Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01116/11.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/25/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
GERÊNCIA DE FACTO
Sumário:I) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual art. 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
II) A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr. objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr. arts. 260º nº 1 e 409º nº 1 do Código das Sociedades Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.
III) A gerência realizada através de procuração dos gerentes a terceiro, porque os actos praticados pelo mandatário se reflectem na esfera jurídica do mandante, tem de considerar-se gerência de facto, verificando-se que o Recorrente admite que a sociedade terá desenvolvido o seu giro normal em função da actividade do identificado mandatário, tendo como pano de fundo a procuração outorgada pelo Recorrente, o que significa que os elementos presentes nos autos permitem a conclusão de que o ora Recorrente foi gerente de facto da sociedade, sendo que os elementos que o mesmo aponta no sentido de afastar a sua ligação à sociedade não apresentam qualquer valor na medida em que existia um terceiro por si mandatado para o efeito e que protagonizava todos esses actos, além de que o entendimento de que a mera emissão de procuração desresponsabilizaria o oponente conduziria ao afastamento deliberado e unilateral da responsabilidade subsidiária dos gerentes ou administradores de empresas ou sociedades de responsabilidade limitada pois, continuando embora gerentes ou administradores de direito, facilmente afastariam a responsabilidade subsidiária outorgando procuração para o exercício de tais funções, ou seja, estava assim encontrada a fórmula legal para beneficiar de uma actividade sem ter de arcar com os correspondentes riscos.
IV) A partir daqui, analisada a matéria de facto provada, constata-se que ficou por provar uma realidade susceptível de evidenciar um tal exercício efectivo dos poderes de administração por parte do ora Recorrido, sendo que, repete-se, quem estava onerado com o peso da prova era a Fazenda Pública, por isso que, como já referimos, o exercício efectivo da administração é facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efectivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:B...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 28-06-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por B... na presente instância de OPOSIÇÃO relacionada com a execução originariamente instaurada contra a sociedade “C… Cerâmicas, Lda.”, e revertida contra o aludido B…, por dívida referente a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do 1.º trimestre de 2008, no valor de € 9.832,64.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 181-186), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
A- Vem o presente recurso interposto contra a sentença proferida nos presentes autos que julgou a oposição procedente e, em consequência extinguiu a execução revertida contra o oponente.
B- O Tribunal ad quo decidiu no sentido de que o oponente “…a AT não fez prova de que o Oponente exerceu de facto a gerência da primitiva devedora no período temporal relevante (2008), deve essa falta de prova contra si ser valorada, concluindo-se pela inverificação dos pressupostos legais da responsabilização subsidiária do Oponente, que é, por isso, parte ilegítima na execução …”
C- A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, pois a prova testemunhal produzida demonstrou que o oponente exerceu de facto a gerência na sociedade devedora originária no ano de 2008.
D- A assinatura do oponente nos cheques, bem como nos contratos que a sociedade celebrava, vinculavam a sociedade, sendo atos puros de gerência.
E- O depoimento da testemunha arrolada pelo recorrido permitiu apreender que o ora recorrido praticou atos de representação em nome da sociedade devedora originária, e permitiu estabelecer um fio condutor no que respeita ao envolvimento do oponente na vida da sociedade, pelo que temos de concluir que fica demonstrada a prática de atos em representação da sociedade, como forma de assegurar o giro comercial da mesma.
F- Tendo em conta as norma reguladoras do cheque, o facto do oponente assinar cheques da devedora originária significa que detinha poderes de representação e de vinculação da sociedade.
G- A assinatura dos cheques por parte do recorrido consubstancia a prática de atos relevantes de gestão, que não podem ser descurados ou relativizados, pois ao assinar os referidos cheques relativos à devedora originária, fá-lo voluntariamente, mesmo fazendo-o a solicitação do irmão, tal quer dizer que o oponente assume que tem funções de representação da devedora originária.
H- A gerência é, por força da lei e salvo situações excecionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir atuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito, pelo que, o gerente goza assim de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade, e se os atos praticados por aquele respeitar às relações da sociedade com terceiros estamos no campo dos poderes representativos.
I- Entende a Fazenda Pública que a fatualidade provada, com a prova testemunhal, impõe a conclusão de que o oponente exerceu a gerência de facto na devedora originária no período temporal em causa nos autos, razão porque é responsável subsidiário pelas dívidas revertidas.
J- Conceber que sejam criadas sociedades em que se nomeiam gerentes para a prática de atos de representação da sociedade, praticando atos concretos e próprios de representação e vinculação da sociedade devedora (assinatura de cheques), sem que se retirem as devidas consequências, isto é, desresponsabilizando o seu autor, constitui uma contradição inaceitável, no que reside o erro de julgamento a que nos vimos reportando, e que, do nosso ponto de vista, padece a sentença recorrida.
K- Deste modo, deve ser alterado o item 10 do probatório passando a ter a seguinte redacção:
- “ O oponente foi gerente de facto da “C... Cerâmicas, Lda.”, na medida em que praticou actos de gerência da sociedade, manifestada na assinatura dos cheques da devedora originária, documentos estes necessários ao giro comercial da sociedade e atividade típica de gerência”.
L- Sendo a divida exequenda proveniente de IVA de 2008, ganha particular relevância o disposto no artigo 24º da LGT que atribui a responsabilidade subsidiária tributária dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos das pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados, ainda que exerçam somente de facto funções de administração ou gestão naquelas, pelas dividas tributárias cujo facto constitutivo, ou prazo legal de pagamento ou entrega se tenha verificado no período em que exerceram o cargo.
M- O oponente foi revertido com o fundamento no nº 1 alínea b) do artigo 24º da LGT, como se pode aferir do despacho que ordena a reversão, datado de 22/10/2010, pelo que incumbia ao oponente provar que a falta de pagamento das dividas tributárias vencidas durante a sua gerência não lhe podia ser imputada, porque a inexistência ou insuficiência de bens na empresa que geriu não é da sua responsabilidade.
N- O recorrido não fez essa prova.
O- A douta sentença incorreu, pois, em nosso entender, em erro de julgamento sobre a matéria de facto, e ainda em erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciado este em errada interpretação e aplicação das normas legais citadas, violando o disposto no artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, pelo que não se deverá manter no ordenamento jurídico.
Termos em que,
Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.”

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento ao nível da matéria de facto e em saber se o Recorrido exerceu a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que para tal foi nomeado e em que nasceu a dívida exequenda identificada nos autos de molde a poder ser responsabilizado pelo pagamento da mesma.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. Em 05/08/2008, o Serviço de Finanças de Vila do Conde instaurou contra a sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, o processo de execução fiscal n.º 1902200801078267, para cobrança coerciva de dívida respeitante a IVA do 1.º trimestre de 2008, na quantia exequenda de € 9.832,64 – cfr. fls. 21 do processo físico.

2. Em 31/03/2009, foi junta aos autos certidão da Conservatória do Registo Comercial, referente à sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, de onde constam, além do mais, as seguintes inscrições:
«AP. 14/20000328 CONTRATO DE SOCIEDADE E DESIGNAÇÃO DE MEMBRO(S) DE ÓRGÃO(S) SOCIAIS
FIRMA: C... CERÂMICAS, LDA.
(…)
OBJECTO: Comércio a retalho de material de bricolage, equipamento sanitário, ladrilhos e materiais similares
CAPITAL: 49.879,78 Euros
SÓCIOS E QUOTAS:
QUOTA: 24.939,89 Euros
TITULAR: J…
(…)
QUOTA: 12.469,94 Euros
TITULAR: B...
(…)
QUOTA: 12.469,94 Euros
TITULAR: R...
(…)
FORMA DE OBRIGAR/ÓRGÃOS SOCIAIS: Intervenção de dois gerentes
(…)
ÓRGÃO(S) DESIGNADOS(S):
GERÊNCIA:
B...
Cargo: Gerente
R...
Cargo: Gerente
(…)» – cfr. a fls. 28-35 do processo físico.
3. Em 22/02/2010, o Serviço de Finanças de Vila do Conde lavrou informação no processo referido em 1), com o seguinte teor:
O processo em apreço foi instaurado por pagamento em falta de IVA do período de 200803T, no valor de € 9.832,64.
Dado não se ter verificado o pagamento das dívidas em causa, em termos processuais seguir-se-ia a penhora para garantia das mesmas, porém, verifica-se que os únicos bens em nome da executada, dois veículos automóveis com as matrículas …01 (marca Mitsubishi do ano de 2000) e …MS (marca Volkswagen do ano de 1999), já se encontram penhorados noutros processos da mesma empresa.
Atendendo ao exposto, é manifesto que o resultado da penhora não será suficiente para satisfazer as dívidas em nome da executada, no valor total de € 126.101,96.
A executada não tem quaisquer outros bens conhecidos, susceptíveis de penhora, nesta data.
Assim, tendo em conta o disposto nos artigos 22°, 23°, 24° da Lei Geral Tributária e 153°, 159° e 160° do CPPT, com audição prévia nos termos do artigo 60° da LGT, e de acordo com informação da Conservatória do Registo Comercial de Vila do Conde, estão reunidos os pressupostos para a reversão contra os responsáveis subsidiários a seguir identificados, com vista à cobrança da dívida:
B…, NIF 2…e R…, NIF 2…, que exercem o cargo de gerentes desde 09 de Agosto de 2004.
– cfr. fls. 36 do processo físico.
4. Em 22/02/2010, foi proferido despacho para audição do Oponente, em sede de reversão, no processo de execução fiscal referido em 1) – cfr. a fls. 38 do processo físico.

5. Em 22/10/2010, o Serviço de Finanças de Vila do Conde lavrou informação no processo referido em 1), com o seguinte teor:
O processo em apreço foi instaurado por dívidas de IVA (pagamento em falta) do período de 200803T, no valor global de € 9.83264.
Verificada a insuficiência de bens em nome da devedora originária, por despacho de 22 de Fevereiro de 2010, foi ordenada a reversão contra B… e R…, pelo que foram enviadas notificações, através dos ofícios n.° 2262 e 2263, respectivamente, para, no prazo de 10 dias, exercerem o direito de audição prévia.
Apesar de regularmente notificados, não juntaram ao processo qualquer elemento de defesa.
– cfr. fls. 40 do processo físico.
6. Na mesma data, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde proferiu despacho com o seguinte teor:
Por despacho de 22 de Fevereiro de 2010, foi ordenada a reversão contra B... e R…, ao abrigo do disposto no n.° 4 do artigo 23.° e do artigo 60.° da Lei Geral Tributária, pelo que foram notificados para, no prazo de 10 dias, exercerem o direito de audição prévia.
Apesar de regularmente notificados, não juntaram ao processo qualquer elemento no âmbito do exercício do direito de audição prévia.
Verificada a falta de bens susceptíveis de penhora da originária devedora, são responsáveis pelas dívidas tributárias da mesma, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 24.° da Lei Geral Tributária, os administradores que naquele período exerceram funções de administração, aos quais é dada a oportunidade de provar, através do mecanismo de audição prévia, que não foi por culpa sua que o património da firma se tornou insuficiente para satisfação dos créditos fiscais ou que a falta de pagamento não lhes é imputável.
A identificação dos responsáveis subsidiários tem por suporte a certidão da Conservatória do Registo Comercial de Vila do Conde onde constam como gerentes da sociedade C... Cerâmicas Lda, B... e R....
Assim, mantêm-se os fundamentos constantes do projecto de decisão de 201 0-02-22 e os pressupostos para a reversão, devendo prosseguir a execução contra B... e R..., na qualidade de responsável subsidiário, pelas dividas abaixo discriminadas, sem encargos, em que é devedora originária a sociedade C... Cerâmicas Lda, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 24.° da Lei Geral Tributária e no artigo 153.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Em consequência, proceda-se à citação do executado por reversão, nos termos do art. 160°, do Código do Processo e Procedimento Tributário, para efectuar o pagamento da quantia que contra si reverteu, dando-lhe a conhecer de que se o fizer no prazo de 30 dias ficará isenta de juros de mora e custas, de harmonia com o n.° 5 do art. 23°, da Lei Geral Tributária.
Identificação da Dívida:
IVA (pagamento em falta), do período de 200803T, no valor de € 9.832,64.
- cfr. fls. 41 do processo físico.
7. Em 03/01/2011, foi o Oponente citado no processo de execução fiscal referido em 1) através de contato pessoal com funcionário do Serviço de Finanças da Trofa, tendo-lhe sido entregue ofício de citação em reversão, acompanhado de cópia do despacho referido em 6) – cfr. fls. 48 dos autos.

8. Em 07/02/2011, a petição inicial da presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde – cfr. fls. 4 dos autos.

*
Mais se provou, com interesse, para a decisão, o seguinte:
9. Correu termos no 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, o processo n.º 15047/09.3IDPRT em que se imputava aos arguidos B..., aqui Oponente e R..., em co-autoria material e na forma consumada, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal por falta de entrega de IVA do ano de 2005, liquidado pela sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, tendo o Oponente sido absolvido e R... condenado, por se ter apurado, com base em confissão integral e sem reservas dos factos por este último, que o Oponente, aí arguido «apenas era gerente no papel» e que era R... quem tomava todas as decisões inerentes à gestão da empresa – cfr. o documento de fls. 106-121 do processo físico.
10. Apesar de o Oponente ter sido nomeado gerente da sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, era o seu irmão, R..., quem, na prática e em exclusivo, tomava todas as decisões inerentes ao giro da empresa, não estando o Oponente a par dos negócios da mesma - cfr. a prova testemunhal produzida.
*
A decisão sobre a matéria de facto baseou-se na análise conjunta dos documentos juntos aos autos, os quais se dão por inteiramente reproduzidos, não tendo sido impugnados, bem como, no que concerne, em particular, ao item 10) do probatório, no depoimento prestado pela testemunha arrolada pelo Oponente que, apesar da relação familiar próxima, por ser seu irmão, depôs de forma genuína e isenta, com conhecimento direto e privilegiado dos factos a que foi inquirida.
Assim, a testemunha inquirida relatou ao Tribunal, de forma autêntica e verosímil, que era a própria quem geria “de facto” a empresa, mais tendo afirmado que o Oponente não estava a par dos negócios da mesma, limitando-se a assinar, “de cruz” os documentos e cheques a seu pedido, que lhe pedia quando ia a sua casa, porque nele confiava, não questionando a finalidade de tais documentos. Mais explicou que foram ambos designados gerentes porque inicialmente a ideia era trabalharem juntos mas logo no início não se entenderam.
De resto, o depoimento prestado pela testemunha inquirida mostrou-se ainda consistente com os elementos documentais carreados para os autos, mormente, com a sentença proferida no processo n.º 15047/09.3IDPRT que correu termos no 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, em que se imputava aos arguidos B..., aqui Oponente e R..., em co-autoria material e na forma consumada, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal por falta de entrega de IVA do ano de 2005, liquidado pela sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, tendo o Oponente sido absolvido e R... condenado, por se ter apurado, com base em confissão integral e sem reservas dos factos por este último, que o Oponente, aí arguido «apenas era gerente no papel» e que era R... quem tomava todas as decisões inerentes à gestão da empresa (cfr. o item 9) do probatório), o que não constituindo decisão penal absolutória para os efeitos consignados no artigo 624.º do Código de Processo Civil (CPC), tanto mais que não foi a dívida revertida que motivou a instauração do procedimento criminal no termo do qual o Oponente foi absolvido, deve, pelo menos, ser valorado como princípio de prova do não exercício dessa gerência.
*
Não existem outros factos provados ou não provados, para além dos acima elencados.”
«»
3.2. DE DIREITO
Nas suas primeiras conclusões do recurso, a Recorrente questiona a sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto, sendo que constituindo tal erro de julgamento não só o primeiro aduzido mas, em especial, aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Vejamos.
Na óptica da Recorrente, a prova testemunhal produzida demonstrou que o oponente exerceu de facto a gerência na sociedade devedora originária no ano de 2008, pois que a assinatura do oponente nos cheques, bem como nos contratos que a sociedade celebrava, vinculavam a sociedade, sendo actos puros de gerência, sendo que o depoimento da testemunha arrolada pelo recorrido permitiu apreender que o ora recorrido praticou actos de representação em nome da sociedade devedora originária, e permitiu estabelecer um fio condutor no que respeita ao envolvimento do oponente na vida da sociedade, pelo que temos de concluir que fica demonstrada a prática de actos em representação da sociedade, como forma de assegurar o giro comercial da mesma.
Tendo em conta as norma reguladoras do cheque, o facto do oponente assinar cheques da devedora originária significa que detinha poderes de representação e de vinculação da sociedade e a assinatura dos cheques por parte do recorrido consubstancia a prática de actos relevantes de gestão, que não podem ser descurados ou relativizados, pois ao assinar os referidos cheques relativos à devedora originária, fá-lo voluntariamente, mesmo fazendo-o a solicitação do irmão, tal quer dizer que o oponente assume que tem funções de representação da devedora originária.
Assim, a Recorrente entende que a fatualidade provada, com a prova testemunhal, impõe a conclusão de que o oponente exerceu a gerência de facto na devedora originária no período temporal em causa nos autos, razão porque é responsável subsidiário pelas dívidas revertidas e conceber que sejam criadas sociedades em que se nomeiam gerentes para a prática de actos de representação da sociedade, praticando actos concretos e próprios de representação e vinculação da sociedade devedora (assinatura de cheques), sem que se retirem as devidas consequências, isto é, desresponsabilizando o seu autor, constitui uma contradição inaceitável, no que reside o erro de julgamento a que nos vimos reportando, e que, do nosso ponto de vista, padece a sentença recorrida.
Deste modo, deve ser alterado o item 10 do probatório passando a ter a seguinte redacção:
- “ O oponente foi gerente de facto da “C... Cerâmicas, Lda.”, na medida em que praticou actos de gerência da sociedade, manifestada na assinatura dos cheques da devedora originária, documentos estes necessários ao giro comercial da sociedade e atividade típica de gerência”.

Sobre esta matéria, e com referência ao julgamento da matéria de facto, crê-se pertinente apontar que com a revisão do CPC operada pelo DL n.º 329-A/95, de 12.12, e pelo DL n.º 180/96, de 25.09, foi instituído, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto.
Importa, porém, ter presente que o poder de cognição deste Tribunal sobre a matéria de facto ou controlo sobre a decisão de facto prolatada pelo tribunal “a quo” não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento de facto - art. 685º-B do CPC, que regulava esta matéria depois da alteração introduzida pelo D.L. nº 303/07, de 24-08, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no art. 685º-B nºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade (vide sobre esta problemática A.S. Abrantes Geraldes in: “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, págs. 250 e segs.).
Daí que sobre o recorrente impende um especial ónus de alegação quando pretenda efectuar impugnação com aquele âmbito mais vasto, impondo-se-lhe, por conseguinte, dar plena satisfação às regras previstas no art. 685º-B do CPC.
É que ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
Diga-se ainda que a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador que se mostra vertido no art. 655.º do CPC, sendo certo que na formação da convicção daquele quanto ao julgamento fáctico da causa não intervém apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados, visto que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação e/ou na respectiva transcrição.
Na verdade, constitui dado adquirido o de que existem inúmeros aspectos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa gravação simples áudio. Tal como já era apontado por Eurico Lopes Cardoso os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe e como tal apreendidos ou percepcionados por outro Tribunal que pretenda fazer a reapreciação da prova testemunhal, sindicando os termos em que a mesma contribuiu para a formação da convicção do julgador, perante o qual foi produzida (cfr. BMJ n.º 80, págs. 220 e 221).
Como tal, sempre o juiz perante o qual foram prestados os depoimentos estará em posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente com a devida articulação de toda a prova oferecida, de que decorre a convicção plasmada na decisão proferida sobre a matéria de facto.
Em conformidade, a convicção resultante de tal articulação global, evidencia-se como sendo de difícil destruição, principalmente quando se pretende pô-la em causa através de indicações parcelares, ou referências meramente genéricas que o impugnante possa fazer, como contrárias ao entendimento expresso.
Com efeito e como tem vindo a ser entendimento jurisprudencial consensual o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, as suas reacções imediatas, o sentido dado à palavra e à frase, o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerado em torno da testemunha, o modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo contribuindo para a formação da convicção do julgador.
Segundo a lição que se extrai dos ensinamentos de Enrico Altavilla "… o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras …" (in: "Psicologia Judiciária", vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12).
Daí que a convicção do tribunal se forma de um modo dialéctico, pois, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas produzidas nos autos, importa atender também à análise conjugada das declarações produzidas e dos depoimentos das testemunhas, em função das razões de ciência, da imparcialidade ou falta dela, das certezas e ainda das lacunas, das contradições, das hesitações, das inflexões de voz, da serenidade, dos “olhares de súplica” para alguns dos presentes, da "linguagem silenciosa e do comportamento", da própria coerência de raciocínio e de atitude demonstrados, da seriedade e do sentido de responsabilidade evidenciados, das coincidências e inverosimilhanças que transpareçam no decurso da audiência de julgamento entre depoimentos e demais elementos probatórios.
Ao invés do que acontece nos sistemas da prova legal em que a conclusão probatória está prefixada legalmente, nos sistemas da livre apreciação da prova, como o nosso, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do discussão em sede de julgamento, com base apenas no juízo que se fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
Note-se, contudo, que este sistema não significa puro arbítrio por parte do julgador.
É que este pese embora livre no seu exercício de formação da sua convicção não está isento ou eximido de indicar os fundamentos onde aquela assentou por forma a que, com recurso às regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquele processo de formação da convicção sobre a prova ou não prova daquele facto, permitindo, desta feita, sindicar-se o processo racional da própria decisão.
Aliás, a nossa lei processual determina e faz impender sobre o julgador um ónus de objectivação da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), devendo aquele analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (cfr. art. 653.º, n.º 2 do C. Proc. Civil).
É que não se trata de um mero juízo arbitrário ou de simples intuição sobre veracidade ou não de uma certa realidade de facto, mas antes duma convicção adquirida por intermédio dum processo racional, objectivado, alicerçado na análise critica comparativa dos diversos dados recolhidos nos autos na e com a produção das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações, sendo que aquela convicção carece de ser enunciada ou explicitada por expressa imposição legal como garante da transparência, da imparcialidade e da inerente assunção da responsabilidade por parte do julgador na administração da justiça.
À luz desta perspectiva temos que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
Aliás e segundo os ensinamentos de M. Teixeira de Sousa ”… o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente …” (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, pág. 348).
Presentes os considerandos que antecedem e na sequência dos mesmos temos que para que possa ser atendida nesta sede a divergência quanto ao decidido em 1.ª instância no julgamento de facto deverá ficar demonstrado, pelos meios de prova indicados pelo recorrente, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, exigindo-se, contudo e para tanto, que tais elementos de prova sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, ou seja, neste domínio, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida.

Em termos de motivação, a decisão recorrida ponderou que:
“…
A decisão sobre a matéria de facto baseou-se na análise conjunta dos documentos juntos aos autos, os quais se dão por inteiramente reproduzidos, não tendo sido impugnados, bem como, no que concerne, em particular, ao item 10) do probatório, no depoimento prestado pela testemunha arrolada pelo Oponente que, apesar da relação familiar próxima, por ser seu irmão, depôs de forma genuína e isenta, com conhecimento direto e privilegiado dos factos a que foi inquirida.
Assim, a testemunha inquirida relatou ao Tribunal, de forma autêntica e verosímil, que era a própria quem geria “de facto” a empresa, mais tendo afirmado que o Oponente não estava a par dos negócios da mesma, limitando-se a assinar, “de cruz” os documentos e cheques a seu pedido, que lhe pedia quando ia a sua casa, porque nele confiava, não questionando a finalidade de tais documentos. Mais explicou que foram ambos designados gerentes porque inicialmente a ideia era trabalharem juntos mas logo no início não se entenderam.
De resto, o depoimento prestado pela testemunha inquirida mostrou-se ainda consistente com os elementos documentais carreados para os autos, mormente, com a sentença proferida no processo n.º 15047/09.3IDPRT que correu termos no 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, em que se imputava aos arguidos B..., aqui Oponente e R..., em co-autoria material e na forma consumada, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal por falta de entrega de IVA do ano de 2005, liquidado pela sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, tendo o Oponente sido absolvido e R... condenado, por se ter apurado, com base em confissão integral e sem reservas dos factos por este último, que o Oponente, aí arguido «apenas era gerente no papel» e que era R... quem tomava todas as decisões inerentes à gestão da empresa (cfr. o item 9) do probatório), o que não constituindo decisão penal absolutória para os efeitos consignados no artigo 624.º do Código de Processo Civil (CPC), tanto mais que não foi a dívida revertida que motivou a instauração do procedimento criminal no termo do qual o Oponente foi absolvido, deve, pelo menos, ser valorado como princípio de prova do não exercício dessa gerência. …”.

Em relação à matéria em causa, cremos que apesar da perspicácia e do esforço de análise da Recorrente, e após a audição do depoimento em causa, tendo presente os elementos destacados pela Recorrente, não é possível atender a sua pretensão neste âmbito, na medida em que não podemos conferir ao exposto a abrangência reclamada no âmbito do presente recurso.
Na verdade, deixando de lado a matéria claramente conclusiva que a Recorrente pretende ver aditada ao probatório sobre a gerência de facto, o elemento essencial a apreciar prende-se com a assinatura de cheques por parte do Recorrido, realidade que não passou ao lado da decisão do Tribunal recorrido, o qual ponderou que “o Oponente não estava a par dos negócios da mesma, limitando-se a assinar, “de cruz” os documentos e cheques a seu pedido, que lhe pedia quando ia a sua casa, porque nele confiava, não questionando a finalidade de tais documentos.
Pois bem, o tal depoimento que a Recorrente pretende valorizar referiu a tal assinatura de cheques, mas também assumiu de forma clara que era ele que geria de facto a empresa e que o Recorrido não tinha papel relevante neste domínio, sendo que este último elemento reporta-se a qualquer iniciativa do Oponente que não a simples assinatura de cheques ou outros documentos que a testemunha lhe apresentava para assinar, tendo sido referido que inicialmente a ideia era trabalharem juntos mas logo no início não se entenderam.
Nesta sequência, e tendo presente que a própria Recorrente não coloca quaisquer reservas ao valor do depoimento na sua globalidade, é manifesto que o mesmo tem de considerado no seu todo, não podendo isolar-se um conjunto de respostas (a maioria das quais um simples “sim”, sem qualquer elaboração sobre a matéria das várias questões) e olvidar todo o contexto que envolve o depoimento.
Mas mais.
Tal como se decidiu, e de forma decisiva, o depoimento prestado pela testemunha inquirida mostra-se ainda consistente com os elementos documentais carreados para os autos, mormente, com a sentença proferida no processo n.º 15047/09.3IDPRT que correu termos no 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, em que se imputava aos arguidos B..., aqui Oponente e R..., em co-autoria material e na forma consumada, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal por falta de entrega de IVA do ano de 2005, liquidado pela sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, tendo o Oponente sido absolvido e R... condenado, por se ter apurado, com base em confissão integral e sem reservas dos factos por este último, que o Oponente, aí arguido «apenas era gerente no papel» e que era R... quem tomava todas as decisões inerentes à gestão da empresa (cfr. o item 9) do probatório), o que não constituindo decisão penal absolutória para os efeitos consignados no artigo 624.º do Código de Processo Civil (CPC), tanto mais que não foi a dívida revertida que motivou a instauração do procedimento criminal no termo do qual o Oponente foi absolvido, deve, pelo menos, ser valorado como princípio de prova do não exercício dessa gerência.
Com efeito, está em causa o depoimento da mesma pessoa que, de forma consistente, reclama para si a gerência da sociedade devedora originária, colocando o ora Recorrido no papel de figurante (diga-se ainda que a Recorrente não coloca em crise o ponto 10. do probatório, o que significa que tal situação também não pode ser desconsiderada nesta sede), limitando-se a assinar os cheques e outros documentos como uma extensão da gerência nominal e, portanto, sem o necessário animus no que concerne à afirmação de uma conduta voluntária dirigida a uma participação consciente na definição da vida da sociedade identificada nos autos.
Isto para dizer que a alegação da Recorrente não comporta elementos que permitam colocar em crise o processo racional da própria decisão, sendo de notar que o Tribunal recorrido não deixou de ponderar os elementos disponíveis - documentos presentes nos autos e depoimento -, de modo que, e como ficou exposto, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção, o que tal acarreta é que o julgamento da matéria de facto levado a cabo pela decisão recorrida, se tenha de ter por inalterado, sendo, pois, à sua luz que caberá indagar da bondade do julgamento de direito consequente, no que diz respeito à matéria em crise.

E quanto à questão substancial?
Nesta matéria, “é pacífica a jurisprudência que a responsabilidade subsidiária dos gerentes é regulada pela lei em vigor na data da verificação dos factos tributários geradores dessa responsabilidade, e não pela lei em vigor na data do despacho de reversão nem ao tempo do decurso do prazo de pagamento voluntário dos tributos (v. acórdãos do Pleno da SCT do STA de 7/7/2010 e de 24/3/2010, nos recursos n.ºs 945/09 e 58/09, e da SCT do STA de 28/9/2006 e de 11/1/2006, nos recursos n.ºs 488/06 e 717/05, respectivamente)” - Ac. do S.T.A. de 29-06-2011, Proc. nº 0368/11, www.dgsi.pt.
Ora, sendo as dívidas exequendas provenientes de dívidas de a IVA do 1.º trimestre de 2008, ganha particular acuidade o art. 24º nº 1 da LGT, sendo que o citado normativo dispõe que:
1- Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.
Ora, em função da inclusão na disposição apontada das expressões “exerçam, ainda que somente de facto, funções” e “período de exercício do seu cargo”, não basta para a responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respectivas funções.
Assim, desde logo se vê que a responsabilidade subsidiária depende, antes de mais, do efectivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto.
Pois bem, e tal como se aponta no Ac. do S.T.A. de 02-03-2011, Proc. nº 0944/10, www.dgsi.pt, “… Na verdade, há presunções legais e presunções judiciais (arts. 350.º e 351.º do CC). As presunções legais são as que estão previstas na própria lei. As presunções judiciais, também denominadas naturais ou de facto, simples ou de experiência são «as que se fundam nas regras práticas da experiência, nos ensinamentos hauridos através da observação (empírica) dos factos». (ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA, e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 1.ª edição, página 486; Em sentido idêntico, MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 215-216, e PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume I, 2.ª edição, página 289.).
De facto, não há qualquer norma legal que estabeleça uma presunção legal relativa ao exercício da gerência de facto, designadamente que ela se presume a partir da gerência de direito.
No entanto, como se refere no acórdão deste STA de 10/12/2008, no recurso n.º 861/08, «o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.
E, eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumidas no processo e provas produzidas ou não pela revertida e pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que isso, nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte (certeza jurídica) de essa gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ela tenha acontecido. (Sobre esta «certeza» a que conduz a prova, pode ver-se MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 191-192.).
Mas, se o Tribunal chegar a esta conclusão, será com base num juízo de facto, baseado nas regras da experiência comum e não em qualquer norma legal.
Isto é, se o Tribunal fizer tal juízo, será com base numa presunção judicial e não com base numa presunção legal.»
Todavia, ainda que não seja possível partir-se do pressuposto de que com a mera prova da titularidade da qualidade de gerente que a revertida tinha não se pode presumir a gerência de facto, é possível efectuar tal presunção se o Tribunal, à face das regras da experiência, entender que há uma forte probabilidade de esse exercício da gerência de facto ter ocorrido.
Mas, por outro lado, na ponderação da adequação ou não de uma tal presunção em cada caso concreto, nunca há num processo judicial apenas a ter em conta o facto de a revertida ter a qualidade de direito, pois há necessariamente outros elementos que, abstractamente, podem influir esse juízo de facto, como, por exemplo, o que as partes alegaram ou não e a prova que apresentaram ou deixaram de apresentar.
Posto isto e voltando ao caso em apreço, na sentença recorrida e ainda que sem o referir expressamente, a Mma. Juíza “a quo” apreciou a questão da presunção judicial.
Com efeito, refere que a Administração Fiscal não alegou nem provou factos que indiciem o exercício da gerência de facto.
Daqui resulta que a sentença apreciou a prova em termos de presunção judicial, concluindo pela não gerência de facto.
Como este Tribunal já afirmou em acórdão de 28/2/2007, no recurso n.º 1132/06, proferido em Pleno da Secção de Contencioso Tributário, «As presunções influenciam o regime do ónus probatório.
Em regra, é a quem invoca um direito que cabe provar os factos seus constitutivos. Mas, se o onerado com a obrigação de prova beneficia de uma presunção legal, inverte-se o ónus. É o que decorre dos artigos 342.º n.º 1, 350.º n.º 1 e 344.º n.º 1 do Código Civil.
Também aqui o que vale para a presunção legal não serve para a judicial. E a razão é a que já se viu: o ónus da prova é atribuído pela lei, o que não acontece com a presunção judicial. Quem está onerado com a obrigação de fazer a prova fica desonerado se o facto se provar mediante presunção judicial; mas sem que caiba falar, aqui, de inversão do ónus.
(…) Quando, em casos como os tratados pelos arestos aqui em apreciação, a Fazenda Pública pretende efectivar a responsabilidade subsidiária do gerente, exigindo o cumprimento coercivo da obrigação na execução fiscal inicialmente instaurada contra a originária devedora, deve, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, provar os factos que legitimam tal exigência.

Mas, no regime do artigo 13.º do CPT, porque beneficia da presunção legal de que o gerente agiu culposamente, não tem que provar essa culpa.
Ainda assim, nada a dispensa de provar os demais factos, designadamente, que o revertido geriu a sociedade principal devedora.
Deste modo, provada que seja a gerência de direito, continua a caber-lhe provar que à designação correspondeu o efectivo exercício da função, posto que a lei se não basta, para responsabilizar o gerente, com a mera designação, desacompanhada de qualquer concretização.
Este efectivo exercício pode o juiz inferi-lo do conjunto da prova, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade, etc.
Mas não pode retirá-lo, mecanicamente, do facto de o revertido ter sido designado gerente, na falta de presunção legal.
A regra do artigo 346.º do Código Civil, segundo a qual «à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos», sendo então «a questão decidida contra a parte onerada com a prova», não tem o significado que parece atribuir-lhe o acórdão recorrido.
Aplicada ao caso, tem este alcance: se a Fazenda Pública produzir prova sobre a gerência e o revertido lograr provar factos que suscitem dúvida sobre o facto, este deve dar-se por não provado. Mas a regra não se aplica se a Fazenda não produzir qualquer prova.» …”.
Perante o que fica exposto, e que traduz o real enquadramento da matéria em apreço, é ponto assente que compete à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, o que significa que deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência.
Aliás, como se aponta no Ac. do S.T.A. (Pleno) de 16-10-2013, Proc. nº 0458/13, www.dgsi.pt, onde se ponderou que: “… De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.
E sendo um acto administrativo tributário, aquele despacho está sujeito a fundamentação, dado até o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (nº 3 do art. 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT. Daí que, enquanto acto administrativo tributário, o despacho de reversão deva incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» - cfr. nº 4 do art. 23º da LGT. (De acordo com o disposto neste nº 4 do art. 23º da LGT «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».)
Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT).

Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT).
Não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.
É que, como se exara no acórdão de 31/10/2012, da Secção do Contencioso Tributário deste STA, processo nº 0580/12, «não … parece, porém, … que seja necessário que do despacho de reversão constem os factos concretamente identificados nos quais a Administração tributária fundamenta a sua convicção relativa ao efectivo exercício de funções, pois que em causa não está uma acusação em matéria sancionatória e persistindo dúvida acerca do efectivo exercício de funções o “non liquet” não poderá deixar de ser valorado contra a Administração fiscal, que invoca o direito a responsabilizar o gerente, pois que inexiste presunção legal no sentido de que o gerente de direito exerça de facto as suas funções, daí que não possa seriamente defender-se que a não invocação no despacho de reversão de tais factos possa comprometer a defesa do responsável subsidiário» (No mesmo sentido ver também o acórdão de 23/1/2013, processo nº 0953/12.) sendo que, em caso de discordância, o revertido sempre poderá exercer o direito de defesa mediante dedução de oposição onde, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações das previsões legais (i) incumbe à AT comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do nº 1 do art. 24º da LGT); (ii) incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT). …”.

Ora, como se colhe do aresto agora descrito, não se impõe que constem do despacho de reversão os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido, o que significa que, no caso de reacção do visado (leia-se oposição), a AT terá então, no desenvolvimento do processo, de afirmar esses elementos no sentido de se desembaraçar do ónus que a lei lhe comete da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, estando aqui em destaque o efectivo exercício da gerência.

Nesta matéria, pode dizer-se que a AT nada inovou no que diz respeito ao exposto no despacho reversão por referência à realidade descrita em sede de contestação à oposição, sendo que apenas nas presentes alegações de recurso tentou desenvolver a sua alegação, numa altura em que isso se revela inviável do ponto de vista processual, apenas servindo para evidenciar o trabalho pouco feliz da AT, que não teve o cuidado de fazer uma análise mais completa da informação de que dispunha, acabando em dificuldade quando é posta em crise a gerência de facto.

Ora, considerando a realidade vertida no probatório, pode dizer-se que os elementos apontados para o ora Recorrido ser considerado gerente de facto ou efectivo, reconduzem-se ao facto de o mesmo ter sido nomeado para o exercício da gerência da sociedade devedora originária, matéria que abrange todo o período em que nasceram as dívidas, tendo-se apurado que apesar de o Oponente ter sido nomeado gerente da sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, era o seu irmão, R..., quem, na prática e em exclusivo, tomava todas as decisões inerentes ao giro da empresa, não estando o Oponente a par dos negócios da mesma.

Ora, o estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa, verificando-se que a lei não define precisamente em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos arts. 259º e 260º do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros, aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social (Ac. deste Tribunal de 08-05-2012, Proc. nº 5392/12).
É no art. 64º do Código das Sociedades Comerciais, que se encontra consagrado o dever de diligência dos administradores/gerentes de sociedade, nos termos do qual estes devem actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores.
A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr. objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr. arts. 260º nº 1 e 409º nº 1 do Código das Sociedades Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação (cfr. Raúl Ventura, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Sociedades por Quotas, III, Almedina, 1991, pág.128 e seg.).
Naturalmente, não se olvida que tal matéria deixou de ser suficiente para o preenchimento desse fundamento da gerência efectiva ou de facto, pelo que só fundada nessa nomeação não poderia haver lugar à reversão da execução contra o ora Recorrido ao abrigo do disposto no art. 24º da LGT, antes tendo a mesma de ter praticado em nome e por conta dessa sociedade alguns dos actos típicos que normalmente por eles são praticados, em que se consubstanciam os poderes de representação e de exteriorização da vontade do ente colectivo - cfr. arts. 390º e segs do CSC.
Nesta sequência, considerando a realidade vertida no probatório e tendo presente o regime de responsabilidade aplicável atrás definido, pode dizer-se que os elementos presentes nos autos não permitem a conclusão de que o ora Recorrido foi gerente de facto da sociedade.
Isto porque a chamada gerência de facto de uma sociedade comercial consiste no efectivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade. Para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros - nestes termos, Rúben Anjos de Carvalho - Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139.
Ora, como se viu, o ora Recorrido limitou-se, na sequência da gerência nominal, a habilitar o seu irmão, sempre que este o solicitava, a subscrever cheques e outros documentos sem qualquer intenção/consciência de participar na vida da sociedade, ou seja, sem o necessário animus no sentido da afirmação de algo susceptível de ser integrado no exposto no parágrafo anterior.

A partir daqui, analisada a matéria de facto provada, constata-se que ficou por provar uma realidade susceptível de evidenciar um tal exercício efectivo dos poderes de administração por parte do ora Recorrido, sendo que, repete-se, quem estava onerado com o peso da prova era a Fazenda Pública, por isso que, como já referimos, o exercício efectivo da administração é facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efectivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.
Na realidade, ainda que assim não tenha sucedido, temos por inexorável a ilação de que, pelo menos, fica uma dúvida substancial e fundada sobre o efectivo exercício da gerência da sociedade executada por parte do ora Recorrido, de modo que, competindo à AT o ónus probatório do exercício efectivo da administração por parte do ora Recorrido, a tal título, como responsável subsidiário, e sendo a presunção desse mesmo exercício, decorrente da respectiva qualidade jurídica, meramente de facto ou judicial, então forçoso se impõe concluir que a referida dúvida tem desfavorecer a AT.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação do recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 25 de Maio de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos