Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00382/14.7BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/24/2014
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
PONDERAÇÃO DE INTERESSES
ART.º 120.º. N.º2 DO CPC
Sumário:I. Para efeitos da ponderação de interesses a que alude o n.º 2 do artigo 120.º do CPTA, não pode afastar-se a possibilidade de a um interesse público concreto na recusa da providência se contrapor um outro interesse público, igualmente específico, na sua concessão.
II. Não existe um interesse público em abstrato, mas uma heterogeneidade de interesses públicos, muito vezes conflituantes entre si.*
*Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Q... - Associação Nacional de Conservação da Natureza
Recorrido 1:Município de Í...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento cautelar de Embargo de Obra Nova
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento do mesmo.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
Q…, associação nacional de conservação da natureza, com sede social no Centro Associativo do C... , Bairro do C... , Lisboa, inconformada, interpôs recurso jurisdicional da decisão proferida em 13/07/2014 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro nos autos de providência cautelar que intentou contra o município de Í... que indeferiu o pedido de ratificação do embargo extrajudicial por si realizado no dia 07 de abril de 2014 aos trabalhos de execução da via de acesso ao Parque de Ciência e Inovação (PCI), no lugar da C... , freguesia de SS... , concelho de Í... .
**
O RECORRENTE, terminou as respetivas alegações com as seguintes CONCLUSÕES de recurso:
A) Atento o disposto no artº 27.º,nº 1, al. h), conjugado com o disposto no artº 119º, ambos do CPTA, a reacção à Douta Sentença recorrida é o recurso e não a reclamação para a conferência como já se pronunciou esse venerando Tribunal, no Douto Acórdão de 28.06.2013, no Processo 00359/11.4BEPNF, cujo Relator foi o Exmº Senhor Desembargador Carlos Luís Medeiros de Carvalho (in www.dgsi.pt);
B) No entanto, e se assim não for entendido, uma vez que o presente recurso é interposto no terceiro dia útil posterior ao prazo de cinco dias, contado sobre a notificação da Douta Sentença recorrida, sempre o mesmo poderá ser convolado em reclamação para a conferência como prevista no nº 2 do artº 27º do CPTA, o que desde já expressamente se requer, embora a título meramente subsidiário, requerendo-se, também a título subsidiário, que caso assim se entenda seja a Requerente notificada para o pagamento da multa equivalente, correspondente a 40% da taxa de justiça que seria devida para o acto (caso não existisse isenção), ou seja, 40% de 20,00 € (vinte Euros).
C) A Douta Sentença agora Recorrida, além de fixar como improcedentes todas as excepções invocadas pelos Requeridos, fixou como verificados, no caso concreto, os pressupostos constantes do artº 120º/1/b) do CPTA (fumus non malus juris e periculum in mora) para o deferimento da providência cautelar requerida, tendo-se pois fundado apenas na ponderação entre o interesse que entendeu ser o público aqui em causa e o interesse que entendeu ser o interesse privado da Requerente para indeferir, como indeferiu, a requerida providência, tendo esse sido o único motivo para o indeferimento da requerida ratificação da providência, pelo que o presente recurso se restringe a essa matéria.
D) Como se referiu no petitório, a acção principal a interpor na sequência da presente providência cautelar será uma acção popular tendo por objecto a defesa da qualidade de vida e do ambiente através da declaração de ilicitude da realização das obras da via de acesso ao Parque de Ciência e Inovação (PCI) — no lugar da C... , da freguesia de SS... , do concelho de Í... , quer por violação do Despacho do Senhor Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território nº 1720/2011, de 15 de Dezembro de 2011, publicado no Diário da República 2ª, Série, nº 246, de 26 de Dezembro de 2011, quer mesmo por nulidade, ou ineficácia, por violação de Lei agrícola e ambiental aplicável, desse mesmo Despacho, e ainda da ilegalidade do regulamento do Plano Director Municipal de Í... , ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 140/99, de 12 de Outubro, publicada no Diário da República 1ª Série B, nº 258, de 05 de Novembro de 1999, e respectivas alterações, nos termos do aviso (extracto) n.º 6683/2010, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 63, de 31 de Março de 2010, e da ilegalidade da Declaração de Utilidade Pública proferida através da Declaração (Extracto) nº 44/2013, da Senhora Secretária de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa, publicada no DR, II Série, nº 44, de 04 de Março de 2013.
E) O objecto do pedido cautelar consubstanciou-se na prática dos actos materiais de execução da mencionada obra, assim como de todos os eventuais actos que ordenaram o seu início, em violação do mencionado despacho, assim como da Lei, em violação da qualidade de vida e da preservação do ambiente e do património agrícola nacional, isto ao abrigo do disposto no artº 112º, nºs 1 e 2, al f) do CPTA, pelo que também se enquadra no âmbito da acção popular, sendo a requerente uma associação que tem por objecto estatutário a defesa do ambiente e do património natural, constando da lista de organizações não governamentais do Ambiente (ONGA).
F) A defesa da qualidade de vida e da preservação do ambiente e do património agrícola nacional, assumida com o impulso processual destes autos, visou impedir as consequências práticas da violação de normas ambientais de carácter imperativo, melhor identificadas e admitidas como suficientemente indiciadas na Douta Sentença recorrida., sendo essa a razão por que o embargo foi feito e pedida a sua ratificação, e não a defesa de qualquer interesse privado seu ou de terceiros;
G) Entende pois a recorrente que, numa providência cautelar preliminar de uma acção popular a intentar ao abrigo do disposto na Lei 83/95, de 31 de Agosto, na qual perfunctoriamente se decidiu no sentido da sua não improcedibilidade manifesta, assim como na confirmação de ocorrência de prejuízos ambientais de difícil reparação, não se deve entender que se está entre um confronto entre interesses de natureza pública e privada, mas sim ante a defesa de um interesse público que, para além da consagração legal já enunciada na Douta Sentença Recorrida, tem consagração Constitucional (enquanto interesse público com dignidade Constitucional) na al. a) do nº 3 do artº 52º da CRP e, que, precisamente por isso, a situação em apreço nos autos não se subsume na previsão do nº 2 do artº 120º do CPTA.
H) A previsão desta norma tem como pressuposto a existência de um confronto, um conflito, entre interesses de natureza pública e interesses de natureza privada, o que não é o caso; Não estando prevista, nessa norma (artº 120º, nº 2 do CPTA) a situação em causa nos autos, também não deveria, na Douta Sentença a quo, ter sido aplicada a sua estatuição, ao contrário do que efectivamente sucedeu.
I) Assim, a Douta Sentença recorrida, ao entender, erradamente, que estavam em confronto interesses públicos e particulares, fez errada aplicação do mecanismo legal de ponderação de interesses previsto no nº 2 do artº 120º do CPTA, que aqui não deveria ter sido aplicado por os factos se não subsumirem à sua previsão, sendo certo que se impunha decisão diversa, a de não submeter a decisão proferida a tal mecanismo de ponderação; Tendo esse Venerando Tribunal Central Administrativo poderes legais para revogar a Douta Sentença nessa parte, desde já se requer que assim seja feito, decretando-se a ratificação da providência requerida, por verificação de todos os seus pressupostos legais nela já fixados.
Subsidiariamente,
Sem conceder, por mera cautela e dever de ofício, e apenas caso Vª Exªs doutamente entendam que é de aplicar in casu o mecanismo previsto e estatuído no nº 2 do artº 120º do CPTA, então ainda haveria a alegar o seguinte:
J) A presente providência é preliminar de uma acção popular a intentar ao abrigo do disposto na Lei 83/95, de 31 de Agosto, na defesa de interesses públicos com consagração Constitucional na al. a) do nº 3 do artº 52º da CRP, estando reconhecidamente intentada na defesa de um interesse público, em substituição dos competentes órgãos fiscalizadores da administração pública, que deveriam ter tomado medidas administrativas ou de polícia que visassem obter o mesmo efeito prático que aquele que se pretende na presente providência, mas que não foram tomadas, isto na defesa de uma legalidade imperativa cuja verificação foi perfunctoriamente reconhecida, cujo desrespeito é gerador de ilícitos, designadamente criminais e contra-ordenacionais como ficou especificado no Requerimento Inicial.
L) Nessa medida existe um, e apenas um interesse público a levar em consideração, que é a defesa da legalidade em matéria de dignidade constitucional e cuja violação constitui a prática de ilícitos sendo que, porém, tal interesse público está (reconhecidamente, na sentença recorrida), do lado da Requerente e não do lado dos Requeridos; Porém, a Douta Sentença recorrida, de forma manifestamente errada, tratou tal interesse como se um mero interesse privado fosse, levando-a ao cotejo com um pretenso interesse que por oposição considerou público.
M) Assim, caso se entenda que o nº 2 do artº 120º do CPTA é aqui aplicável, e a partir da perfunctória apreciação de Direito feita, deveria ter sido desde logo considerado público o interesse que a presente acção visa acautelar, sem necessidade de qualquer cotejo, o que erradamente não sucedeu, pelo que a Douta Sentença recorrida, ao ignorar a defesa do interesse público subjacente à presente providência, indeferindo-a por a considerar um interesse privado, quando na realidade sucede o contrário, fez errada aplicação do mecanismo legal de ponderação de interesses previsto no nº 2 do artº 120º do CPTA, sendo que a sua aplicação deveria, nem face do interesse público defendido na presente providência, e da sua natureza e dignidade, deveria ter sido feita, sim, mas tendo como consequência lógica o deferimento da providência, o que não sucedeu.
N) Razão porque ainda assim se impunha decisão diversa, a de, mesmo submetendo a decisão proferida a tal mecanismo de ponderação, declarar público, sem mais, o interesse defendido pela Requerente e, consequentemente, ratificar a providência, como acima já requerido.
Ainda subsidiariamente,
Sem conceder, por mera cautela e dever de ofício, e apenas caso Vª Exªs doutamente entendam que existe matéria de ponderação entre interesses públicos, e que tal ponderação pode ser feita ao abrigo do disposto no nº 2 do artº 120º do CPTA, então ainda assim também haveria a alegar o seguinte:
O) A Douta Sentença recorrida, na ponderação de interesses que fez, entre projectos de interesse público e criação de postos de trabalho, por um lado, e a defesa do meio ambiente, por outro, ignorou o facto, essencial, de a violação da legislação cuja possível violação perfunctoriamente reconheceu, se traduzir na prática de actos ilícitos, passíveis de responsabilidade contra-ordenacional ou até mesmo criminal, pelo que se suscita a questão de se poder, ou não, levar a cotejo interesses que, embora públicos, se admite que possam alicerçar-se na prática de actos ilícitos, mesmo eventualmente constituindo crimes, entendendo a Recorrente que tal não é possível.
P) A recorrente entende que nessa ponderação nem se deve chegar a fazer qualquer cotejo de interesses, confrontados que estejam, de um lado, o interesse público da defesa da legalidade de normas cuja violação se traduz em ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais, e do outro interesses que, ainda que na sua finalidade possam (o que neste caso até é mais que duvidoso) ser considerados públicos, mas que, numa análise perfunctória, se admite que possam alicerçar-se em ilícitos contra-ordenacionais, ou mesmo criminais.
Q) Certo é que na Douta Sentença recorrida tal cotejo foi feito, ainda por cima pendendo a favor desses interesses que perfunctoriamente podem ser considerados ilícitos contra-ordenacionais ou criminais, o que a Recorrente não pode aceitar.
R) Assim, a Douta Sentença recorrida, na ponderação de interesses públicos contraditórios ao abrigo do disposto no nº 2 do artº 120º do CPTA, fê-lo indevidamente dado que, submeteu a cotejo o interesse público da defesa da legalidade de normas cuja violação se traduz em ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais, e do outro interesses que, ainda que na sua finalidade possam (o que neste caso até é mais que duvidoso) ser considerados públicos, mas que, numa análise perfunctória, se admite que possam alicerçar-se em ilícitos contra-ordenacionais, ou mesmo criminais, cotejo esse que a referida norma, correctamente interpretada, não pode prever, razão porque também por isso se impunha decisão diversa, como acima já requerido.
Também subsidiariamente,
Sem conceder, por mera cautela e dever de ofício, e apenas caso Vª Exªs doutamente entendam que o disposto no nº 2 do artº 120º do CPTA permite o cotejo entre os interesses acima descritos, ainda que um deles seja a defesa da licitude penal e contra-ordenacional e o outro um interesse público, mas alicerçado em ilícitos dessa natureza, então ainda assim também haveria a alegar o seguinte:
S) Na Douta Sentença recorrida, muito embora os prejuízos de difícil reparação invocados pela Recorrente tenham sido minimamente quantificados (a perda de terra de aluvião agrícola e ecologicamente protegida, numa determinada profundidade e extensão), já a medida dos interesses públicos não o foi. Ou seja, o interesse dos Requeridos não foi quantificado da mesma forma, ficando-se os considerandos a esse respeito expendidos, na douta sentença, uma vaga enunciação de benefícios que, se no púlpito político podem ser as adequadas, no jurídico (ainda e sempre salvo o devido respeito, que é muito) não são suficientes para fazer, de forma minimamente objectiva e segura, pender um cotejo de interesses em favor destes últimos interesses.
T) Nessa medida, a Douta Sentença recorrida, ao fazer a ponderação de interesses e cotejo que fez, fazendo pender a decisão a favor dos interesses em confronto que menos consubstanciados se encontram, violou a regra de proporcionalidade inerente a essa ponderação, prevista no nº 2 do artº 120º do CPTA, que assim ficou violado, pelo que, se mais não houvesse, ainda assim se impunha decisão diversa, como acima já requerido”
Termina, requerendo o provimento do presente recurso e, em consequência, que seja revogada a decisão recorrida, concedendo-se a providência requerida.
**
O RECORRIDO não contra-alegou.
**
O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos previstos nos artºs 146º e 147º do CPTA, pronunciou-se sobre o mérito do presente recurso, pugnando pelo não provimento do mesmo e pela confirmação da decisão recorrida, nos termos que constam do seu parecer de fls. 340 a 353 dos autos [paginação física].
**
Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no art.º 36º, nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
**
II.FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
II.1 MATÉRIA DE FACTO
Da decisão recorrida resultam assentes os seguintes factos:
A). O teor dos “Estatutos da Q... – aprovados em Assembleia Geral a 30 de Outubro de 2010”, que aqui se dão por integralmente reproduzidos. – cfr. fls. 32 dos autos;
B). O teor do Aviso n.º 1427/2013, de 30 Janeiro, através do qual a Agência Portuguesa do Ambiente, IP torna pública a lista das organizações não-governamentais de ambiente e equiparadas, com inscrição activa no respectivo registo nacional até 31.12.2012, onde inclui a Requerente. – cfr. fls. 40 e 41 dos autos;
C). O teor dos “estatutos da PCI – Parque de Ciência e Inovação, SA.”, que aqui se dão por integralmente reproduzidos. – cfr. fls. 106 a 116 dos autos;
D). O teor do Aviso (extracto) n.º 6683/2010, de 31 Março, através do qual o Município de Í... publica a “alteração do Plano Director Municipal de Í…, da qual fazem parte a alteração do artigo 14º do Regulamento – Espaço para Equipamentos – e respectiva correspondência de alteração do uso da Planta de Ordenamento, para integração de um Equipamento Social na GN... e de um Equipamento – Parque de Ciência e Inovação em Í... , com a adequação das Plantas de condicionantes e RAN. (…)”, que aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 117 a 119 dos autos;
E). O teor do Despacho n.º 17270/2011, de 26 Dezembro do Secretário de Estado do Ambiente e Ordenamento do Território, que aqui se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“Pretende a Câmara Municipal de Í... construir a via de acesso à área destinada à construção do Parque de Ciência e Inovação (PCI), a levar a efeito na zona da C..., da cidade de Í... . Via esta que estabelecerá a ligação entre a Circular Norte de Í... e a área do PCI, englobando as respectivas ligações à rede viária existente.
Para o efeito pretende utilizar 14 638,98m2 de terrenos integrados na Reserva Ecológica Nacional do concelho de Í..., por força da delimitação constante da Resolução do Conselho de Ministros n.º 112/96, de 3 de Julho, publicada no Diário da República, 1.ª série -B, n.º 173, de 27 de Julho de 1996, alterada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 79/2000, de 1 de Junho, publicada no Diário da República, 1.ª série -B, n.º 155, de 7 de Julho de 2000.
Considerando a importância desta Via para a acessibilidade ao Parque de Ciência e Inovação (PCI) a construir na Zona da C... em Í…, a sua ligação à rede viária municipal existente e interligação com a futura ligação directa a A…;
Considerando que a disciplina constante do Regulamento do Plano Director Municipal de Í…, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 140/99, de 12 de Outubro, publicada no Diário da República, 1.ª série -B, n.º 258, de 5 de Novembro de 1999, e respectivas alterações, nos termos do aviso (extracto) n.º 6683/2010, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 63, de 31 de Março de 2010 (Alteração ao Regulamento, Planta de Ordenamento, Planta de Condicionantes e RAN), não obsta à concretização da obra;
Considerando que, para os referidos efeitos, se revela necessária a utilização de 23 383,17 m2 de terrenos integrados na Reserva Agrícola Nacional do concelho de Í…, tendo a pretensão merecido parecer favorável à ocupação, pela Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional do Centro, condicionado à execução do Parque de Ciência e Inovação;
Considerando que a Assembleia Municipal de Í..., reconheceu o interesse público municipal da construção desta infra -estrutura;
Considerando o parecer favorável emitido pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro;
Considerando que na execução do projecto, a Câmara Municipal de Í... deverá dar cumprimento aos condicionamentos e medidas de minimização expressos na ficha instrutória que consta do processo designadamente:
(…)
Considerando que as demais condicionantes legais e regulamentares em vigor não obstam à concretização do projecto:
Determina -se, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 21.º do Decreto -Lei n.º 166/2008, de 22 de Agosto, e no uso das competências delegadas pela Ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território no Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território, através do despacho n.º 12412/2011, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 181, de 20 de Setembro 2011, com a redacção que lhe foi conferida pela declaração de rectificação n.º 1810/2011, publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 227, de 25 de Novembro de 2011, o reconhecimento de relevante interesse público à construção da Via de acesso ao Parque de Ciência e Inovação (PCI) — no lugar da C…, da freguesia de SS.., do concelho de Í.... (…)” – cfr. fls. 42 dos autos;
F). O teor da “memória descritiva” da «via de acesso ao parque de ciência e inovação», datada de Janeiro de 2012, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 97 a 102 do processo administrativo;
G). Em 02.01.2012, foi apresentada “proposta de abertura de concurso” para a «via de acesso ao parque de ciência e inovação”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a qual foi aprovada por unanimidade, em 04.01.2012. – cfr. fls. 214 dos autos;
H). Em 12.01.2012, foi publicado o Anúncio de Procedimento n.º 113/2012, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta ser entidade adjudicante o Município de Í... e, ser objecto do contrato “construção de uma via de acesso direto ao futuro Parque de Ciência e Inovação, bem como um acesso local à zona poente da povoação da C...” – cfr. fls. 215 a 216 dos autos;
I). Em Março de 2012, foi deliberado adjudicar o contrato mencionado no ponto que antecede ao candidato MFA, SA., conforme teor da deliberação que aqui se dá por reproduzida. - cfr. fls. 218 dos autos;
J)..O teor da «nota de imprensa n.º 24 – Gabinete do Presidente» da Câmara Municipal de Í... , que aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 219 a 223 dos autos;
K). O teor da Declaração (extracto) n.º 44/2010, de 5 Março da Secretária de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte: “a pedido da Câmara Municipal de Í... , declarou a utilidade pública urgente da expropriação das parcelas a seguir referenciadas …” – cfr. fls. 120 e 121 dos autos;
L). Em 11.12.2013 foi celebrado um “contrato de financiamento” entre a Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Centro e a sociedade PCI – Parque de Ciência e Inovação, SA., cujo teor, e dos respectivos anexos, aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 43 a 71 dos autos;
M). Em 19.12.2013, este Tribunal proferiu sentença no âmbito do processo cautelar que correu termos sob o n.º 371/13.9BEAVR, cujo teor aqui se dá por reproduzido. – cfr. fls. 73 a 105 dos autos;
N). No dia 07.04.2014, um representante da Requerente embargou extrajudicialmente as obras de construção da via de acesso ao Parque da Ciência e Inovação. – por acordo;
O). No dia 07.04.2014, foi publicitada a «nota de imprensa n.º 39» da Câmara Municipal de Í..., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e, da qual consta, além do mais, o seguinte: “A Câmara Municipal de Í... foi informada de que o Núcleo Regional de A… da Q... – A.N.C.N. terá embargado extrajudicialmente a obra de construção da via de acesso ao Parque da Ciência e Inovação (PCI), embargo esse feito na pessoa dos responsáveis pela empresa a quem aquela obra foi adjudicada.
(…)
No entanto,
i. Esta madrugada, concretamente às 5.52h da manhã, o Núcleo Regional de A… da Q... informou a CMI que mantém há algum tempo a contestação à pretensão de destruição dos terrenos agrícolas da C... e que, perante a evidência das marcações no terreno e das máquinas ali presentes, iria proceder ao embargo extrajudicial da obra que, no seu entendimento e segundo a análise jurídica que fez, é irregular à luz da legislação em vigor.
ii. Adianta o NRA da Q... que já alertou há algum tempo, com denúncias concretas junto das entidades competentes, para irregularidades e ilegalidades no processo, mas não recebeu ainda nenhuma resposta e imagina que as tomadas de decisão levem o seu tempo.
iii. Não lhe resta por isso outra alternativa que não seja proceder o embargo da obra para dar tempo a que as denúncias sejam averiguadas e, ao mesmo tempo, pedir ainda a avaliação do poder jurídico sobre esta situação (sic).
iv. Mais informa (recordamos que às 5: 52h quando os trabalhos na obra deveriam reiniciar-se às 9:00h) que permaneceria no local, impedindo as máquinas de iniciarem os seus trabalhos enquanto o Presidente da Câmara ou alguém em sua representação oficial, não se deslocasse ao local. (…)
(…) está o Município de Í... convencido da legalidade e regularidade forma de todo o procedimento de materialização da empreitada de construção daquela via de acesso ao PCI, cujas obras se iniciaram no passado dia 1 de abril de 2014, pelo que, atentos também os avultados encargos associados a uma eventual suspensão dos trabalhos – que terão de ser imputados aos seus responsáveis na eventualidade de estes virem a ser efetivamente suspensos – a Câmara Municipal de Í... não procedeu a qualquer suspensão dos mesmos. (…)”. – cfr. fls. 28 e 29 dos autos;
P). Em 07.04.2014, a Requerente intentou neste Tribunal uma providência cautelar que corre termos sob o processo n.º 374/14.6BEAVR, em que também é Requerido o Município de Í... e, cujo teor da petição inicial aqui se dá por integralmente reproduzido. – cfr. fls. 177 a 197 dos autos;
Q). Com data de 08.04.2014, a Requerente dirigiu ao Posto da GNR de Í... uma carta, sob o “assunto: Solicitação de intervenção da GNR no processo de embargo extrajudicial da obra da Câmara Municipal de Í... – construção da via de acesso ao PCI”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 30 e 31 dos autos;
R). O teor do Aviso n.º 5423/2014, de 29 de Abril, através do qual o Município de Í... publica a “a versão final do processo de revisão do PDM de Í..., …”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. - cfr. fls. 198 a 209 dos autos;
S). O teor das plantas que se referem a “extracto da integração da via de acesso ao PCI no atual PDM de Í... ”, “condicionantes: planta geral” e, “condicionantes: planta REN”, que aqui se dão por integralmente reproduzidas. - cfr. fls. 210 213 dos autos;
T). As fotografias, cujas imagens aqui se dão por reproduzidas. - cfr. fls. 22 a 27 dos autos;
U). Com data de 05.05.2014, a Mais Centro – Programa Operacional Regional do Centro dirigiu à Associação Cívica, Colectivo de Intervenção de Defesa dos Interesses dos Habitantes da C..., o ofício com a referência “maiscentro 920/14”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(…) sobre a aprovação do financiamento do projeto mencionado em epígrafe, temos a referir que a Comissão Directiva do Mais Centro ainda não deliberou sobre a questão relativa ao cumprimento pelo Parque de Ciência e Inovação, SA. (P.C.I.) das condições apostas na cláusula sexta do contrato de financiamento, (…)”. – cfr. fls. 245 dos autos;
V). Com data de 08.05.2014, a Câmara Municipal de Í... dirigiu à Associação Cívica, Colectivo de Intervenção de Defesa dos Interesses dos Habitantes da C... , um ofício, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(…) 1. O pedido de licenciamento do loteamento da área de intervenção do PCI …, deu entrada …no dia 15 de Abril de 2014, encontrando-se em fase de apreciação.
2. Não foi apresentado pela PCI - Parque da Ciência e Inovação, SA. qualquer pedido de licenciamento municipal de obras de edificação.
(…)
Não é possível emitir certidão dos alvarás de licenciamento do loteamento e obras de urbanização e dos edifícios referidos no ponto anterior, dado que não foi emitido qualquer alvará. (…)”. – cfr. fls. 2453 e 244 dos autos; W). A via de acesso em causa na presente lide terá uma extensão de cerca de 800 m. – por acordo (cfr. artigo 20º requerimento inicial e 112º, 113º e 114º da oposição).
Z). O requerimento inicial da presente lide foi apresentado em juízo, via «SITAF», no dia 10.04.2014. – cfr. fls. 1 dos autos;
***
II.2 - O DIREITO.
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, tendo presente que o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º todos do Código de Processo Civil (CPC), na redação conferida pela Lei n.º 41/2013, “ex vi” art. 140º do CPTA, e bem assim, conforme o disposto no art.º 149º do CPTA nos termos do qual ainda que o tribunal de recurso declare nula a sentença decide do objeto da causa de facto e de direito.
*
QUESTÕES A DECIDIR:
Como decorre da motivação do recurso e respetivas conclusões, as questões suscitadas de que cumpre tomar conhecimento passam por saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por, após ter julgado verificados os requisitos do non fumus malus iuris e do periculum in mora:
(i) o tribunal a quo ter ainda recorrido à ponderação de interesses a que se reporta o n.º2 do artigo 120.º do CPTA, como critério a atender na decisão a proferir sobre a providência cautelar requerida;
(ii) subsidiariamente, caso se entenda que para a concessão da providência requerida o tribunal a quo tinha de efetuar a ponderação de interesses prevista nessa norma, saber se a sentença tratou, de forma errada, o interesse defendido pela requerente cautelar, ora Recorrente, como se de um mero interesse privado se tratasse, levando-a ao cotejo com um pretenso interesse que por oposição considerou público.
(iii) subsidiariamente, caso se entenda haver ponderação entre interesses públicos, saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento por ter submetido a cotejo o interesse público defendido pela Recorrente, cuja violação pode conduzir à prática de ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo de crimes, com o interesse público defendido pela Recorrida;
(iv) Por fim, e subsidiariamente, caso se entenda que esse cotejo é possível, saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por não ter considerado devidamente a falta de concretização do interesse público invocado pela Recorrida.
Vejamos.
A requerente cautelar, ora Recorrente, dirigiu ao TAF de Aveiro pedido de ratificação de embargo extrajudicial das obras de construção da via de acesso ao identificado Parque da Ciência e Inovação (PCI), tendo aquele tribunal, após concluir pela não verificação do manifesto fumus boni iuris contemplado na alínea a) do nº1 do artigo 120º do CPTA e pela verificação dos requisitos do non fumus malus iuris e do periculum in mora previstos na alínea b) do n.º1 do artigo 120.º do CPTA, decidido que não se encontrava preenchido o pressuposto da ponderação de interesses exigido pelo n.º2 do art.º 120.º, necessário para o decretamento da providência requerida, razão pela qual indeferiu a sua concessão.
É contra este julgamento que a Recorrente se insurge.
Antes de iniciarmos a análise das questões colocadas pela Recorrente, importa proceder a um enquadramento geral, ainda que breve, sobre os pressupostos de que depende o decretamento das providências cautelares no contencioso administrativo, ao abrigo do regime legal estabelecido no Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA].

O artigo 120.º do CPTA fornece-nos os critérios que presidem à concessão de providências cautelares, aí se consignando que:
“1 – Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adoptadas:

a) Quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente;

b) Quando, estando em causa a adopção de uma providência conservatória, haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito;

c) Quando, estando em causa a adopção de uma providência antecipatória, haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.

2 – Nas situações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior, a adopção da providência ou das providências será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que possam resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

3 – As providências cautelares a adoptar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, podendo o tribunal, ouvidas as partes, adoptar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado a evitar a lesão desses interesses e seja menos gravoso para os demais interesses, públicos ou privados em presença.

4 – Se os potenciais prejuízos para os interesses, públicos ou privados, em conflito com os do requerente forem integralmente reparáveis mediante indemnização pecuniária, o tribunal pode, para os efeitos do disposto no número anterior, impor ao requerente a prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária.

5 – Na falta de contestação da autoridade requerida ou da alegação de que a adopção das providências cautelares pedidas prejudica o interesse público o tribunal julga verificada a inexistência de tal lesão, salvo quando esta seja manifesta ou ostensiva.

6 – Quando no processo principal esteja apenas em causa o pagamento da quantia certa, sem natureza sancionatória, as providências cautelares são adoptadas, independentemente da verificação dos requisitos previstos no n.º 1, se tiver sido prestada garantia por uma das formas previstas na lei tributária.”

Decorre do disposto na transcrita alínea a) do n.º1 do art.º 120.º do C.P.T.A., que o tribunal decretará a providência cautelar requerida sempre que, mediante um juízo perfunctório possa concluir, sem necessidade de maiores indagações, que é manifesta a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal.

A este respeito, a jurisprudência nacional tem sustentado que «a concessão das providências cautelares ao abrigo do art. 120.º, n.º1, al. a) do CPTA, exige que se esteja perante ilegalidades captáveis “de visu”, isto é, detectáveis num primeiro olhar, que dispense um elaborado “iter” demonstrativo- pois só assim elas serão evidentes ou manifestas»- [cfr. Ac. do STA, de 12.02.2009, processo n.º 022/09], ou, conforme se afirma no acórdão do STA, de 22/10/2008, proferido no processo n.º 0396/08 que a ilegalidade detetada seja líquida, salte à vista, não ofereça qualquer dúvida.

Nas situações em que resulte evidente a procedência da pretensão formulada, ou a formular no processo principal, a providência é concedida sem mais. Trata-se de situações de máxima intensidade da aparência de bom direito ou fumus boni iuris, surgindo este como único fator relevante para a concessão ou não da providência, pelo que deverá ser decretada quase automaticamente, sem necessidade de fundamentar a decisão cautelar por referência aos requisitos das alíneas b) e c) do n.º1 e do n.º2 do art.º 120.º do CPTA e, portanto, dispensando-se a ponderação de interesses públicos e privados e o juízo de proporcionalidade quanto à decisão da providência, porque o critério da evidência incorpora já a salvaguarda de tais interesses (do interesse público, porque a Administração não pode praticar atos ilegais, e dos interesses particulares, porque têm direito a que a sua situação seja legalmente apreciada e conformada).

No caso, o tribunal a quo começou por analisar se, na situação em apreço, se mostrava preenchido o requisito previsto na alínea a), do n.º1 do art.º 120.º do CPTA, como se lhe impunha que fizesse, uma vez que, caso concluísse ser evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular na ação principal, a providência seria concedida automaticamente, sem necessidade de atender a quaisquer outros requisitos.

Tendo concluído, como se constata que sucedeu, pela não verificação do referido requisito, o tribunal a quo passou a analisar se estavam verificados os requisitos da alínea b) do n.º1 do artigo 120.º [o non fumus malus iuris e do periculum in mora] e em resultado desse exercício, deu como preenchidos os identificados pressupostos.

Na presente instância recursiva, a Recorrente não põe em crise a decisão recorrida quanto ao que nela se sentenciou sobre a não verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º1 do art.º 120.º do CPTA e sobre a verificação dos requisitos da alínea b) do n.º1 desse mesmo preceito [non fumus malus iuris e periculum in mora], pelo que, quanto aos mesmos, a decisão recorrida transitou em julgado.

O que o Recorrente questiona é o facto do tribunal a quo ter recorrido ao critério da ponderação de interesses previsto no n.º2 do artigo 120.º do CPTA e o modo como se procedeu à ponderação dos interesses envolvidos na providência cautelar requerida.

Em primeira linha, a Recorrente insurge-se contra a necessidade de ser considerado o critério da ponderação de interesses acolhido no n.º2 do artigo 120.º do CPTA, na concreta providência cautelar requerida, por entender que estando em causa, da sua banda, a defesa de um interesse público e não de um interesse privado, aquela ponderação não se justificar. É que, a seu ver, a previsão da norma do n.º2 do artigo 120.º do CPTA «tem como pressuposto a existência de um confronto, um conflito, entre interesses de natureza pública e interesses de natureza privada, o que não é o caso. Não estando prevista, nessa norma, …a situação em causa nos autos, também não deveria, na Douta Sentença a quo, ter sido aplicada a sua estatuição, ao contrário do que efectivamente sucedeu».

Não lhe assiste razão.

Nos termos gizados pelo n.º2 do artigo 120.º do CPTA “Nas situações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior, a adopção da providência ou das providências será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que possam resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências”.

O que resulta da norma em referência é que, para a concessão das providências cautelares que não sejam automaticamente deferidas nos termos da alínea a) do n.º1 do artigo 120.º do CPTA, em adição aos requisitos previstos na alínea b) ou c), do n.º1 do mesmo preceito [conforme a providência requerida seja conservatória ou antecipatória], o legislador exige ainda que seja efetuada uma ponderação dos interesses envolvidos na concreta situação, de tal modo que a providência deve ser recusada se, num juízo de prognose, se concluir que os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores aos danos que resultariam da sua recusa.

Como salientam MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2010, 3.ª edição, Almedina, pág. 810 “o n.º 2 vem acrescentar uma cláusula de salvaguarda neste domínio, permitindo que, no interesse dos demais envolvidos a providência ainda seja recusada quando, pese embora o preenchimento, em favor do requerente, dos requisitos previstos na alínea b) ou na alínea c) do n.º 1, seja de entender que a sua adopção provocaria danos (ao interesse público e de eventuais terceiros) desproporcionados em relação àqueles que se pretenderia evitar que fossem causados (à esfera jurídica do requerente).

Conforme é unanimemente entendido, o critério da ponderação de interesses inserto no n.º2 do art.º 120.º do CPTA, visa assegurar uma ponderação equilibrada, proporcional e equidistante dos diversos interesses em presença, não sendo, por conseguinte, uma qualquer lesão do interesse público que é apta a afastar a possibilidade de ser decretada a providência requerida.

Como refere CHINCHILA MARIN, in “El derecho a la tutela cautelar como garantia de la efectividade de las resoluciones judiciales”, in RAP, n.º131, 1993, pág. 163 «…o interesse público há-de ser específico e concreto, ou seja, diferenciado do interesse genérico da legalidade e eficácia dos actos administrativos». Ou nas palavras de ANA GOUVEIA MARTINS, in Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo, Coimbra Editora, pág.516 “ Não se trata do interesse público presente no fim de qualquer actuação administrativa, mas de um interesse público qualificado, de especial significado, que exige, no caso concreto, a não concessão da providência cautelar»

Daí que, estando em causa factos impeditivos da concessão da providência cautelar, seja, em princípio, sobre o requerido que recai o ónus da alegação e prova da superioridade dos interesses, públicos e privados, contrapostos aos do requerente, como se intui, aliás, do regime legal estabelecido no n.º 5 do artigo 120.º do CPTA, onde se determina que “Na falta de contestação da autoridade requerida ou da alegação de que a adopção das providências cautelares pedidas prejudica o interesse público, o tribunal julga verificada a inexistência de tal lesão, salvo quando esta seja manifesta ou ostensiva”.

Posto isto, contrariamente à tese perfilhada pela Recorrente, não pode afastar-se a possibilidade de a um interesse público concreto na recusa da providência se contrapor um outro interesse público, igualmente específico, na sua concessão. É que, como bem atesta a realidade da vida, de que o caso sujeito a julgamento é ilustrativo, não existe um interesse público em abstrato, mas uma heterogeneidade de interesses públicos, muito vezes conflituantes entre si.
A este respeito, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in ob. cit., pág.813, esclarecem que “Como tem sido assinalado na doutrina, são cada vez mais frequentes as situações que envolvem uma multiplicidade de interesses públicos e privados conflituantes e em que o requerente, seja ele o Ministério Público, uma associação ambiental ou um grupo de moradores, se move em defesa de interesses públicos, porventura contrapostos a outros interesses públicos que determinaram a actuação da Administração e a interesses privados, por vezes significativos, que foram beneficiados por essa actuação”.

Nada impede, assim, que no juízo a efetuar sobre a ponderação dos interesses envolvidos no decretamento de uma providência cautelar requerida, o julgador se veja confrontado com a presença de interesses públicos conflituantes e que seja em relação a tais interesses públicos que o mesmo se veja compelido a efetuar a ponderação a que se alude no n.º2 do art.º 120.º do CPTA, sopesando os riscos que a concessão da providência pode acarretar para o interesse público sacrificado com a dimensão dos danos que a sua recusa pode causar ao interesse público prosseguido pelo requerente da providência cautelar.

Isto dito, para concluir que o tribunal a quo não podia deixar de atender ao disposto no n.º2 do artigo 120.º do CPTA na decisão a proferir sobre a providência requerida, sem o que estaria a decidir contra legem, em clara e frontal violação da lei aplicável.
Improcede, por conseguinte, o apontado fundamento de recurso.

Em segunda linha, a Recorrente insurge-se contra a decisão recorrida, por, uma vez lançado mão do critério da ponderação de interesses previsto no n.º2 do artigo 120.º do CPTA, o tribunal a quo, de forma manifestamente errada, ter considerado o interesse por si defendido como se de um mero interesse privado se tratasse, levando-a ao cotejo com um pretenso interesse que por oposição considerou público.

A este respeito, importa, prima facie, atender à decisão recorrida na qual se consignou que «Desta feita, agora importa realizar a competente ponderação entre interesses públicos e privados, considerando para o efeito se “os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa”, à luz do estatuído no n.2 do artigo 120º do CPTA.
A este respeito, invoca a Requerente, que estão contrapostos os interesses de construção de uma via que serve uma infra-estrutura particular e que visa a satisfação de interesses privados e, a protecção de um solo agrícola insubstituível, garante de independência nacional no plano alimentar nacional, além de constituir “um património ecológico único em todo o país – a ria de a… e suas adjacentes -.”
Ao invés, o Requerido sustenta “o interesse público subjacente a um Projecto com estas características (a via de acesso é complementar e essencial para assegurar a qualidade de vida dos munícipes durante a execução da empreitada de construção e a operação do Parque da Ciência e Inovação)”, sendo o projecto do PCI de “reconhecido relevo nacional e internacional, orientado para a produção científica, tecnológica e educativa, nas mais diversas áreas.”, propondo-se “criar conhecimento e emprego”.
Refere ainda que, nos termos do contrato de financiamento celebrado entre a sociedade PCI, SA. e a autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Centro, a obra tem de estar concluída a 30.06.2015 e que, o incumprimento de tal prazo pode conduzir à rescisão do dito contrato e, afirma, consequentemente ao fim do projecto em causa.
Mais invoca que a execução da via em presença se reveste da maior importância, porquanto tendo em conta a sobrecarga de meios de transporte e circulação diária, aquando da construção do próprio Parque da Ciência e Inovação, será esta via de acesso “determinante na agilização dos meios de trabalho … para garantir a sustentabilidade das acessibilidades e a qualidade de vida e conforto dos nossos cidadãos”, o que, em suma, conclui, constitui uma das atribuições do Município.
Adicionalmente, invoca que a Requerente não concretiza, nem demonstra a prevalência dos interesses pelos quais pugna, questionando, mesmo, se face à extensão de 800 m da via de acesso, esta será apta a comprometer os interesses aqui defendidos pela Requerente.
Analisemos.
Com efeito, considerando os interesses em presença, o Tribunal julga que o interesse público invocado pelo Requerido, o qual se traduz, de facto, (i) na prossecução de um projecto de interesse público, que visa, além do mais, (ii) a criação de postos de trabalho (diga-se que, muitos ou poucos, serão sempre mais que os existentes, o que releva, especialmente, numa época em que o desemprego flagela o nosso País) e que, (iii) a via em causa será “uma infraestrutura indispensável para a boa sustentabilidade das acessibilidades ao PCI” [cfr. ponto J) do probatório], é prevalecente.
Por outro lado, acresce que estando prevista uma desafectação/ utilização de terrenos de REN e de RAN, respectivamente, de 14 638,98 m2 e 23 383,17m2 [cfr. ponto E) do probatório – despacho n.º 17270/11], não se afigura ao Tribunal que a execução de uma via com 800m de extensão seja susceptível de colocar em causa o património ecológico único no País e, bem assim, de por em causa a independência nacional no plano alimentar.
De facto, sendo certo que o ambiente e o património ecológico do País e, em concreto, de uma determinada zona serão, sempre que possível, de preservar, a verdade é que, mesmo atento o princípio da prevenção – pilar do Direito do Ambiente – não redunda, sempre, sem mais, na inexistência de lesões no ambiente. Ao invés, daquele princípio resulta ser necessário proceder a um juízo de razoabilidade, evitando que prevenção implique a evitação de todo e qualquer dano, mas sim, que exija uma análise ponderada que identifique os riscos e minimize os danos [cfr. ponto F) do probatório, maxime ponto 9).
É que, na realidade a maior parte das vezes, face à pretendida protecção ambiental, contrapõe-se o direito de iniciativa económica, que visa o desenvolvimento económico e social de uma determinada zona. Assim, ambos os direitos, não sendo absolutos, haverão de comprimir-se, compatibilizando-se e, cedendo, na medida do necessário, adequado e proporcional, com vista à conjugação de todos os interesses em presença.
Posto isto, na ponderação dos interesses públicos e privados em presença, julga o Tribunal, atenta a fundamentação espraiada, que os danos que resultariam da concessão da providência requerida serão superiores aos que poderão advir da sua recusa.

Em suma, face à factualidade apurada e enquadramento legal expendido, decide-se não ratificar o embargo extrajudicial efectuado pela Requerente, objecto da presente providência cautelar.”

Se bem cuidarmos de analisar a decisão recorrida e de a considerar na sua substância, o que dela se extrai é que a senhora juiz a quo considerou o interesse defendido pela requerente cautelar, ora Recorrente, como um interesse público, e não como um mero interesse privado, na medida em que expressamente o identificou como sendo o interesse na defesa do ambiente e do património ecológico do país, não ignorando a senhora juiz a quo, como de resto o não pode ignorar nenhum jurista, que a defesa da qualidade de vida e da preservação do património agrícola nacional representa um interesse público relevante, com consagração constitucional na al. a) do n.º3 do art.º 52-º.E foi este específico interesse público [encabeçado pela Recorrente] que foi ponderado na decisão recorrida por contraposição ao interesse público do requerido cautelar, ora Recorrido [construção da mencionada via de acesso ao Parque de Ciência e Inovação (PCI), no lugar de C..., da freguesia de SS..., do concelho de Í...], pese embora na decisão recorrida o mesmo venha nominado como sendo o «interesse privado» a ponderar para efeitos da contraposição ao interesse público, o que, a nosso ver, apenas sucede por força da terminologia usada no n.º2 do artigo 120.º do CPTA.
Não se ignora, pois, que na decisão recorrida a senhora juiz a quo escreveu, a dado passo, como supra se viu, que «na ponderação dos interesses públicos e privados em presença, julga o Tribunal, atenta a fundamentação espraiada, que os danos que resultariam da concessão da providência requerida serão superiores aos que poderão advir da sua recusa», pelo que, se nos ativermos à mera literalidade da decisão in crisis, a mesma aponta no sentido da consideração dos interesses defendidos pela requerente cautelar, ora Recorrente, como interesses privados. Porém, e como já deixamos afirmado, não é essa a real conclusão que se extrai do repositório argumentativo usado na decisão recorrida quando se atenta no balanceamento que foi realizado entre os interesses envolvidos, e onde, conforme supra se deixou evidenciado, o interesse prosseguido pela Recorrente foi claramente identificado como o interesse na defesa do ambiente e do património ecológico do país, que é, por natureza, um interesse público.
Assim, a referência que na decisão recorrida é feita a «interesses privados» mais não é do que o resultado de uma imprecisão terminológica, influenciada e determinada pela terminologia legal usada no n.º2 do art.º 120.º do CPTA que, em termos estritamente literais, apenas contrapõe ao interesse público o interesse privado.
Termos em que improcede o referido fundamento de recurso.

Em terceiro lugar, a Recorrente demarca-se da decisão recorrida por considerar que, mesmo admitindo-se que na ponderação de interesses realizada pelo tribunal a quo ao abrigo do n.º2 do artigo 120.º do CPTA, o interesse por si prosseguido foi valorado como um interesse publico e não como um mero interesse privado, a mesma incorreu em erro de julgamento por ter levado a cotejo o interesse público por si prosseguido com o interesse público defendido pelo ora Recorrido, uma vez que, a seu ver, não pode fazer-se qualquer cotejo entre interesses públicos quando de um lado esteja em causa o interesse público da defesa da legalidade de normas cuja violação se traduz em ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais, cotejo esse que a referida norma, corretamente interpretada, não pode prever.

Pretende a Recorrente, que o tribunal a quo não podia contrapor o interesse público por si defendido ao interesse público defendido pela ora Recorrido, porquanto a violação do interesse público cuja proteção visava obter com a concessão da providência requerida pode traduzir-se na prática de ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais. Dito de outro modo, o que a Recorrente pretende fazer crer ao tribunal ad quem é que a recusa da concessão da providência por si requerida, traduzida, recorde-se, na ratificação do embargo extrajudicial das obras de construção da via de acesso ao PCI tem como consequência que, prosseguindo as referidas obras, serão violadas normas de que resultarão a prática de ilícitos contra-ordenacionais, ou mesmo criminais, danos que se mostram superiores aos que resultariam da concessão da providência.

Sucede que, para além da menção vaga e genérica que a Recorrente faz ao perigo de serem praticados ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais, uma vez que a mesma não cuidou de especificar ou densificar que concretos ilícitos são esses, não se pode olvidar que na ponderação de interesses a ter em conta para efeitos da concessão de uma providência cautelar o interesse público a considerar não é o interesse publico geral, prosseguido pelo Estado, no sentido de que não sejam adoptados comportamentos desviantes relativamente ao que se considera ser “o dever ser”, mas como supra se mencionou, « um interesse público qualificado, de especial significado”.
Ora, no caso, não foi para evitar a prática de eventuais ilícitos contra-ordenacionais ou mesmo criminais que a Recorrente lançou mão da presente providência cautelar, mas para evitar a lesão do ambiente e do património agrícola que entende estar associado à construção da via de acesso ao PCI. O interesse público cuja tutela a Recorrente pretende garantir com a presente providência é que não sejam produzidos danos concretos no ambiente de que resultem prejuízos para o interesse da coletividade no desfrute de um ambiente que lhe propicie qualidade de vida.

Assim sendo, o apontado fundamento de recurso não tem qualquer consistência para abalar o acerto da decisão recorrida no balanceamento que efetuou entre os interesses em jogo nesta concreta situação, que identificou e considerou corretamente.

Assim sendo, as razões em que a senhora juiz a quo se louvou para considerar serem superiores os danos que resultariam da concessão da providência cautelar para o interesse público do que os decorrentes da sua não concessão, não merecem nenhuma censura da nossa parte.

Por fim, a Recorrente insurge-se contra a decisão recorrida, considerando que a mesma enferma de erro de julgamento, por ter considerado o interesse público defendido pelo requerido cautelar, ora Recorrido, prevalecente em relação ao interesse público que pretendia ver assegurado, sem que os prejuízos invocados pelo Recorrente tenham sido quantificados da mesma forma que foram os por si invocados, afirmando que a decisão recorrida se queda por uma vaga enunciação de benefícios que, se no púlpito político podem ser as adequadas, no jurídico não são suficientes para fazer, de forma minimamente objectiva e segura, pender um cotejo de interesses em favor destes últimos interesses.

Desde já se antecipa que não vemos razão para divergir do que foi decidido pelo tribunal a quo, tendo em conta a fundamentação que consta da decisão recorrida e que supra se teve o ensejo de transcrever, e para cuja consideração se remete.

A fim de melhor explicitarmos a razão da nossa concordância com o decidido pelo tribunal a quo, relembremos os factos que foram alegados pelo requerido cautelar, e que foram considerados assentes, relevantes para a determinação da amplitude do interesse público por si defendido.
Assim, resulta da matéria de facto assente que:
(i) o Parque de Ciência e Inovação é um projeto de reconhecido relevo nacional e internacional, que se encontra orientado para a produção científica, tecnológica e educativa, nas mais diversas áreas e que no contexto atual em que Portugal se encontra o mesmo propõe-se atrair e fixar recursos altamente qualificados, criar conhecimento e emprego [cfr. alínea L) da matéria de facto assente, que dá por reproduzido o teor do contrato de financiamento celebrado entre o PCI e a Autoridade de Gestão do Programa Operacional Regional do Centro e seus anexos, constando de fls. 52 e 53, designadamente, o seguinte:«1. Enquadramento do Projeto.
(…) Com este investimento procura-se estimular e gerir fluxos de conhecimento e de tecnologias entre o Sistema Científico e Tecnológico, o tecido empresarial e o mercado nacional e internacional, potenciando a criação e o crescimento de empresas, baseadas na inovação e o reforço da competitividade regional nas áreas das TICE, Energia/Mar e Materiais/Agroindustrial…
2.2. (…)
Com este cinco programas pretende-se fomentar o empreendedorismo e a dinamização e internacionalização da economia intensiva em conhecimento, a aproximação entre os centros de produção de conhecimento e o tecido empresarial e promover estratégias de desenvolvimento inteligente da região»];
(ii) que já foi concluída a etapa de aquisição dos terrenos necessários à sua implantação, devendo a obra estar concluída em 30 de junho de 2015 [cfr. alínea L) da matéria de facto assente, cláusula 3.ª do contrato de financiamento aí dado por reproduzido];
(iii) que o incumprimento daquele prazo pode conduzir à rescisão do contrato de financiamento e ao fim daquele projeto [cfr. alínea L) da matéria de facto assente, cláusula 14.ª, 2, al.a), do contrato de financiamento aí dado por reproduzido;
(iv) que a execução material da via de acesso em causa cumpre um papel determinante na agilização dos meios de trabalho ao facultar a disponibilidade de uma infraestrutura rodoviária indispensável para garantir a sustentabilidade das acessibilidades e a qualidade de vida e conforto dos cidadãos [cfr. alíneas E) e F) da matéria de facto assente];
(v) que a empreitada em causa orçou em 667.235,44€ (+ 6% de IVA), sendo o respectivo prazo de execução de 120 dias [cfr. alíneas G), H) e I) da matéria de facto assente];
(vi) que a via de acesso em causa na presente lide terá uma extensão de cerca de 800 m [cfr.alínea W) da matéria de facto assente].

Partindo deste quadro factual, o que o mesmo nos revela é que o interesse público defendido pelo requerido cautelar, ora Recorrido, assume significativa relevância. E no confronto com o interesse público que a requerente cautelar, ora Recorrente, pretende assegurar, propendemos para considerar serem de maior relevância os prejuízos que resultarão da ratificação do embargo extrajudicial para o interesse público do que os prejuízos que decorrem da sua não ratificação para os interesses públicos, de natureza ambiental, que a requerente visa proteger. É que, como bem refere o Ministério Público, no seu douto parecer, o deferimento da pretensão cautelar formulada nos autos «impedirá o Município de iniciar as obras necessárias à execução do projecto em apreço, com as consequências já mencionadas, e ponderados os interesses públicos acabados de referir, ressalta com clareza a prevalência destes face ao interesse invocado pela recorrente, não devendo, em consequência, ser proferida decisão de adopção da providência requerida».

Em face do que vem afirmado, nenhuns motivos se lobrigam para não acompanharmos a ponderação, certeira e criteriosa, que a este respeito foi encetada pelo tribunal a quo.

Termos em que improcede o invocado fundamento de recurso.

*
III. DECISÃO:
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente em ambas as instâncias, sem prejuízo da isenção que beneficia- artigo 539.º do CPC e art.º 4.º, n.º1, alínea b) do RCP.
Notifique.
DN.
**
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 131º nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º do CPTA).
**
Porto, 24 de outubro de 2014
Ass.: Helena Ribeiro
Ass.: Alexandra Alendouro
Ass.: João Beato Sousa