Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00453/18.0BEMDL
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/03/2019
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Helena Canelas
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR; PROVA TESTEMUNHAL; ESTABELECIMENTO DE APOIO SOCIAL; ORDEM DE ENCERRAMENTO; FUMUS BONI IURIS
Sumário:
I – A mera circunstância de ter sido requerida pelas partes, em sede de processo cautelar, a produção de prova testemunhal, não implica que necessariamente o Tribunal a quo esteja adstrito à realização da respetiva diligência de inquirição de testemunhas, como claramente decorre do disposto no artigo 118º nº 1 do CPTA.
II – Apenas cumpre ao juiz cautelar levar a cabo as diligências de prova relativamente a factos concretos que se mostrem controvertidos, designadamente por terem si alvo de impugnação na oposição, e dentro desses os que importem para a decisão da causa em conformidade com os critérios decisórios insertos no artigo 120º do CPTA.
III – Se o estabelecimento social de apoio social (creche) funcionava sem a existência de título administrativo de autorização de funcionamento (seja a licença seja a autorização provisória de funcionamento), e foram constatadas, em sede de ação de fiscalização a inadequação e deficiências das instalações, entre outras anomalias, relatadas no relatório em que assentou a decisão suspendenda, que a requerente não põe em causa, tem de concluir-se num juízo perfunctório que a ordem de encerramento se encontra legitimada à luz do quadro normativo convocado, devendo negar-se a decretação da providência cautelar de suspensão de eficácia por não verificação do requisito do fumus boni iuris. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:FR – Unipessoal, Lda.
Recorrido 1:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
FR – Unipessoal, Lda. (devidamente identificada nos autos), requerente no processo cautelar que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela em que é requerido o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP – no qual requereu a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação nº 202 de 2018, do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, IP, que ordenou o encerramento administrativo do estabelecimento de apoio social denominado FR – inconformada com a sentença de 01/02/2019 do Tribunal a quo que indeferiu o pedido de decretação da providência cautelar, dela interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:
A Recorrente, atendendo aos elementos que constam dos autos, mormente do seu requerimento inicial, dos factos aí alegados e não impugnados, bem como dos documentos juntos por si, discorda da d. Sentença proferida que julgou improcedente a acção, e, consequentemente, indeferiu a providência cautelar requerida nos presentes autos. E, porque não se conforma com a mesma dela interpõe o presente recurso.
Com o respeito devido por opinião contrária, afigura-se-nos que o Tribunal a quo não apreciou correctamente a pretensão da Requerente, a qual consistia no pedido de suspensão de eficácia da deliberação do Conselho Directivo do ISS, I.P. n.º 202 de 2018 que ordenou o encerramento administrativo da creche instalada na Rua A…, nº 1, em Vila Real.
Por questão de economia processual, dão se aqui por reproduzidos para todos os efeitos legais, os factos provados que constam da d. Sentença recorrida.
Deixa-se aqui mencionado que sob a epígrafe “Factos Não Provados“ o Tribunal a quo declarou que “inexistem quaisquer factos relevantes para a decisão a proferir que se tenham considerado não provados“ – sic.
Em sede de fundamentação do indeferimento do pedido de suspensão da eficácia do acto administrativo que ordenou o encerramento do estabelecimento de apoio social (creche) o Tribunal a quo considera como não verificado, para o efeito, o requisito do fumus boni iuris, sendo sabido que nos termos da Lei – artº 120 nº 1 do CPTA – basta o não preenchimento de um dos requisitos ali mencionados para determinar o não decretamento da providência cautelar.
Julgando o não preenchimento desse requisito o Tribunal a quo considerou prejudicada a apreciação dos restantes requisitos, designadamente o periculum in mora e a ponderação de interesses públicos e privados em causa, tal como previsto no nº 2 do artº 120 do CPTA.
Em sede de fundamentação, é dito na d. Sentença recorrida que “ a Requerente erige o seu pedido de tutela cautelar sobre a invocação de que o acto que determinou o encerramento administrativo se estribou na norma ínsita no art.º 35º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março, que prevê uma mera possibilidade da Administração determinar o encerramento imediato do estabelecimento e não um dever. Donde, conclui a Requerente que o Requerido, “ao invés do decretar do encerramento, a medida que se nos afigura ser a mais correcta seria a de conceder à Requerente um prazo para que a mesma procedesse a todas as (eventuais) correcções que se mostrassem necessárias ao seu funcionamento” “ – sic. Cf. pág. 16/22.
Mais aí se diz que, “ no caso vertente, alega a Requerente que a Administração ao invés de decidir pelo encerramento imediato do seu estabelecimento, deveria ter optado por conceder-lhe um prazo para regularizar o seu funcionamento, por ser a medida que, no caso, se afigurava mais correcta. E nada mais refere. Ou seja, a Requerente limita-se a alegar que o Requerido deveria ter tomado outra medida em face da situação irregular em que se encontrava o seu próprio estabelecimento – que a própria reconhece e admite ser verdade – por considerar, simplesmente, que esta seria mais correcta “ – sic. Cf. pág. 17/22.
Com o devido respeito, não concorda a Requerente com a conclusão do Tribunal a quo de que Ela “nada mais refere”, porquanto, da leitura do seu requerimento inicial resulta o contrário, sendo que, para se chegar a esta conclusão, bastará para o efeito ter em conta o teor do artº 18 e seguintes do requerimento inicial, de um modo especial o teor dos artºs 18, 22, 23, 24, 26, 39 e 41, entre outros, desse mesmo requerimento, factualidade que a Requerente ali expôs e que supra transcreveu, teor esse que aqui, por questão de economia processual, se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
10ª Compulsada a oposição ao requerimento inicial, constata-se que o Requerido não impugnou nenhum destes factos, nem se pode considerar que estejam em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, pelo que, devem ter-se como admitidos por acordo, por via do efeito cominatório previsto no artº 574 do CPC ex vi artº 1 do CPTA, o que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
11ª Aliás, mesmo que se não entenda que estes factos estão admitidos por acordo, o que não se concede mas que até admite, apenas e só por dever de patrocínio, não se pode considerar que os mesmos não estão provados, pela simples razão de que não ocorreu produção de prova.
12ª E, se houver o entendimento de que esses factos não estão provados, impõe-se dizer aqui que tal situação apenas ocorre porque o Tribunal a quo entendeu não cumprir o disposto no artº 118º do CPTA, o que fez em notória violação desse preceito legal, nomeadamente do nº 5 desse mesmo artigo.
13ª Ora, in casu, impõe-se então dizer que à Requerente não lhe foi permitido provar os factos que tinha alegado através da prova testemunhal apresentada / requerida no seu requerimento inicial, porque o Tribunal a quo entendeu proferir a d. Sentença recorrida com base na prova documental, mas apenas em parte, junta ao requerimento inicial e com base no PA, desconsiderando todos os outros meios de prova legalmente admissíveis.
14ª Acontece que tais factos não constam nem dos factos provados nem dos factos não provados, sendo certo que os mesmos, atento o predito, porque estão admitidos por acordo, deveriam constar daqueles, com inerentes consequências legais, o que por certo levaria a outra decisão que não aquela que in casu veio a ser proferida.
15ª Sempre com o respeito devido por opinião contrária, estamos convictos de que a matéria de facto alegada no requerimento inicial a propósito do requisito do fumus boni iuris, e, a nosso ver, matéria provada, atento o que cima se deixou dito e que aqui, por questão de economia processual, se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, é suficiente para que se julgue verificado este requisito, levando à revogação da d. Decisão recorrida, o que aqui se peticiona.
16ª Contudo, à cautela, caso assim se não entenda, pugna-se para que os autos baixem à primeira Instância ordenando-se a produção de prova, nos termos do artº 118 nº 2 do CPTA, atenta a sua violação, o que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
17ª E isto porque, o Tribunal a quo ao preterir essa produção de prova testemunhal, em sede de Audiência de Julgamento, condicionou restritivamente a matéria de facto com notória influência na Decisão final e ora recorrida, como da mesma resulta, prova testemunhal que a ser produzida levaria por certo, a nosso ver, à prolação de uma Decisão diferente daquela da qual ora se recorre.
18ª Face ao que vem de se dizer, fica claro que a d. Sentença recorrida para além de claro erro de julgamento de facto, com notória influência na decisão, viola também, por erro de interpretação e aplicação, os preceitos legais supra invocados – artº 118 nº 2 do CPTA e artº 574 do CPC, bem como o nº 5 do mesmo artº 118 do CPTA, o que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
19ª Pelo que, inexistindo qualquer fundamento válido e muito menos fundamento legal para o Tribunal a quo se decidir pela improcedência da acção, se impõe a revogação da d. Sentença recorrida por outra que julgue aquela procedente, o que aqui se requer,
20ª Ou se ordene a baixa dos autos para produção da prova testemunhal e prossecução da ulterior tramitação processual, como é de JUSTIÇA !
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O recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença recorrida.
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Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público não emitiu Parecer.
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Sem vistos, foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pela recorrente as conclusões de recurso, a questão essencial a decidir é a de saber se deve proceder-se ao aditamento da matéria de facto propugnada pela recorrente e com base nela dar-se por verificado o requisito do fumus boni iuris necessário ao decretamento da providência cautelar, ou à baixa dos atos para a produção de prova sobre a mesma.
III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, vertida na sentença recorrida ipsis verbis nos seguintes termos:
1. A Requerente, FR – Unipessoal, Lda., tem por objecto social “creche, jardim de infância e outras actividades de apoio a crianças e idosos” (cf. documento n.º 02 junto aos autos com o requerimento inicial);
2. Até ao dia 04/06/2018, a Requerente esteve instalada na Praça D…, lote 3, lojas F-J, Abambres, Vila Real (admitido por acordo – cf. artigo 6º do requerimento inicial e artigo 9º da oposição);
3. No local referido no ponto anterior, anteriormente à Requerente, esteve instalada a sociedade «BK – Creche, Jardim de Infância, Lda.» (cf. documento n.º 03 junto aos autos com o requerimento inicial);
4. A Requerente esteve instalada no local referido no ponto 2. ao abrigo de um contrato, denominado de “contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial”, outorgado em 09/12/2015 entre a Requerente, na qualidade de concessionária, AMGC e mulher, DMSBC, na qualidade de concedentes, e PVAGP, na qualidade de fiadora (cf. documento n.º 03 junto aos autos com o requerimento inicial);
5. Em 09/12/2015 a «BK – Creche, Jardim de Infância, Lda.» tinha como sócios AMGC e RBC (cf. documento n.º 04 junto aos autos com o requerimento inicial);
6. No dia 04/06/2018 foi concretizado o despejo da Requerente das instalações sitas no local referido no ponto 2. (admitido por acordo – cf. artigo 9º do requerimento inicial e artigo 9º da oposição);
7. As instalações onde a Requerente actualmente se encontra, sitas à Rua A…, n.º 1, em Vila Real, são propriedade do Colégio B… (admitido por acordo – cf. artigo 17º do requerimento inicial e artigo 9º da oposição);
8. Por ter recepcionado três denúncias visando a Requerente, o Requerido desencadeou o procedimento administrativo de fiscalização Proave n.º 201800009571 visando a averiguação das condições de instalação e funcionamento da creche explorada pela Requerente no local referido no ponto anterior (cf. documento de fls. 18 a 26 do processo administrativo junto aos presentes autos);
9. No âmbito daquele procedimento de fiscalização foram programadas e realizadas as seguintes diligências:
9.1 Verificação da existência de antecedentes relativos à morada denunciada, tendo sido constatada a sua inexistência;
9.2 Verificação da existência de antecedentes relativos à entidade denunciada, tendo sido constatada a existência do Proave n.º 201700015712, relativo a uma creche a funcionar na Praceta D. D…, lote 3, lojas F/G/H/I/J, em Vila Real, no âmbito do qual não foram registadas quaisquer irregularidades;
9.3 Deslocação de equipa de fiscalização à Rua A…, n.º 1, Vila Real, no dia 06/07/2018, tendo, nesta data, sido visualizadas as instalações, identificando o pessoal ao serviço, e preenchido o guião de apoio à inspecção relativo à resposta social ali em funcionamento;
9.4 Análise legislativa e subsunção legal;
9.5 Elaboração de projecto de relatório;
(cf. documento de fls. 18 a 26 do processo administrativo junto aos presentes autos);
10. No projecto de Relatório de Fiscalização referido no ponto anterior, a equipa de fiscalização dos serviços do Requerido concluiu pelo seguinte:
(…)
- Falta de título administrativo de funcionamento (licença ou autorização provisória de funcionamento) relativo à resposta social denominada Creche, facto que viola o disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de março, republicado pelo Decreto-Lei n.º 33/2014, de 4 de março, porquanto tal atividade só poderia ser iniciada após a emissão do referido título administrativo, facto que constará de auto de notícia.
- Localização dos espaços destinadas à estada das crianças num piso acima do rés-do-chão, devendo ser tido em conta o previsto no n.º 2 do artigo 17º da Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto (…). Assim, resulta que, no edificado em análise, o qual não se encontra dotado de acesso e segurança de comunicações internas e de evacuação em caso de emergência comprovadas pela Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), não poderão os espaços destinadas à estada das crianças funcionar num piso superior, de acordo com o previsto no artigo 11º do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de outubro, o qual estabelece o regime jurídico da segurança contra incêndios em edifícios.
- Inadequação das instalações face ao previsto no Anexo à Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto, (…), porquanto se verificou a inexistência da área de receção, conforme se encontra descrita no ponto 1 do referido Anexo; da área da direção, serviços técnicos e administrativos, conforme está descrita no ponto 2 desse Anexo; da sala-parque, conforme descrita na alínea b) do ponto 3.1 e no ponto 3.2 do mesmo Anexo; da área do pessoal, conforme se encontra descrita no ponto 5 do citado Anexo; e de instalações sanitárias com lavatórios e sanitas de tamanho infantil; conforme está previsto na alínea c) do ponto 4 do mencionado Anexo, sendo que tais factos constarão de auto de notícia;
- Falta de pessoal com categoria profissional e afetação adequadas à actividade desenvolvida no estabelecimento social em análise, dada a inexistência de um elemento de pessoal com a categoria profissional de ajudante de ação educativa para assegurar o pleno funcionamento do período de abertura e de encerramento da Creche, facto que viola o disposto na alínea c) da Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto.
Foram, ainda, detetadas as seguintes irregularidades:
- Falta de condições de acessibilidade de pessoas com mobilidade condicionada às instalações, dado o acesso ao primeiro piso das mesmas ser realizado, unicamente, por escadas, facto que foi já dado a conhecer, para os devidos efeitos, à Câmara Municipal de Vila Real;
- Inexistência de certificado de segurança relativo aos meios de proteção contra o risco de incêndio; de medidas de autoproteção; de placas de sinalização; de iluminação de emergência; de detetores automáticos de incêndio; e de saída direta para o exterior no primeiro piso; factos que foram já, para os devidos efeitos, dados a conhecer à Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC); e
- Inexistência de realização de vistoria higiossanitária às instalações, bem corno a inexistência, nas mesmas, de registos de higienização, factos que foram já dados a conhecer à Autoridade de Saúde de Vila Real.
- Falta de emissão, por parte da entidade gestora, de recibos fiscais relativos ao mês de Julho de 2018, facto que já foi dado a conhecer, para os devidos efeitos, à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Do mencionado supra (…); são, no entender da equipa signatária, motivos que justificarão o encerramento administrativo imediato deste estabelecimento social, nos termos previstos no artigo 35.º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de março, republicado pelo Decreto-Lei n.º 33/2014. De 04 de março, uma vez que a prossecução dos objetivos a atingir por um estabelecimento desta natureza, e plasmados na Portaria n.º 262/11, de 31 de agosto, se encontra comprometida, sendo graves as condições relatadas e constituindo perigo potencial para os direitos dos utentes e para a sua qualidade de vida.
(…)
(cf. documento de fls. 18 a 26 do processo administrativo junto aos presentes autos);
11. Em 20/09/2018, o Conselho Directivo do Requerido deliberou concordar com a proposta de encerramento administrativo do estabelecimento da Requerente nos termos do art.º 35º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março (cf. documento de fls. 18 do processo administrativo junto aos presentes autos);
12. Sobre o projecto de decisão referido no ponto anterior, a Requerente exerceu o seu direito de audiência prévia, através de requerimento apresentado em 15/10/2018, pedindo a reapreciação do processo e a atribuição de “licença/autorização provisória de funcionamento (…) concedendo-se-lhe um prazo não inferior a cento e oitenta dias para regularizar toda a situação” (cf. documentos de fls. 27 a 29 do processo administrativo junto aos presentes autos);
13. Pelos serviços de fiscalização do Requerido foi elaborado Relatório Final com, além do mais, o seguinte teor:
(…)
APRECIAÇÃO CRÍTICA DO ALEGADO EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS
No documento elaborado pela sócia-gerente da entidade proprietária do estabelecimento social em causa no âmbito do exercício do direito de resposta e rececionado nesta Unidade de Fiscalização, é requerido que seja concedida licença/autorização provisória de funcionamento a esse estabelecimento bem como a concessão de um prazo não inferior a cento e oitenta e dias para regularizar toda a situação, sendo, em resumo, alegado que:
1. a supra citada sócia-gerente está empenhada em regularizar à situação, desde as instalações até à parte administrativa; e
2. alguns argumentos que constam da proposta de decisão não correspondem à verdade, sendo que, por isso, nem os direitos nem a qualidade de vida dos utentes foram, ou são, colocados em causa.
No que respeita ao alegado no ponto 1, tais tactos em nada alteram o conteúdo do Projeto de Relatório elaborado pela equipa signatária.
Tendo em consideração o alegado no ponto 2, verifica-se que, no documento subscrito pela sócia-gerente da entidade proprietária deste estabelecimento social, esta não expõe quais os argumentos que, constando do Projeto de Relatório como fundamentos do projeto de decisão de encerramento administrativo imediato do estabelecimento social em causa, considera não corresponderem à verdade. Assim, também esta alegação não, altera o conteúdo do referido Projeto de Relatório;
Quanto ao requerido pela sócia-gerente, haverá que referir que esta Unidade de Fiscalização não detém competência para tramitar procedimentos administrativos de licenciamento, sendo que, in casu, tal competência incumbe ao Centro Distrital de Vila Real.
Face ao exposto, e tendo em consideração o alegado pela sócia-gerente da entidade proprietária do estabelecimento social em causa, resulta que subsistem as graves deficiências suscetíveis de colocar em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida, as quais fundamentaram o projeto de decisão de encerramento administrativo imediato do estabelecimento social denominado «FR» e que constam do respetivo Projeto de Relatório, a saber, falta de condições de segurança contra o risco de incêndio, inadequação de instalações, e falta de pessoal, pelo que não poderá ser concedido o prazo requerido para a regularização da situação.
Assim, e considerando que os factos alegados em sede de audiência de interessados em nada alterar os fundamentos da proposta já efetuada, entende-se que o procedimento de encerramento administrativo imediato deste estabelecimento Social devera prosseguir os seus trâmites, nos termos do disposto no artigo 35.º do Decreto-Lei n).º 64/2007, de 14 de março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 33/2014, de 4 de março e com os fundamentos constantes do respetivo Projeto de Relatório.
CONCLUSÕES
Tendo em consideração a análise realizada ao conteúdo do documento elaborado pela sócia-gerente da entidade proprietária do estabelecimento social em causa, no âmbito da audiência de interessados, e face à factualidade alegada, conclui-se que deverá este procedimento administrativo, que culminará, com a emissão da decisão de encerramento administrativo imediato do referido estabelecimento social, prosseguir os seus trâmites, nos termos do disposto no art.º 35.º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 33/2014, de 4 de março, e com os fundamentos constantes do respetivo Projeto de Relatório.
PROPOSTAS
Face ao exposto, propõe-se:
- remeter o presente Relatório ao Conselho Diretivo, para apreciação e deliberação nos termos da Orientação Técnica n.º 12/2011 do referido Conselho Diretivo;
- tornar acessível a consulta ao Centro Distrital de Vila Real, através da aplicação SAF, do conteúdo do presente Relatório e do anterior Projeto de Relatório;
- tornar acessível a consulta ao Núcleo de Contraordenações do referido Centro Distrital, através da aplicação SAF, do auto de notícia elaborado, nomeadamente para efeitos de instauração do respetivo procedimento contra-ordenacional;
- notificar a sócia-gerente do estabelecimento social denominado «FR», remetendo cópia deste Relatório e da deliberação de encerramento; e
- dar conhecimento aos denunciantes (Dr. PM, na qualidade de mandatário judicial do Sr. AMGC e da Sra. D. DMSBC; Sra. D. MFNA e Sra. D. TVLM, na qualidade de sócias da sociedade denominada «MG, Lda.»; e Sra. D. ACM, na qualidade de encarregada de educação dos menores AAP) das conclusões deste procedimento de fiscalização.
(…)
(cf. documento de fls. 32 a 34 do processo administrativo junto aos presentes autos);
14. Sobre o Relatório Final referido no ponto anterior, recaiu, em 24/10/2018, despacho de concordância proferido pela Vogal do Conselho Directivo do Requerido, Sofia Borges Pereira, com o seguinte teor:
“Concordo.
Atenta a informação constante do relatório da ação de fiscalização nomeadamente quanto à demonstração de interesse da entidade gestora do equipamento ilegal em regularizar a situação, deve a Direção do CDist., aquando da notificação, encetar diligências para que seja prestada:
- informação do respetivo quadro legal e procedimentos instituídos para licenciamento de Creche à gestora do equipamento, se necessário em articulação com a Câmara Municipal e demais entidades competentes, no sentido de prevenir reincidências;
- informação e apoio às famílias no âmbito dos seus direitos e deveres e se, se necessário também em articulação com a Câmara Municipal, encetar marcação com os familiares para atendimento e acompanhamento social, no sentido de elaborar diagnóstico dos AF e avaliar eventuais apoios prestacionais e sociais necessários e encaminhamento das crianças.”
(cf. documento de fls. 32 do processo administrativo junto aos presentes autos);
15. Em 31/10/2018, o Conselho Directivo do Requerido deliberou, além do mais:
“1. Ordenar o encerramento administrativo imediato do estabelecimento de apoio social denominado FR com as seguintes características:
- exerce a atividade de Creche;
- com fins lucrativos;
- não estando licenciado;
- funciona sob a propriedade de FR-Unipessoal, Lda.;
- está instalado em Rua A…, n.º 1, Vila Real.
2. Fixar o prazo de 30 dias para a cessação da atividade, devendo a entidade responsável fazer tudo que for necessário para respeitar esse prazo.
3. Mandar notificar a entidade proprietária e afixar um aviso na porta principal de acesso ao estabelecimento, que aí se deve manter pelo prazo de 30 dias.
Defesa dos direitos e da qualidade de vida dos utentes
A deliberação tomada tem por fundamento deficiências graves nas condições de instalação, segurança e funcionamento do estabelecimento, representando um perigo potencial para os direitos dos utentes e a sua qualidade de vida, conforme se indica no relatório da Unidade de Fiscalização, que se anexa.
(…)
(cf. documento de fls. 32 e 35 do processo administrativo junto aos presentes autos);
16. Em 27/11/2018 a Requerente foi pessoalmente notificada da deliberação referida no ponto anterior pela Polícia de Segurança Pública (cf. documentos de fls. 37 e 38 do processo administrativo junto aos presentes autos).
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B – De direito
1. Pela sentença recorrida o Mmº Juiz a quo julgou improcedente o pedido cautelar com fundamento na não verificação do requisito do fumus boni iuris a que alude o artigo 120º nº 1 do CPTA, considerando em consequência prejudicado o conhecimento do requisito do periculum in mora em face da natureza cumulativa dos requisitos necessários para o decretamento da providência.
Decisão que assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«Também designado por aparência do bom direito, o fumus boni iuris, como se retira da segunda parte do n.º 1 do art.º 120º do CPTA, exige, para a concessão da providência cautelar, que seja provável que a pretensão formulada ou a formular pelo requerente no processo principal venha a ser julgada procedente.
Trata-se, portanto, de um juízo positivo, ainda que perfunctório, sobre o bem fundado da alegação que o requerente da tutela cautelar pretende fazer valer no processo principal [vd. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2014, pág. 477].
Assim, ainda que em termos sumários, o juiz tem o poder e o dever de avaliar a probabilidade da procedência da acção principal, avaliando a existência do direito invocado pelo requerente ou da ilegalidade que ele diz existir, uma vez que a referência do legislador ao fumus visa exprimir que a convicção prima facie do fundamento substancial da pretensão é adequada à decisão cautelar, ao contrário do que se exige na decisão dos processos principais [vd. JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “Justiça Administrativa – Lições”, 15ª edição, Almedina, 2016, pp. 318 e 321].
A Requerente erige o seu pedido de tutela cautelar sobre a invocação de que o acto que determinou o encerramento administrativo se estribou na norma ínsita no art.º 35º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março, que prevê uma mera possibilidade da Administração determinar o encerramento imediato do estabelecimento e não um dever.
Donde, conclui a Requerente que o Requerido, “ao invés do decretar do encerramento, a medida que se nos afigura ser a mais correcta seria a de conceder à Requerente um prazo para que a mesma procedesse a todas as (eventuais) correcções que se mostrassem necessárias ao seu funcionamento”.
Apreciando.
À semelhança da petição inicial numa acção administrativa, o requerente de uma providência cautelar deve expor as razões de facto e de direito em que fundamenta a sua pretensão, derivando do disposto no art.º 114º, n.º 3, alínea g) do CPTA que “No requerimento, deve o requerente: (…) Especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência”.
Impõe-se, pois, ao requerente da providência o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida [art.º 342º do CC], não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo.
O requerente terá de tornar credível a sua posição através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivas nas quais sustenta a verificação dos requisitos da providência já que, da conjugação dos art.os 112º, n.º 2, alínea a), 114º, n.º 3, alíneas f) e g), 118º e 120º do CPTA, não se mostra consagrada uma presunção iuris tantum da existência dos aludidos requisitos como simples decorrência da execução dum acto, pelo que o requerente não está desobrigado ou desonerado de fazer a prova e demonstração dos factos integradores dos pressupostos ou requisitos em questão, alegando, para o efeito, de modo especificado e concreto tais factos, já que não é idónea uma alegação de forma meramente conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas – cf., entre outros, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 14/07/2008 (proc. n.º 0381/08), de 19/11/2008 (proc. n.º 0717/08) e de 22/01/2009 (proc. n.º 06/09); assim como os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 11/02/2011 (proc. n.º 01533/10.6BEBRG), de 08/04/2011 (proc. n.º 01282/10.5BEPRT-A), de 08/06/2012 (proc. n.º 02019/10.4BEPRT-B), de 14/09/2012 (proc. n.º 03712/11.0BEPRT), de 30/11/2012 (proc. n.º 00274/11.1BEMDL-A), de 25/01/2013 (proc. n.º 02253/10.7BEBRG-A), de 25/01/2013 (proc. n.º 01056/12.9BEPRT-A), de 08/02/2013 (proc. n.º 02104/11.5BEBRG), de 17/05/2013 (proc. n.º 01724/12.5BEPRT), de 31/05/2013 (proc. n.º 00019/13.1BEMDL), de 14/03/2014 (proc. n.º 01334/12.7BEPRT-A), de 17/04/2015 (proc. n.º 03175/14.8BEPRT), de 31/08/2015 (proc. n.º 00370/15.6BECBR) e de 03/06/2016 (proc. n.º 00033/16.5BECBR).
No caso vertente, alega a Requerente que a Administração ao invés de decidir pelo encerramento imediato do seu estabelecimento, deveria ter optado por conceder-lhe um prazo para regularizar o seu funcionamento, por ser a medida que, no caso, se afigurava mais correcta.
E nada mais refere.
Ou seja, a Requerente limita-se a alegar que o Requerido deveria ter tomado outra medida em face da situação irregular em que se encontrava o seu próprio estabelecimento – que a própria reconhece e admite ser verdade – por considerar, simplesmente, que esta seria mais correcta.
Não concretizando em que medida e com que fundamentos é que a mesma seria a mais correcta do seu ponto de vista, nem extraindo dessa alegação qualquer violação de uma norma jurídica ou de qualquer princípio geral da actividade administrativa.
Fica, desta forma, o Tribunal sem conhecer ou compreender qual a ilegalidade que a Requerente imputa ao acto administrativo suspendendo.
Apenas se percebe que a Requerente com ele não concorda. Mas tal não é suficiente para demonstrar a sua ilegalidade e, muito menos, para demonstrar a provável procedência da sua pretensão a formular na acção principal.
Poder-se-á intuir que a Requerente procure assacar ao acto uma eventual ilegalidade por violação do princípio da proporcionalidade, pois invoca que perante duas possibilidades que a lei lhe atribuía, o Requerido optou pelo encerramento imediato do seu estabelecimento ao invés de emitir uma autorização provisória de funcionamento nos termos previstos no art.º 19º do Decreto-Lei n.º 64/2017, de 14 de Março.
Todavia, não vem minimamente densificada tal alegação, quer com argumentação jurídica, quer com invocação de factos que, de alguma forma, permitissem a este Tribunal debruçar-se sobre a questão.
Além disso, importa referir que a Requerente não alega nem comprova nos presentes autos que esteja em curso um procedimento destinado à emissão da licença de funcionamento da creche que explora, requisito essencial para convocar o art.º 19º do Decreto-Lei n.º 64/2007, pois que a autorização provisória de funcionamento destina-se a conceder ao particular a possibilidade de colocar em funcionamento o seu estabelecimento, no decurso do procedimento de licenciamento da actividade, no caso de não se encontrarem reunidas todas as condições de funcionamento exigidas para a concessão da licença, mas ser seguramente previsível que as mesmas poderão ser satisfeitas (salvo se as condições de funcionamento forem susceptíveis de comprometer a saúde, segurança ou bem-estar dos utentes).
Pelo que, a possibilidade aventada pela Requerente não teria viabilidade no caso ora sub specie.
Por outro lado, a possibilidade que a lei confere ao Requerido de determinar o encerramento imediato do estabelecimento nos casos em que este apresente deficiências graves nas condições de instalação, segurança, funcionamento, salubridade, higiene e conforto, que ponham em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida (art.º 35º do Decreto-Lei n.º 64/2007), ainda que pudesse ser vista como integrando a margem de actuação discricionária da Administração por não traduzir uma vinculação da Administração a esse encerramento, a verdade é que somente com base em erro grosseiro, crasso ou palmar ou por violação dos princípios gerais da actividade administrativa (que, como referido supra, não vêm invocados nem tão-pouco densificados minimamente para permitir a sua sindicabilidade pelo Tribunal), mormente do princípio da proporcionalidade, seria possível ao Tribunal proceder ao seu escrutínio, sob pena de ferir o princípio da separação e interdependência de poderes, ínsito na ideia de Estado de direito democrático consagrada no art.º 2º da Constituição da República Portuguesa.
E nada dos autos consta ou leva a crer – muito pelo contrário – que o Requerido tenha partido de erro grosseiro na análise da situação da Requerente e do seu estabelecimento para determinar o seu encerramento imediato ou que tal medida, de alguma forma, ofenda os princípios gerais que norteiam a actividade administrativa.
Outrossim, analisado o probatório, resulta à saciedade que a Requerente não detém qualquer título que lhe permita exercer a actividade de creche, reconhecendo inclusivamente que não dispõe de licença para o efeito – caso contrário não pugnava em sede de audiência prévia pela emissão da licença provisória de funcionamento nem alegava nos presentes autos que deveria ser essa medida a adoptada pelo Requerido.
Pelo que, ainda que o acto de encerramento pudesse ser anulado, sempre a Requerente continuaria a sua actividade numa situação de ilegalidade ex ante ao próprio acto – no mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 08/05/2014 (proc. n.º 11054/14).
Consequentemente, no que respeita ao requisito do fumus boni iuris na formulação do n.º 1 do art.º 120º CPTA, não se verifica o pressuposto da aparência de ilegalidade da actuação administrativa que demonstre ser provável que a pretensão a formular na acção principal venha a ser julgada procedente.
Assim, e em suma, inexiste fumus boni iuris.»
2. A recorrente propugna que os artigos 18º, 22º, 23º, 24º, 26º, 39 e 41º do Requerimento Inicial do processo cautelar vertem factualidade que não foi impugnada pelo requerido, e que assim, devem esses factos ter-se como admitidos por acordo, por via do efeito cominatório previsto no artigo 574º do CPC ex vi do artigo 1º do CPTA; que mesmo que não se entenda que esses factos estão admitidos por acordo não ocorreu quanto a eles produção de prova, tendo o Tribunal a quo incumprido o disposto no artigo 118º nº 5 do CPTA por não ter sido permitido à requerente provar os factos que tinha alegado através da prova testemunhal requerida no seu requerimento inicial; que tal matéria é suficiente para que se julgue verificado o requisito do fumus boni iuris levando à revogação da sentença recorrida.
3. A final do requerimento inicial do processo cautelar a requerente, além da prova documental que juntou, requereu a produção de prova testemunhal arrolando quatro (4) testemunhas, que ali identificou.
4. Mas a mera circunstância de ter sido requerida pelas partes, em sede de processo cautelar, a produção de prova testemunhal, não implica que necessariamente o Tribunal a quo esteja adstrito à realização da respetiva diligência de inquirição de testemunhas, como claramente decorre do disposto no artigo 118º nº 1 do CPTA.
5. A respeito da produção de prova em sede cautelar dispõe o artigo 118º do CPTA o seguinte:
“Artigo 118.º
Produção de prova
1 — Juntas as oposições ou decorrido o respetivo prazo, o processo é concluso ao juiz, podendo haver lugar a produção de prova, quando este a considere necessária.
2 — Na falta de oposição, presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente.
3 — O juiz pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias, não sendo admissível a prova pericial.
4 — O requerente não pode oferecer mais de cinco testemunhas para prova dos fundamentos da pretensão cautelar, aplicando -se a mesma limitação aos requeridos que deduzam a mesma oposição.
5 — Mediante despacho fundamentado, o juiz pode recusar a utilização de meios de prova quando considere assentes ou irrelevantes os factos sobre os quais eles recaem ou quando entenda que os mesmos são manifestamente dilatórios.
6 — As testemunhas oferecidas são apresentadas pelas partes no dia e no local designados para a inquirição, não havendo adiamento por falta das testemunhas ou dos mandatários.
7 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, e estando a parte impossibilitada de apresentar certa testemunha, pode requerer ao tribunal a sua convocação.”
6. Da conjugação do ónus, a cargo do requerente de uma providência cautelar, de no seu requerimento inicial especificar os fundamentos do pedido cautelar, alegando os factos integradores da causa de pedir da concreta pretensão cautelar, nos termos do princípio do dispositivo e do especificamente disposto no artigo 114º nº 3 alínea g) do CPTA, com o efeito cominatório previsto no artigo 118º nº 2 do CPTA de acordo com o qual “na falta de oposição presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente”, fazendo corresponder, assim, à falta de impugnação à admissão, por acordo, dos factos alegados, tem que considerar-se que as diligências de prova necessárias, à luz do disposto do artigo 118º nº 3 do CPTA hão-de incidir desde logo sobre os factos que se mostrem controvertidos, designadamente por terem si alvo de impugnação na oposição, e dentro desses os que importem para a decisão da causa em conformidade com os critérios decisórios insertos no artigo 120º do CPTA.
7. Isto sem prejuízo de não ter o juiz cautelar que se satisfazer com as provas carreadas ou requeridas pelas partes, podendo ordenar a produção de outros meios de prova que considere necessárias em face das questões suscitadas e a decidir, à luz do princípio da inquisitoriedade na averiguação da verdade material, como também decorre do disposto no artigo 118º nº 3 do CPTA (vide a este respeito Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, pág. 597 ss. e José Manuel Santos Botelho, in, Contencioso Administrativo – Anotado – Comentado - Jurisprudência, Almedina, 2002, pág. 664).
8. Assim, apenas cumpre ao juiz cautelar levar a cabo as diligências de prova relativamente a factos concretos que se mostrem controvertidos, designadamente por terem si alvo de impugnação na oposição, e dentro desses os que importem para a decisão da causa em conformidade com os critérios decisórios insertos no artigo 120º do CPTA – (vide, entre muitos outros, a título ilustrativo, os acórdãos do TCA Sul de 10/08/2015, Rec. n.º 12.424/15 (Proc. nº 232/15.7BECTB-A), e de 06/10/2016, Rec. nº 13.590/16 (Proc. nº 53/16.0BEBJA) e deste TCA Norte de 01/02/2019, Proc. n.º 593/18.6BECBR, de que fomos relatores).
9. Os estabelecimentos de apoio social geridos por entidades privadas, abrangidos pelo regime contido no DL. n.º 64/2007, de 14 de Março, como é o caso do estabelecimento de creche em causa nos autos, só podem iniciar a sua atividade após a concessão da respetiva licença de funcionamento, da competência do Instituto da Segurança Social, IP, aberto que seja o respetivo processo de licenciamento a requerimento do interessado (cfr. artigo 11º do DL. n.º 64/2007).
A licença é concedida quando, concluído o processo de licenciamento, se verificar que o estabelecimento reúne todos os requisitos (cfr. artigo 18º do DL. n.º 64/2007), o que depende da verificação das seguintes condições: a) da existência de instalações e de equipamento adequados ao desenvolvimento das atividades pretendidas; b) da apresentação de projeto de regulamento interno, nos termos do artigo 26.º; c) da existência de um quadro de pessoal adequado às atividades a desenvolver, de acordo com os diplomas referidos no artigo 5.º; d) da regularidade da situação contributiva do requerente, quer perante a segurança social, quer perante a administração fiscal; e) da idoneidade do requerente e do pessoal ao serviço do estabelecimento, nos termos do disposto no artigo 14.º (cfr. artigo 12º do DL. n.º 64/2007).
Os estabelecimentos podem também iniciar atividade ao abrigo de autorização provisória, nos termos do artigo 19º do DL. n.º 64/2007, que dispõe o seguinte:
“Artigo 19º
Autorização provisória
1 - Nos casos em que não se encontrem reunidas todas as condições de funcionamento exigidas para a concessão da licença, mas seja seguramente previsível que as mesmas possam ser satisfeitas, pode ser concedida uma autorização provisória de funcionamento, salvo se as condições de funcionamento forem suscetíveis de comprometer a saúde, segurança ou bem-estar dos utentes.
2 - A autorização referida no número anterior é concedida, por um prazo máximo de 180 dias, prorrogável por igual período, por uma só vez, mediante requerimento devidamente fundamentado.
3 - Se não forem satisfeitas as condições especificadas na autorização provisória dentro do prazo referido no número anterior, é indeferido o pedido de licenciamento.”
10. Na situação dos autos temos que a decisão suspendenda ordenou o encerramento administrativo do identificado estabelecimento de apoio social (creche) da requerente, ao abrigo do disposto no artigo 35º do DL. n.º 64/2007, de 14 de março, com as alterações introduzidas pelo DL. n.º 33/2014, de 4 de março, assente na circunstância de que a atividade de creche é ali exercida sem título autorizativo de funcionamento, e na constatação da inadequação das instalações para o efeito, entre outras anomalias.
Com efeito a decisão que foi tomada tendo por base o relatório elaborado na sequência de ação de fiscalização, no qual foi constatada falta de título administrativo de funcionamento para o exercício da atividade de creche (seja a licença seja a autorização provisória de funcionamento), com violação do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de março, republicado pelo Decreto-Lei n.º 33/2014, de 4 de março. Bem como a inadequação das instalações (em concreto, quanto à localização dos espaços destinadas à estada das crianças num piso acima do rés-do-chão, não se encontrando o espaço dotado de acesso e segurança de comunicações internas e de evacuação em caso de emergência comprovadas pela Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), com violação do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de outubro e quanto à área de receção, à área da direção, aos serviços técnicos e administrativos, à sala-parque, à área do pessoal, às instalações sanitárias, com violação do previsto no Anexo à Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto) e a falta de pessoal com categoria profissional e afetação adequadas à atividade desenvolvida no estabelecimento social em análise (em concreto a inexistência de um elemento de pessoal com a categoria profissional de ajudante de ação educativa para assegurar o pleno funcionamento do período de abertura e de encerramento da Creche, com violação o disposto na alínea c) da Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto). E ainda a verificação de falta de condições de acessibilidade de pessoas com mobilidade condicionada às instalações (por o acesso ao primeiro piso ser realizado, unicamente, por escadas), a inexistência de certificado de segurança relativo aos meios de proteção contra o risco de incêndio; de medidas de autoproteção; de placas de sinalização; de iluminação de emergência; de detetores automáticos de incêndio; e de saída direta para o exterior no primeiro piso; a inexistência de realização de vistoria higiossanitária às instalações, bem corno a inexistência, nas mesmas, de registos de higienização.
11. Ora, a respeito do encerramento administrativo dos estabelecimentos de apoio social, o artigo 35º do DL. n.º 64/2007 dispõe o seguinte;
“Artigo 35.º
Condições e consequências do encerramento administrativo
1 - Pode ser determinado o encerramento imediato do estabelecimento nos casos em que apresente deficiências graves nas condições de instalação, segurança, funcionamento, salubridade, higiene e conforto, que ponham em causa os direitos dos utentes ou a sua qualidade de vida.
2 - A medida de encerramento implica, automaticamente, a caducidade da licença ou da autorização provisória de funcionamento, bem como a cessação dos benefícios e subsídios previstos na lei. “
11. A requerente não pôs em causa os pressupostos de facto em que a entidade requerida assentou a ordem de encerramento do seu estabelecimento.
E é indubitável que face à inexistência de título administrativo de autorização de funcionamento da creche, seja a licença seja a autorização provisória de funcionamento, e à concomitante constatação da inadequação e deficiências das instalações, verificada em sede de ação de fiscalização, e relatada no relatório em que assentou a decisão suspendenda, a ordem de encerramento se encontra legitimada, à luz do quadro normativo convocado.
O que seria suficiente para negar-se a decretação da providência por não verificação do requisito do fumus boni iuris.
12. De todo o modo compulsado o Requerimento Inicial da requerente emerge que nele foi alegado, nos indicados artigos 18º, 22º, 23º, 24º, 26º, 39º e 41º, foi o seguinte:
- artigo 18º: «Dado que nessas instalações, durante vários anos, já foi leccionado o 1º ciclo de estudos do ensino básico, a Requerente convenceu-se de que no espaço em causa era, legalmente possível, instalar a creche, ainda que sujeita a obras de alteração, tendo em conta que as crianças que frequentam a creche são desde logo mais pequenas e em tudo diferentes das crianças que frequentam o 1º ano e seguintes»;
- artigo 22º: «Acresce que, nunca e em circunstância alguma estiveram ou estão em causa os direitos e a qualidade de vida dos utentes da creche, motivos pelos quais a mesma continua a ter crianças, as quais ali são levadas, diariamente, pelos seus pais ou familiares, os quais são testemunhas do esforço da Requerente para que tudo esteja dentro normalidade»;
- artigo 23º: «Daí que, desde 4 de Junho p.p. a Requerente esteja e está empenhada em regularizar toda a situação, desde as instalações até à parte administrativa junto de todas as Entidades, facto que só com o decurso do tempo é que se logrará obter, tendo em conta que, como é sabido, tudo, incluindo as entidades tutelares, tem os seu prazos e os seus timings inclusive de resposta»;
- artigo 24º: «Desde essa data, a Requerente já procedeu a obras nas instalações, já comprou equipamento, etc, tudo com vista ao bem-estar dos utentes / crianças – cf. doc.s 6, 7, 8, 9, 10, e 11, cujo teor aqui, por questão de economia processual, se dá por reproduzido para todos os efeitos legais»;
- artigo 26º: «As pessoas em causa são profissionais com formação para o cargo que cada um ocupa»;
- artigo 39º: «até porque, in casu, o funcionamento da creche não coloca em causa nenhum aspecto vital e fundamental da vida da comunidade»;
- artigo 41º: «Na verdade, tendo em conta que a Requerente colocou e coloca em prática, diariamente, todas as condições e medidas necessárias à prossecução das suas finalidades, as quais toma também como objectivos a atingir, e, são presenciadas e “fiscalizadas”, também diariamente, pelos pais»
13. Ora, as alegações assim feitas, não são de molde a afastar, mesmo numa análise perfuntória, própria da sede cautelar em que os encontramos, o bem fundado da ordem de encerramento do estabelecimento da requerente. Isto na exata medida em que à luz do quadro normativo aplicável as circunstâncias ali alegadas não assumem qualquer relevância, pertinência ou acuidade no sentido de afastar ou impedir a decidida ordem de encerramento.
Nem permitindo, simultaneamente, consubstanciar a invalidade da ordem de encerramento do estabelecimento. A qual, como se viu, se mostra, mesmo num juízo perfuntório, apoiada na lei e fundada nas circunstâncias factuais que foram apuradas em sede de ação de fiscalização que não são refutadas pela requerente.
14. E se assim é, tem que concluir-se ter sido correto o julgamento de improcedência do pedido cautelar, por falta de verificação do requisito do fumus boni iuris.
15. Não há, pois, que proceder à modificação do julgamento da matéria de facto, nem à baixa dos atos para a produção de prova, nos termos propugnados pela requerente, por se revelar infrutífera, nos termos sobrevistos, para a utilidade do recurso e para o despacho do processo cautelar.
16. Aqui chegados, não merecendo provimento o recurso, deve confirmar-se a decisão recorrida. O que se decide.
***
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
Notifique.
D.N.
Porto, 3 de maio de 2019
Ass. Helena Canelas
Ass. Isabel Costa
Ass. João Beato