Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00924/13.5BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/15/2019
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO DE CONCESSÃO DE SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO; PRESTAÇÃO DE FALSAS DECLARAÇÕES; MÁ-FÉ; EFEITOS DA NULIDADE; ARTIGO 60º DO DECRETO-LEI Nº.220/2006, DE 03.11;
ARTIGO 78º DA LEI Nº. 04/2007, DE 16.01; ARTIGO 134º DO C.P.A. APROVADO PELO DL Nº. 442/291; ARTIGOS 286º A 289º DO C.C.
Sumário:
I- O preenchimento de formulário de pedido de concessão de subsídio de desemprego com negação expressa de factos que se se sabe serem verdadeiros, ou que não se possam ignorar, com direta repercussão na decisão de deferimento da visada prestação social de desemprego, consubstancia a prestação de declarações falsas com má-fé para efeitos do disposto no artigo 78.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro.
II – A tal não obsta a circunstância do beneficiário ter assumido posteriormente um comportamento colaborante e sem ocultação da “verdade” quando confrontado com a questão por parte da Segurança Social, por ser posterior à prática das apontadas falsas declarações.
III- O ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos [art. 134º do CPA aprovado pelo D.L. nº. 442/91] e a declaração de nulidade tem efeitos retroativos [artigos 286 e 289º do CC]. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL
Recorrido 1:JAPL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Julgar totalmente improcedente a acção
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
JAPL, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra a presente Ação Administrativa Especial contra o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, peticionando, em substância, a invalidade do ato administrativo proferido em 26.04.2013, pela Diretora da Unidade de Prestações e Atendimento da Entidade Demandada, pelo qual se declarou a nulidade da decisão de concessão de subsídio de desemprego e se ordenou a restituição das prestações indevidamente recebidas.
O T.A.F. de Coimbra julgou esta ação procedente, tendo anulado “(…) o ato impugnado (ponto 12 do probatório), e [condenado] (…) a ED no mais peticionado pelo Autor (…)”.
É desta sentença que o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, I.P., vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL, para o que alegou, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso:
(…)
I. Por sentença notificada ao R., aqui Recorrente, por ofício de 05-06-2018, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, julgou totalmente procedente a acção intentada pelo A. JAPL e, em consequência, anulou o acto impugnado.
II. Com o presente dissídio pretendia o A. a revogação da decisão - que declarou nulo o anterior despacho de deferimento das prestações de desemprego - proferida em 24/06/2013 pela Diretora da Unidade de Prestações e Atendimento do Centro Distrital de Coimbra.
III. No essencial, a declaração de nulidade do deferimento de atribuição das prestações de desemprego teve por fundamento o facto de o A. ter omitido ser pensionista de um regime de protecção social estrangeiro desde 05/2009, quando requereu as prestações de desemprego em 16/07/20'10.
IV. Em sede contenciosa veio o Autor arguir, que não omitira que estaria a receber uma pensão de França e que, aquando do pedido das prestações de desemprego o R. terá omitido os seus deveres de controlo prévios e de análise demitindo-se pois com a aduzida argumentação de qualquer responsabilidade por ter informado no requerimento de prestações de desemprego apresentado junto do Centro de Emprego da Figueira da Foz, que não era pensionista de outro sistema de protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro.
V. Argumentos estes que tiveram acolhimento por parte da sentença recorrida, o que conduziu a que o Recorrente, inconformado com o seu teor intentasse o presente recurso, uma vez que entende que a mesma padece de erro na apreciação da matéria de facto e na aplicação do direito.
VI. Assim urge esclarecer que, a gestão e tratamento das diversas prestações a cargo do R., ao contrário do que pretende fazer crer o A., não correm numa única aplicação informática, por manifesta impossibilidade operacional.
VII. Consequentemente, não sendo possível aos serviços do R. e atento o referido supra, cruzar a informação omitida, tornou-se necessário recolher diretamente dos beneficiários informações com vista à aferição dos condicionalismos fácticos e legais para efeitos de atribuição das prestações sociais.
VIII. Ora, de acordo com o disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 60.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, as prestações de desemprego não são acumuláveis com Pensões atribuídas pelos regimes do sistema de segurança social ou de outro sistema de protecção social de inscrição obrigatória incluindo o da função pública e regimes estrangeiros.
IX. Outrossim, acresce que constitui dever dos beneficiários durante o período de concessão das prestações de desemprego comunicar ao centro de emprego qualquer facto susceptível de determinar a cessação das prestações, devendo a restituição das prestações indevidamente recebidas ser efectuada nos termos estabelecidos no respectivo regime jurídico, de acordo com o disposto no artigo 42.° sob a epígrafe "Comunicações obrigatórias".
X. Resulta dos normativos legais referidos a obrigatoriedade de os beneficiários informarem os serviços da segurança social de todos os aspectos que possam influir na atribuição e recebimento das prestações de desemprego, nomeadamente os que obstam ao seu recebimento.
XI. Corolário deste dever de informação que, materializado na prestação de informações correspondentes à verdade dos factos, não se compagina com omissão ou falsas declarações.
XII. Por sua vez, o regime jurídico da responsabilidade emergente do recebimento, por parte dos beneficiários, de prestações indevidas, consta do Decreto-Lei n.° 133/88, de 20 de Abril.
XIII. Consideram-se prestações indevidas, designadamente as que sejam concedidas pelas instituições de segurança social sem observância das disposições legais em vigor, ou seja sem observância das condições legais de atribuição.
XIV. No caso sub judice a prestação de desemprego concedida ao Autor, foi atribuída em violação do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 60.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro.
XV. Sendo que, a violação do mencionado normativo legal deriva da informação veiculada pelo Autor no requerimento apresentado junto do centro de emprego da Figueira da Foz em 16/07/2010, onde o mesmo informou não ser pensionista de outro sistema de protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro, quando na realidade já o era desde 01/05/2009.
XVI. Convocou aqui o A. aplicação do regime do artigo 78.° da Lei n.° 4/2007, de 16 de Janeiro.
XVII. Pretendendo assim inviabilizar a declaração de nulidade, uma vez que a aplicabilidade do referido exige, para efeitos de aplicação do regime da nulidade dos actos, que as informações falsas prestadas o tenham sido de forma dolosa ou com má-fé, para efeitos de declaração de nulidade do acto de atribuição da prestação e consequentemente da devolução da totalidade dos montantes indevidamente recebidos.
XVIII. Cabe referir, contudo, que o citado artigo não tem aqui aplicabilidade! Nem tão- pouco fundamentou a decisão de restituição das prestações indevidamente prestadas.
XIX. Ora, estamos aqui perante uma situação em que o recebimento das prestações indevidas resultou de uma omissão de informação a que o A. estava legalmente obrigado, configurando tal circunstância a nulidade do acto de atribuição das mesmas.
XX. Ainda assim, entendemos não obter vencimento a tese defendida pelo aqui recorrido de que este actuou com mera negligência, sem intenção de prestar falsas declarações.
XXI. No entanto, sempre se dirá que o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 133/88, de 20 de Abril, não faz depender a restituição das prestações indevidas, de uma conduta dolosa ou com má-fé por parte dos beneficiários, mas da simplesmente da falta de informação dos mesmos que conduziu à atribuição indevida das prestações.
XXII. Neste caso, determina o legislador a restituição das prestações indevidas com a devolução da totalidade dos montantes pagos indevidamente, por facto imputável aos beneficiários e, independentemente do tempo da sua concessão, nos termos do disposto no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 133/88, de 20 de Abril.
XXIII. Estamos perante uma nulidade, esta sim prevista no n° 1 do art. 133° do CPA.
XXIV. Esta nulidade difere do previsto no já mencionado artigo 78.° da Lei n.° 4/2007 de 16 de Janeiro, na medida em que não exige para o seu preenchimento que as falsas informações tenham sido prestadas dolosamente ou com má-fé pelos beneficiários.
XXV. Ou seja, quando a lei diz que são nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais, coloca-se a questão do que são tidos como elementos essenciais.
XXVI. É certo que, os elementos essenciais referidos no n° 1 do artigo 133° não são os elementos essenciais ou referências que nos termos do n° 2 do artigo 123° devem sempre constar do acto, assim como não se podem considerar elementos essenciais os da noção do art. 120° do CP A porque aí se trata de uma situação de inexistência de acto administrativo.
XXVII. Consideram-se nulos os actos administrativos que careçam de elementos que, no caso concreto, devam considerar-se essenciais em função do tipo de acto em causa ou da gravidade do vício que o afecta, podendo encontrar-se assim casos de nulidades similares à cláusula geral da lei procedimental alemã.
XXVIII. Neste sentido, seria elemento essencial de uma verificação constitutiva a veracidade dos factos certificados, considerando-se nulos os actos declarativos ou certificativos que incorporem uma constatação falsa, não verdadeira.
XXIX. Ademais, não se veem razões para não se considerar nulo, em geral, o acto que esteja inquinado com um vício anormal ou especialmente grave, ou até um vício normal, mas resultante de uma conduta contraria ao direito.
XXX. Elementos essenciais são todos aqueles que se ligam a momentos ou aspectos legalmente decisivos e graves dos actos administrativos, além daqueles que vêm referidos no seu n° 2, pelo que a existência de uma pensão auferida pelo requerente obstava, desde logo, ao deferimento da prestação requerida.
XXXI. O tribunal de 1ª instância desconsiderou a aplicação do artigo 133° n° 1 do CP A como regra a aplicar neste caso de nulidade, alegando que a entidade demandada se pretendia valer da má-fé e ocultação de informações para declara a nulidade de um acto que, estaria de outro modo já estabilizado no ordenamento jurídico,
XXXII. Ademais e quanto à alegada violação do artigo 141° do CP A assacada pela douta sentença, cabe referir que não ocorreu revogação extemporânea do acto constitutivo de direitos, com fundamento na respectiva ilegalidade, porquanto tratou-se de um acto de reapreciação com fundamento em factos novos e de conhecimento superveniente, reportados a 2013, neste sentido vide Acórdão do TCA Norte de 30/H/2012, Proc. n° 00356/07.4BEM DL.
XXXIII. Entende o aqui Recorrente que a douta sentença ao desconsiderar a factualidade dada como provada e a prova produzida nos autos e constante do processo instrutor, incorreu em erro de julgamento por errada aplicação do direito.
Nestes termos,
E nos mais de Direito que Vossas Excelências, Venerandos Senhores Desembargadores,
Não deixarão de suprir,
Deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença proferida em primeira instância e proferido douto Acórdão que julgue o acto administrativo impugnado válido e eficaz, com a sua manutenção na ordem jurídica, como é de JUSTIÇA!
(…)”.
*
Notificado que foi para o efeito, o Recorrido não contra-alegou.
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.
*
O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Com dispensa de vistos prévios – artigo 36.º n.º 2 do C.P.T.A. – cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do CPTA e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir resume-se a saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação do direito, mormente do disposto no artigo 78º da Lei 04/2007, de 16 de janeiro.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:
1. Em 01.09.2008 o A. apresentou junto dos serviços da Entidade Demandada um requerimento de pensão de reforma antecipada, a partir de 09-04-2009, tendo aí declarado que trabalhou em França entre 01-01-1969 a 31-12-1979 e entre 01-01-1984 a 31-12-1994 (cfr. requerimento de fls. 1 e 2 do processo instrutor do Centro Nacional de Pensões, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
2. Desde data concretamente não determinada do mês de maio de 2009 o A. começou a receber uma pensão de pré-reforma proveniente de França (acordo).
3. Em 16.07.2010 o A. requereu junto dos serviços da Entidade Demandada a concessão de subsídio de desemprego, no qual respondeu “Não” às questões “Está abrangido por outro sistema de protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro?” e “É pensionista de outro sistema de protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro?” (cfr. doc. n.° 2 junto com a p. i., a fls. 19 a 21 do processo físico cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
4. Em 17.08.2010 a Entidade Demandada emitiu ofício com a referência 108443, dirigido ao A., pelo qual lhe atribuía subsídio de desemprego no montante diário de €12,72, a atribuir pelo período de 1020 dias com início em 16.07.2010 (cfr. ofício de fls. 4 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
5. Em 02.04.2013 o A. apresentou junto do Serviço Local da Figueira da Foz da Entidade Demandada um pedido de concessão de subsídio social de desemprego (cfr. requerimento de fls. 6 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
6. Em 08.04.2013 a Entidade Demandada emitiu ofício com o assunto “Esclarecimentos”, dirigido ao A., no qual pode ler-se o seguinte (cfr. ofício de fls. 7 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“Consultado o Sistema de Informação da Segurança Social, é requerente de Pensão com convenção de França, agradecemos desde já que nos informe, se tem ou não da Pensão da França, e qual o valor.”
7. Em 17.04.2013 o A. respondeu ao ofício precedente, tendo informado a Entidade Demandada que recebia uma pensão proveniente de França no valor mensal de €228,78 (cf. exposição de fls. 8 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
8. Em 22.04.2013 a Entidade Demandada emitiu ofício com o assunto “URGENTE - pedido de documento”, dirigido ao A., com o seguinte teor (cf. ofício de fls. 10 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“Com referência à sua carta de 2013/04/17, deverá V. Exa. informar esse serviço, no prazo de 5 dias, qual a data em que produziu efeitos esta pensão paga pelo sistema francês, enviando documento comprovativo”.
9. Em 22.05.2013 a Diretora da Unidade de Prestações e Contribuições da Entidade Demandada apôs o despacho:
Concordo. Proceda-se à notificação do interessado em sede de audiência prévia” na seguinte Informação (cf. despacho e informação de fls. 13 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“INFORMAÇÃO PARA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO DESPACHO DE DEFERIMENTO
REQUERIMENTOS DE PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO - Subsídio de DESEMPREGO
(…)
Por Despacho do Director de Núcleo de Prestações de Sistema Previdencial proferido em 2010/08/17, foi deferido o pedido de atribuição de subsídio de desemprego ao beneficiário identificado, com início em 2010/07/16.
Posteriormente, por factos conhecidos supervenientemente, verifica-se que não estão preenchidas as condições legais de atribuição;
Pelo que se propõe a declaração de nulidade do deferimento com base nos seguintes fundamentos:
- através do pedido de atribuição do subsídio social subsequente verificou-se que o beneficiário era pensionista de regime estrangeiro (França). Foi questionado sobre a data em que produziu efeitos essa pensão e até à data ainda não respondeu.
-Nos termos da al. b) do n.° 1 do art.° 60.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 03/11, as prestações de desemprego não são acumuláveis com pensões atribuídas pelos regimes do sistema de segurança social ou de outro sistema de protecção social de inscrição obrigatória incluindo o da função pública e regimes estrangeiros;
- Cabe ao beneficiário requerente informar a Segurança Social de fatos [sic] que influam nas condições de atribuição das prestações, habilitando os serviços a analisar correctamente os documentos que instruem o pedido e decidirem em conformidade (art. 59° als. b), d) e f) do DL em referência).
- Uma vez que o beneficiário omitiu a informação de que era pensionista, a concessão das prestações de desemprego propõe-se que seja declarada nula, e o pedido cessado para a data do requerimento uma vez que as prestações de desemprego não são acumuláveis com pensões atribuídas pelos regimes do sistema de segurança social ou de outro sistema de protecção social de inscrição obrigatória, incluindo os regimes estrangeiros - al. b) do n.° 1 do art.° 60.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 03/11.
Mais se propõe que se notifique o interessado da cessação da atribuição da prestação, por declaração de nulidade do despacho de deferimento e da obrigatoriedade de devolução das quantias indevidas recebidas, nos termos do art.°s 3.°, 4.° e 17.° do Decreto-Lei n.° 133/88, de 20 de abril.”
10. Em 24.05.2013 a Entidade Demandada emitiu ofício com o assunto “Notificação da Decisão”, dirigido ao A., com o seguinte teor (cf. ofício de fls. 14 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
pelo presente ofício e nos termos do despacho da Diretora da Unidade de Prestações e Atendimento proferido em 2012/03/13 no uso da competência subdelegada, informa-se V. Ex- que o deferimento do requerimento acima indicado será declarado nulo se, no prazo de 5 dias úteis a contar da data da recepção deste ofício, não der entrada nestes Serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possa obstar à referida decisão”.
11. Em 30.05.2013 o A. pronunciou-se em sede de audiência dos interessados acerca da decisão mencionada em 10. (cf. resposta de fls. 15 a 25 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
12. Em 10.07.2013 a Entidade Demandada emitiu ofício com o assuntoDecisão Definitiva”, dirigido ao A., com o seguinte teor (cf. ofício de fls. 26 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
“Analisada a sua resposta à audiência de interessados, pelo presente ofício e nos termos do Despacho proferido em 2013/06/24 da Diretora da Unidade de Prestações e Atendimento, proferido no uso de competência delegada, notifica-se V. Ex- que o requerimento acima indicado foi declarado nulo, nos termos e com os fundamentos a seguir indicados:
- Quando requereu a atribuição de prestações de desemprego em 2010/07/16 era V. Exa. pensionista de um regime de proteção social de inscrição obrigatória estrangeiro, designadamente, francês.
- Dispõe o art. 54.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de novembro as situações determinantes da cessação das prestações perante os sistemas de proteção social. Estabelece o art. 60.° do mesmo diploma as situações não acumuláveis com as prestações de desemprego, designadamente, a alínea b) do n° 1: «As prestações de desemprego não são acumuláveis com: (...) b) Pensões atribuídas pelos regimes de segurança social ou de outro sistema de proteção social de inscrição obrigatória, incluindo o da função pública e regimes estrangeiros».
- Decorrente do exposto, e ao abrigo do art. 42.°/2 al. a) do diploma em referência, estava V. Exa. obrigado durante o período de concessão das prestações de desemprego a comunicar à competente instituição de segurança social qualquer facto suscetível de determinar a suspensão ou a cessação das prestações, no vertente caso, a situação de pensionista, o que não chegou a efetuar voluntariamente, não permitindo a verificação e controlo pelos Serviços da Segurança Social, de acordo com o disposto nas als. b) e c) do art. 69.°, do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de novembro.
- Caberia ainda a V. Exa. ter informado a sua entidade empregadora do facto de ser pensionista aquando da receção da notificação de atribuição de pensão do regime estrangeiro, para que passasse a contribuir sobre uma taxa correspondente, que é uma taxa mais favorável.
Nos termos do art. 3.° do DL 133/88, de 20 de abril, há lugar à reposição integral dos valores indevidamente recebidos, pelo que consequentemente será criada a respectiva nota de reposição.”
13. Em 16.10.2013 o A. apresentou recurso hierárquico da decisão mencionada em 12. (cf. recurso de fls. 27 a 32 do processo instrutor, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
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III.2 - DO DIREITO
A decisão judicial recorrida anulou o ato administrativo proferido em 26.04.2013, pela Diretora da Unidade de Prestações e Atendimento do Recorrente, pelo qual se declarou a nulidade da decisão de concessão de subsídio de desemprego e se ordenou a restituição das prestações indevidamente recebidas.
Fê-lo, sobretudo, com a seguinte fundamentação jurídica:
“(…)
Tal como é afirmado por ambas as partes na presente acção, resulta directamente do n.° 1 do artigo 60.° do DL n.° 220/2006, de 3 de Novembro, diploma que estabelece o regime jurídico de protecção social na situação de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, as prestações de desemprego não podem cumular-se com quaisquer pensões atribuídas por outro sistema de protecção social, incluindo os estrangeiros, bem como as prestações de pré-reforma.
Ora, resulta do ponto n.° 2. do probatório que o A. recebe, desde maio de 2009, uma prestação de pré-reforma proveniente da instituição de segurança social francesa, o que resulta dos documentos e o mesmo admite, sendo ainda por si reconhecido que esta pensão não pode cumular-se com as prestações de desemprego que recebia, ainda que afirme que não detinha este conhecimento à data em que requereu a concessão de prestações de desemprego.
E a Entidade Demandada, apercebendo-se desta circunstância com o requerimento de concessão de subsídio social de desemprego apresentado pelo A., declarou a nulidade do ato de concessão do subsídio de desemprego, com base no artigo 78.° da Lei n.° 4/2007, de 16 de Janeiro, que define as bases do sistema da Segurança Social em Portugal.
Com efeito, de acordo com este preceito legal, “os actos administrativos de atribuição de direitos ou de reconhecimento de situações jurídicas, baseados em informações falsas, prestadas dolosamente ou com má fé pelos beneficiários, são nulos e punidos nos termos da legislação aplicável” , situação que a Entidade Demandada entende verificar-se no caso concreto, afirmando que, ao requerer a concessão do subsídio de desemprego, o A. prestou dolosamente informações falsas, ocultando o facto de auferir uma pensão de pré-reforma proveniente de França.
O artigo 78.° da Lei n.° 4/2007 introduz, portanto, um caso especial de nulidade do acto administrativo atributivo de direitos, a acrescer aos que já vêm em geral estabelecidos no artigo 133.° do CPA, que aqui também tem aplicação por efeito do disposto no n.° 6 do artigo 2.° deste último diploma legal (cf., neste sentido, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) de 02-07-2015, Proc. n.° 01543/10.3BEPRT, disponível em www.dgsi.pt).
Para que possa verificar-se esta nulidade haverá, portanto, que resultar das circunstâncias do caso concreto que o beneficiário agiu com dolo e com a intenção de ocultar informações ou de prestar falsas declarações à entidade administrativa.
E não se afigura que dos elementos carreados para os autos resulte que o A. agiu com esta intenção de prestar informações falsas à Entidade Demandada para que lhe fossem concedidas as prestações de desemprego.
Com efeito, conforme já referido, este trata-se de um caso especial de nulidade que não se basta com a mera omissão de informação num formulário de concessão de prestações, uma vez que do artigo 78.° não pode extrair-se uma “presunção de actuação/omissão dolosa ou de má-fé por parte dos beneficiários pelo que se impõe “à Administração a recolha de elementos e o apuramento de factos que corporizem ou preencham a previsão do preceito de molde a legítima e legalmente emitir ato com tal conteúdo declaratório da nulidade com extracção das respectivas consequências” (cf. acórdão do TCAN de 12-10-2012, Proc. n.° 01600/07.3BEPRT, disponível em www.dgsi.pt).
Esta é, aliás, a orientação que melhor se coaduna às regras de distribuição do ónus da prova constantes do artigo 342.° do Código Civil, de acordo com as quais será a parte a quem determinado facto aproveita que deve alegá-lo e comprová-lo adequadamente.
Ora, no caso concreto, é a Entidade Demandada que pretende valer-se da alegada má fé e ocultação de informações para declarar a nulidade de um acto que, de outro modo, estaria já estabilizado no ordenamento jurídico, razão pela qual sempre seria a parte responsável pela prova do dolo do A..
Todavia, dos factos apurados e dos elementos que foram juntos aos autos não é possível retirar que o A. em algum momento agiu com má fé ou com intenção de ocultar estas informações, tendo afirmando junto dos serviços da Entidade Demanda, quando requerido, que recebia um pensão de pré-reforma proveniente de França. Não manifestou o A., deste modo, qualquer comportamento ao longo do procedimento administrativo que permita concluir pela sua má fé no preenchimento do formulário em que requeria o subsídio de desemprego. Tendo tido antes um comportamento colaborante e sem ocultação da “verdade” quando confrontado com a questão por parte da ED.
Acresce que os formulários de questões múltiplas nem sempre são entendíveis por todos os cidadãos.
Não se verificando as circunstâncias que permitiriam à Entidade Demandada lançar mão do artigo 78.° da Lei n.° 4/2007, ou outras que definidas pelo artigo 133.° do CPA, que conduzam à nulidade do acto de concessão do subsídio de desemprego ao A., então sempre seria meramente anulável, nos termos do artigo 135.° do CPA, por ter sido praticado em desrespeito do disposto no artigo 60.° do DL n.° 220/2006.
Sendo aquele um acto meramente anulável, e de acordo com o disposto no artigo 141.° do CPA, apenas poderia ser “revogado” administrativamente, na terminologia utilizada pelo CPA aprovado pelo DL n.° 442/91, no prazo do respectivo recurso contencioso, que corresponde ao prazo mais longo de um ano, conferido ao Ministério Público pela al. a) do n.° 2 do artigo 58.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Ora, tendo o acto de concessão do subsídio de desemprego sido emitido em 17-08-2010, apenas poderia ser anulado até 17-08-2011, o que não sucedeu, tendo o acto “revogatório” aqui impugnado sido proferido apenas em 10-07-2013.
Assim, por ter sido desrespeitada a regra do artigo 141.° do CPA, o acto que aqui vem impugnado é anulável, nos termos do artigo 135.° do CPA.
Deste modo, deve proceder a presente acção de impugnação, anulando-se o ato impugnado e mantendo-se na ordem jurídica o acto de concessão do subsídio de desemprego do A., sem necessidade de reposição de quaisquer quantias.
(…)”.
Espraiada a fundamentação vertida na sentença recorrida, adiante-se, desde já, que divergimos do sentido da decisão adotada pelo Tribunal a quo.
No caso sob apreço, está em causa o despacho de declaração de nulidade da decisão de concessão de subsídio de desemprego [e consequente ordem de restituição das prestações indevidamente recebidas].
Ora, não só impende sobre o Réu, aqui Recorrente o ónus da prova da existência dos pressupostos legais da sua atuação, como, ainda, a legalidade dos atos em causa tem de ser aferida à luz dos pressupostos de facto e de direito existentes à data da sua prolação.
Assim, cumpre destrinçar, antes de mais, quais os pressupostos de facto que deverão estar preenchidos no caso sub judice, isto é, quais os pressupostos de facto cuja verificação legitima a atuação do Réu, aqui Recorrente, no sentido de declarar nulo a decisão de concessão de subsídio de desemprego.
Por força do artigo 60º, nº. 1º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, que estabelece o regime jurídico de proteção social da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, “As prestações de desemprego não são acumuláveis com: a) Prestações compensatórias da perda de remuneração de trabalho; b) Pensões atribuídas pelos regimes do sistema de segurança social ou de outro sistema de protecção social de inscrição obrigatória incluindo o da função pública e regimes estrangeiros; c) Prestações de pré-reforma e outras atribuições pecuniárias, regulares, normalmente designadas por rendas, pagas pelo empregador aos trabalhadores por motivo da cessação do contrato de trabalho”.
De outra banda, estabelece o artigo 78.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, diploma que aprovou as Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, que os atos administrativos de atribuição de direitos ou de reconhecimento de situações jurídicas são nulos quando se baseiam em (i) informações falsas, (ii) prestadas dolosamente ou (iii) com má-fé pelos beneficiários.
Assim, flui das normas legais transcritas que os pressupostos de facto com que nos debatemos radicam na impossibilidade de acumulação das prestações de desemprego com quaisquer outras pensões atribuídas com outro sistema de proteção social, incluindo os estrangeiros, bem como as prestações de reforma.
No caso concreto, atentando na factualidade que se considerou como provada, impera assumir que resulta cristalino que, quando foi concedido subsídio de desemprego ao Recorrido, já este se encontrava a receber uma pensão de pré-reforma proveniente de França, que auferia desde maio de 2009, condição que declarou “expressamente não existir” no pedido de concessão de subsídio de desemprego formulado junto do Recorrente em 16.07.2010.
Quer isto tanto significar que o ato de concessão ao Recorrido do subsídio de desemprego foi ilegal, por contrariar o disposto no nº.1 do art. 60º Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, que proíbe a acumulação com a pensão de pré-aposentação recebida pelo mesmo.
A questão que se coloca é a de saber se o tecido factual supra evidenciado é suficiente para despoletar a estatuição jurídica assumida pela Recorrente no ato impugnado – nulidade da decisão de concessão do subsídio de desemprego [e consequente ordem de restituição das prestações indevidamente recebidas].
No aresto de 10.12.2012, tirado no processo nº. 600/07.3BEPRT, consultável em www.dgsi.pt, este Tribunal Central Administrativo Norte foi chamado apreciar a questão de saber se, no âmbito de um requerimento com vista à atribuição do subsídio de desemprego, a omissão de preenchimento de campos indicativos [ou não] da qualidade de aposentado, consubstanciava [ou não] a prestação de falsas declarações por parte do beneficiário.
Considerou-se, nesse aresto, que:” (…)
Presentes estas notas de enquadramento em matéria do regime geral de invalidade dos atos administrativos importa, então, analisar o regime específico/especial previsto para os atos administrativos de atribuição de direitos ou de reconhecimento de situações jurídicas no quadro da proteção concedida no âmbito do subsistema de solidariedade social decorrente do citado art. 78.º da Lei n.º 04/07, na certeza de que se mostra consensual, incluindo nos autos, o entendimento de que não é admissível a acumulação de pensões (mormente, de aposentação) com subsídio de desemprego [cfr., para além do disposto nos normativos referidos supra neste ponto 3.2.3) § II), ainda, entre outros, os Acs. STA de 13.02.2001 - Proc. n.º 46769, de 19.02.2002 - Proc. n.º 048399, de 11.05.2004 - Proc. n.º 01533/03, de 29.05.2008 - Proc. n.º 0779/07, de 28.10.2009 - Proc. n.º 0535/09 in: «www.dgsi.pt/jsta»] .
(…)
XXII. É que, desde logo, temos que do normativo em questão não deriva, nem é do mesmo possível extrair, uma qualquer presunção de atuação/omissão dolosa ou de má fé por parte dos beneficiários, mormente, em situações de pura e simples omissão de preenchimento de campos dum determinado impresso, termos em que se impõe à Administração a recolha de elementos e o apuramento de factos que corporizem ou preencham a previsão do preceito de molde a legítima e legalmente emitir ato com tal conteúdo declaratório da nulidade com extração das respetivas consequências.
XXIII. Na verdade, não se descortina como do simples não preenchimento de campo de determinado impresso por parte dum requerente e que deu entrada do mesmo requerimento no serviço competente sem que este, através dos seus funcionários ou agentes, o confira devidamente alertando e/ou advertindo para o suprimento de tal omissão se possa, sem mais, concluir no caso pela atuação dolosa ou de má fé por parte daquele requerente.
XXIV. Tal concreta omissão de preenchimento poderá ser gerada ou causada por intenção dolosa e deliberada mas também poderá derivar de conduta meramente negligente (seja ela consciente ou inconsciente), pelo que, sem apuramento e prova do quadro circunstancial, não poderá o R. avançar para a emissão de ato como o aqui impugnado por não dotado do suficiente lastro factual e jurídico.
XXV. Não se nos afigura aceitável que tendo a Administração omitido também seus deveres de controlo (prévios e/ou “a posteriori”) e de análise quanto à pretensão que lhe foi dirigida, dispondo a mesma, aliás, de meios de cruzamento de informação e de dados que lhe permitiam e permitem detetar erros (voluntários ou involuntários dos interessados requerentes) e, assim, desatender pretensões ilegais, se possa escudar numa “falha” do administrado, imputá-la e qualificá-la sem mais como dolosa ou de má fé, para daí se prevalecer do regime inserto no art. 78.º da Lei n.º 04/07. A Administração não poderá descurar seus deveres instrutórios e de pronúncia, nem alijar suas responsabilidades, presumindo atuações ou condutas dolosas e de má fé por parte dos administrados prevalecendo-se de meros erros ou lapsos negligentes destes.
XXVI. Tal preceito exige para o operar do desvalor da nulidade, enquanto regime especial introduzido em matéria de invalidade daquele ato administrativo, que o requerente/beneficiário haja atuado com conhecimento e vontade de prestar falsas informações aos serviços da Segurança Social.
XXVII. Dessa forma temos que sem que se mostre apurado tal quadro circunstancial e motivacional não resulta preenchida a previsão do preceito em referência pelo que falhando a mesma o desvalor que no caso derivaria da ilegalidade será o da mera anulabilidade (art. 135.º do CPA) e como tal sujeita aos pressupostos e prazos de revogação decorrentes dos arts. 141.º a 147.º do CPA.
(…)”.
É, portanto, legítimo concluir, que a mera omissão ou a mera inação do beneficiário em questão no preenchimento de documento/impresso não é compatível com a aquisição de uma atuação/omissão dolosa ou de má fé por parte daquele.
Esse, porém, não é o quadro em que nos movemos nos presentes autos.
Na verdade, e conforme dimana expressivamente do probatório coligido nos autos, o Recorrido não omitiu o preenchimento de qualquer campo, antes declarou falsamente ao responder “Não” às questões “Está abrangido por outro sistema protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro?’’ e “É pensionista de outro sistema de protecção social obrigatório, nacional ou estrangeiro?”.
Como bem salienta o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Superior no seu parecer “(…) O requerente ao preencher o respectivo requerimento sabia que tinha de responder correctamente a todos os campos, pois é através da informação por ele prestada que o Instituto da Segurança Social tomará uma decisão fundamentada sobre a pretensão requerida. Ao responder “Não” à matéria supra referida e constante do ponto 3 do probatório, o requerente declarou falsamente uma informação que bem sabia ser decisiva para a atribuição do subsídio de desemprego (…)”.
Efetivamente, o Recorrido não podia ignorar que se encontrava a auferir uma pensão de aposentação proveniente da França, pelo que, ao declarar nos termos que constam do ponto 3 do probatório, fê-lo perfeitamente ciente da falsidade do que estava a asseverar.
Ora, atua com má-fé aquele que, no âmbito do preenchimento de um formulário de pedido de concessão de subsídio de desemprego junto do Instituto de Segurança Social, nega expressamente factos que sabe serem verdadeiros, ou que não se possa ignorar, com direta repercussão na decisão de deferimento da visada prestação social de desemprego.
O que serve para concluir que o Recorrido prestou declarações falsas com má-fé no âmbito da atribuição do subsídio de desemprego, sendo que a tal não obsta a circunstância do beneficiário ter assumido posteriormente um comportamento colaborante e sem ocultação da “verdade” quando confrontado com a questão por parte da Segurança Social, por ser posterior à prática das apontadas falsas declarações.
Nesta esteira, e sopesando o disposto no artigo 78º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, é nosso entendimento que o ato que concedeu o subsídio de desemprego ao Recorrido está ferido de nulidade, pois que o visado preceito legal introduziu um caso especial de nulidade ao elenco que consta no artigo 133º do C.P.A. [neste sentido, vd. aresto deste T.C.A.N. de 02.07.2015, tirado no processo nº. 01543/10.3BEPRT, disponível em www.dgsi.pt].
Pelo que se mostra perfeitamente legitimada a atuação da Recorrente aposta no ato administrativo proferido em 26.04.2013, traduzida na declaração de nulidade da decisão de concessão de subsídio de desemprego.
O mesmo se pode dizer no que tange à consequente ordem de reposição das prestações indevidamente recebidas.
Na verdade, o ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos [art. 134º do CPA aprovado pelo D.L. nº. 442/91, aplicável à data dos factos em discussão] e a declaração de nulidade tem efeitos retroativos [artigos 286 e 289º do CC], o que, por consequência, implica a restituição de todas as prestações recebidas.
Concludentemente, procede o erro de julgamento de direito imputado à sentença recorrida no domínio em análise.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, e, em conformidade, revogada a sentença recorrida e julgada improcedente a presente ação administrativa especial.
Ao que se provirá em sede de dispositivo.
***
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em conceder provimento ao recurso jurisdicional “sub judice”, revogar a sentença recorrida e julgar totalmente improcedente a presente ação administrativa especial.
Custas a cargo do Recorrido, ficando esta, porém, exonerado do pagamento da taxa de justiça que seria devida pelo impulso processual nesta instância de recurso, por não ter contra-alegado.
Registe e Notifique-se.
Porto, 15 de fevereiro de 2019,
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco