Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01671/16.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/30/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:João Beato Oliveira Sousa
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
Sumário:1. Verifica-se que o acto visado não consubstancia uma ordem de remoção do totem, painéis e respectivos suportes pertencentes à Recorrente, inserindo-se apenas, como acto instrumental e interlocutório no procedimento que poderá vir a conduzir a essa ordem de remoção.
2. Acresce que a sua execução coerciva que de resto não deverá ser tomada sem nova audiência da Recorrente e exigirá a prévia determinação da posse administrativa do imóvel nos termos dos artigos 71 e 72º do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público.
3. Nestas circunstâncias o acto visado nestes autos não tem potencial para produzir directamente e de forma iminente os prejuízos de difícil reparação, ou factos consumados, invocados pela Recorrente.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Petróleos de Portugal – P..., S.A.
Recorrido 1:Município de Vila Nova de Gaia
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
Petróleos de Portugal – P..., S.A. veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF do PORTO julgou improcedente o presente processo cautelar, prévio à instauração da respectiva acção principal, contra o Município de Vila Nova de Gaia, visando a suspensão de eficácia do ato administrativo do Vereador do Município de Vila Nova de Gaia, datado de 20 de abril de 2016, que lhe foi notificado através do Ofício com a ref.ª 3028/2016, dessa mesma data, assim como, a intimação do Município para que se abstenha de praticar os actos tendentes à remoção dos seus bens, anunciados na decisão.
*
Em alegações a Recorrente formulou as seguintes conclusões:
A) O presente recurso vem interposto da douta Sentença de 08.08.2016 que julgou improcedente o processo cautelar, a qual além de se fundar em pressupostos de facto e de direito errados e insuficientes, padece de omissão de pronúncia, e violação do direito ao contraditório, gerador de nulidade.

B) Incorreu em omissão de pronúncia o douto Tribunal porquanto não se pronunciou sobre a produção de prova testemunhal, a qual foi requerida pela Recorrente no seu RI, nem proferiu nenhum despacho que fundamentasse a sua recusa ou desnecessidade, como seria sempre exigido, pelo art. 118º/5 CPTA.

C) Ora, o facto de não ter existido nenhum despacho/decisão por parte do Tribunal a quo, faz a douta sentença incorrer em omissão de pronúncia, não tendo sido cumprida uma formalidade exigida por lei, o que acarreta a sua nulidade – v. art. 195º/1 e 615º/1/d) CPC.

D) Errou o Tribunal a quo porquanto, ao contrário do decidido, deveria ter sido produzida prova testemunhal, para prova de certos factos que, por si só, determinaria não só a verificação do requisito “periculum in mora” mas também do “fumus bonus iuris”.

E) Sendo certo que nos presentes autos, e em especial, no que toca ao requisito do periculum in mora, a inquirição de testemunhas se afigura indispensável à boa decisão da causa, a falta de cumprimento dessa formalidade exigida por lei, implica a nulidade da Sentença, devendo assim ser revogada e substituída por outra que ordene a baixa dos autos e ordene a realização da referida inquirição das testemunhas arroladas.

F) Além disso, incorreu ainda o douto Tribunal em erros de julgamento que colocaram em crise uma decisão favorável – o que implicaria uma pronúncia necessariamente diferente no que toca aos requisitos legais para decretar esta providência.

G) A omissão de pronúncia implicou também a preterição do direito ao contraditório das partes, pois a ora Recorrente (e bem assim, a Recorrida) ficaram sem possibilidade de se oporem à pretendida dispensa de prova, configurando esta situação uma nulidade, por preterição de uma formalidade legalmente exigida e que pode influir no exame ou na decisão da causa, como vimos, nos termos do art. 195º/1 CPC aplicável ex vi o art. 1º CPTA.

H) Em concreto e quanto à matéria de facto, a Recorrente – não concordando com todos os factos dados como provados - não se pode conformar com a relevância de determinados factos dados como assentes que devem ser desconsiderados – factos elencados nos nº 2, 5 e 6.

I) Relativamente ao 1º facto, elencado como n.º 2 da matéria assente, não se percebe a sua relevância para a decisão de decretamento desta providência, além de nenhuma ilação ou conclusão é retirada deste facto no segmento decisório sobre as questões de direito.

J) A isto acresce que o mero facto de terem sido levantados autos de notícia não significa que existam fundamentos válidos para a existência ou procedência de uma contra-ordenação, que pode muito bem concluir-se pela absolvição – por estas razões, este facto não é relevante para a decisão destes autos.

K) Quanto ao 2º facto sobre as fotografias que foram juntas ao processo, teria sido essencial especificar o que resulta provado dessas mesmas imagens e por conseguinte de que elementos estamos a falar.

L) Em especial, entendemos ser importante dar como provado que no referido posto encontra-se afixado o totem de dupla face, que constitui o painel exigido por lei por forma a informar os consumidores da

“indicação do preço de venda a retalho dos combustíveis efectuada nos postos de abastecimento de combustíveis.” – v. art. 1º/1 do DL 170/2005.

M) Mais à frente, na parte da impugnação da matéria de direito, este facto é importante para provar que este totem de dupla face não constitui publicidade e por isso, não poderá ser alvo de remoção pelo Recorrido.

N) O TAF deveria ter tomado uma posição sobre o pórtico de sinalização que se encontra à entrada do posto e contém a indicação dos preços – o que não aconteceu!

O) Como se disse, este painel é obrigatório por lei e deverá conter, para além dos preços dos combustíveis, a identificação do posto e das marcas dos combustíveis comercializados.

P) Por fim, quanto ao 3º facto sobre a data de entrada da presente petição, o tribunal não retira nenhuma ilação nem nenhuma conclusão na Sentença, pelo que também o consideramos irrelevante.

Q) Em conclusão, devem ser antes dados como provados os seguintes factos que consideramos importantes (sem prejuízo de outros factos que seriam provados pela prova testemunhal):

a) Que no ano de 2013 foi realizada audiência prévia – v. art. 14º e Doc. 1 junto ao RI;

b) Que a Recorrente não recebeu mais nenhuma resposta por parte do Município, até dia 22/04/2016, data da notificação do acto ora suspendendo – v. art. 18º e Doc. 1;

c) Com isso, foram ultrapassados os 90 dias para a conclusão do procedimento e não foi a Recorrente notificada de nenhuma prorrogação;

d) Que está instalado à entrada do posto um totem de dupla face, com indicação dos preços dos combustíveis e do logótipo da empresa – v. art. 67º e Doc. 1.

e) Que tal totem constitui o painel exigido pelo Decreto-Lei n.º 170/2005, que regula as regras sobre a informação e indicação dos preços de venda a retalho dos combustíveis – cfr. invocado no art. 68º e 69º.

f) Que no posto também se encontram letreiros, compostos por letras soltas, ostentando os dizeres “Galp + logotipo” e três bandeiras com os dizeres “+Descontos 6ª Feira e Sábado”.

g) Que estes elementos fazem parte do estabelecimento comercial e publicitam exclusivamente bens comercializados no próprio posto.

R) A nível da matéria de direito, também entendemos que a douta Sentença incorreu em erros de julgamento, no que toca à verificação dos requisitos essenciais para decretamento da providência cautelar peticionada.

S) A Recorrente invocou vários vícios que implicam a ilegalidade do presente acto, incluindo: o incumprimento do prazo geral para conclusão do procedimento administrativo nos termos do art. 58º CPA; a violação de lei – em especial, do disposto no Decreto-Lei n.º 170/2005; a lesão grave de direitos fundamentais; e a inconstitucionalidade das normas do regulamento ao abrigo das quais o acto foi emitido.

T) Sem prejuízo, o douto Tribunal não se pronunciou especificadamente sobre cada vício nem concretizou nenhum destes fundamentos, bastando-se com a argumentação genérica de que não seria possível “concluir estarmos perante um acto manifestamente ilegal”.

U) Adicionalmente, o facto de não ter dado como provado ou não provados determinados factos, acima descritos, sem ter ouvido as testemunhas arroladas, prejudicou (em larga medida) uma decisão favorável.

V) Por outro lado e sem prejuízo do que se expôs acima, a decisão de julgar não verificado o requisito do periculum in mora, foi uma decisão tomada com base numa omissão de pronúncia que levou a um erro de julgamento, que conforme vimos, inquinou o juízo do Tribunal a quo ao não ter determinado uma fase de instrução e produção de prova testemunhal.

W) Entendemos que o raciocínio do Tribunal em considerar que a remoção destes elementos neste posto, não aportará prejuízos de difícil reparação à Recorrente, porque é notório que a mesma é detentora de dezenas de postos de abastecimento espalhados pelo país é um raciocínio, no mínimo, falacioso e não tem em consideração as especificidades do funcionamento do sector.

X) Não é um raciocínio tido com base em qualquer prova constante do processo, não sendo lícito ao Juiz formular esses juízos sem qualquer fundamento!

Y) Note-se o regime especial do DL 170/2005, que impõe a colocação de um pórtico à entrada de todos os postos com a indicação da empresa e dos preços dos combustíveis, como forma de informar o consumidor e cuja ausência poderá ser passível de ser punido com uma contra-ordenação que, como se disse, poderá chegar aos € 30.000.

Z) E não estamos só a falar de um posto único no concelho de Vila Nova de Gaia; este Município já adotou esta conduta em mais outros 3 postos. Neste caso, o prejuízo poderia chegar aos € 120.000 só em coimas aplicadas.

AA) Podendo ainda os postos virem a ser encerrados se a afixação dos preços dos combustíveis for retirada, em violação de lei!

BB) Está em causa a defesa e salvaguarda de direitos fundamentais da Recorrente, como o seu direito de propriedade e livre iniciativa económica privada.

CC) Pelo que, à luz do que se deixa dito, entendemos que este requisito também deveria ter sido dado como verificado e provado, impondo-se a revogação da sentença.

Termos em que, com o douto suprimento de V. Ex.ªs, se requer seja dado provimento ao presente recurso, revogando a sentença recorrida e substituindo-se por outra que:

(i) ordene a audição das testemunhas arroladas, prosseguindo os autos até decisão final

ou

(ii)se dê total provimento ao pedido da Recorrente, como é de Lei e de Justiça!
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O Recorrido em contra alegação concluiu:

1 - A douta sentença recorrida que julgou improcedente a providência cautelar por não ocorrer manifesta ilegalidade do despacho impugnado nem se considerar demonstrado o requisito do periculum in mora constante da alínea b) do nº 1 do artigo 120º do C.P.T.A, não merece qualquer reparo, encontra-se devidamente fundamentada e fez correcta interpretação da lei aos factos, não violando quaisquer normativos legais nem incorrendo em omissão de pronúncia, pelo que deve ser mantida.

2 – Resulta do artigo 118º do CPTA que a produção de prova não é obrigatória e incumbe ao juiz aquilatar da sua necessidade pelo que a não inquirição das testemunhas arroladas não constitui uma nulidade processual uma vez que não constitui omissão de um acto que a lei prescreva que deva ocorrer sempre.

3 – Além de que, a recorrente no seu requerimento inicial, não requereu a realização de prova testemunhal, apenas indicou testemunhas para “caso seja julgado necessário”, tendo também deixado ao critério do julgador a realização ou não da prova testemunhal.

4 – O tribunal ao proferir sentença sem produção de prova testemunhal e sem se pronunciar expressamente sobre a mesma tacitamente considerou que a mesma era desnecessária e, como tal, também, por este motivo, não ocorre omissão de pronúncia nem tão pouco violação do princípio do contraditório.

5 – A sentença sob recurso não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia, não se encontrando violados os comandos normativos invocados pela recorrente, concretamente o artigo 195º nº 1 e 615º, nº1 alínea d) do CPC, nem tão pouco o artigo 118º do CPTA, pelo que devem improceder as conclusões A), B), C), E) e G) das alegações de recurso.

6 – Tendo em atenção que o que está em causa não é a decisão do fundo da questão mas a suspensão de eficácia do acto em causa a fim de evitar a lesão dos invocados direitos e interesses e a produção de prejuízos irreparáveis, ou seja se a situação é ou não merecedora de tutela cautelar, a douta sentença concluiu que para a adoção da requerida providência; “era mister que a Requerente alegasse e fizesse prova, no sentido de que com a continuidade da motivação dada a conhecer por parte do requerido, de que vai proceder à remoção das estruturas de suporte de publicidade e relativamente às quais a Requerente nada fez, seja por inacção sua, seja pela insusceptibilidade de esses suportes se puderem manter no local, que não poderia continuar a sua actividade de venda de combustíveis.”

7 – Deste modo, a inverificação do requisito do “periculum in mora” decorre não da falta de prova mas da alegação de factos não tendo a requerente alegado factos consubstanciadores dos prejuízos irreparáveis não é a realização da prova testemunhal indicada que vai colmatar essa falta, pelo que a eventual realização de prova para os factos relacionados na alínea Q) das alegações não alteraria o sentido da decisão uma vez que tais factos não consubstanciam prejuízos irreparáveis que justifiquem a tutela cautelar.

8 – In casu a recorrente não alegou factos concretos que, a provarem-se, demonstrem que a lesão ou receio de lesão seja causadora de prejuízos irreparáveis fundamentados que justifiquem a tutela cautelar e, só por isso, a douta sentença concluiu pela inverificação do requisito do “periculum in mora”.

9 – Além disso, a requerida alteração da matéria de facto deve improceder, por ou serem factos já aceites, ou decorrerem do procedimento administrativo ou serem conclusivos ou questões de direito.

10 - A sentença fundamentou devida e adequadamente a decisão que tomou de não ocorrer a manifesta ilegalidade dos actos impugnados e de não estar demonstrado o periculum in mora, pelo que não foram violados quaisquer comandos normativos, sendo certo que a recorrente nem sequer invoca algum.

11 – Também não se verifica o alegado erro de julgamento na apreciação da matéria de direito, por ter invocado vários vícios da eventual ilegalidade do acto em causa e o tribunal não se pronunciar especificamente sobre cada vício, porquanto “ (…) não cabe no âmbito deste processo cautelar avaliar se o ato impugnado é ilegal, antecipando deste modo para um processo sumário e urgente, a decisão sobre a questão de mérito do processo principal, mas tão só avaliar se a alegada invalidade é tão manifesta que não deixe dúvidas sobre a necessária procedência da pretensão a julgar na acção principal.”, como consta do Acórdão do TCA Norte proferido em 17/04/2015 no processo 03175/14.8BEPRT.

12 – Acresce que não sendo os requisitos de verificação cumulativa, isto é, sendo suficiente a verificação de um deles, nem se torna necessário que a sentença se pronuncie sobre todos os requisitos, logo que dê um por verificado

13 - Assim, bem decidiu a douta sentença ao negar provimento á presente providência por considerar que não ocorre manifesta ilegalidade dos despachos impugnados e não se encontrar demonstrado o requisito do periculum in mora, pelo que deve ser mantida, por válida e legal.

Termos em que deverá ser mantida a sentença recorrida e julgada improcedente a providência cautelar requerida, assim se fazendo Justiça.

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O Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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A Recorrente respondeu ao parecer do MP.
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QUESTÕES A RESOLVER

Tendo em conta as conclusões formuladas pela Recorrente há que indagar das seguintes questões:

- Nulidades da sentença recorrida, decorrentes de alegada omissão de pronúncia, prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC e da preterição do direito ao contraditório, cominada no artigo 195.º, n.º 1, do mesmo diploma.

- Erros de julgamento na dispensa da prova testemunhal e na seleção dos factos assentes.

- Erros de julgamento em matéria de direito.

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FACTOS
Consta na sentença:
Com interesse para a decisão a proferir julgo provados os seguintes factos:

1 – No dia 23 de dezembro de 2008, a Direcção Regional de Economia do Norte, emitiu à Requerente, a Licença de Exploração n.º 162, para explorar o posto de combustíveis existente na avenida Dr. MS, sentido sul-norte, em Ps... e Sx..., em Vila Nova de Gaia - Cfr. doc. 3 junto com o Requerimento inicial;

2 – Visando a publicidade e respectivos suportes existentes no posto de combustíveis existente na avenida Dr. MS, sentido sul-norte, em Ps... e Sx..., em Vila Nova de Gaia, o Requerido emitiu os autos de notícia n.º 16/2013, de 04 de fevereiro de 2013, n.º FM-45/2016, de 18 de fevereiro de 2016, e n.º FM-44/2016, de 18 de fevereiro de 2016 - Cfr. fls. 4, 24, 25 do Processo Administrativo;

3 - No dia 16 de março de 2016, no seio do Requerido, com reporte à publicidade e respectivos suportes existentes no posto de combustíveis existente na avenida Dr. MS, sentido Lisboa-Porto, em Ps... e Sx..., em Vila Nova de Gaia, foi emitida informação na qual se concluiu que devia a Requerente proceder á regularização das mensagens publicitárias apostas nos vários suportes, adotando uma de três posturas admissíveis, com o que concordou o Vereador Manuel Monteiro, da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, por seu despacho datado de 20 de abril de 2016 – Cfr. fls. 26 a 26.5 do Processo Administrativo;

4 – O Requerido remeteu à Requerente o ofício datado de 20 de abril de 2016, sob a epígrafe “Convite à regularização”, Ref.ª 3028/2016, subscrito pelo Diretor do Departamento da Polícia Municipal da Câmara de Vila Nova de Gaia, o qual, por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai como segue:

[imagem omissa]

5 – No dia 07 de julho de 2016, os serviços do Requerido elaboraram informação, onde reportaram e fotografaram os suportes publicitários a que se reportam os autos, que estão afixados no posto de combustíveis – Cfr. fls. não numeradas do Processo Administrativo;

6 – O Requerimento inicial que motiva o presente processo cautelar foi remetido a este Tribunal em 27 de junho de 2016.

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Fundamentação:
Os factos dados como assentes supra, tiveram por base os documentos constantes dos autos, assim como do Processo Administrativo junto aos autos pelo Requerido, e ou que não resultaram controvertidos, ou por decorrência da tramitação dos autos.
~
Com interesse para a decisão a proferir, nada mais se julgou provado.
~
Dão-se aqui por integralmente enunciados os documentos referidos supra na matéria de facto assente.
*
DIREITO

Nulidades da sentença

Esta matéria é versada nas conclusões A-G da Recorrente.

Tal como se refere no parecer do MP não é exacto que o TAF haja omitido pronúncia sobre a questão da produção de prova testemunhal, pois o invocado requerimento formulado nesse sentido no requerimento inicial foi ponderado e indeferido, nos termos do artigo 118º/3/5 do CPTA, no despacho interlocutório a folhas 82-A do processo físico.

Em rigor nem sequer foi formulado um requerimento para produção de prova, mas apenas foi indicada uma testemunha “a apresentar, caso seja julgado necessário”, ou seja, sob condição de que o TAF considerasse necessária essa prova, nos termos do artigo 118º/1/3 CPTA. Condição que não se verificou.

Assim, uma vez que o TAF não decidiu nada para além dos limites do previamente requerido pela parte, o contraditório foi plenamente garantido.

Mais adiante, na conclusão V) por exemplo, a Recorrente alega que aquela situação (que qualifica, sem precisão, como “omissão de pronúncia”) levou a um erro de julgamento.

Mas sendo assim, já se ultrapassa o campo das nulidades da sentença e se entra no domínio do julgamento de mérito.

Em suma, não se verifica a nulidade da sentença.


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Erro de julgamento po preterição de prova

Alega a Recorrente que “deveria ter sido produzida prova testemunhal, para prova de certos factos…”

Mas quais factos? A Requerente não especificou quais os factos que pretendia provar através da prova testemunhal sugerida e, portanto, não pode fazer-se uma avaliação minimamente credível sobre a influência de tal “preterição” no exame e decisão da causa.

Veio ainda a Recorrente, em resposta ao parecer do MP, argumentar:

«Como de resto sucede nos presentes autos, os meios probatórios requeridos são, pois, totalmente indispensáveis para a prova dos “prejuízos de difícil reparação” que se gerarão na esfera da ora Recorrente e, consequentemente, para se dar por verificado o requisito “periclum in mora” e, nesse seguimento, o requisito do “fumus boni iuris”, culminando no decretamento da providência cautelar requerida.

De resto, como se verá, são tão essenciais que face à sua dispensa – e só por isso – foram considerados não provados os prejuízos da ora Recorrente.

E até por isto se vê que mal andou o Tribunal: se entende que falta prova, não pode dispensá-la…

Se o Tribunal entende que falta prova e ela foi requerida, é obrigação do Tribunal providenciar essa prova.

O Tribunal não pode dispensar prova requerida e depois vir dizer que falta prova…

Com efeito, a inquirição de testemunhas (como requerido pela ora Recorrente) seria crucial para demonstrar que elementos existem atualmente no posto em causa, bem como para provar os prejuízos que a Recorrente teria com uma eventual remoção dos mesmos, que poderia levar ao próprio encerramento do posto.

(…)
Ora, do exposto resulta que o douto Parecer é errado e totalmente contraditório: se, por um lado, o Digm.o MP pugnou pela não produção da prova indispensável para a comprovação dos prejuízos de difícil reparação, por outro lado, veio depois, pasme-se, assinalar a falta de prova que o mesmo havia entendido não ser necessária!
Laborando no mesmo erro da Sentença recorrida…»

Mas esta argumentação cai pela base, ao partir do pressuposto inverídico de que o MP assentou o seu parecer, e o TAF a sua decisão, na falta de prova dos factos relativos ao “periculum in mora”.

Na realidade o MP refere que “os factos alegadamente omitidos não versam sobre o requisito periculum in mora” e que “ainda que esses factos viessem a ser dados como provados, não lograriam inverter o sentido da decisão judicial recorrida”.

E na sentença pode ler-se:

«Para efeitos de adoção das requeridas providências cautelares, era mister que a Requerente alegasse e fizesse prova, no sentido de que com a continuidade da motivação dada a conhecer por parte do Requerido, de que vai proceder à remoção das estruturas de suporte de publicidade e relativamente às quais a Requerente nada fez, seja por inacção sua, seja pela insuscetibilidade de esses suportes se puderem manter no local, que não poderia continuar a sua actividade de venda de combustíveis.»
E nessa sequência racional, o TAF entendeu que não se verificava o requisito periculum in mora, em ambas as vertentes, facto consumado ou prejuízos de difícil reparação, por falta de alegação (e não apenas prova) de factualidade idónea para o efeito.
Assim esta arguição improcede.

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Erros de julgamento na selecção dos factos

Recorrente insurge-se sobre a inclusão dos factos 2, 5 e 6 nos factos assentes na sentença, aparentemente por receio de que deles possam ser extraídas erradas ilações. Não impugna esses factos na sua materialidade (nem seria sensato, pois estão documentados nos autos) mas apenas diz que “não se percebe a sua relevância para a decisão”.
Trata-se de um receio infundado sobre a hipotética relevância desses factos, pois a própria Recorrente não identifica nenhuma ilação contrária aos seus interesses que deles tivesse resultado na decisão. Mais, tais factos não versam sobre o requisito periculum in mora, único apreciado, e portanto a ilação potencial ou efectivamente deles tirada foi favorável à Recorrente, uma vez que o TAF, pelo menos implicitamente, admitiu a aparência de bom direito, ou seja a probabilidade de a pretensão formulada ou a formular no processo principal vir a ser julgada procedente.
Na conclusão Q) a Recorrente elenca factos que, em sua opinião, deviam ser dados como provados, mas que têm a ver com a legalidade do acto e não com o periculum in mora e cuja relevância impugnatória em face da decisão do TAF é, portanto, nula.

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Erros de julgamento de direito

Neste campo discute-se o mérito da decisão quanto à inverificação no caso de periculum in mora. Transcreve-se a este respeito da sentença:
«Decorre do artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, que só prejuízos de difícil reparação para os interessados, lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil reparação, ou quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado, é que são merecedores de tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar, em ordem a alcançar-se uma tutela jurisdicional efectiva, sem lacunas.

Para efeitos de adoção das requeridas providências cautelares, era mister que a Requerente alegasse e fizesse prova, no sentido de que com a continuidade da motivação dada a conhecer por parte do Requerido, de que vai proceder à remoção das estruturas de suporte de publicidade e relativamente às quais a Requerente nada fez, seja por inacção sua, seja pela insuscetibilidade de esses suportes se puderem manter no local, que não poderia continuar a sua actividade de venda de combustíveis.
Como julgamos ser óbvio, por experiência comum de vida, a ausência de publicidade local, física, por si só, não pode ser motivo de impedimento de a Requerente continuar a prosseguir a sua actividade nesse posto de venda de combustíveis.
Para além de que, como também é do conhecimento público, a Requerente é detentora de dezenas de postos de abastecimento espalhados pelo país, e não é o simples facto de poder ser iminente a remoção de suportes publicitários, colocados no próprio local onde procede à venda de combustíveis num dos postos situados em Vila Nova de Gaia, que essa actuação do Requerido lhe aportará prejuízos de difícil reparação, e uma situação de facto consumado.
Incumbia à Requerente o ónus de provar ou demonstrar [artigo 342.°, n.° 1 e 2, do Código Civil e artigo 5.º n.° 1 do CPC], as razões determinativas, concretas, para a decretação pelo Tribunal, em processo cautelar, e segundo juízos de verosimilhança, de uma decisão que, tendo como base os factos alegados e os elementos probatórios dos autos e, ainda, a experiência comum, pudessem ser evitados os prejuízos, conforme sustentou, e que esses prejuízos fossem irreparáveis.

Atenta a natureza da providência requerida, o Tribunal leva a cabo uma apreciação sumária da prova apresentada, sendo que esta tem de ter relevância para a questão decidenda a proferir em sede cautelar.

Constitui, pois, nossa convicção, por experiência comum de vida, que a não adopção da presente providência cautelar de suspensão de eficácia da decisão suspendenda não é suscetível de causar à Requerente prejuízos de difícil reparação, nem a constituição de uma situação de facto consumado, razão pela qual não se mostra verificado, in casu, o requisito de periculum in mora, condição sine qua non do deferimento da presente providência cautelar.»

Sobre isto e de forma algo surpreendente, a Recorrente continua nas demais conclusões, R) e seguintes, a atacar preferencialmente a sentença do ponto de vista da questão da ilegalidade do acto impugnado, matéria cuja discussão é reservada para a acção principal.

É certo que finalmente, sobretudo nas conclusões Y) a BB), acaba por realçar alguns aspectos que poderiam, em abstracto, preencher o conceito de prejuízos de difícil reparação, mas que em concreto são insuficientes para o efeito.

Mas sem êxito, pois em contrário é decisivo um outro argumento, que foi aduzido pelo TAF, em despacho saneador, para julgar inverificada a exceção de inimpugnabilidade do acto, mas que, no contexto agora em causa, possui aptidão para infirmar a existência no caso de periculum in mora.

Transcreve-se:

«No âmbito da Oposição deduzida pelo Requerido, o mesmo sustentou que, como enunciado no ofício dirigido à Requerente, datado de 20 de abril de 2016, que tal se tratava de um mero convite à regularização [Cfr. pontos 1 a 16 da Contestação], assim como, que o ato administrativo em causa é inimpugnável, por não consubstanciar uma ordem de remoção [Cfr. pontos 17 a 24 da Contestação], pois que, apenas se a Requerente não regularizar a situação, como foi convidada, é que no futuro pode aportar consequências na sua esfera jurídica, no sentido de que irá dar início ao procedimento de reposição da legalidade previsto no artigo 71.º do RMDPPOEP.

Ora, como julgamos, não assiste razão ao Requerido.

Com efeito, ainda que, como refere ao Requerido, essa notificação comporte um acto procedimental que não põe termo ao procedimento, sendo apenas um mero convite à regularização de uma situação de facto, o ato que lhe está na base, da autoria do Vereador da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, datado de 20 de abril de 2016, porque visa a produção de efeitos jurídicos externos, na esfera jurídica da Requerente, tal é objecto de impugnação, tendo subjacente o disposto nos artigos 51.º, n.º 1 e 113.º, ambos do CPTA, sendo assim um ato passível de impugnação.»

Ora bem, como se antecipou, não sendo tal fundamentação idónea para fundar a inimpugnabilidade do acto, é no entanto idónea para demonstrar que o acto visado não consubstancia uma ordem de remoção do totem, painéis e respectivos suportes pertencentes à Recorrente, inserindo-se apenas, como acto instrumental e interlocutório no procedimento que poderá vir a conduzir a essa ordem de remoção, que de resto não será previsivelmente tomada sem nova audiência da Recorrente. Acrescendo que a sua execução coerciva não será viável sem que seja previamente determinada a posse administrativa do imóvel (cf. artigos 71 e 72º do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público), o que, em conjunto, retira ao acto visado nestes autos potencial para produzir directamente e de forma iminente os prejuízos de difícil reparação, ou factos consumados, invocados pela Recorrente.

Deste modo improcedem todas as conclusões da Recorrente, sendo de confirmar a sentença.

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DECISÃO

Pelo exposto acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Porto, 30 de Novembro de 2016
Ass.: João Beato Sousa
Ass.: Hélder Vieira
Ass.: Joaquim Cruzeiro