Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01312/18.3BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/04/2019
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL. INDEFERIMENTO LIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO E POR AMBIGUIDADE OU OBSCURIDADE QUE TORNE A DECISÃO ININTELIGÍVEL. TAXAS DE PORTAGEM E CUSTOS ADMINISTRATIVOS.
ILEGITIMIDADE SUBSTANTIVA. FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO.
Sumário:
I) No que concerne à invocada nulidade da sentença por falta de fundamentação, é preciso distinguir a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
II) Por sua vez, verifica-se obscuridade quando a sentença contenha “algum passo cujo sentido seja ininteligível” ou do qual não possa apreender-se o seu sentido exacto, enquanto a ambiguidade ocorre quando “alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos.
III) O indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo. Assim, o despacho de indeferimento liminar só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior.
IV) A ora Recorrente não poderá discutir nesta sede a legalidade da liquidação das taxas de portagem (designadamente, nas suas vertentes da legitimidade passiva), sendo que a Recorrente, ao invocar a sua ilegitimidade substantiva para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado, está a colocar em crise a legalidade da liquidação, o que significa que terá de suscitar tal realidade noutra sede.
V) O momento do vencimento da dívida que, neste caso, tem de reportar-se a 06-10-2017, o que quer dizer que a decisão recorrida andou bem ao apontar que, apesar de dizer respeito a Dezembro de 2016, tem como data limite de pagamento o dia 06-10-2017. Ou seja, não há dúvida de que se trata de um crédito vencido após a declaração de insolvência, a qual ocorreu em 19-09-2017 e, assim sendo, cai no âmbito da previsão do n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que preceitua que o disposto em tal artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência, que seguirão os termos normais até à extinção da execução, ou seja, nada obsta à instauração e prossecução de execução fiscal para cobrança destas concretas dívidas tributárias, desde que na penhora de bens seja observada a restrição supra referida. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:NRS
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Pronunciou-se pela improcedência do recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
NRS, identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 20-02-2019, que rejeitou liminarmente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de OPOSIÇÃO com referência à execução fiscal n.º 01592018060000098967 por dívidas de taxas de portagem e custos administrativos, no valor global de € 30,80.
Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 29-35), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
I - NULIDADE DA SENTENÇA NOS TERMOS DO ART. 615º, n.º 1, al. b), e c) DO CPC, POR REMISSÃO DO ART. 2º, AL. E) DO CPPT
A. Resulta da alínea b), do n.º 1, do art. 615º do CPC (por remissão ao Art. 2º, al. e) do CPPT), que “É nula a sentença quando: b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
B. Sucede que, não resulta da sentença em crise a fundamentação de facto, subsumível às questões de direito elencadas, necessária para justificar a decisão tomada. senão vejamos,
C. Na página 2 da sentença em apreciação, refere o douto tribunal que será de aplicar a jurisprudência do Acórdão do STA de 18/06/2013, proferido à margem do Proc. n.º 01276/12, pois o mesmo consiste numa situação em tudo idêntica à dos presentes autos.
D. Ora, para que se pudesse aplicar o acórdão em questão teríamos que nos encontrar perante os mesmos tributos, ou seja, dívida não só proveniente de taxas, como também de coimas.
E. Contudo, não resulta da douta sentença qualquer fundamentação de facto, quanto aos tributos peticionados, nomeadamente qual o tributo em causa (se taxas ou coimas) e qual o período de tributação. Sem prescindir,
F. Na presente execução, encontra-se em dívida, única e exclusivamente taxas de portagem e custas (em conformidade com o título executivo), pelo que sempre se dirá que a sentença também é nula nos termos da alínea c), do n.º 1, do art. 615 do CPC (por remissão ao Art. 2º, al. e) do CPPT), porquanto se mostra ambígua/obscura na matéria de facto que considera provada. Senão vejamos,
G. A quantia exequenda resume-se a taxas de portagem e custas, sendo que as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo, ao invés, a obrigação tributária nasce por via de utilização da via rodoviária;
H. Tendo a Recorrente indicado como condutor efectivo da viatura o seu filho FG, nos termos do art. 10º, n.º 1 da Lei 25/2006.
I. Isto posto, não estando perante a execução de coima deveria o douto tribunal admitir a Oposição à Execução e Absolver a Recorrente, porquanto a ilegitimidade invocada é subsumível ao fundamento da oposição constante da alínea b) do n.º 1 do art. 204º do CPPT.
J. Face ao que bem de referir-se, é flagrante concluir que a douta sentença se encontra ferida de nulidade nos termos da alínea b) e c) do n.º 1, do art. 615º do CPC.
SEM PRESCINDIR
II - DO RECURSO
K. Vem o presente recurso interposto da Sentença de 17/01/2019, a qual rejeitou liminarmente a Oposição à Execução, por considerar que a ilegitimidade invocada não consubstancia fundamento de Oposição à Execução, nos termos do art. 204º, n.º 1 do CPPT e que a suspensão decorrente da declaração de Insolvência da Recorrente é manifestamente improcedente.
L. O recurso merece – com o devido respeito – inteiro provimento, como se irá tentar demonstrar. Senão Vejamos:
M. Considera o douto tribunal que a ilegitimidade por não ter sido proprietário ou possuidor do bem apenas pode constituir fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos doa alínea b) do n.º 1 do artigo 204º do CPPT relativamente aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens, o que não acontece com as taxas de portagem e as coimas.
N. Ora, nos termos do art. 10º, n.º 1 da Lei n.º 25/2006, de 30 de, Junho e como bem refere o douto tribunal, “a obrigação tributária nasce por via de utilização da via rodoviária”, logo tendo a Recorrente indicado que o condutor da viatura era o seu filho FG, seria este o sujeito passivo da obrigação tributária. Sucede que,
O. O douto tribunal não destrinçou os tributos em causa no presente processo e assumiu, sem qualquer fundamento factual, que estariam em dívida não só taxas de justiça como coimas, concluindo assim, em conformidade com o acórdão que cita (Ac. STA de 18/06/2013) que o lugar para discutir a legitimidade seria o processo de contraordenação.
P. Contudo, no citado acórdão estavam em causa coimas, ao contrário do presente processo em que apenas se encontra em dívida taxas de portagem e custos administrativos;
Q. Sendo prova bastante e plena de tal facto a certidão de dívida e respectivo anexo, junto pela Exequente, da qual resulta que a quantia Exequenda ascende a € 30,80, respeitante ao período de tributação de Dezembro de 2016, sendo € 2,25 em taxas de portagem, € 11,05 de custos administrativos e € 17,50 de custas.
R. Neste sentido, a vexata quaestio é se a ilegitimidade é fundamento da Oposição à Execução, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 204º do CPPT, quando estejam apenas em causa o pagamento de taxas de portagens.
S. Ora, como resulta da prova constante dos autos, dúvidas não existem que estamos apenas perante tributos decorrentes de taxa de portagem e custos administrativos, pelo que o momento processual atendível para arguir a ilegitimidade passiva é a Oposição à Execução.
T. Neste sentido, vejamos, o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 18-06-2014, ao abrigo do processo n.º 01549/13 (disponível em http://www.dgsi.pt), que se cita:
“Por outro lado, também não serve como fundamento de oposição à execução fiscal a alegada falta de responsabilidade da Recorrente pelas dívidas exequendas por não ser ela o condutor do veículo que deu origem às taxas e coimas.
«Esta invocada ilegitimidade (da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou) constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens.
O que não acontece com as coimas ora em execução.
Por um lado, as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo (em termos de ser essa posse que faz determinar o sujeito passivo daquela relação jurídica tributária, não obstante este, porventura, já não ser o proprietário ou o possuidor do veículo). A obrigação tributária nasce por via da utilização da via rodoviária (e não pela posse daquele veículo em especial). Por outro lado, a dívida exequenda reporta-se, não apenas às ditas taxas, mas, também às próprias coimas em que a Recorrente veio a ser condenada nos respectivos processos de contra-ordenação.
Ora, […] a exigibilidade destas quantias, rectius, os fundamentos da condenação no processo de contra-ordenação fiscal, só poderiam ser discutidos no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação, podendo a recorrente interpor recurso judicial da decisão de aplicação de coima (arts. 80.º do RGIT e 59.º do RGCO), e nunca em sede de oposição à execução fiscal (cfr., entre outros, os acs. desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 1/10/2008, rec. n.º 408/08 e de 25/11/2009, rec. n.º 0812/09)» (Cfr. acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Junho de 2013, proferido no processo n.º 1276/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Abril de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32220.pdf), págs. 2759 a 2764, também disponível em
(http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/04942147b4a5202980257baa004daea4?OpenDocument.).” (negrito e sublinhado nosso)
U. Vejamos ainda o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 18-06-2013, ao abrigo do processo n.º 01276/12 (disponível em http://www.dgsi.pt), em que se baseia o douto tribunal e que se cita:
“III - A ilegitimidade da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou, constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens. O que não acontece quando se executa dívida resultante de coima por infracção tributária.
IV - Ocorrendo erro na forma de processo, deve ordenar-se a convolação para a forma processual adequada, tendo em conta o efeito jurídico pretendido e os fundamentos de facto e de direito alegados.” (negrito e sublinhado nosso)
V. Isto posto, não estando em causa a execução de dívida resultante de coima por infração tributária (cfr. certidão de dívida que constitui título executivo), resulta forçoso concluir que a ilegitimidade invocada pela Recorrente é fundamento de oposição à execução nos termos do art. 204º, n.º 1, al. b) do CPPT, devendo a mesma ser absolvida da instância por ilegitimidade passiva, nos termos do art. 10º, n.º 1 da Lei 25/2006.
Mais,
W. Resulta ainda da certidão de dívida que o período tributário em questão reporta a janeiro de 2017 e não ao ano de 2018, sendo, consequentemente, anterior à declaração de insolvência da Recorrente que ocorreu em 19/09/2017, ao abrigo do processo n.º 3053/17.9T8AVR, que corre termos no Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 3.
X. Deste modo, resulta forçoso concluir que a presente execução não poderá prosseguir, devendo a mesma ficar suspensa, nos termos do art. 88º do CIRE.
Y. Assim, a sentença de que se recorre violou, nomeadamente, o disposto nos artigos 10º, n.º 1 da Lei 25/2006, art. 204º, n.º 1, al. b) do CPPT e art. 88º do CIRE, pelo que deverá ser revogada e substituído por outra que, absolva a Recorrente da Instância por ilegitimidade passiva.
NESTES TERMOS E COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ SER DADO INTEIRO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE, EM CONSEQUÊNCIA, A SENTENÇA RECORRIDA, SENDO A MESMA SUBSTITUÍDA POR OUTRA EM QUE, ACOLHENDO-SE AS RAZÕES INVOCADAS, ABSOLVA A RECORRENTE POR SER PARTE ILEGITMA. ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!
*
A recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.
*
O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do presente recurso.
*
Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, apreciar a nulidade da sentença por falta de fundamentação e por ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível bem como analisar a susceptibilidade de a alegada ilegitimidade substantiva da ora Recorrente para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado ser fundamento de oposição nos termos do art. 204º al. b) do CPPT, sem olvidar a situação relacionada com a impetrada suspensão da execução nos termos do art. 88º do CIRE.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
1. É do seguinte teor o despacho recorrido:
“…
NRS, NIF: 15xxx21, residente na Rua C…, Arada, em Ovar, citada no âmbito da execução fiscal n.º 01592018060000098967, invocando, em suma, a sua ilegitimidade substantiva para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nadas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado e, ainda, a suspensão da execução, nos termos do artigo 88.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas1, em virtude de ter sido declarada insolvente.
Os presentes autos encontram-se em fase de despacho liminar, importando, desde já aferir da viabilidade do prosseguimento dos mesmos.
Dispõe o artigo 209.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário que:
«1 – Recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição por um dos seguintes fundamentos:
a) Ter sido deduzida fora do prazo;
b) Não ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º;
c) Ser manifesta a improcedência.»
Por um lado, constata-se que a oponente pretende afirmar a sua ilegitimidade para a presente execução pelo facto de não ter sido a condutora do veículo automóvel cujas passagens nas portagens originaram a dívida exequenda, fundando a sua pretensão no estatuído no artigo 204.º, n.º 1, alínea b), do CPPT.
A questão que se coloca é se o oponente pode, ao abrigo do artigo 204.º, n.º 1, alínea b), do CPPT, discutir a sua ilegitimidade para a execução fiscal, por não ser a utilizadora do veículo em questão no momento a que se reporta a dívida exequenda?
A resposta tem sido dada de forma unívoca: se estivesse em causa dívidas de imposto relacionados com os bens móveis [IUC] ou imóveis [IMI] que lhe deram origem, sim, à luz do que decorre do artigo 158.º, do CPPT. Fora destes casos, a resposta tem de ser negativa.
Ora, as dívidas de taxas de portagem e custos administrativos associados, não se poderão subsumir à previsão normativa do artigo 204.º, n.º 1, alínea b), do CPPT.
Com efeito, é pressuposto desta previsão normativa que os tributos em causa sejam incidentes sobre o uso ou fruição de bens, o que, indiscutivelmente, não sucede com as dívidas de taxas de portagem e custos administrativos associados.
Neste sentido, vide o Acórdão do STA de 18-06-2013, proferido no recurso n.º 01276/12, publicado em www.dgsi.pt, aqui inteiramente aplicável, na qual se decidiu [e passa-se a transcrever]:
«(…)
Esta invocada ilegitimidade (da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou) constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens.
O que não acontece com as coimas ora em execução.
Por um lado, as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo (em termos de ser essa posse que faz determinar o sujeito passivo daquela relação jurídica tributária, não obstante este, porventura, já não ser o proprietário ou o possuidor do veículo). A obrigação tributária nasce por via da utilização da via rodoviária (e não pela posse daquele veículo em especial). Por outro lado, a dívida exequenda reporta-se, não apenas às ditas taxas, mas, também às próprias coimas em que a oponente veio a ser condenada nos respectivos processos de contra-ordenação.
Ora, como salienta o MP, a exigibilidade destas quantias, rectius, os fundamentos da condenação no processo de contra-ordenação fiscal, só poderiam ser discutidos no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação, podendo a recorrente interpor recurso judicial da decisão de aplicação de coima (arts. 80º do RGIT e 59º do RGCO), e nunca em sede de oposição à execução fiscal (cfr., entre outros, os acs. desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 1/10/2008, rec. nº 408/08 e de 25/11/2009, rec. nº 0812/09).
Em suma, a invocada ilegitimidade da oponente também não é subsumível ao fundamento de oposição constante da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.» [sublinhados nossos].
Não vendo razões para divergir da jurisprudência ora citada, acolhemo-la na íntegra, aderindo à sua fundamentação.
Pelo que se conclui que, quanto a este fundamento, a presente oposição não se subsume a qualquer dos fundamentos previstos no artigo 204.º, n.º 1, do CPPT, designadamente o previsto na alínea b) do citado preceito legal, mas à discussão da (i)legalidade da dívida exequenda susceptível de ser sindicada em sede de impugnação judicial.
Depois temos uma segunda questão [decidenda], respeitante à necessidade de suspender o processo de execução fiscal em virtude da declaração de insolvência, nos termos do artigo 88.º do CIRE, sendo que, em relação a esta questão importa referir o seguinte:
A dívida aqui em causa, de acordo com a certidão junta a fls. 15 e 15 vº do suporte físico dos autos, diz respeito a taxas de portagem e custos administrativos de Dezembro de 2016, com prazo limite de pagamento de 06-10-2017.
A oponente foi declarada insolvente em 19-09-2017, no processo n.º 3053/17.9T8AVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Comércio de Aveiro – Juiz 3 de Anadia [cfr. fls. 9 do suporte físico dos autos].
Com base na sua insolvência vem alegar que o artigo 88.º, n.º 1, do CIRE obsta ao prosseguimento de qualquer execução e que, por isso, a execução fiscal em causa nos autos deve ser suspensa.
Tal alegação constitui, em abstracto, fundamento válido de oposição enquadrável na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT. No entanto, no caso concreto é manifesto que o fundamento da oposição, tal como vem invocado, é manifestamente improcedente.
Como se viu acima, a dívida em causa nos autos, apesar de dizer respeito a Dezembro de 2016, tem como data limite de pagamento o dia 06-10-2017. Ou seja, não há dúvida de que se trata de um crédito vencido após a declaração de insolvência, a qual ocorreu em 19-09-2017.
E, assim sendo, cai no âmbito da previsão do n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que preceitua que o disposto em tal artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência, que seguirão os termos normais até à extinção da execução.
Com efeito, esta é uma questão já amplamente tratada pela jurisprudência dos tribunais superiores e pela doutrina, em termos com os quais este tribunal concorda, pelo que, a seguir, transcrevem as partes relevantes para os presentes autos de dois Acórdãos do STA, que são exemplo de tal jurisprudência e que aqui se acompanha.
Assim, ficou consignado no Acórdão do STA de 07-09-2011, proferido no processo n.º 0326/11, o seguinte:
«(…)
A alegada inaplicabilidade do disposto no artigo 180.º do CPPT ao processo de insolvência apenas poderia resultar do facto de este preceito legal se haver de ter como tacitamente revogado (pois que o não foi expressamente) aquando da entrada em vigor do CIRE (em 15 de Setembro de 2004, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto), por incompatibilidade do disposto neste Código com o prescrito no artigo 180.º do CPPT.
Não o entendemos assim, contudo, antes se entende, com JORGE LOPES DE SOUSA (Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, II volume, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, pp. 232/233, nota 7 ao art. 180.º do CPPT), estar-se perante um regime especial para os processos de execução fiscal, pois que só pode entender-se que uma lei geral revoga uma lei especial quando for detectável uma intenção inequívoca do legislador nesse sentido, como impõe o n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil, o que não sucede neste caso.
Ora, estando o artigo 180.º do CPPT em vigor e tendo ele por objecto específico os processos de execução fiscal pendentes ou que venham a ser instaurados contra a mesma empresa (n.º 1) e bem assim (n.º 6) os créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação (ou, no âmbito do CIRE, da declaração de insolvência a que se referem os artigos 28.º e 36.º do CIRE, ex vi do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março), é este preceito legal aplicável, e, ao abrigo do que nele se dispõe, há-de reconhecer-se que a instauração da execução fiscal é legalmente possível, embora as respeitantes a créditos vencidos antes da declaração de insolvência tenham de ser sustadas logo após a instauração (cfr. o n.º 1 do artigo 180.º), prescrevendo-se que as relativas a créditos vencidos posteriormente à declaração de insolvência seguirão os termos normais até à extinção da execução (cfr. o n.º 6 do artigo 180.º do CPPT).
Observe-se contudo que, embora a lei diga expressamente, relativamente às situações contempladas no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que (os processos) seguirão os termos normais até à extinção da execução, propõe JORGE LOPES DE SOUSA (op. cit. p. 233), no que tem sido acompanhado pela jurisprudência deste Tribunal (cfr., entre outros, os Acórdãos de 24/10/2001, rec. n.º 26.344, de 15/11/2006, rec. n.º 625/06 e de 12 de Novembro de 2009, rec. n.º 102/09, Ac. de 14/4/2010, rec. n.º 51/10 e de 6 de Abril de 2011, rec. n.º 981/10) que «(…) deverá entender-se este seguimento em consonância com as normas do CPEREF e do CIRE, sob pena de se abrir a porta à possibilidade de se inutilizar todo o esforço de recuperação da empresa e de satisfação equilibrada dos direitos dos credores que se visa com estes processos especiais, o que seria uma solução manifestamente desacertada, atentos os fins de interesse público e social estão subjacentes àqueles», pelo que «(…) a interpretação razoável daquele n.º 6, que se compagina com a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil), é a de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência ou insolvência ou do despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa se forem penhorados bens não apreendidos naqueles processos de falência ou recuperação ou insolvência».».
O mesmo se deixou consignado no Acórdão do STA de 06-04-2011, proferido no processo n.º 0981/10, o qual acrescentou apenas o seguinte:
«(…)
E é este o entendimento que também aqui adoptamos, em conformidade com a jurisprudência citada, pelo que há-de concluir-se que falece razão ao recorrente quando considera no caso dos autos não poder ser instaurada e prosseguir a execução fiscal. Esta pôde ser instaurada e prosseguir em conformidade com a lei, embora sofra restrições no que toca à penhora de bens, só podendo ser apreendidos bens não apreendidos no processo de falência.».
Ou o Acórdão do STA de 29-02-2012, proferido no processo n.º 0885/11, disponível em www.dgsi.pt, segundo o qual:
«I - Nada obsta a que após a declaração de insolvência sejam instauradas execuções fiscais contra a sociedade insolvente, possibilidade que constitui um regime especial para os processos de execução fiscal (afastando a regra geral do art. 88.º, n.º 1, do CIRE), sendo que
- se para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência, deverão ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de falência (art. 180.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT, e art. 85.º, n.ºs 1 e 2, do CIRE);
- se para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência, prosseguindo a execução, mas apenas se forem penhorados bens não apreendidos no processo de insolvência (cfr. art. 180.º, n.º 6, do CPPT, interpretado tendo em conta a unidade do sistema jurídico, como imposto pelo art. 9.º, n.º 1, do CC).
II - Um crédito considera-se vencido quando puder ser exigido pelo credor.».
De facto, o artigo 88.º do CIRE contém uma regra geral [relativa às execuções em geral] que é derrogada pela regra especial contida no artigo 180.º do CPPT [relativa apenas às execuções fiscais]. Pelo que o artigo 88.º do CIRE não obsta à autuação de execuções fiscais nem à respectiva citação.
Por isso, como se disse já, e tal como nos acórdãos citados, também o tribunal entende que é possível a instauração e a prossecução da execução fiscal relativamente a créditos vencidos posteriormente à declaração de insolvência, como no caso, só não podendo ser penhorados bens que tenham sido apreendidos no processo de insolvência.
Além disso, o pedido de suspensão de execução formulado nestes termos deve ser formulado no respectivo processo executivo e não no processo de oposição. Se formulado na oposição deve ser desentranhado e remetido à execução para aí ser apreciado [cfr. Acórdão do STA de 20-11-2002, proferido no processo n.º 01433/02].
Sem prejuízo de reclamação contra actos considerados ilegais, praticados posteriormente à citação, nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT, a presente oposição com o fundamento sob análise tem necessariamente de improceder com base no artigo 209.º, n.º 1, alínea c), do CPPT.
Assim sendo, conclui-se que, no caso em concreto, a presente oposição, quanto ao primeiro fundamento, não se subsumindo em nenhum dos constantes nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT e, quanto ao segundo, sendo manifestamente improcedente, tem que ser liminarmente rejeitada ao abrigo do estatuído no artigo 209.º, alíneas b) e c), do CPPT, o que se determinará a final.
DECISÃO
Ante o exposto e com os fundamentos atrás aduzidos, decide-se rejeitar liminarmente a presente acção. …”.
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3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, apreciar a matéria relacionada com a invocada nulidade por falta de fundamentação e por ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Com efeito, nas suas alegações, a Recorrente aponta que não resulta da sentença em crise a fundamentação de facto, subsumível às questões de direito elencadas, necessária para justificar a decisão tomada, pois que, na página 2 da sentença em apreciação, refere o douto tribunal que será de aplicar a jurisprudência do Acórdão do STA de 18/06/2013, proferido à margem do Proc. n.º 01276/12, pois o mesmo consiste numa situação em tudo idêntica à dos presentes autos.
Ora, para que se pudesse aplicar o acórdão em questão teríamos que nos encontrar perante os mesmos tributos, ou seja, dívida não só proveniente de taxas, como também de coimas e não resulta da douta sentença qualquer fundamentação de facto, quanto aos tributos peticionados, nomeadamente qual o tributo em causa (se taxas ou coimas) e qual o período de tributação, verificando-se que na presente execução, encontra-se em dívida, única e exclusivamente taxas de portagem e custas (em conformidade com o título executivo), pelo que sempre se dirá que a sentença também é nula nos termos da alínea c), do n.º 1, do art. 615 do CPC (por remissão ao Art. 2º, al. e) do CPPT), porquanto se mostra ambígua/obscura na matéria de facto que considera provada, dado que, a quantia exequenda resume-se a taxas de portagem e custas, sendo que as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo, ao invés, a obrigação tributária nasce por via de utilização da via rodoviária, tendo a Recorrente indicado como condutor efectivo da viatura o seu filho FG, nos termos do art. 10º, n.º 1 da Lei 25/2006, de modo que, não estando perante a execução de coima deveria o douto tribunal admitir a Oposição à Execução e Absolver a Recorrente, porquanto a ilegitimidade invocada é subsumível ao fundamento da oposição constante da alínea b) do n.º 1 do art. 204º do CPPT, o que significa que a douta sentença se encontra ferida de nulidade nos termos da alínea b) e c) do n.º 1, do art. 615º do CPC.
Relativamente ao núcleo essencial desta arguição, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação - Ac. do S.T.A. de 16-11-2011, Proc. nº 0802/10, www.dgsi.pt -, sendo que tal como refere o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”.
Porém, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, pág. 909, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.
Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão.
Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”.
Por outro lado, quanto à nulidade decorrente da falta de exame crítico das provas, é sabido que nos termos do disposto nos arts. 123º nº 2 do CPPT e 659º nº 3 do C. Proc. Civil, na elaboração da decisão final o julgador está vinculado a elencar discriminadamente, a factualidade demonstrada da não provada, fundamentando porque veio a tomar o sentido decisório final, seja no que concerne ao julgamento da matéria de direito, seja, como é axiomático e evidente, no que diz respeito ao julgamento da matéria de facto, na medida em que aquele mais não será do que subsunção desta última ao enquadramento jurídico tido por relevante e aplicável.
Por sua vez, verifica-se obscuridade quando a sentença contenha “algum passo cujo sentido seja ininteligível” ou do qual não possa apreender-se o seu sentido exacto, enquanto a ambiguidade ocorre quando “alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos” (cfr. Prof. José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 151).
Nesta sequência, cumpre notar que o vício em apreço, em qualquer das vertentes apontada, apenas ocorre quando haja ausência total de fundamentos, sendo que a sentença posta em crise começa por ponderar que a ora Recorrente invoca a sua ilegitimidade substantiva para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado, o que significa que definiu de forma clara o objecto do processo, não existindo qualquer confusão com qualquer outro elemento e balizou de forma clara a primeira questão tratada nos autos.
Não se olvida que na sua argumentação recorre a um aresto do S.T.A. onde é considerada a relevância da defesa apresentada também ao nível das coimas aí apontadas, emergindo do exposto que o decisor entendeu que a doutrina do aresto tinha aplicação à matéria objecto dos presentes autos, sendo que o facto de a transcrição efectuada abranger a situação das coimas não é susceptível de tornar ininteligível o exposto, de modo que, considerando os termos da decisão recorrida, é manifesto que a invocada nulidade não pode ser atendida em qualquer das vertentes descritas na medida em que foi apontada a realidade em equação, tendo sido considerado que a alegação da ora Recorrente não era subsumível aos fundamentos de oposição previsto no art. 204º do CPPT, o que nos remete para o eventual erro de julgamento nesta sede.
Aliás, a Recorrente não revela qualquer dificuldade em referir que o presente recurso é interposto da Sentença de 17/01/2019, a qual rejeitou liminarmente a Oposição à Execução, por considerar que a ilegitimidade invocada não consubstancia fundamento de Oposição à Execução, nos termos do art. 204º, n.º 1 do CPPT e que a suspensão decorrente da declaração de Insolvência da Recorrente é manifestamente improcedente.
Quanto à substância da questão suscitada nos autos, cabe notar, antes de mais, que o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo. Assim, o despacho de indeferimento liminar só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.).
Daí que a jurisprudência tenha vindo a afirmar que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado.
No caso, como já se disse, a ora Recorrente invoca a sua ilegitimidade substantiva para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado, sendo que importa apreciar se tal matéria constitui fundamento de oposição à execução fiscal ou se, pelo contrário, trata-se de matéria que não integra nenhum dos fundamento admitidos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, o que configura motivo de rejeição liminar da petição inicial, nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alínea b), do CPPT.
Isto porque é inequívoca a natureza taxativa dos fundamentos da oposição à execução fiscal, sem prejuízo do carácter aberto da previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, sendo que essa «taxatividade dos fundamentos de oposição não implica uma restrição aos direitos fundamentais de acesso aos tribunais, à tutela judicial efectiva e ao recurso contencioso, uma vez que a impugnação de actos lesivos é permitida sempre que a lei não assegurar um meio de os impugnar contenciosamente, como expressamente se refere na alínea h) do n.º 1» - Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 2 ao art. 204.º, págs. 441/442. ).
Nesta medida, e tal como decidido, afigura-se-nos manifesto que a ora Recorrente não poderá discutir nesta sede a legalidade da liquidação das taxas de portagem (designadamente, nas suas vertentes da legitimidade passiva), sendo que a Recorrente, ao invocar a sua ilegitimidade substantiva para a presente execução, por não ser a condutora do veículo automóvel nas datas que originaram a dívida de taxas de portagem e custos administrativos associados em cobrança coerciva no processo executivo mencionado, está a colocar em crise a legalidade da liquidação, o que significa que terá de suscitar tal realidade noutra sede.
Diga-se ainda que o facto de eventualmente não ter sido notificada das liquidações em apreço não lhe abre a possibilidade de impugná-las em sede de oposição à execução fiscal, possibilidade prevista na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT apenas relativamente às situações em que, porque as dívidas exequendas não resultam de acto administrativo ou tributário, a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação e já às situações em que a lei o assegure, mas o sujeito passivo não tenha podido utilizá-lo por falta de notificação - Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 37 a) e b) ao art. 204.º, págs. 495/496.).
A única alavanca que poderia ter sido utilizada pela Recorrente prende-se com a deslocação da questão para a matéria da inexigibilidade da dívida, na medida em que a falta de notificação da liquidação das taxas de portagem, porque determina a inexigibilidade das dívidas que tenham origem nesses actos, integram, em abstracto, o fundamento de oposição à execução fiscal previsto na alínea i) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT, de modo que, o presente recurso está condenado ao insucesso neste âmbito em função do modo como a Recorrente enquadrou a questão na sua petição inicial, fazendo apelo à al. b) do art. 204º do CPPT.
A Recorrente aponta ainda que resulta da certidão de dívida que o período tributário em questão reporta a Janeiro de 2017 e não ao ano de 2018, sendo, consequentemente, anterior à declaração de insolvência da Recorrente que ocorreu em 19/09/2017, ao abrigo do processo n.º 3053/17.9T8AVR, que corre termos no Juízo de Comércio de Aveiro - Juiz 3, o que significa que a presente execução não poderá prosseguir, devendo a mesma ficar suspensa, nos termos do art. 88º do CIRE.
Ora, é sabido que e a dívida tributária se vence no momento em que o credor adquire o direito de exigir o pagamento ao devedor, momento que não pode deixar de se referir ao termo final do prazo para o pagamento voluntário, prazo que, na ausência de lei em contrário, se inicia com a notificação ao contribuinte para pagamento, em conformidade com o disposto no art. 85º, nºs 1 e 2, do CPPT.
Pois bem, a certidão de dívida que consta de fls. 15 dos autos indica como data limite de pagamento relativamente aos valores aí descritos a data de 06-10-2017, o que significa que as dívidas em apreço se venceram na data agora indicada, situação que não se confunde com o momento em que é elaborada a certidão de dívida.
Nesta medida, não se compreende a alegação da Recorrente nesta sede, quando refere que o período tributário reporta-se a Janeiro de 2017 e não a 2018, até porque é incontroverso que as situações que deram origem à liquidação das taxas de portagem e custos associados ocorreram em Dezembro de 2016.
De qualquer modo, aquilo que é decisivo neste âmbito é o momento do vencimento da dívida que, neste caso, tem de reportar-se a 06-10-2017, o que quer dizer que a decisão recorrida andou bem ao apontar que, apesar de dizer respeito a Dezembro de 2016, tem como data limite de pagamento o dia 06-10-2017. Ou seja, não há dúvida de que se trata de um crédito vencido após a declaração de insolvência, a qual ocorreu em 19-09-2017 e, assim sendo, cai no âmbito da previsão do n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que preceitua que o disposto em tal artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência, que seguirão os termos normais até à extinção da execução, ou seja, nada obsta à instauração e prossecução de execução fiscal para cobrança destas concretas dívidas tributárias, desde que na penhora de bens seja observada a restrição supra referida.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
***
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 04 de Julho de 2019
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Cristina da Nova
Ass. Ana Paula Santos