Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01578/17.5BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/12/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL; ARTIGO 5º/4 DO DL 59/2015, DE 21 DE ABRIL
Sumário:
I-O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt, através de modelo aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do emprego e da segurança social;
I.1-no caso posto a Autora não conseguiu provar que o requerimento em causa foi entregue materialmente em qualquer dos serviços do Réu nem enviado para o endereço em www.seg-social.pt, ou seja, que o requerimento foi apresentado nos termos impostos pelo artº 5º/4 do DL 59/2015, de 21/4.
II-O Tribunal a quo considerou, e bem, que a aqui Recorrente apresentou junto dos serviços competentes do Fundo de Garantia Salarial, requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, ao abrigo do regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial;
II.1-por despacho do Presidente do Conselho de Gestão do FGS, o seu requerimento foi indeferido, e corretamente, porquanto o mesmo não preenchia o requisito imposto pelo n° 8 do art° 2° do DL 59/2015, de 21 de abril, uma vez que não havia sido apresentado no prazo de 1 ano aí estabelecido;
II.2-é que, como resulta do probatório, o contrato de trabalho da ora Apelante terminou no dia 22/05/2015 e o requerimento foi apresentado junto do FGS no dia 24/01/2017, isto é, quando já tinha decorrido mais de 1 ano desde a cessação do contrato de trabalho, tal como estatui o novo regime jurídico previsto no DL 59/2015, à luz do qual o requerimento foi apreciado por ser o diploma então em vigor. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MAVVS
Recorrido 1:Fundo de Garantia Salarial, I.P
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
MAVVS, residente na Rua H…., Vilar de Andorinho, Vila nova de Gaia, instaurou acção administrativa contra o Fundo de Garantia Salarial, I.P., sito na Rua António Patrício, 262, Porto, pedindo a anulação do despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Réu, datado de 11/04/2017, que lhe indeferiu o requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, e a condenação deste no pagamento da soma de € 9,090,00.
Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção.
Desta vem interposto recurso.
*
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
I. Objecto do recurso:
A Recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo M.º Juiz “a quo”, que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo o Réu do pedido, porquanto entende que, deste modo, salvo o devido e muito respeito, o Tribunal recorrido:
A) Incorre no vício de erro de julgamento e nulidade da sentença proferida;
II. A sentença recorrida decidiu “inexistir necessidade de produção de prova adicional, pois os autos estão dotados de todos os elementos necessários para que seja proferida uma decisão conscienciosa sobre o mérito dos autos”, preterindo a produção de prova testemunhal.
III. A inquirição das testemunhas oferecidas pela Recorrente impunha-se porquanto as mesmas permitiriam demonstrar se foi ou não enviado o requerimento de pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, bem como quando é que o mesmo foi enviado, porque meio, e, bem assim, se o mesmo chegou ao destino pelo meio que foi remetido.
IV. À Recorrente competia demonstrar que procedeu ao envio atempado do requerimento ao Recorrido, pelo que carreou para o processo administrativo e, mais tarde, para os presentes autos, todos os documentos que detinha e que lhe permitiam comprovar o envio do requerimento.
V. Para tal remeteu a A., os seguintes documentos: o relatório da impressora do escritório do seu mandatário, que dá conta do envio de três emails, pelas 17:43, 17:52 e 17:58 para o endereço igfss-dgf@seg-social.pt; informação da empresa que vende e faz a manutenção da impressora do escritório do mandatário da A. a atestar que se “Estado de Ficheiros Digitalizados” aparece como “Concluído” é porque o ficheiro foi sem dúvida enviado para o endereço de email aposto; o relatório da impressora do escritório do seu mandatário, que descreve a tentativa de envio de cinco fax para o IGFSS sem sucesso no dia 23/05/2016.
VI. A R. recebeu um dos três requerimentos enviados pelo mandatário da A. (que representava três ex-trabalhadores da empresa insolvente) uma vez que esta tramitou e decidiu o pedido de JS; a A. nunca contestou a titularidade do endereço de email ou número de fax.
VII. Deste modo, e ainda que se entendesse que a prova documental deixava margem para dúvidas, sempre poderia a produção de prova testemunhal lograr demonstrar ou não os factos alegados.
VIII. Preterindo, nestas condições, a prova testemunhal incorreu, o tribunal “a quo”, salvo melhor opinião, em erro de julgamento quando preteriu a produção de prova testemunhal.
IX. O que implicará, salvo o devido e muito respeito, que os autos não forneçam os elementos probatórios necessários para a apreciação da causa, e, consequentemente para a reapreciação da matéria de facto.
X. Bem como, salvo melhor opinião, cometeu uma nulidade insanável ao não determinar a produção da prova requerida pela A., sem justificar a preterição dessa formalidade.
B) Do incorrecto julgamento da matéria de facto;
XI. A A. demonstra pelos documentos juntos aos autos que remeteu o referido requerimento, por diversos meios, no dia 23/06/2015, nomeadamente três emails e cinco fax para o endereço de email e número de fax, respectivamente, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., que gere o Fundo de Garantia Salarial, aqui Recorrido.
XII. O Recorrido nunca contestou a titularidade do endereço de email nem do número de fax.
XIII. Deste modo, recebe e aceita o requerimento entregue pela Recorrente a 24/01/2017 como 2.ª via do requerimento do pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho (cfr. doc. n.º 8 da petição inicial).
XIV. A Recorrente tem um comprovativo de remessa do email no dia 23/05/2016 e uma declaração da empresa que faz manutenção ao hardware e software da multifunções do mandatário da A., que não foi contestada pelo Réu/Recorrido, a atestar que esse comprovativo faz prova do envio do documento.
XV. Aliás, salvo melhor entendimento, não tendo a R. impugnado ou alegado a falsidade do documento, o mesmo faz prova plena dos factos que atesta, ou seja, o envio dos emails.
XVI. Deste modo, deveria a sentença de que se recorre ter dado como provado que a A./Recorrente remeteu a 23/05/2016, por email, requerimento de pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ao Réu/Recorrido.
XVII. De igual modo, atento o acima exposto, teria ainda de ser alterada a matéria de facto dada como provada, nos seguintes termos:
B) Em 23 de Maio de 2016, foram remetidas, entre outros, três mensagens de correio electrónico para o endereço igfssdgf@seg-social.pt;
F) Em 24/01/2017, a A. apresentou nos serviços do R. 2.ª via do requerimento no qual peticiona o pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho no valor global de € 9.090,00;
C) Da incorrecta aplicação do Direito e interpretação e aplicação das normas que constituem fundamento jurídico da decisão.
XVIII. A sentença do tribunal “a quo” conclui que mesmo que a Recorrente lograsse demonstrar que enviou o referido requerimento por email atempadamente, sempre a pretensão da Autora não procederia, pois não constitui meio idóneo para apresentação do mesmo nos termos que constam do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril.
XIX. Ora, o requerimento foi enviado em modelo aprovado para o efeito, tendo sido remetido por email, na impossibilidade de se lograr enviar com sucesso por fax.
XX. Foi o email remetido para o instituto da segurança social que gere o fundo de garantia salarial.
XXI. O DL 59/2015 (NRFGS), de 21 de Abril determina que o requerimento deve ser apresentado em qualquer serviço da segurança social, não determinando, salvo melhor opinião, o modo como o requerimento deve chegar ao serviço da segurança social.
XXII. Ora, temos necessariamente de discordar da sentença do tribunal “a quo”, e embora não desconsiderando o facto do NRFGS assumir natureza de “lei especial” em relação ao diploma de 1999, supra citado, o facto é que o disposto no novo regime não colide com o DL 135/99, de 22 de Abril, na medida em que o DL 59/2015, de 21 de Abril, não determina o modo como se pode fazer chegar o requerimento aos serviços da segurança social.
XXIII. De todo o modo, à data da interposição do requerimento – 23/05/2016 – já há muito havia entrado em vigor o novo Código do Procedimento Administrativo, que expressamente prevê os princípios aplicáveis à administração electrónica bem como as regras de utilização de meios electrónicos, determinando que, a Administração deve disponibilizar e divulgar meios electrónicos aos interessados, de modo a promover a eficiência e a transparência administrativas e promover a proximidade com os interessados.
XXIV. A Recorrente utilizou um meio de contacto electrónico amplamente divulgado pela administração, neste caso pelo instituto que gere o fundo de garantia salarial.
XXV. Quer o referido instituto quer o Instituto da Segurança Social, IP há vários anos que possibilitam o contacto por email com os cidadãos.
XXVI. Ainda que este não fosse o endereço mais directo para ser recebido pelo Recorrido, sempre se diga que teria, salvo o melhor opinião, o IGFSS de reencaminhar o procedimento despoletado para o serviço competente ao abrigo do princípio da colaboração com os particulares.
XXVII. O mandatário da Recorrente utilizou esta via de remessa do requerimento porque o email era público e amplamente divulgado e era titulado pelo instituto que gere o Recorrido.
XXVIII. Deste modo, e em conformidade com o princípio da boa-fé, não poderá, dada a prova carreada para os autos susceptível de demonstrar o envio do requerimento atempadamente, improceder o pedido da Recorrente nos termos decididos pelo Recorrido, e confirmados pelo tribunal “a quo”.
XXIX. Pelo que deve o presente recurso proceder, deferindo-se o pedido de créditos emergentes do contrato de trabalho despoletado pela Recorrente, porquanto a mesma tinha legitimidade para o requerer, fê-lo atempadamente, em modelo adequado e por meio idóneo a ser recepcionado pelo Recorrido.
Assim decidindo farão Justiça.
*
O Réu juntou contra-alegações, concluindo:
A. O requerimento da A. foi apresentado ao FGS em 24.012017, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.
B. Assim, o referido requerimento da A. foi apreciado à luz deste diploma legal.
C. Este diploma previa um prazo de 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.
D. De resto, já o anterior regime legal, previsto na Lei 35/2004, de 29/07, estabelecia no seu art.° 319.° 3, um prazo para a apresentação do requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho, que era de 3 meses antes do termo do prazo de prescrição, ou seja 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho.
E. Deste modo se verifica que sempre existiu um prazo para apresentação dos requerimentos ao FGS, sendo que o actual regime prevê um prazo de caducidade findo o qual cessa o direito de os ex-trabalhadores das EE insolventes requererem o pagamento dos créditos ao FGS.
F. Não tendo aqui aplicação o art.° 297.° do CC, uma vez que à luz dos dois diplomas já se encontra terminado o prazo para apresentação do requerimento ao FGS.
G. Sendo aplicável o novo regime, temos de considerar como estando ultrapassado o prazo para a apresentação dos requerimentos ao FGS, à luz do diploma DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015,
Termos em que, e com o suprimento, deve ser feita justiça, mantendo-se a decisão de indeferimento proferida pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial.
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O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
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Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A) A Autora foi admitida a trabalhar na SLx - Comércio de Produtos Alimentares, Lda., tendo o seu contrato cessado a 23.05.2015;
B) Em 23 de maio de 2016, foram remetidas, de entre outras, quatro mensagens de correio eletrónico para o endereço igfss-dgf@seg-social.pt;
C) Em 13.02.2017, a advogada CT enviou uma mensagem de correio eletrónico para o endereço igfss-dgf@seg-social.pt, solicitando informação no tocante ao seguimento dado aos requerimentos para pagamento de créditos emergentes de contratos de trabalho apresentados por correio eletrónico pela Autora e AMFF;
D) Idêntica solicitação foi requerida em 05.04.2017, desta vez por carta registada, e pelo Gabinete de Advogados VG e Associados;
E) Na sequência de tal, a Autora foi confrontada com o facto de não constar do sistema qualquer pedido ao aqui Réu.
F) Em 24.01.2017, o A. apresentou nos serviços do R. requerimento no qual peticiona o pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho no valor global de € 9,090,00;
G) Por ofício datado de 19.05.2017, foi a Autora notificada, para efeitos de audiência prévia de interessados, de que o requerido seria indeferido com o fundamento de que o requerimento apresentado não foi apresentado no prazo previsto no artigo 2, nº. 8 do Decreto-Lei nº. 52/2015, de 21 de abril, e que o requerimento não se encontra instruído com os documentos previstos no nº 2 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril.
H) A Autora exerceu o seu direito de resposta nos termos e com os fundamentos que fazem fls. 16 e seguintes dos autos [suporte físico], cujo teor de se dá por integralmente reproduzido;
I) Em 04, 10 e 11.04., todos de 2017, os serviços do R. elaboraram as informações cujo teor consta de fls. 116 a 118 do PA apenso, e que aqui se entende como inteiramente reproduzido, e nas quais se propõe o indeferimento do requerido pelo A.;
J) Em 11.0.2017, o Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial lavrou despacho concordante;
K) Em cumprimento do despacho descrito no ponto anterior, foi a A. notificado, por ofício datado de 02.05.2017, de que o requerido foi indeferido com o fundamento de que o requerimento apresentado não foi apresentado no prazo previsto no artigo 2, nº 8 do Decreto-Lei nº 52/2015, de 21 de abril, e que o requerimento não se encontra instruído com os documentos previstos no nº 2 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril.
L) Inconformada, a Autora reclamou da decisão de indeferimento, a qual que logrou obter a decisão de indeferimento vertida no ofício datado de 19.05.2017, e cuja cópia faz fls. 34 dos autos físicos.
M) Dá-se por reproduzido todo o teor dos documentos que integram os autos [inclusive o PA apenso].
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Em sede de factualidade não provada o Tribunal exarou: Não se provaram outros factos senão os que antecedem, designadamente que a Autora tenha apresentado junto do Réu um pedido de pagamento de créditos emergentes de créditos laborais, por correio eletrónico, no dia 23.05.2016 [cfr. artigos 17º e 18º do libelo inicial].
E no que à motivação da factualidade tida por assente e não assente respeita consignou que a sua convicção se baseou na prova documental oferecida pelas partes e no PA instrutor devidamente junto aos autos, atendendo ainda a que nenhum documento foi alvo de impugnação, tendo-se ainda aplicado o princípio do cominatório semipleno, nos termos do qual se deram como provados os factos admitidos por acordo, na parte onde tal foi possível.
No mais, refira-se que os factos dados como não provados não obtiveram prova segura e convincente para o Tribunal.
Neste particular, saliente-se o aduzido nos artigos 17º e 18º do libelo inicial, cuja aquisição processual carecia de efetiva análise do teor da mensagem de correio eletrónico supostamente enviado para os serviços do Réu em 23.06.2016, o que não veio a suceder [por oposição à situação inicialmente relatada no artigo 24º - cfr. fls. 41 dos autos físicos], sendo de referir ainda o facto dos demais elementos probatórios postos à disposição do Tribunal, como o é o caso da lista que integra o documento nº 5, que nem sequer identifica o seu remetente, nada aportarem de relevante no sentido de corroborar a matéria em questão, o que também contribuiu para a posição assumida pelo Tribunal no que diz respeito à matéria acima indicada.
Assim sendo, e tratando-se de matéria substancialmente documental, tendo em conta o ónus da prova, afigura-se-nos sérias dúvidas quanto à sua ocorrência, propendemos para o sentido acima referido.
Nestes termos, a convicção do Tribunal nesta matéria teve, necessariamente, que ser limitada e/ou negativa no seu conteúdo.
É esta, em suma, a motivação que subjaz ao juízo probatório formulado.
X
DE DIREITO
Está posta em crise a decisão que ostenta este discurso fundamentador:
Atendendo ao objeto da lide, definido pela causa de pedir e pelos pedidos formulados, estamos em presença de uma ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido.
Na ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido, o Tribunal deve pronunciar-se sobre a pretensão material formulada pelo Autor, rejeitando-se, neste tipo de ações, a prolação de sentenças de anulação ou declaração de nulidade de atos administrativos.
No caso concreto, como vimos já, a questão decidenda eleita consubstancia-se em saber se assiste o direito à Autora a ver o Réu condenado a pagar os créditos laborais reclamados nos autos, no montante global de € 9,090,00.
Ora, examinada a argumentação exposta pela A. nos presentes autos, é pacífico que o mesmo vem afrontar o fundamento invocado pelo R. para indeferir a sua pretensão – o decurso do prazo de 1 ano previsto no n.º 8 do art.º 2.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21/04, ou seja, a apresentação do requerimento para pagamento dos créditos mais de um ano após a data da cessação do contrato de trabalho -, porque entende que o mesmo é inválido.
Efetivamente, sustenta esta, no mais essencial, que, tendo o seu contrato de trabalho cessado a 22.05.2015, bem como o requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho sido apresentado, por correio eletrónico, no dia 23.05.2016, o mesmo foi apresentado tempestivamente, cumprindo o estipulado pelo nº. 8 do artigo 2º do Decreto-Lei nº. 59/2015, de 21 de abril.
Ora, no que se refere a esta alegação, adiante-se, desde já, que não assiste qualquer razão á Autora.
Com efeito, pretende a Autora que se considerada válida a demonstração do envio pedido de pagamento de créditos emergentes de créditos laborais, por correio eletrónico, no dia 23.05.2016, independentemente do R. alegar que não o recebeu.
Significa isto que, independentemente do regime jurídico aplicável, para que procedesse a pretensão da Autora, era necessário demonstrar-se, desde logo, que a mesma remeteu efetivamente, no dia 23.05.2016 e por correio eletrónico, para os serviços do R. um requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho.
Todavia, como dimana do probatório coligido, a Autora fracassou na prova da factologia vertida nos artigos 17º e 18º do libelo inicial, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à demonstração da tese da A. no plano da alegação em análise.
Mas ainda que assim não fosse, e para que não subsistam quaisquer dúvidas, sempre a pretensão da Autora não procederia, pois, contrariamente ao sustentado, a remessa por correio eletrónico do requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho para os serviços do Réu não constitui o meio idóneo para apresentação do mesmo nos termos que constam do Decreto-Lei nº. 59/1015, de 21 de abril.
Efetivamente, e como resulta cristalino do nº. 4 do artigo 5º do citado diploma legal, “(…) O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt, através de modelo aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do emprego e da segurança social (…)”.
Quer isto tanto significar que o dito requerimento é apresentado presencialmente junto dos serviços do Réu - admitindo-se aqui igualmente a sua remessa por correio, com registo postal, considerando-se a data da prática do ato a da efetivação do registo postal - ou por forma eletrónica através de modelo aprovado por Portaria.
Certo é que não é passível de apresentação por correio eletrónico.
Assim, atentando que o citado Decreto-Lei nº. 59/1015, de 21 de abril, assume a natureza de “lei especial”, naturalmente prevalecendo sobre os demais regimes generalistas neste domínio, como é o caso do invocado Decreto-Lei nº. 135/99, de 22 de abril, é imperativo concluir que a Administração não podia deixar de considerar senão a data do requerimento apresentado presencialmente, ou seja, 24.01.2017, e não a data de suposta remessa por correio eletrónico do pedido da Autora, que, de resto, não se logrou demonstrar processualmente.
Por conseguinte, também pela fundamentação ora exposta, falece a posição da Autora quanto à pretendida validação da suposta apresentação do seu requerimento de 23.05.2016.
Resta-nos, pois, a questão em torno da apresentação pela Autora do requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato apresentado em 21.04.2017 junto dos serviços do Réu e a aplicação do disposto no nº. 8 do artigo 2º Do Decreto-Lei nº. 59/2015, de 21 de abril.
Neste particular, importa que se comece por sublinhar que, atendendo à data do requerimento apresentado pela Autora [21.04.2017], a matéria visada nos autos é predominantemente regulada pelo Decreto-Lei nº. 59/2015, de 21 de abril, que aprova o novo regime do Fundo de Garantia Salarial.
Com efeito, nos termos do prescrito no art.º 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.
Por conseguinte, tendo o mencionado regime entrado em vigor em 04.05.2015, consonantemente com o estipulado no art.º 5 do mesmo diploma, resulta inequívoco que a pretensão da A. deve ser apreciada à luz do regime estabelecido pelo NRFGS.
Sendo assim, assoma como óbvio que o acolhimento da pretensão da A. não pode deixar de cumprir o requisito estabelecido no art.º 2.º, n.º 8 do NRFGS.
O aludido art.º 2.º dispõe, no seu n.º 8, que o Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
No entanto, percorrido o regime anteriormente vigente, estabelecido nos art.ºs 316.º a 326.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, verifica-se que inexiste qualquer prazo estipulado para apresentação ao R., por banda do trabalhador requerente, do requerimento para pagamento dos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho.
O que quer dizer, portanto, que o prazo de um ano prescrito no citado n.º 8 do art.º 2.º do NRFGS, para além de configurar uma novidade em face do regime anteriormente vigente, configura igualmente na medida em que introduz um prazo, anteriormente inexistente, para o exercício de um direito, e em bom rigor, uma alteração de prazo.
Assim sendo, interessa convocar o preceituado no art.º 297.º, n.º 1 do Código Civil, que prescreve que “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar”.
Sendo assim, impera salientar que o prazo de um ano, descrito no art.º 2.º, n. 8 do NRFGS, aplica-se à totalidade do universo dos trabalhadores requerentes do pagamento dos seus créditos salariais ao R., desde que o respetivo requerimento seja apresentado após a data de 04.05.2015 e independentemente da data da cessação do contrato de trabalho.
Todavia, a contagem do citado prazo, na medida em que “encurta” o prazo anteriormente vigente para apresentação do mencionado requerimento ao R., “só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei”.
Quer isto significar, no que releva para o caso posto e atento o disposto no art.º 297.º, n.º 1 do Código Civil, que, independentemente da data em que tenha cessado o contrato de trabalho do A., o prazo de um ano estipulado no art.º 2.º, n.º 8 do NRFGS apenas inicia a sua contagem no dia 04.05.2015, findando tal prazo um ano depois, ou seja, em 04.05.2016 [em consonância com o estipulado nos art.ºs 296.º e 279.º, al. c) do Código Civil].
Destarte, em face das regras de contagem de prazos prescritas nos artsº 297.º, 296.º e 279.º, al. c) do Código Civil, e aplicáveis ao prazo introduzido pelo art.º 2.º, n.º 8 do NRFGS, sempre deve entender-se que, tendo a Autora apresentado o requerimento ao R. em 21.04.2017, que a apresentação de tal requerimento é claramente intempestiva.
Efetivamente, tendo o contrato de trabalho do A. cessado em 22.05.2015, grassa à evidência que na data em que a A. requereu ao R. o pagamento dos seus créditos salariais -21.04.2017-, há muito que o sobredito prazo de um ano se encontrava decorrido.
Deste modo, assomando como manifesto que o prazo estabelecido no art.º 2.º, n.º 8 do NRFGS constitui um prazo de caducidade, e que, por essa razão, não comporta causas de interrupção ou suspensão, impera concluir que, no momento em que a A. apresentou o seu requerimento para pagamento dos créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, há muito se encontrava decorrido e esgotado o prazo de um ano contado desde a data da cessação do contrato de trabalho em causa.
Por conseguinte, a decisão do R. não merece qualquer censura no que concerne ao fundamento que escora o indeferimento.
E não se argumente que a fixação de um prazo de caducidade como o previsto no normativo legal em análise afronta os princípios do acesso ao direito e da tutela jurisdicional efetiva.
É que estes princípios não se traduzem numa abertura da via judicial a todo o custo.
Tais princípios, com assento constitucional [artigos 20º e 268º nºs 3, 4 e 5, CRP] exigem que a todos esteja aberta a via judicial, para defender as pretensões legítimas e ver reconhecidos os seus direitos, e que o Estado, que tem o monopólio da administração da Justiça, forneça aos cidadãos, dela carentes, todos os meios necessários para a poderem efetivar, ou seja, para poderem obter a tutela pretendida.
O que não impõe, nem o legislador ordinário nem o constitucional, é que a tutela jurisdicional efetiva tenha de ser feita a todo o custo, passando por cima das normas processuais, nomeadamente das normas sobre a caducidade do exercício do direito de pagamento de créditos laborais.
Aliás, se as criou, se existem, é para serem respeitadas, sem que isso signifique coartar aqueles princípios, uma vez que o acesso ao direito e a tutela efetiva está assegurada dentro dos limites da legalidade, e não apesar deles.
Verificando-se que a contagem do prazo de caducidade de 1 ano se encontra bem realizada na decisão administrativa impugnada, e tendo em conta quanto acaba de ser dito, há que considerar que o ali decidido em nada contende com o princípio da tutela jurisdicional efetiva previsto no artigo 2.º do CPTA e na Constituição da República Portuguesa.
Sendo assim, por tudo o quanto ficou exposto, nenhuma inconstitucionalidade se divisa por violação do artigo 20º da CRP.
Mercê do exposto, impõe-se absolver o Réu do pedido.
Assim se decidirá.
X
Insurge-se a Recorrente contra esta decisão que, julgando a acção improcedente, absolveu o Réu do pedido.
É univocamente entendido pela doutrina e foi consagrado quer pela lei processual quer pela jurisprudência que o objecto do recurso jurisdicional se encontra delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente, da respectiva motivação, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria que nelas não tiver sido versada, com ressalva óbvia dos casos que imponham o seu conhecimento oficioso.
Assim sendo, analisadas as conclusões, resulta que na óptica da Recorrente a decisão padece de nulidade e erro de julgamento, quer de facto, quer de direito.
Avança-se, já, que carece de razão.
Da nulidade -
Segundo o artigo 615º do NCPC (artº 668º do CPC de 1961), sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”,
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 -…. .
3 -….. .
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Nos termos das alíneas b)1) e c) só ocorre nulidade quando falte a fundamentação (de facto/de direito devidamente especificada) ou quando a fundamentação da decisão aponta num sentido e a decisão em si siga caminho oposto, isto é, as situações em que os fundamentos indicados pelo juiz deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao que se contém na sentença ou agora, também quando a decisão seja ininteligível por alguma ambiguidade.
Esta nulidade (al. c)) pressupõe um vício real no raciocínio expresso na decisão, consubstanciado na circunstância de a fundamentação explicitada na mesma apontar num determinado sentido, e, por seu turno, a decisão que foi proferida seguir caminho oposto, ou, pelo menos, diferente, ou ainda não ser perceptível face à fundamentação invocada. Isto é, a fundamentação adoptada conduz logicamente a determinada conclusão e, a final, o juiz extrai outra, oposta ou divergente (de sentido contrário).
Não se confunde com o erro de julgamento, seja quanto à apreciação dos factos feita pelas instâncias, seja quanto às consequências jurídicas deles extraídas, por inadequada ter sido a sua subsunção à regra ou regras de direito pertinentes à situação concreta a julgar.
Trata-se, pois, de uma irregularidade lógico-formal e não lógico-jurídica.
Já a “omissão de pronúncia” está relacionada com o dever que o nº 1 do artº 95º do CPTA impõe ao juiz de decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Nestes termos, a nulidade da decisão por “omissão de pronúncia” verificar-se-á quando exista uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, a “omissão de pronúncia” existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.
Logo, não se verifica tal nulidade quando todas as questões que as partes submeteram à apreciação jurisdicional foram objecto de decisão.
No caso posto é manifesto que a sentença enfrentou o cerne da questão pelo que não enferma do mal que lhe é atribuído.
Da não produção de prova adicional -
Como é sabido, compete ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova.
Assim, quando, após a resposta à matéria exceptiva suscitada na contestação ou o decurso do prazo para a mesma, o juiz, sem mais, profere decisão, é porque entendeu decidir sem que haja lugar à produção da prova.
Nesse caso, a falta de inquirição das testemunhas oferecidas não é um problema de omissão de formalidade imposta pela lei, mas sim de suficiência ou veracidade da matéria de facto considerada na sentença, competindo ao juiz examinar se é legalmente permitida a produção da prova testemunhal oferecida pelas partes e, no caso afirmativo, aferir da relevância da factualidade alegada perante as várias soluções plausíveis para as questões de direito colocadas, só podendo dispensar essa prova no caso de concluir que ela é manifestamente impertinente, inútil ou desnecessária.
Como o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender “(…) a falta de inquirição de testemunhas não constitui nulidade porque não surge como diligência cuja realização se imponha inelutavelmente ao juiz, antes cabendo a este avaliar se a questão a dirimir no processo é meramente de direito ou, sendo também de facto, constam do processo todos os elementos pertinentes para a decisão e, nesse caso, decidir-se pelo imediato conhecimento do pedido. Compete ao juiz aferir da necessidade ou não de produzir prova, decidindo “se deve ou não realizar diligências que forem requeridas, podendo oficiosamente realizar as diligências que entender úteis para a descoberta da verdade, em relação aos factos alegados ou de que oficiosamente possa conhecer (…)”. Ou seja, a lei não prescreve que deve haver sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; pelo que não havendo essa imposição legal, se o juiz dispensa a produção de prova não se pode dizer que foi preterida uma formalidade legal geradora de nulidade processual. O que não obsta a que a omissão de diligências de prova, quando existam factos controvertidos que possam relevar para a decisão da causa possa afectar o julgamento da matéria de facto, acarretando a anulação da sentença por défice instrutório com vista a obter o devido apuramento dos factos.” - Acórdão de 09/04/2014, proferido no Proc. 01869/13.
A lei não prevê a prolação de decisão alguma a dispensar a produção da prova oferecida pelas partes. Ora, se a lei não prescreve tal despacho, não se pode sustentar que a sua falta gere nulidade. A nulidade processual consiste num desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo efectivamente seguido nos autos; por isso, a falta de despacho a dispensar a inquirição das testemunhas não constitui nulidade processual.
A não inquirição das testemunhas arroladas não consta do catálogo das “nulidades da sentença” previstas no artº 615º do CPC.
Também não se pode considerar que constitua uma nulidade processual à luz do artº 195º do CPC - omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreva - pois que o CPTA não estabelece a obrigatoriedade de produção de prova (testemunhal ou outra), antes confere ao juiz o poder de avaliar/ajuizar da necessidade da sua produção.
Na verdade, a produção de prova testemunhal/pericial arrolada está dependente da constatação da sua “necessidade” para a decisão da causa segundo o juízo de aferição do julgador, pelo que, não constituindo uma formalidade legal vinculadamente imposta pelo CPTA, a sua preterição não consubstancia uma nulidade.
Deste modo, a não inquirição de testemunhas apenas seria susceptível de consubstanciar erro de julgamento na medida da eventual deficiência do juízo valorativo que a dispensou.
Achar que o julgador está obrigado a admitir a produção da totalidade dos meios de prova apresentados pelas partes, mesmo quando manifestamente desnecessários, seria abrir a porta ao exercício de puros e inadmissíveis expedientes dilatórios, o que destronaria a exigência de uma boa gestão processual.
Voltando ao caso concreto, quanto à requerida prova que a Autora pretendia ver apreciada, bem andou o Senhor Juiz ao não abrir o período de produção de prova, por entender que não se provaram outros factos senão os que foram dados por assentes, designadamente que a Autora tenha apresentado junto do Réu um pedido de pagamento de créditos emergentes de créditos laborais, por correio eletrónico, no dia 23/05/2016.
Efectivamente dispõe o artº 5º/4 do DL 59/2015, de 21/04:
(….)
“4. O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt, através de modelo aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do emprego e da segurança social.”
Ora, para prova de ter apresentado tal requerimento nos moldes impostos por aquele preceito, a Autor juntou com a p.i os documentos nºs 5, 6 a 8 e 9.
Todavia, da análise do doc. nº 5 resulta, quando muito, que alguém, não identificado no mesmo documento, poderá ter expedido entre as 17:45 e as 17:58 horas do dia 23/05, 3 mensagens de correio electrónico para o endereço “igfss_dgfeg_social.pt” , cujo teor se desconhece, nada permitindo concluir que os mesmos, a terem sido expedidos, tinham anexados os docs. nº s 7 e 8.
E da análise do doc. nº 9 resulta que o mesmo consiste numa mera afirmação, sem razão de ciência, subscrita por um técnico informático do mandatário da Autora, no sentido de que, quando um e-mail é enviado através dos meios técnicos ali mencionados e aparece nos mesmos como “concluído”, o documento terá sido enviado, o que de forma alguma permite convencer de que os documentos nºs 6 a 8 tenham sido efectivamente expedidos para o Réu, e, muito menos, que tenham ou devessem ter sido recepcionados pelo mesmo Réu.
Acresce que é por demais evidente que a Autora não conseguiu provar que o requerimento em causa foi entregue materialmente em qualquer dos serviços do Réu nem enviado para o endereço em www.seg-social.pt, isto é, que o requerimento foi apresentado nos termos impostos pelo artº 5º/4 do DL 59/2015, de 21/4.
E não se diga, como alega a Recorrente, que a falta de audiência das testemunhas por si indicadas obstou a que pudesse provar a factualidade invocada na petição inicial.
Com efeito, mesmo a admitir-se que pudessem fazer prova do alegado envio do e-mail, o mesmo de nada lhe aproveitaria.
Por um lado porque se afigura insuficiente a prova testemunhal para formar a convicção de que o alegado e-mail foi efectivamente enviado e recepcionado pelo Réu a 23/05/2016 e, por outro, porque não tendo sido observados os trâmites plasmados no nº 4 do artº 5º do DL 59/2015, de 21 de abril, o alegado requerimento seria sempre de indeferir.
Ademais, não corresponde à verdade que o Réu não tenha observado o disposto no artº 14 º do DL 135/99, de 22/4, uma vez que o nº 4 do artº 5 º do DL 59/2015, de 21/4 prevê expressamente a remessa electrónica: “O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt ....”.
Assim, é notória a desnecessidade de produção de prova testemunhal.
Desta feita, improcede também o apontado erro de julgamento de facto.
É que nada autoriza a pretensão da Recorrente: Deste modo, deveria a sentença de que se recorre ter dado como provado que a A./Recorrente remeteu a 23/05/2016, por email, requerimento de pedido de pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ao Réu/Recorrido.
De igual modo, atento o acima exposto, teria ainda de ser alterada a matéria de facto dada como provada, nos seguintes termos:
B) Em 23 de Maio de 2016, foram remetidas, entre outros, três mensagens de correio electrónico para o endereço igfssdgf@seg-social.pt;
F) Em 24/01/2017, a A. apresentou nos serviços do R. 2.ª via do requerimento no qual peticiona o pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho no valor global de € 9.090,00.
Improcede pois este segmento do recurso.
E o que dizer do erro de julgamento de direito?
Apenas que não ocorre.
Na verdade, o Tribunal a quo considerou, e bem, que a aqui Recorrente apresentou junto dos serviços competentes do Fundo de Garantia Salarial, requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, ao abrigo do regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial.
Por despacho do Presidente do Conselho de Gestão do FGS, o seu requerimento foi indeferido, porquanto o mesmo não preenchia o requisito imposto pelo n° 8 do art° 2° do DL 59/2015, de 21 de abril, uma vez que não havia sido apresentado no prazo de 1 ano aí estipulado.
A lei reguladora do FGS estabelece regras de concessão desta compensação, sendo que o DL 59/2015, de 21 de abril, fixa, no seu artº 2°, um prazo de caducidade.
No entanto, já a anterior legislação regulamentadora do FGS estabelecia requisitos temporais para apresentação do requerimento junto do Fundo, dispondo o art° 319° da Lei 35/2004, de 29/7, no seu n° 3, que o FGS só assegurava o pagamento dos créditos que lhe fossem reclamados até 3 meses da respectiva prescrição, ou seja, até 9 meses após a cessação do contrato de trabalho.
De acordo com a análise efectuada ao processo pelo Centro Distrital do Porto, o requerimento apresentado pela Autora não preenchia os pressupostos legais impostos pela legislação reguladora do FGS conducentes ao deferimento da pretensão formulada, porquanto, não se encontrava preenchido o requisito temporal, não tendo o requerimento sido apresentado no prazo legalmente previsto para o efeito.
De facto, como resulta do probatório, o contrato de trabalho da ora Apelante terminou no dia 22/05/2015 e o requerimento foi apresentado junto do FGS no dia 24/01/2017, ou seja, quando já tinha decorrido mais de 1 ano desde a cessação do contrato de trabalho, tal como estabelece o novo regime jurídico previsto no DL 59/2015, à luz do qual o requerimento foi apreciado por ser o diploma então em vigor.
É que, nos termos do art° 3°/1 do DL 59/2015, de 21/4, ficam sujeitos ao novo regime do FGS aprovado em anexo ao presente Decreto-Lei, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor - 04/05/2015 -.
Tendo o requerimento da Autora sido apresentado no dia 24/01/2017, tinha de se concluir que era aplicável o novo regime jurídico do FGS, estando assim a Entidade Demandada obrigada a observar o prazo previsto no n° 8 do art° 2° do regime do FGS.
Tal como dispõe o art° 298°/2 do Código Civil, quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.
Ora o art° 2°/8 do DL 59/2015, de 21/4 não alude à prescrição, pelo que tem de se considerar que se trata de um prazo de caducidade.
Logo, tendo aquele requerimento sido apresentado depois de decorrido aquele prazo, é manifesto que se verifica a caducidade do direito da Autora, até porque se tratam de créditos laborais que se vencem nos termos da lei laboral, sendo pois créditos que há data em que foi proferida sentença de insolvência já se encontravam vencidos.
Deveria pois aquela ter reclamado os créditos emergentes do contrato de trabalho dentro do prazo de 1 ano estabelecido pelo novo regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial.
Não o tendo feito, caducou o seu direito.
Bem andou pois o Réu, aqui Recorrido, ao desatender o requerimento em apreço; a sua conduta apenas se norteou pelo estatuído no apontado artigo 2º/8.
Sucumbem pois as conclusões da alegação.
***
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 12/04/2019
Fernanda Brandão
Frederico Branco
Nuno Coutinho
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1) Dos incontáveis arestos dos tribunais superiores que reiteram a mesma doutrina jurisprudencial nesta matéria, retemos o Acórdão do Pleno da Secção do CA do Supremo Tribunal Administrativo, de 15-11-2012, proc. 0450/09, que sumariou: “(…) II - A estrutura da sentença está concebida no artº 659º do CPC, devendo a mesma começar por identificar as partes, o objecto do litígio (fixando as questões que que ao tribunal cumpre solucionar), os fundamentos (de facto e de direito) e concluindo com a decisão. Delineada a estrutura deste acto jurisdicional (por excelência), o desvio ao figurino gizado pelo legislador ocasiona uma patologia na formação e estruturação da decisão susceptível de a inquinar de nulidade (artº 668º nº1 do CPC).
III - Um dos elementos estruturantes da sentença é a fundamentação. Esta tem duas funções: uma função endoprocessual e uma função extraprocessual. A função endoprocessual é aquela que desenvolve a motivação da sentença, entendido como requisito técnico da pronúncia jurisdicional, no interior do processo; a função extraprocessual da motivação está ligada com a natureza garantista da absoluta generalidade e na consequente impossibilidade de a entender como derrogável ad libitum pelo legislador ordinário (e muito menos como derrogável ad libitum pelo juiz ou pelas partes.
IV - A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando haja ausência absoluta de motivação, ou seja, total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que a decisão assenta. (…)”.