Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01426/12.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/04/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:CORREÇÕES ARITMÉTICAS, PRESSUPOSTOS DO RECURSO;
Sumário:I. Na verdade, como é sabido, de acordo com o artigo 75º, nº 1 da LGT, as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, presumem-se verdadeiras.

II. Essa presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).

III. Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a administração tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos.

IV. Mas, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte.

V.É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil, de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Massa Insolvente de (...)
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
Os Recorrentes, Massa Insolvente de (...), contribuintes n°s (…) e (…), respetivamente, melhor identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a pretensão pelos mesmos deduzida na impugnação judicial, relacionada com as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, referentes aos anos de 2008, 2009 e 2010.

Os Recorrentes interpuseram o presente recurso, formulando nas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…)

. A) Quanto à impugnação da decisão de facto:
1ª A sentença recorrida incorreu em erro na apreciação da matéria de facto, pelo que há que analisar em primeiro lugar o erro na apreciação da matéria de facto dada como provada e não provada, cuja alteração se afigura necessária, e que influenciou decisivamente a decisão de direito proferida.
2ª A questão decidenda, fulcral nos presentes autos, é a de saber se a determinação da matéria coletável, que deu origem às liquidações de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) resultante de prévio procedimento de inspeção tributária, ocorreu por mera correção aritmética como alega a IT e a recorrida Administração Tributária e Aduaneira (ATA), com respeito pelos pressupostos de facto e de direito previstos legalmente para este método de determinação da matéria coletável. Os recorrentes entendem que não, que sob a designação de correções aritméticas a AT aplicou, isso sim, presunções, recorrendo a amostragens aleatórias e outros métodos indiretos e que, por via disso as liquidações enfermam de manifesta ilegalidade. Associada a esta questão colocam-se outras questões de direito relacionadas com os vícios formais do procedimento inspetivo e do próprio procedimento de determinação da matéria coletável e, ainda, da caducidade da liquidação do ano de 2008.
3ª De toda a prova testemunhal produzida, apresentada pelas partes, dos depoimentos das testemunhas da própria AT, transcritos nas presentes alegações, bem assim como do teor dos documentos apresentados pelas partes nos autos, impõe diferente decisão sobre a matéria de facto. Assim, a conclusão contida no ponto 8 da matéria de facto considerada provada incorpora uma conclusão de direito que deve ser excluída, pelo que deve ser alterada. Pelo que, à decisão da matéria de facto impõem-se as seguintes alterações:
A) Do ponto 8 da matéria de facto provada deve constar apenas que “Na sequência da inspeção acima mencionada, a Autoridade Tributária fixou matéria tributável em sede de IVA, dos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de, respetivamente €54.023,70 €54.817,44 e €56.893,04 – cfr. relatório de inspeção a fls 33 a 66 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.”
B) Na parte referente á matéria de facto não provada deve passar a constar um ponto novo, do qual conste que “Para apuramento da matéria coletável a Inspeção recorreu a indícios, procedeu a amostragens aleatórias quanto à determinação dos stocks, que não verificou, e das vendas determinadas oficiosamente.”
4ª - Não se afigura aceitável a desconsideração pelo recurso a margens de lucro, amostragens e outros indícios serviram apenas para constituir meros indícios para a realização da inspeção. Ora, resulta dos autos que assim não foi. Ou seja, o momento em que a IT se serve, utiliza e recorre à aplicação desses indícios não antecedeu a inspeção mas sim ocorreu durante a inspeção e servem de fundamento, isso sim, para a correção da matéria coletável. Isto resulta com total evidência do relatório de Inspeção, incluindo a matéria nele vertida a páginas 33 a 66 dadas como provadas na alínea F) da matéria de facto provada. A conclusão do M. Juiz quanto a este ponto é incongruente com o que ele próprio considera como provado. É que, a fls 33 a 66 do Relatório constam, precisamente, os métodos utilizados pela Sra. Inspetora para chegar à matéria coletável que veio a determinar. Não se trata de justificar a realização da Inspeção (como considerou o M. Juiz a quo), a qual foi ordenada muito antes da elaboração do Relatório, mas sim, efetivamente, de tentar justificar o percurso que conduziu à fixação da matéria coletável, donde resulta não estarmos perante meras correções aritméticas mas antes perante a aplicação de métodos indiciários, ou, de um método misto, diferente de qualquer dos dois previstos na lei (vd. artigos 81º a 85º da LGT), o que se afigura manifestamente ilegal.
5ª - Face ao disposto na lei a AT não pode sobre a capa de estar a recorrer à aplicação de meras correções aritméticas aplicar métodos indiretos, apenas para violar o procedimento e as garantias que estão associadas à determinação da matéria coletável por recurso a métodos indiretos. Foi precisamente isso que sucedeu no caso em apreço, sendo certo que o M. Juiz a quo não entendeu assim. Acresce que, a prova não se pode bastar com o recurso aos elementos vertidos no Relatório de Inspeção, pois que são esses mesmos que se encontram em discussão nos presentes autos, logo é matéria controvertida.
6ª - O Tribunal a quo ao dar como provada a matéria contida no cap. III do Relatório, reconhece como provado que a forma que a IT/AT escolheu para chegar à fixação da matéria coletável assentou em recurso a amostragens, indícios e extrapolações incompatíveis com o método definido na lei como “correções meramente aritméticas”, o qual pressupõe objetividade absoluta nas correções efetuadas a partir dos elementos da contabilidade do Sujeito Passivo (SP), sem necessidade de recurso a métodos indiretos, assentes em amostragens ou outros, dos quais se procede á “extrapolação global”, como reconhece a Sra. Inspetora no seu depoimento.
7ª - Impõe-se extrair da prova testemunhal produzida (bem assim como do que vem descrito no Relatório) quais os métodos aplicados e a partir dos quais a IT/AT chegou aos valores de IVA fixados. Resulta da sentença recorrida, que o M. Juiz a quo desvalorizou totalmente os depoimentos das testemunhas indicadas pela Requerente. A fundamentação que apresenta para tal desvalorização não é aceitável, porquanto, se é verdade que algumas das testemunhas indicadas pelos impugnantes eram e são seus funcionários, não é menos verdade que a Sra. Inspetora e Sr. Inspetor perito informático indicados pela AT também são funcionários da Requerida. Não se afigura justo, desvalorizar os depoimentos dos primeiros por essa razão e não aplicar o mesmo critério de valoração aos segundos, quando razão idêntica os caracteriza.
7ª Acresce que, na opinião do M. Juiz a quo, mesmo o depoimento do TOC não se afigura credível porquanto se trata de uma testemunha com relações profissionais com os impugnantes. A ponderação realizada pelo M. Juiz a quo sobre a fiabilidade dos depoimentos não é justa nem isenta. Note-se que, no caso, as testemunhas da AT são seus funcionários, sujeitos a ordens de serviço impostas pela hierarquia enquanto das testemunhas indicadas pelos impugnantes duas são seus funcionários e sabem bem (só eles sabem) como funcionam as lojas e o sistema informático e quais as falhas e dificuldades que encontravam, as outras duas são totalmente alheias à atividade dos impugnantes, embora a conheçam por razões de auditorias regularmente realizadas (não se vê qual a razão de ciência para a sua não credibilidade) e por fim, o TOC é um profissional independente, sujeito a um código deontológico exigente e a responsabilidades pessoais por eventuais falhas contabilísticas, bem assim como Informático pelas falhas que lhe possam ser imputadas pelo funcionamento do sistema informático. Perante isto é inaceitável, mormente à luz do princípio da igualdade das partes processuais, o juízo de valor vertido na Sentença sobre a credibilidade das testemunhas de uma e da outra parte. Tal considerando, subjacente à análise e fundamentação da matéria de facto considerada provada e não provada configura uma clara violação dos princípios jurídico-processuais da igualdade das partes e do contraditório, justo e isento.
8ª Para apuramento da matéria coletável a Inspeção recorreu a indícios, procedeu a amostragens aleatórias quanto à determinação dos stocks, que não verificou, e das vendas determinadas oficiosamente. Recorreu, pois, a indícios recolhidos a partir da realização de amostragens aleatórias, para certos dias, das quais a inspeção extrapolou para a análise global que determinou a fixação da matéria coletável que deu origem às liquidações impugnadas.
9ª -O que se extrai do depoimento da Sra. Inspetora é que os métodos utilizados para chegar à matéria coletável, nada tiveram de objetivo, mas antes assentaram no recurso a indícios, amostragens aleatórias efetuadas em dias e meses determinados, na análise de documentos referenciados a dias e meses aleatoriamente escolhidos.
10ª - Assim, as liquidações de IVA em crise foram produzidas com base em meros indícios, amostragens e extrapolações, o que as torna ilegais e impõe a sua anulação.
11ª - Face à prova produzida nos autos é de concluir que o percurso que conduziu a IT/AT à determinação da matéria coletável não é compatível com a aplicação de correções meramente aritméticas, desde logo porque assentam em factos presumidos e numa análise parcial do sistema informático, tendo apenas considerado a informação contida na base de dados Fast 10, desprezando totalmente as informações contidas no sistema informático, nomeadamente nas lojas (que não analisaram) e na própria base de dados Fast2, que apenas consideraram não estar correta por conter correções aso dados contidos na Fast10, mas sem qualquer preocupação em saber se estas correções eram ou não necessárias. Cabia à AT fazer um apuramento correto e objetivo dos resultados de todas as lojas, proceder ao tratamento de toda a informação contida no sistema informático do SP (armazém, lojas e Bases de dados Fast2 e Fast 10) para chegar a um correto apuramento da matéria coletável.
12ª - Verifica-se, pois, que a sentença assenta numa errónea apreciação da matéria de facto, pelo que se impugna e requer a sua alteração nos termos supra expostos.

B) Quanto à impugnação da matéria de direito:
13ª – Nesta conformidade entendem os impugnantes e ora recorrentes que a sentença recorrida aplicou mal o direito, por se deixar equivocar quanto aos pressupostos de facto subjacentes ao caso concreto, e ainda por apresentar uma deficiente leitura dos princípios plasmados na lei quanto aos métodos de determinação da matéria coletável. Importa aferir se a AT chegou à determinação da matéria coletável por aplicação de um método direto assente em “correções meramente aritméticas” ou não, é uma questão de direito e não de facto.
14ª – A sentença recorrida incorre num equívoco, nesta matéria, pois que, não se trata de invocar o direito a aplicação de métodos indiretos, o que os impugnantes nunca reclamaram. O que está em causa, e isso sim foi invocado pelos impugnantes, é que no caso concreto, a AT alegou ter aplicado correções aritméticas quando, na verdade, os métodos que usou para lá chegar não assentam em meras correções de erros de cálculo ou de qualquer outra natureza, mas sim na aplicação de métodos indiciários, ou indiretos, tais como as amostragens aleatórias e consequentes extrapolações, embora sempre sob a designação de “correções aritméticas”.
15ª - Não está, nem nunca esteve, em discussão nos presentes autos a invocação de um direito dos impugnantes senão a um tratamento justo e conforme á lei. O que se colocou à discussão e se submeteu ao conhecimento do Tribunal a quo foi, unicamente, aferir do cumprimento da lei por parte da AT na forma como chegou à matéria coletável que fixou oficiosamente por via da Inspeção realizada.
16ª - Quando o M. Juiz incorre num manifesto erro de apreciação da questão fundamental a decidir, a qual se centra, isso sim, nos deveres da AT a cumprir nesta sede, na qual se encontra estritamente vinculada à lei, e, nessa medida, obrigada a prosseguir pela determinação da matéria coletável por via direta quando a contabilidade do SP lho permita (demonstrando objetivamente quais os erros de cálculo ou na declaração ocorridos) ou pela via indireta, naqueles casos em que a contabilidade do SP apresente erros ou inexatidões que não permitam chegar à demonstração objetiva dos valores a fixar.

17ª Recorde-se a este propósito a jurisprudência do Acórdão do TCAS, proferido no Processo Nº 08641/15, de 18 de junho, no qual se aprecia questão em tudo idêntica à dos presentes autos. Considerou este Tribunal superior que “Não obstante no relatório inspetivo constar que as correções foram efetuadas com base na avaliação direta, resulta da ação de inspeção que, do ponto de vista dos SIT, a escrita da Impugnante não permite comprovar e quantificar direta e exatamente os elementos indispensáveis à determinação da matéria coletável, tendo sido necessário fazer fiscalizações cruzadas e análises comparativas. (...) Em toda esta análise perpassa uma atividade que é característica da avaliação indireta, sendo que o próprio conteúdo do relatório utiliza raciocínios que são apenas consentâneos com o plano das presunções e dos métodos indiretos de avaliação. Portanto, as correções efetuadas não traduzem, na medida em que assentam em presunções, a comprovação e quantificação direta e exata de elementos indispensáveis à determinação da matéria coletável, sendo certo que, não é o facto de a Administração se socorrer de elementos de que disponha reveladores da efetiva capacidade contributiva do sujeito passivo – no caso, entre outros, os valores fornecidos por clientes da Impugnante e pela própria Impugnante – que faz com que se possa afirmar que a avaliação é direta, que as correções são meras correções técnicas. (..) A AT, no caso em análise, sob a capa de alegadas correções técnicas, corrigiu e alterou valores declarados com recurso a métodos indiretos, sem que tal recurso tenha sido acompanhado do necessário procedimento, o qual reclamava especiais deveres à Administração (designadamente de fundamentação – artigo 77, n°4° da LGT) e consagra especiais direitos e garantias ao contribuinte (designadamente o pedido de revisão, previsto no artigo 91° e ss da LGT, sendo ainda de assinalar, em certos casos, o encurtamento do prazo de caducidade de direito à liquidação quando esta decorre da aplicação de métodos indiretos, tal como resulta do artigo 45º, nº 2 da LGT).
18ª - Em síntese, concluímos, que também no caso agora em apreço, se pode concluir que a Administração Tributária, no caso em análise, sob a capa de alegadas correções técnicas, corrigiu e alterou valores declarados com recurso a métodos indiretos, sem que tal recurso tenha sido acompanhado do necessário procedimento, o qual reclamava especiais deveres à Administração (designadamente de fundamentação – artigo 77º, nº 4 da LGT) e consagra especiais direitos e garantias ao contribuinte (designadamente o pedido de revisão, previsto no artigo 91º e ss da LGT, sendo ainda de assinalar, em certos casos, o encurtamento do prazo de caducidade de direito à liquidação quando esta decorre da aplicação de métodos indiretos, tal como resulta do artigo 45º, nº 2 da LGT). Nem tais deveres foram observados, nem os direitos e garantias de defesa da Impugnante foram salvaguardados, no caso.
19ª Aliás, basta atentarmos naquilo que vimos de dizer, em especial quanto ao procedimento especialmente previsto nos artigos 91º e ss da LGT, para imediatamente concluirmos que a Fazenda Pública não tem qualquer razão quando sustenta, neste recurso, que mesmo que a AT tivesse presumido quaisquer valores, cabia à sociedade impugnante fazer a contraprova, cenário que a sentença sob recurso também não equacionou, nem avaliou, não permitindo decidir no sentido em que veio a decidir.
20ª Havendo incorreções, inexatidões ou falhas na contabilidade, a lei permite à AT a faculdade de recorrer a outros meios subsidiários, como no artigo 87º e ss da LGT, o recurso aos métodos indiretos, de forma a, se não alcançar o montante exato da matéria tributável, pelo menos a máxima verosimilhança. Compete, então, à Administração Tributária demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiciários e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação.
21ª Ou, ainda a este propósito, concluímos conformar a jurisprudência do Acórdão do TCAS, proferido no processo nº07637/14, de 21 de maio de 2015, que “Na correção aritmética, a matéria coletável é identificada pelo contribuinte na declaração periódica anual, pelo que a administração não precisa de se socorrer de qualquer método de avaliação – direto ou indireto - para determinar o imposto devido: a administração tributária limita-se a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações, com o objetivo de garantir a exatidão das autoliquidações. Trata-se, pois, do resultado da normal função de controlo que a administração tributária realiza quando recebe as declarações do contribuinte e verifica a existência de erros de cálculo.
22ª - Está em causa nos presentes autos a ilegalidade das liquidações adicionais de IVA, com referência aos anos / exercícios de 2008, 2009 e 2010, determinadas por alegadas correções aritméticas, o valor de matéria coletável foi determinado no âmbito do processo inspetivo desenvolvido e no qual a Autoridade Tributária (AT) determinou o valor global em dívida de €181.338,75, com referência aos anos de 2008, 2009 e 2010.
23ª - Perante as insuficiências de funcionamento do programa informático, relatadas pelos informáticos inquiridos nos autos e cujos depoimentos em sede de acareação se transcrevem nas presentes alegações, não se percebe como pode a AT considerar a informação processada como inteiramente fidedigna, na parte que lhe interessava. Ao concluir como concluiu o M. Juiz a quo, desvalorizando toda a prova documental e testemunhal produzida pelos impugnantes, que validou erroneamente, a sentença recorrida incorreu em manifesto erro de direito, pois que considerou como correções aritméticas métodos que não se aceitam como tal. Mais do que isso, o que sucede no presente caso é que a AT diz ter aplicado correções aritméticas, quando de forma clara admite ter recorrido a amostragens aleatórias para diversos fins, nomeadamente para a determinação dos Stocks, volume de vendas, presumido pelo valor contido na base de dados Fast 10, a qual como se viu não permitia chegar a tal conclusão.
24ª - Assim, conclui-se que não estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito que habilitam a AT a recorrer à avaliação direta, ou seja, à aplicação de correções aritméticas. Mas conclui-se ainda que o procedimento no caso concreto que levou à determinação da matéria coletável foi designada por correções aritméticas mas consistiu, verdadeiramente, na aplicação de métodos presuntivos em tudo idênticos aos aplicáveis em sede de avaliação indireta. Assim sendo, o procedimento seguido pela AT não foi o adequado e o SP foi impedido de exercer as garantias previstas no artigo 91º da LGT e de poder beneficiar da aplicação do prazo de caducidade de três anos, com referência ao IRS de 2008, previsto no artigo 46º, nº1 da LGT.
25ª Pelo que, as liquidações impugnadas enfermam de vício de forma e de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, e devem, por isso, ser anuladas. Esta conclusão decorre ainda, da consideração dos vícios procedimentais do processo de inspeção. A prorrogação do prazo para a conclusão da inspeção é ilegal, por não ter fundamentação legalmente admissível, tendo em conta que o SP se encontrava em acompanhamento permanente (PNAIT) desde 2002. Foi ainda ilegal por ser violadora dos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da boa-fé.
26ª Tal circunstância consubstancia um vício de forma por falta de fundamentação do despacho de prorrogação e um vício de violação de lei, por violação do disposto no artigo 39º, nºs 1 e 2, do disposto no artigo 5º do RCPIT e, ainda, do disposto nos artigos 8º e 46º da LGT, e, consequentemente, tem efeito invalidante sobre todo o processado subsequente, incluindo, naturalmente, o Relatório Final que serve de suporte às liquidações ora impugnadas, devendo estas ser anuladas. Ou, se assim não se entender, terá pelo menos como consequência a suspensão do prazo de caducidade.
27ª Assim, no que respeita ao ano de 2008, as liquidações de imposto, juros compensatórios e respetiva demonstração, foram notificadas aos contribuintes já depois dos três anos previstos na lei – artigo 45º, nº 2 da LGT. Assim, quanto às liquidações de imposto e juros referentes ao ano de 2008 verifica-se a caducidade da mesma, por ter decorrido o prazo de três anos previsto na lei.
28ª Ora, se o sistema informático não era fiável, em caso de dúvida sobre a determinação correta e objetiva da matéria coletável, não estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito que habilitam a AT a recorrer à avaliação direta, ou seja, à aplicação de correções aritméticas. Dir-se-á que, perante as insuficiências de funcionamento do programa, não se percebe como pode a AT considerar a informação processada como inteiramente fidedigna, na parte que lhe interessava. Ao concluir como concluiu no Relatório entrou em contradição com o que o próprio perito informático indicado pela AT afirmou no Tribunal, tendo mesmo afirmado que tudo o que analisou (entenda-se, as duas bases de dados em discussão) lhe ofereceu dúvidas e que nenhuma das informações se afigurava como “fidedigna”.
29ª - A própria Inspetora que acompanhou o processo e o Perito informático ouvido pelo Tribunal, admitiram falhas, erros e incorreções do programa, além do que admitiu que fez uma análise parcial, seletiva, por dias, meses, artigos e lojas para concluir a sua análise. A ser assim, forçoso é concluir que a AT não procedeu verdadeiramente a correções meramente aritméticas, como alega no Relatório.
30ª - As liquidações aqui impugnadas devem ser anuladas por padecerem de vício de forma, decorrente da violação das regras do procedimento de inspeção, dos quais se extrai a caducidade do procedimento, com as consequências legais; Ou, se assim não se entender, conclui-se pela suspensão do prazo de caducidade, o que atendendo ao disposto no artigo 45º, nº 2, resulta na caducidade da liquidação de IVA com referência ao ano de 2008, por decurso do prazo de três anos legalmente previsto e aplicável ao caso concreto, como
No mínimo, face à prova produzida, numa situação de dúvida, por força do disposto no artigo 100.º do CPPT, esta tem de ser valorada a favor dos impugnantes.
Nesta conformidade, deve ser revogada sentença recorrida, por manifesto erro de julgamento quanto á matéria de facto e de direito, e as liquidações impugnadas padecem de vício de forma, vicio de violação de lei e violação dos princípios jurídico constitucionais verdade material, da justiça e da proporcionalidade e da proibição dom excesso, decorrentes do disposto nos artigos 13º, 103º e 266º da CRP, artigo 55º da LGT e artigo 6º do RCPIT.

Pelo que deve ser revogada a sentença recorrida e anulados os atos tributários impugnados.

Como é de inteira Justiça...(…)”

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso mantendo a sentença recorrida.

Atento à natureza prioritária do processo, à existência do mesmo em suporte informático, e à conjuntura atual de pandemia, dispensa-se de vistos, nos termos do art.º 657.º, n. º4, do Código de Processo Civil, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
As questões suscitadas pelos Recorrentes, são delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões (nos termos dos artigos 660º, nº 2, 684º, nº s 3 e 4, actuais 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5 todos do CPC “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT), sendo as de saber se a sentença recorrida incorreu erro de julgamento da matéria de facto e de direito ao considerar que estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito que habilitam a Administração Tributária a recorrer à avaliação direta, ou seja, à aplicação de correções aritmética; caducidade da liquidação de IVA de 2008; violação de lei por erro manifesto sobre os pressupostos de facto e de direito, que determinaram a prática dos atos tributários, consubstanciados nas liquidações em crise, e ainda, violação de lei, e dos princípios jurídico constitucionais verdade material, da justiça e da proporcionalidade e da proibição dom excesso, decorrentes do disposto nos artigos 13º, 103º e 266º da CRP, artigo 55º da LGT e artigo 6º do RCPIT.

3. JULGAMENTO DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “(…)
III. 1. Factos provados
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
1. O Impugnante A. encontra-se registado, desde 15/01/1987, para o exercício da atividade de comércio a retalho de calçado (CAE 47721), apurando a sua matéria tributável em sede de IRS segundo o regime da contabilidade organizada – cfr. fls. 39 do processo administrativo (PA) apenso aos autos.
2. Os Impugnantes foram objeto de uma ação inspetiva externa, com âmbito geral, levada a cabo pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças (...) , que se iniciou em 15/03/2011, com a assinatura da ordem de serviço n.º OI201004491, dirigida ao exercício de 2008, que foi emitida na sequência da análise de rácios efetuada no âmbito do acompanhamento permanente da atividade do Impugnante pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças (...) – cfr. fls. 83 do PA apenso aos autos.
3. Em 01/09/2011, foram os Impugnantes notificados da ampliação do prazo do procedimento de inspeção por mais 3 meses, nos termos previstos na alínea a) do n.º 3 do RCPIT, e, bem assim, do alargamento da ação inspetiva aos exercícios de 2009 e 1010, com a assinatura da ordem de serviço n.º OI201103701 – cfr. fls. 143, 147 e 157 do PA apenso aos autos.
4. Em 26/10/2011, o Impugnante prestou esclarecimentos escritos à inspeção tributária – cfr o doc. n.º 74 junto com a p.i., cujo teor se dá por reproduzido.
5. Em 03/11/2011, os Serviços de Inspeção Tributária deram por concluída a inspeção – cfr o doc. n.º 75 junto com a p.i., cujo teor se dá por reproduzido
6. Notificado do projeto de relatório para exercer o seu direito de audição, o Impugnante exerceu-o nos seguintes termos:
«1- Constata-se que persiste um manifesto equívoco quanto à apreciação das bases de dados recolhidas pelas Técnicas responsáveis, e que os esclarecimentos prestados pelo Contribuinte, anteriormente no processo, foram completamente desvalorizados.
2- Face ao teor do Relatório o Contribuinte só pode dizer que ele assenta em pressupostos manifestamente errados e é no mínimo “brutal” quanto às consequências que pretende produzir.
3- Prestou todos os esclarecimentos que tinha a prestar, quando lho solicitaram e nada mais tem a acrescentar.
4- Repudia as conclusões do Relatório por não considerar de todo justificados os resultados agora apresentados.
5- Apela para que este serviço de Inspecção possa, ainda, rever as conclusões que propõe» – cfr o doc. n.º 76 junto com a p.i., cujo teor se dá por reproduzido.
7. Em 29/11/2011, os Serviços de Inspeção Tributária elaboraram o relatório final da inspeção, de onde resultam correções de natureza meramente aritmética, em sede de IRS e, bem assim, à matéria tributável de IVA dos anos de 2008, 2009 e 2010, estas nos valores de € 54.023,70, € 54.817,44 e € 56.893,04, respetivamente – cfr. relatório de inspeção inserto a fls. 33 a 66 do PA apenso aos autos e doc. 77 junto com a p.i., cujo teor se dá por reproduzido.
8. As correções mencionadas no ponto que antecede apresentam a seguinte fundamentação:
«(…)
III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
III-1. ANÁLISE PRELIMINAR
III-1.1. SITUAÇÃO CADASTRAL E DECLARATIVA
Da consulta ao sistema informático da Direcção Geral dos Impostos, retira-se que:
• Os sujeitos passivos não possuem declarações em fata, quer de IVA, quer de IRS;
• O sujeito passivo A está registado, desde 15 de Janeiro de 1987 para o exercício da actividade de comércio a retalho de calçado, estabelecimento especificado – CARE 47721, enquadrando-se no Regime Normal de tributação de IVA com periodicidade mensal, sendo a
matéria Tributável de IRS referente à actividade exercida apurada segundo o regime da contabilidade organizada.
O sujeito passivo B apenas declara a obtenção de rendimentos prediais de pequeno montante;
Os rendimentos que o agregado familiar (composto pelos dois sujeitos passivos e um dependente) tem vindo a declarar são muito baixos:

Anos20032004200520062007200820092010
Rendimento29.351,04396,0420.7747,480,0031.482,75282,2829.475,028.919,26
Global
As despesas incorridas pelo agregado familiar que constam do anexo H relativo a Benefícios Fiscais e Deduções à Colecta, são as constantes do quadro seguinte:

Descrição20032004200520062007200820092010
Pl.Pou.454,791.799,1616.809,165.799,168.804,165.049,162.565,76
Reforma
Cts.Poup.2.302,282.302,28
Hab.
Pl.Poup.2.639,602.639,60
Acções
Cont. pº F.8.001,285.291,28918,00969,00
pensões, pa
P.Seg..10.730,36712,85300,08671,58
Acid.Pess.
E vida
P.S.riscos56,8856,8857,3819,16
saúde
Despesas426,381.048,15677,031.102,21520,46382,94533,561.667,42
saúde
Despesas3.090,083.237,744.874,265.096,495.618,202.801,776.010,00
educação
Outros794,50631,18847,41760,44
TOTAIS17.708,9116.949,396.398,7023.768,3022.725,0612.758,6012.868,185.892,92
DESPESAS
Do descrito, verifica-se que os rendimentos declarados pelo agregado familiar, os quais derivam quase exclusivamente da actividade exercida pelo sujeito passivo A, não se mostram coerentes com as despesas e aplicações efectuadas pelo mesmo (conhecidas através do Anexo H) ainda mais tendo em conta que, prioritariamente, o agregado familiar terá incorrido em despesas correntes de alimentação, vestuário, transportes, etc. III-1.2. DESCRIÇÃO DA ACTIVIDADE EXERCIDA PELO SUJEITO PASSIVO A
(…)
Os registos da actividade exercida são efectuados da seguinte forma, conforme informação dada pelo próprio sujeito passivo e pelo técnico de contas, J., NIF (…):
As compras são entregues no Armazém, a partir do qual se distribui os artigos pelas várias lojas;
As entradas de stocks (Compras) são efectuadas no computador de cada loja, não havendo informação conjunta dos stocks de artigos, isto é, não existe Inventário Permanente. O Controlo de stocks (inventário) é efectuado com recurso à inventariação física;
Os registos das compras na contabilidade (em valor) são efectuados com base nas facturas emitidas pelos fornecedores;
As vendas são registadas no computador de cada loja, sendo emitido o respectivo talão a entregar ao cliente. Não se encontram arquivados os duplicados dos talões emitidos devido alegadamente, a dificuldades de armazenamento, uma vez que são numerosos;
Diariamente, é impresso e arquivado um “Resumo tipo Z” relativo a cada loja, com a informação das vendas diárias. Este documento tem por função para além de controlo dos valores em Caixa, servir de suporte ao preenchimento do Mapa Mensal (Resumo) das Vendas, efectuado manualmente por agregação dos “Z” de todas as lojas;
Este Mapa-resumo mensal das Vendas efectuadas serve de documento de suporte ao registo contabilístico das vendas e do IVA liquidado;
O cliente paga através de cartão (de crédito ou Multibanco) ou através de cheque ou em dinheiro, sendo nestes casos efectuado o depósito dos valores.
Quanto à política de preços aplicada, o sujeito passivo declara que para a marcação de preços é aplicado o coeficiente de 1,2 sobre o preço de custo (a que corresponde uma margem bruta de 54,5% sobre a venda).
Verifica-se, assim, que os procedimentos adoptados para o registo contabilístico das operações de venda são susceptíveis de originar erros porquanto sendo os documentos de suporte aos registos de vendas constituídos por mapas elaborados manualmente em Excel, em detrimento de outros emitidos directamente do programa informático, não se encontram disponíveis os elementos necessários ao controlo e validação das tarefas executadas, nomeadamente:
Os duplicados dos talões de venda emitidos não se encontram arquivados, não permitindo verificar a sua conformidade com as listagens “Tipo Z”;
Face ao volume de movimentos de artigos assim como à multiplicidade de referências, a inexistência de um controlo informático de artigos para comparação com as contagens físicas realizadas não permite um controlo efectivo dos movimentos de artigos.
III-1.3. ANÁLISE ECONÓMICO-FINANCEIRA
Da análise aos valores registados na contabilidade do sujeito passivo (os quais estão em conformidade com os valores inscritos nas declarações fiscais entregues, verifica-se que:
O volume de negócios declarado pela empresa tem vindo a aumentar, sendo esse aumento de 4,7% em 2008, 7,19% em 2009 e 4,5% em 2010;
(…)
O custo das mercadorias vendidas também tem aumentado, 9,45% de 2007 para 2008 (mais do dobro do Volume de Negócios), 7,17% em 2009 e 3,3% em 2010;
A margem bruta sobre as vendas de mercadorias é de 36,94%, em 2008, 36,51% em 2009 e 37% em 2010;
Os Fornecimentos e Serviços Externos mantiveram-se estáveis de 2006 para 2007 e 2008, aumentaram 6% em 2009 e 3% em 2010;
Os custos com pessoal aumentaram 9% de 2007 para 2008, mantiveram-se estáveis em 2009 e aumentaram novamente 15% em 2010;
As existências finais de mercadorias têm aumentado continuamente: em 2008 passaram de 580.300,00 € para 720.038,11 €, um aumento de 24%; em 2009 aumentaram 2,49% e em 2010, 7,2%.
A duração média de existências de mercadorias (em meses) é de 6,82 em 2008, 7,09 em 2009 e 7,18 em 2010;
Os Resultados Líquidos do Exercício que já haviam sido negativos em 2004 e 2006, voltam a ser negativos em 2008. Em 2009 e 2010, os Resultados Líquidos foram positivos, embora de pequeno montante.
Conforme se verifica pelo quadro seguinte, nos últimos 8 anos, os resultados positivos são apenas suficientes para absorver os prejuízos apurados, não havendo criação de valor nem tributação efectiva em sede de Imposto sobre o Rendimento:
(…)
A Rentabilidade Fiscal das Vendas do sujeito passivo é de -0,39% (negativa), em 2008, 1,49% em 2009 e 0,69% em 2010.
Em resumo, verifica-se que o aumento do volume de negócios não é coerente com o aumento dos custos registados na contabilidade:
No ano de 2008, o custo das vendas aumenta mais do dobro do volume de negócios;
Os Custos com pessoal não variam na mesma proporção do Volume de Negócios;
As existências finais de mercadorias têm aumentado, em especial, no ano de 2008, concretizando-se, assim, numa duração média de existências de 7 meses (período correspondente a duas colecções).
III-2. ANÁLISE DE CONFORMIDADE
III-2.1. MARGEM
O sujeito passivo tem vindo a fazer parte do leque de entidades que são alvo de controlo das obrigações declarativas no âmbito do Acompanhamento Permanente. Neste âmbito e com base no Despacho n.º DI200809626, no dia 17 de Junho de 2009, os serviços de inspecção tributária deslocaram-se a duas das lojas do sujeito passivo (N. shopping e Outlet de (...)) e recolheram os preços de venda ao público dos artigos relacionados em Anexo 1 que se encontravam expostos.
Através do Ofício n.º 44503/0505 de 23 de Junho de 2009, foram solicitadas cópias das facturas de aquisição dos referidos artigos. Com base nestas informações, calculou-se uma margem sobre o preço de venda, por loja de:
Loja do N. shopping - 48,2%;
Loja do Outlet - 15,8%.
A loja do N. shopping contribui em 30% para as vendas totais e a loja do Outlet em 10%. Se calcularmos uma média ponderada das lojas, obtém-se uma margem de 40% sobre a venda, o que é superior à margem declarada pelo sujeito passivo em 2009 (36,51%).
48,2% * 0,75 + 15,8% * 0,25 = 40,1%
III-2.2. INVENTÁRIOS
(…) Da análise efectuada não se detectou a existência de divergências/irregularidades que possam constituir indícios válidos de que tenha sido efectuada uma errónea valorização dos inventários.
III-2.3. COMPRAS
(…) não se detectaram indícios da existência de omissões ou inexactidões relevantes ao nível das compras registadas na contabilidade.
III-2.4. VENDAS
III-2.4.1. REGISTOS CONTABILÍSTICOS VERSUS DOCUMENTOS DE SUPORTE
Dado que os duplicados dos talões referentes às vendas realizadas não se encontram arquivados, o sujeito passivo disponibilizou listagens de vendas, elaboradas pelo seu técnico informático, relativas aos dias 2 e 29 de Janeiro, 10 de Julho e 5 e 31 de Dezembro de 2008, de acordo com a nossa solicitação.
(…)
Considerando que a listagem informática agora fornecida não contém mais do que as informações constantes dos Resumos “Tipo Z” emitidos e arquivados que serviram de suporte aos Mapas-Resumos Mensais, alargamos o período de análise aos restantes dias dos meses de Janeiro, Julho e Dezembro de 2008 e comparamos os Resumos tipo “Z” arquivados com o próprio Mapa-Resumo Mensal a que os mesmos deram origem (o qual serve de suporte aos registos contabilísticos), detectando-se as seguintes incoerências:
(…)
Do descrito, conclui-se que a contabilidade do sujeito passivo evidencia irregularidades:
Não se encontram arquivados os duplicados dos talões de venda, o que não permite a validação dos Resumos “Tipo Z”;
Foram emitidos (informaticamente) e arquivados na contabilidade Resumos “Tipo Z” referentes ao mesmo dia mas com indicação de vendas diferentes. São exemplos os “Z” referentes aos dias 7 de Janeiro e 5 de Dezembro de 2008;
Foram emitidos (informaticamente) e arquivados na contabilidade Resumos de Vendas (tipo “Z”) que foram consideradas na contabilidade por um valor divergente.
Tendo-se confrontado o sujeito passivo com as divergências detectadas, este declarou que as mesmas são consequência de erros cometidos pelo pessoal encarregue das tarefas de emissão e organização dos documentos. Não forneceu, contudo, quaisquer elementos ou informações acerca da duplicidade de documentos, isto é, a existência de dois “Z” da mesma loja para o mesmo dia.
III-2.4.2. MOVIMENTOS FINANCEIROS
Para analisar os registos financeiros do sujeito passivo, relativamente aos meses selecionados compararam-se as vendas registadas com os movimentos expressos nos extractos bancários (TPA e depósitos), elaborando-se o seguinte quadro:
(…)
Para uma análise mais aprofundada dos movimentos financeiros, solicitaram-se os talões comprovativos dos pagamentos por cartão (talões multibanco) dos dias 2 e 29 de Janeiro, 10 de Julho e 5 e 31 de Dezembro de 2008 da Loja do N. shopping e compararam-se os mesmos com as listagens informáticas das vendas diárias fornecidas pelo sujeito passivo.
Da análise efectuada, detectou-se a existência de talões de Multibanco arquivados sem que nesse mesmo dia se identifique um talão de venda de igual montante que lhe possa ser associado. Estes montantes, recebidos a título de vendas (e que se relacionam, por dia, no quadro seguinte), constituem um indício efectivo de que foram realizadas vendas, cujo registo foi omitido na contabilidade:
(…)
III-3. ANÁLISE DO SISTEMA INFORMÁTICO DO SUJEITO PASSIVO
III-3.1. ELEMENTOS RECOLHIDOS
Face às incoerências detectadas nos procedimentos efectuados, foi solicitada a intervenção da DAPIT para recolha do sistema informático do sujeito passivo. Esta intervenção veio a realizar-se no âmbito dos Despachos n.ºs OI201101765/6 tendo-se efectuado cópias dos ficheiros considerados fiscalmente relevantes contidos no computador servidor (identificado na rede como servidor.A..pt) presente no Armazém da empresa, bem como os presentes no computador utilizado para emissão da facturação da loja do N. shopping.
Analisados os ficheiros recolhidos verificámos que a empresa utilizava para facturação o software FAST-II (produzido pela softwarehouse Microdigital). Constatamos ainda que o denominado software utilizava como repositório de dados, ficheiros de dados do tipo dBase (extensão dbf).
Uma análise à globalidade dos ficheiros copiados revelou que eram relevantes para a nossa análise os contidos nos seguintes directórios:
Localizados no computador “servidor.A..pt” do Armazém:
D:\FAST2\
D:\fast10\
Localizados no computador da loja do N. Shopping:
C:\FAST2\
No seguimento de instruções dadas pelo técnico informático no momento da cópia e posteriormente pela confrontação como os elementos declarados pelo sujeito passivo confirmamos que os ficheiros localizados na pasta FAST2 do computador servidor (Armazém) constituem a base de dados que agrupa a informação de todas as lojas.
Os ficheiros contidos nessa pasta revelaram possuir os dados de facturação mais recentes e mostraram-se consistentes com os elementos contabilísticos. Podemos então considerar que os ficheiros contidos na pasta FAST2 constituem a base de dados activa e aquela que serve de suporte aos registos contabilísticos de venda.
Contudo uma análise pormenorizada das principais tabelas da facturação, designadamente as linhas de detalhe (FTDLN) e cabeçalhos dos documentos (FTDOC), revelou fortes indícios de que os registos se encontram manipulados.
Os indícios mais relevantes são:
Falhas na numeração dos documentos
A análise à sequência numérica de cada uma das lojas revelou falhas na numeração. A título meramente exemplificativo podemos referir que não se encontram presentes os talões de venda do dia 2008.04.24 com a numeração 14468 a 14470 da série A (loja Antas).
• Falhas na numeração das linhas das facturas
Analisando o campo SEQ da tabela FTDLN, cujo conteúdo consiste na numeração das linhas de cada documento, constatou-se que diversos documentos apresentavam falhas na numeração. Um exemplo da situação descrita pode ser observado no documento 70345 da série N (loja N. Shopping). Associado a esse documento, na tabela FTDLN, apenas existe uma linha que apresenta o número 6, o que indicia que o documento originalmente possuía no mínimo 6 linhas e posteriormente as 5 primeiras foram eliminadas.
• Linhas marcadas como eliminadas
Neste tipo de ficheiros de dados (dBase) quando é dada uma instrução de eliminação de registos ela não é executada em termos físicos, ou seja, o registo não desaparece, é antes marcado como se tratando de um registo eliminado. Só quando é dada a instrução PACK ao ficheiro é que esses registos desaparecem fisicamente.
Com recurso a aplicações de auditoria informática (neste caso foi utilizado o ACL) é possível verificar se existem registos marcados como eliminados, mas que ainda não o foram fisicamente. Constatou-se então que o ficheiro de linhas dos documentos (FTDLN) possui um número muito elevado de registos que se encontram na situação descrita. A titulo exemplificativo apresentamos a forma como está armazenado o documento 82885 da série N, datado de 2009.07.11.
Os registos que possuem um * (asterisco) no campo RECORD_DELETED (criado pelo ACL) são registos que se encontram marcados como eliminados. Constata-se que o documento possuía duas linhas e que posteriormente ambas foram eliminadas, embora em termos físicos não tenham desaparecido do ficheiro. Posteriormente o documento apenas ficou com a linha da posição 2 (ver campo SEQ). Através deste exemplo conseguimos constatar que o documento em causa, por via da eliminação efectuada, apresenta uma falha na sequência numérica.
• Número muito elevado de anulações de artigos vendidos
É ainda indiciador de manipulação de registos o número bastante elevado de anulações de artigos vendidos, que num número significativo de documentos, coloca o total da venda a zero.
Em face dos indícios detectados não nos restam dúvidas que os registos foram objecto de manipulação de forma a diminuir os valores de vendas contabilizados e inerentemente os valores declarados à Administração Fiscal.
E caso alguma dúvida persistisse, ela fica completamente dissipada pela comparação entre a base de dados activa (presente no directório D:\FAST2) e a base de dados presente no directório D:fast10\ do servidor. Constatamos que se trata de uma base de dados com a mesma estrutura que a presente em FAST2, sem contudo ter os dados mais recentes. O que nos leva a crer que se trata de uma cópia de segurança da base de dados activa.
Uma análise pormenorizada dos ficheiros presentes em fast10 revelou que os documentos apresentavam os mesmos valores e detalhes que os contidos em FAST2, no que respeita aos documentos que não apresentam indícios de manipulação. Este dado conjugado com o facto de os documentos que em FAST2 apresentam as situações indiciadoras de manipulação atrás enunciadas, em fast10 se encontrarem plenamente consistente s, sem qualquer falha, demonstra de forma inequívoca que se trata de uma cópia de segurança dos documentos de venda antes da realização de qualquer manipulação.
A fiabilidade da base de dados armazenada em fast10 torna-se inquestionável através da comparação dos dados nela presentes com os que foram objecto de cópia na loja do N. Shopping (armazenada na pasta C:\FAST2\ do computador presente na loja).
Na realidade os dados aí copiados demonstraram ser iguais aos presentes em fast10 (relativos à série N), e portanto bastante superiores aos contidos em D:\FAST2\ do computador servidor.
(…)
III-3.2. COMPARAÇÃO DAS BASES DE DADOS
Face ao apurado no ponto anterior, efectua-se uma comparação entre o valor das vendas em ambas as bases de dados, verificando-se que o valor das mesmas na base de dados de segurança (Fast10) é superior ao valor constante na base de dados activa, o que corrobora o indício já anteriormente referido, ao longo do Capítulo III-2, de que foram realizadas vendas cujo registo na contabilidade foi omitido.
(…)
para analisar de forma pormenorizada as divergências apuradas entre ambas as bases de dados, restringimos a informação à loja do N. shopping e aos dias já mencionados, verificando-se a existência de divergências nos talões relacionados no quadro seguinte:
(…)
Da confrontação entre os valores constantes em ambas as bases de dados com o meio de pagamento utilizado, verifica-se que os talões modificados correspondem na sua maioria a pagamentos em dinheiro.
No entanto, sempre que correspondem a pagamentos com cartão é possível verificar que o valor pago está em conformidade com os registos da base de dados de segurança (Fast10) o que, por um lado, valida a informação constante desta base de dados e por outro demonstra que os registos constantes da base de dados activa (Fast2) foram manipulados.
Esta informação é ainda validada através dos recebimentos de clientes consubstanciados através dos Talões Multibanco arquivados na contabilidade (relacionados no ponto III.2.4.2) cujo registo das vendas não foi efectuado na contabilidade.
(…)
III-3.3. RESUMO
Na análise efectuada ao sistema informático do sujeito passivo e na sequência do descrito nos pontos anteriores, verificou-se que o sujeito passivo manipulou os registos da Base de Dados de suporte aos registos contabilísticos (Fast2), isto é:
Foram eliminados documentos de venda (talões);
Foram eliminadas e alteradas linhas de documentos de venda (Talões) quer ao nível da quantidade e do próprio artigo quer ao nível do valor da venda.
Da comparação entre os talões originais constantes da Base de Dados de Segurança (Fast10) e os talões manipulados constantes da Base de Dados Activa (Fast2) apuram-se as seguintes divergências ao nível do valor das vendas (IVA incluído):

Vendas 2008 2009 2010
Eliminação1864.804,00703.093,001392.599,00
de talões
Alteração5.947362.874,744.509347.178,664.577368.387,51
de talões
TOTAL5.683367.678,744.579350.271,664.716370.986,51
III-4. CONCLUSÃO
Nos procedimentos inspectivos realizados e conforme se infere pelo descrito nos capítulos anteriores, verificou-se falta de condições para validar as vendas declaradas, traduzidas por:
Falta de arquivo das cópias dos talões relativos às vendas realizadas;
Irregularidades nos documentos de suporte aos registos contabilísticos (Resumos tipo “Z”):
o Foram emitidos (informaticamente) e arquivados na contabilidade Resumos de Vendas “Tipo Z” referentes ao mesmo dia mas com indicação de vendas diferentes;
o Foram emitidos (informaticamente) e arquivados na contabilidade Resumos de Vendas (tipo “Z”) com indicação de vendas que foram consideradas na contabilidade por um valor divergente;
Recebimentos de Clientes (comprovados através de talões multibanco) cuja venda correspondente não foi registada na contabilidade;
A Base de dados do sujeito passivo que dá suporte aos registos contabilísticos (B. D. Activa-Fast2) foi manipulada, isto é:
o Foram eliminados documentos de venda (Talões);
o Foram eliminadas e alteradas linhas de documentos de venda quer ao nível da quantidade e referência do artigo quer ao nível do valor da venda;
o Possui conjuntos de dados (linhas) marcados como “eliminados”, cuja informação é possível aceder informaticamente e verificar que está de acordo com a que consta da Base de Dados de Segurança (Fast10).
Considerando que o sujeito Passivo possui uma outra Base de Dados (B. D. de Segurança - Fast 10), cujos registos são passíveis de validar pelos testes efectuados:
o A informação é consistente e credível, nomeadamente, não evidencia falhas na numeração de documentos ou nas próprias linhas dos documentos;
o Os dados constantes desta base de dados estão em conformidade com os dados constantes da base de dados situada na loja do N. shopping;
o Os dados constantes desta Base de Dados estão em conformidade com os pagamentos efectuados pelos clientes através de cartão.
Assim, da análise das duas Bases de Dados, é possível apurar que:
Os dados constantes da Base de Dados Activa (Fast2) foram manipulados o que tem como consequência a manipulação dos próprios registos contabilísticos das vendas;
O valor das vendas omisso à contabilidade em consequência da manipulação de registos efectuada é dado pela comparação dos registos entre ambas as bases de dados:
registos eliminados e alterados.
Face à omissão de vendas detectada, em 27 de Setembro de 2011, notificou-se o sujeito passivo para identificar eventuais omissões/inexactidões ao nível das componentes do Custo das Vendas, isto é:
•Se adquiriu mercadorias que não contabilizou, juntando documentos comprovativos com a identificação dos bens, quantidades, valores e fornecedor;
•Se os inventários estão correctamente quantificados e valorizados, justificando as eventuais divergências.
(…)
Da análise da resposta do sujeito passivo, verifica-se a existência de algumas incongruências, isto é:
O sujeito passivo afirma que as devoluções são aceites nas lojas, onde não é emitido qualquer talão (ou Nota de Crédito) referente às mesmas.
No entanto, da análise dos talões “não modificados”, verifica-se a existência de talões com quantidade negativa que se deduz tratar-se de efectivas devoluções. A ser assim, a alegada norma estabelecida pelo sujeito passivo, não está a ser aplicada;
O sujeito passivo afirma que os artigos devolvidos são enviados para o armazém, não entrando em stock, uma vez que a sua grande parte é artigo com defeito, no entanto, não indica o destino dado aos mesmos, isto é, não apresentou documentos comprovativos de que os mesmos foram destruídos, foram devolvidos a fornecedores, etc.
Acresce o facto da contabilidade do sujeito passivo não reflectir as afirmações do sujeito passivo;
O sujeito passivo afirma que o artigo restante (sem defeito) é enviado mais tarde para as lojas, no entanto, a ser assim e não tendo sido registada a devolução, o mesmo artigo é vendido duas vezes.
Por outro lado, o alegado pelo sujeito passivo não explica porque uma simples devolução suscita a alteração da Base de Dados de forma diversificada, isto é:
Em alguns casos, são eliminados Talões na sua totalidade;
Em outros casos, são simplesmente eliminadas linhas de Talões;
Em outros casos, são eliminadas linhas de Talões acrescentando-se outras com referências e valores diferentes;
Ainda em outros casos, são acrescentadas linhas de quantidade negativa.
E principalmente não explica porque não se encontra arquivado na contabilidade qualquer documento que evidencie as alegadas devoluções (nem que fosse manual e meramente descritivo da operação) e, em vez disso, uma simples devolução, constitui motivo para alterar a base de dados informática (o que exige o recurso a um técnico especializado), para modificar o documento anteriormente emitido (Talão de Venda entregue ao cliente) e as consequentes listagens (listagens tipo “Z”), arquivando-as na contabilidade como sendo verdadeiras. Isto conduz à elaboração de uma contabilidade com inexactidões e omissões (diferente da que seria elaborada com base nos documentos efectivamente emitidos e entregues aos clientes).
Consequentemente, a resposta do sujeito passivo carece de consistência e de comprovação, não trazendo novos elementos que permitam alterar os factos apurados nos procedimentos inspectivos realizados, no que respeita à omissão de vendas e não apresentou, apesar de para isso ter sido notificado, qualquer elemento indicativo de que foram praticadas outras omissões ou inexactidões ao nível das componentes do Custo das Mercadorias Vendidas.
Assim, conclui-se que:
O sujeito passivo regista as vendas, no computador de cada loja, emitindo o respectivo Talão de venda ao cliente;
As vendas registadas são transferidas para o computador situado na sede, onde constam de duas Bases de Dados: Base de dados de Segurança (Fast10) e Base de Dados Activa (Fast2);
Os registos da Base de Dados Activa (Fast2) foram alvo de manipulação, através da eliminação e alteração de registos, vindo posteriormente a servir de suporte aos registos contabilísticos do sujeito passivo;
· Não tendo sido apuradas outras omissões ou inexactidões, foram omitidas à contabilidade (e consequentemente não foram declaradas) as vendas correspondentes às diferenças apuradas através da comparação dos talões de venda em ambas as Bases de Dados. (…).» - Cfr. fls. 78- 112 do P.A. apenso.
9. Sob correio registado de 21/12/2011 com aviso de receção assinado em 27/12/2011, foi remetido aos Impugnantes o ofício n.º 75538/0505, de 20/12/2011 para 2.ª notificação do relatório final de inspeção tributária, uma vez que a 1.ª notificação havia sido devolvida ao remetente em 19/12/2011 por não ter sido reclamada, com as indicações “avisado” e “não atendeu em 06/12/2011” – cfr. fls. 115-118 do PA apenso.
10. Na sequência das correções efetuadas, a Autoridade Tributária emitiu em 14/01/2012, em nome do Impugnante, as seguintes liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios, com data limite de pagamento de 31/03/2012, que foram notificadas ao sujeito passivo em 31/01/2012:
(enumeração no original , art.º 663.º n.º 6 do CPC)
– cfr. fls. 74-75 e 129 a 142 do PA apenso.
11. A presente impugnação deu entrada no Serviço de Finanças (...)-2 em 22/05/2012 – cfr. fls. 2 do processo físico.

III. 2. Factos não provados
1. Que as diferenças apuradas entre pagamentos efetuados, expressos nos extratos bancários (TPA e depósitos) e vendas registadas advêm do registo de vales e sinais aceites pela “empresa” a certos clientes, permitindo-lhes efetuar o pagamento faseado ou ainda quando aceita adiantamentos para encomendas de produtos específicos – facto alegado no artigo 165.º da p.i..
2. Que as falhas na numeração dos talões de venda são devidas a “erro humano” dos funcionários das lojas do Impugnante – facto alegado no artigo 156.º da p.i..
3. Que as falhas na numeração das linhas dos talões de venda, a eliminação de linhas e as anulações de artigos vendidos, são devidas a devoluções de artigos e trocas, ao facto de certos funcionários não conseguirem corrigir/eliminar os seus erros no registo das vendas e ser necessário aguardar pelo momento da conferência do caixa para corrigir a situação e, bem assim, ao próprio modo de funcionamento do programa informático, que assume e regista como venda uma pesquisa efetuada a um “par único”, o mesmo sucedendo se um funcionário se enganar e por lapso accionar a tecla “enter” inadvertidamente, sendo que os funcionários não podem eliminar os seus próprios erros, pelo que estes só são corrigidos aquando da conferência do caixa por parte do responsável da empresa – facto alegado nos artigos 157.º, 161.º e 171.º da p.i..
4. Que o número elevado de linhas eliminadas sucede, por vezes, porque quando se reedita um documento e o finalizam, novamente a aplicação automaticamente anula todas as linhas, por insuficiência do programa informático – facto alegado no artigo 174.º da p.i..
5. Que os valores corretos são os que se encontram registados na base de dados que serve de suporte à contabilidade (“fast 2”), já que na outra base de dados (“fast 10”) encontram-se todos os registos, muitos dos quais têm de ser posteriormente anulados ou corrigidos, funcionando como um registo de tudo o que sucede nas lojas, de todos os registos, mas não necessariamente vendas - facto alegado no artigo 186.º da p.i..

III:3. Motivação
A decisão sobre a matéria de facto baseou-se na análise dos documentos juntos aos autos, cujo teor não foi impugnado, e, ainda, na ponderação crítica da prova testemunhal produzida, livremente apreciada pelo Tribunal (cfr. o artigo 396.º do Código Civil), à luz das regras de experiência comum e da verosimilhança, conforme indicado em cada um dos itens do probatório, com as seguintes particularidades:
- No que respeita ao item 8) dos factos provados, a convicção do Tribunal resultou da análise do relatório da inspeção tributária à atividade do Impugnante, cuja força probatória se reporta aos factos que nele são referidos, sejam os afirmados como tendo sido praticados pelos serviços de inspeção tributária (v.g. as diligências realizadas), sejam os factos materiais apurados por esses serviços, sempre que devidamente fundamentados através de elementos externos e assentes em critérios objetivos (cfr. o disposto no artigo 76.º, n.º 1 da LGT), uma vez que, se bem vemos, em grande medida, os Impugnantes apenas refutam as conclusões a que chegou a Administração Tributária, mas não os factos em que esta assentou as suas conclusões.
- Já no que concerne aos factos não provados, a decisão do Tribunal baseou-se na ausência/insuficiência de prova documental e testemunhal produzida a esse respeito, senão vejamos:
· Não foi apresentada qualquer prova documental da existência e registo dos alegados vales, aceites e adiantamentos ou das devoluções a fornecedores, designadamente, neste último caso, as notas de crédito emitidas por estes ou qualquer outro documento que atestasse a efetiva devolução, pois os Impugnantes apenas juntam algumas guias de transporte e notas de devolução a fornecedores que não comprovam a efetiva remessa) nem a aceitação da devolução (mas apenas que foi emitida guia e nota de devolução), sendo, inclusive, grande parte referentes a consertos que, nessa medida, nunca poderiam justificar a eliminação de linhas ou de talões;
· O depoimento de J., técnico oficial de contas do Impugnante há cerca de 20 anos, não foi valorado positivamente pelo Tribunal, desde logo, porque a sua razão de ciência resulta apenas do registo contabilístico dos documentos que lhe são apresentados, não justificando o conhecimento dos factos a que foi inquirido, designadamente, o modo de funcionamento do sistema informático do sujeito passivo, até porque, como referiu, não tinha acesso ao mesmo, não se compreendendo, por isso, como pôde afirmar que a base de dados “fast 2” registava todas as vendas do Impugnante. De resto, o depoimento prestado pela referida testemunha também evidenciou uma credibilidade “tingida” pela relação profissional de longa data mantida com o Impugnante, sendo natural que das suas declarações não resulte qualquer facto que fosse susceptível de “incriminar” o seu “patrão”, o que se infere, por exemplo, das afirmações de que a inspetora tributária vinha com o objetivo de demonstrar que o Sr. A. não podia viver com os rendimentos declarados, tendo orientado a inspeção nesse sentido, para defender essa tese. Ficou ainda patente no seu depoimento algum desconforto com as conclusões extraídas pela inspeção tributária, que, segundo a própria testemunha afirmou, o punham em causa enquanto profissional (técnico oficial de contas).
· Por seu lado, o depoimento de C., economista, amigo de longa data do Impugnante, autor do documento n.º 91 junto com a petição inicial, que constitui uma análise ao relatório de inspeção, limitou-se a discorrer sobre a crise económica de 2008 e sobre as consequências negativas que dela advieram para a atividade do Impugnante (sendo interessante verificar que, apesar da conjuntura económica mundial desfavorável, com indubitáveis reflexos na economia nacional, o volume de negócios declarado pelo Impugnante apresenta incrementos de 4,7% em 2008, 7,9% em 2009 e 4,6% em 2010 – cfr. o cap. III.1.3 do RIT), reiterando o teor do referido documento, elaborado com base nos elementos contabilísticos fornecidos pelo Impugnante, sem que tivesse tido acesso ao programa informático e aos registos nele efetuados, sendo que apenas sabia da existência das bases de dados “fast 2” e “fast 10” em virtude de ter lido o relatório inspetivo em causa. Ou seja, o seu depoimento apenas traduziu a sua opinião sobre as conclusões vertidas no relatório de inspeção, designadamente, sobre a margem de lucro apurada, por amostragem, pela inspeção tributária e a sua indevida extrapolação para o ano inteiro, bem como sobre a impossibilidade de com as compras registadas – que não foram postas em causa - ter efetuado aquelas vendas e sobre a irrazoabilidade da margem a que se chega após a introdução das correções efetuadas (note-se, aliás, que a maior parte das suas afirmações iniciam-se com as expressões “parece-me”, “eu acho” e “suponho que”), nada tendo mencionado sobre a divergência dos valores registados nas referidas bases de dados, que esteve na origem das correções efetuadas, suscetível de ser positivamente valorado. Diga-se, de resto, que o parecer em causa (apresentado ao abrigo do disposto no art. 426.º do CPC, que rege sobre a prova documental) não tem nem poderia ter a mesma força probatória que se atribui à prova pericial realizada em juízo e requisitada pelo Tribunal a peritos (nº 1 e 3 do art. 467.º do CPC) que, de uma forma independente, isenta e imparcial, formulam o respetivo parecer técnico-científico sobre o objeto da prova pericial que lhe é apresentado, prova pericial que no caso dos autos não teve lugar.
· De igual modo, o depoimento de A., que referiu ter conhecido o Impugnante em 1994, altura em que desempenhava as funções de promotor comercial na sociedade “S. Imobiliária”, tendo concretizado os negócios das lojas do “N. shopping” e “G. Shopping”, nada de relevante acrescentou quanto à matéria de facto em discussão, tendo-se revelado vago e genérico, uma vez que do negócio em concreto do Impugnante esta testemunha nada sabia, desconhecendo por completo o funcionamento do programa informático em causa. Com efeito, o depoente limitou-se a esclarecer a forma como era apurada a remuneração mensal devida pela utilização de lojas nos centros comerciais (montante fixo ou percentagem das vendas) e, bem assim, a forma como esta controlava as vendas declaradas pelos seus lojistas, e que era através de auditorias efetuadas às lojas, através da verificação “in loco” das vendas efetuadas em determinado período temporal, de que são exemplo os documentos 97 a 99 juntos com a p.i., porém, referiu desconhecer se os dados fornecidos pelo Impugnante à S. eram ou não os mesmos que aquele declarou à AT.
· Outrossim, J., funcionário do Impugnante desde há 23 anos, que exerce funções no armazém e que referiu ter estado, por vezes, nas lojas, nos períodos em causa (v.g. para substituir funcionários que faltavam, estavam de folga ou de férias) prestou declarações confusas, em atitude defensiva e de modo inconsistente, sendo que a falta de percetibilidade do seu testemunho indicia uma deliberada vontade em não esclarecer certos aspetos, revelando um receio de estar a prestar declarações e falar de factos para prejuízo do seu “patrão”, evidenciando falta de isenção, e, por conseguinte, de credibilidade, pelo que o seu depoimento não foi positivamente valorado. Com efeito, a testemunha começou por descrever, de modo claro e fluido, em termos genéricos, as limitações do programa informático então existente (v.g. que bloqueava, dava alguns erros e faturava logo uma mera consulta de um “par único”) e, logo em seguida, quando proposto a relatar como é que essas situações se resolviam, questão esta reportada ao mesmo momento temporal, a testemunha já se revelou hesitante, confusa e divagante, ora dizendo que “deixava a situação em aberto para depois a colega tratar disso” e que “por vezes havia tempo para deixar em aberto mas se quisesse registar outra coisa a seguir para outro cliente muitas vezes tinha que desligar o computador”. Adiante, referiu que “deixava as anulações para o final do dia, quando entrasse a responsável da loja, ela tratava disso” e, depois, já referiu que os funcionários das lojas “não podiam anular as vendas no computador, pois isso poderia dar azo a “falcatruas” e que as correções dos supostos erros no registo das vendas eram feitas por uma funcionária de nome S. (que, refira-se, não foi arrolada como testemunha), mas desconhecia como essas eram feitas, com base em que documentos e como era feito o respetivo controlo. De resto, e sendo certo que o seu depoimento não foi valorado pela inconsistência e vacilação apontadas, não deixa de causar estranheza ao Tribunal o facto de a testemunha ter agora apresentado uma versão discrepante ou contraditória com as declarações que anteriormente prestou no processo n.º 1074/12.7BEPRT onde, claramente e sem hesitações, afirmou que “havia um método, uma tecla no computador da loja para anular as vendas em caso de troca, por exemplo, de um par de sapatos por um cinto e devolução do dinheiro remanescente” (Cfr. o CD junto aos autos - processo n.º 1074/12.7BEPRT – parte 2, minutos 1h50:50 a 1h51:15), o que abala manifestamente a sua credibilidade.
· De igual modo, a testemunha S., empregada da loja do Impugnante no “N. shopping”, que respondeu à mesma matéria que a testemunha anterior, prestou declarações de forma defensiva, impaciente, com um discurso tenso e premeditado ou comprometido, desprovido de naturalidade/espontaneidade, até mecanizado, com respostas rápidas, curtas e definitivas, que revelaram não querer dar abertura a mais perguntas. Assim, as várias respostas “sim, sim, sim” dadas pela testemunha a perguntas longas, indiciam um querer “despachar” rapidamente o depoimento e não relatar os factos que a sua memória conservava. Por outro lado, no que concerne ao conteúdo do seu depoimento, a testemunha falou, em termos gerais, nas limitações do sistema informático (v.g. que registava a consulta de um par único na loja como venda), tendo sido perentória ao afirmar que não podia fazer anulações de linhas de faturas ou documentos e que nesses casos tomava nota numa folha e a colega do escritório (a colega S. já referida, não foi arrolada como testemunha) resolvia, afirmando que na loja “simplesmente vendemos” e que não falava com essa colega sobre essas situações, o que não se afigura verosímil e revela uma atitude esquiva, que só teve em vista evitar esclarecimentos sobre a forma como eram efetuadas essas correções. De resto, e sendo certo que o seu depoimento não foi valorado pela falta de genuinidade e verosimilhança apontadas, também não deixa de causar estranheza ao Tribunal o facto de a testemunha ter agora apresentado uma versão totalmente oposta e escassa de conteúdo descritivo relativamente à anteriormente relatada no processo n.º 1074/12.7BEPRT, onde questionada sobre as anulações e de devoluções de artigos afirmou, de modo claro e espontâneo, “nós fazemos tudo para que o cliente fique satisfeito e obviamente se o cliente se arrependeu do que comprou nós devolvemos o dinheiro” e quando perguntada sobre o modo como formalizavam essa operação referiu, sem hesitar, “fazemos uma devolução, no computador, do dinheiro”, “essa devolução dá origem a um documento que vai na faturação” e “há uma colega no escritório que verifica as faturações diárias das lojas”; de igual modo, quando perguntada nesses autos sobre o que fazia se estivesse a efetuar uma venda de um par de sapatos que era par único no stock, respondeu de forma escorreita e descritiva, “se o cliente se arrepender nós conseguíamos anular a venda, conseguíamos anular o talão e não precisávamos sequer de fazer a devolução do dinheiro por era possível fazê-lo, anular o talão; havia uma opção que conseguíamos fazer a anulação do talão”, mais tendo referido que quando a consulta de par único dava origem ao registo indevido de uma venda “tínhamos a possibilidade de ir a uma tecla lá e anular o talão” e que, nestes casos, “fazíamos a anulação mas não saía documento nenhum, podíamos voltar a registar com a anulação feita”, “era assim que o programa funcionava na altura, tínhamos a possibilidade de conseguir anular”; por fim, a contra instância da Fazenda Pública, reafirmou nesse mesmo processo que os funcionários conseguiam eliminar linhas das faturas (Cfr. o CD junto aos autos - processo n.º 1074/12.7BEPRT – parte 2, minutos 4:50 a 12:00), o que não pode deixar de abalar a credibilidade do depoimento prestado nos presentes autos. De resto, tendo sido confrontada pela Representante da Fazenda Pública, no decurso da inquirição nos presentes autos, com a versão dos factos por si apresentada naqueloutro processo, a testemunha não refutou essa situação e, chegando mesmo a admiti-la dizendo “se o disse…”, não apresentou qualquer razão para a alteração do seu testemunho.
· Finalmente, o depoimento de A., que participou na implementação do sistema informático do Impugnante e é autor do documento n.º 93 junto com a petição inicial, que constitui uma análise à auditoria ao sistema informático efetuada pela AT que, por si só, nada demonstra, também se revelou pouco esclarecedor e consistente e assente em juízos de valor ou meras suposições, razão pela qual também não foi valorado. Por um lado, referiu “achar” que a base de dados “fast 2” era a base que apresentava os registos corretos das vendas das lojas mas, por outro lado, referiu que “se as bases de dados são diferentes, parece manipulação” e que “há coisas que estão certas, outras não sei; não tenho explicação para elas”; “há coisas que estão certas, mas há outras coisas estranhas”, “é tudo interpretável: pode ser manipulação ou correcção”. Ademais, quando questionado pelo Tribunal sobre qual o conteúdo das bases de dados, explicou que a “fast 10” continha os registos das compras, vendas, consignações, simulações e que era pouco fiável e permeável a erros, mas era através dessa que o Impugnante fazia a análise do seu negócio já que a “fast 2” só continha as vendas, não se compreendendo como é que a análise de um negócio era feita através de dados não fiáveis; por outro lado, não soube explicar a razão de ser da alegada correção dos erros na base de dados “fast 2” quando era a “fast 10” que servia de base à análise do negócio, tendo-se limitado a concordar com tal perplexidade, afirmando “não saber qual foi a intenção mas que na altura ficou assim”. Finalmente, referiu desconhecer como e quando foram efetuadas as correções na base de dados “fast 2” aos supostos erros nos registos informáticos, supondo apenas que foram efetuadas com rigor, o que traduz uma mera convicção pessoal, não tendo conhecimento da realidade dos factos.
· Por seu lado, a testemunha P., inspetor tributário responsável pela auditoria informática efetuada ao Impugnante, explicou, de uma forma clara, detalhada e segura, as conclusões que retirou dessa análise, vertidas no relatório de inspeção tributária, designadamente:
o que nas anulações que não apresentavam indícios de manipulação e que foram aceites pela inspeção, na “linha 1” do talão era registada a venda do artigo e na “linha 2” a anulação dessa venda (talão negativo), ao passo que nas situações consideradas como “manipulação” havia uma linha com o registo da venda do artigo e depois uma eliminação dessa linha;
o que a quase totalidade das “manipulações” ocorreu nas situações em que o tipo de pagamento era dinheiro mantendo-se registado o meio de pagamento o “tipo 1” (que era o pagamento em dinheiro que havia sido efetuado porque o sapato tinha sido efetivamente vendido); no entanto, quando a devolução é verdadeira, o meio de pagamento assumido no programa é “tipo 6”, ou seja, sem meio de pagamento;
o que no universo de talões que foram considerados como não manipulados (cerca de 85%), encontram-se diversas trocas, devoluções e anulações que foram validadas e aceites e estas estavam quer na “fast 2” quer na “fast 10”;
o que a base de dados local do “N. shopping”, em que o utilizador é sempre o mesmo e em que não existem linhas eliminadas, apresenta valores exatamente iguais aos da base de dados “fast 10” do servidor para o “N. shopping”, mas superiores aos contidos na base de dados “fast 2” do computador servidor;
o que existem indícios de que manipulação ocorre muito depois do apuro diário do caixa, cerca de um mês depois, pois em maio de 2011, aquando da inspeção, a base de dados “fast 2” ainda não estava manipulada, mas não faz sentido que os alegados erros fossem corrigidos tão tarde, porque, se assim fosse, o “patrão” não tinha controlo nenhum sobre a realidade das vendas; por outro lado, tendo em conta que a declaração periódica do período só seria entregue em julho, haveria ainda tempo para a manipulação;
o detetaram-se falhas de numeração em documentos ou nas linhas das faturas constantes na base de dados “fast 2” (em vários dias e lojas, i.e., não se tratou de uma situação pontual), o que não acontecia com os documentos encontrados na base de dados “fast 10”, tendo sido narradas situações de evidência de manipulação de dados como, por exemplo, a substituição do registo de sapatos de 100€, por palmilhas de 10€ ou escovas de 2,5€, sendo que, em todos os casos de correções, estas eram sempre favoráveis ao sujeito passivo que, por essa via, entregava menos imposto ao Estado.
Ora, ao contrário do depoimento prestado pela anterior testemunha, o técnico informático do Impugnante, o depoimento prestado por esta, contendo uma descrição pormenorizada e isenta dos factos encontrados na auditoria informática efetuada, mostrou-se bastante preciso e coerente, infirmando os factos alegados pelos Impugnantes, que, assim, foram considerados como não provados. De resto, e visto que o técnico informático do Impugnante confirmou várias vezes ao longo do seu depoimento que a manipulação dos registos era possível, sendo que apenas estava pessoalmente convicto de que tal situação não teria ocorrido, não se poderá dizer que tenha existido uma contradição propriamente dita entre as declarações de ambos que justificasse a sua acareação (cfr. o art. 523.º do CPC), pois as testemunhas em causa não prestaram depoimentos divergentes sobre os mesmos factos, e tanto assim é que nenhuma das partes a requereu.
· Finalmente, a testemunha G., inspetora tributária responsável pela elaboração do relatório de inspeção que está na génese das liquidações impugnadas, reiterou os factos materiais referidos no relatório de inspeção, as diligências efetuadas e conclusões retiradas, designadamente:
o A inexistência dos duplicados dos talões de venda;
o A existência de divergências ao nível dos valores entre as listagens informáticas “tipo Z” emitidas todos os dias e os mapas Excel mensais, elaborados manualmente, que suportavam o registo mensal das vendas;
o A existência de duas listagens “tipo Z” para o mesmo dia, com valores distintos;
o A verificação, através da análise informática, da existência de uma base de dados paralela em que os registos das vendas estavam intactos;
o A inexistência de notas de crédito dos fornecedores a documentar as devoluções, e a inconsistência entre os valores das devoluções a fornecedores registadas na contabilidade (entre 20-30 mil euros) e o valor da divergência entre as bases de dados (de cerca de 200 mil euros em cada ano).
Por outro lado, através do depoimento prestado a testemunha esclareceu: (i) o conteúdo do trabalho desenvolvido no âmbito do acompanhamento permanente ao sujeito passivo (i.e. que consiste numa análise interna, de conformidade, dos valores declarados e na verificação da eventual falta de declarações, mas que não envolve a análise de documentos contabilísticos ou dos registos nas bases de dados do sujeito passivo); (ii) que as correções efetuadas não decorreram da aplicação de qualquer margem de lucro, apurada por amostragem, sobre as vendas, mas sim da análise efetuada ao sistema informático do Impugnante, uma vez que a referida margem, assim como a análise económico-financeira da atividade do Impugnante, constituíram meros indícios para a realização da inspeção; e (iii) que não foi possível efetuar uma análise quantitativa (em termos de valor) às compras uma vez que os stocks não eram objeto de gestão, sendo as entradas dadas em loja, consoante as necessidades de venda, sem indicação do preço de custo, podendo, inclusive, haver transferências entre lojas, susceptível de desvirtuar os stocks, daí que tenha sido apenas analisada a conformidade entre os anexos recapitulativos referentes ao sujeito passivo e as compras registadas na contabilidade (de que não resultaram divergências), tendo o sujeito passivo sido notificado para indicar se adquiriu mercadorias que não contabilizou ou se os inventários haviam sido corretamente quantificados e valorizados, justificando as divergências, o que este não fez. Diversamente, quanto às vendas, não sendo possível “circularizar” os clientes (dado tratar-se de vendas ao público), foi possível identificar o concreto valor omitido, que foi corrigido através de correção aritmética.
- No mais, dir-se-á que as restantes asserções constantes da petição inicial constituem meras considerações pessoais, juízos de valor, generalidades e/ou conclusões a extrair de factos não alegados ou raciocínios meramente hipotéticos, que, por total ausência de consubstanciação, tão pouco estariam sujeitos a prova ou haveria que elencar nos factos não provados. E, por fim, da instrução da causa não resultaram demonstrados quaisquer outros factos com interesse para a decisão a proferir. (…)”

3.2. Os Recorrentes nas conclusões – 1.ª a 12.ª - impugnam a matéria de facto pugnando pela alteração do facto provado constante no ponto n.º 8.
Que no seu entender, deverá constar apenas que: “Na sequência da inspeção acima mencionada, a Autoridade Tributária fixou matéria tributável em sede de IVA, dos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de, respetivamente €54.023,70 €54.817,44 e €56.893,04 – cfr. relatório de inspeção a fls 33 a 66 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
E pelo aditamento na parte referente à matéria de facto não provada de um ponto novo, onde conste: “Para apuramento da matéria coletável a Inspeção recorreu a indícios, procedeu a amostragens aleatórias quanto à determinação dos stocks, que não verificou, e das vendas determinadas oficiosamente.”.
Vejamos:
Pese embora nas conclusões não se dê cumprimento pleno ao artigo 640.º do CPC, no entanto, a indicação dos meios de prova e respetiva localização nas gravações encontra-se identificadas nas motivações das alegações, (embora para a questão não tenha qualquer relevância) pelo que se considera cumprido minimamente, o ónus que sobre os Recorrentes recaia face aquele normativo.
Os Recorrentes insurgem-se contra a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial, alegando erro na apreciação da prova, pelo tribunal recorrido, desde logo, por ter sido considerado como provados e não provados factos que, segundo aqueles, resultam provados por prova produzida nos autos.
Prevê o art.º 607.º, n.º 5 do CPC que “o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”
Destarte, o juiz em primeira instância, na decisão sobre a matéria de facto, aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
A apreciação e valoração da prova, está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova a qual se sustenta em critérios racionais e objetivos, em juízos de deduções e conclusões razoáveis, mas sempre de mera probabilidade conduzindo a um juízo positivo da prova quando, se afigure aceitável à luz de um cidadão medianamente informado e esclarecido, que a realidade por eles indiciada se possa ter como efetivamente ter acontecido.
E pelo princípio da sua imediação, que consiste no contacto direto entre o juiz que decide a ação e as testemunhas que fornecem os elementos de prova que interessam à decisão.
O contacto direto, entre o juiz e a testemunha, permite àquele captar uma série relevante de elementos, quer através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento e das reações do inquirido sobre a realidade dos factos.
É jurisprudência pacífica que mesmo com o registo magnético não se conseguem apreender determinadas realidades que só a imediação entre o juiz e a testemunha permite, quando o juiz profere a decisão de acordo com a sua livre convicção, essa convicção foi formada não só com o que lhe foi dito, mas também como foi dito. (Cfr. Acórdãos do STA n.ºs 01188/02 de 18.06.2006 e 109/10 de 12.05.2011).
É, pois, pela fundamentação da sentença que se afere a correção do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Assentando a decisão da matéria de facto, no presente caso, na convicção criada no espírito do juiz e baseada na livre apreciação da prova (documental e testemunhal) que foi produzida, a sindicância de tal decisão não pode deixar de respeitar a liberdade da 1ª instância, na respetiva apreciação.
A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas.
Sobre este entendimento do duplo grau de jurisdição, o Tribunal Constitucional de 13.10.2011, pronunciou-se referindo que (...): “A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis”, de tal modo que a função do Tribunal da 2.ª instância deverá circunscrever-se a “apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1.° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos(destacado nosso) in Acórdãos do T. C. Vol. 51°, Pag 206 e ss..
Em suma, apenas haverá erro de julgamento de facto quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.
Baixando ao caso dos autos pretende os Recorrentes que se dê nova formulação ao ponto 8. da matéria de facto provado no qual consta extratos do relatório de inspeção.
Pretende os Recorrentes que se proceda à seguinte redação: Na sequência da inspeção acima mencionada, a Autoridade Tributária fixou matéria tributável em sede de IVA, dos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de, respetivamente €54.023,70 €54.817,44 e €56.893,04 – cfr. relatório de inspeção a fls 33 a 66 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.”
Na motivação da prova produzida a sentença recorrida fundamenta tal facto referindo que: “ No que respeita ao item 8) dos factos provados, a convicção do Tribunal resultou da análise do relatório da inspeção tributária à atividade do Impugnante, cuja força probatória se reporta aos factos que nele são referidos, sejam os afirmados como tendo sido praticados pelos serviços de inspeção tributária (v.g. as diligências realizadas), sejam os factos materiais apurados por esses serviços, sempre que devidamente fundamentados através de elementos externos e assentes em critérios objetivos (cfr. o disposto no artigo 76.º, n.º 1 da LGT), uma vez que, se bem vemos, em grande medida, os Impugnantes apenas refutam as conclusões a que chegou a Administração Tributária, mas não os factos em que esta assentou as suas conclusões.”
Como se pode ver o ponto da matéria de facto, extrata parte essenciais do relatório de inspeção que fundamentaram e conduziram às correções da matéria coletável e consequente liquidação do IVA. Logo demonstram o percurso cognitivo e valorativo, prosseguido pela Administração Tributária para a prática do ato tributário.
Embora a matéria controversa, seja a metodologia utilizada pela inspeção, estamos no âmbito do processo judicial tributário, onde se apura a legalidade da liquidação do imposto efetuada pela Administração Fiscal.
O Tribunal é confrontado com o ato tributário de liquidação, nomeadamente, com metodologia usada e os seus pressupostos, que no caso estão espelhados no referido relatório de inspeção e que conduziram as liquidações adicionais e ainda com aplicação das leis e sua interpretação.
Se a metodologia é ou não errada, não se prende com o erro de julgamento de facto, mas sim com erro de julgamento de direito, por erro nos pressupostos de facto o que melhor infra se analisará.
Assim, o facto provado no ponto n.º 8 é essencial para a decisão, nomeadamente, para a questão de saber se a Administração Fiscal, sobre a capa de correções aritméticas aplicou métodos indiretos ou outro método.
Nesta conformidade, improcede a alteração do referido ponto mantendo-se na sua íntegra.
Pretendem ainda os Recorrentes o aditamento na parte referente à matéria de facto não provada de um ponto novo, onde conste: “Para apuramento da matéria coletável a Inspeção recorreu a indícios, procedeu a amostragens aleatórias quanto à determinação dos stocks, que não verificou, e das vendas determinadas oficiosamente.”.
Com efeito, a asserção que se pretende ver aditada é conclusiva na medida em que, um juízo de facto é um julgamento baseado em análise isenta de valores ou interpretações subjetivas identificando somente aquilo que é visível comprovado ou objetivo.
Tratando-se de um juízo conclusivo, não pode ser aditado aos factos provados.
Importa ainda, relativamente à matéria de facto, referir que a Recorrente, nas conclusões 4.ª 6. ª a 12.ª reporta-se à apreciação da prova testemunhal produzida referindo que a desvalorização dos depoimentos das testemunhas por si arroladas não é aceitável, e se é verdade que algumas das testemunhas indicadas eram ou são seus funcionários, não é menos verdade que a Sra. Inspetora e Sr. Inspetor perito informático indicados pela AT também são funcionários da Recorrida. Não se afigura justo, desvalorizar os depoimentos dos primeiros por essa razão e não aplicar o mesmo critério de valoração aos segundos, quando razão idêntica os caracteriza.
Face à impugnação da matéria de facto provada e não provada, e face ao supra decidido os Recorrentes não impugnaram quaisquer outros factos que tenham tido por base o depoimento das mesmas ou se pediu o aditamento com base nesses depoimentos.
Tais conclusões mostram-se irrelevantes para o julgamento da matéria de facto.
4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. Nas conclusões 16.ª a 25º alegam os Recorrente que a sentença recorrida aplicou mal o direito, por se deixar equivocar quanto aos pressupostos de facto subjacentes ao caso concreto, e ainda por apresentar uma deficiente leitura dos princípios plasmados na lei quanto aos métodos de determinação da matéria coletável. Alegam que importa aferir se a Administração Tributária chegou à determinação da matéria coletável por aplicação de um método direto assente em “correções meramente aritméticas” ou não, é uma questão de direito e não de facto.
E que a sentença recorrida incorre num equívoco, nesta matéria, pois que, não se trata de invocar o direito a aplicação de métodos indiretos, o que os impugnantes nunca reclamaram. O que está em causa, e isso sim foi invocado pelos impugnantes, é que no caso concreto, a Administração Tributária alegou ter aplicado correções aritméticas quando, na verdade, os métodos que usou para lá chegar não assentam em meras correções de erros de cálculo ou de qualquer outra natureza, mas sim na aplicação de métodos indiciários, ou indiretos, tais como as amostragens aleatórias e consequentes extrapolações, embora sempre sob a designação de “correções aritméticas”.
Alegam que, o que foi colocado à discussão e se submeteu ao conhecimento do Tribunal a quo foi, unicamente, aferir do cumprimento da lei por parte da Administração Tributária na forma como chegou à matéria coletável que fixou oficiosamente por via da Inspeção realizada.
Entendem que a sentença recorrida incorre num manifesto erro de apreciação da questão fundamental a decidir, a qual se centra, isso sim, nos deveres da Administração Tributária a cumprir nesta sede, na qual se encontra estritamente vinculada à lei, e, nessa medida, obrigada a prosseguir pela determinação da matéria coletável por via direta quando a contabilidade do SP lho permita (demonstrando objetivamente quais os erros de cálculo ou na declaração ocorridos) ou pela via indireta, naqueles casos em que a contabilidade do SP apresente erros ou inexatidões que não permitam chegar à demonstração objetiva dos valores a fixar.
Vejamos:
A questão fulcral nos presentes autos, é a de saber se a determinação da matéria coletável, que deu origem às liquidações do IVA, resultante de prévio procedimento de inspeção tributária, ocorreu por mera correção aritmética, com respeito pelos pressupostos de facto e de direito previstos legalmente para este método de determinação da matéria coletável.
A sentença recorrida sob o item denominado “Da ilegitimidade das correções aritméticas efetuadas em detrimento da determinação da matéria tributável a métodos indiretos” analisou o quadro legal, a doutrina e a jurisprudência, profusamente, tendo concluído que a metodologia de tributação subjacente às liquidações impugnadas era adequada à realidade constatada pela inspeção tributária, vertida no respetivo relatório.
Entendeu que não assistir razão aos Impugnantes/Recorrentes quando invocam a utilização de presunções e de extrapolações, pois a matéria tributável não foi determinada com base em margens médias, que as correções à matéria coletável foram determinadas pelas diferenças detetadas entre os valores constantes da base de dados ativa (“fast 2”) e os registos contabilísticos e que foi a alegada manipulação informática da base de dados ativa (“fast 2”) que esteve na base de todo o percurso conclusivo do relatório.
As correções basearam-se, unicamente, na informação espelhada no sistema informático do próprio contribuinte, pelo que na determinação do rendimento tributável a Administração Tributária não partiu de quaisquer indícios ou presunções, mas sim de elementos objetivos e diretamente recolhidos junto do visado. Ou seja, a alteração do rendimento tributável em sede de IVA bastou-se com o recurso a correções técnicas, por via das quais as alegadas vendas omitidas passaram a ser consideradas.
Tendo concluído que estavam preenchidos os pressupostos para a Administração Tributária lançar mão, como lançou, da avaliação direta da matéria tributável, método a que, o legislador fiscal deu clara prevalência no nosso sistema tributário.
E, assim, não se verificando os pressupostos para a avaliação indireta (de impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável), não existia fundamento para o pedido de revisão da matéria tributável, uma vez que, esta faculdade depende da existência de uma avaliação indireta.
Apreciando:
Antes de mais, e em abono da verdade, refira-se que a sentença recorrida não incorreu em equivoco, na interpretação da pretensão dos Recorrentes, - ao invocar o direito à aplicação a métodos indiretos, - uma vez, que se focou na metodologia usada pela Administração Tributária (avaliação direta) se respeitava os pressupostos e estava conforme com a lei.
E desde já se diga que a sentença recorrida não nos merece qualquer reparo.
O n.º 1 do art.º 75.º do Lei Geral Tributária (LGT) determina que “Presumem-se verdadeiras de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando este tiverem organizada de acordo com a lei comercial e fiscal.”
Assim, o artigo 75.º da LGT consagra o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei fiscal e comercial.
Esta presunção vincula a Administração Fiscal à realização da liquidação com base nas declarações dos contribuintes, (art.º 59.º do CPPT) sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, ao controlo dos factos declarados.
Essa presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).
Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a Administração Tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos.
No entanto, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte.
E como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado,actuando a Administração Tributária no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas que suportam essa liquidação”. – cf., por todos, acórdão do STA de 28/9/2011, Processo 0494/11.
Refira-se ainda que, como resulta do artigo 81.º, n.º 1 da LGT, regra geral, a matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente, segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a Administração Fiscal proceder a avaliação indireta nos casos e condições expressamente previstos na lei.
A preferência pela avaliação direta é, ainda, um imperativo constitucional por ser o método que melhor acautela a tributação pelo lucro real, previsto no artigo 104.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
Por sua vez, o artigo 85.º da LGT prevê que a avaliação indireta é subsidiária da avaliação direta sendo-lhe aplicáveis, sempre que possível e a lei não prescreva em sentido diverso, as regras da tributação direta.
Em consonância, o n. º1 do artigo 90.º do Código do IVA, a liquidação do imposto com base em presunções ou métodos indiretos efetua-se nos casos e condições previstos nos artigos 87.º a 89.º da LGT.
Daqui resulta, como bem refere a sentença recorrida, que o apuramento da matéria tributável de qualquer imposto deve ser feito, sempre que possível, com recurso a métodos diretos ou correções aritméticas, isto é, pela determinação da matéria coletável através dos elementos da própria contabilidade do sujeito passivo e só pode haver recurso a métodos indiretos quando aquele apuramento direto se mostre de todo inviável, não gozando a Fazenda Pública de qualquer margem de discricionariedade relativamente à opção do método (direto ou indireto) de avaliação da matéria tributável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr., neste sentido, o Acórdão do TCA Sul proferido em 13/03/2014, proc. n.º 07215/13).
Da matéria de facto provada e do relatório de inspeção tributária resulta que os serviços de inspeção tributária concluíram pela omissão de vendas nos anos de 2008, 2009 e 2010 que conduziram a liquidações adicionais de IVA e juros.
As liquidações em causa, nos presentes autos, decorrem de correções que apelidaram de aritméticas efetuadas pela Administração Tributária na sequência de uma ação de inspeção aos dados contidos no programa de faturação do Recorrente, marido, denominado FAST-II (produzido pela Softwarehouse Microdigital) utilizando ficheiros de dados tipo dBase (extensão dbf) utilizado por este para o registo das operações atinentes à sua atividade comercial (comércio de calçado a retalho), que incluía armazém e 9 lojas de venda ao público, no Porto, Coimbra e Lisboa, com a marca “A.”.
Resulta do relatório da inspeção (factos provados no ponto n.º 8), no ponto III.1 foi feita uma análise preliminar abrangendo a situação cadastral e declarativa dos sujeitos passivos, a descrição da atividade exercida pelo Impugnante/Recorrente e a análise económico-financeira dos valores registados na contabilidade. No ponto III.2. procedeu-se a uma análise de conformidade da margem (com base no confronto entre os preços de venda ao público praticados, em 2009, em duas lojas do sujeito passivo e as correspondentes faturas de aquisição), dos inventários (com base no inventário final de 2008 e as vendas realizadas em 02.01.2009, foram selecionadas algumas referências e foi analisada a fatura de aquisição), das compras (compreendendo a análise dos registos contabilísticos e o cruzamento com informação declarada por fornecedores) e, por fim, das vendas, tendo sido detetadas incoerências e irregularidades contabilísticas e financeiras o que conduziu à análise ao sistema informático do sujeito passivo (ponto III.3.), do qual resultaram indícios de manipulação dos registos contidos na base de dados ativa que servia de base à contabilidade (“fast 2”), de forma a diminuir os valores das vendas, tendo, sido considerada credível a informação constante da base de dados de segurança (“fast 10”), apurando o valor das vendas omisso à contabilidade obtido pela comparação entre os registos de ambas as bases de dados. Concluíram que os ficheiros contidos nessa pasta revelam possuir os dados de facturação mais recentes e montante consistentes com a elementos contabilísticos.
Assim, do ficheiro FAST2 contidos no disco, copiados desse programa de faturação pelos serviços de inspeção, constataram que os registos das operações de venda inscritos na tabela FAST2 (que suporta os registos contabilísticos) constituem a base de dados ativa não coincide com a FAST 10.
Que os ficheiros da FAST2 apresentam indícios de manipulação e falhas o que não acontece com a FAST10 que se mostra consistente sem qualquer falha.
Perante estes indícios e pela comparação entre a base de dados ativa (D:\Fast 2) e a base de dados no diretório D: \Fast10 do servidor concluíram que está corresponde uma cópia de segurança dos documentos de venda antes da realização qualquer manipulação.
Face a este paradigma, a inspeção comparou o valor das vendas em ambas as bases de dados, tendo concluído que FAST10 é superior ao valor constante na base de dados ativa (FAST2) concluindo que foram realizadas vendas cujo registo na contabilidade foi omitido.
Com efeito, com vista ao enquadramento do sujeito passivo, a Inspeção no relatório procedeu análises económica–financeira, de conformidade e a cálculos de margens, porém estas não foram as razões que levaram às correções aritméticas.
Assim, sendo não nos merece reparo a sentença ao ter decidido que não lhes assista razão quando invocam a utilização de presunções e de extrapolações, pois a matéria tributável do Impugnante/Recorrentes não foi determinada com base em margens médias. O que esteve na base de todo o percurso conclusivo do relatório, e nas correções à matéria coletável foram determinadas pelas diferenças detetadas entre os valores constantes da base de dados ativa (“fast 2”) e os registos contabilísticos e que foi a alegada manipulação informática da base de dados ativa (“fast 2”), como bem perceberam os Recorrentes e admitiram expressamente na sua petição inicial (art.º 145.º e 146.º).
Aqui chegados, importa saber, se a Administração Fiscal logrou provar os pressupostos da sua atuação, ou seja, se os fundamentos vertidos no relatório de inspeção são de molde a suportar a correção que está na origem das liquidações adicionais de IVA sendo que, para tal concluiu no sentido da omissão de vendas.
É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil, de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT.
Importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificados que a Administração Fiscal logrou provar os pressupostos da sua atuação, ou seja, se os fundamentos vertidos no relatório de inspeção são de forma a suportar a correção que está na origem das liquidações adicionais de IVA.
Como bem refere a sentença recorrida, a Administração Fiscal para concluir no sentido da omissão de vendas, ponderou o seguinte:
- Indícios de que os registos efetuados na pasta “fast 2” (localizada no computador do armazém do Impugnante e que constituía a base de dados ativa que servia de suporte ao registo contabilístico das vendas) se encontravam manipulados, em virtude de terem sido encontradas:
· falhas na numeração (na sequência numérica) dos talões de venda, detetadas em diversas lojas;
· falhas na numeração das linhas dos documentos de venda, indiciando que possuíam outras linhas, entretanto eliminadas;
· linhas marcadas como eliminadas (detetadas com recurso a uma aplicação de auditoria informática);
· número elevado de anulações de artigos vendidos (número significativo de documentos em que o total da venda é colocado a zero);
· a base de dados “fast 10” apresenta uma estrutura idêntica à “fast 2”, sem, contudo, ter os dados mais recentes, o que levava a crer que se trata de uma cópia de segurança da base de dados ativa;
· a análise dos ficheiros presentes em “fast 10” revelou que os documentos apresentavam os mesmos valores e detalhes que os contidos em “fast 2”, no que respeita aos documentos que não apresentam indícios de manipulação;
· os documentos que em “fast 2” apresentam situações indiciadoras de manipulação (atrás referidas), encontram-se plenamente consistentes em “fast 10”, sem qualquer falha, o que demonstra que esta se trata de uma cópia de segurança dos documentos de venda antes da realização da manipulação;
· a fiabilidade dos dados armazenados em “fast 10” (do computador do armazém) torna-se inquestionável através da comparação com os dados que foram objeto de cópia na loja do “N. Shopping” (armazenados na pasta “fast 2” localizada no computador da loja do “N. Shopping”), onde se apurou que os dados (relativos à série N) eram iguais;
· da comparação entre o valor das vendas em ambas as bases de dados (“fast 10” e “fast 2” localizadas no computador do armazém), verifica-se que o valor é superior em “fast 10”;
· da confrontação dos valores constantes de ambas as bases de dados (“fast 10” e “fast 2”) com o meio de pagamento utilizado, verifica-se que os talões modificados correspondem na sua maioria a pagamentos em dinheiro, sendo que sempre que correspondem a pagamentos com cartão é possível verificar que o valor pago está em conformidade com os registos da base de dados “fast 10”, o que valida a informação constante desta base de dados e demonstra que os registos constantes da base de dados “fast 2” foram manipulados.
- a falta de arquivo dos duplicados dos talões de venda, que impossibilita a validação das vendas registadas nos resumos “tipo Z” (resumos das vendas diárias de cada loja, que serviam de suporte ao preenchimento manual dos mapas mensais, que, por sua vez, serviam de suporte ao registo contabilístico das vendas e do IVA liquidado);
- a existência de resumos de vendas “tipo Z” arquivados na contabilidade, referentes ao mesmo dia e com indicação de vendas diferentes;
- a existência de resumos de vendas “tipo Z” arquivados na contabilidade, com indicação de vendas que foram consideradas na contabilidade por um valor divergente;
- recebimentos de clientes, comprovados através de talões “multibanco”, cuja venda correspondente não foi registada na contabilidade.
A sentença recorrida entendeu que aa situação descrita no relatório de inspeção, acompanhada da ausência de qualquer explicação plausível no decurso do procedimento inspetivo, constitui, no nosso entendimento, indício fundado de que as vendas declaradas em 2008, 2009 e 2010 pelo Impugnante não correspondem às suas vendas reais, ficando assim abalada a presunção de verdade das declarações e dos dados inscritos na sua contabilidade. (…)”
Com efeito o julgamento efetuado pela sentença recorrida nãos nos merece qualquer reparo uma vez que resulta claro que as correções não resultaram do desfasamento apurado entre os rendimentos e as despesas declaradas pelos Impugnantes, nem da discrepância detetada ao nível da margem de lucro sobre as vendas, mas sim, do cálculo da diferença entre os dados das vendas recolhidos do sistema informático do Impugnante/Recorrente (base de dados “fast 10”) e os declarados para efeitos fiscais.
Nesta conformidade, tendo a sentença recorrida firmado a convicção que a Administração Fiscal demonstrou de forma abundante os pressupostos da sua atuação, satisfazendo o ónus da prova que lhe competia, não nos merece qualquer censura.
Acresce ainda, referir que pelo facto de Administração Tributária ter efetuado deduções (lógicas) a partir da análise económica financeira, análise de conformidade (apuramento de margem e inventários e compras e vendas efetuadas em dias determinados e movimentos financeiros) para concluir que houve omissão vendas, não impeditivo de recurso a métodos diretos na determinação da matéria tributável.
Não é o recurso a presunções no processo lógico do apuramento da verdade fiscal do contribuinte que define a avaliação direta, mas a possibilidade de aceder ao valor exato objetivo da matéria tributável depois de se confirmar que o declarado não corresponde à verdade.
E, no caso dos autos, essa possibilidade verificou-se.
Face ao que vimos de dizer é de concluir que, in casu, os indicadores recolhidos pela Administração Tributária são suficientes para suportar a conclusão a que chegou e, assim ilidir a presunção de verdade da declaração de rendimentos da Recorrente, pelo que terá de manter a sentença recorrida que assim entendeu.
Improcede, pois, este fundamento do recurso.

4.2. Nas conclusões 25.º a 27. º alegam que a prorrogação do prazo para a conclusão da inspeção é ilegal, por não ter fundamentação legalmente admissível, tendo em conta que o SP se encontrava em acompanhamento permanente (PNAIT) desde 2002. Foi ainda ilegal por ser violadora dos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da boa-fé. Tal circunstância consubstancia um vício de forma por falta de fundamentação do despacho de prorrogação e um vício de violação de lei, por violação do disposto no artigo 39º, nºs 1 e 2, do disposto no artigo 5º do RCPIT e, ainda, do disposto nos artigos 8º e 46º da LGT, e, consequentemente, tem efeito invalidante sobre todo o processado subsequente, incluindo, naturalmente, o Relatório Final que serve de suporte às liquidações ora impugnadas, devendo estas ser anuladas. Ou, se assim não se entender, terá pelo menos como consequência a suspensão do prazo de caducidade.
Assim, no que respeita ao ano de 2008, as liquidações de imposto, juros compensatórios e respetiva demonstração, foram notificadas aos contribuintes já depois dos três anos previstos na lei – artigo 45º, nº 2 da LGT. Assim, quanto às liquidações de imposto e juros referentes ao ano de 2008 verifica-se a caducidade da mesma, por ter decorrido o prazo de três anos previsto na lei.
Os Recorrentes no pedido do recurso, concluem que para além dos supra analisados vícios padece ainda deviolação dos princípios jurídico constitucionais verdade material, da justiça e da proporcionalidade e da proibição dos excessos, decorrentes do disposto nos artigos 13º, 103º e 266º da CRP, artigo 55º da LGT e artigo 6º do RCPIT.”
Vejamos:
A sentença recorrida debruçou-se sobre as questões nos itens designados “Dos vícios (formais) imputados ao procedimento inspectivo e da caducidade do direito à liquidação do IVA do ano de 2008” e “Da violação dos princípios da verdade material, justiça e proporcionalidade”.
A sentença recorrida sustentando-se na lei, na doutrina e na jurisprudência, profusamente analisou cada uma das questões considerando que não se verificavam os vícios imputados pela Impugnante /Recorrente.
Em sede de alegações os Recorrentes limitam-se a trazer à colação a questão, desta vez em termos sintéticos, no entanto, não curaram de apontar à sentença recorrida erro de julgamento.
Os Recorrente não contrariam os fundamentos e a posição sustentado pela MMª juiz na sentença, sustentando-se na generalidade no foi dito na petição inicial, como se a questão não tivesse sido objeto de apreciação judicial.
Importa referir que o objeto do recurso, nos termos do n. º 1 do art627. º do CPC são as decisões judiciais e não os atos administrativos e tributários praticados pela Administração Fiscal.
O recurso terá de demonstrar a sua discordância com a decisão proferida, ou melhor, os fundamentos por que os Recorrente acham que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.
Os Recorrente terão de convocar argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis sob pena de o decidido não poder ser alterado, na parte não impugnada.
Como se referiu no acórdão do STA de 11.05.2011, Processo 04/11, constituindo o recurso jurisdicional “um meio de impugnação da decisão judicial com vista à sua alteração ou anulação pelo tribunal superior após reexame da matéria de facto e/ou de direito nela apreciada, correspondendo, assim, a um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça”, estará votado ao “insucesso o recurso que se alheia totalmente da fundamentação factual e/ou jurídica que determinou a decisão de improcedência da impugnação.
Destarte, se em sede de recurso jurisdicional, os Recorrentes se alhearam em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito em sede de petição inicial, não atacam o julgado, não pode o tribunal de recurso alterar o decidido pelo tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no nº 4 do artigo 635.º do CPC (Cf. TCAN n.º 01806/09.0BEBRG de 15.02.2012 e ac. do STA n.º 0508/13 de 15-05-2013).
Nesta conformidade, não vindo questionado o julgamento em que assentou, não pode este Tribunal conhecer agora essa questão, pelo que o recurso nesta parte não poderia obter provimento.

4.3. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário:
I. Na verdade, como é sabido, de acordo com o artigo 75º, nº 1 da LGT, as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, presumem-se verdadeiras.
II. Essa presunção cessa nomeadamente se essas declarações ou os respetivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexatidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não refletem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (cf. artigo 75º, nº 2, da LGT).
III. Nos casos em que, por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no art.º 75º, nº 1 da LGT deixa de funcionar, a administração tributária fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, com recurso para o efeito e preferencialmente de métodos diretos ou, quando tal não seja possível, a métodos indiretos.
IV. Mas, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar que o juízo que esteve subjacente à sua atuação corretiva é bem fundado, provando os indícios que o sustentam, demonstrando a factualidade suscetível de abalar a presunção da veracidade das operações registadas na contabilidade do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte.
V.É pacificamente aceite quer na doutrina, quer na jurisprudência, que compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável), cabendo, em contrapartida, ao administrado/contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, entendimento que corresponde à regra geral artigo 342.º do Código Civil, de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos, regra essa que foi acolhida no artigo 74.º, n.º 1 da LGT.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso, manter a sentença recorrida.

Após trânsito em julgado do presente acórdão remeta-se cópia aos Serviços do Ministério Público, melhor identificado nos autos.

Custas pelos Recorrentes, nos termos do art.º 527.º do CPC.

Porto, 04 de junho de 2020

Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes