Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02612/17.4BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/29/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Canelas
Descritores:PRAZO DE IMPUGNAÇÃO; TERMO INICIAL; NOTIFICAÇÃO; MANDATÁRIO
Sumário:
I – A respeito do início dos prazos de impugnação de atos administrativos dispõe o nº 2 do artigo 59º do CPTA (na versão decorrente da revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015) que “…o prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efetuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação, mesmo que obrigatória”.
II – Se o ato impugnado na ação foi notificado à mandatária dos autores, enquanto tal constituída no procedimento administrativo, em momento posterior àquele em que os autores foram dele notificados, é por referência à data em que se verificou a última das notificações que deve ser contado, nos termos do disposto no artigo 59º nº 2 do CPTA, o prazo legal de três meses previsto no artigo 58º nº 1 alínea b) do mesmo CPTA, para a instauração da ação administrativa destinada à impugnação do ato. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:JCGO
Recorrido 1:Município P…
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso merecer provimento
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
JCGO e MFCGO (devidamente identificados nos autos) instauraram em 14/11/2017, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ação administrativa em que é réu o Município P…, na qual visaram a impugnação do ato administrativo que determinou a resolução do arrendamento apoiado referente ao identificado fogo habitacional e respetiva desocupação.
Em sede de despacho-saneador proferido em 16/05/2018 a Mmª Juíza do Tribunal a quo absolveu o réu da instância com fundamento na verificação da intempestividade do direito à instauração da ação.
Inconformados os autores interpuseram o pressente recurso de apelação, pugnando pela revogação daquela decisão, com prosseguimento dos autos para conhecimento do mérito da ação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:
A) Apesar de os AA. terem sido notificados em 10-08-2017, com data de 11-08-2017 recebida a 17-08-2017, foi a aqui Mandatária subscritora notificada da decisão final de resolução do contrato de arrendamento do qual é arrendatário o aqui Autor JCGO, conforme Doc n.º 1 que a aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido.
B) Este documento faz parte do processo administrativo da resolução do contrato de arrendamento e que deveria ter sido junto aos autos, nos termos do Art. 8.º, n.º 3 do CPTA: “As entidades administrativas têm o dever de remeter ao tribunal, em tempo oportuno, o processo administrativo e demais documentos respeitantes à matéria do litígio, bem como o dever de dar conhecimento, ao longo do processo, de superveniências resultantes da sua actuação, para que a c existência seja comunicada aos demais intervenientes processuais”.
C) Nos termos do Art. 59.º, n.º 2 do CPA, o prazo para a impugnação só corre a partir data de notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento.
D) Conforme se pode ver do Doc. n.º 1 que aqui se juntou, a aqui Mandatária subscritora foi notificada da decisão de resolução do arrendamento da casa arrendada aos aqui AA. em 17-08-2017, pelo que a considerar o prazo de 3 meses e, tendo ainda em consideração o Art. 279.º, alínea b) do Código Civil, o prazo para a impugnação terminaria em 18-11-2017, dia da semana – sábado.
E) Pelo que a impugnação judicial foi apresentada atempadamente.
SEM PRESCINDIR:
F) O prazo contado na aliás Douta sentença encontra-se errado, uma vez que tendo sido notificados a 10-08-2017, o prazo para os AA. sempre se iniciaria a 11-08-2017, uma vez que nos termos do Artº. 279.º, alínea b) do Código Civil, o dia da notificação não se inclui na contagem do prazo, sendo a partir daquele que o mesmo se inicia.
G) Sendo que o decurso dos 3 meses sempre terminariam a 13-11-2017 e nunca a 10- 11-2017.
H) Ora o prazo de caducidade importa um verdadeiro prazo peremptório de exercício de direito.
I) A contagem do prazo previsto no Art. 58.º do CPTA não impede que se possa fazer apelo à norma prevista para o incumprimento dos prazos judiciais.
J) Nos termos do Art. 139.º do CPC e no n.º 1 daquele preceito, o prazo é dilatório ou peremptório, sendo que no n.º 5 daquele artigo, independentemente do justo impedimento, o ato pode ser praticado nos 3 dias úteis seguintes ao prazo, ficando a sua validade dependente de pagamento imediato de uma multa, que se encontra fixada nas alíneas daquele número daquele preceito.
K) Ora referindo-se o Art. 1.º do CPTA que supletivamente e com as necessárias adaptações se aplica a lei do processo civil e, sendo omisso o CPTA quanto a este aspecto, entende-se por aplicável o disposto processualmente no 139.º n.º 5 do CPC.
L) Não tendo liquidado a respectiva multa, a considerar que o termo do prazo seria a 13-11-2017 e, tendo sido este praticado no dia 14-11-2017, deveria a aqui Mandatária subscritora ter sido notificada independentemente de despacho, para vir liquidar a multa acrescida da respectiva penalização.
M) Pelo que, no entender dos ora Recorrentes, a decisão sobre a intempestividade da acção, no seu entender ao proceder como procedeu o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” não tenha feito boa ponderação e aplicação do Direito, situação em que legitima a interposição do presente Recurso.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Remetidos os autos a este Tribunal em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de o recurso merecer provimento, devendo ser revogada a decisão recorrida, ordenando-se a baixa dos autos para prosseguimento e decisão sobre o mérito da causa, nos seguintes termos, que se passam a transcrever:
«JCGO e MFGO vêm interpor recurso da sentença que julgou verificada a intempestividade do direito à instauração da acção, absolvendo o réu CMP….
No probatório, a sentença considerou que os AA. foram notificados em 10.8.2017.
No entanto, analisando a cópia documentos juntos com o recurso, verifica-se que a notificação foi remetida para a mandatária dos autores em 16/08/2017 e recepcionada em 17/08/2017.
Acresce que seria estranho aceitar como data da notificação da decisão o dia 10/08/2017, quando no rosto do próprio ofício se menciona a data de 11/08/2017.
Assim, houve erro de julgamento quanto à matéria de facto, que deverá ser corrigida, o que conduzirá à tempestividade da propositura da acção.
Pelo exposto, deverá ser revogada o despacho saneador-sentença, ordenando-se a baixa dos autos para prosseguimento e decisão sobre o mérito da causa.»
Sendo que dele notificadas as partes, nenhuma se apresentou a responder.
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Após redistribuição (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram os autos submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pelos recorrentes as conclusões de recurso, a questão essencial a decidir é a de saber se o Tribunal a quo ao decidir pela intempestividade da propositura da ação, incorreu em erro de julgamento.
III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
Com relevância para o conhecimento da exceção de intempestividade da instauração da ação o Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida, expressis verbis no despacho-saneador objeto do presente recurso:
1. Em 1.8.2017 foi emitido despacho pelo Presidente do Conselho de Administração da DomusSocial, EMP contendo decisão de resolução do arrendamento apoiado correspondente à casa 1x, da entrada 6x, bloco 1x, da Rua P…, F…. - cfr. doc. de fls. 293 e ss. do p.a..
2. Os AA. foram notificados em 10.8.2017. – cfr. doc. de fls. 288-verso do p.a.
3. A presente ação foi remetida a este Tribunal em 14.11.2017. – cfr. doc. de fls.3 dos autos.
B – De direito
1. Da decisão recorrida
O Tribunal a quo, julgando verificada, em sede de despacho-saneador, a exceção dilatória de intempestividade da ação, absolveu em consequência o réu da instância.
Decisão que tendo por base a matéria de facto que ali foi considerada, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«A Entidade Demandada pugnou pela intempestividade da instauração da ação nos termos do art. 89.º, n.º 1, al. k) do CPTA.
Em primeiro lugar, refira-se que a lei processual aplicável para aferir da tempestividade da instauração dos presentes autos será a vigente à data da prática do ato impugnado, ou seja, no caso dos autos o Código de Processo nos Tribunais Administrativos na versão do Decreto-Lei n.º 215-G/2015.
Assim, dispõe o art. 58.º do CPTA que,
1 – Salvo disposição em contrário, a impugnação de atos nulos o não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de:
[…]
b) Três meses, nos restantes casos.
2 – Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil.
[…]
Em primeiro lugar, este prazo de 3 meses previsto no n.º 1, al. b) do art. 58.º conta-se a partir da notificação ao interessado nos termos do art. 59.º, n.º 2 do CPTA, ou seja, os prazos são contínuos e não se suspendem em férias.
Em segundo lugar, é sabido que os prazos para instauração de ação, designadamente os previstos no art. 58.º do CPTA, são de natureza substantiva e não adjetiva, conforme, desde logo, resulta do n.º 2 do art. 58.º que os manda contar de acordo com as regras constantes do art. 279.º do C.C., sendo que esta natureza não judicial do prazo de propositura da ação se justifica por, aquando da interposição, não haver, ainda, qualquer processo judicial em curso,
Neste contexto, porque estamos perante um prazo de caducidade, cujo decurso faz extinguir o direito a demandar, e não perante um prazo estabelecido para a prática de um ato inserido num processo judicial pendente, não tem aplicação o disposto nos nºs. 5 e 6 do art. 139º do CPC.
Em terceiro lugar, importa notar que não foram invocados na sua petição inicial quaisquer vícios que determinassem a nulidade do ato, designadamente nos termos previstos no art. 161.º do CPA.
Com efeito, vem alegada a caducidade do direito à resolução, o erro nos pressupostos, a violação do princípio da proporcionalidade, vícios que nos termos do art. 163.º do CPA geram a mera anulabilidade do ato e relativamente aos quais, a sua invocação pelos AA., e consequente dever de apreciação pelo Tribunal, apenas poderia ser feita mediante o cumprimento do prazo previsto na al. b) do n.º 1 do art. 58.º do CPTA.
Mas também não se pode considerar que a alegada violação do direito à habitação ofenda o conteúdo essencial do direito fundamental, suscetível de gerar a nulidade do ato (art. 161.º, n.º 2 al d) do CPA). Com efeito, o direito à habitação, enquanto direito a ter uma morada decente ou condigna (65.º da CRP), assume essencialmente uma dimensão social de “um direito a prestações, de conteúdo não determinável ao nível das opções constitucionais, a pressupor, antes, uma tarefa de concretização e de mediação do legislador ordinário, cuja efetividade está dependente da reserva do possível, em termos políticos, económicos e sociais”. Ou seja, o direito à habitação, enquanto direito fundamental de natureza social, “pressupõe a mediação do legislador ordinário destinada a concretizar o respetivo conteúdo” (Acórdão do TC n.º 829/96), dele não se retirando um “direito imediato a uma prestação efetiva” (Acórdão do TC n.º 280/93). Nestes termos, sendo a habitação social, em si mesma, “um bem escasso e que visa acudir à satisfação das necessidades básicas da população mais carenciada, pelo que, a ocupação da mesma deve ser atribuída após uma ponderação concreta das necessidades dos indivíduos e famílias elegíveis para o efeito, de modo a que se possa equilibradamente proceder a uma distribuição correta das habitações existentes” (cfr. Acórdão do TCAN, de 01.02.2007, P. 01321/04.9BEPRT), como se conclui no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 29.03.2006, P. 01203/05, “o direito à habitação, assegurado pelo art. 65.º da CRP, é um direito da generalidade dos cidadãos, que não é necessariamente afectado quando é retirado a determinado agregado familiar o direito a ocupar uma habitação social”.
Estando, assim, imputados ao ato apenas vícios determinantes da mera anulabilidade, então o prazo de reação contenciosa contra o ato administrativo é o previsto no art. 58.º, n.º 1, al. b) do CPTA, contado nos termos dos arts. 58.º, n.º 2 e 59.º do CPTA, ou seja, 3 meses após a notificação e continuamente, não se suspendendo nas férias judiciais.
Ora, vem demonstrado que os AA. foram notificados em 10.8.2017, pelo que o prazo para impugnação judicial do ato terminou em 10.11.2017.
Como resulta do probatório a ação foi instaurada em 14.11.2017, encontrando-se pois esgotado o prazo de que os AA. dispunham para reagir contenciosamente do mesmo.
Cumpre deste modo concluir ter-se por verificada a intempestividade da ação.»
2. Da tese dos recorrentes
Pugnam os recorrentes pela revogação da decisão recorrida sustentando, em primeira linham que nos termos do artigo 59º nº 2 do CPTA, o prazo para a impugnação só corre a partir data de notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento; que no caso, se bem que os autores tenham sido notificados em 10/08/2017 a sua mandatária foi notificada da decisão final de resolução do contrato de arrendamento em 17/08/2017, como decorre do Doc. n.º 1 que juntam com as alegações de recurso; pelo que a considerar o prazo de 3 meses e, tendo ainda em consideração o artigo 279º alínea b) do Código Civil, o prazo para a impugnação terminaria em 18/11/2017, um sábado, pelo que a impugnação judicial foi apresentada atempadamente – (vide conclusões A) a E) das alegações de recurso).
Invocam ainda, subsidiariamente, que foi erradamente contado o prazo na decisão recorrida uma vez que tendo sido os autores notificados a 10/08/2017, o prazo sempre se iniciaria a 11/08/2017, nos termos do artigo 279º alínea b) do Código Civil, e o decurso dos 3 meses sempre terminaria a 13/11/2017 e nunca a 10/11/2017, defendendo que a contagem do prazo previsto no artigo 58º do CPTA não impede que se possa fazer apelo à norma prevista no artigo 139º nº 5 do CPC para o incumprimento dos prazos judiciais, nos termos da qual independentemente do justo impedimento, o ato pode ser praticado nos 3 dias úteis seguintes ao prazo, ficando a sua validade dependente de pagamento imediato de uma multa, que se encontra fixada nas alíneas daquele número daquele preceito, que entende ser aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA; e que não tendo liquidado a respetiva multa, a considerar que o termo do prazo seria a 13/11/2017 e, tendo sido este praticado no dia 14/11/2017, deveria a Mandatária dos autores ter sido notificada independentemente de despacho, para vir liquidar a multa acrescida da respetiva penalização – (vide conclusões F) a M) das alegações de recurso).
3. Da análise e apreciação do recurso
3.1 Comece por dizer-se que na situação presente nada obsta à junção aos autos do Doc. 1 que recorrentes juntaram com as suas alegações de recurso, à luz do disposto no artigo 651º nº 1 do CPC novo (Lei nº 41/2013), aplicável aos tribunais administrativos ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, e aqui temporalmente aplicável (em face da data em que a ação foi instaurada), nos termos do qual as partes podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
Ressuma deste normativo que a junção da prova documental deve ocorrer na 1ª instância, já que os documentos se hão-de destinar a demonstrar factos cuja verificação o Tribunal é chamado a aferir no respetivo julgamento. De modo que apenas será legítimo às partes juntarem documentos com as respetivas alegações de recurso quando a sua apresentação não tenha sido possível em momento oportuno na 1ª instância. Impossibilidade que poderá decorrer quer da superveniência objetiva do documento quer da sua superveniência subjetiva (conhecimento).
3.2 Mas também será legítima a apresentação de documentos com as alegações quando a sua apresentação se revele necessária por virtude da decisão proferida - (vide a este respeito, António Santos Abrantes Geraldes, in, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2ª Edição, pág. 189-190).
E os recorrentes pretendem, através de tal documento, comprovar que a sua mandatária, como tal constituída no procedimento administrativo, foi notificada do ato colocado em crise em 17/08/2017, do que fazem decorrer a tempestividade da instauração da ação sustentando que por referência a tal data, o prazo de três (3) meses para a instauração da ação só terminaria em 17/11/2017, nos termos do disposto no artigo 59º nº 2 do CPTA.
3.3 E simultaneamente importa proceder, nos termos do disposto no artigo 662º nº 1 do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, ao aditamento daquela factualidade, que o Doc. nº 1 junto com as alegações de recurso revela e demonstra, o qual se mostra relevante para a decisão da questão trazida em recurso.
3.4 Com efeito, a respeito do início dos prazos de impugnação de atos administrativos dispõe o nº 2 do artigo 59º do CPTA (na versão decorrente da revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, aqui temporalmente aplicável) que “…o prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efetuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação, mesmo que obrigatória” (sublinhado nosso).
3.5 Pelo que a circunstância de a mandatária dos autores ter sido notificada do ato administrativo objeto de impugnação na ação em momento posterior àquele em que ocorreu a notificação aos próprios autores é pertinente e relevante, à luz do quadro normativo convocado, para a decisão sobre a questão de saber se a ação administrativa foi ou não instaurada dentro do prazo legal de três, tendo por referência aquela notificação.
Assim, e ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 1 do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, adita-se à factualidade dada como provada o seguinte:
«4. Através de ofício datado de 11/08/2017, remetido por correio registado com aviso de receção à mandatária dos autores, e por ela rececionado em 17/08/2017 (cfr. data e assinatura aposta no respetivo aviso de receção), foi-lhe notificada, na qualidade de mandatária dos autores, a decisão final de resolução do contrato de arrendamento apoiado. – cfr. Doc. nº 1 junto com fls. 139 ss.-SITAF»
3.6 Vejamos agora, perante a globalidade do quadro factual agora assim considerado, se ao decidir pela absolvição do réu da instância com fundamento em intempestividade da instauração da ação, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento nos termos apontados pelos recorrentes.
3.7 A respeito dos prazos de impugnação de atos administrativos dispõe o artigo 58º do CPTA (na versão decorrente da revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, aqui temporalmente aplicável) o seguinte:
“Artigo 58º
Prazos
1 - Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de:
a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público;
b) Três meses, nos restantes casos.
2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil.
3 - A impugnação é admitida, para além do prazo previsto na alínea b) do n.º 1:
a) Nas situações em que ocorra justo impedimento, nos termos previstos na lei processual civil;
b) No prazo de três meses, contado da data da cessação do erro, quando se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração ter induzido o interessado em erro; ou
c) Quando, não tendo ainda decorrido um ano sobre a data da prática do ato ou da sua publicação, quando obrigatória, o atraso deva ser considerado desculpável, atendendo à ambiguidade do quadro normativo aplicável ou às dificuldades que, no caso concreto, se colocavam quanto à identificação do ato impugnável, ou à sua qualificação como ato administrativo ou como norma.
4 - [Revogado].”
3.8 Só os atos nulos não estão, assim, sujeitos a prazo de impugnação, sendo a nulidade invocável a todo o tempo por qualquer interessado e podendo ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal (cfr. artigo 162º nº 2 do CPA novo – DL. nº 4/2015).
3.9 O Tribunal a quo considerou que não foram invocados na sua petição inicial quaisquer vícios que determinassem a nulidade do ato, designadamente nos termos previstos no art. 161.º do CPA.
O que conduziu, em face da preclusão do prazo de três meses previstos no artigo 58º nº 1 alínea b) do CPTA decorrido entre o momento da notificação daquele ato aos autores (em 10/08/2017) e o da instauração da ação (em 14/11/2017), ao julgamento de verificação da intempestividade da instauração da ação.
3.10 Não vem posto em causa no presente recurso o entendimento feito pelo Tribunal a quo de que os vícios assacados ao ato impugnado serão apenas, a ocorrerem, fundamento para a sua anulabilidade e não causa de nulidade, designadamente nos termos previstos no artigo 161º do CPA.
Significando, assim, que a instauração da ação visando a impugnação do ato que determinou a resolução do contrato de arrendamento apoiado se encontrava sujeita ao prazo de três meses previsto no artigo 58º nº 1 alínea b) do CPTA.
3.11 A respeito do início dos prazos de impugnação de atos administrativos dispõe o nº 2 do artigo 59º do CPTA (na versão decorrente da revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, aqui temporalmente aplicável) que “…o prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efetuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação, mesmo que obrigatória”.
3.12 No caso presente resulta que os autores foram notificados decisão de resolução do arrendamento apoiado em 10/08/2017. E foi por referência à data em que ocorreu tal notificação que o Tribunal a quo procedeu à contagem do prazo de 3 meses para a instauração da ação.
Porém, resulta nos autos que para além da notificação dirigida aos autores também foi expedido ofício de notificação, datado de 11/08/2017, dirigido à mandatária dos autores. Ofício que foi por ela rececionado em 17/08/2017. Dando-se, assim, aliás, cumprimento ao disposto no artigo 111º nº 1 do CPA novo (DL. nº 4/2015) a respeito das notificações aos mandatários constituídos no âmbito do procedimento administrativo.
3.13 Ora, se o ato impugnado na ação foi notificado à mandatária dos autores, enquanto tal constituída no procedimento administrativo, em momento posterior àquele em que os autores foram dele notificados, é por referência à data em que se verificou a última das notificações que deve ser contado, nos termos do disposto no artigo 59º nº 2 do CPTA, o prazo legal de três meses previsto, no artigo 58º nº 1 alínea b) do mesmo CPTA, para a instauração da ação administrativa destinada à impugnação do ato.
3.14 Tendo a mandatária dos autores sido notificada do ato impugnado em 17/08/2017, o prazo de três meses previsto no artigo 58º nº 1 alínea b) do mesmo CPTA para a instauração da ação administrativa destinada à impugnação do ato iniciou-se no dia seguinte, isto é, em 18/08/2017, em conformidade com o artigo 279º alínea b) do Código Civil, de acordo com o qual “…na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr”, e terminou em 18/11/2017, em conformidade com o artigo 279º alínea c) do Código Civil, de acordo com o qual “…o prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data”.
3.15 A ação foi instaurada em 14/11/2017. Foi-o, pois, dentro do prazo legal de três meses a que se encontrava submetida, contado da data em que a mandatária dos autores foi notificada do ato impugnado.
E se assim é, não pode manter-se a decisão de absolvição do réu da instância com fundamento em intempestividade da ação, que não se verifica.
3.16 Merece, pois, provimento o recurso, pelos fundamentos supra, devendo a decisão recorrida ser revogada, baixando os autos à 1ª instância para que aí prossigam os seus termos, se a tanto nada mais obstar.
O que se decide.
Ficando, concomitantemente prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos do recurso, aliás invocados a título subsidiário.
***
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, e ordenando a baixa dos autos à 1ª instância para aí prosseguirem os seus termos, se a tanto nada mais obstar.
Custas nesta instância pelo recorrido - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
Notifique.
D.N.
Porto, 29 de março de 2019
Ass. Helena Canelas
Ass. Isabel Costa
Ass. João Beato