Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00665/15.9BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/12/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:SUPLEMENTO REMUNERATÓRIO; MÉDICOS USF; UNIDADES CONTRATUALIZADAS; SUBSTITUIÇÃO DE MÉDICO
Sumário:
1 – O Tribunal ao aplicar o regime legal vigente, bem como Despacho proferido por Secretário de Estado, não impugnado, à situação da Recorrida, fez o que lhe competia, sendo que esta, entendendo que o regime estabelecido se mostrava inadequadamente aplicado à sua situação, sempre teria de o demonstrar, não se podendo refugiar na simples afirmação conclusiva de que o referido Despacho lhe não é aplicável.
2 – Tendo reconhecidamente o Tribunal decidido em função, designadamente, do referido Despacho do Secretário de Estado, e não contestando a Recorrente o seu conteúdo, mas singelamente entendendo, sem que tenha logrado demonstra-lo, que o mesmo não lhe é aplicável, não merece assim censura a decisão proferida no sentido do referido regime lhe ser aplicável.
3 – A substituição de um médico entretanto aposentado numa USF, não significa que o clinico que o venha a substituir tenha de auferir exata e necessariamente o que aquele auferia, mormente ao nível dos suplementos remuneratórios percebidos, pois que terá de se atender à situação pessoal e funcional do substituto que não coincidirá com aquela que o anterior titular detinha, não havendo uma mera sucessão e equivalência funcional e remuneratória entre o médico substituído e o seu substituto. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:ALPD
Recorrido 1:Administração Regional de Saúde do Norte, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
ALPD, no âmbito de Ação Administrativa Comum, intentada contra a Administração Regional de Saúde do Norte, IP, tendente ao “(…) reconhecimento da situação jurídica da ora Autora, designadamente o seu desempenho, tanto por via das unidades ponderadas que detém como por via das atividade que a USF onde desempenha funções apresenta e inerente número de unidades contratualizadas que desse nível de desempenho advém (…) perfazendo um total de 25.610€ (…) por valores em atraso, bem como pelo pagamento de 3.224€/mês (…)”, inconformada com a Sentença proferida em 30 de novembro de 2018, no TAF do Porto, que julgou a Ação parcialmente procedente, reconhecendo o direito da Autora a receber, a título de suplemento associado ao aumento das unidades ponderadas 8.320€ mais tendo sido reconhecido o direito a receber, a título de compensação pelo desenvolvimento de atividades específicas 4.680€, veio interpor recurso jurisdicional em 18 de fevereiro de 2019, formulando as seguintes conclusões:
1. A recorrente vê o seu direito parcialmente reconhecido na sentença recorrido.
2. Todavia não lhe são consideradas na integra a compensação que deveria auferir pelo desenvolvimento de atividades especificas.
3. É a propósito recortado pela sentença recorrida um ofício de 2011.
4. Todavia, o ofício não é aplicável, na parte citada, ao caso, visto que a médica aqui recorrente não é, em boa verdade, uma médica que inicia funções mas sim que substitui outro médico previamente em funções.
5. Neste pressuposto, substitui a posição do médico que sucede, na integra.
6. Garantindo que os demais médicos da USF continuam a receber pelas atividades especificas da recorrente.
7. Mas não recebendo, como contrapartida, o retorno financeiro.
8. Algo que se crê ser a pedra de toque do despacho de 11 de Abril de 2011 emanado pelo Secretário de Estado Adjunto e da Saúde.
Termos em que deve a sentença recorrida vir a ser revogada, procedendo integralmente o peticionado pela aqui recorrente, por integralmente provado e enquadrado legalmente com os preceitos legais vigentes.”
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Não foram apresentadas contra-alegações de Recurso
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O Recurso interposto veio a ser admitido por Despacho de 22 de maio de 2019.
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O Ministério Público junto deste TCAN, notificado em 13 de junho de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - Questões a apreciar
As questões a apreciar resultam da necessidade de verificar, designadamente, se a Recorrente preenche os pressupostos tendentes ao recebimento dos montantes reclamados, e não reconhecidos pelo tribunal a quo, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada, a qual aqui se reproduz:
A) A Autora é médica e exerce funções, desde 1 de Abril de 2013, na USFSL, ACES Vale Sousa Norte [cf. admissão por acordo];
B) Naquela data, a Autora assumiu, em substituição, a posição do médico Dr. PMRFS, que se havia aposentado naquela altura, tendo-se apercebido que, nesse mês de Abril de 2013, não apresentava o número de utentes necessário para perfazer as 1917 unidades ponderadas [cf. admissão por acordo; documento n.º 1 junto com a petição inicial e informação anexa ao despacho de 8 de Fevereiro de 2014 constante do processo administrativo digitalizado];
C) A partir de 1 de Maio de 2013 em diante, a Autora passou a registar um número de unidades ponderadas por médico de família superior a 1917, as quais, além do mais, se cifraram no mês de Julho de 2013 em 2095 unidades ponderadas e no mês de Outubro de 2013 em 2229 unidades ponderadas [cf. admissão por acordo; documentos n.º 2 a 11 juntos com a petição inicial, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido];
D) A atualização das unidades ponderadas da Autora apenas foi efetuada pelo Réu em Janeiro de 2014 e tendo por referência apenas 7 unidades contratualizadas [cf. admissão por acordo; recibos de vencimento juntos como documentos n.ºs 12 a 36 da petição inicial, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido].
E) No mês de Abril de 2014, a Autora registou 2337 unidades ponderadas [cf. admissão por acordo; documento n.º 7 junto com a petição inicial];
F) A Autora tomou conhecimento que a Dra. FNS e a Dra. JIN, médicas na USFSL receberam, respetivamente, nos meses de Novembro de 2014 e Abril de 2014, o equivalente a 14 unidades contratualizadas relativas ao desenvolvimento de atividades específicas [cf. recibo em documento n.º 35 junto com a petição inicial e recibo de fls. 357 do SITAF; cf. impressões constantes do processo administrativo digitalizado correspondentes aos meses de Abril a Dezembro de 2013, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido];
G) Com data de 5 de Maio de 2014, o Réu elaborou um documento designado de “Carta de Compromisso”, a que se refere o artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de Agosto onde se contratualizou o desenvolvimento de atividades específicas na USFSL [cf. cópia de fls. 249 e seguintes do SITAF];
H) A partir de 1 de Fevereiro de 2015, o Réu procedeu à atualização das unidades contratualizadas da Autora e ao pagamento do correspondente a 12 unidades contratualizadas a título de compensação pelo desenvolvimento de atividades específicas [cf. admissão por acordo; recibos de fls. 163 e seguintes do SITAF];
I) Com data de 14 de Abril de 2015, o Réu elaborou, com a participação da Autora, um documento designado de “Reunião de contratualização”, do qual consta, além do mais, que “a ARS deve assegurar o cálculo e a atribuição atempada dos suplementos e compensações pelo desempenho aos profissionais da USF, realçando: i. a compensação associada às atividades específicas, a médicos (…) Anexo II – Compromisso Assistencial contratualizado (…) B – Carteira Básica de Serviços 1 – Contratualização de atividades específicas (artigos 6.º, n.º 3, alínea c) e 29.º, n.º 2, do DL n.º 298/2007, de 22 de Agosto) (…)” [cf. cópia de fls. 249 e seguintes do SITAF].
J) No mês de Agosto de 2015, o Réu procedeu ao pagamento à Autora de retroativos relativos aos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Junho de 2015, no valor mensal de 520€ e correspondente a 4 unidades contratualizadas pelo desenvolvimento de atividades específicas [cf. recibo do mês de Agosto junto com o requerimento de fls. 163 e seguintes do SITAF, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido].
K) Por despacho de 11 de Abril de 2011, exarado sobre o parecer emitido pelo Coordenador da Coordenação Estratégica da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, o Secretário de Estado Adjunto e da Saúde determinou, além do mais, o seguinte:
“1. O número de unidades ponderadas (UP) relacionadas com as atividades especificas é avaliado anualmente e consta da carta de compromisso, sendo atualizado em 1 de Janeiro de cada ano referente a 31 de Dezembro do ano anterior, à semelhança da ponderação da lista de utentes
2. No caso da entrada de um novo médico numa unidade de saúde familiar (USF) com menos de 2 anos de atividade, este profissional recebe oito unidades contratualizadas (UC) durante um período mínimo consecutivo de 12 meses. Pode ser necessário alargar este período até a USF completar 2 anos de atividade.
3 - No caso da entrada de um médico numa USF com mais de 2 anos de atividade ou numa USF em que os médicos já estão com atividades especificas contratualizadas perante histórico, serão feitas as seguintes adaptações para o cálculo das atividades especificas:
3.1. O novo médico receberá oito UC por um período mínimo consecutivo de 12 meses. Este período é alargado até à data de cálculo seguinte das atividades especificas.
3.2. Os restantes médicos da equipa mantêm as unidades ponderadas resultantes das atividades específicas atribuídas em 01 de Janeiro do ano de entrada do novo elemento.
3.3 - No dia 1 de Janeiro do ano imediato à entrada de um novo médico e enquanto não decorrer o período mínimo de 12 meses, a contar da data da sua entrada, deve observar-se o seguinte:
3.3.1 O novo médico não beneficia das unidades ponderadas resultantes das atividades específicas dos restantes médicos.
3.3.2 No cálculo das unidades ponderadas dos restantes médicos não entram as atividades especificas do novo médico [cf. despacho a fls. 29 do processo administrativo digitalizado];”
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IV – Do Direito
Desde logo, no que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª instância:
“(...)
Do direito ao suplemento associado ao aumento das unidades ponderadas
Sustenta, a este título, a Autora que o Réu, não procedeu, como deveria, à atualização trimestral da lista de utentes por médico, pelo que, nessa sequência, encontra-se em falta o pagamento das quantias devidas por conta do aumento das unidades contratualizadas.
Por seu turno, o Réu defende a sua pretensão substantiva, aduzindo, que, por um lado, não há lugar à sucessão na posição de um médico e, por outro, aquela atualização tem periodicidade anual.
Parte-se, de imediato, para a tarefa de subsunção fáctico-jurídica.
Dispõe o n.º 5 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 298/2007 de 22 de Agosto que:
"A dimensão ponderada dos utentes inscritos na USF e da lista de utentes por médico é atualizada trimestralmente no primeiro ano de atividade na USF e anualmente nos anos seguintes”.
Ora, a Autora, conforme nos demonstra o probatório coligido nos presentes autos, na data em que ingressou na USFSL [1 de Abril de 2013], não tinha o número mínimo de unidades ponderadas previsto no artigo 9.º, n.º 3, daquele DL [1917], motivo pelo qual a sua remuneração se efetuava de acordo com a respetiva categoria e escalão do seu regime de trabalho [artigo 30.º, n.º 9, do DL n.º 298/2007 de 22 de Agosto].
Todavia, o probatório evidencia que, a partir do início do 3.º trimestre de 2013 [mês de Julho], a Autora passou a deter um número superior àquele mínimo de unidades ponderadas.
A este título, o Réu, como se viu, considera que não tendo sido preenchido aquele mínimo no primeiro ano, então a sua remuneração haveria que se manter incólume durante seis meses tal como impunha o artigo 30.º, n.º 9, daquele Decreto-Lei; a Autora, por seu turno, entende que, como o Réu tinha a obrigação de atualizar trimestralmente as listas de utentes, por forma a assim concluir que esta havia superado aquele número mínimo, então a sua remuneração deveria ser efetuada, a partir de Julho de 2013, de acordo com o suplemento previsto no artigo 28.º, n.º 3, alínea a), daquele Decreto-Lei. Quid juris?
Assiste integral razão à Autora.
Com efeito, é manifesto que, em 1 de Julho de 2013 [3 meses após o ingresso], o Réu tinha a obrigação de atualizar a dimensão ponderada dos utentes inscritos na USF e da lista de utentes da Autora, nos termos do artigo 9.º, n.º 5, do DL n.º 298/2007 de 22 de Agosto.
Na verdade, no primeiro ano de atividade da Autora na USFSL, essa obrigação de atualização/revisão deveria ter sido efetivamente realizada com uma periodicidade trimestral e não com uma periodicidade anual.
Com efeito, o entendimento segundo o qual aquele dever de atualização trimestral se reporta ao primeiro ano de atividade da USF [conforme vinha sustentado pelos serviços do Réu] e não ao primeiro ano de atividade do médico em questão na USF não tem na lei um mínimo de correspondência verbal.
E, se assim é, constatando-se que, a partir do 3.º trimestre de 2013, a Autora ultrapassou o mínimo de unidades ponderadas exigidas pelo artigo 9.º, n.º 3, daquele Decreto-Lei, claro está, que lhe assistirá o legal direito a ser ressarcida pelo “suplemento associado ao aumento das unidades ponderadas” que se encontra previsto no artigo 28.º, n.º 3, alínea a), do DL n.º 298/2007 de 22 de Agosto.
Daqui resulta então que, pelo 3.º trimestre [Julho, Agosto e Setembro] do ano de 2013, a Autora tinha direito a auferir o equivalente a 4 unidades contratualizadas [tendo em conta que, nos termos do artigo 30.º, n.º 1, do mencionado Decreto-Lei, “a unidade contratualizada está associada a cada aumento de 55 unidades ponderadas da dimensão mínima” (que é, como se viu, de 1917) e que no mês de Julho de 2013 a Autora tinha 2095 unidades ponderadas], no montante de 234€ cada uma [artigo 30.º, n.º 5, do citado Decreto-Lei], perfazendo o montante mensal de 936€ e correspondente à quantia global do trimestre de 2.808€ [em todo o caso, repare-se que o cálculo das unidades contratualizadas efetuado pela Autora na petição inicial vai precisamente ao encontro àquele que se encontra plasmado pelo Réu nas próprias impressões constantes do processo administrativo digitalizado].
De igual forma, pelo 4.º trimestre [Outubro, Novembro e Dezembro] do ano de 2013, a Autora tinha direito a auferir o equivalente a 6 unidades contratualizadas [tendo em conta que em Outubro de 2013 havia atingido 2229 unidades ponderadas face a um mínimo de 1917] [Ponto C) dos factos provados], no montante de 234€ cada uma [artigo 30.º, n.º 5, do citado Decreto-Lei], perfazendo o montante mensal de 1.404€ correspondente à quantia global do trimestre de 4.212€.
Acresce que, considerando que no mês de Abril de 2014, ainda se mantinha a obrigação de atualização trimestral das listas de utentes [artigo 9.º, n.º 5, do citado Decreto-Lei], data em que a Autora tinha já 2337 unidades ponderadas [Ponto E) dos factos provados], esta deveria ter passado a receber, desde então, o equivalente a 8 unidades contratualizadas, cada uma no valor de 130€ [por já não ser aplicável o disposto no n.º 5 do artigo 30.º do citado DL].
Ora, tendo em conta que, dos meses de Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2014 a Janeiro de 2015, o Réu apenas procedeu ao pagamento do equivalente a 7 unidades contratualizadas, então deverá o mesmo ser condenado a pagar o equivalente a 1 unidade contratualizada por cada um daqueles meses, o que perfaz o montante global de 1.300€.
Procede, por isso, inelutavelmente, o direito de crédito, a este título, peticionado.
Do direito à compensação associada às atividades específicas
Sustenta a Autora que, tendo sido atingido na USFSL o respetivo limite máximo de 20 unidades contratualizadas, cada médico tem direito a receber de acordo com as unidades ponderadas afetas às atividades específicas, ou seja, aquele máximo.
Dispõe o artigo 28.º, n.ºs 1 e 4, do DL n.º 298/2007 de 22 de Agosto que:
“1 - A remuneração mensal dos médicos das USF integra uma remuneração base, suplementos e compensações pelo desempenho.
(…)
4 - A compensação pelo desempenho integra:
a) A compensação associada ao desenvolvimento das atividades específicas, previsto no artigo 29.º;”
A este título, sob a epígrafe “Compensação associada às atividades específicas dos médicos”, preceitua o artigo 29.º do mencionado Decreto-Lei que:
“1 - A compensação prevista na alínea a) do n.º 4 do artigo anterior está associada ao aumento das unidades ponderadas da lista mínima de utentes dos médicos por força das atividades específicas de vigilância a utentes vulneráveis e de risco, segundo as orientações técnicas da Direcção-Geral da Saúde, nos termos seguintes:
(…)
2 - As atividades específicas previstas no número anterior são contratualizadas anualmente e constam da carta de compromisso.
3 - Os critérios para atribuição de unidades ponderadas às atividades específicas previstas no n.º 1 são definidos pela Direcção-Geral da Saúde.”
Pois bem, ninguém contesta que a Autora tivesse efetivamente direito a receber o valor devido a título de compensação pelas atividades específicas que foram contratualizadas na respetiva Carta de Compromisso.
Todavia, a verdade é que, sem prejuízo de aquela compensação se encontrar legalmente restrita aos casos em que se verifique um efetivo aumento das unidades ponderadas mínimas para as atividades especificas [1 unidade contratualizada por cada aumento correspondente a 55 unidades ponderadas], os critérios para a sua atribuição encontravam-se delimitados pelo que fora definido pela Direcção-Geral da Saúde, através do ofício n.º 2875 emanado pelo Secretário de Estado Adjunto e da Saúde de 11 de Abril de 2011, nos termos do citado artigo 29.º, n.º 3, do DL n.º 298/2007 de 22 de Agosto [Ponto K) do elenco dos factos provados].
Ora, desse despacho dimana, com meridiana clareza, que, a Autora tendo entrado no dia 1 de Abril de 2013 ao serviço da USFSL, se manteria durante o período mínimo de um ano com 8 unidades contratualizadas para as atividades específicas [tivesse ou não mais de 2 anos de atividade].
Isto, independentemente do número de unidades contratualizadas que se encontravam atribuídas aos demais médicos que se encontravam já a exercer funções na referida unidade de saúde familiar.
Deste modo, dúvidas não devem, desde logo, subsistir, no sentido de que o Réu esteve bem ao efetuar o pagamento de apenas 8 unidades contratualizadas durante aquele período mínimo [sufragando a aplicação da doutrina proveniente do referido despacho do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, veja-se, entre outros, http://www2.acss.min-aude.pt/Portals/0/metodologiacontratualizacousf_2010_publicada.pdf].
Não tem, portanto, a Autora direito ao recebimento do peticionado valor de 12.090€ [4.680€+3.120€+2.340€+1.950€].
Todavia, o mesmo já não sucede quanto ao período subsequente.
Com efeito, decorrido aquele período mínimo de um ano e, uma vez que o Réu nada alega em sentido contrário [v.g. que este período tenha sido “alargado até à data de cálculo seguinte das atividades específicas”], a partir de 1 de Abril de 2014 em diante, terá, inelutavelmente, de se aplicar na íntegra o raciocínio efetuado pela Autora na petição inicial.
Daqui decorre então que se todos os médicos da USFSL atingiram sempre o limite máximo de 20 unidades contratualizadas [artigo 30.º, n.º 3, do DL n.º 298/2007, de 22 de Agosto] [Ponto F) dos factos provados] e se a Autora, desde 1 de Abril de 2014, mantinha oito unidades contratualizadas [para efeitos de suplemento associado ao aumento das unidades ponderadas, como se apurou no capítulo anterior da presente decisão], então logo se constata que teria direito a auferir [a diferença], a título de compensação associada ao desenvolvimento de atividades específicas, o montante equivalente a 12 [doze] unidades contratualizadas [tal como, de resto, lhe vem sendo processado desde o mês de Fevereiro de 2015].
Ora, tendo o Réu procedido ao pagamento de apenas 8 e não, como deveria, de 12 unidades contratualizadas, encontram-se em falta 4 unidades contratualizadas correspondentes ao montante mensal de 520€ [4x130€] desde 1 de Abril de 2014 até, como peticionado, ao mês de Janeiro de 2015 [este inclusive].
Tudo, portanto, num total de 5.200€ [520€x10 meses], sem prejuízo de a este valor dever ser subtraído o retroativo de 520€ equivalente ao mês de Janeiro de 2015 que se mostra efetivamente liquidado pelo Réu [Ponto J) dos factos provados].
Deve, por isso, ser reconhecido à Autora o direito a receber, a título de suplemento associado ao aumento das unidades ponderadas, a quantia global de 8.320€ e, a título de compensação pelo desenvolvimento de atividades específicas, a quantia global de 4.680€, tudo num total de 13.000€.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, procederá parcialmente a presente ação.
Vejamos:
Do objeto do recurso
O Recurso apresentado é desde logo particularmente incipiente na medida em que a Recorrente mais do que imputar vícios à decisão recorrida vem no essencial, reiterar e retomar a argumentação que esgrimiu em 1ª instância, sendo as conclusões do Recurso paradigmáticas do que se afirmou.
Quando no Recurso se afirma “que a médica aqui recorrente não é, em boa verdade, uma médica que inicia funções mas sim que substitui outro médico previamente em funções”, tal mostra-se falacioso, pois que o facto de ter ocorrido a aludida substituição, não significa que não tenha de ser considerada a situação efetiva e concreta da recorrente, pois que não há lugar a uma mera sucessão e equivalência funcional e remuneratória entre o médico substituído e o seu substituto.
Refira-se exemplificativamente que o facto de um clinico substituir um outro médico mais categorizado e com maior antiguidade não significa que tenha de auferir exatamente o mesmo que o substituído, pois que sempre predominará o regime legal e regulamentar aplicável.
Não se vislumbram pois razões que permitam afastar a aplicação do Despacho do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, de 11 de abril de 2011 à situação da Recorrente, nos termos densificados pelo tribunal de 1ª Instância, sem prejuízo, naturalmente, da aplicação do regime legal vigente.
Incontornavelmente, consta do facto provado K), a transcrição do despacho de “aprovo” do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde de 11 de Abril de 2011, relativamente ao teor do parecer proferido Coordenador da Estratégica da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, o qual, tanto quanto se sabe não objeto de impugnação, o seguinte:
“1. O número de unidades ponderadas (UP) relacionadas com as atividades específicas é avaliado anualmente e consta da carta de compromisso, sendo atualizado em 1 de Janeiro de cada ano referente a 31 de Dezembro do ano anterior, à semelhança da ponderação da lista de utentes
2. No caso da entrada de um novo médico numa unidade de saúde familiar (USF) com menos de 2 anos de atividade, este profissional recebe oito unidades contratualizadas (UC) durante um período mínimo consecutivo de 12 meses. Pode ser necessário alargar este período até a USF completar 2 anos de atividade.
3 - No caso da entrada de um médico numa USF com mais de 2 anos de atividade ou numa USF em que os médicos já estão com atividades especificas contratualizadas perante histórico, serão feitas as seguintes adaptações para o cálculo das atividades específicas:
3.1. O novo médico receberá oito UC por um período mínimo consecutivo de 12 meses. Este período é alargado até à data de cálculo seguinte das atividades específicas.
3.2. Os restantes médicos da equipa mantêm as unidades ponderadas resultantes das atividades específicas atribuídas em 1 de Janeiro do ano de entrada do novo elemento.
3.3 - No dia 1 de Janeiro do ano imediato à entrada de um novo médico e enquanto não decorrer o período mínimo de 12 meses, a contar da data da sua entrada, deve observar-se o seguinte:
3.3.1 O novo médico não beneficia das unidades ponderadas resultantes das atividades específicas dos restantes médicos.
3.3.2 No cálculo das unidades ponderadas dos restantes médicos não entram as atividades específicas do novo médico.”
O Tribunal de 1ª instância ao aplicar o regime legal vigente e o referido Despacho à situação da Recorrida, fez o que lhe competia, sendo que esta, entendendo que o regime estabelecido se mostrava inadequadamente aplicado à sua situação, sempre teria de o demonstrar, não se podendo refugiar na simples afirmação que fez, de acordo com a qual o tribunal de 1ª instância se terá limitado a recortar o teor de oficio de 2011 que exatamente dá a conhecer o teor do referido Parecer, confirmado por despacho do Secretário de Estado.
A afirmação da Recorrente é pois meramente opinativa e conclusiva, limitando-se a referir que “o ofício não é aplicável, na parte citada, ao caso, visto que a médica aqui recorrente não é, em boa verdade, uma médica que inicia funções...”.
Se a própria Recorrente reconhece que o Tribunal de 1ª instância decidiu em função do referido Despacho e uma vez que a mesma não contesta o seu conteúdo, mas singelamente entendendo que o mesmo não lhe é aplicável, o que se não reconhece, não merece assim censura a decisão proferida.
Com efeito, a Recorrente não logrou provar que, designadamente, o controvertido despacho de 2011 lhe não é aplicável, pois que, em bom, rigor, apenas o afirmou de modo conclusivo.
Há pois aqui uma subtil tentativa de alterar a matéria de facto, colocando a Recorrente fora da aplicabilidade do deferido Despacho do Secretário de Estado, de 2011, sendo que, como se sumariou no Acórdão deste TCAN nº 680/16.5BEAVR, de 15.03.2019, “Ao tribunal de recurso não compete repetir o julgamento da matéria de facto efetuado pelo tribunal de 1.ª instância, nem pronunciar-se sobre impugnações genéricas da matéria de facto, apenas lhe incumbindo rever concretas questões de facto controvertidas, o que exige que o recorrente concretize as divergências que pretende ver apreciadas em sede de recurso.”
Assim sendo, estando estabilizada a matéria de facto, e não vindo suscitada a indevida aplicação do regime jurídico e regulamentar em que assentou a decisão proferida em 1ª instância, que, aliás, julgou parcialmente procedente as pretensões da Recorrente, e não vindo questionadas as operações materiais que determinaram a quantificação dos montantes devidos e não devidos à autora, aqui Recorrente, improcederá necessariamente o Recurso
Em face de tudo quanto precede, não merece censura a decisão proferido pelo tribunal a quo.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão proferida em 1ª instância.
Custas pela Entidade Recorrente.
Porto, 12 de julho de 2019
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. Nuno Coutinho
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa