Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00366/10.4BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/25/2018
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:AUDIÇÃO DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
Sumário:I - Nos termos do artigo 23.º n.º 4 da LGT a reversão, mesmo nos casos em que exista presunção de culpa, é precedida da audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seu pressupostos e extensão a incluir na citação.
II. A audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP bem como a fundamentação do ato administrativo e sua notificação é direito também com consagração constitucional (artigo 268.º n. º3 da CRP) tendo a sua densificação no art.º100.º do CPA, art.º 60.º da LGT e art.º 23.º n.º4 do CPPT.
III - Destarte, o despacho que determinou o prosseguimento dos autos para reversão padece de vício de forma, por preterição de formalidade essencial, (art. 60.º, n.º 7, da LGT) uma vez, que não emitiu pronúncia sobre necessidade ou desnecessidade de inquirição das testemunhas arrolada.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:O...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, FAZENDA PÚBLICA, não conformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou procedente a oposição deduzida por O..., contribuinte fiscal n.º 2…no âmbito da execução fiscal n.º 1848-2003/01019244 contra este revertida e originariamente instaurada contra a primitiva devedora, a sociedade “D…, Lda.”, para cobrança coerciva de dívidas relativas a CA e IRC dos anos de 2008 e 2002, no valor global de € 2422,38 €, interpôs o presente recurso.

A Recorrente no recurso jurisdicional formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)

A. Salvo o devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece do vício de omissão de pronúncia, em violação do disposto no art.º 125º do CPPT, da al. d) do n.º 1 do art.º 668º e do n.º 2 do art.º 660, ambos do CPC e de erro de julgamento, por ter decidido em desconformidade com a realidade factual, errando, pois, na valoração da prova, atendendo às razões que passa a expender.

B. A Fazenda Pública, na sua contestação, invocou a excepção do meio impróprio, por, no seu entender, a forma do oponente reagir contra a alegada falta de audição das testemunhas arrolados no exercício do direito de audição seria através do processo de reclamação das decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal, previsto no art.º 276º e segs. do CPPT.

C. O douto tribunal a quo não se pronunciou sobre a invocada excepção, que a ser valorada, como assim entende a Fazenda Pública, daria lugar à absolvição da instância, nos termos nos termos dos art.s 493º, nºs 1 e 2, 494º, al. b), e 288º, al. b), do CPC.

D. Donde a decisão do tribunal a quo encontra-se viciada, devendo por esse efeito ser declarada nula, uma vez que não conheceu da excepção invocada pela Fazenda Pública.

E. Donde a douta sentença padece de vício de omissão de pronúncia, em violação do disposto no art.º 125º do CPPT, da al. d) do n.º 1 do art.º 668º e do n.º 2 do art.º 660, ambos do CPC.

F. A Fazenda Pública considera, ainda, que a decisão do tribunal a quo enferma de erro de julgamento, por ter decidido em desconformidade com a realidade factual, errando na valoração da prova.

G. Face à prova produzida deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que o oponente assinou em 22.10.2003, na qualidade de representante legal da devedora originária, a declaração de cessação de actividade.

H. Resulta evidente, como resultou já para o órgão da execução fiscal, que o recorrido exercia funções de gerente à data em que terminou o prazo para pagamento voluntário dos tributos em questão.

I. Contrariamente ao sentenciado, considera a Fazenda Pública que, in casu, mostravam-se verificados os pressupostos legais de que depende a reversão da execução contra o gerente ora oponente, que somente a titulo subsidiário responde pelas dívidas da sociedade comercial originariamente devedora, e ainda,

J. designadamente a gerência de facto por parte do recorrido no período a que se reporta o prazo legal de pagamento do imposto, por livre iniciativa deste afirmada perante a Administração Tributária.

K. No entanto, entendeu o tribunal a quo que, considerando que o oponente alegou que não exerceu as funções de gerente e tendo arrolado testemunhas, competia ao órgão de execução fiscal pronunciar-se sobre os factos “(…) ouvindo e ponderando a prova carreada para os autos pelo oponente ou pelo menos dizer porque motivo não produzia as provas carreadas pelo oponente especificando as provas que sustentavam o exercício de facto da gerência pelo oponente (…)”.

L. Ora, o órgão de execução fiscal pronunciou-se sobre o alegado pelo oponente no exercício do direito de audição, cf. informação e despacho de 18.03.2010 junto aos autos,

M. rejeitando afinal as alegações produzidas pelo oponente naquela sede, pela certeza do exercício, de facto, da gerência, demonstrada pelos documentos juntos aos autos, i.e., a certidão da conservatória do registo comercial e a declaração de cessação de actividade assinada pelo oponente na qualidade de representante legal da devedora originária.

N. O tribunal a quo não justifica cabalmente a desvalorização da declaração de cessação de actividade assinada pelo oponente na qualidade confessada de representante legal da devedora originária para considerar, como considerou, que este acto só por si não é suficiente para revelar o exercício da facto da gerência.

O. Desde logo, os termos em que declara essa desconsideração são, salvo o devido respeito, incongruentes, porque refere por um lado que o órgão da execução fiscal indicou “acto que revela exercício efectivo da gerência” para, de seguida, dizer que “esse acto só por si não é suficiente para revelar o exercício de facto da gerência”.

P. A Fazenda Pública, sempre respeitosamente, permite-se observar que resulta incompreensível essa constatação mas, entendendo que tal declaração de cessação, integrada no regimento estatutário da sociedade devedora originária, não traduzia o exercício efectivo ou de facto da gerência (que parecem ser expressões em sinonímia), cumpria ao Tribunal a quo que expusesse as razões de diferente valoração dessa prova documental reunida pelo órgão da execução fiscal.

Q. Tal documento é uma prova firmada e segura do exercício efectivo ou de facto da gerência, pois, nele, de forma livre e espontânea o oponente reconhece-se como gerente da devedora principal.

R. E nessa qualidade assim reconhecida pratica um acto de crucial importância para a devedora originária, i.e., manifesta perante a AT a vontade da sociedade de não continuar a desenvolver o seu objecto social.

S. Ademais, a gerência que não tem de ser exercida de forma ampla nem de modo continuado, bastando-se com a prática de algum acto que por si só seja revelador da externação da vontade da sociedade que o seu autor legalmente representa, como, aliás, é entendimento dos tribunais superiores, p.e., expresso no acórdão do TCAN, de 06.07.2006, proc. 00129/98.

T. Não pode, por isso, o tribunal a quo considerar, como infundadamente considerou, que os factos alegados pelo oponente em sede de exercício de direito de audição não podiam ser contrariados como a mera indicação da qualidade de gerente na conservatória do Registo Comercial e a apresentação duma declaração de cessação de actividade.

U. Tais elementos, como se deu conta, são reveladores da participação e actuação do oponente no giro da devedora originária.

V. Mais, e significativamente, o oponente, em sede de direito de audição começa pela tentativa de afastar a sua culpa legalmente presumida,

W. e só depois reage contra a questão do exercício da gerência, limitando-se à mera negação da prática de actos de gerência.

X. Esta conduta procedimental, em que oponente procura antes de mais afastar a presunção de culpa, e só depois recusar a gerência, sem detalhar, sugere perante o órgão instrutor do procedimento de reversão, pois, e ao contrário do entendimento do douto tribunal a quo, fundamento suficiente para confirmar a reversão e a dispensa da realização de quaisquer outras diligências, nomeadamente a audição das testemunhas arroladas.

Y. Tendo presente a prova documental da gerência com origem no próprio responsável, e mostrando-se a solicitada recolha de declarações, nos termos vagos em que foi solicitada, inútil e de valor previsivelmente diminuto, atendendo à factualidade documentalmente apurada pela Administração Tributária,

Z. o órgão instrutor agiu dentro da sua competência de avaliar da necessidade daquela diligência complementar, favorecendo a prova documental dimanada do próprio responsável das declarações que com um elevado grau de probabilidade teriam um conteúdo viciado pelo escopo interessado com que iriam ser feitas,

AA. pois, como escreve Mário Esteves de Oliveira et al., in CPA Comentado, pág. 459, o órgão instrutor é o único a quem compete julgar da necessidade dessas diligências em termos de instrução do procedimento administrativo e da consistência da comprovação já existente sobre as questões (de facto e de direito).

BB. Acresce referir que a Administração Tributária ao, concluir o procedimento com a decisão no sentido em que o foi, implicitamente pronunciou-se quanto à audição das testemunhas, denegando o pretendido pelo oponente.

CC. Assim, emerge de forma clara e evidente dos autos prova que sustenta a posição do órgão de execução fiscal, enquanto titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, devendo ser considerada legitima e legal a reversão contra o recorrido,

DD. não padecendo o despacho do órgão de execução fiscal, mandado anular pelo douto tribunal a quo, de qualquer vício que impeça a sua manutenção na ordem jurídica.

Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida.. (…)”

O Recorrido não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste tribunal teve vista nos autos emitiu parecer no sentido de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser completada a instrução, e após ser proferida nova decisão.

Colhidos os vistos das Exm.ªs Juízas Desembargadoras Adjuntas, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia e em erro de julgamento de facto e de direito ao anular o despacho de reversão e os termos ulteriores do processo de execução fiscal, por desrespeito do direito de participação dos interessados.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efetuado nos seguintes termos:
A) O oponente foi notificado para o exercício do direito de audição no procedimento de reversão do processo de execução fiscal n.º 1848-2003/01019244 e apensos, pela notificação constante de fls. 6 a 9, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) O oponente exerceu o direito de audição nos termos do requerimento de fls. 10 a 12, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
C) Sobre esse requerimento foi lançada a informação e o despacho constantes de fls. 14, que determinou o prosseguimento da reversão, cujo teor aqui se dão por integralmente reproduzidos.
D) O processo de execução fiscal foi revertido contra o oponente por despacho de 25/3/2010, que consta de fls. 18, que aqui se dá por reproduzido.
3.1.1 – Motivação.
O tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base nos documentos juntos aos autos e no processo administrativo que não foram impugnados, identificados em cada um dos factos.
A restante matéria de facto alegada não foi julgada provada ou não provada, por revelar-se inútil para a decisão da causa ou por constituírem conceitos de direito ou alegações conclusivas.(...).”,

3.2. Alteração e aditamento oficioso à matéria de facto.
Oficiosamente, e por nos autos existirem documentos que o comprovem, altera-se a alínea C) dos factos provados e adita-se a alínea E) nos seguintes termos:

C) Sobre o requerimento referido em B) foi lançada a informação constante de fls. 14, que determinou o prosseguimento da reversão, onde consta:
“Nesta data juntei o direito de audição exercido pelo revertido O..., ….sócio gerente da empresa “D….., onde alega que nunca exerceu funções de administração, gestão ou gerência.
Constata-mos que na certidão da Conservatória do Registo Comercial de Paredes o revertido esta registado como gerente desde 1998-03-24 até 2003-05-03.
Em 2003-10-22, na qualidade de representante legal apresenta um pedido de cessação de actividade da empresa D……(fls. 43).
Penso ser de considerar a sua responsabilidade as dívidas fiscais até 2003-10-22, no montante de 2.4222,38 €, e acrescidos se for paga nos 30 dias posteriores à citação.(…)

E) Sobre a informação a que refere o facto C) foi proferido em 18.03.2010 o despacho do Chefe de Finanças no seguinte nos seguintes termos:
Concordo
Face à informação que antecede, aos documentos juntos aos autos e ao que vem alegado pelo contribuinte, procedo à reversão parcial do meu despacho de 22-02-2010, reduzindo a dívida da sua responsabilidade para 2.4222,38 €,
Notifique e após proceda à citação, como proposto, ou seja, ……(…)” (fls 14 dos autos)

3.3. A Recorrente alega que face à prova produzida deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que o oponente assinou em 22.10.2003, na qualidade de representante legal da devedora originária, a declaração de cessação de actividade.
O n.º 1 do artigo 712.º (atual art.º 662.°) do Código de Processo Civil (CPC) , determina que A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Por sua vez, o art.º 685º-B.º do CPC, (atual art.º 640.º) do mesmo diploma impõem que “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
2 – No caso previsto na alínea b) do númeno anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento em erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no número n.º2 do artigo 522.º C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere á impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa proceder à respectiva transcrição (…).”
Resulta da conjunção dos artigos 712.º e 685º-B.º do CPC, (atuais art.ºs 662.º e 640.º) que a Relação [in casu o Tribunal Central Administrativo] deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios.
Assim, para que o TCA possa proceder alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
No caso a Recorrente limita-se a alegar que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por ter decidido em desconformidade com a realidade factual, errando na valoração da prova.
Face à prova produzida deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que o Recorrido assinou em 22.10.2003, na qualidade de representante legal da devedora originária, a declaração de cessação de actividade.
No entanto, não dá cumprimento ao art.º 685º-B.º do CPC, uma vez que não indica em concreto quais meios probatórios, constantes do processo que impunha outra decisão.
Acresce ainda referir que nos autos não consta qualquer a declaração de cessação de actividade, assinada pelo Recorrido em 22.10.2003, na qualidade de representante legal da devedora originária.
Nesta conformidade, não tendo dado cumprimento ao ónus que sobre si impendia rejeita-se o recurso da matéria de facto, nos termos do art.º 685º-B.º do CPC.

4. JULGAMENTO DE DIREITO

4.1. Nas conclusões A) a E) a Recorrente imputa à sentença recorrida nulidade, por omissão de pronúcia, uma vez que não julgou a excessão do meio impróprio por si alegada em sede de contestação.
Por despacho do MM juiz, proferido em 06.07.2011, foi reparada a nulidade da sentença, tendo analisado a exceção.
Tendo concluído que Esse facto consubstancia simultaneamente uma violação do exercício do direito de audição e uma falta de fundamentação, na medida em que não explica o motivo porque não é produzida a prova arrolada. Estes vícios constituem preterição de uma formalidade legal essencial que se projecta na validade do despacho final de reversão.

O julgamento da validade do despacho de reversão tem sido considerado pela jurisprudência 1 2 3 como fundamento de oposição (art. 204.º, n.º 1, alínea i), do CPPT).”

Notificados os intervenientes no processo veio a Recorrente, em 16.08.2011 (fls. 88), informar que se conforma com o julgamento efetuado quanto à exceção, mantendo o recurso na parte do erro de julgamento.
Tendo a Recorrente se conformado com o decidido, nos termos do n.º 5 do art.º 632.º e alínea e) do art.º 277.º ambos do CPC, aplicável ex vimos do artigo alínea e) do art.º 2.º do CPPT, declara-se o mesmo extinto, nesta parte, inutilidade superveniente da lide.

4.2 A questão principal que cumpre resolver, consiste em apreciar se houve erro de julgamento de facto e de direito da sentença recorrida ao ter decidido anular o despacho de 18.03.2010, proferido pelo órgão de execução fiscal sobre o requerimento de audição e os ulteriores termos do processo de execução fiscal.
Vejamos.
O Recorrido na petição inicial invocou a preterição de formalidade essencial no despacho que ordenou o prosseguimento dos autos para reversão, por não se ter pronunciado sobre as questões suscitadas no exercício do direito de audição.
A sentença recorrida após fazer um enquadramento legal e jurisprudencial decidiu que face ao arrolamento em sede de audição, de testemunhas para provar que não exerceu de facto as funções de gerente da sociedade executada e não teve culpa na insuficiência do património, competia ao órgão de execução fiscal pronunciar-se sobre esses factos ouvindo e ponderando a prova carreada para os autos ou pelo menos dizer por que motivo não produzia as provas carreadas pelo Recorrido, especificando as provas que sustentavam o exercício de facto da gerência e a consequente desnecessidade da produção das provas apresentadas.
E ponderou se tal irregularidade se poderia considerar sanada e degradada em formalidade não essencial tendo concluído que no caso, não pode dizer-se de forma segura e inequívoca que a falta de apreciação dos elementos novos suscitados pelo Recorrido, não poderia resultar numa alteração da matéria de facto e de direito relevantes para a decisão.
Entendeu que o desrespeito do exercício do direito de participação constitui preterição de formalidade legal essencial, vício de forma que determina a ilegalidade do despacho que ordena o prosseguimento do processo para reversão e a sua anulação (arts. 60.º do RCPIT, 60.º, n.º 7, da LGT, 135.º do CPA e 204.º, n.º 1, alínea i), do CPPT).
Apreciando:
Nos termos do artigo 23.º n.º 4 da LGT a reversão, mesmo nos casos em que exista presunção de culpa, é precedida da audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seu pressupostos e extensão a incluir na citação. Exige este preceito que seja dado ao responsável subsidiário a possibilidade de se pronunciar sobre esse ato.
A audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP bem como a fundamentação do ato administrativo e sua notificação é direito também com consagração constitucional (artigo 268.º n. º3 da CRP) tendo a sua densificação no art.º100.º do CPA, art.º 60.º da LGT e art.º 23.º n.º4 do CPPT.
No âmbito do exercício desse direito, é permitido ao particular a participação na decisão final, não só através da apresentação da sua perspetiva da situação, mas também através da sugestão da produção de novas provas que invalidem ou, pelo menos, ponham em causa as razões invocadas no projecto de decisão.
A audição prévia do sujeito passivo revertido, aqui Recorrido, permite contrapor ao projeto de decisão, a apresentação de outros meios de prova com vista a alteração da proposta de decisão.
Tendo sido dada possibilidade ao Recorrido de se pronunciar, foi cumprida a formalidade procedimental, no entanto, e face aos argumentos plasmados pelo Recorrido no requerimento, nomeadamente o arrolamento das testemunhas, impunha-se que o órgão de execução fiscal, ponderasse esses argumentos e meios de prova.
Resulta da matéria assente no probatório, neste acórdão reformulado, alínea C) e E) - que nem a informação que sustentou o despacho de reversão nem mesmo o próprio despacho, se pronunciam quanto aos argumentos nem quanto à necessidade ou desnecessidade de inquirição das testemunhas arroladas, ignorando por completo.
E como bem refere a sentença recorrida “A referida falta de pronúncia do órgão de execução fiscal no despacho proferido sobre o requerimento do direito de audição integra uma falta do exercício efectivo do direito de audição, porquanto equivale a um mero exercício formal do direito de audição, por não se ter pronunciado, em concreto, sobre esses elementos novos, não os apreciando, nem decidindo.(…)”
É jurisprudência deste TCAN, e citada na sentença recorrida, que “ III – Tendo o responsável subsidiário aduzido razões que contrariam o seu chamamento à execução, a administração é obrigada a ponderar essas razões e traduzi-las no despacho de reversão.
IV – Significa o exposto que o despacho de reversão deve ser fundamentado e numa situação destas expor os motivos que levaram a afastar as razões em contrário do responsável.
V – Não o fazendo, ou limitando-se a concluir que o responsável nada carreou de novo para os autos deve o despacho ter-se por insuficientemente fundamentado o que o torna anulável. (Cfr. Acórdão n.º 1376/04.6 BEPRT, de 08.05.2008, da 2.ª secção contencioso tributário disponível em www.dgsi.pt.).
Com efeito, o ora despacho recorrido, do chefe de finanças não se pronunciou sobre tal questão e omitiu a análise dessa prova apresentada não precisando sequer porque dispensou a inquirição das testemunhas. Não apreciou assim os novos elementos de facto carreados para os autos o que determina uma preterição de formalidade legal que inquina a decisão.
Destarte, o despacho que determinou o prosseguimento dos autos para reversão padece de vício de forma, por preterição de formalidade essencial, (art. 60.º, n.º 7, da LGT) uma vez, que não emitiu pronúncia sobre necessidade ou desnecessidade de inquirição das testemunhas arrolada.
E não se diga como alega a Recorrente, que a Administração Tributária ao, concluir o procedimento com a decisão no sentido em que o foi, implicitamente pronunciou-se quanto à audição das testemunhas, denegando o pretendido pelo oponente, pois impunha-se uma pronúncia expressa sobre necessidade ou desnecessidade de inquirição das testemunhas arroladas
Nesta conformidade, improcede o presente recurso.

4.4. Nas conclusões H. a K., M a Z, a Recorrente pretende infirmar que estão verificados os pressupostos legais da reversão contra o Recorrido, por ter exercido a gerência de facto, sendo que tal consta do registo da conservatória do registo comercial e da declaração de cessação da actividade assinada em 22.10.2003, na qualidade de representante legal da devedora originária.
Face ao anteriormente decidido a questão da verificação dos pressupostos da reversão fica prejudicada, pois tal questão fica a montante, ou seja, se a reversão foi validamente efetuada, depois de terem sido respeitados os direitos do contribuinte.
Não tendo sido cumprida a formalidade legal – audição do contribuinte - inquina o despacho de reversão.
Nesta conformidade, improcedem as citadas conclusões.

4.4. E assim formulam-se a seguintes conclusões, apropriando-nos com a devida vénia do sumário do citado acórdão:

I -. Nos termos do artigo 23.º n.º 4 da LGT a reversão, mesmo nos casos em que exista presunção de culpa, é precedida da audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seu pressupostos e extensão a incluir na citação.

II. A audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP bem como a fundamentação do ato administrativo e sua notificação é direito também com consagração constitucional (artigo 268.º n. º3 da CRP) tendo a sua densificação no art.º100.º do CPA, art.º 60.º da LGT e art.º 23.º n.º4 do CPPT.

III - Destarte, o despacho que determinou o prosseguimento dos autos para reversão padece de vício de forma, por preterição de formalidade essencial, (art. 60.º, n.º 7, da LGT) uma vez, que não emitiu pronúncia sobre necessidade ou desnecessidade de inquirição das testemunhas arrolada.


5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, julgar extinta a instância, com que concerne à nulidade de sentença e no demais negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Porto, 25 de maio de 2018

Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Cristina Travassos Bento