, com pedidos de garantias bancárias por parte dos serviços fiscais, as quais foram entregues e posteriormente canceladas (fls. 34 a 71 dos autos e depoimentos de B…, assistente social e Coordenadora na impugnante desde Junho de 2004, M…, funcionário administrativo na impugnante desde finais de 1998, que recebe declarações de IVA desde essa altura, e F…, TOC da impugnante);
L) Nos relatórios de aprovação de contas e orçamentos que eram enviados à Segurança Social estava sempre considerado o IVA recebido e o que se previa receber (documentos de fls. 72 a 86 dos autos e depoimento de F…, TOC da impugnante);
M) A impugnante foi notificada pelos serviços do IVA para pagar o montante de esc. 67 289 042$00, correspondente a IVA dos anos de 1996 a 2001 e respectivos juros compensatórios a que se referem as notas de liquidação de fls. 7 a 33, cujo teor se dá por reproduzido;
N) Tendo as liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios referentes ao ano de 1996 ocorrido em 13 de Novembro de 2001 (fls. 93 e 94) e as correspondentes notificações em 11 de Dezembro de 2001 (fls. 95 a 99 do P.A.);
O) O campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante.
Nada mais se provou com interesse para a decisão.
Motivação:
A prova dos factos levados ao probatório fundou-se nos documentos e nos depoimentos das testemunhas indicados em cada uma das alíneas dele - mais concretamente na circunstância de os referidos documentos não terem sido impugnados nem ostentarem quaisquer sinais que afectem a sua força probatória e de as testemunhas terem deposto de forma objectiva e segura.
A prova do facto elencado em O) do probatório baseia-se no que sobre a matéria adiante se dirá na fundamentação da decisão do mérito da impugnação.”

2. O Direito

Começa a Recorrente por imputar à sentença recorrida o vício de nulidade, por falta de fundamentação, de exame crítico das provas e de discriminação da matéria de facto não provada.
Iniciamos a nossa apreciação pela arguição de nulidade da sentença recorrida, de harmonia com o disposto no artigo 125.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Sustenta a Recorrente não existir qualquer discriminação dos factos considerados como não provados (e que tal é equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada).
O julgamento da matéria de facto é um momento essencial da realização da justiça constitucionalmente cometida aos tribunais. De acordo com o disposto no artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
O juiz tem, por isso, o dever de se pronunciar sobre a factualidade alegada e sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente e que se apresente relevante para a decisão, discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação crítica dos elementos de prova e especificando os fundamentos decisivos para a convicção formada - cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e, a título de exemplo, os Acórdãos deste Tribunal Central Administrativo Norte, proferidos em 27/02/2014, proc. n.º 409/06.6BEPNF; em 17/04/2015, proc. n.º 735/09.2BEPNF; em 30/04/2015, proc. n.º 36/05.5BEPNF; em 30/04/2015, proc. n.º 730/09.1BEPNF.
O actual regime do Código de Processo Civil (CPC) relativo à elaboração da sentença aproximou-se do regime que já vigorava no CPPT, consagrado no n.º 2 do artigo 123.º deste diploma; norma que, contudo, vai aparentemente mais longe que o artigo 607.º, n.º 4, do CPC, já que impõe que o juiz discrimine “a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões”.
A exigida discriminação dos factos provados e não provados é absolutamente essencial na sentença, pois que não existe outra peça processual que concretize tal julgamento da matéria de facto.
É, pois, a necessidade absoluta de julgamento da matéria de facto efectuada, no contencioso tributário, na própria sentença, que leva directamente à exigência da referida discriminação entre "a matéria provada da não provada" – cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, in «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», II volume, Áreas Editora, 2011, página 320, citando a declaração de voto do Senhor Conselheiro Dr. Brandão de Pinho proferida no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 07/05/2003, no processo n.º 0869/02.
É precisamente por ter sido eliminado o julgamento da matéria de facto, previsto no anterior artigo 653.º do CPC, que no regime actual do CPC se acolheu uma solução idêntica à prevista no CPPT.
Actualmente é, portanto, incontroverso que, na elaboração da sentença, quer em processo civil quer em processo tributário, o juiz deve declarar quais os factos que julga não provados.
Perfilhamos, no entanto, o entendimento de que o artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, não exige uma descrição textual e exaustiva de cada facto não provado, bastando-se com uma simples remissão que permita identificar com exactidão o facto ou os factos a que respeita, por exemplo para os artigos das peças processuais, que possibilite às partes ou a qualquer destinatário da sentença apreender com facilidade os factos que o julgador considerou não provados, visto que a falta da sua descrição textual pode facilmente ser suprida pela sua leitura/visualização na peça ou documento processual para onde a remissão é feita.
Obedecendo aos cânones impostos pelo artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil a norma é passível de interpretação no sentido de que o legislador do CPPT quis autonomizar a matéria provada da não provada, não impondo que esta seja obrigatoriamente descrita, ao prescrever que “o juiz discriminará também a matéria provada da não provada” (negrito nosso). Se outra fosse a sua intenção, isto é, se o fim visado com a norma fosse a discriminação da matéria provada e não provada, então por certo que a redacção que teria sido utilizada seria esta: “o juiz discriminará também a matéria provada e a não provada”. A discriminação é, pois, entre uma e outra e não uma discriminação das duas.
Isto é, o artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, deve ser interpretado no sentido de que a referência à matéria de facto não provada se basta com a declaração dos correspondentes factos, de modo semelhante à solução acolhida pelo actual Código de Processo Civil – neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 30/01/2014, proferido no âmbito do processo n.º 07160/13.
Ora, in casu, foi utilizada a seguinte formulação após a indicação dos factos provados - Nada mais se provou com interesse para a decisão.
Saliente-se que já o elenco dos factos provados tinha por base somente a matéria com interesse para a decisão, inculcando a ideia, por exclusão, que, com interesse para a decisão, não importou fixar factos não provados.
Vista a situação deste prisma, somente podemos afirmar que, quando muito, poderá a decisão da matéria de facto enfermar de erro de julgamento, mas não de nulidade, dado que resulta da formulação utilizada que inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
Por outro lado, nos termos do preceituado no artigo 668.º, n.º 1, alínea b), actual artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Para sustentar a conclusão BB das alegações de recurso a esse respeito, a Recorrente alerta para a falta de exame crítico das provas, o que implica a falta de fundamentação da sentença.
Exige-se, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida. “Não se trata, por conseguinte, de um mero juízo arbitrário ou de intuição sobre a realidade ou não de um facto, mas de uma convicção adquirida através de um processo racional, alicerçado - e, de certa maneira, objectivado e transparente - na análise criticamente comparativa dos diversos dados trazidos através das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações essencialmente determinantes da opção feita e cuja enunciação, por exigência legal, representa o assumir das responsabilidades do julgador inerentes ao carácter público da administração da Justiça” – cfr. J. Pereira Baptista, in Reforma do Processo Civil, 1997, pags 90 e ss.
O exame crítico da prova deve consistir, pois, na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro. O julgador não se deve limitar a uma simples e genérica indicação dos meios de prova produzidos (v.g. “prova testemunhal” ou “prova por documentos”), impondo-se-lhe que analise criticamente essa prova produzida. O tribunal deve justificar os motivos da sua decisão quanto à matéria de facto, declarando por que razão deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos, achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos particulares, etc. Quer dizer: não basta apresentar, como fundamentação, os simples meios de prova, v.g., “os depoimentos prestados pelas testemunhas e a inspecção ao local”, sendo necessária a indicação das razões ou motivos porque relevaram no espírito do julgador - cfr. António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, II Volume, 2ª, edição, a págs. 253 a 256.
Em suma, a fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto – cfr. Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, Vol. II, pág. 321.
Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade.
Como explicava já o Prof. Alberto dos Reis, no “Código de Processo Civil Anotado”, no seu volume V, na página 140, «(…) por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2 do artigo 668.º»
No processo judicial tributário, o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida em processo judicial tributário.
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida e do exarado quanto à fundamentação da matéria de facto e de direito da sentença do Tribunal “a quo”, é este fundamento do recurso manifestamente improcedente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme supra mencionado, consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
In casu, a justificação da convicção do Tribunal e do concreto juízo que formulou quanto à prova dos factos que levou ao probatório é feita no segmento designado “motivação”, que se apresenta bastante sucinta, e quanto ao facto vertido na alínea O) do probatório, a justificação apresenta-se mais pormenorizada, mas apresentada em simultâneo com a fundamentação de direito. Resumindo, o Tribunal recorrido aponta para a importância na formação da sua convicção os documentos ínsitos nos autos não terem sido impugnados e a prova testemunhal, salientando que as testemunhas depuseram de forma objectiva e segura.
Pelo seguinte conjunto de razões, o Tribunal “a quo” concluiu que o campo 11 da declaração de início de actividade entregue não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante:
A dissemelhança, no traço, da cruz (“x”) aposta no campo 11 em relação à colocada nos restantes campos do impresso modelo de declaração preenchidos é um indício que legitima a suposição de que as mesmas foram apostas por pessoas diferentes, confirmando, em alguma medida, a afirmação de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade, de que esta só parcialmente ia preenchida, fazendo todo o sentido que o campo 11 tenha sido preenchido pelo funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração (por caber à Administração Fiscal fazer o enquadramento no regime de IVA aplicável e por não se representar que outra pessoa o poderia ter feito) e os campos restantes ao sujeito passivo.
Sublinhe-se que a A.F. não nega o preenchimento do campo 11 da declaração, que lhe é imputado pela impugnante; limita-se a alegar que que o Serviço de Finanças de Paços de Ferreira informou que, atendendo ao tempo decorrido, não é possível saber quem preencheu o campo 11 da declaração em causa, mas que a responsabilidade pelo preenchimento da declaração é do sujeito passivo (cfr. o requerimento junto a fls. 313 dos autos).
Nestes termos, e independentemente da questão de saber se a fundamentação ínsita na sentença é ou não convincente, se está certa ou errada ou, ainda, se está incompleta por se verificar défice instrutório (questão que se situa no domínio da validade substancial da sentença, e não da sua validade formal), não pode dizer-se que ocorre a invocada nulidade.
Concluindo, improcedem as conclusões do recurso sobre a alegada nulidade da decisão recorrida.

Impugna, ainda, a Recorrente a decisão da matéria de facto, por padecer de erro de julgamento - por défice instrutório, por errada valoração da prova e por deficiente valoração dos factos dados como provados.
Este tribunal já havia conhecido o objecto de um anterior recurso nos presentes autos, tendo detectado, por acórdão proferido em 10/03/2016, a existência de défice instrutório, dado que a factualidade assente nessa sentença então anulada não permitia, com a amplitude necessária, verificar se estavam reunidas as diversas circunstâncias que subjazem ao princípio da tutela da confiança.
Efectivamente, na sua petição inicial a aqui Recorrida havia invocado que a declaração de início de actividade quando foi entregue só levou a parte da frente preenchida, e esta nem toda, e as assinaturas dos seus responsáveis, porque era uma situação nova; acrescentando que a cruz aposta no item correspondente às transmissões de serviços que conferem direito à dedução não foi aposta pela impugnante, nem a seu mando, apresentando-se em branco até ao pedido de informação ao funcionário que viria a receber a declaração – cfr. artigo 15.º, 16.º, 17.º, 18.º e 19.º da petição inicial.
Apesar de a declaração de início de actividade ter sido entregue pessoalmente pela técnica oficial de contas da impugnante, juntamente com o escriturário no gabinete de contabilidade “F…”, que fazia o tratamento contabilístico da impugnante, estando, em princípio, dotados dos conhecimentos técnicos para esse efeito; o certo é que resultará do probatório que poderão ter tido dúvidas no preenchimento da mesma, atenta a factualidade constante das alíneas A) a G).
Aí se considerou que a decisão proferida em primeira instância se apresentava deficiente, sendo indispensável a ampliação da decisão da matéria de facto, dado que faria toda a diferença apurar quem preencheu o referido quadro 11 da declaração de início de actividade – cfr. artigo 16.º da petição inicial.
A provar-se que grande parte da declaração de início de actividade, incluindo o quadro 11 da mesma, foi levado sem preenchimento para o serviço de finanças de Paços de Ferreira, que o contribuinte apresentou todos os documentos de que dispunha e esclareceu integralmente que operações iria praticar no âmbito da sua actividade, que foi a análise e informações dos serviços fiscais que levaram ao esclarecimento das dúvidas do contribuinte, não se revelando falhas na cooperação e nas informações prestadas pelo contribuinte e que não foi este que preencheu os campos em falta (não nos referimos àqueles que sempre seriam destinados ao uso exclusivo dos serviços); estaremos perante um quadro factual em que a actuação da AT conduziu, em concreto, à violação do equacionado princípio da boa-fé, dado que, perante o erro, liquidou o IVA em discussão nos presentes autos, em venire contra factum proprium, assumindo especiais contornos o princípio da tutela da confiança, devido à convicção da correcção do preenchimento da declaração de início de actividade, que foi sendo reforçada com as sucessivas restituições de IVA ao longo de todos estes anos (de 1996 a 2001).
Contudo, a factualidade antes assente não permitia, com a amplitude necessária, verificar se estavam reunidas as diversas circunstâncias que subjazem ao princípio da tutela da confiança, uma vez que o enquadramento da impugnante em regime do IVA sempre estaria acometido aos serviços da AT (cfr. quadro 10 da declaração de início de actividade: uso exclusivo dos serviços), pressupondo, previamente, que o declarante dê a conhecer à AT toda a actividade, conforme se exige nos restantes quadros da declaração, designadamente, no quadro 11 da declaração de início de actividade – daí a importância de apurar quem preencheu este quadro.
Sendo com este fito que foi determinada a remessa dos autos ao Tribunal “a quo” e, para tanto, fossem efectivadas as diligências probatórias que se mostrassem adequadas e necessárias ao esclarecimento, mais completo possível, desses aspectos apontados como deficitariamente instruídos, no sentido de averiguar esses factos, levando os mesmos ao probatório.
Nessa sequência, o Tribunal “a quo” notificou as partes para procederem à junção aos autos da declaração de início de actividade que tivessem em seu poder, bem como para esclarecerem quem preencheu o quadro 11 da supra citada declaração e porque o fizeram. Em resposta à notificação, a impugnante respondeu “que foi o Serviço de Finanças de Paços de Ferreira”, e o Serviço de Finanças informou não ser possível saber quem preencheu o quadro 11 da referida declaração, atendendo ao tempo decorrido, acrescentando que a responsabilidade pelo preenchimento da declaração é do sujeito passivo ora impugnante.
Com base unicamente nestas diligências, o Tribunal a quo procedeu à ampliação da matéria de facto, acrescentando apenas ao probatório a alínea O), da qual consta que “O campo 11 da declaração de início de actividade mencionada supra em H) não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante”.
Assim, ao invés de se apurar toda uma série de factos positivos, apenas se logrou provar um facto negativo. Mas, também se diga que era essencial apurar quem, realmente, preencheu o quadro 11 da declaração. E parece que o Tribunal recorrido assim entendeu, pois logo que constatou a impossibilidade de prova, com a certeza e segurança exigíveis, de quem terá aposto a cruz no quadro 11 da declaração, percebeu, e com razão, que a restante factualidade perdia pertinência.
Na verdade, era a concatenação de todos os factos - que grande parte da declaração de início de actividade, incluindo o quadro 11 da mesma, foi levado sem preenchimento para o serviço de finanças de Paços de Ferreira, que o contribuinte apresentou todos os documentos de que dispunha e esclareceu integralmente que operações iria praticar no âmbito da sua actividade, que foi a análise e informações dos serviços fiscais que levaram ao esclarecimento das dúvidas do contribuinte, não se revelando falhas na cooperação e nas informações prestadas pelo contribuinte – com a averiguação do efectivo preenchimento do quadro 11 da declaração (por quem) que permitiriam retirar ilações de facto e de direito.
Por isso, não censuramos que o Tribunal “a quo” se tenha ficado pelas diligências referidas, dado que a posição e resposta da AT inviabilizaram a utilidade de mais e melhor investigação. A informação do Serviço de Finanças de Paços de Ferreira é plausível e compreensível, atendendo ao tempo decorrido desde a recepção da declaração de início de actividade em 01/04/1993 – não surpreende não ser possível saber quem preencheu o quadro 11 da referida declaração.
Pelas razões que infra apontaremos, seria inútil apurar os restantes factos referidos na petição inicial, pelo que não se verifica o défice instrutório invocado pela Recorrente.
A concatenação das provas (testemunhal e documental), espelhada na fundamentação constante da sentença recorrida, permite o aditamento efectuado à decisão da matéria de facto, consubstanciado na alínea O), sem que se vislumbre qualquer erro ostensivo ou grosseiro na apreciação das provas produzidas:
“(…) Na prática, o enquadramento faz-se mediante a aposição de uma cruz (“x”) na quadrícula correspondente ao regime de IVA aplicável - na circunstância na quadrícula correspondente ao campo 11.
A dissemelhança, no traço, da cruz (“x”) aposta no campo 11 em relação à colocada nos restantes campos do impresso modelo de declaração preenchidos é um indício que legitima a suposição de que as mesmas foram apostas por pessoas diferentes, confirmando, em alguma medida, a afirmação de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade, de que esta só parcialmente ia preenchida, fazendo todo o sentido que o campo 11 tenha sido preenchido pelo funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração (por caber à Administração Fiscal fazer o enquadramento no regime de IVA aplicável e por não se representar que outra pessoa o poderia ter feito) e os campos restantes ao sujeito passivo.
Sublinhe-se que a A.F. não nega o preenchimento do campo 11 da declaração, que lhe é imputado pela impugnante; limita-se a alegar que que o Serviço de Finanças de Paços de Ferreira informou que, atendendo ao tempo decorrido, não é possível saber quem preencheu o campo 11 da declaração em causa, mas que a responsabilidade pelo preenchimento da declaração é do sujeito passivo (cfr. o requerimento junto a fls. 313 dos autos).
Por este conjunto de razões, conclui-se que o campo 11 do impresso não foi preenchido por qualquer representante da impugnante. (…)”
O princípio da livre apreciação das provas, contido no artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.
Por força do princípio da imediação, a tarefa de reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorre erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo.
Ora, a prova documental limita-se a espelhar que a declaração de início de actividade está assinada pelo responsável pela escrita e pelo Presidente da Direcção da impugnante, ora Recorrida.
Ressalta que as testemunhas terão prestado depoimento de forma objectiva e segura (cfr. motivação), cabendo nos padrões de racionalidade formar convicção com a afirmação de F…, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade, de que esta só parcialmente ia preenchida.
Logo, reiteramos que não se afigura um erro de julgamento palmar na matéria vertida na alínea O) do probatório.
Além do mais, a AT chega a admitir – cfr. conclusão EE das suas alegações – que a declaração em causa tivesse sido preenchida por pessoas diferentes.
Assim sendo, resta-nos apreciar o invocado erro de julgamento, com base numa, alegadamente, errada valoração dos factos dados como assentes e levados ao probatório.
Colhe-se do teor do relatório da inspecção tributária que a AT considerou a impugnante, face aos estatutos e à “publicação” no Diário da República, uma instituição particular de solidariedade social (IPSS) e, portanto, um sujeito passivo isento de IVA, por realizar operações isentas nos termos dos n.°s 7 e 8 do artigo 9.º do Código do IVA, pelo que só teria direito à restituição de IVA segundo o disposto no Decreto-Lei n.º 20/90, de 13 de Janeiro, e não nos termos gerais. O reembolso de IVA de que a impugnante beneficiou nos termos gerais foi consequência do seu errado enquadramento no regime normal trimestral, conforme assinalado na declaração de início de actividade.
Como resulta do probatório [cfr. alíneas A) a H)], apesar de a Recorrida ter sido constituída como IPSS em 1992, a sua natureza jurídica parece ter gerado algumas dúvidas; tanto que, em 1994, o Instituto da Segurança Social comunicou-lhe que não reunia as condições para ser caracterizada como IPSS, não se encontrando abrangida pelo Estatuto das IPSS – Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro. Faltar-lhe-ia a característica essencial: que tivesse sido constituída por iniciativa de particulares; dado que os sócios fundadores são representantes de organismos e entidades públicas, como por exemplo o Presidente da Câmara Municipal de Paços de Ferreira. Efectivamente, em 2001, o Instituto da Segurança Social considerou a instituição de utilidade pública, abrangida pelo Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de Maio (estabelece o regime de licenciamento e fiscalização dos estabelecimentos e serviços de apoio social do âmbito da Segurança Social), na medida em que tinha como objectivo desenvolver um projecto de luta contra a pobreza no concelho de Paços de Ferreira.
Ora, tendo em conta as valências e os fins prosseguidos, bem como o facto de a utilidade social desta instituição ter sido reconhecida pelas entidades competentes, sempre a Recorrida estaria isenta de IVA (e, portanto, sem direito a dedução – cfr. artigo 20.º, n.º 1, alínea a) do Código do IVA), por realizar operações isentas nos termos do n.º 8 do artigo 9.º do Código do IVA.
Tudo isto para dizer que a declaração de início de actividade ao indicar (no quadro 11), com referência do tipo de operações que efectua no exercício da sua actividade, transmissões de bens ou prestações de serviços que conferem o direito a dedução, enferma de claro erro, em violação do princípio da legalidade, pois, como vimos, a Recorrida realizava operações isentas de IVA.
Tradicionalmente, sempre se entendeu que o princípio da boa-fé somente operaria no âmbito do exercício de poderes discricionários, o que não seria o caso, dado que a situação concreta resulta de discricionariedade zero, ou seja, não existe qualquer margem de livre decisão perante um circunstancialismo de isenção de IVA, prevalecendo o princípio da legalidade.
Todavia, actualmente, deve entender-se que princípios como o da justiça - e da boa-fé - são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais (cfr., por todos, o Acórdão do STA, de 25/06/2008, recurso n.º 0291/08).
Foi neste pressuposto que se determinou a ampliação da decisão da matéria de facto, tendo em vista apurar factos invocados e depois efectuar a subsunção ao direito, tendo por objectivo apreciar o julgamento levado a cabo na primeira instância, assente no princípio da cooperação e da boa-fé entre AT e contribuinte.
Vejamos os termos desse julgamento:
“(…) Está, contudo, provado que quem fez o enquadramento foram os serviços da A.F. e que o fizeram apesar de os estatutos, o acto constitutivo e a “publicação” no Diário da República entregues juntamente com a declaração de início de actividade apontarem no sentido de a impugnante ser, ou, ao menos, parecer ser, uma IPSS e não obstante ter sido explicado pelo apresentante ao funcionário receptor o que a impugnante ia fazer, a actividade que exercia, o seu objecto social e de onde vinham as verbas que iria receber [v. as fontes indicadas supra em H) e I) do probatório].
Na prática, o enquadramento faz-se mediante a aposição de uma cruz (“x”) na quadrícula correspondente ao regime de IVA aplicável - na circunstância na quadrícula correspondente ao campo 11.
A dissemelhança, no traço, da cruz (“x”) aposta no campo 11 em relação à colocada nos restantes campos do impresso modelo de declaração preenchidos é um indício que legitima a suposição de que as mesmas foram apostas por pessoas diferentes, confirmando, em alguma medida, a afirmação de F…l, TOC da impugnante que entregou pessoalmente a declaração de início de actividade, de que esta só parcialmente ia preenchida, fazendo todo o sentido que o campo 11 tenha sido preenchido pelo funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração (por caber à Administração Fiscal fazer o enquadramento no regime de IVA aplicável e por não se representar que outra pessoa o poderia ter feito) e os campos restantes ao sujeito passivo.
Sublinhe-se que a A.F. não nega o preenchimento do campo 11 da declaração, que lhe é imputado pela impugnante; limita-se a alegar que o Serviço de Finanças de Paços de Ferreira informou que, atendendo ao tempo decorrido, não é possível saber quem preencheu o campo 11 da declaração em causa, mas que a responsabilidade pelo preenchimento da declaração é do sujeito passivo (cfr. o requerimento junto a fls. 313 dos autos).
Por este conjunto de razões, conclui-se que o campo 11 do impresso não foi preenchido por qualquer representante da impugnante.
Mas mesmo que tivesse sido a representante da impugnante a preencher o campo 11 da declaração (e só por erro o poderia ter feito, dados a sua natureza e o estatuto jurídico que lhe corresponde), o funcionário do Serviço de Finanças que recebeu o impresso tinha o dever, diante de toda a informação que lhe foi fornecida pela representante da impugnante, de tê-la alertado para o erro e corrigido o enquadramento - tudo por força dos princípios da cooperação e da boa fé.
Nem se diga que, sendo o preenchimento da declaração, incluindo o campo reservado à indicação do regime de IVA, da responsabilidade do contribuinte, a assinatura da declaração de início de actividade pela representante da impugnante significou, ou implicou, a aceitação pela impugnante do enquadramento feito pelos serviços da A.F. com base na opção assinalada no impresso modelo, com todas as consequências daí decorrentes. Porquê?
Por princípio, os serviços da A.F., melhor do que ninguém (pelo menos melhor do que o contribuinte comum) conhecem ou têm a obrigação de conhecer a legislação fiscal, que é, como se sabe, muito técnica, prolixa e instável, e portanto se a opção por um determinado enquadramento fiscal é ou não possível face à lei aplicável e às circunstâncias do caso, bem como as implicações, nomeadamente em termos da existência ou não do direito ao reembolso de IVA e das condições do seu exercício.
Têm, por isso, em todos os casos, a obrigação, decorrente do dever de recíproca colaboração entre a A.F. e os contribuintes (art.°s 7º do CPA e 48° do CPPT), de esclarecer os contribuintes, oficiosamente ou a requerimento, sobre a existência, conteúdo e alcance dos seus direitos, bem como sobre as condições e implicações do seu exercício.
Se o contribuinte, por desconhecer a lei ou por ter dúvidas sobre o seu sentido e alcance, confiou nas informações que os serviços da A.F. lhe prestaram e estas se vieram a revelar erradas, não pode, razoavelmente, imputar-se o erro ao contribuinte, mormente quando ele forneceu aos serviços, como na circunstância forneceu, as informações e elementos necessários para, numa análise cuidada dos dados de facto e de direito da situação, prestarem uma informação correcta.
Num semelhante cenário, a A.F. não pode “pôr-se de fora”, refugiando-se no argumento formal de que ao preencher a declaração o sujeito passivo assume a responsabilidade pelo que nela é declarado, mais a mais quando o sujeito, aqui impugnante, nega ter sido ele quem preencheu o campo 11 da declaração. Para fazer o enquadramento, a A.F. não deve limitar-se a apreciar a correcção formal do preenchimento do impresso; deve, ao invés, confrontar o declarado no impresso com toda a informação, documental e verbal, que lhe seja fornecida pelo contribuinte (informação complementar, extra-declaração), a fim de avaliar a coerência, a veracidade ou a plausibilidade do declarado no impresso e escolher o enquadramento legal adequado.
Se é verdade que a escolha do tipo de enquadramento em termos de IVA cabe, em princípio, ao contribuinte, também o é que o erro no enquadramento verificado no impresso oficial próprio, em desconformidade com informação complementar fornecida pelo contribuinte só à A.F. pode ser imputado.
Por isso, as consequências do errado enquadramento da impugnante no regime normal trimestral, traduzidas na indevida restituição do IVA, só à A.F. podem ser imputadas.
Na situação em pauta, é de presumir que a convicção da impugnante na correcção do enquadramento operado pelos serviços da A.F. se fosse reforçando com as sucessivas e “pacíficas” restituições de IVA ao longo dos anos.
Exigir agora o imposto seria abuso do direito, na espécie venire contra factum proprium, violador do princípio da boa fé (art°s 266°, n.° 2, da Constituição e 6°-A do CPA, ou pelo menos do princípio da tutela da confiança, tanto mais quanto é certo que a impugnante, por não ser IPSS, mas simples “instituição de utilidade social”, não tem direito à restituição de IVA ao abrigo do Decreto-Lei n.° 20/90, de 13 de Fevereiro, mesmo nesta última qualidade. Com efeito o art.° 2° deste diploma só confere o direito à restituição do IVA às IPSS e apenas quanto às “aquisições de bens e serviços relacionados com a construção, manutenção e conservação de imóveis utilizados total ou principalmente na prossecução dos fins estatutários (...)” e “desde que constantes de facturas de valor não inferior a 200 000$00, com exclusão do IVA”. (…)”
No fundo, está em causa sindicar a valoração que foi efectuada dos factos apurados e determinar se os mesmos se podem subsumir a violação do princípio da boa-fé no relacionamento da Administração Tributária com a aqui Recorrida, ao não reconhecer o exercício do direito à dedução, verificando se haviam sido criadas legítimas expectativas nesse sentido.
Como apontam Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 3ª ed., anotação 1 ao artigo 55.º, pp. 235/236) «Toda a actividade da administração tributária deve subordinar-se ao interesse público que, relativamente ao sistema fiscal, consiste, em primeira linha, na obtenção de receitas para satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades (art. 103°, n° 1, da CRP). E por força do preceituado no art. 266° da CRP, esta actividade tem de ser levada a cabo em subordinação à Constituição e à lei e deve respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos (princípio da legalidade) e os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé», sendo que apesar de o art. 55º da LGT omitir a referência a este princípio da boa fé «a sua aplicação é imposta por aquela norma constitucional e a própria LGT supõe a sua observância no âmbito do princípio da colaboração entre a administração tributária e os contribuintes (art. 59°) e concretiza a sua aplicação ao estabelecer o regime das informações vinculativas (art. 68°).» [Segundo estes mesmos autores a inclusão deste princípio na LGT estava prevista na lei de autorização legislativa em que o Governo se baseou para a aprovar (n.º 10 do artigo 2.º da Lei n.º 41/98, de 4/8)].
A este princípio da boa-fé se refere, ainda, o artigo 6.º-A do CPA, cujo n.º 2 «esclarece factores a atender na apreciação do cumprimento das regras da boa-fé, prescrevendo que devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa e o objectivo a alcançar com a actuação empreendida. Esta exigência tem um conteúdo de carácter ético, impondo aos intervenientes no procedimento tributário que actuem com lealdade e sinceridade recíprocas no decurso do procedimento tributário, abstendo-se de actuações que possam enganar o outro interveniente, ou ocultando-lhe elementos que possam ter proveito para a defesa das suas posições.» (ob. cit., pag. 278).
Daí que o n.º 1 do artigo 48.º do CPPT, concretizando os deveres de colaboração da AT com os contribuintes, estabeleça que aquela «… esclarecerá os contribuintes e outros obrigados tributários sobre a necessidade de apresentação de declarações, reclamações e petições e a prática de quaisquer outros actos necessários ao exercício dos seus direitos, incluindo a correcção dos erros ou omissões manifestas que se observem.» e que o nº 2 do mesmo artigo estabeleça que «O contribuinte cooperará de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso.», sendo que a violação, por parte da AT, dos deveres procedimentais de colaboração e de actuação segundo as regras da boa fé, pode consistir em vício autónomo de violação de lei (cfr. Jorge de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, anotação 7 ao art. 48º, p. 413).
Como corolário do princípio da colaboração da Administração, em geral, com os particulares (cfr. artigo 7.º, do Código de Procedimento Administrativo), o artigo 59.º, n.º 3, alínea e) da Lei Geral Tributária prevê a cooperação da Administração Tributária com os contribuintes consubstanciada, além do mais, na emissão de informação vinculativa sobre situações tributárias concretas (cfr. artigo 68.º, da LGT).
Nos termos da lei (cfr. artigo 57.º, n.º 1, do CPPT), uma vez prestada a informação sobre a situação do contribuinte, ficam os serviços tributários vinculados a não proceder de forma diversa, caso se verifiquem os factos identificados e previstos na lei, salvo em cumprimento de decisão judicial. O CPPT não fixa qualquer prazo de validade à informação prestada, é preciso notar que ela tem, no entanto, dois termos de referência. Por um lado, ela reporta-se aos factos enunciados pelo contribuinte; por outro, reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços. Assim, a informação prestada perde qualquer validade se os factos ocorrerem em termos diversos daqueles que foram apresentados aos serviços, nomeadamente se ocorrerem com contornos que lhe tenham sido ocultados. Do mesmo modo, a informação prestada perde validade se as normas jurídicas que serviram à qualificação tributária dos factos vierem, entretanto, a ser alteradas. Por último, se a Fazenda Pública proceder de forma diversa do sentido que constar de informação vinculativa prestada, o acto que praticar enfermará de vício de violação de lei, sendo gerador da sua anulabilidade (cfr. acórdão do TCA Sul-2ª.Secção, de 22/11/2011, proc.3013/09 e acórdão, também do TCA Sul, de 10/07/2014, proferido no âmbito do processo n.º 07558/14; Sérgio Vasques, O Mecanismo da Informação Vinculativa, C.T.F. 397, Jan/Mar 2000, pág.118 e 119; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª.edição, 2012, pág.622 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª. edição, Coimbra Editora, 2007, pág.204 e seg.).
Relembramos, então, que o regime legal actual da emissão de informações vinculativas está previsto nos artigos 68.º da LGT e 57.º do CPPT.
A Administração Tributária, com a emissão de uma informação vinculativa, não fica obrigada ao seu cumprimento em relação a todas as situações que se lhe colocam dentro do objecto dessa mesma orientação. Pelo contrário, a vinculação da Administração Tributária ao teor das mesmas é uma vinculação inter-partes, pois somente em relação ao caso em concreto objecto do pedido a Fazenda Pública não pode proceder em sentido diverso da informação prestada, ressalvado o cumprimento de decisão judicial, conforme aludido supra. Regime diferente existe para as informações genéricas proferidas pela Administração Tributária sobre a interpretação das normas tributárias que estejam em vigor no momento do facto tributário, relativamente às quais, nos termos do artigo 68.º-A, n.º 1, da LGT, a Administração Tributária fica vinculada ao seu cumprimento em relação a todas as situações que se lhe colocam dentro do objecto dessa mesma orientação – cfr. o referido acórdão do TCA Sul, de 10/07/2014, proferido no âmbito do processo n.º 07558/14.
As informações vinculativas têm em conta as circunstâncias e as situações concretas colocadas por cada sujeito passivo, sendo prestadas atendendo a cada caso. Não resulta dos autos que a ora Recorrida tenha solicitado, para a sua situação específica, qualquer informação vinculativa; no entanto, não chocaria equiparar-se a uma informação vinculativa de que a Recorrida poderia exercer o direito à dedução, se se tivesse provado que foi o dirigente máximo do serviço que teria aposto “a cruz” no quadro 11 da declaração de início de actividade, na sequência de transmissão pela Recorrida de toda a factualidade pertinente à avaliação do seu caso concreto.
A factualidade que resultou provada [cfr. alínea H)] limitou-se ao apuramento de que, aquando da entrega da declaração de início de actividade na Repartição de Paços de Ferreira, acompanhada dos estatutos e Diário da República, foi explicado ao funcionário receptor em exercício o que a impugnante ia fazer, a actividade que exercia, o seu objecto social e de onde vinham as verbas que iria receber, resultando, ainda, que tal declaração foi entregue pessoalmente pela TOC da Recorrida e que o campo 11 da mesma não foi preenchido por qualquer representante ou colaborador da impugnante [cfr. alínea O)].
Em face desta factualidade, desconhece-se quem preencheu o quadro 11 da declaração, não podendo retirar-se a ilação, como se realiza na sentença recorrida, que faz todo o sentido que o campo 11 tenha sido preenchido pelo funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração. Falham a segurança e certeza exigíveis, pelo que jamais podemos apontar para a existência de uma informação vinculativa, tanto mais que se desconhece a intervenção do dirigente máximo do serviço – cfr. artigo 68.º da LGT.
A sentença recorrida fundamenta que a AT não nega o preenchimento do campo 11 da declaração, que esta só parcialmente ia preenchida e que foi o técnico oficial de contas, em representação da ora Recorrida, que se dirigiu ao Serviço de Finanças de Paços de Ferreira, que terá obtido a informação de que o imposto a pagar, em sede de IVA, seria dedutível. Acrescentou caber à AT fazer o enquadramento no regime de IVA e, por não representar que outra pessoa o poderia ter feito, concluiu que terá sido o funcionário do Serviço de Finanças que recebeu a declaração que terá preenchido o quadro 11.
Em suma, como este tribunal “a quem” não aceita que se tenha logrado provar quem efectivamente preencheu um campo da declaração cujo preenchimento é da responsabilidade do sujeito passivo, tudo se resume a eventual obtenção de informação favorável ao exercício do direito à dedução.
Ora, ainda assim, impõe-se analisar se tal confiança nas informações que a AT terá prestado, e que vieram a revelar-se erradas, pode contender com eventual violação do princípio da boa-fé.
Embora a jurisprudência do STA acentuasse a impossibilidade de o princípio da boa-fé ser aplicável em caso de actos praticados no exercício de poderes vinculados (pois que, nessa circunstância, o princípio da legalidade se sobrepõe a quaisquer outros princípios, que, por isso, só poderão gerar vício autónomo de violação de lei no domínio do exercício de poderes discricionários – cfr. por exemplo, o Acórdão de 26/10/94, recurso n.º 17626, in Ap. DR de 20/01/97, pp. 2395 e ss), a relevância deste princípio não se esgota nos actos praticados no exercício de poderes discricionários, tendo vindo a ser colocada a da possibilidade da sua aplicação em caso de actos praticados também no exercício de poderes vinculados.
No acórdão da Secção do Contencioso Tributário do STA, de 17/05/2000, recurso n.º 024382 (Ap. DR, de 23/12/2002, Vol. II, Maio, pp. 1940 a 1946), reconheceu-se, aliás (ainda antes da entrada em vigor do CPPT), a vigência deste princípio no procedimento tributário por aplicação directa das normas constitucionais que consagram quer o princípio da boa-fé quer o da protecção da confiança, que o Tribunal Constitucional sempre tem considerado ínsito na ideia de Estado de Direito Democrático (artigo 2.º da CRP).
E, na verdade, dado que «… o texto do art. 266º da C.R.P. não deixa entrever qualquer restrição à sua aplicação a qualquer tipo de actividade administrativa (…) em princípio, dever-se-á fazer tal aplicação, se não se demonstrar a sua inviabilidade» (Diogo Leite de Campos e outros, loc. cit., pag. 250), sendo que também Jorge Miranda e Rui Medeiros «referem que o princípio permite afastar soluções legais expressas que conduzam, em concreto, a uma violação da boa-fé». (Constituição da República Anotada, tomo III, pag. 575).
Trata-se da aplicação dos chamados princípios da juridicidade substancial, que estão explicitados na lei e na Constituição (cfr. Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 8ª ed., Almedina, 2006, pag. 469).
Com efeito, na densificação do referido princípio da actividade administrativa relevam sobretudo dois subprincípios concretizadores da boa-fé: o princípio da primazia da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança.
Ora, a respeito destes subprincípios Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo I, 1ª ed. pp. 214/216), referem o seguinte:
“«O princípio da boa-fé está consagrado no art. 266°, 2 CRP e no art. 6°-A CPA, que alargou o seu âmbito subjectivo de aplicação, de modo a vincular não apenas a administração mas também os particulares que com ela se relacionem. Tendo em conta a origem da sua positivação, não admira que a densificação deste princípio no CPA tenha sido muito influenciada pela construção dogmática empreendida no direito civil por A. Menezes Cordeiro (Da boa fé no direito civil), que identifica dois subprincípios concretizadores da boa fé: o princípio da primazia da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança. (…)
O princípio da primazia da materialidade subjacente exprime a ideia de que o direito procura a obtenção de resultados efectivos, não se satisfazendo com comportamentos que, embora formalmente correspondam a tais objectivos, falhem em atingi-los substancialmente. Este princípio proíbe, por exemplo, o exercício de posições jurídicas de modo desequilibrado ou o aproveitamento de uma ilegalidade cometida, pelo próprio prevaricador, de modo a prejudicar outrem. É a isto que o artigo 6.º-A, n.º 2, b) do CPA se quer referir quando afirma que se deve ponderar «o objectivo visado com a actuação empreendida».
Já o princípio da tutela da confiança «visa salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem.
É a isto que o artigo 6.º-A, n.º 2, alínea a) do CPA se refere quando afirma que se deve ponderar «a confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa».
A tutela da confiança pressupõe a verificação de diversas circunstâncias: primeira, uma actuação de um sujeito de direito que crie a confiança, quer na manutenção de uma situação jurídica, quer na adopção de outra conduta; segunda, uma situação de confiança justificada do destinatário da actuação de outrem, ou seja, uma convicção, por parte do destinatário da actuação em causa, na determinação do sujeito jurídico que a adoptou quanto à sua actuação subsequente, bem como a presença de elementos susceptíveis de legitimar essa convicção, não só em abstracto mas em concreto; terceiro, a efectivação de um investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento de acções ou omissões, que podem não ter tradução patrimonial, na base da situação de confiança; quarto, o nexo de causalidade entre a actuação geradora de confiança e a situação de confiança, por um lado, e entre a situação de confiança e o investimento de confiança, por outro; quinto, a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou. Estes pressupostos devem ser encarados de modo global: a não verificação de um deles será em princípio relevante, mas pode ser superada pela maior intensidade de outro ou por outras circunstâncias pertinentes (por exemplo, em certos casos, o decurso de grandes lapsos temporais).»”
Embora, actualmente, como referimos, se deva entender que princípios como o da boa-fé são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais, urge, antes de mais, analisar se a factualidade apurada se enquadra nas várias circunstâncias referidas supra e, portanto, se é susceptível de se subsumir a violação da tutela da confiança.
A factualidade apresenta-se um pouco vaga e genérica, pois está vertido somente que foi explicado ao funcionário receptor da declaração a actividade que a impugnante ia exercer, o seu objecto social e de onde vinham as verbas que iria receber, acompanhando a declaração os estatutos e Diário da República.
Como elencamos supra, tem que existir uma convicção, por parte do destinatário da actuação em causa, na determinação do sujeito jurídico que a adoptou quanto à sua actuação subsequente, bem como a presença de elementos susceptíveis de legitimar essa convicção, não só em abstracto mas em concreto.
Ora, in casu, desconhecemos os termos em que a técnica oficial de contas apresentou a situação, mesmo porque a circunstância oral limita a averiguação do detalhe com que foi apresentado o caso concreto. Note-se que só mediante a exposição da situação concreta, com os pormenores necessários ao cabal e total entendimento do caso, seria possível formar a referida convicção.
A factualidade provada não se apresenta de molde a permitir aferir eventual violação da tutela da confiança e, consequentemente, do princípio da boa-fé.
De todo o modo, sempre se dirá, chamando novamente à colação as informações vinculativas, não ser por acaso que o artigo 68.º da LGT se refere a informações escritas prestadas aos contribuintes e que o pedido de informação deve ser acompanhado da identificação dos factos cuja qualificação jurídico-tributária se pretenda. Lembramos que a LGT concretiza a aplicação do princípio da boa-fé ao estabelecer o regime das informações vinculativas.
No caso concreto, ficaria sempre a dúvida acerca do teor da consulta efectuada pela técnica oficial de contas junto do funcionário que recebeu a declaração e, detalhadamente, o que lhe foi explicado pela TOC. Tendo-se tratado de uma abordagem oral, apresenta-se muito difícil a formação de convicção por parte deste tribunal, com a segurança e certeza exigíveis, acerca dos dados e factos realmente transmitidos ao funcionário receptor da declaração, inviabilizando retirar ilações acerca de eventual confiança que se tenha formado na técnica oficial de contas.
Salientamos, novamente, não constar dos autos qualquer elemento comprovativo de que a Recorrida tenha formalizado pedido de informação vinculativa, com a identificação dos factos cuja qualificação jurídico-tributária pretendia.
Por outro lado, a declaração foi apresentada em 01/04/1993 e logo, em 27/12/1994, a Segurança Social comunicou à Recorrida que não reunia as condições para adquirir o estatuto de IPSS e que podia optar por alterar/rectificar o acto de constituição, por forma a que os sócios fundadores sejam unicamente entidades particulares – cfr. alíneas D) e E) do probatório.
Nesta conformidade, qualquer informação que possa ter sido prestada à TOC pelo serviço de finanças com base na constituição da Recorrida como IPSS, assente na publicação de 1992, exibida no momento, do Diário da República [cfr. alínea A) do probatório], deixou de induzir qualquer confiança no exercício do direito à dedução; tanto mais que, em 09/10/2001, a mesma entidade competente atestou ser a aqui Recorrida instituição de utilidade social – cfr. alínea F) do probatório.
Na verdade, os factos provados não permitem percepcionar que a Administração Tributária tenha criado, efectivamente, legítimas expectativas no sentido de a Recorrida ter direito à dedução do IVA. E se as mesmas, por hipótese, tivessem sido formadas aquando da apresentação da declaração de início de actividade, logo foram dissipadas, dado que a comunicação da Segurança Social, em 1994, interrompeu qualquer expectativa criada por alteração dos factos; não sendo a Recorrida merecedora de tutela da confiança.
Ora, tendo em conta as valências e os fins prosseguidos [cfr. alínea B) do probatório], bem como o facto de a utilidade social desta instituição ter sido reconhecida pelas entidades competentes, a Recorrida estava isenta de IVA e, portanto, sem direito a dedução [artigo 20.º, n.º 1, alínea a) do código do IVA], por realizar operações isentas nos termos do n.º 8 do artigo 9.º do Código do IVA; prevalecendo, no contexto vindo a expor, o princípio da legalidade.
A intervenção da AT, no momento da declaração do início de actividade dos contribuintes [o quadro 10 é reservado ao preenchimento por parte dos serviços da AT (“uso exclusivo dos serviços”), onde se efectua, nomeadamente, o enquadramento do contribuinte no regime do IVA (“enquadramento definido pelo serviço de finanças em IVA”)], tem por base a realidade que lhe é apresentada pelos interessados (além do mais, o preenchimento do quadro 11; correspondendo as declarações aí prestadas à verdade e não omitindo qualquer informação pedida), incumbindo-lhe sempre proceder às correcções necessárias em momento posterior, sempre que verifique ter ocorrido uma desconformidade que implique o não pagamento, ou pagamento de menos imposto, do que aquele que seria devido, com o limite coincidente com o momento do fim do prazo a que alude o artigo 45.º da LGT.
Nestes termos, impõe-se conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, mantendo a decisão administrativa, julgar a impugnação improcedente.

Conclusões/Sumário

I – O princípio da livre apreciação das provas, contido no artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.
II - Por força do princípio da imediação, a tarefa de reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorre erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo.
III - Estão isentas de IVA as prestações de serviços e as transmissões de bens estreitamente conexas, efectuadas no exercício da sua actividade habitual por creches, jardins de infância, centros de actividade de tempos livres, estabelecimentos para crianças e jovens desprovidos de meio familiar normal, lares residenciais, casas de trabalho, estabelecimentos para crianças e jovens deficientes, centros de reabilitação de inválidos, lares de idosos, centros de dia e centros de convívio para idosos, colónias de férias, albergues de juventude ou outros equipamentos sociais pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou instituições particulares de solidariedade social ou cuja utilidade social seja, em qualquer caso, reconhecida pelas autoridades competentes – cfr. artigo 9.º, n.º 8 do Código do IVA.
IV – Só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas – cfr. artigo 20.º, n.º 1 alínea a) do Código do IVA.
V - Como corolário do princípio da colaboração da Administração, em geral, com os particulares (cfr. artigo 7.º, do Código de Procedimento Administrativo), o artigo 59.º, n.º 3, al. e), da Lei Geral Tributária, prevê a cooperação da Administração Tributária com os contribuintes consubstanciada, além do mais, na emissão de informação vinculativa sobre situações tributárias concretas (cfr. artigo 68.º da Lei Geral Tributária).
VI - Nos termos da lei (cfr. artigo 57.º, n.º 1, do C.P.P.T.), uma vez prestada a informação sobre a situação do contribuinte, ficam os serviços tributários vinculados a não proceder de forma diversa, caso se verifiquem os factos identificados e previstos na lei, salvo em cumprimento de decisão judicial. O C.P.P.T. não fixa qualquer prazo de validade à informação prestada, é preciso notar que ela tem, no entanto, dois termos de referência. Por um lado, ela reporta-se aos factos enunciados pelo contribuinte; por outro, reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços.
VII - A informação prestada perde qualquer validade se os factos ocorrerem em termos diversos daqueles que foram apresentados aos serviços, nomeadamente se ocorrerem com contornos que lhe tenham sido ocultados. Do mesmo modo, a informação prestada perde validade se as normas jurídicas que serviram à qualificação tributária dos factos vierem, entretanto, a ser alteradas. Por último, se a Fazenda Pública proceder de forma diversa do sentido que constar de informação vinculativa prestada, o acto que praticar enfermará de vício de violação de lei, sendo gerador da sua anulabilidade.
VIII - Por força do preceituado no artigo 266.° da Constituição da República Portuguesa, a actividade da administração tributária tem de ser levada a cabo em subordinação à Constituição e à lei e deve respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos (princípio da legalidade) e os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
IX - Actualmente, deve entender-se que princípios como o da justiça e da boa-fé são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais.
X - Na densificação do princípio da actividade administrativa relevam sobretudo dois subprincípios concretizadores da boa-fé: o princípio da primazia da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança.
XI - A Lei Geral Tributária concretiza a aplicação do princípio da boa-fé ao estabelecer o regime das informações vinculativas.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação improcedente.
Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias.
Porto, 10 de Maio de 2018
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro


(1) Citando Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, in Direito Administrativo Geral, Tomo 1, 1ª edd., pp. 214/216.