Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01943/12.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/25/2013
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Catarina Almeida e Sousa
Descritores:RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
TEMPESTIVIDADE
CITAÇÃO
JUSTO IMPEDIMENTO
COMUNICAÇÕES POR FAXE
Sumário:I. O conhecimento de uma questão não significa que o Tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes, sendo, aliás, clara a distinção que a doutrina e a jurisprudência estabelecem a este propósito entre “por um lado, “questões”, e, por outro, “razões” ou “argumentos”, e concluem que só a falta de apreciação das primeiras – as “questões” – integra a nulidade prevista no citado normativo (leia-se, artigo 660º, nº2 do CPC) mas já não a mera falta de discussão das razões ou argumentos invocados para concluir sobre as questões”
II. Mesmo que tivesse sido concretizada uma segunda citação do credor com garantia real (o que, no caso sub judice, não se verificou), sempre esta teria que se considerar inócua para todos os efeitos, designadamente em relação ao (re)início de prazos já concedidos pela primeira citação para reclamar créditos.
III. A arguição da nulidade da citação do executado compete-lhe a ele, executado, caso não seja sanada oficiosamente, sendo que, enquanto destinatário da citação, cabe-lhe demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que não lhe é imputável, e que tal falta prejudicou a sua defesa.
IV - Como dispõe o artigo 239º, nº1 do CPPT, “feita a penhora e junta a certidão de ónus, serão citados os credores com garantia real, relativamente aos bens penhorados, e o cônjuge do executado no caso previsto no artigo 220.º ou quando a penhora incida sobre bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo, sem o que a execução não prosseguirá.
III. Assim, a citação dos credores com garantia real relativamente aos bens penhorados depende absolutamente da efectivação da penhora e não da citação pessoal do executado, a qual, como se sabe, pode, e assim acontece não raras vezes, ter lugar após a penhora.
V. Para a existência de justo impedimento nos termos do nº 1 do art. 146º do CPC (na redacção do art. 18.º-4 do DL n.º 329-A/95, de 12/12) basta que o facto que obsta à prática do acto não seja imputável, a título de culpa, à parte ou seu mandatário.
VI. Ou seja, lei actual deixou de fazer qualquer exigência a respeito da normal imprevisibilidade do evento, estranho à vontade da parte, para se centrar apenas na não imputabilidade à parte nem aos seus representantes ou mandatários pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto
VII. O evento invocado pelo advogado da parte de não ter recebido um fax que esta lhe enviou a comunicar a citação, justificador, na sua óptica, da impossibilidade da prática atempada do acto em causa, não pode ser qualificado como não imputável à parte, pois que, como é sabido, as falhas nos sistemas de transmissão electrónica ou através de fax são, óbvia e naturalmente, passíveis de acontecer.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:D... Bank Ag
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte

1- RELATÓRIO

D… Bank AG – Sucursal em Portugal., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, julgando improcedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), manteve o despacho proferido no processo de verificação e graduação de créditos, no âmbito da execução fiscal nº 3190200801122436, nos termos do qual foi determinada a rejeição liminar da reclamação de créditos apresentada, em 27/09/10, pela ora Recorrente, com fundamento na intempestividade da sua apresentação, veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Rematou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

A - O presente recurso é interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto na qual foi decidido a improcedência total da reclamação apresentada da decisão do órgão de execução fiscal, de rejeição liminar da reclamação de créditos apresentada no âmbito do processo de graduação de créditos no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3190200801122436, por alegadamente ter sido apresentada fora do respectivo prazo legal.

B - A referida sentença deu fundamentalmente como provado que a ora Recorrente foi citada na sua sede a 12 de Abril de 2010 e que somente apresentou a sua reclamação de créditos a 27 de Setembro de 2010.

C - Por sua vez, foram dados como não provados toda a restante factualidade, designadamente que não foi recepcionado qualquer fax pela ora Signatária no dia 12 de Abril de 2010, por ter sido considerada inidónea a prova testemunhal oferecida, mas mesmo a considerar-se como provado o referido facto, tal seria absolutamente indiferente à decisão a atribuir ao caso em concreto.

D - Por sua vez, quanto às questões de direito, a douta sentença objecto de recurso, decidiu que não se verificou no caso em apreço qualquer verificação de justo impedimento, com fundamento no artigo 146º n.º 1 do C.P.C., por entender somente imputável à parte o erro verificado, a qual poderia sempre alegar “dificuldades técnicas de comunicação”, colocando em causa a segurança jurídica que assiste à contraparte, por passarem a inexistir quaisquer prazos a respeitar.

E - Quanto à verificação de mais de uma citação, o entendimento plasmado na douta sentença proferida, foi no sentido de que apenas e somente ocorreu uma citação da ora Recorrente, a qual terá ocorrido a 12 de Abril de 2010 (e não 2012 como por lapso consta das conclusões).

F - Ora, sucede que, não obstante a douta sentença proferida, salvo o devido respeito, é entendimento da ora Recorrente que a sua reclamação de créditos não poderá ser considerada extemporânea.

G - Se por um lado, a ora Recorrente discorda da resposta dada quanto à questão da verificação de justo impedimento, já a posição do douto Tribunal quanto à posição da existência de apenas uma citação apresenta-se fracamente fundamentada, limitando-se a remeter para o ofício do qual a ora Recorrente foi notificada, e nada dizendo acerca do despacho que acompanhava o mesmo, e no qual encontra-se mencionado o artigo 239º n.º 1 do C.P.P.T..

H - Ora, a Recorrente foi citada no dia 15 de Setembro de 2010, data em que foi recepcionado o despacho que citava os credores com garantia real nos termos do n.º 1 do artigo 239º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, doravante designado por C.P.P.T, já junto como doc. 2 à reclamação apresentada junto do órgão de execução fiscal.

I - Nessa sequência, salvo o devido respeito, o prazo para a ora Recorrente reclamar créditos terminaria a 30 de Setembro de 2010, sendo esse o último dia de prazo em que poderia enviar a respectiva reclamação de créditos, a qual no entanto foi enviada no dia 27 de Setembro de 2010, conforme talão de aceitação de correio registado, o qual apresenta o carimbo dos correios com a data de 27 de Setembro de 2010, cfr. doc. 4 já junto à reclamação apresentada da decisão do órgão de execução fiscal, e conforme alínea D) dos factos dados como provados da douta sentença proferida.

J - Nessa conformidade, para a ora Recorrente a sua reclamação de créditos havia assim seguido atempadamente para o respectivo Serviço de Finanças, antes de terminado o respectivo prazo legal para o efeito, de 15 dias, atenta a data em que se considerou citada.

K - Sucede que, nessa sequência foi a ora Recorrente notificada da decisão já junta como doc. 1 à reclamação apresentada, a qual rejeitou liminarmente a reclamação de créditos apresentada pela ora Recorrente, com fundamento da mesma não ter sido apresentada dentro do respectivo prazo legal.

L - Nessa conformidade, e após diversas tentativas infrutíferas, apenas conseguiu entrar em contacto telefónico com o referido Serviço de Finanças no dia 12 de Junho de 2012 (e não em 2006 como, por lapso, consta do original das conclusões), onde junto da funcionária Glória Barros foi possível apurar que consideravam a ora Recorrente citada a 12 de Abril de 2010, tendo inclusivamente a mesma procedido ao envio através de correio electrónico, para o escritório da ora Signatária, da citação remetida em Abril de 2010, para a sede da Credora D... BANK, assim como respectivo aviso de recepção, o qual efectivamente se encontra assinado.

M - Atenta a documentação recepcionada, a ora Signatária entrou de imediato em contacto com a sua Constituinte D... BANK, alertando para o sucedido, uma vez que nunca havia recepcionado a referida citação no seu escritório, a qual por sua vez aferiu que a referida citação havia sido enviada por fax a 12 de Abril de 2010 para o escritório da ora Signatária.

N - Sucede que, a ora signatária nunca recebeu o referido fax (o qual no escritório da ora Signatária é apenas recepcionado electronicamente devidamente digitalizado num endereço de correio electrónico, e não em suporte de papel), resultante de uma falha no sistema electrónico que permite à ora Recorrente remeter documentação para a ora Signatária e que permite a esta receber essa mesma documentação.

O - Ora, consultado o referido endereço de correio electrónico, não existe qualquer e-mail (fax) recepcionado no dia 12 de Abril de 2010, conforme print screen já junto como doc. 4. à reclamação apresentada da decisão do órgão de execução fiscal, podendo a funcionária responsável pela distribuição dos referidos faxes, recepcionados electronicamente, confirmar que procede ao imediato encaminhamento sempre que chega algum novo documento.

P - Assim, resulta claro que não obstante a citação de 12 de Abril de 2010 ter sido recepcionada junto da sede da ora Credora Reclamante, a mesma nunca chegou ao conhecimento da ora Signatária impossibilitando-a de reclamar os respectivos créditos dentro do prazo de 15 dias subsequentes.

Q - Na sequência do supra exposto, por nunca ter sido recebida qualquer comunicação anterior, mas apenas e somente a notificação do despacho já mencionado supra (doc. 2 já junto à reclamação apresentada), a ora Recorrente aquando a recepção do mesmo, deparou-se com a menção expressa do n.º 1 do artigo 239º do C.P.P.T. no despacho em anexo proferido pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças.

R - A referida notificação efectivamente dava conta do agendamento da referida venda judicial para o dia 4 de Janeiro de 2011, através da modalidade de abertura de propostas em carta fechada, pelo valor de € 120.080,00, cfr. doc. 2 já junto à reclamação apresentada, porém no despacho junto à mesma consta expressamente a menção “Diligências com os seguintes actos: Citação dos credores com garantia real, cfr. n.º 1 do art. 239º deste código” (sublinhado e negrito nosso).

S - Ora, o n.º 1 do artigo 239º do C.P.P.T. dispõe “Feita a penhora e junta a certidão de ónus, serão citados os credores com garantia real, relativamente aos bens penhorados (…)”, pelo que, a ora Credora atento o conteúdo do referido despacho que acompanhava a notificação recepcionada a 15 de Setembro de 2010, e por nunca ter recebido qualquer outra comunicação anterior, considerou-se citada nos termos e para os efeitos do artigo 239º n.º 1 do C.P.P.T..

T - Mais acresce, que a referida venda agendada pelo ofício datado de 10 de Setembro de 2010, veio posteriormente a ser suspensa, a fim de ser dado o “cumprimento de formalidades legais”, conforme notificação recepcionada e que já junta como doc. 5 à reclamação apresentada, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.

U - As referidas formalidades legais consistiam na citação pessoal do executado, a qual havia sido preterida.

V - Nesse seguimento, veio a ora Recorrente ainda a recepcionar mais uma notificação, a 18-11-2010, cfr. doc. 6 já junto, dando conta da marcação da nova data da venda para o dia 18 de Janeiro de 2011, através da modalidade de proposta em carta fechada, pelo valor de € 120.080,00, conforme documento já junto como doc. 6 à reclamação apresentada, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.

W - Acontece que, a notificação recepcionada, que dava conhecimento da nova data agendada para a venda do imóvel penhorado, apresentava, mais uma vez, no respectivo despacho anexo, datado de 25-10-2010, nova a indicação de “citação dos credores com garantia real, cfr. n.º 1 do art. 239º C.P.P.T” (sublinhado e negrito nosso).

X - Ou seja, a ora Recorrente, não obstante já ter reclamado os seus créditos a 27 de Setembro de 2010, viu mais uma vez, ser-lhe renovado o seu direito processual de reclamar créditos junto do respectivo processo de execução fiscal, identificado supra, pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças, a ser exercido ao abrigo do artigo 239º do C.P.P.T.

Y - Nessa conformidade, e salvo o devido respeito, a reclamação de créditos apresentada pela ora Credora a 27 de Setembro de 2010, atenta a renovação do seu direito processual de reclamar créditos, em data posterior àquela em que já o tinha feito, terá necessariamente de ser considerada apresentada em tempo, e não extemporânea.

Z - Acontece que, quanto a esta situação a douta sentença objecto de recurso proferida não faz qualquer referência, referindo simplesmente que a notificação datada de 10 de Setembro de 2010, não consubstancia uma nova citação, sem mais considerações, estando em causa, uma clara omissão de pronúncia por parte do douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

AA - Mais acresce, e tal como já referido supra, que a primeira citação realizada da ora Credora Reclamante, foi feita sem que o executado se apresentasse devidamente citado pessoalmente, ou seja, com a preterição de uma formalidade legal essencial, a citação pessoal do executado, a qual se encontra prevista no artigo 165º do C.P.P.T. que dispõe no n.º 1 alínea a) que “São nulidades insanáveis em processo de execução fiscal:
a) A falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado;

BB - Por sua vez, o n.º 2 do mencionado artigo prevê expressamente que “As nulidades dos actos têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo (…)” (negrito e sublinhado nosso), estipulando o n.º 4 que “As nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final”.

CC - Assim, outro entendimento não se poderá ter senão que com a referida ausência de citação pessoal do executado, que consubstanciou uma nulidade, que desde já se invoca para todos os efeitos legais, com consequente anulação dos termos subsequente do processo, nos termos e para os efeitos do artigo 165º do C.P.P.T., deveria impreterivelmente ter sido realizada nova citação dos credores com garantia real.

DD - Acontece que, também quanto a esta questão, lida a douta sentença proferida não é feita igualmente qualquer menção, existindo uma clara e completa omissão de pronúncia.

EE - Também quanto à questão da reclamação de créditos que foi apresentada antes de realizada a transmissão do bem imóvel que se apresentava penhorado, com fundamento no artigo 240º, n.º 4 do C.P.P.T. “O disposto no número anterior não obsta a que o credor com garantia real reclame espontaneamente o seu crédito na execução, até à transmissão dos bens penhorados” (negrito e sublinhado nosso), a mesma também não foi objecto de qualquer posição por parte do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

FF - A ora Recorrente reclamou créditos a 27 de Setembro de 2010, cfr. facto dado como provado da douta sentença (alínea D), tendo a venda do imóvel apenas se concretizado no ano seguinte, a 4 de Janeiro de 2011.

GG - Ora, atendendo que o imóvel, aquando a recepção da respectiva reclamação de créditos enviada pela ora Recorrente (27/09/2010), ainda não havia sido vendido, e que, note-se, o próprio executado não se encontrava sequer devidamente citado, (estando o processo de execução fiscal ferido de uma nulidade insanável, com consequente anulação de todos os actos subsequentes), reitera-se que não poderá, salvo o devido respeito, ser considerada a reclamação de créditos extemporânea.

HH - Por último, alegou ainda a ora Recorrente que a não apresentação da respectiva reclamação de créditos, de forma atempada, após os 15 dias contados desde o dia 12 de Abril de 2010, se deveu apenas e somente à ocorrência de uma situação de justo impedimento, o qual desde já se alega para todos os efeitos legais.

II - O justo impedimento encontra-se previsto no Código Processo Civil (doravante C.P.C.), aplicável por remissão do artigo 246º do C.P.P.T., no artigo 146º, o qual dispõe no n.º 1 “Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”.

JJ - Nos termos do Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 30-03-2004, “À luz do actual conceito de justa causa bastará que o facto obstaculizador da prática do acto não seja imputável à parte ou ao seu mandatário para que se verifique uma situação de justo impedimento”.

KK - E ainda “É considerado como justo impedimento todo o evento que obste à prática atempada de acto jurisdicional e que não seja imputável à parte que o invoca nem aos seus representantes ou mandatários (a verificação de um acto não culposo por parte do “ retardatário”) - artº 146º, nº 1, do CPC”.

LL - Ainda neste sentido pode ler-se Lebre de Freitas, in “Código Proc. Civil anotado“, vol. 1º, pg. 257, o qual ainda acrescenta que, a tal não obsta a possibilidade de a parte ou o mandatário terem tido alguma forma de participação na ocorrência verificada, desde que, nos termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade.

MM - Já o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 18-07-2006 afirma que O justo impedimento é concedido às partes, a título excepcional, quando razões estranhas e imprevisíveis ocorram, de forma que se revele adequada e equitativa a concessão de um prazo suplementar para a prática do acto(negrito e sublinhado nosso).

NN - Ora, no caso concreto em apreço, estamos perante uma falha ocorrida no equipamento electrónico através da qual a Recorrente envia e a ora Signatária recepciona as comunicações que lhe são remetidas via fax, não sendo imputável a nenhuma das partes qualquer falha, uma vez que as condutas em apreço não poderão ser objecto de censurabilidade.

OO - Tal como consta no douto Acórdão da Relação de Coimbra de 30-03-2004, já citado supra “O mesmo sucederia se essa carta tivesse sido colocada em cima da sua secretária para análise e momentos depois tivesse sido daí furtada por alguém, juntamente com outros bens, sem que, entretanto, houvesse ocasião de se tomar conta da dita missiva e sua proveniência, ou se esse desaparecimento tivesse ocorrido nas mãos de um funcionário de escritório, quando recebe a correspondência, por motivos estranhos à sua conduta e devido a terceiro.”

PP - Desta forma, afigura-se que não se pode imputar o sucedido à ora Signatária ou à sua Constituinte, D... BANK, razão pela qual é forçoso reconhecer existência de uma situação de justo impedimento, à luz do nº 1 do artigo 146º do C.P.C., e também nos termos do artigo 145º n.º 4 do C.P.C. “O acto poderá, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos do regulado do artigo seguinte.

QQ - A ora Recorrente indicou junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a prova testemunhal que dispõe e que entende que deveria ter sido ouvida, não tendo, salvo o devido respeito, como provar que não recebeu o referido fax em mais nenhuma outra data, tal como pretendido pelo o douto Tribunal a quo, prova essa que não foi sequer ouvida, tão pouco objecto de apreciação o referido testemunho.

RR - A ora Signatária apenas tomou conhecimento dos factos supra mencionados no dia 12 de Junho de 2012, após contacto telefónico com o respectivo Serviço de Finanças (realizado na sequência da notificação da decisão de rejeição liminar da reclamação de créditos apresentada) e ainda posterior contacto com a sua Constituinte D... BANK, a fim de aferir o sucedido, tendo nesse mesmo dia apresentado a reclamação da decisão do órgão de execução fiscal, que julgava inicialmente somente conter um lapso.

SS - Termos em que, caso nenhum outro argumento apresentado seja susceptível de acolhimento, deverá sempre resultar como provado a existência de um justo impedimento por parte da ora Signatária, e consequentemente ser revogada a douta sentença proferida, que deverá ser substituída por outra que admita a reclamação de créditos remetida para o respectivo Serviço de Finanças a 27 de Setembro de 2010 e gradue o valor reclamado no lugar que legalmente lhe competir.


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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Neste Tribunal, o Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo [artigo 707º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 278º, nº 5 do CPPT], cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

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Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, as questões que constituem objecto do presente recurso, seguindo a ordem pela qual vêm colocadas nas conclusões, são as seguintes:

- Saber se a Sentença recorrida errou ao considerar intempestiva a apresentação da reclamação de créditos apresentada pela ora Recorrente em 27/09/10;

- Saber se sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia;

- Saber se a sentença recorrida errou ao considerar que, no caso, valendo como data da citação do credor reclamante o dia 12/04/10, não se verificou uma situação de justo impedimento, violando, assim, o disposto no artigo 146º do CPC.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a matéria de facto fixada em 1ª instância:

A. O processo de execução fiscal nº 3190200801122436 foi instaurado a 29 de Outubro de 2008 contra L…, para cobrança coerciva da IMI relativo aos anos de 2007 e 2008;

B. No âmbito do processo referido em A) foi penhorado o prédio inscrito na matriz da freguesia de Aldoar, Porto, sob o artigo 2…º;

C. O Reclamante foi citado na sua sede a 12 de Abril de 2010;

D. A Reclamante apresentou reclamação de créditos a 27 de Setembro de 2010;

E. A 06 de Agosto de 2010 foi proferido despacho a designar data para venda do imóvel penhorado;

F. O despacho referido em E) foi remetido através do ofício 10060/3190-30 de 2010-09-10 e deste consta “Face ao referido no nº 4 do artº 886 – A do CPC ficam V. Exas. por este meio notificados, na qualidade de credores do executado do despacho reproduzido pela fotocópia em anexo, proferido no processo supra e que ordena a venda judicial na modalidade de propostas em carta fechada, do bem penhorado no mesmo processo e constante de editais a afixar nos lugares de estilo.”

G. O despacho referido em E), designou o dia 04 de Janeiro de 2011 para abertura de propostas;

H. A Reclamante foi notificada a 06 de Junho de 2012 da decisão de rejeição liminar da reclamação de créditos apresentada;

I. A presente reclamação deu entrada a 14 de Junho de 2012


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Factos não provados

Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou, nomeadamente, não se provou que não existe qualquer fax recepcionado no dia 12 de Abril de 2010.


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Motivação da decisão de facto

A decisão da matéria de facto considerada provada, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo.

A matéria de facto considerada não provada, resultou da inidoneidade da prova oferecida para provar que não existe qualquer fax recepcionado no dia 12 de Abril de 2010 (nem se encontra alegado que o fax não tenha sido enviado noutro dia qualquer). Porém, tal facto a considerar-se como provado, seria absolutamente indiferente à resolução a dar à presente situação, como resulta do entendimento infra vertido”.


*

Ao abrigo do disposto no artigo 712º do CPC, dada a sua relevância para a decisão da causa, adita-se a seguinte matéria de facto, que também resulta provada documentalmente:

J - A citação a que alude o ponto C supra, foi efectuada através da expedição, pelo SF do Porto 5, do ofício nº 3913/3190-30, de 08/04/10, através de correio registado, com aviso de recepção, assinado em 12/04/10, dirigido ao D... Bank Portugal, SA, Rua …, nº…, 1250-060 Lisboa;

- Do teor de tal ofício consta o seguinte:

“(…)

Citação

(…)

Face ao referido no artigo 239º e ss do Código de Procedimento e de Processo Tributário, fica por este meio citado que, por este Serviço de Finanças foi efectuada e registada a competente Conservatória do Registo Predial, a penhora do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Aldoar-Porto, sob o artigo 2…, pertencente a L…, NIF: 1…, no processo supra instaurado por dívidas de IMI.

Mais fica citado para, querendo, reclamar os seus créditos no prazo de 15 dias.

Junta-se fotocópia da certidão do Registo Predial.

(…)”- cfr. fls. 125 e 126 dos autos;

L – O despacho referido em E) supra, que foi remetido ao D... Bank Portugal através do ofício m.i em F, apresenta o seguinte teor - cfr. fls. 89 dos autos:

“Proceda-se à venda judicial, na modalidade de propostas em carta fechada, do prédio urbano inscrito na matriz da Freguesia de Aldoar, concelho do Porto, sob o art. 2… e descrito na competente conservatória sob o nº 2…/1…, designando o dia quatro de Janeiro de 2011, pelas 11,00 horas, para a abertura das propostas, as quais deverão ser entregues neste serviço de finanças, impreterivelmente, até às dez horas do mesmo dia, em subscrito fechado e devidamente identificado com o nº do processo executivo, sob pena de não serem válidas, ou através da internet.

O valor de base para venda, apurado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), por força do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 250º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), é de 120.080,00 (cento e vinte mil e oitenta euros).


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Diligências com os seguintes actos:

Citação dos credores com garantia real, cfr. nº1 do art. 239º, deste código;

Notificação do depositário para os fins previstos no nº6 do art, 249º do mesmo código;

Notificação do presente despacho ao executado bem como aos credores com garantia real, cfr. nº 4 do art. 886º-A do Código de Processo Civil;

Publicidade da venda através da afixação de editais nos locais legalmente exigíveis e publicação de anúncios, cfr., respectivamente, nºs 2 e 4 daquele código e, ainda, divulgação através da internet, cfr. nº8 do art. 249º supra referido

(…)”;

M Através do ofício nº 10250/3190, de 16/09/10, do Serviço de Finanças do Porto 5, foi comunicado ao D... Bank Portugal que “a venda judicial de bens penhorados ao executado L…, NIF: 1…, foi suspensa com vista ao cumprimento de formalidades legais” cfr. fls. 163 dos autos;

N – Através do ofício nº 10248/3190-30, de 16/09/10, do Serviço de Finanças do Porto 5, expedido através de correio registado com AR, assinado em 23/09/10, foi comunicado ao executado, L…, o seguinte:

“Assunto: Penhora de Imóveis - Citação

(…)

Fica V. Exª por este meio CITADO/A, de que por este Serviço de Finanças correm termos os processos executivos supra referenciados por dívidas de IMI, conforme certidões em anexo.

Caso não tenha sido anteriormente citado, deverá no prazo de 30 dias proceder ao pagamento da dívida exequenda e acréscimos legais, nos termos abaixo indicados ou, querendo, requerer o pagamento em prestações se legalmente aplicável (artº 196º CPPT), a dação em pagamento (artº 201º do CPPT), ou ainda deduzir oposição judicial (artºs 203º e 204º do CPPT).

Por consulta à tramitação do referido processo verifica-se ter sido efectuada e registada na competente Conservatória do Registo Predial, a penhora do prédio inscrito na matriz predial urbana da Freguesia de Aldoar sob o artigo 2….

Mais informo, de que foi nomeado fiel depositário do referido bem, ficando desde já intimado para do mesmo não largar mão sem ordem do Chefe deste Serviço de Finanças, sob pena de (…).

Informo ainda que findo o prazo de trinta dias sem que tenha utilizado qualquer dos meios identificados, prosseguirão os autos os seus termos legais, designadamente com a marcação da venda” - cfr. fls. 157 e 158 dos autos.

O – Através do ofício nº 13273/3190-30, de 18/11/10, do Serviço de Finanças do Porto 5, cujo assunto em epigrafe é NOTIFICAÇÃO DOS CREDORES COM GARANTIA REAL NOS TERMOS DO ARTIGO 886º -A Nº 4 DO CPC, foi comunicado à Senhora Advogada mandatária do D... Bank Portugal o teor do despacho de 25/10/10 remetido em anexo, nos termos do qual foi ordenada a venda judicial na modalidade de propostas em carta fechada, do bem penhorado no mesmo processo – cfr. fls. 95 dos autos;

P – O despacho referido no ponto anterior apresenta o seguinte teor - cfr. fls. 96 dos autos:

“Proceda-se à venda judicial, na modalidade de propostas em carta fechada, do prédio urbano inscrito na matriz da Freguesia de Aldoar, concelho do Porto, sob o art. 2… e descrito na competente conservatória sob o nº 2…/1…, designando o dia dezoito de Janeiro de 2011, pelas 11,00 horas, para a abertura das propostas, as quais deverão ser entregues neste serviço de finanças, impreterivelmente, até às dez horas do mesmo dia, em subscrito fechado e devidamente identificado com o nº do processo executivo, sob pena de não serem válidas, ou através da internet.

O valor de base para venda, apurado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), por força do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 250º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), é de 120.080,00 (cento e vinte mil e oitenta euros).


**

Diligências com os seguintes actos:

Citação dos credores com garantia real, cfr. nº1 do art. 239º, deste código;

Notificação do depositário para os fins previstos no nº6 do art, 249º do mesmo código;

Notificação do presente despacho ao executado bem como aos credores com garantia real, cfr. nº 4 do art. 886º-A do Código de Processo Civil;

Publicidade da venda através da afixação de editais nos locais legalmente exigíveis e publicação de anúncios, cfr., respectivamente, nºs 2 e 4 daquele código e, ainda, divulgação através da internet, cfr. nº8 do art. 249º supra referido

(…).


*

2.2. O direito

Vistos os factos, passemos à análise do direito.

Depois de descrever o percurso argumentativo expendido na sentença recorrida – conclusões A a F das alegações de recurso – a Recorrente insurge-se, em primeiro lugar, contra a resposta dada pelo Tribunal quanto à (in)tempestividade da apresentação da reclamação de créditos em 27/09/10.

Com efeito, e como decorre daquilo que ficou dito, o Tribunal julgou improcedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º e ss. do CPPT contra a decisão do órgão da execução fiscal que, no âmbito do processo de verificação e graduação de créditos respeitante à execução fiscal nº 3190200801122436, rejeitou a reclamação de créditos apresentada, em 27/09/10, pelo D... Bank, com fundamento na intempestividade da respectiva apresentação.

Para assim decidir o Tribunal a quo partiu da matéria de facto que julgou assente, designadamente do facto constante do ponto C do probatório, nos termos do qual o D... Bank foi citado, enquanto credor com garantia real para reclamar créditos, em 12/04/10. Como tal, e tendo entendido inexistir qualquer situação configurável como justo impedimento, considerou o Tribunal que a reclamação de créditos apresentada em 27/10/10 foi-o para além do prazo legal de 15 dias, previsto no artigo 240º, nº1 do CPPT.

Como se percebe, o Mmo. Juiz não acolheu o argumento avançado pela Reclamante, ora Recorrente, no sentido de que foi objecto de uma segunda citação, em 15/09/10, o que lhe conferiu um novo prazo de 15 dias para reclamar créditos, cujo termo coincidiu com o dia 30/09/10; por outro lado, não julgou verificado o alegado justo impedimento que a Reclamante invocou, caso fosse considerado como início do prazo de apresentação da reclamação de créditos o dia 12/04/10, a que alude o ponto C dos factos assentes.

A este propósito – do justo impedimento - defende a Recorrente que, apesar de ter remetido a cópia da citação ocorrida em 12/04/10, dirigida ao D... Bank, enquanto credor com garantia real e para reclamar créditos em 15 dias, para a sua mandatária, através de fax, por razões de ordem técnica, de falhas na comunicação entre o Banco e a sua mandatária, esta nunca chegou a receber tal fax. Por conseguinte, defende a Reclamante, ora Recorrente, verifica-se, in casu, uma situação de justo impedimento, que só em sede de reclamação pôde ser alegada, já que a Recorrente estava convencida da apresentação tempestiva da reclamação de créditos.

Vejamos, então.

Já sabemos, e tal não vem posto em causa, que em 12/04/10, o D... Bank foi citado, no âmbito do processo de execução fiscal nº 3190200801122436, na qualidade de credor com garantia real sobre o imóvel aí penhorado, para apresentar, em 15 dias, a sua reclamação de créditos.

A questão que aqui se coloca é a de saber se, apesar de tal facto, a circunstância de o banco credor, ora Recorrente, ter sido notificado do ofício nº 10060/3190-30 de 2010-09-10 (com o conteúdo integral que se deixou plasmado nos factos assentes –F, G e L) configura uma nova citação, uma segunda citação do D... Bank para reclamar créditos. A reclamante entende que sim, face à alusão, em tal notificação, ao artigo 239º, nº1 do CPPT; o Tribunal entendeu que não.

Se a Reclamante, ora Recorrente, estiver com a razão do seu lado, logo a análise deste recurso terminará por aqui, sendo inútil apreciar qualquer outro argumento, por a conclusão a extrair ter que passar necessariamente pela constatação de que a p.i de reclamação de créditos foi tempestivamente apresentada. O contrário sucederá se a razão estiver do lado do Tribunal a quo.

Vejamos, então, começando por deixar exposto o que a este propósito se referiu na sentença:

“Alegou ainda a Reclamante que face ao despacho proferido a designar data para venda do imóvel penhorado que deveria ser aceite a reclamação de crédito, uma vez que a notificação de tal despacho configuraria uma nova citação.

Ora, como resulta dos factos considerados provados, consta do ofício que “Face ao referido no nº 4 do artº 886-A do CPC ficam V. Exas. por este meio notificados, na qualidade de credores do executado do despacho reproduzido pela fotocópia em anexo, proferido no processo supra e que ordena a venda judicial na modalidade de propostas em carta fechada, do bem penhorado no mesmo processo e constante de editais a afixar nos lugares de estilo.”

Assim sendo, tal despacho não configura uma nova citação e, como tal, não “recomeçou” nenhum novo prazo para proceder a reclamação de créditos.

Aliás como é referido pela Fazenda Pública na contestação, não existem duas citações. Existiu uma e ocorreu a 12 de Abril de 2012”.

O assim decidido não nos merece qualquer censura.

O ofício expedido em 10/09/10, relativamente ao qual a Recorrente pretende que se conclua que o mesmo traduz, afinal, uma nova (segunda) citação para os efeitos previstos no artigo 239º, 1 do CPPT, reporta-se, sem sombra de dúvida, à designação da data para a abertura das propostas, a qual foi fixada em 4/01/11. O teor do ofício em questão e o conteúdo do despacho que seguiu em anexo não deixam margem para dúvidas.

Como bem assinalou a Fazenda Pública, na contestação apresentada, do referido despacho, mas separado, e devidamente assinalada a separação, consta um rol de diligências que fazem parte do procedimento de penhora e venda de imóveis em execução fiscal, mencionando entre as diversas diligências “citação dos credores com garantia real, cfr. artº 239º do mesmo Código”, a par, por exemplo, da menção à “notificação do depositário para os fins previstos no nº6 do art. 249º” ou à publicidade da venda através da afixação de editais.

Ora, como deixámos assinalado, é por referência àquela menção, feita nos termos expostos – “citação dos credores com garantia real, cfr. artº 239º do mesmo Código” – que a Reclamante, aqui Recorrente, pretende retirar como consequência a de que terá sido novamente citada naquele momento para reclamar os seus créditos (dizemos novamente, pois a citação ocorrida em 12/04/10 não é posta em causa) e, por conseguinte, que a reclamação de créditos apresentada em 27/09/10 é tempestiva.

Não tem a Reclamante, ora Recorrente, qualquer réstia de razão.

Desde logo, porque inexistem duas citações: existe uma citação efectuada ao abrigo do artigo 239º, nº1 do CPPT, em 12/04/10 (cfr. pontos C e J dos factos provados), e existe, isso sim, um despacho a designar a data da abertura das propostas (note-se que, no âmbito do processo de verificação e graduação, sempre a marcação da data da abertura das propostas teria necessariamente lugar após a citação dos credores com garantia real relativamente ao bem penhorado). A isto acresce que a citação ocorrida em 12/04/10 chegou ao conhecimento do banco, credor com garantia real, o que, jamais, foi questionado.

Acrescente-se que na jurisprudência a questão da existência de uma segunda citação do executado e dos seus efeitos já tem sido abordada e tem merecido uma resposta de sentido unânime, em termos que sufragamos.

Citamos, a este propósito, o acórdão do STA, de 30/11/10 (processo nº 07010), em cujo sumário de pode ler, além do mais, que:

I- Uma vez chamado à lide executiva, a citação deixa de ser o instrumento processual adequado a dar conhecimento ao executado de quaisquer factos relevantes que ocorram na respectiva tramitação.

II- Sendo assim, uma segunda citação do executado é manifestamente indevida e daí que não seja susceptível de abrir um novo prazo de trinta dias para deduzir oposição, ao abrigo do disposto na alínea a), n.º 1 do artigo 203.º do CPPT, direito esse que decorrera da primitiva citação e que caducara por falta de exercício atempado”.

Também no acórdão do STA, de 21/05/08 (processo nº 0293), se deixou sumariado que:

“(…)

III - Efectuadas duas citações iguais - da mesma pessoa, no mesmo processo e para o mesmo fim - vale a primeira, - sendo a segunda inócua – para todos os efeitos, nomeadamente arguição da nulidade da citação - que não da sua falta - e contagem do prazo de oposição, não renascendo, pois, os respectivos prazos e direitos, antes devendo considerar-se precludidos”.

É verdade, e este Tribunal não desconsidera, que nos acórdãos citados a questão da existência de duas citações se colocava relativamente ao executado, o que não é o caso em análise. Porém, tal diferença não afasta aplicação, ao caso, do entendimento acolhido em ambos os arestos citados, valendo aqui todas as razões para afirmar que, mesmo que tivesse sido concretizada uma segunda citação (o que, no caso sub judice, não se verifica), sempre esta teria que se considerar inócua para todos os efeitos, designadamente em relação ao (re)início de prazos já concedidos pela primeira citação.

Portanto, quanto a este argumento que foi invocado relativamente à apreciação da tempestividade da apresentação da reclamação em 27/09/10 – a existência de uma nova citação realizada em Setembro de 2010 - há que dizer que o Tribunal a quo decidiu correctamente, não acolhendo o argumento avançado.

É certo que, a par deste argumento, a Reclamante invocou outros que, na sua tese, vinham demonstrar, por outras razões, caso aquele primeiro argumento improcedesse, que, ainda assim, a reclamação era tempestiva.

É em relação a esses outros argumentos que, directamente relacionados com a questão a apreciar – caducidade do direito de acção/ tempestividade da apresentação da reclamação de créditos – a Recorrente vem, em sede de recurso jurisdicional, invocar omissão de pronúncia. Efectivamente, é assim nas conclusões T a GG, em especial nas conclusões Z, DD e EE.

Vejamos, então, se a omissão de pronúncia de verifica e se, em consequência, a sentença é nula.

A nulidade de sentença por omissão de pronúncia verifica-se quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questões sobre as quais deveria ter-se pronunciado [arts. 125.º do CPPT e 668.º, n.º 1, alínea d), do CPC].

Esta nulidade está conexionada com os deveres de cognição do Tribunal, previstos no artigo 660º, nº 2, do CPC, em que se estabelece que o juiz tem o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Tal nulidade “só ocorrerá nos casos em que o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento”Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, I Vol, 2006, Áreas Editora, pág.912.

Revertendo os conceitos expostos para a situação sub judice, temos que, no caso, a sentença considerou, e assim, autonomizou, como questões a decidir, por um lado, a tempestividade da reclamação de créditos apresentada em 27/09/10 pelo D... Bank e, por outro, ainda relacionada com esta, a questão da verificação, in casu, de uma situação de justo impedimento. E, como resulta da sentença recorrida, tais questões foram apreciadas e decididas.

Ora, como se sabe, o conhecimento de uma questão não significa que o Tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes, sendo, aliás, clara a distinção que a doutrina e a jurisprudência estabelecem a este propósito entre “por um lado, “questões”, e, por outro, “razões” ou “argumentos”, e concluem que só a falta de apreciação das primeiras – as “questões” – integra a nulidade prevista no citado normativo (leia-se, artigo 660º, nº2 do CPC) mas já não a mera falta de discussão das razões ou argumentos invocados para concluir sobre as questões” - vide, CPC, anotado, Abílio Neto, 20ª Edição, Ediforum, pág. 925.

Neste sentido vai o ensinamento do Professor Alberto dos Reis: «Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que eles se apoiam para sustentar a sua pretensão» - vide, Código de Processo Civil, Anotado, vol. V, pág. 143.

Por conseguinte, e porque os conceitos de «questões» e de «argumentos» ou «razões» não são confundíveis, o Tribunal estava obrigado a conhecer das questões suscitadas pela Reclamante – o que fez – mas não já de refutar todos os argumentos que a aquela invocou em abono da pretendida procedência dessas questões, já que, sublinhe-se, o Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.

Tal não significa, porém, que a sentença não possa padecer de erro de julgamento por não ter apreciado a argumentação apresentada pela parte ou mesmo contrariado aquela implicitamente no julgamento que fez. Todavia, essa é uma outra questão que, podendo eventualmente brigar com o mérito da sentença, não contende com os vícios formais da mesma.

Em face daquilo que fica dito, não se acompanha a Recorrente quando sustenta, nas conclusões atrás identificadas (Z, DD e EE), que a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia.

Não obstante o que fica dito, e porque a resposta dada à (in)tempestividade da apresentação da reclamação de créditos pode, no entendimento da Recorrente, revelar-se, afinal, errada, pela procedência dos demais argumentos esgrimidos, não deixaremos de analisar as restantes razões avançadas pela Reclamante, ora Recorrente.

Vejamos, então.

Sustenta a Recorrente que, para além do tal ofício nº 10060/3190-30, de 10/09/10, e através do qual se considerou citada (ou, também, como sustenta, novamente citada), recebeu ainda, em 18/11/10, uma notificação dando-lhe conta de uma nova data para a abertura das propostas (desta feita para o dia 18/01/10). Mais refere que, à semelhança do que lhe foi comunicado através do ofício nº 10060/3190-30, também aqui o despacho anexo fazia novamente menção à “citação dos credores com garantia real, cfr. nº 1 do artigo 239º do CPPT”.

Assim sendo, conclui a ora Recorrente, não obstante já ter reclamado os seus créditos em 27/10/10, viu, com esta última notificação, “mais uma vez, ser-lhe renovado o seu direito processual de reclamar créditos junto do respectivo processo de execução fiscal(…)”, pelo que a reclamação apresentada em 27/10/10, “atenta a renovação do seu direito processual de reclamar créditos, em data posterior àquela em que já o tinha feito, terá necessariamente de ser considerada apresentada em tempo, e não extemporânea”.

Não tem, uma vez mais, razão a Recorrente, valendo aqui integralmente as razões que atrás deixámos expendidas quanto aos efeitos da notificação operada através do ofício nº nº 10060/3190-30, de 10/09/10 e para as quais, por uma questão de identidade e economia, remetemos.

Com efeito, como ali dissemos, daquilo que se tratou foi de uma comunicação efectuada nos termos do artigo 886º-A, nº 4 do CPC, a designar uma nova data para a abertura das propostas em carta fechada, que não de uma nova citação (no caso, terceira), donde se possa concluir pela renovação do prazo de 15 dias para o credor com garantia real sobre o bem penhorado poder apresentar a sua reclamação de créditos.

Por outro lado, sustenta a Recorrente que a razão justificativa da suspensão da abertura das propostas inicialmente marcada para 04/01/11 (e a nova data, 18/01/11), deveu-se à necessidade de serem cumpridas formalidades legais, concretamente a citação pessoal do executado que havia sido preterida. Assim sendo, argumenta a Recorrente, a citação ocorrida em 12/04/10 “foi feita sem que o executado se apresentasse devidamente citado pessoalmente, ou seja, com a preterição de uma formalidade legal essencial, a citação pessoal do executado, a qual se encontra prevista no artigo 165º do C.P.P.T. que dispõe no n.º 1 alínea a) que “São nulidades insanáveis em processo de execução fiscal: A falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado;”. Por sua vez, prossegue a Recorrente, “o n.º 2 do mencionado artigo prevê expressamente que “As nulidades dos actos têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo (…)”, sendo que o n.º 4 determina que “As nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final”.

Ora, com esta argumentação conclui a Recorrente que “outro entendimento não se poderá ter senão que com a referida ausência de citação pessoal do executado, que consubstanciou uma nulidade, que desde já se invoca para todos os efeitos legais, com consequente anulação dos termos subsequente do processo, nos termos e para os efeitos do artigo 165º do C.P.P.T., deveria impreterivelmente ter sido realizada nova citação dos credores com garantia real”.

Em relação ao que vem alegado, há, desde já, que dizer que a este Tribunal não faz qualquer sentido arguir uma nulidade que oficiosamente já foi sanada.

Mas mais. A arguição da nulidade da citação do executado compete-lhe a ele, executado, caso não seja sanada oficiosamente, sendo que, enquanto destinatário da citação, cabe-lhe demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que não lhe é imputável, e que tal falta prejudicou a sua defesa.

Já sobre os efeitos dessa invocada nulidade, entretanto sanada, também não se acompanha a argumentação da Recorrente. Na verdade, nos termos do nº 2 do artigo 165º do CPPT, “as nulidades dos actos têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos” (sublinhado nosso).

Ora, tal como dispõe o artigo 239º, nº1 do CPPT, “feita a penhora e junta a certidão de ónus, serão citados os credores com garantia real, relativamente aos bens penhorados, e o cônjuge do executado no caso previsto no artigo 220.º ou quando a penhora incida sobre bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo, sem o que a execução não prosseguirá.

Portanto, pode dizer-se que a citação dos credores com garantia real relativamente aos bens penhorados depende absolutamente da efectivação da penhora e não da citação pessoal do executado, a qual, como se sabe, pode, e assim acontece não raras vezes, ter lugar após a penhora.

Improcede, pois, este argumento ora analisado.

Prosseguindo na análise, e ainda com vista a sustentar a tempestividade da reclamação de créditos, defende a Recorrente que em 27/09/10, data em que apresentou a reclamação de créditos, ainda não havia sido vendido o bem penhorado, pelo que, nos termos do disposto no artigo 240º, nº4 do CPPT, a referida apresentação, em 27/09/10, não pode deixar se ser considerada tempestiva.

Vejamos o que se nos oferece dizer sobre isto.

Sob a epígrafe Convocação dos credores, dispõe o artigo 240º do CPPT o seguinte:

1 - Podem reclamar os seus créditos no prazo de 15 dias após a citação nos termos do artigo anterior os credores que gozem de garantia real sobre os bens penhorados.

2 - O crédito exequendo não carece de ser reclamado.

3 - O órgão da execução fiscal só procede à convocação de credores quando dos autos conste a existência de qualquer direito real de garantia.

4 - O disposto no número anterior não obsta a que o credor com garantia real reclame espontaneamente o seu crédito na execução, até à transmissão dos bens penhorados.

Da leitura conjugada das várias disposições deste artigo, só se pode interpretar que o disposto no nº 4 é aplicável somente na hipótese de o credor com garantia real não ter sido convocado pelo órgão da execução fiscal.

Se o credor com garantia real foi citado, como no caso aconteceu, é evidente que o seu prazo para apresentar a reclamação de créditos é o prazo de 15 dias previsto no nº1 deste artigo 240º do CPPT. Neste sentido, refere J. Lopes de Sousa In CPPT, anotado e comentado, IV volume, áreas Editora, 6ª edição 2011, pág. 54, aludindo ao nº 4 do artigo 240º do CPPT, que “esta norma reporta-se explicitamente à situação prevista no nº 3 deste artigo, em que se prevê a possibilidade de o órgão da execução fiscal não proceder à convocação de credores, mas o regime é aplicável à generalidade dos casos em que os credores com garantia real não tenham sido citados, por força do disposto no nº3 do art. 865º do CPC” – (“Os titulares de direitos reais de garantia que não tenham sido citados podem reclamar espontaneamente o seu crédito até à transmissão dos bens penhorados”).

Ora, aqui chegados, e improcedendo todas as conclusões que vínhamos analisando, resta-nos apreciar, tal como nos é colocada, a questão do justo impedimento.

Vejamos, então, recuperando, em síntese, as conclusões HH a SS.

Sustenta, então, a Recorrente que a não apresentação da respectiva reclamação de créditos, de forma atempada, após os 15 dias contados a partir do dia 12 de Abril de 2010, se deveu à ocorrência de uma situação de justo impedimento, sendo certo que, conforme defende, no caso concreto, “estamos perante uma falha ocorrida no equipamento electrónico através da qual a Recorrente envia e a ora Signatária recepciona as comunicações que lhe são remetidas via fax, não sendo imputável a nenhuma das partes qualquer falha, uma vez que as condutas em apreço não poderão ser objecto de censurabilidade”.

Vejamos, pois, se lhe assiste razão, não sem antes deixar transcrita a resposta dada a esta questão pelo Tribunal a quo e que foi a seguinte:

“(…) Como decorre dos factos considerados provados a Reclamante foi citada na sua sede a 12 de Abril de 2010.

Alega a Reclamante que existiu uma falha no envio do fax da Reclamante para a Ilustre Mandatária desta e que por tal circunstância não teve conhecimento da citação.

Ora, dispõe o artigo 146º, do Código de Processo Civil (CPC):

“1-Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste á prática atempada do acto.”

Refere António Santos Abrantes Geraldes que: “A reforma processual atenuou a rigidez do anterior sistema de invocação e aceitação do justo impedimento, assente no principio da imprevisibilidade e da impossibilidade de prática dos actos, centrando agora o instituto na ideia da culpabilidade das partes, dos seus representantes ou mandatários”.1 António Santos Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, I volume, 2.ª ed., pág. 87.

Passou-se, assim, de um regime de quase responsabilidade objectiva, para um regime matizado, no sentido de dever exigir-se às partes que procedam com a diligência normal, mas não já que entrem em linha de conta com factos e circunstâncias excepcionais.

Caberá assim à parte, ou seu representante, que não praticou o acto alegar e provar a sua falta de culpa.

Incumbe ao juiz, caso a caso, indagar se o motivo invocado exclui ou não a culpa da parte, seu representante ou mandatário ao exceder ou ultrapassar o prazo peremptório, sem prejuízo do especial dever de diligência e organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das causas.

(…)

Em resumo, com a nova redacção do artigo 146º, nº 1, do CPC, o núcleo do conceito de justo impedimento passou da normal imprevisibilidade do acontecimento para a sua não imputabilidade à parte ou ao mandatário.

Ora, partindo do entendimento doutrinal, é forçoso concluir que não ocorreu justo impedimento como alega a Ilustre Mandatário da Reclamante, uma vez que é apenas imputável à parte o erro verificado. Senão vejamos:

Atenta a citação, ou a Reclamante não informou a sua Ilustre Mandatária ou tendo enviado fax a informa-la, deveria ter encetado diligência no sentido de averiguar se o mesmo foi devidamente recebido – até porque em caso de não entrega, normalmente, há relatórios de “não entrega”.

De qualquer forma, é forçoso reconhecer que nenhuma razão assiste à Reclamante pois se assim fosse jamais existiriam prazos a respeitar, dado que sempre se poderia alegar problemas de comunicação entre a parte e respectivo Mandatário sem que existisse qualquer sistema de averiguação minimamente válida por parte do Tribunal para aferir da veracidade das alegadas impossibilidades ou dificuldades. Acrescido claro está, do desrespeito pela certeza jurídica que assiste à contraparte, sempre dependente dessa “dificuldade técnica de comunicação entre parte e seu Mandatário”.

Concluindo, quanto à verificação de Justo Impedimento pela não apresentação da reclamação de créditos atempadamente, considera este Tribunal que improcede.

(…)”

O sentido do assim decidido, adiante-se, não pode deixar de ter acolhimento por banda deste Tribunal, como passaremos a demonstrar.

Com efeito, importa ter em conta que a partir da reforma processual civil operada pelo DL nº 329-A/95, de 12/12, e pelo DL nº 180/96, de 25/09, foi alargado o conceito de justo impedimento dado no CPC (aplicável ao processo tributário por força do disposto no artigo 2º, al. e) do CPPT) face ao consagrado na anterior redacção do mesmo Código, tornando-se agora mais flexível a sua interpretação e atenuados os respectivos pressupostos.

Efectivamente, o artigo 146º nº 1 do CPC, na redacção actual, considera justo impedimento “o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”, ao passo que na redacção anterior o justo impedimento era considerado “o evento normalmente imprevisível, estranho à vontade da parte, que a impossibilite de praticar o acto, por si ou por mandatário”.

Como consta do preâmbulo do referido DL nº 329-A/95, flexibilizou-se «a definição conceitual de «justo impedimento», em termos de permitir a uma jurisprudência criativa uma elaboração, densificação e concretização, centradas essencialmente na ideia de culpa, que se afastem da excessiva rigidificação que muitas decisões, proferidas com base na definição constante da lei em vigor, inquestionavelmente revelam.”

Neste sentido, Lopes do Rego (in “Comentários ao Código de Processo Civil”, págs. 125) defende que “O nº1 pretende operar alguma flexibilização no conceito de «justo impedimento», colocando no cerne da figura a inexistência de um nexo de imputação subjectiva à parte ou ao seu representante do facto que causa a ultrapassagem do prazo peremptório...O que deverá relevar decisivamente para a verificação do «justo impedimento» – mais do que a cabal demonstração da ocorrência de um evento totalmente imprevisível e absolutamente impeditivo da prática atempada do acto – é a inexistência de culpa da parte, seu representante ou mandatário no excedimento ou ultrapassagem do prazo peremptório, a qual deverá naturalmente ser valorada em consonância com o critério geral estabelecido no nº2 do art. 487º do CC, e sem prejuízo do especial dever de diligência e organização que recai sobre os profissionais do foro no acompanhamento das causas”.

Deixou, portanto, a lei de fazer qualquer exigência a respeito da normal imprevisibilidade do evento, estranho à vontade da parte, para se centrar apenas na não imputabilidade à parte nem aos seus representantes ou mandatários pela ocorrência do obstáculo que impediu a prática do acto - cfr. Pereira Baptista, in “Reforma do Processo Civil”, 1997, pág.54, nota 100.

Assim, “Para a existência de justo impedimento nos termos do nº 1 do art. 146º do CPC (na redacção do art. 18.º-4 do DL n.º 329-A/95, de 12/12) basta que o facto que obsta à prática do acto não seja imputável, a título de culpa, à parte ou seu mandatário” – vide, acórdão do STJ de 28/09/00, publicado no BMJ nº 499º, pág. 283

Atento o exposto e a factualidade apurada, importa, pois, apreciar se ocorreu um evento que tenha impossibilitado totalmente a mandatário da parte de, atempadamente, apresentar a p.i de reclamação de créditos, no prazo de 15 dias, a contar da citação ocorrida em 12/04/10, ao abrigo do artigo 240º, nº1 do CPC, ou se houve responsabilidade ou culpa da parte (ou do mandatário) nessa extemporânea apresentação, tendo em consideração que só o evento que impeça totalmente que o acto seja praticado a tempo pode ser considerado justo impedimento, excluindo-se a simples dificuldade da sua realização.

No caso em apreço, o justo impedimento tem por fundamento uma falha ocorrida no equipamento electrónico através da qual a Recorrente envia, e a sua Mandatária recepciona, as comunicações que lhe são remetidas via fax, falha essa que, no caso, terá inviabilizado a recepção, pela Senhora Advogada, de um fax que alegadamente lhe foi remetido pela Recorrente e que se reportava à citação recebida, em 12/04/10, para reclamar créditos.

Note-se que na decisão da matéria de facto, concretamente nos factos não provados, fez-se constar que não se provou que não existe qualquer fax recepcionado no dia 12 de Abril de 2010, tendo-se, aliás, na motivação da decisão da matéria de facto, acrescentado que “tal facto a considerar-se como provado, seria absolutamente indiferente à resolução a dar à presente situação, como resulta do entendimento infra vertido”. Este juízo, que no entendimento acolhido na sentença recorrida bem se compreende, não foi sequer questionado pela Recorrente.

Ora, salvo o devido respeito pela opinião da Recorrente, entendemos que o evento que é relatado, justificador, na sua óptica, da impossibilidade da prática atempada do acto em causa, não pode ser qualificado como não imputável à parte, pois que, como é sabido, as falhas nos sistemas de transmissão electrónica ou através de fax são, óbvia e naturalmente, passíveis de acontecer.

E porque assim é, tais falhas podem - e devem - ser contornadas através de uma actuação vigilante das partes, de uma actuação reveladora da uma diligência normal que, no caso, deveria ter levado o Banco a confirmar, junto da sua Mandatária, a recepção do fax, seja através de um relatório de entrega, de leitura ou mesmo por via de um posterior contacto entre as partes.

Ora, no caso, foi este cuidado, esta diligência normal, exigível a alguém medianamente avisado, que não existiu. Tal actuação, ou a falta dela, não pode deixar de ser censurável.

Tanto basta, pois, para, em conclusão, considerarmos, na senda da sentença recorrida, não verificado o alegado justo impedimento. Por conseguinte, a reclamação de créditos apresentada em 27/09/10 é manifestamente intempestiva.

Improcedem, assim, na sua totalidade, as conclusões da alegação do recurso, mantendo-se a sentença objecto de recurso.


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3. DECISÃO

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCAN em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Porto, 25 de Janeiro de 2013

Ass. Catarina Almeida e Sousa

Ass. Nuno Bastos

Ass. Irene Neves