Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02407/21.0BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/05/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA;
DEFEITOS DA OBRA;
LIBERAÇÃO DA CAUÇÃO (APENAS) APÓS REPARAÇÃO DOS DEFEITOS;
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
«EMP01...», LDA., com sede na Rua ..., ..., ..., ..., instaurou AÇÃO ADMINISTRATIVA contra o Município ... (doravante entidade demandada, ED., R., ou ME), com sede na Praça ..., peticionando:
a. A anulação do despacho do Presidente do Município ..., de 12.10.2021, que determina que será o adjudicatário (a A.) a responder perante o Município ... pelos defeitos da obra, que deverão ser corrigidos o mais rapidamente possível e, bem assim, ordena a liberação da caução apenas após tal reparação;
b. Ser declarado que o Município age com abuso de direito, devendo manter-se os termos, condições, validade e eficácia do acordo de reparação de defeitos;
c. Ser o Município condenado a pagar à A. a quantia total de € 16.341,38, correspondente ao valor vencido a título de retenções (€ 15.217,77), acrescido de juros de mora, à taxa de 7%, contados desde a data do auto para liberação da caução (16.11.2020) até 16.12.2021 que computou em € 1.123,62, juros vincendos e respetivos encargos legais.
Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi decidido assim:
a. Verificada a exceção de inimpugnabilidade do despacho do Presidente do Município ..., de 12.10.2021.
b. Quanto ao mais, totalmente improcedente a ação;
c. Improcedente o pedido de condenação da R. como litigante de má fé.
Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso de apelação da douta sentença proferida e que julgou verificada a exceção de inimpugnabilidade do despacho do Presidente do Município ... de 12/10/2021, julgando, ainda, quanto ao mais, totalmente improcedente a ação e, bem assim, improcedente o pedido de condenação da Ré como litigante de má-fé.
2. Não se conforma, a ora Recorrente, com tal douta sentença que, como se demonstra supra, é incongruente, contraditória, infundamentada, ilegal e, acima de tudo, injusta, salvo o devido respeito.
3. A douta sentença recorrida viola, antes de mais, o princípio do contraditório, nos termos do disposto no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, o que consubstancia uma nulidade processual suscetível de influir no exame ou decisão da causa.
4. E, a não observância de tal princípio, com a não concessão às partes da possibilidade de se pronunciarem sobre questões que importe conhecer, na medida em que possa influir no exame ou decisão da causa, constitui uma nulidade processual nos termos do artigo 195.º do CPC.
5. Note-se que, a M.ma Juíza titular dos presentes autos considerou inadmissíveis (processualmente) factos que contraditavam os argumentos invocados pela Ré na sua contestação – cfr. pág. 1, último parágrafo, da douta sentença recorrida – e, por outro lado, admitiu o Documento ... junto com a Réplica da ora Recorrente – cfr. pág. 2, 1.º ponto do 2.º parágrafo da douta sentença recorrida – documento esse que, conforme foi ali alegado, corresponde a uma carta da Ré, na qual esta vinha agora confirmar uma “reunião de trabalho com vista à resolução de todas as patologias existentes na obra”, “no seguimento do despacho do Sr. Presidente datado de 12/10/2021 e da informação ...21”, intitulando, desta feita, o despacho ora em crise, não como uma “mera declaração negocial” – como havia feito na sua contestação –, mas sim como um verdadeiro despacho que, no entender da Recorrente, reveste, sem dúvida, a natureza de um ato administrativo, sendo passível e suscetível de impugnação autónoma.
6. Por conseguinte, deveria (salvo melhor opinião), a M.ma Juíza titular dos presentes autos, designar uma audiência prévia, para os fins previstos no n.º 1 do artigo 87.º-A do CPTA, atenta a prova documental carreada para os autos, e, ao não o fazer, violou o princípio do contraditório já referenciado e, bem assim, o artigo 87.º-A do CPTA já citado.
7. E, apesar do determinado no artigo 87.°-B, n.° 1 do CPTA, certo é que, atenta toda a prova documental junta aos autos, não se afigura minimamente claro ou notório, o termo dos presentes autos pela procedência da exceção dilatória invocada (inimpugnabilidade do ato).
8. E, sem permitir o contraditório à Recorrente, o Tribunal recorrido, em clara violação do artigo 3.°, n.° 3 do CPC, julga injustamente procedente a exceção de inimpugnabilidade do ato e determina a improcedência total da ação.
9. Nessa medida, a decisão recorrida é nula, nulidade essa que veio influir na decisão da causa, sendo certo que, tal omissão praticada pelo Tribunal recorrido violou, ainda, os princípios constitucionais da igualdade, do acesso ao direito e do contraditório, nos termos preceituados no artigo 20.°, n.° 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa, devendo por isso declarar-se a nulidade processual em questão.
10. Por todo o exposto, entendemos que o Tribunal recorrido violou as normas dos citados artigos 87-A, n.° 1, alínea b) do CPTA, 3.°, n.° 3 do CPC e 20.°, n.° 1 e 4 da CRP, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
11. A douta decisão recorrida viola, ainda, o disposto no artigo 34.°, n.° 1 e 2 do CPTA, pois considera estarmos “...perante uma ação que tem por objeto a apreciação do cumprimento de um contrato que ascende ao valor de € 147.491,05, no que respeita à obrigação de reparação de defeitos e de devolução das quantias retidas a título de caução, ou seja, os pedidos compreendem-se no âmbito do disposto no art. 32.º, n.º 3 do CPTA.”, fixando aos autos o valor de €147.491, 05.
12. Ora, discordamos da aplicação daquela norma que, saliente-se, atende ao valor do contrato, quando o objeto da ação seja a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução desse mesmo contrato, o que, refira-se, entendemos não ser o caso.
13. De facto, o objeto do processo é, conforme se discrimina no pedido, a declaração de ilegalidade do ato administrativo praticado pela Ré, com a declaração de abuso de direito praticado por esta e, em cumulação, a condenação no pagamento à Recorrente das retenções e respetivos juros (no caso, o total de €16 341, 38).
14. Entendemos, assim, ser de aplicar o critério supletivo previsto no artigo 34.°, n.° 2 do CPTA, por considerarmos estar em causa um valor indeterminável que sempre consubstanciaria o valor que, desde logo, foi atribuído pela própria Recorrente (€30 000, 01), isto é, superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo.
15. Aliás, consideramos inclusive que, o pedido cumulativo formulado pela Recorrente e que consubstancia um valor económico e determinado no pedido, correspondente às retenções aí solicitadas e num total de €16 341, 38, estará já englobado naquele maior valor de €30 000, 01 ou, quando muito, acresceria àquele valor e somaria o total de €46 341, 38, por estarem em causa e terem sido peticionados pedidos cumulativos.
16. Fixar-se o exorbitante valor fixado na douta sentença recorrida, seria onerar injustamente as partes com taxas e custas elevadas que, nos presentes autos, não teriam qualquer cabimento, atentos os pedidos formulados e que, economicamente, não ascenderiam sequer a um décimo do valor fixado.
17. Nessa medida, entendemos que o Tribunal recorrido violou a norma do citado artigo 34.º, n.º 1 e 2 do CPTA, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
18. A douta decisão recorrida viola, ainda, o disposto nos artigos 307.º, n.º 2, alínea a), 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do CCP.
19. Considera, além do mais, que “A questão está em saber se o ato impugnado, que no essencial se traduz na imputação ao empreiteiro do dever de reparação dos defeitos e recusa de liberação da caução se reconduz a qualquer das alíneas do n.º 2 do art. 307.º, pois só aí estaremos perante um ato administração e não uma mera declaração negocial.”.
20. E, para justificar a fundamentação supra, a douta sentença ora em crise recorre ao probatório para dizer que “... a ordem de correção de defeitos, após a vistoria para receção definitiva, a que se reporta o art. 396.º, n.º 1 ex vi art. 398.º, n.º 5 do CCP, foi emitida em 5.6.2018 na sequência da vistoria de 25.5.2018. Essa ordem foi confirmada em 17.12.2020, na sequência da realização de nova vistoria em 26.11.2020.”, considerando que o ato impugnado não corresponde à ordem de reparação de defeitos, emitida nos termos daqueles preceitos, mas sim a um novo levantamento dos defeitos e apuramento do grau de imputabilidade aos intervenientes da responsabilidade pelos mesmos (à luz do processo negocial encetado pelas partes) e ao pedido de levantamento da caução pela Recorrente, ao esclarecimento da posição da Ré quanto à exigibilidade ao empreiteiro do dever de reparação dos defeitos (na medida da imputabilidade dos mesmos ao subempreiteiro) e aos moldes em que deve ser dado início ao processo de reparação e à recusa da liberação da caução enquanto tais defeitos não forem corrigidos.
21. Considera, por isso, a douta decisão recorrida, que, o ato impugnado e aqui em causa corresponde, na realidade, a uma mera declaração negocial.
22. Discorda totalmente, a ora Recorrente, de tal fundamentação, considerando que a douta decisão recorrida é contraditória e faz uma errada interpretação do artigo 307.º, n.º 2 do CCP, em confronto com toda a matéria factual provada e constante dos autos.
23. Importa por isso salientar que, a douta decisão recorrida considera provada, entre outra, a matéria de facto que se transcreveu nas alegações do presente articulado e que ora, por mera economia processual, nos abstemos de reproduzir.
24. Ora, de toda a documentação junta aos autos, é passível extrair a conclusão de que a Ré, com o despacho em causa, pretendeu, única e simplesmente, vincular a Recorrente, ordenando-lhe formalmente a reparação dos defeitos, contrariamente ao acordado com esta no acordo de eliminação dos defeitos celebrado em 08/02/2017.
25. De facto, entende a Recorrente que o despacho em causa vai além da mera declaração, não se ficando pela interpretação e/ou validade do contrato e reveste uma verdadeira ordem ou instrução no exercício dos poderes de direção e fiscalização, consubstanciadora de um ato administrativo passível de impugnação, nos termos do n.º 2 do artigo 307.º do CCP.
26. Note-se que, conforme havia sido alegado na PI, tal despacho declara a sua concordância com os fundamentos ali enunciados que, notoriamente, são contraditórios, já que – reitere-se –, aceita um acordo de eliminação de defeitos e que, de resto, assinou e outorgou em 08/02/2017 (cfr. doc. ... junto com a PI), aceitando, ainda, o relatório pericial de eliminação desses defeitos (cfr. doc. ... junto com a PI), e aceitando, nessa medida, os defeitos que tal relatório identificou e, bem assim, a responsabilidade da Ré pela sua correção (cfr. doc. ...3, pág. 9, junto com a PI) e, por sua vez, considera que é a Recorrente que deverá responder perante a Ré por esses defeitos (cfr. doc. ...3, pág. 10, junto com a PI)!!! Em que ficamos?
27. A Ré altera e modifica, a seu belo prazer, as clausulas contratuais do contrato que celebrou com a Recorrente, pretendendo depois prevalecer-se do argumento que invocou na sua contestação – isto é, que o seu despacho consubstancia uma mera declaração negocial – para, nessa medida, deixar passar os respetivos prazos de reclamações, induzir a Recorrente em erro ou tentar ludibriá-la, com manifesto abuso de direito, incumprindo, assim, o acordo de eliminação de defeitos que, de resto, assinou e outorgou em 08/02/2017 e não pagando, ainda, o que sabe que é devido à Recorrente, a título de retenções peticionadas na PI.
28. De facto, a Ré vem atuando com manifesto abuso de direito, não só na sequência da prolação do despacho em crise, como também nas alegações apresentadas com a sua contestação. Aliás, veio no decurso dos presentes autos – através de carta que a Recorrente rececionou em 09/02/2022 (e junta como doc. ... à Réplica e admitida como prova documental pelo Tribunal recorrido – cfr. primeiro ponto do segundo parágrafo da página 2 da douta decisão recorrida) – confirmar uma “reunião de trabalho com vista à resolução de todas as patologias existentes na obra”, “no seguimento do despacho do Sr. Presidente datado de 12/10/2021 e da informação ...21”, intitulando, desta feita, o despacho em causa, não como uma “mera declaração negocial”, mas sim como um verdadeiro despacho que, no entender da Recorrente, reveste, sem dúvida, a natureza de um ato administrativo, sendo passível e suscetível de impugnação autónoma.
29. A Ré vai atuando, alegando e contestando à medida das suas comodidades e necessidades, com flagrante abuso de direito e notória má-fé, com a agravante de ser uma entidade pública que sempre deveria ser um exemplo e, nessa medida, dar o exemplo!!
30. Reitere-se que, a Recorrente não foi visada no relatório pericial como sendo uma das entidades responsáveis pela eliminação dos defeitos, o que, aliás, foi aceite pela Ré, aceitação essa que, sempre prevalecerá sobre qualquer irregularidade – a qual não se concebe – que possa advir dos termos e condições estabelecidas com a adjudicação da empreitada efetuada pela ora Recorrente.
31. É assaz evidente que, a Ré – como entidade visada no relatório pericial já falado – pretende fugir à sua responsabilidade, correspondente, no caso, a 30%, não liquidando, por isso, à Recorrente as retenções já vencidas.
32. Os fundamentos contraditórios alegados pela Ré mais não são do que um evidente abuso de direito e uma flagrante má-fé, sendo que, no caso em concreto, o abuso de direito reveste-se na modalidade de “venire contra factum proprium”, que pressupõe que aquele em quem se confiou viole com a sua conduta os princípios da boa-fé e da confiança em que aquele que se sente lesado assentou a sua expectativa relativamente ao comportamento alheio, o que efetivamente se verificou na conduta da Ré.
33. Foi, portanto, num contexto criado e mantido pela própria Ré que a ora Recorrente (e demais empresas) aceitou o supra citado acordo e subsequente relatório pericial, documentos esses que, a Ré não pode agora olvidar, escudando-se com o cumprimento do Código dos Contratos Públicos.
34. No fantasioso entendimento da Ré, a Recorrente teria agora de suportar a reparação dos defeitos constantes do relatório pericial e do auto junto como Doc. ... à PI, sendo que, a responsabilidade pelos mesmos – 30% dessa responsabilidade – foi atribuída à própria Ré. E, em direito de regresso – alega a Ré na sua contestação –, pedir responsabilidades ao subempreiteiro identificado como responsável no relatório pericial. Esquece-se, contudo, a Ré que, tal subempreiteiro é apenas responsável em 70%, sendo que, os restantes 30% são da responsabilidade da própria Ré!!! De facto, no fantasioso entendimento da Ré, a Recorrente teria agora que suportar, pelo menos, com os 30% da responsabilidade da própria Ré!!!
35. Ora, a Ré sempre soube que, a assunção por todas as partes do acordo de eliminação dos defeitos, nos moldes aí elencados, teria como contrapartida a imputação a qualquer uma dessas partes (incluindo a própria Ré) da responsabilidade pela eliminação e correção dos defeitos visados no relatório pericial, não podendo, como se compreende, vir agora – e porque foi visada no relatório pericial, como uma das entidades responsáveis – invocar argumentos contraditórios, escudando-se no Código dos Contratos Públicos, num notório exercício ilegítimo de um direito, passados quase cinco anos desde a data em que outorgou, assinou (por intermédio do seu Ilustre Presidente da Câmara) e apôs o seu selo branco no Acordo correspondente ao doc. ... junto com a PI (em 08/02/2017). Na verdade, a Ré atua agora de forma avessa à boa fé que deve existir entre as partes, tornando absolutamente ilegítima a invocação de qualquer irregularidade, representando, a sua conduta, um “venire contra factum proprium”, modalidade de abuso de direito.
36. Assim, não nos parece de grande rigor a fundamentação apresentada pela douta decisão recorrida, não só pelo que supra se expôs, mas também, face a todos os documentos juntos aos autos e que documentam e contrapõem tal fundamentação.
37. Senão vejamos, da matéria de facto considerada provada, resultou provado, além do mais, que, a ora Recorrente celebrou, em 08/02/2017, com a Ré, juntamente com duas outras empresas (“«EMP02...», L.da” e “«EMP03...», S.A.”), uma transação extrajudicial ou um acordo de eliminação de defeitos (cfr. doc. ... junto à PI), e no qual se acordou que a cobertura do pavilhão desportivo de ... (da propriedade da Ré) apresentava os defeitos que iriam ser aferidos pelo relatório pericial a elaborar por laboratório acreditado para o efeito (cfr. cláusula segunda, ponto 1 e cláusula terceira, ponto 2 do doc. ... supra citado).
38. Todas as Signatárias, inclusive a Ré, aceitaram que os trabalhos de decapagem e metalização da cobertura em questão foram adjudicados e executados pela Terceira Signatária, após contrato de subempreitada celebrado entre esta e a Segunda Signatária e os trabalhos de pintura de tal cobertura foram adjudicados e executados pela Quarta Signatária, após contrato de subempreitada celebrado entre esta e a Terceira Signatária (cfr. cláusula primeira, ponto 3 e 4 do Doc. supra citado). Isto é, a Ré aceitou desde logo a intervenção (na transação) e a responsabilidade daqueles subempreiteiros que, igualmente, se responsabilizaram, perante todos, incluindo a Ré, na reparação de quaisquer defeitos que lhes viessem a ser imputados.
39. Atribuíram a tal acordo/transação o valor da execução específica (cfr. cláusula sétima daquele doc. ...).
40. Acordou-se assim, em tal documento, que, todas as signatárias desse acordo aceitariam eliminar e/ou corrigir os defeitos identificados, na medida das suas responsabilidades, isto é, a responsabilidade pela reparação e eliminação dos defeitos identificados, seria da entidade e/ou empresa visada no relatório pericial, relatório este que deveria, além do mais, apontar os responsáveis pelos defeitos da obra (cfr. cláusula segunda, ponto 2 do doc. ... supra citado).
41. Estabeleceram-se, nesse acordo, todas as regras, condições e prazos para a correção e eliminação dos defeitos no pavilhão pertença da Ré que, inclusive, outorgou, assinou (por intermédio do seu Ilustre Presidente da Câmara) e apôs o seu selo branco no Acordo correspondente ao doc. ... supra citado (cfr. páginas 1 a 4 desse doc. ...), juntamente com as restantes signatárias (incluindo as subempreiteiras), cujas assinaturas foram devidamente reconhecidas para todos os legais efeitos (cfr. páginas 5 a 10 do doc. ... supra citado).
42. Certo é que, após pedido de orçamento a dois laboratórios acreditados para a elaboração do relatório pericial referenciado na cláusula terceira desse doc. ..., todas as signatárias e, inclusive, a Ré aceitaram a elaboração desse mesmo relatório pelo ISQ (Instituto de Soldadura e Qualidade), nos termos da declaração que expressamente vieram prestar, respetivamente, em 20/11/2017, 05/12/2017, 11/12/2017 e a Ré em 08/02/2018 (cfr. Doc. ..., ..., ... e ... juntos à PI).
43. Após elaboração do relatório pericial, emitido em .../.../2019 pelo ISQ, e depois de solicitados todos os esclarecimentos a este Instituto e, nomeadamente, pela Ré, foram aferidas as responsabilidades pelos defeitos, nos termos constantes do acordo supra referido, isto é, aquele Instituto, após inspeção à obra (presenciada por todos os representantes dos signatários subscritores do acordo) veio determinar as responsabilidades pela correção dos defeitos à própria Ré e ao aplicador (no caso, a empresa “«EMP03...», S.A”), na proporção de 30% e 70% respetivamente (cfr. relatório pericial, pedido de esclarecimentos e respostas respetivas a tais esclarecimentos e que se juntaram como Doc. ... e ... à PI). Veja-se a tal propósito os pedidos de esclarecimento solicitados pela Ré a páginas 16 do doc. ... supra citado (cfr. email datado de 24/04/2019, pelas 13.13h), a páginas 13 desse doc. ... (cfr. email datado de 11/07/2019, pelas 16.39h), a páginas 9 desse doc. ... (cfr. email datado de 10/10/2019, pelas 17.19h) e a páginas 4 desse doc. ... (cfr. email datado de 28/02/2020, pelas 9.29h). E confira-se, a tal propósito, as respostas do técnico do ISQ a esses sucessivos pedidos de esclarecimento, nomeadamente, a páginas 14 do doc. ... supra citado (cfr. email datado de 26/06/2019, pelas 11.44h), a páginas 12 desse doc. ... (cfr. email datado de 22/07/2019, pelas 11.20h), a páginas 6 desse doc. ... (cfr. email datado de 18/12/2019, pelas 21.43h) e a páginas 3 desse doc. ... (cfr. email datado de 31/03/2020, pelas 19.º5h).
44. Nessa medida, foram emitidas, pelo ISQ, as respetivas faturas de tal relatório, na proporção das responsabilidades da Ré e do aplicador, nos termos constantes do doc. ..., página 1 (cfr. email datado de 19/06/2020, pelas 19.52h), faturas essas que, de acordo com informação prestada à ora Recorrente pelo ISQ, foram devidamente liquidadas, na proporção respetiva pelas entidades supra citadas.
45. De facto, tais entidades são responsáveis pela devida correção e eliminação dos defeitos constantes em tal relatório, sendo que, à Ré caberia a proporção de 30%, nos termos já referenciados e documentados no doc. ... supra citado (página 1, primeiro parágrafo, e página 7, quarto parágrafo).
46. São, assim, tais entidades, e nomeadamente a Ré, que deverão definir um plano de trabalhos em conjunto para iniciar a execução dos trabalhos de correção de tais defeitos, cumprindo-se desde logo o que foi acordado e determinado entre todos no acordo supra citado como doc. ... (cfr. cláusula quarta de tal documento).
47. Em face de todos os factos documentalmente comprovados e atenta a cronologia supra citada, constata-se notoriamente que a referida (na douta decisão recorrida) ordem de correção de defeitos emitida em 05/06/2018, na sequência da vistoria de 25/05/2018, e confirmada em 17/12/2020, na sequência da realização de nova vistoria em 26/11/2020, não consistiu, de facto, numa ordem de correção de defeitos, nos termos previstos no artigo 396.º, n.º 1 do Código dos Contratos Públicos.
48. Aliás, a alegada ordem de correção de defeitos emitida em 05/06/2018 foi emitida, via correio eletrónico, sem qualquer formalidade, e apenas tinha em vista a liberação de parte da caução prestada pela Recorrente (e solicitada por esta). Não tinha como finalidade notificar a Recorrente para corrigir os defeitos, cuja responsabilidade, como supra se referiu, a Ré havia acordado em 08/02/2018 (três meses antes), ser aferida pelo ISQ (cfr. doc. ... junto à PI), o que, de facto, veio a suceder em 23/01/2019 (cerca de oito meses depois).
49. Ora, não faz qualquer sentido a Ré emitir uma ordem à ora Recorrente para correção dos defeitos em 05/06/2018, quando tais defeitos, atenta a transação efetuada em 02/02/2017, não haviam sido, ainda, aferidos pelo ISQ, não só no que respeita à sua existência e descrição, como também no que respeita à aferição da responsabilidade pelos mesmos.
50. E, em relação à alegada confirmação daquela ordem e datada de 17/12/2020, na sequência da realização de nova vistoria em 26/11/2020, entendemos igualmente que, tal confirmação nada mais foi do que nova confirmação de que a caução ou parte da caução devida à Recorrente não iria ser liberada.
51. Em ambas as referidas (na douta decisão recorrida) ordens, não foi sequer estabelecido qualquer prazo para a correção dos defeitos, nos termos estabelecidos no artigo 396.º, n.º 1 do CCP.
52. Não percebeu sequer, a Recorrente, atenta toda a cronologia já citada e, acima de tudo, a transação celebrada, o que é que a Ré pretendia com tais alegadas ordens. Sempre entendeu que, a correção dos alegados defeitos seria efetuada nos termos acordados naquela transação e jamais na sequência de tais alegadas ordens. Aliás, não faria qualquer sentido que assim fosse.
53. Por outro lado, no douto despacho ora em crise e que levou à interposição dos presentes autos, notifica-se, a final, a Recorrente para, o mais atempadamente possível, iniciar, juntamente com o subempreiteiro e o dono da obra, um plano de trabalhos conjunto (cfr. pág. 11 do doc. ...3 junto à PI).
54. Ora, a considerar-se que o despacho em crise é suscetível de vincular a Recorrente, por se considerar que não deverá ser anulável (o que, desde logo, não se concebe, atenta a falta de fundamentação de tal despacho, já invocada na PI), a ordem referenciada na douta decisão recorrida estaria notoriamente consubstanciada neste despacho, nos termos do n.º 1 do artigo 396.º do CCP.
55. Porquanto, considera a Recorrente que, a douta decisão recorrida violou as normas dos citados artigos 307.º, n.º 2, alínea a), 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do Código dos Contratos Públicos, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
56. A douta decisão recorrida viola, ainda, o disposto nos artigos 321.º do Código dos Contratos Públicos, artigo 334.º do Código Civil e cláusula 41.º, n.º 7 do Caderno de Encargos.
57. É ainda contraditória nos seus fundamentos e carece, salvo o devido respeito, de fundamento legal, fazendo, aliás, uma errada interpretação daquelas normas.
58. Aliás, considera até a Recorrente que, a douta decisão recorrida, é acima de tudo injusta, por, atenta a sua fundamentação, permitir o abuso de direito, notoriamente praticado pela Ré.
59. Entendemos que, da transação celebrada, todas as partes, incluindo a Ré, pretendiam vincular-se na responsabilidade que seria aferida pelo ISQ (laboratório escolhido por todas as partes para apurar os defeitos e seus responsáveis), chamando, inclusive, os subempreiteiros que, de igual forma, se vincularam.
60. Aceitaram, assim, todas as partes (incluindo a Ré e os respetivos subempreiteiros) eliminar e/ou corrigir os defeitos identificados, na medida das suas responsabilidades, isto é, a responsabilidade pela reparação e eliminação dos defeitos identificados, será da entidade e/ou empresa visada no relatório pericial, relatório este que deverá, além do mais, apontar os responsáveis pelos defeitos da obra (cláusula segunda, ponto 2 do Acordo – doc. ... junto com a PI). Tal aceitação decorre da letra desta cláusula que, expressamente, responsabiliza a entidade visada no relatório. E, por sua vez, desresponsabiliza qualquer outra entidade (e o empreiteiro também) pela reparação dos defeitos a apurar.
61. Tal é a leitura que a Recorrente faz do acordo / transação que foi celebrado e cujas cláusulas nos parecem claramente percetíveis (por um declaratário normal), no sentido de, se entender também que, a Ré, ao celebrar tal acordo, pretendeu e sabia que o empreiteiro (e ora Recorrente) poderia ser desresponsabilizado. O mesmo sucederia com a própria Ré que, também ela, poderia ser responsabilizada pelos defeitos, como, afinal, veio a ser, na proporção de 30% (cfr. pág. 7 do doc. ... junto à PI).
62. E, como muito bem refere a douta decisão recorrida (mas interpreta de modo contrário), “...ainda que por via deste Acordo (e, concretamente, das cláusulas sexta e sétima), o dono de obra possa agora exigir diretamente do subempreiteiro a reparação dos defeitos - possibilidade que, não fosse este Acordo, não detinha por não existir uma relação contratual entre ambos, antes a obrigação do subempreiteiro é perante o empreiteiro nos termos do contrato de subempreitada celebrado -, ...”. De facto, a Ré – entende a Recorrente – pode agora exigir diretamente do subempreiteiro a reparação dos defeitos. Aliás, reitere-se, foi essa a razão de ser do acordo / transação, pois caso contrário, não haveria sequer necessidade de celebrar qualquer transação.
63. Nessa medida, entendemos, ao contrário da douta decisão recorrida, que, existe, de facto, abuso de direito por parte da Ré, nos termos já fundamentados supra e que, desde já, reproduzimos aqui e na íntegra para todos os efeitos legais. Na verdade, a Ré atua de forma avessa à boa fé que deve existir entre as partes, tornando absolutamente ilegítima a invocação de qualquer irregularidade, representando, a sua conduta, um “venire contra factum proprium”, modalidade de abuso de direito, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 334.º do Código Civil.
64. Reitere-se que, a Recorrente não foi visada no relatório pericial como sendo uma das entidades responsáveis pela eliminação dos defeitos, o que, aliás, foi aceite pela Ré, aceitação essa que, sempre prevalecerá sobre qualquer irregularidade – a qual não se concebe – que possa advir dos termos e condições estabelecidas com a adjudicação da empreitada efetuada pela ora Recorrente, irregularidade essa que, inclusive, já estaria sanada.
65. É assaz evidente que, a Ré – como entidade visada no relatório pericial já falado – pretende fugir à sua responsabilidade, correspondente, no caso, a 30%, não liquidando, por isso, à Recorrente as retenções já vencidas.
66. E nem sequer poderemos falar no afastamento do disposto no artigo 321.º do CPP ou até do n.º 7 da cláusula 41.º do CE que, entendemos, não estar sequer em questão. Note-se que, o que está em causa é uma transação que foi celebrada, livremente e de boa-fé, entre as partes (incluindo a Ré), após a verificação de defeitos apurados na obra da Ré, devidamente peritados pelo ISQ, escolhido por todas as partes, transação essa que visava estabelecer a responsabilidade, o modo e as condições de correção daqueles mesmos defeitos. Nenhuma das partes, à data, incluindo a Ré, pretendia afastar o disposto naquelas normas. Aliás, diríamos até que, se alguém pretende afastar o disposto naquelas normas, esse alguém é agora a Ré!
67. Assim, jamais poderemos falar ou invocar – como a douta decisão recorrida faz – a violação de qualquer norma imperativa, atenta a transação extrajudicial celebrada entre todas as partes (incluindo a Ré e respetivos subempreiteiros).
68. Nestes termos, considera a Recorrente que a douta decisão recorrida fez uma errada interpretação (salvo o devido respeito) das normas correspondentes aos artigos 321.º do Código dos Contratos Públicos, artigo 334.º do Código Civil e cláusula 41.º, n.º 7 do Caderno de Encargos, o que consubstancia uma verdadeira violação de tais normas, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
69. A douta decisão recorrida viola, ainda, o disposto no artigo 295.º do Código dos Contratos Públicos e da cláusula 39.º do Caderno de Encargos, pois considera que a ...restituição dos valores retidos nos pagamentos ao empreiteiro dependeria de a A. demonstrar a inexistência de defeitos ou a correção dos defeitos detetados, prova que a A. não fez.”.
70. Face a todo o já exposto, devidamente documentado nos presentes autos e considerado como matéria que resultou provada, entendemos não assistir qualquer razão ao Tribunal recorrido.
71. Desde logo porque faz uma errada interpretação do citado artigo 295.º do CCP, não sendo a mais consentânea com a realidade dos factos. De facto, o artigo 295.º, n.º 1 daquele Código preceitua que: 1 - O regime de liberação das cauções prestadas pelo cocontratante deve ser estabelecido no contrato, não podendo as partes acordar em regime diverso durante a fase de execução contratual, salvo havendo fundamento de modificação do contrato que justifique uma alteração do regime de liberação das cauções e desde que sejam respeitados os limites previstos no presente Código.” (sublinhado nosso).
72. Assim, a ressalva prevista na segunda parte do n.º 1 daquele artigo prevê a existência de fundamento de modificação do contrato que justifique uma alteração do regime de liberação das cauções, fundamento esse que, no caso dos autos, está mais do que justificado e devidamente comprovado e documentado, através da transação/acordo que foi celebrado entre as partes.
73. Por outro lado, os defeitos existentes na obra não são, reitere-se, da responsabilidade da Recorrente, motivo pelo qual, não existiria obrigação desta na sua correção, não tendo sequer que provar e demonstrar a inexistência daqueles defeitos ou a sua correção.
74. Por todo o que supra se expôs, é assaz evidente que o Réu deverá ser condenado, nos presentes autos, a liquidar a quantia já vencida a título de retenções e peticionada na PI, acrescida dos respetivos juros de mora, num total reclamado à data de €16 341, 38.
75. Considera, pelo exposto, a Recorrente que, a douta decisão recorrida fez uma errada interpretação (salvo o devido respeito) do artigo 295.º do Código dos Contratos Públicos e da cláusula 39.º do Caderno de Encargos, o que consubstancia, novamente, uma verdadeira violação de tais normas, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
76. Entende, ainda, a Recorrente que, a douta decisão recorrida viola, ainda, o disposto no artigo 542.º do Código de Processo Civil.
77. De facto, no que respeita, finalmente, à apreciada litigância de má-fé, importa realçar a fundamentação da douta decisão recorrida e com a qual não podemos concordar, por ser manifestamente contraditória perante toda a documentação constante dos autos e por, acima de tudo, decorrer notoriamente da atuação da própria Ré.
78. Assim, a douta decisão recorrida deveria ter condenado a Ré como litigante de má-fé, nos termos peticionados pela Recorrente, pois que, aquela vai atuando, alegando e contestando à medida das suas comodidades e necessidades, com flagrante abuso de direito e notória má-fé, com a agravante de ser uma entidade pública que sempre deveria ser um exemplo e, nessa medida, dar o exemplo!! Vem agora, aos presentes autos, deturpar a lei e interpretá-la da maneira que lhe é mais conveniente, sendo notório – e claramente documentado em todos os documentos juntos aos autos – que a Ré age de má-fé. Age conscientemente de forma manifestamente reprovável, com vista a entorpecer a ação da justiça.
79. Assim, sempre, a Ré, deverá ser exemplarmente punido, por atuar como litigante de má-fé, pois que, usa e abusa de artifícios que não podem ter cabimento em juízo, pretendendo alterar a verdade a seu belo prazer, agindo com o único propósito de prejudicar, de forma atroz, a Recorrente, devendo, em consequência, ser julgada e condenada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 542.º do CPC, em litigante de má-fé, ao pagamento de multa e indemnização à Recorrente, num montante nunca inferior a €5 000, 00 (cinco mil euros), peticionado na PI.
80. A douta decisão recorrida não entende assim, e considera, aliás, que a Ré não litigou de má-fé, pois que, limitou-se a defender-se, invocando a exceção da inimpugnabilidade do ato, sendo certo que, o Tribunal até lhe deu razão.
81. Ora, a Ré nada mais fez do que “arranjar” argumentos para, contrariamente ao que havia acordado com a Recorrente, obriga-la a corrigir os defeitos que não são da responsabilidade desta, onerando, nessa medida, a Recorrente com as despesas que daí advirão e, bem assim, não liquidar a esta o valor devido a título de retenções e já vencido.
82. Por todo o exposto, considera, além do mais, a Recorrente que, a douta decisão recorrida fez uma errada interpretação (salvo o devido respeito) do artigo 542.º do Código de Processo Civil, o que consubstancia, novamente, uma verdadeira violação de tal norma, violação essa que, desde já, se invoca para todos os legais efeitos.
83. Há, inclusive, uma manifesta contradição entre os fundamentos e a decisão recorrida, a qual determina, sem mais, a sua nulidade, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, nulidade essa que, desde já, se invoca e se pretende seja declarada.
84. Nestes termos, deverá, a douta sentença recorrida, ser revogada e declarada nula, pois violou o disposto nos artigos 34.º, n.º 1 e 2 e 87-A, n.º 1, alínea b) do CPTA; artigos 3.º, n.º 3, 542.º e 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC; artigo 20.º, n.º 1 e 4 da CRP; artigos 295.º, 307.º, n.º 2, alínea a), 321.º, 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do CCP; artigo 334.º do CC; bem como as cláusulas 39.º e 41.º, n.º 7 do CE.

***
NESTES TERMOS e nos melhores de direito que serão supridos,
requer se dignem dar provimento ao presente recurso, revogando-se e declarando-se nula a douta decisão recorrida por efeito da fundamentação, motivações e conclusões que antecedem, com as legais consequências, com o que se fará
INTEIRA JUSTIÇA.
O Réu juntou contra-alegações, sem conclusões, finalizando assim:
Em conclusão, a douta sentença recorrida não viola qualquer normativo legal, pelo que não merece o mínimo reparo, uma vez que faz uma apreciação e aplicação irrepreensível do direito aos factos.
Termos em que, com o suprimento, deverá ser negado provimento ao presente recurso e, consequentemente, confirmada a douta sentença recorrida.
A Senhora Procuradora Geral Adjunta, notificada nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1. Por despacho de 26.12.2014 foi aberto, pelo Município ..., o procedimento de ajuste direto visando a “Execução de cobertura no do Pavilhão Gimnodesportivo de ...” (doravante Empreitada) e aprovadas as peças do procedimento. – doc. INF_INTERNA.pdf constante do p.a.
2. Do caderno de encargos aprovado consta, além do mais,
CAPÍTULO I – DISPOSIÇÕES INICIAIS
Cláusula 1.ª – Objecto
O presente Caderno de Encargos compreende as cláusulas a incluir no Contrato a celebrar no âmbito do
concurso para a realização da empreitada de “Execução da Cobertura do Pavilhão Desportivo - ...".
Cláusula 2.ª – Disposições por que se rege a empreitada
1 - A execução do Contrato obedece:
a) Às cláusulas do Contrato e ao estabelecido em todos os elementos e documentos que dele fazem parte integrante;
b) Ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro (Código dos Contratos Públicos, doravante “CCP”);
c) Ao Decreto-Lei n.º 273/2003, de 29 de Outubro, e respectiva legislação complementar;
d) À restante legislação e regulamentação aplicável, nomeadamente a que respeita à construção, à revisão de preços, às instalações do pessoal, à segurança social, à higiene, segurança, prevenção e medicina no trabalho e à responsabilidade civil perante terceiros;
e) Às regras da arte.
2 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se integrados no Contrato:
a) O clausulado contratual, incluindo os ajustamentos propostos de acordo com o disposto no artigo 99.º do Código dos Contratos Públicos e aceites pelo adjudicatário nos termos do disposto no artigo 101.º desse mesmo Código;
b) Os suprimentos dos erros e das omissões do caderno de encargos identificados pelos concorrentes, desde que tais erros e omissões tenham sido expressamente aceites pelo órgão competente para a decisão de contratar, nos termos do disposto no artigo 61.º do CCP;
c) Os esclarecimentos e as rectificações relativos ao caderno de encargos;
d) O caderno de encargos;
e) O projecto de execução;
f) A proposta adjudicada;
g) Os esclarecimentos sobre a proposta adjudicada prestados pelo empreiteiro;
h) Todos os outros documentos que sejam referidos no clausulado contratual ou no caderno de encargos.
[...]
CAPÍTULO II – OBRIGAÇÕES DO EMPREITEIRO
Secção I – Preparação e planeamento dos trabalhos
Cláusula 6.ª – Preparação e planeamento da execução da obra
1 - O empreiteiro é responsável:
a) Perante o dono da obra pela preparação, planeamento e coordenação de todos os trabalhos da empreitada, ainda que em caso de subcontratação, bem como pela preparação, planeamento e execução dos trabalhos necessários à aplicação, em geral, das normas sobre segurança, higiene e saúde no trabalho vigentes e, em particular, das medidas consignadas no plano de segurança e saúde, e no plano de prevenção e gestão de resíduos de construção e demolição;
[…]
Secção II - Prazos de execução
Cláusula 9.º - Prazo de execução da empreitada
1 - O empreiteiro obriga-se a:
a) Iniciar a execução da obra na data da conclusão da consignação total ou da primeira consignação parcial ou ainda da data em que o dono da obra comunique ao empreiteiro a aprovação do plano de segurança e saúde, caso esta última data seja posterior;
b) Cumprir todos os prazos parciais vinculativos de execução previstos no plano de trabalhos em vigor;
c) Concluir a execução da obra e solicitar a realização de vistoria da obra para efeitos da sua recepção
provisória no prazo de 120 dias a contar da data da sua consignação.
[…]
Secção III - Condições de execução da empreitada
Cláusula 13.ª - Condições gerais de execução dos trabalhos
1 - A obra deve ser executada de acordo com as regras da arte e em perfeita conformidade com o projecto, com o presente caderno de encargos e com as demais condições técnicas contratualmente estipuladas
[…]
Cláusula 27.ª - Descontos nos pagamentos
1 - Para prestação da caução com vista a garantir o exacto e pontual cumprimento das obrigações contratuais, às importâncias que o empreiteiro tiver a receber em cada um dos pagamentos parciais previstos é deduzido o montante correspondente a 10 % desse pagamento, de acordo com o disposto no n.º3 do Artigo 88.º do Código de Contratação Pública.
[…]
CAPÍTULO V - RECEPÇÃO E LIQUIDAÇÃO DA OBRA
Cláusula 35.ª - Recepção provisória
1 - A recepção provisória da obra depende da realização de vistoria, que deve ser efectuada logo que a obra esteja concluída no todo ou em parte, mediante solicitação do empreiteiro ou por iniciativa do dono da obra, tendo em conta o termo final do prazo total ou dos prazos parciais de execução da obra.
2 - No caso de serem identificados defeitos da obra que impeçam a sua recepção provisória, esta é efectuada relativamente a toda a extensão da obra que não seja objecto de deficiência.
3 - O procedimento de recepção provisória obedece ao disposto nos artigos 394.º a 396.º do CCP.
[…]
Cláusula 36.ª - Prazo de garantia
1 - O prazo de garantia varia de acordo com os seguintes tipos de defeitos:
a) 10 anos para os defeitos que incidam sobre elementos construtivos estruturais;
b) 5 anos para os defeitos que incidam sobre elementos construtivos não estruturais ou instalações técnicas;
c) 2 anos para os defeitos que incidam sobre equipamentos afectos à obra, mas dela autonomizáveis.
2 - Caso tenham ocorrido recepções provisórias parcelares, o prazo de garantia fixado nos termos do número anterior é igualmente aplicável a cada uma das partes da obra que tenham sido recebidas pelo dono da obra.
3 - Exceptuam-se do disposto no n.º 1 as substituições e os trabalhos de conservação que derivem do uso
normal da obra ou de desgaste e depreciação normais consequentes da sua utilização para os fins a que
se destina.
[…]
Cláusula 38.ª - Recepção definitiva
1 - No final dos prazos de garantia previsto na cláusula anterior, é realizada uma nova vistoria à obra para efeitos de recepção definitiva.
2 - Se a vistoria referida no número anterior permitir verificar que a obra se encontra em boas condições de funcionamento e conservação, esta será definitivamente recebida.
3 - A recepção definitiva depende, em especial, da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
a) Funcionalidade regular, no termo do período de garantia, em condições normais de exploração, operação ou utilização, da obra e respectivos equipamentos, de forma que cumpram todas as exigências contratualmente previstas;
b) Cumprimento, pelo empreiteiro, de todas as obrigações decorrentes do período de garantia relativamente à totalidade ou à parte da obra a receber.
4 - No caso de a vistoria referida no n.º 1 permitir detectar deficiências, deteriorações, indícios de ruína ou falta de solidez, da responsabilidade do empreiteiro, ou a não verificação dos pressupostos previstos no número anterior, o dono da obra fixa o prazo para a sua correcção dos problemas detectados por parte do empreiteiro, findo o qual será fixado o prazo para a realização de uma nova vistoria nos termos dos números anteriores.
Cláusula 39.ª - Restituição dos depósitos e quantias retidas e liberação da caução
1 - Feita a recepção definitiva de toda a obra, são restituídas ao empreiteiro as quantias retidas como garantia ou a qualquer outro título a que tiver direito.
2 - Verificada a inexistência de defeitos da prestação do empreiteiro ou corrigidos aqueles que hajam sido detectados até ao momento da liberação, ou ainda quando considere os defeitos identificados e não corrigidos como sendo de pequena importância e não justificativos da não liberação, o dono da obra promove a liberação da caução destinada a garantir o exacto e pontual cumprimento das obrigações contratuais, nos seguintes termos:
a) 25 % do valor da caução, no prazo de 30 dias após o termo do segundo ano do prazo a que estão sujeitas as obrigações de correcção de defeitos, designadamente as de garantia;
b) Os restantes 75 %, no prazo de 30 dias após o termo de cada ano adicional do prazo a que estão sujeitas as obrigações de correcção de defeitos, na proporção do tempo decorrido, sem prejuízo da liberação integral, também no prazo de 30 dias, no caso de o prazo referido terminar antes de decorrido novo ano.
3 - No caso de haver lugar a recepções definitivas parciais, a liberação da caução prevista no número anterior é promovida na proporção do valor respeitante à recepção parcial.
[…]
Cláusula 41.ª - Subcontratação e cessão da posição contratual
1 - O empreiteiro pode subcontratar as entidades identificadas na proposta adjudicada, desde que se encontrem cumpridos os requisitos constantes dos n.ºs 3 e 6 do artigo 318.º do CCP.
2 - O dono da obra apenas pode opor-se à subcontratação na fase de execução quando não estejam verificados os limites constantes do artigo 383.º do CCP, ou quando haja fundado receio de que a subcontratação envolva um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do Contrato.
3 - Todos os subcontratos devem ser celebrados por escrito e conter os elementos previstos no artigo 384.º do CCP, devendo ser especificados os trabalhos a realizar e expresso o que for acordado quanto à revisão de preços.
4 - O empreiteiro obriga-se a tomar as providências indicadas pelo director de fiscalização da obra para que este, em qualquer momento, possa distinguir o pessoal do empreiteiro do pessoal dos subempreiteiros presentes na obra.
5 - O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável aos contratos celebrados entre os subcontratados e terceiros.
6 - No prazo de cinco dias após a celebração de cada contrato de subempreitada, o empreiteiro deve, nos termos do n.º 3 do artigo 385.º do CCP, comunicar por escrito o facto ao dono da obra, remetendo-lhe cópia do contrato em causa.
7 - A responsabilidade pelo exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais é do empreiteiro, ainda que as mesmas sejam cumpridas por recurso a subempreiteiros.
[…]
- doc. CE.pdf constante do p.a.

3. A A., «EMP01...», apresentou proposta. - cf. pasta 3 Propostas do p.a.
4. Por despacho do Presidente da Câmara Municipal ..., de 14.1.2015, a Empreitada foi adjudicada à proposta da A. - doc. DESPACHO.pdf constante da pasta 5 do p.a.
5. Em 15.1.2015 a A. (2.º Outorgante) e o R. (1.º Outorgante) celebraram contrato relativo à Empreitada, do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


[…]

- doc. Contrato.pdf constante do p.a.
6. A consignação da Empreitada deu-se em 20.1.2015. – doc. Consignação.pdf constante do p.a.
7. Na execução da obra a A. recorreu à «EMP02...», Lda. e «EMP03...», S.A. para a execução de trabalhos abrangidos pela Empreitada. – facto admitido por acordo.
8. Em 21.1.2016 foi realizada a receção provisória, elaborando-se auto do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- doc. Receção Provisoria.pdf constante do p.a.
9. Nos pagamentos realizados à A. no âmbito da empreitada, o Município reteve, a titulo de caução, o valor de € 15.217,77. – facto admitido por acordo.
10. Em junho de 2016 o Município ... comunicou à A. a existência de anomalia na pintura da estrutura da cobertura, tendo as partes encetado negociações. – doc. ... da pasta 12 do p.a.
11. Por email de 1.6.2016 a mandatária da A. comunicou à técnica da CM... (Câmara Municipal ...),
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- doc. ... da pasta 12 do p.a.
12. Em 10.8.2016 o R. comunicou à A. a opção quanto ao proposto em A do email referido no ponto anterior. – doc. ... da pasta 12 do p.a.
13. Em 6.8.2016 a A., através da sua mandatária, remeteu email, entre o mais, ao Município, «EMP02...» e «EMP03...», nos seguintes termos,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- doc. ... da pasta 12 do p.a.
14. Na sequência de reuniões e troca de comunicações, em 8 de fevereiro de 2017 foi celebrado entre o R. (1.º Outorgante), a A. (2.ª Outorgante), a «EMP02...», Lda. (3.ª Outorgante) e a «EMP03...», S.A. (4.ª Outorgante), “Acordo para eliminação de defeitos” do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- doc. ... e Acordo_eliminação constantes do p.a.
15. Na sequência de pedidos de orçamento, as partes acordaram na realização de relatório pericial pelo ISQ – Instituto da Soldadura e Qualidade. – docs. ... e ... da pasta 12 do p.a..
16. Em 25.5.2018 foi realizada vistoria para liberação de caução elaborando-se auto, assinado pelas partes, do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- doc. ... Scan constante do p.a.
17. Em 5.6.2018 a A. foi notificada do auto de vistoria e para, face às inconformidades detetadas, proceder à respetiva correção.
18. Em janeiro de 2019 o ISQ elaborou relatório do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- doc. ... da p.i.
19. O Município solicitou os seguintes esclarecimentos ao relatório elaborado pelo ISQ Decorrente da leitura do relatório apresentado pelo ISQ, somos a questionar:
1. Nas conclusões é referido que: "A natureza/espessura de pintura de acabamento, pode não ter sido devidamente calculada, para o ambiente de exposição.". Contudo sabemos, da analise efetuada pelo ISQ que é apresentada neste relatório (página 10), que apenas foram aplicados 70 um e estavam previstos para a camada de acabamento 100 μrn. Face ao exposto questionamos se os 100 um seriam suficientes para este nível de exposição ambiental?
Se fosse cumprido o plano de pinturas previsto em projeto e respeitadas as condições de aplicação de acordo com as instruções do fabricante, seria de esperar que em 6 meses as pinturas estivessem neste estado?
- doc. ... da p.i.
20. Tendo o ISQ, em 26.6.2019 e 22.7.2019, prestado os seguintes esclarecimentos,
Resposta 1. A nossa percepção é que a espessura de acabamento, pode não ter sido definida para um ambiente de exposição exterior (neste caso talvez de corrosividade elevada). De qualquer modo a espessura encontrada è inferior ao especificado. Cabe ao aplicador certificar-se que a espessura aplicada é a requerida, em especificação de pintura. Cabe ao Fabricante especificar a espessura de acabamento adequada para protecção à degradação do intumescente, em determinado ambiente atmosférico e condições climáticas, Type X. A espessura de 100 μm para este produto, nestes perfis e para exposição em ambiente type X pode ser insuficiente para protecção do intumescente.
[...]
Resposta 2. Se... a resposta será sempre lesiva. De qualquer modo, a resposta a esta questão é de alguma maneira respondida na resposta 1. Poderia acrescentar: Cumprido o plano de pinturas previsto em projeto e respeitadas as condições de aplicação de acordo com as instruções do fabricante, poderia extender a durabilidade do esquema de pintura para além de seis meses! Sim, mas a função de protecção ao fogo poderia já estar comprometida.
[...]
Quanto à pergunta
Se fosse cumprido o plano de pinturas previsto em projeto e respeitadas as condições de aplicação de acordo com as instruções do fabricante, seria de esperar que em 6 meses as pinturas estivessem neste estado. Teria que acrescentar outro se: Se as condições climáticas a que a estrutura ficaria exposta durante o tempo de vida previsto fosse assegurada. Esclarecimentos relativos à responsabilidade pelos defeitos na obra em questão:
É evidente que o aplicador tinha a responsabilidade de uma cuidada aplicação que deveria ser demonstrada por registos de controlo que deveriam ser apresentados ao dono da obra, até de uma maneira regular durante a execução.
Quanto ao dono de obra seria da sua responsabilidade verificar o cumprimento da especificação de pintura e das espessuras aplicadas, ainda garantir as condições de exposição da estrutura durante a sua vida útil.
- doc. ... da p.i.
21. Em 10.10.2019 o R. voltou a solicitar novos esclarecimentos nos seguintes termos,
Na sequência do relatório elaborado pelo ISQ e das respostas que nos têm sido prestadas pela referida entidade, em sede de esclarecimento do mesmo, somos a informar que, de acordo com o nosso entendimento, estas não têm sido claras de forma a determinar-se com exatidão o responsável ou responsáveis pela patologia em causa. Contudo, mais informamos que, não concordamos, de todo, com algumas afirmações constantes no ponto 3 do relatório "CONCLUSÕES/DISCUSSÃO DOS RESULTADOS" e que passamos a clarificar:
1. "A natureza/espessura de pintura de acabamento, pode não ter sido devidamente calculada, para o ambiente de exposição.". Conforme se pode verificar na tabela constante no ponto 2.1 do relatório "Documentos de referência/Especificação de pintura" a pintura de acabamento foi realizada com a tinta 7G300 da CIN, que de acordo com a sua ficha técnica, esta tinta está indicada para ser aplicada em "interiores e exteriores", tendo a mesma "boa resistência em ambientes rural, urbano, marítimo e industrial de moderada agressividade", para uma espessura recomendada de 50μm-100μm por demão, sendo que a ficha técnica recomenda 1 demão. Assim, podemos concluir que a pintura de acabamento foi devidamente calculada (a especificação da pintura de acabamento previa o acabamento com a espessura de 100 μm), para o ambiente de exposição, quando devidamente aplicada, de acordo com as instruções do fabricante; 9
2. "… O dono de obra não mantém o pavilhão, nas condições de uso "previstas" para a
especificação de proteção ao fogo. O pavilhão não está finalizado (paredes e piso em tosco), e apresenta aberturas em paredes que permitem a exposição a ambiente, que deve ser considerado como exterior no local de implementação, de acordo com a ...44-1.": 2.1 Conforme se pode verificar na ficha técnica da tinta 7G300 da CIN, está indicada para ser aplicada em interiores e exteriores; 2.2 A ISO 12944-1 "define o escopo geral de todas as partes da /5012944. Fornece alguns termos e definições básicos e uma introdução geral às outras ...44. Além disso, inclui uma declaração geral sobre saúde, segurança e proteção ambiental e diretrizes para o uso da ...44 para um determinado projeto". Assim, analisada a presente 150, é nosso entendimento que estaremos perante uma categoria de CORROSIVIDADE (Exposição Atmosférica) C2 Baixa, que em ambientes exteriores está definido para atmosferas com baixo nível de poluição (Principalmente áreas rurais). A categoria C2 Baixa para ambientes interiores enquadra-se em edifícios não aquecidos onde a condensação pode ocorrer (depósitos, pavilhões desportivos). Face ao exposto e tendo em consideração a ficha técnica da tinta (boa resistência em ambientes rural, urbano, marítimo industrial de moderada agressividade), entendemos que, o acabamento aplicado cumpre quanto ao ambiente e exposição atual e futura, desde que devidamente aplicado de acordo com as instruções do fabricante.

- doc. ... da p.i.
22. Em 18.12.0219 o ISQ respondeu nos seguintes termos,
Pelo presente prestamos esclarecimento às duvidas suscitadas:
1 - A pintura de acabamento só por si não pode estar indicada para determinado ambiente, será sempre um esquema de pintura que permite determinada durabilidade em ambientes de exposição de determinada corrosividade (a norma ISO 12944-5 estabelece os parâmetros a definir para a durabilidade de esquemas de pintura a escolher para determinado ambiente de corrosividade; norma ISO 12944-6 estabelece os ensaios determinados para aceitar a durabilidade do esquema de pintura. No limite pela indicação da ficha técnica, tal como descrito, bastaria uma espessura de 50μm para a tal boa resistência em qualquer ambiente, não será a realidade.
A pintura de acabamento de um esquema intumescente deverá ser calculada e indicada pelo fabricante em determinado ambiente. Esse ambiente deve ser devidamente aclarado em projecto de execução de obra.
2 - A duvida indicada neste ponto é basicamente a mesma do ponto 1. Volto a dizer uma pintura pode ser válida para ambiente interior ou exterior, mas quando aplicada a determinada espessura, e exposta ao ambiente interior ou ao ambiente exterior o seu comportamento (resistência) será completamente diferente, no mesmo espaço de tempo. Volta a afirmar as responsabilidades de aplicador e dono de obra:
O aplicador deve cumprir o plano de qualidade de pintura, mais deveria no fim da obra entregar um dossier com os registos de controlo de qualidade que lhe é exigido: condições atmosféricas durante aplicação e secagem e registo de espessuras secas obtidas.
O dono de Obra após conclusão da mesma deverá dar o uso previsto ou devido ao equipamento construído.
Se tivesse que distribuir responsabilidades pela falha do esquema de pintura intumescente, e de acordo com a minha sensibilidade de acompanhamento de obras atribuiria: 70 % de responsabilidade ao aplicador; 30% de responsabilidade ao dono de obra,.
- doc. ... da p.i.
23. Em 28.2.2020 o Município ... pronunciou-se nos seguintes termos,
Relativamente aos esclarecimentos prestados pelo ISQ, em comunicação infra, e com os quais não podemos concordar, somos a referir:
a. Primeiramente, consta do ponto 1 da exposição apresentada, que "a pintura de acabamento de um esquema intumescente deverá ser calculada e indicada pelo fabricante em determinado ambiente. Esse ambiente deve ser devidamente aclarado em projecto de execução de obra." Neste âmbito, cumpre informar que, em sede da empreitada em juízo, "Execução da Cobertura no Pavilhão Desportivo de ...", o esquema de pintura se encontra devidamente definido na página 3 do "Relatório pericial de avaliação de revestimento de proteção ao fogo, existente em estrutura metálica da cobertura do Pavilhão Desportivo de ...", considerando-se, portanto, cumprida a disposição alegada.
b. Ademais, a ficha técnica do produto para o acabamento do esquema de pintura referido no ponto anterior (esquema para a proteção passiva ao fogo de estruturas metálicas), preconiza uma espessura de 50 - 100μm/demão, informando que o produto está indicado para ser aplicado em interiores e exteriores, tendo o mesmo, boa resistência em ambientes rural, urbano, marítimo e industrial de moderada agressividade, ficha técnica certificada, relativamente à qual o Município, enquanto dono de obra, terá obrigatoriamente que fazer fé.
c. Ultimamente, importa informar que, a pintura de acabamento para o esquema de pintura suprarreferido, previa uma espessura de 100μm, espessura esta que, "o aplicador não terá assegurado a obtenção de espessura de filme suficiente, relativa a demão de acabamento preconizada", segundo conclusões do relatório identificado, afirmando-se, deste modo, o incumprimento do aplicador relativamente às condições aceites e contratualizadas neste âmbito com a entidade adjudicatária.
- doc. ... da p.i.
24. Ao que o ISQ respondeu em 31.3.2020 nos seguintes termos,
- Resposta a: o esquema definido seria para um pavilhão em condições de uso como indicamos no nosso relatório reta 0169/SIE/19: a dono de obra não mantêm o pavilhão, nas condições de uso "previstas" para a especificação de protecção ao fogo. O pavilhão não esta finalizado (paredes, e pisa em tosco), e apresenta aberturas em paredes que permitem a exposição a ambiente, que deve ser considerado como exterior no local de implementação, de acordo com a 1SiO112944-1.
- Resposta b: as fichas técnicas de produto são um documento importante que deve sempre ser consultado. A informação de espessura da ficha do acabamento é simplesmente indicativa das possibilidades de espessura a aplicar. A protecção anticorrosiva ou ao fogo de um revestimento é caracterizada por uma especificação que indica a preparação de superfície e as diferentes camadas, pela totalidade dos produtos: primário + intumescente + acabamento. É na especificação que temos que fazer fé.
- Resposta c: sim já o referimos no nosso relatório re9 0169/SIE/19: O aplicador não terá assegurado a obtenção de espessura de filme suficiente, relativa a demão de acabamento preconizada. Nas responsabilidades indicamos também o incumprimento do dono de obra porque: O dono de Obra após conclusão da mesma deverá dar o uso previsto ou devido ao equipamento construído. Acrescentamos ainda o dono de obra deveria assegurar-se na execução da obra do recebimento de registo de espessuras de filme seco credenciadas pelo aplicador ou por terceiros. Assim e dado que, se encontra, efetivamente, devidamente definido um esquema de pintura, cujas características dos seus produtos davam a proteção necessária à estrutura metálica, quer em ambientes de exposição interiores e exteriores com moderada corrosividade, esquema que não foi cumprido pelo aplicador, e atendendo a que o cumprimento dos parâmetros de espessura exigidos deveriam ter sido por este obrigatoriamente cumpridos, entende-se não poder ser imputada qualquer responsabilidade ao dono de obra no concernente aos defeitos de pintura constatados, pelo que se pede uma revisão do resultado de imputação de responsabilidades do relatório pericial, para os devidos efeitos. A exposição da pintura a um ambiente exterior, seria, portanto, irrelevante se devidamente cumprido o esquema de pintura exigido, enquanto parte integrante do contrato outorgado.
- doc. ... da p.i.
25. O Município procedeu ao pagamento da quantia de € 534,00, acrescido de IVA, relativos a 30% dos honorários do ISQ pela realização da perícia. – doc. ... da p.i., facto não controvertido.
26. Em 26.11.2020 foi realizada a vistoria para efeitos de liberação de caução, elaborando-se auto, assinado, além do mais, pelo representante da A., do qual se extrai,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]


- doc. Auto de Vistoria constante da pasta 11 do p.a.
27. Por ofício datado de 17.12.2020 o Chefe de Divisão de Projetos e Obras Municipais notificou a A. do auto de vistoria e para, face às inconformidades detetadas, para proceder às respetivas retificações. – doc. Auto de Vistoria constante da pasta 11 do p.a.
28. Por carta datada de 28.12.2020 a A. informou o R. que,
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- doc. ...0 da p.i.
29. Em 3.2.2021 a A. remeteu email ao R. nos seguintes termos,
Em conformidade com o teor da comunicação emitida em 28/12/2020 pela M/ Cliente, foram Vossa(s) Ex.cia(s), mais uma vez, notificados para procederem à imediata liberação de todas as retenções devidas pela empreitada efetuada.
Sucede que, até à data, nada foi liquidado por conta de tais retenções.
Ora, o montante correspondente a tais retenções está já vencido, motivo pelo qual, são, ainda, devidos os respetivos juros de mora que serão imputados a Vossa(s) Ex.cia(s).
Nessa medida, deverão Vossa(s) Ex.cia(s) proceder à imediata liquidação de todas as retenções devidas, acrescidas dos respetivos [uros de mora até efetivo e integral pagamento. - doc. ...1 da p.i.
30. Por comunicação datada de 30.9.2021 a A. requereu ao R.,
Assunto: liquidação dos valores retidos a título de retenções
Em conformidade com o teor da N/ comunicação emitida em 28/12/2020, das comunicações eletrônicas efetuados peia N/ Mandatária e. bem assim, das inúmeras interpelações verbais realizadas pela N/ empresa, por intermédio dos seus representantes legais, foram Vossa (s) Ex.cia(s) notificados para procederem à imediata liberação de todas as retenções devidas pela empreitada efetuado em ....
Sucede que, até à data, nada foi pago por conta de tais retenções.
Ora, o montante total de €15 217. 77, correspondente a tais retenções. está já vencido, desde pelo menos 26/11/2020 (data em que foi efetuado o auto para liberação de caução),

motivo pelo qual, são. ainda, devidos os respetivos juros de mora que, calculados até à data e à taxa legal em vigor perfazem já a quantia de €898.89.
Deverão, portanto, proceder ao pagamento integral da quantia em dívida no montante total de €16 116, 66 (dezasseis mil, cento e dezasseis euros e sessenta e seis cêntimos), no prazo de 10 dias a contar da receção da presente, findo o qual será intentada a respetiva ação judicial, sempre e a todos os títulos mais incómoda e dispendiosa.
- doc. ...2 da p.i.
31. Em 17.2.2021 os serviços da CM... emitiram a informação ...21 com o seguinte teor,
Assunto: Defeitos de Obra - Contrato de Empreitada de Obras Públicas "Execução de
Cobertura no Pavilhão Desportivo de ...."
Exmo. Senhor Eng.° [AA],
Chefe da Divisão de Projetos e Obras Municipais
Relativamente ao assunto devidamente identificado em epígrafe e em conformidade com o
historial factual integrante e devidamente anexo ao processo sub judice, após solicitação de
colaboração dirigida à Divisão de Assuntos Jurídicos, via email, no passado dia 09 de dezembro,
no concernente ao procedimento a adotar na sequência do relatório pericial resultante de
avaliação do ISQ, no âmbito do contrato de empreitada de obras públicas devidamente
identificado em epígrafe, eis o que, nos cumpre informar:
A. Da Situação de Facto:
Assim e com relevo para a formulação de pronúncia jurídica, apresentam-se como assentes os
seguintes factos, evidenciados pelos documentos e informações remetidas a esta Divisão:
1. Primeiramente, cumpre ressalvar que, no dia 15 de janeiro de' 2015 e na sequência de um procedimento por ajuste direto, o Município ... outorgou com a sociedade «EMP01...», Lda., o contrato de empreitada de obras públicas intitulado "Execução de Cobertura no Pavilhão Desportivo de ...", pelo valor global de E 147.491,05 (cento e quarenta e sete mil quatrocentos e noventa e um euros e cinco cêntimos), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, o qual previa um período de execução de 120 dias contados da data da consignação da obra.
2. Sendo que, na sequência do auto de receção provisória atinente à empreitada em juízo, datado de 21 de janeiro de 2016, elaborado pela Comissão nomeada por deliberação da Câmara Municipal e por técnico em representação da entidade adjudicatária, foi aprovada em reunião ordinária do órgão executivo municipal, realizada em 25 de fevereiro desse ano, a homologação do auto de vistoria e a receção provisória dos trabalhos, donde consta, "e tendo sido entregues as telas finais foram vistoriados todos os trabalhos daquela obra, verificaram e dão fé que todas as obrigações contratuais e legais do empreiteiro foram cumpridas de forma integral e perfeita e foi executado o plano de prevenção e gestão de resíduos de construção e
demolição, corretamente, nos termos da legislação aplicável, exarando, por unanimidade, que os mesmos podem ser rececionados provisoriamente."
3. Meses decorridos da receção provisória da obra, foram detetados defeitos, tendo, no dia 08 de fevereiro de 2017, sido assinado, entre o Município ..., a entidade adjudicatária «EMP01...», Lda., a sociedade «EMP02...», Lda. (entidade que, segundo alegado no relatório enviado, procedeu à execução dos trabalhos de decapagem e metalização da cobertura, após contrato de subempreitada celebrado com a sociedade «EMP01...», Lda.) e a sociedade «EMP03...», S.A. (entidade que, segundo alegado no relatório enviado, procedeu à execução dos trabalhos de pintura da cobertura, após contrato de subempreitada celebrado com a sociedade «EMP02...», Lda.), um acordo para eliminação de defeitos.
4. Em boa verdade, do acordo para eliminação de defeitos outorgado pelas entidades enunciadas no considerando anterior, consta, da sua cláusula 2." que, todas as signatárias "aceitam desde já e pela presente que, a cobertura efetuada naquele pavilhão apresenta os defeitos que o relatório pericial identificar à data da s/ elaboração", aceitando todas as signatárias, de igual modo, "eliminar e/ou corrigir os defeitos identificados, na medida das suas responsabilidades, isto é, a responsabilidade pela reparação e eliminarão dos defeitos identificados, será da entidade e/ou empresa visada no relatório pericial, relatório este que deverá, além do mais, apontar os responsáveis pelos defeitos da obra." (sublinhado nosso)
5. Assim, e na sequência do enunciado no considerando anterior, aceitaram as signatárias elaborar um relatório pericial para aferir da existência de alegados defeitos na cobertura do pavilhão, acordando que tal relatório seria efetuado "por laboratório acreditado para o efeito", sendo que, por força da sua cláusula 4.", "a entidade e/ou empresa visada no relatório pericial e responsável pela correção e eliminação dos alegados defeitos deverá corrigir e eliminar tais defeitos, iniciando tal intervenção no prazo máximo de 45 dias após a notificação (por carta registada) do citado relatório", e que, "se for atribuída responsabilidade a mais que uma signatária, estas deverão definir o plano de trabalhos em conjunto para uma boa execução." (sublinhado nosso)
6. Consequentemente, em 23 de janeiro de 2019, a entidade ISQ, Serviços Industriais de Engenharia, procedeu à concretização de relatório pericial de avaliação de revestimento de proteção ao fogo, existente em 'estrutura metálica da cobertura do pavilhão desportivo de ..., tendo concluído que, 'face aos resultados obtidos durante a inspeção, verificamos que o revestimento de proteção ao fogo apresenta falha catastrófica", mais acrescentando que, "o revestimento existente apresenta degradação que não permite o desempenho pretendido em serviço."
7. Sendo que, na sequência dos pedidos de esclarecimentos solicitados pelas signatárias do acordo para eliminação de defeitos, mormente atinentes à concretização e definição das entidades responsáveis pela eliminação dos defeitos de obra, em email datado de 18 de dezembro de 2019, vem a ISQ, Serviços Industriais de Engenharia, estabelecer a assunção de responsabilidades nos termos que se enunciam, 70% de responsabilidade do aplicador, porquanto, conforme alegado, "o aplicado, - deve cumprir o plano de qualidade de pintura, mais deveria no fim da obra entregar um dossier com os registos de controlo de qualidade que lhe é exigido: condições atmosféricas durante a aplicação e secagem e registo de espessuras secas obtidas"; atribuindo, por sua vez, 30% de responsabilidade ao dono da obra, porquanto e conforme indicado, "o dono de obra, após conclusão da mesma deverá dar o uso previsto ou devido ao equipamento construído."
8. Em 06 de novembro de 2020, vem a mandatária da sociedade «EMP01...», Lda., solicitar a liberação das retenções devidas pela empreitada efetuada por aquela sociedade, sendo quê, em 21 de novembro de 2020, foi concretizado auto para liberação de caução, com a presença, no local, da Comissão nomeada por deliberação da Câmara Municipal de 22 de março de 2012, bem como do técnico em representação da entidade adjudicatária, resultando daquela auto que "a caução não pode ser liberada por motivo da pintura geral da estrutura metálica se encontrar descolada."
9. Seguidamente, no dia 08 de janeiro do presente ano, a Divisão de Projetos e Obras Municipais remete ao conhecimento desta Divisão, email enviado a esta autarquia pela sociedade «EMP01...», Lda., através do qual é solicitado o pagamento, pelo Município, do valor de € 794,50 (setecentos e noventa e quatro euros e cinquenta cêntimos), a título de despesas e honorários devidos pelo trabalho desenvolvido pela mandatária daquela sociedade, no âmbito do processo ora em juízo, sendo que, no dia 14 de janeiro último, o Chefe da Divisão de Projetos e Obras-Municipais informa esta Divisão que, passo a citar, "não temos conhecimento da existência de acordos para além do acordo para a eliminação de defeitos'."
10. Ultimamente, no dia 15 de fevereiro de 2021, e após solicitação de informação por parte da Divisão de Assuntos Jurídicos relativamente à existência e comunicação do contrato de subempreitada concretizado pela entidade adjudicatária, a sociedade «EMP01...», Lda, o Chefe da Divisão de Projetos e Obras Municipais remete, via mail, informação técnica, que se cita para os devidos efeitos:
"A empresa «EMP01...» não me enviou cópia do contrato, nesse sentido não temos documento que comprove o contrato por escrito entre as duas empresas, contudo estas duas empresas estiveram em obra."
B. Enquadramento Jurídico:
Ora, até então enunciados os factos conhecidos por força dos documentos e elementos integrantes do processo subjuditio, após junção da informação solicitada, a qual foi transmitida ao conhecimento da Divisão de Assuntos Jurídicos no passado dia 15 de fevereiro, discutindo-se, in casu, do procedimento a adotar na sequência do acordo de eliminação de defeitos outorgado por esta autarquia e consequente concretização de relatório pericial por parte da entidade ISQ, Serviços Industriais de Engenharia, eis o que, neste âmbito e em matéria de direito, nos cumpre informar:
B.1. Regime Jurídico da Liberação de Cauções em Empreitadas de Obras Públicas. Decreto-Lei número 190/2012, de 22 de agosto.
Primeiramente, e tendo presente que o contrato ora em juízo foi outorgado em 15 de janeiro de 2015, mencione-se que lhe é aplicável o Decreto-Lei número 190/2012, de 22 de agosto, que veio consagrar um regime excecional e temporário no concernente à liberação das cauções prestadas para garantia da execução de contratos de empreitada de obras públicas e do exato e pontual cumprimento de todas as obrigações legais e contratuais decorrentes para o empreiteiro, regime que, por força do seu artigo 2.° , se aplica aos contratos de obras públicas celebrados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de março, bem como e com relevância para o caso sub judice, "aos contratos de empreitada de obras públicas celebrados ou a celebrar ao abrigo do Código dos Contratos Públicos até 1 de julho de 2016."
Assim, e fazendo ora referência às disposições legais patentes no Decreto-Lei número 190/2012, de 22 de agosto, aplicáveis in casu, cumpre ressalvar o disposto no seu artigo 3.°, sob a epígrafe "Liberação da caução", o qual se transcreve para os devidos efeitos:
"1. O dono da obra pode autorizar a liberação das cauções que tenham sido prestadas no âmbito dos contratos referidos no artigo anterior, decorrido um ano contado da data da receção provisória da obra.
2. A liberação da caução é feita faseadamente, durante um período de cinco mios,
contado da data da receção provisória da obra, nos seguintes termos:
a) No 1.° ano após receção provisória da obra, 30% da caução total da obra;
b) No 2.° ano após a receção provisória da obra, 30% da caução total da obra;
c) No 3.° ano após a receção provisória da obra, 15% da caução total da obra;
d) No 4.° ano após receção provisória da obra, 15% da caução total da obra;
e) No 5.° ano após receção provisória da obra, 10% da caução total da obra.
(...) 4. Para efeitos do n.° 2, nas empreitadas celebradas ao abrigo do CCP, cujo prazo de garantia esteja em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei e em que já tenha tido lugar a liberação parcial da caução, é considerado o montante já liberto, procedendo-se ao acerto necessário para respeitar as percentagens previstas relativas aos anos completos já decorridos.
5. É condição de liberação da caução a inexistência de defeitos da obra da responsabilidade do empreiteiro, salvo se o dono da obra considerar que os defeitos denunciados, ainda não modificados ou corrigidos, são pouco relevantes e não justificam a não liberação da caução." (sublinhado nosso)
Sendo que, relativamente ao procedimento de liberação da caução, dispõe o artigo 4.º do Decreto-Lei número 190/2012, de 22 de agosto:
"1. Decorrido o prazo referido no n.° 1 do artigo anterior, o empreiteiro pode requerer a liberação ao dono da obra, através de carta registada com aviso de receção, solicitando, para esse fim, a realização de vistoria a todos os trabalhos de empreitada.
2. O dono da obra ordena a realização da vistoria, que tem lugar nos 30 dias subsequentes à receção do pedido, convocando para tal o empreiteiro, por meio de carta registada com aviso de receção, com a antecedência mínima de 5 dias da data prevista para a realização da vistoria.
3. Se o empreiteiro não comparecer, a vistoria tem lugar na presença de duas testemunhas, que assinam o auto respetivo.
4. A decisão de liberação da caução é comunicada ao empreiteiro, através de carta registada com aviso de receção ou correio eletrónico com recibo de leitura, no prazo de 30 dias contados da data da realização da vistoria.
5. A liberação da caução considera-se autorizada se o dono da obra não ordenar a realização de vistoria no prazo previsto no n." 2 ou não comunicar a sua decisão no prazo previsto no número anterior. (...)" (sublinhados nossos)
Face ao regime ora enunciado, é de ressalvar que, se afigura condição da liberação da caução a inexistência de defeitos da obra da responsabilidade do empreiteiro, salvo dos que forem considerados, pelo dono de obra, de pouca importância e, por esse facto,
não impedirem tal liberação.
B.2. Do regime jurídico da subcontratação em sede dos contratos públicos. Da responsabilidade do empreiteiro pela correção das deficiências de execução da obra que se revelem no decurso do prazo de garantia.
Centremo-nos, ora, no regime jurídico da subcontratação no âmbito do Código dos Contratos Públicos, matéria com relevância no caso em juízo para aferição do procedimento a adotar, bem como da entidade com responsabilidade perante o dono da obra pelo exato e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais e posterior reparação de defeitos de obra.
Em bom rigor, importa, primeiramente mencionar que, por força do número 1 do artigo 385.º do Código dos Contratos Públicos, doravante CCP, sob a epígrafe "subempreitadas na fase de execução", a subcontratação no decurso da execução do contrato não carece de autorização do dono da obra, salvo nos casos previstos no número 2 do mesmo artigo. Ademais, resulta da redação normativa dada pela cláusula 41.° do caderno de encargos que, "o dono da obra apenas pode opor-se à subcontratação na fase de execução do contrato quando não estejam verificados os limites. constantes do artigo 383.° do CCP, ou quando haja fundado receio de que a subcontratação envolva um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do contrato", sendo que, em conformidade com os pontos 3 e 6 daquela cláusula, "Todos os subcontratos devem ser celebrados por escrito e conter os elementos previstos no artigo 384." do CCP, devendo ser especificados os trabalhos a realizar e expresso o que for acordado quanto à revisão de preços", "no prazo de cinco dias após a celebração de cada contrato de subempreitada, o empreiteiro deve, nos termos do n." 3 do artigo 385." do CCP, comunicar por escrito o facto ao dono da obra, remetendo-se cópia do contrato em causa."
Mais se acrescenta o ponto 7, ainda da cláusula 41.ª do caderno de encargos, por força da qual - A responsabilidade pelo exato e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais é do empreiteiro, ainda que as mesmas sejam cumpridas por recurso a subempreiteiros," (sublinhado nosso)
Ora, importa salientar que o contrato de empreitada de obras públicas é um contrato intuitu personae, sendo que, na subempreitada e através dela, o empreiteiro adjudicatário, sob a sua responsabilidade, encarrega outro empreiteiro da execução de trabalhos incluídos no objeto da empreitada por si contratada, natureza jurídica que justifica a disposição legal contida no artigo 321.º do Código dos Contratos Públicos e que impõe que, nos casos de subcontratação, o cocontratante permaneça integralmente responsável perante o contraente público pelo exato e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais.
Assim, atendendo à natureza privada do contrato de subcontratação e considerando que o subcontratado não é parte no contrato inicialmente outorgado, afigurando-se como um terceiro face ao contraente público, é ao adjudicatário que compete o integral cumprimento do contrato de empreitada outorgado, mesmo relativamente às prestações em que se fez substituir pelo subempreiteiro, que assume como suas. Importa, portanto, assinalar que o contrato de subempreitada é celebrado exclusivamente entre o empreiteiro e o subempreiteiro e que, não obstante ser objeto de regulamentação no Código dos Contratos Públicos, não deixa, por esse mesmo facto, de manter a natureza de contrato de direito privado, continuando, por isso, a ser regulamentado pelo Código Civil.
Termos em que, independentemente da existência de contratos de subempreitada, é o empreiteiro que permanece integralmente responsável pelo exato e pontual cumprimento de todas as obrigações que decorram das cláusulas contratuais, bem como, a posteriori, da obrigação de correção das deficiências de execução da obra que se revelem no decurso do prazo de garantia.
É esse, aliás, o espírito e a natureza jurídica do regime jurídico da garantia da obra, patente no artigo 397.º do Código dos Contratos Públicos, que faz depender o prazo de garantia dos defeitos de obra, decorrendo, do seu número 5, que "o empreiteiro tem a obrigação de corrigir, a expensas suas, todos os defeitos da obra e dos equipamentos nela integrados que sejam identificados até ao termo do prazo de garantia, entendendo-se como tais, designadamente, quaisquer desconformidades entre a obra executada e os equipamentos fornecidos ou integrados e o previsto no contrato", sendo que, por força do seu número 6, "se os defeitos identificados não ,forem suscetíveis de correção, o dono da obra pode, sem custos adicionais, exigir ao empreiteiro que repita a execução da obra com defeito ou que substitua os equipamentos defeituosos, salvo se tal se revelai' impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais."
Conforme refere Jorge Andrade da Silva, in Código dos Contratos Públicos Anotado e Comentado, pág. 835, em comentário ao artigo 397.º, "Regula-se, pois, neste preceito, o prazo durante o qual, uma vez concluída a obra, esta é posta à prova, para a hipótese de, no decurso desse prazo, acontecer algo que possa revelar vício de execução não aparente na altura da receção provisória", mais acrescentando, “só após o decurso desse tempo é a obra definitivamente recebida e o empreiteiro ilibado da responsabilidade relativamente ao que naquela possa acontecer, sem prejuízo da última parte do n.º 7 do artigo seguinte." (sublinhado nosso)
Assim, e ainda que tenha sido celebrado um acordo para eliminação dos defeitos de obra, constatados após a receção provisória, partilhamos do entendimento de que tal acordo não exclui a responsabilidade do adjudicatário pela assunção dos encargos decorrentes da reparação dos defeitos existentes na obra, porquanto a responsabilidade do subempreiteiro, no âmbito do contrato de empreitada outorgado, é perante o adjudicatário e não perante a entidade adjudicante, in casu, o Município ....
B.3. Da nulidade do contrato de subempreitada. por violação dos vícios de forma patentes no artigo 384.º do CCP.
Atenta a informação prestada pela Divisão de Projetos e Obras Municipais, é importante ressalvar que não foram enviados a esta Divisão quaisquer contratos de subempreitada outorgados, pelo que, em caso de inexistência e ausência de comunicação do contrato de subempreitada ao Município, eis o que nos cumpre informar no concernente à temática da exigência de forma e conteúdo do contrato de subempreitada, bens como à existência e (in)validade de eventual contrato verbal de subempreitada.
Em bom rigor, importa, primeiramente mencionar que, conforme enunciado, por força do número 1 do artigo 385.º do Código dos Contratos Públicos, doravante CCP, sob a epígrafe "subempreitadas na fase de execução", bem como por força do clausulado do caderno de encargos do contrato ora em análise, a subcontratação no decurso da execução do contrato não carece de autorização do dono da obra, salvo nos casos previstos no número 2 do mesmo artigo. Ora, se é verdade que tal instituto jurídico constitui um regime especial e oposto ao dos números 1 e 2 do artigo 319.º relativos à subcontratação pelo cocontratante na generalidade dos contratos na fase da sua execução, dispensando, para o efeito, a prévia autorização do contraente público, não é menos verdade que, não obstante a livre escolha do respetivos subempreiteiros pela entidade adjudicatária, se exige, da parte desta, o cumprimento de um série de deveres, quais sejam, comunicar por escrito ao dono da obra a contratação, com envio de cópia do contrato outorgado, fundamentação da decisão de subcontratar, declaração de que o subempreiteiro é titular do alvará ou certificado com as habilitações legais exigidas para executar a obra, e finalmente, declaração da observância do limite de subcontratação de 75% relativamente ao preço contratual.
Recorde-se, neste âmbito, o estipulado no número 3 do caderno de encargos concernente ao contrato de empreitada sub judice, o qual se passa a citar para os devidos efeitos, "Todos os contratos devem ser celebrados por escrito e conter os elementos previstos no artigo 384." do CCP." Termos em que, será de necessária análise a redação normativa do enunciado artigo, sob a epígrafe "Forma e conteúdo", o qual, no seu número 1, estabelece que o subcontrato está sujeito à forma escrita e o seu clausulado deve conter, sob pena de nulidade, os documentos taxativamente identificados nas alíneas que o compõem, a saber, a identificação das partes e respetivos representantes, dos alvarás ou certificados de empreiteiro de obras públicas das partes, a descrição do objeto do contrato, o preço, o prazo de execução das prestações objeto do subcontrato.
Consequentemente, alerta-se para o facto de que, a inexistência de contrato escrito de subempreitada por violação do artigo 384.º do CCP, configura uma nulidade atípica, conforme tem sido jurisprudencialmente entendido (cfr. Acórdão da Relação de Guimarães de 21 de janeiro de 2016), não sendo legalmente possível o dono da obra intimar o subempreiteiro ao cumprimento das obrigações verbalmente estipuladas com o cocontratante. Ademais, independentemente da existência de contrato escrito, atendendo à natureza privada do contrato de subcontratação e considerando que o subcontratado não é parte no contrato inicialmente outorgado, afigurando-se como um terceiro face ao contraente público, é ao adjudicatário que compete o integral cumprimento do contrato de empreitada outorgado, mesmo relativamente às prestações em que se fez substituir pelo subempreiteiro, que assume como suas. Importa, portanto, assinalar que o contrato de subempreitada é celebrado exclusivamente entre o empreiteiro e o subempreiteiro e que, não obstante ser objeto de regulamentação no Código dos Contratos Públicos, não deixa, por esse mesmo facto, de manter a natureza de contrato de direito privado, continuando, por isso, a ser regulamentado pelo Código Civil.
C. Conclusão. T
ermos em que, face aos argumentos de facto e de Direito enunciados até então e aos artigos descritos, aplicáveis ao caso sub judice, atento o acordo para eliminação de defeitos outorgado pelo Município ..., e salvo abalizada interpretação jurídica que sustente do contrário, partilhamos do entendimento de que, in casu, deverá ser adotado o procedimento que se enuncia:
1. Primeiramente, tendo esta autarquia aceite, desde logo, aquando da outorga do acordo para eliminação de defeitos devidamente identificado no ponto 3 dos considerandos factuais, os defeitos que o relatório pericial identificasse à data da sua concretização, bem como a responsabilidade pela correção ou eliminação dos defeitos que lhe foram imputados, tendo aceite as conclusões que fossem formuladas por aquela entidade imparcial, caso não as pretenda, ora, aceitar e aquela entidade mantenha a sua posição relativamente à responsabilidade do Município, a única solução será, forçosamente e a nosso ver, a interposição de ação judicial junto dos Tribunais competentes.
2.Tendo em consideração que o relatório pericial concretizado indicia como responsáveis pelos defeitos de obra constatados, o dono da obra em 30%, bem como o aplicador em 70%, e considerando que, por força do acordo outorgado, as entidades com responsabilidade deverão definir o plano de trabalhos em conjunto e iniciar a intervenção no prazo máximo de 45 dias após a notificação do relatório, deverá o órgão competente que autorizou a abertura do procedimento autorizar o início da reparação dos defeitos, com imputação dos custos na proporção resultante do relatório pericial.
3. Por sua vez, e no concernente aos valores solicitados pela sociedade «EMP01...», para pagamentos dos honorários e despesas suportadas pela sua mandatária, não tendo havido qualquer contratação de tais serviços pela autarquia, deverão os serviços competentes da Divisão de Projetos e Obras Municipais, informar a entidade demandante que, por força do acordo outorgado, os valores devidos por esta autarquia são os relativos apenas e só aos que decorrem das cláusulas do acordo outorgado, a saber, cláusula 5.9, atinente à assunção do custo do relatório pericial na proporção da sua responsabilidade, e cláusula 29, ponto 2, concernente à assunção dos custos para eliminação de defeitos na proporção da responsabilidade definida no relatório, pelo que não assumirá esta autarquia a responsabilidade pelo pagamento de quaisquer valores respeitantes ao pagamentos de honorários e despesas de serviços contratados por entidades externas, porquanto do acordo outorgado não resulta forçosamente a assunção de tais encargos pelo Município.
4. Atenta a natureza jurídica da subcontratação e por força do artigo 321..° do Código dos Contratos Públicos, somos de opinião de que, não obstante o acordo concretizado para a eliminação de defeitos, não fica excluída a responsabilidade do adjudicatário pela assunção dos encargos decorrentes da reparação dos defeitos existentes na obra, sendo o adjudicatário que deverá responder perante o dono da obra pelos defeitos que esta apresenta, sem prejuízo do direito de regresso que possa exercer sobre o subempreiteiro identificado como responsável no relatório pericial.
5. Assim, e na sequência do descrito no ponto anterior, e porquanto, conforme enunciado, o adjudicatário é a entidade responsável pela execução dos trabalhos, bem como pela correção dos seus consequentes defeitos, afigurando-se a única entidade com a qual o Município celebrou um contrato de empreitada, quer tais trabalhos tenham sido executados por si ou por terceiros subcontratados, deverá Município notificar o adjudicatário para, o mais atempadamente possível, iniciar, juntamente com o subempreiteiro e o dono de obra, um plano de trabalhos conjunto.
Ultimamente, apenas após a reparação dos defeitos visados, seja por parte do adjudicatário ou do aplicador, é que poderá ser liberada, total ou parcialmente, a caução, em conformidade com as disposições normativas patentes no Decreto-Lei número 190/2012, de 22 de agosto.
- doc. ...3 da p.i.

32. Sob a informação referida no ponto anterior o Presidente da CM... apôs despacho de “Concordo. Transmita-se.”. – doc. ...3 da p.i.
33. Por ofício datado de 4.11.2021 a A. foi notificada do despacho e informação referidos nos pontos anteriores. – doc. ...3 da p.i.
Em sede de factualidade não provada o Tribunal consignou:
Com interesse para a decisão da causa não se provaram os factos que não constam de III.1.
E no que à motivação da factualidade assente diz respeito exarou:
A matéria de facto provada resultou da conjugação dos elementos documentais juntos aos autos e ao processo administrativo apenso, nos termos indicados em cada um dos pontos do probatório, tendo sido considerados admitidos por acordo os factos que não foram impugnados nos termos do art. 574.º, n.º 2 do CPC, aplicando-se ainda as regras gerais de distribuição do ónus da prova.
DE DIREITO
É objecto de recurso a sentença que julgou:
“a. Verificada a exceção de inimpugnabilidade do despacho do Presidente do Município ..., de 12.10.2021.
b. Quanto ao mais, totalmente improcedente a ação;
c. Improcedente o pedido de condenação da R. como litigante de má fé.”
Na óptica da Recorrente a mesma deve ser declarada nula por violar as seguintes disposições legais:
i. Artigo n.º 87.º-A, n.º 1, alínea a) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante "CPTA"), artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (doravante "CPC), e artigo 20.º, n.º 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa (doravante "CRP");
ii. Artigo 34.º, n.º 1 e 2 do CPTA;
iii. Artigos 307.º, n.º 2, alínea a), 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do Código dos Contratos Públicos (doravante "CCP");
iv. Artigos 321.º do CCP, artigo 334.º do Código Civil e cláusula 41.º, n.º 7 do Caderno de Encargos;
v. Artigo 295.º do CCP e da cláusula 39.º do Caderno de Encargos;
vi. Artigo 542.º do CPC;
vii. Artigo 615º/c) do CPC.
Cremos que carece de razão.
Vejamos,
Da alegada violação do artigo n.º 87.º-A, n.º 1, alínea a) do CPTA, do artigo 3.º, n.º 3 do CPC, e do artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da CRP -
Alega a Recorrente que a sentença recorrida viola o princípio do contraditório, consagrado no artigo 3.º, n.º 3 do CPC e ainda os artigos 87.º-A, n.º 1, alínea a) do CPTA e 20.º, n.ºs 1 e 4 da CRP, por não ter sido realizada audiência prévia, nem ter sido concedido às partes a oportunidade de se pronunciarem sobre todas as questões.
Não secundamos este entendimento.
Como é sabido, a lei processual administrativa atende às especificidades do contencioso administrativo e procura dar resposta a problemas que não se colocam em processo civil, consagrando, quando tal se justifica, soluções diferenciadas, em que o regime do CPTA se afasta daquele que resulta do CPC, sem prejuízo da sua aplicação supletiva.
Neste ponto de vista, merecem, desde logo, referência os regimes “do artigo 85.º-A que prevê a existência da réplica e, havendo reconvenção, da tréplica, ao contrário do processo civil, e dos artigos 87.º-A a 87.º-C que se afastam e introduzem adaptações ao regime da audiência prévia e do saneador, bem como dos artigos 91.º e 91.º-A que clarificam os termos em que se procede à realização da audiência final e em que pode haver lugar a alegações escritas”. (cfr. ponto 3, do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que procede à quarta alteração do CPTA, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro).
Assim, ao contrário do consagrado na lei processual civil, o CPTA prevê, expressamente, a admissibilidade de réplica para o autor responder, por forma articulada, às exceções deduzidas na contestação.
Assim, a 17 de fevereiro de 2022, a ora Recorrente apresentou réplica, onde teve oportunidade de se pronunciar sobre a exceção de inimpugnabilidade do ato invocada pelo ora recorrido.
Neste articulado, a Autora, ora Recorrente, pronunciou-se e expôs os argumentos que entende serem aplicáveis e válidos no sentido da improcedência da exceção em causa, exercendo, assim, o consagrado direito ao contraditório. Argumentos estes, aliás, que coincidem com os invocados na presente sede de recurso.
Assim, não existiu qualquer decisão surpresa, tendo sido concedido, conforme prevê o CPTA, oportunidade à Autora, ora recorrente, para se pronunciar sobre a exceção invocada pelo Réu, aqui recorrido, que veio, a final, ser julgada procedente.
Prevê o artigo 87.º-B do CPTA, sob a epígrafe “Não realização da audiência prévia”:
“1 - A audiência prévia não se realiza quando seja claro que o processo deve findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória.
2 - O juiz pode dispensar a realização de audiência prévia quando esta se destine apenas ao fim previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior.
3 - Nas ações que hajam de prosseguir, o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins previstos nas alíneas d), e) e f) do n.° 1 do artigo anterior, proferindo, nesse caso, despacho para os fins indicados, nos 20 dias subsequentes ao termo dos articulados.
4 - Notificadas as partes, se alguma delas pretender reclamar dos despachos proferidos para os fins previstos nas alíneas e), f) e g) do n.° 1 do artigo anterior, pode requerer, em 10 dias, a realização de audiência prévia, que, neste caso, deve realizar-se num dos 20 dias seguintes e destinar-se a apreciar as questões suscitadas e, acessoriamente, a fazer uso do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo anterior, podendo haver alteração dos requerimentos probatórios.”
No presente caso, entendeu, e quanto a nós bem, o Tribunal a quo dispensar a realização de audiência prévia, uma vez que a mesma apenas se destinava a “facultar às partes a discussão de facto e de direito”, conforme a própria Recorrente reconhece.
As questões de fundo em causa nos presentes autos foram suficientemente discutidas pelas partes nos vários articulados existentes, não subsistindo quaisquer dúvidas ou imprecisões relativamente à matéria de facto que pudessem ser supridas na audiência prévia, pelo que não se justificava a sua realização.
O artigo 87.º-13 do CPTA consagra, assim, uma forma de descongestionamento do serviço, libertando tanto o Tribunal como os advogados das partes dessa diligência, em cumprimento dos princípios de gestão processual e de adequação formal, evitando as delongas e prática de atos e diligências inúteis em processos que se pretende com a maior celeridade possível.
Assim, não incorreu o Tribunal em qualquer violação do CPTA; pelo contrário, houve cumprimento estrito da lei.
Em suma,
O princípio do contraditório tem consagração constitucional (artº 32º/nº 5 da Constituição da República Portuguesa) e significa que nenhuma decisão (mesmo interlocutória) deve ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar - Acórdão da RC de 17/3/2009, no prc. 63/07.8SAGRD.C1 JTRC;
Este é um princípio basilar do processo, que hoje ultrapassou a concepção clássica, que estava associada ao exercício do direito de resposta, assumindo-se como uma garantia de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o processo, conferindo às partes a possibilidade de influírem em todos os elementos que se liguem ao objeto da causa.
Como ensina Lebre de Freitas em Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais à luz do Código Revisto, Coimbra Editora, 1996, pág. 96: “a esta concepção, válida mas restritiva, substitui-se hoje uma noção
mais lata de contraditoriedade, entendida como garantia de participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo”.
Segundo este princípio, o juiz não deve decidir qualquer questão, de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre ela se pronunciarem, pois só assim se assegura a participação efetiva das partes no desenvolvimento do litígio e na busca da justiça da decisão.
Como se sumariou no Acórdão do STA de 13/11/2007, proc. 0679/07
I-O princípio do contraditório é um dos direitos fundamentais das partes no desenvolvimento do processo já que, garantindo-lhes a possibilidade de intervir em todos os seus actos, permite-lhes defender os seus interesses e influenciar a decisão do Tribunal.
II-E, porque assim, tal princípio só pode ser postergado nos casos de manifesta desnecessidade ou nos casos em que o seu cumprimento poderia pôr em causa, injustificadamente, os direitos de uma das partes ou poderia comprometer seriamente a finalidade que determinou a instauração do processo.
III-O cumprimento do princípio do contraditório é essencial na marcha do processo e que, por isso, a sua violação constitui nulidade uma vez que pode influir no exame ou na decisão da causa a qual, por via de regra, determinará a nulidade de todo o processado que lhe é posterior. - nºs 1 e 2 do art. 201º do CPC.

No caso concreto este princípio não foi postergado; ademais, verificou-se ainda ter sido julgada procedente a exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato, que implica o término dos autos no despacho saneador, pelo que, em momento algum, se justificaria a realização de uma diligência como a audiência prévia que tem como pressuposto o prosseguimento dos autos (cfr. n.º 1 do artigo 87.º-13 do CPTA).
Da alegada violação do artigo 34.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA -
Entende a Recorrente que nos presentes autos se deve aplicar o critério supletivo previsto no artigo 34.º, n.º 2 do CPTA, por considerar estar em causa um valor indeterminável.
Ora, não se trata de uma causa com valor indeterminável, uma vez que o processo não diz respeito a bens imateriais ou a normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa.
Pelo contrário, estamos perante uma causa com valores definidos e concretos, pelo que se justifica a aplicação do n.º 1 ou do n.º 3 do artigo 32.º do CPTA ao presente caso.
Como se refere na sentença: Nos presentes autos a A. peticiona a anulação do despacho do Presidente do Município ..., de 12.10.2021, que, no âmbito da empreitada de “Execução de cobertura no Pavilhão Gimnodesportivo de ...”, determina que será a A. a responder perante o Município ... pelos defeitos da obra, que deverão ser corrigidos o mais rapidamente possível e, bem assim, que a liberação da caução apenas ocorrerá após tal reparação. E, bem assim, que seja reconhecido, no essencial, a validade e eficácia do acordo de reparação de defeitos, condenando-se o R. a pagar à A. a quantia total de € 16.341,38, correspondente ao valor vencido a título de retenções (€ 15.217,77), acrescido de juros de mora, à taxa de 7%, contados desde a data do auto para liberação da caução (16.11.2020) até 16.12.2021 que computou em € 1.123,62, juros vincendos e respetivos encargos legais.
Ora, no essencial, estamos perante uma ação que tem por objeto a apreciação do cumprimento de um contrato que ascende ao valor de € 147.491,05, no que respeita à obrigação de reparação de defeitos e de devolução das quantias retidas a título de caução, ou seja, os pedidos compreendem-se no âmbito do disposto no art. 32.º, n.º 3 do CPTA.
Assim, atendendo a que, nos termos do disposto no artigo 315.º, n.º 1 do C.P.C. (aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA), não obstante o dever de indicação que impende sobre as partes, compete ao juiz fixar o valor da causa, fixo aos autos o valor de € 147.491,05 (cento e quarenta e sete mil quatrocentos e noventa e um euros e cinco cêntimos).
Da alegada violação dos artigos 307.º, n.º 2, alínea a), 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do CCP -
Entende a Recorrente que o ato impugnado nos presentes autos “vai além da mera declaração, não se ficando pela interpretação e/ou validade do ato e reveste uma verdadeira ordem ou instrução no exercício dos poderes de direção e fiscalização, consubstanciadora de um ato administrativo passível de impugnação, nos termos do n.º 2 do artigo 307.º do CCP.”.
Para esse efeito, começa a Recorrente por destacar trechos da matéria de facto que não se mostram relevantes para a decisão sobre a procedência ou não da exceção de inimpugnabilidade do ato.
À semelhança da sentença recorrida, para a boa decisão da causa, assumem particular relevância os seguintes factos dados como provados:
“16. Em 25.5.2018 foi realizada vistoria para liberação de caução elaborando-se auto, assinado pelas partes, do qual se extrai:
Ao vigésimo quinto dia do mês de maio de dois mil e dezoito, no local dos trabalhos da obra referenciada, compareceu a Comissão nomeada para o efeito por deliberação da Câmara Municipal de vinte e dois de Março de dois mil e doze, constituída pelos Senhores Engºs Civis [AA], [BB] e Arq.tº [CC] em representação da Câmara Municipal e o Senhor Eng.º [DD] em representação da empresa adjudicatária da referida empreitada para procederem à vistoria dos trabalhos para liberação da caução dos mesmos, nos termos e para os efeitos do Artigo 3.º e seguintes do Decreto Lei n.º 190/2012, de 22 de Agosto.
E tendo vistoriado todos os trabalhos daquela obra, verificaram que a caução não pode ser liberada, pelo seguinte motivo:
1. Pintura geral da estrutura metálica descolada.
Nota: Em anexo registo fotográfico – doc. ... Scan constante do p.a..
17. Em 5.6.2018 a A. foi notificada do auto de vistoria e para, face às inconformidades detetadas, proceder à respetiva correção.
(...)
26. Em 26.11.2020 foi realizada a vistoria para efeitos de liberação da caução, elaborando-se auto, assinado, além do mais, pelo representante da A., do qual se extrai
Ao vigésimo sexto dia do mês de novembro de dois mil e vinte, no local dos trabalhos da obra referenciada, compareceu a Comissão nomeada para o efeito por deliberação da Câmara Municipal de vinte e dois de Março de dois mil e doze, constituída pelos Senhores Eng.s [BB] e [EE] e o Arq.to [CC] em representação da Câmara Municipal e o Senhor Eng.º [DD] em representação da empresa adjudicatária da referida empreitada para procederem à vistoria dos trabalhos para liberação da caução dos mesmos, nos termos e para os efeitos do Artigo 3.º e seguintes do Decreto Lei n.º 190/2012, de 22 de Agosto.
E tendo vistoriado todos os trabalhos daquela obra, verificaram que a caução não pode ser liberada, pelo seguinte motivo:
1. Pintura geral da estrutura metálica descolada.
Nota: Em anexo registo fotográfico.
-doc. Auto de Vistoria constante da pasta 11 do p.a..
27. Por ofício datado de 27.12.2020 o Chefe de Divisão de Projetos e Obras Municipais notificou a A. do auto de vistoria e para, face às inconformidades detetadas, para proceder às respetivas retificações – doc. Auto de Vistoria constante da pasta 11 do p.a..
(...)
30. Por comunicação datada de 30.9.2021 a A. requereu ao R.,
Assunto: liquidação dos valores retidos a título de retenções
Em conformidade com o teor da N/ comunicação emitida em 28/12/2020, das comunicações eletrônicas efetuados pela N/ Mandatária e. bem assim, das inúmeras interpelações verbais realizadas pela N/ empresa, por intermédio dos seus representantes legais, foram Vossa (s) Ex.cia(s) notificados para procederem à imediata liberação de todas as retenções devidas pela empreitada efetuado em ....
Sucede que, até à data, nada foi pago por conta de tais retenções.
Ora, o montante total de €15 217. 77, correspondente a tais retenções, está já vencido, desde pelo menos 26/11/2020 (data em que foi efetuado o auto para liberação de caução), motivo pelo qual, são, ainda, devidos os respetivos juros de mora que, calculados até à data e à taxa legal em vigor perfazem já a quantia de €898.89.
Deverão, portanto, proceder ao pagamento integral da quantia em dívida no montante total de €16 116, 66 (dezasseis mil, cento e dezasseis euros e sessenta e seis cêntimos), no prazo de 10 dias a contar da receção da presente, findo o qual será intentada a respetiva ação judicial, sempre e a todos os títulos mais incómoda e dispendiosa. - doc. ...2 da p.i.
31. Em 17.2.2021 os serviços da CM... emitiram a informação ...21 com o seguinte teor
(...) – doc. ...3 da p.i.
32. Sob a informação referida no ponto anterior o Presidente da CM... apôs despacho de “Concordo. Transmita-se.”. - doc. ...3 da p.i.
33. Por ofício datado de 4.11.2021 a A. foi notificada do despacho e informação referidos nos pontos anteriores. – doc. ...3 da p.i.”
Assim, o ato impugnado [despacho proferido pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal ... datado de 12/10/2021, no seguimento da informação ...21] foi praticado na sequência de um pedido formulado pela Recorrente de devolução dos valores retidos a título de caução no âmbito da empreitada em causa nos presentes autos ("Execução de Cobertura no Pavilhão Gimnodesportivo de ...").
Refere o artigo 307.º do CCP:
"1 - Com exceção dos casos previstos no número seguinte, as declarações do contraente público sobre interpretação e validade do contrato ou sobre a sua execução são meras declarações negociais, pelo que, na falta de acordo do cocontratante, o contraente público apenas pode obter os efeitos pretendidos através do recurso à ação administrativa.
2 - Revestem a natureza de ato administrativo as declarações do contraente público sobre a execução do contrato que se traduzam em:
a) Ordens, diretivas ou instruções no exercício dos poderes de direção e de fiscalização;
b) Modificação unilateral das cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução das prestações previstas no contrato por razões de interesse público;
c) Aplicação das sanções previstas para a inexecução do contrato;
d) Resolução unilateral do contrato;
e) Cessão da posição contratual do cocontratante para terceiro."
Estamos, assim, perante a afirmação formal do princípio do ato administrativo enquanto exceção.
Com efeito, o artigo 307.º do CCP assume e consagra a natureza excecional dos atos administrativos contratuais e estabelece o princípio de que apenas os atos praticados pelo contraente público no exercício dos poderes elencados no artigo 302.º do CCP são atos administrativos.
Prescreve o artigo 302.º do CCP, sob a epígrafe "Poderes do contraente público": "Salvo quando outra coisa resultar da natureza do contrato ou da lei, o contraente público pode, nos termos do disposto no contrato e no presente Código:
a) Dirigir o modo de execução das prestações;
b) Fiscalizar o modo de execução do contrato;
c) Modificar unilateralmente as cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução das prestações previstas no contrato por razões de interesse público, com os limites previstos no presente Código;
d) Aplicar as sanções previstas para a inexecução do contrato;
e) Resolver unilateralmente o contrato;
f) Ordenar a cessão da posição contratual do cocontratante para terceiro.”
Ora, analisado o despacho impugnado nos presentes autos, é notório que o mesmo não se subsume ao exercício de nenhum dos poderes referidos no artigo 302.º supra, uma vez que não discorre sobre o modo de execução das prestações em causa, não fiscaliza o modo de execução, e muito menos, modifica unilateralmente as cláusulas do contrato, resolve o mesmo, aplica sanções ou ordena a cessão da posição contratual, apenas esclarecendo a posição do ora recorrido quanto à sua interpretação do contrato celebrado entre as partes, no que toca ao dever de reparação dos defeitos e da liberação de caução.
Assim, o despacho impugnado “não convoca o exercício de poderes especiais de interesse público ou de supremacia, manifestando-se em termos de vinculação paritária no contexto de uma típica lógica de contrato, de consenso ou de pactum, em que as partes manifestam as suas vontades e interesses através de declarações negociais” [cfr. sumário (…)
II- Constitui declaração negocial e não acto administrativo, a declaração de oposição à renovação do referido contrato de concessão, comunicada ao concessionário pelo concedente, nos termos previstos na cláusula 16ª do contrato “mediante declaração expressa, escrita, recebida com uma antecedência mínima de oito meses sobre a data do fim do período inicial de vigência” do contrato, já que tal denúncia – passível de ser efectivada por qualquer das partes – não convoca o exercício de poderes especiais de interesse público ou de supremacia, manifestando-se em termos de vinculação paritária “no contexto de uma típica lógica de contrato, de consenso ou de pactum, em que as partes manifestam as suas vontades e interesses através de declarações negociais”.
(…) do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 28/04/2017, processo n.º 03172/16.0BEVIS-A].
A este propósito refere Mário Aroso de Almeida, in “Cadernos de Justiça Administrativa”, n.º 66, de novembro/dezembro de 2007, págs. 11 e seguintes:
“A jurisprudência portuguesa sempre tendeu, desde tempos muito recuados, a assumir um entendimento favorável à afirmação das relações contratuais administrativas como relações contratuais eminentemente paritárias, no âmbito das quais só excepcionalmente haveria lugar à emissão de actos administrativos.
(...) em tese geral, vimos defendendo, que o moderno entendimento da Administração Pública e do seu posicionamento perante os particulares num Estado de Direito democrático aconselha a que não se sobrevalorize e, pelo contrário, se atribua o devido peso ao exercício de poderes de autoridade da Administração, circunscrevendo-o aos domínios em que ele se revele verdadeiramente indispensável.
Ora, nessa perspectiva, afigura-se-nos que o contrato administrativo não deve ser prioritariamente encarado como um instrumento de subjugação dos particulares ao poder da Administração, mas como uma fonte de relações jurídicas eminentemente paritárias no âmbito das quais o clássico padrão autoritário de relacionamento da Administração com os particulares deve ceder o passo a um novo padrão de relacionamento, no âmbito do qual só em circunstância excepcionais, porventura previstas pela lei consoante os concretos tipos de contratos, deveria haver lugar à emissão de actos administrativos."
Conclui assim que: "não parecem revestir a natureza de acto administrativo, por não serem objecto de qualificação formal nesse sentido no capítulo IV do Título I da Parte III, os actos que exprimam o exercício de dois poderes que o Código confere ao contraente público, mas que não se enquadram no elenco dos poderes de conformação que se encontram previstos no referido capítulo IV."
Ora, neste domínio, faz a sentença recorrida uma interpretação e aplicação adequada dos poderes elencados no capítulo IV (artigos 303.º, 304.º, 305.º e 306.º do CCP - poderes de fiscalização e direção) ao caso concreto, em especial, ao despacho impugnado, concluindo que o mesmo não corresponde a um ato administrativo praticado no exercício dos poderes de direção ou fiscalização.
Assim, e conforme sentenciado, "O ato impugnado não corresponde à ordem de reparação de defeitos emitida nos termos dos arts. 396.º, n.º 1 e 398.º, n.º 5 do CCP. Na realidade, o despacho em causa limita-se a, na sequência, por um lado, de novo levantamento dos defeitos e do apuramento do grau de imputabilidade aos intervenientes da responsabilidade pelos mesmos (à luz do processo negocial encetado pelas partes), e, por outro, do pedido de levantamento da caução pela A., ao esclarecimento da posição do Município quanto à exigibilidade ao empreiteiro do dever de reparação dos defeitos (na medida da imputabilidade dos mesmos ao subempreiteiro) - e aos moldes em que deve ser dado início ao processo de reparação - e, consequentemente, à recusa de liberação de caução enquanto tais defeitos não forem corrigidos.
Não estamos aqui, opostamente ao advogado pela A., perante qualquer ato administrativo praticado no exercício dos poderes de fiscalização passível de ser reconduzido ao disposto no art. 307.º, n.º 2 al. a) do CCP.
O ato impugnado não corresponde à ordem de reparação de defeitos que, de resto, já tinha sido praticada em 5.6.2018 e confirmada em 17.12.2020, não se reconduzindo a uma decisão no exercício dos poderes jurídico-administrativos de direção e fiscalização, mas tão só emergindo da relação jurídica paritária no seio da execução contratual, negando à A. a liberação da caução por se considerar que, sem prejuízo da responsabilidade do subempreiteiro pelos defeitos, é o empreiteiro quem responde pelos mesmos perante o dono de obra.
Estamos no âmbito de uma relação de paridade entre as partes, de tal forma que o ato impugnado corresponde, na realidade, a uma mera declaração negocial.”.
Entende ainda a Recorrente que o Recorrido, por intitular o ato impugnado de "despacho" e não de "mera declaração negocial", na carta enviada a 9 de fevereiro de 2022, junta aos presentes autos com a réplica, está a reconhecer-lhe natureza de ato administrativo.
Ora, tal não é assim. Despacho não é sinónimo de ato administrativo, nem ato administrativo se confunde com despacho.
Com efeito, existem inúmeros despachos que não constituem atos administrativos, como é o caso, dos despachos de mero expediente.
Um "despacho" diz respeito a uma decisão, em princípio, não-final que o Tribunal profere para resolver certa questão pendente ou então para prover ao andamento regular da causa (cfr. os n.ºs 1 e 4 do artigo 152.º do CPC).
O Recorrido, em momento algum, disse não pretender liberar as cauções à Recorrente, nem tão pouco, alegou que pretende que a Recorrente suporte os custos dos defeitos que, de acordo com o relatório junto aos presentes autos, são da alegada responsabilidade do Recorrido (30%).
O que resulta da posição vertida pelo Recorrido ao longo dos presentes autos é apenas e somente que, enquanto os defeitos subsistirem, não pode liberar as cauções.
Tal resulta dos normativos legais aplicáveis, dos princípios de direito administrativo e ainda das próprias obrigações contratuais assumidas pelo Recorrente e pelo Recorrido, pelo que decidiu e bem o Tribunal não ser possível liberar as cauções em causa enquanto os denunciados e reconhecidos defeitos subsistirem.
Uma decisão contrária ao exposto não só violaria as disposições legais e contratuais aplicáveis, como ainda o superior interesse público, por não assegurar que as reparações a levar a cabo num edifício público, destinado ao uso da coletividade, são realizadas.
Assim, a sentença recorrida fez uma interpretação correcta dos factos e uma escorreita aplicação da legislação em vigor, não violando, ao contrário do alegado, o disposto nos artigos 307.º, n.º 2, alínea a), conforme supra demonstrado, nem os artigos 396.º e 398.º, n.º 5 do CCP.
Relativamente aos referidos artigos do CCP, cuja violação é invocada pela Recorrente, em sede de alegações de recurso, cumpre ainda referir o seguinte:
Quanto à alegada violação do artigo 396.º do CCP pela sentença recorrida, não assiste razão à Recorrente.
Com efeito, o Recorrido denunciou os defeitos existentes à Recorrente, dentro do prazo de garantia, defeitos estes que foram reconhecidos e expressamente aceites por esta. Ora, não existindo trabalhos de correção de defeitos concluídos, não é possível haver lugar a nova receção provisória, sendo certo que no disposto no número 3 do artigo em causa trata-se de uma possibilidade (“pode”) e não de um dever que se imponha à Administração.
No que toca ao artigo 398.º do CCP, em especial ao seu número 5, no presente caso estamos perante defeitos que abrangem a totalidade do prédio em causa, nomeadamente, no que concerne à pintura e revestimento de proteção ao fogo, pelo que não é possível levar a cabo uma receção parcial, tendo em conta a natureza dos defeitos e ainda a não verificação, no caso concreto, das condições cumulativas consagradas no n.º 3 do artigo em causa.
Não obstante, sempre se dirá que esta se trata de uma alegação totalmente nova, que não só não é concretizada a nível de alegações de recurso, como nem sequer foi alegada em sede de petição inicial.

Ora, os recursos jurisdicionais visam a reapreciação de decisões de tribunais de grau hierárquico inferior, tendo em vista a sua alteração ou anulação por erro de facto ou de direito das mesmas, não sendo admissível no recurso o conhecimento de questões que não foram colocadas nem apreciadas na decisão recorrida e que não são de conhecimento oficioso - Acórdão do STA, de 26/09/2012, proc. 0708/12.

Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado - Acórdão do STA, de 13/11/2013, proc. 01460/13.

Em sede de recurso jurisdicional não pode ser conhecida questão nova, que o recorrente não tenha oportunamente alegado nos seus articulados, designadamente a invocação de um novo vício do ato impugnado, por essa matéria integrar matéria extemporaneamente invocada sobre a qual a sentença impugnada não se pronunciou, nem podia pronunciar-se - Acórdão do TCA Sul, proc.° 5786/09, de 3 de fevereiro.)

O objectivo do recurso jurisdicional é a modificação da decisão impugnada, pelo que, não tendo esta conhecido de determinada questão por não ter sido oportunamente suscitada, não pode o Recorrente vir agora invocá-la perante este tribunal ad quem, porque o objecto do recurso são os vícios da decisão recorrida.

Nestes termos, esta nova questão não será enfrentada nesta sede recursiva.
Da alegada violação do artigo 321.º do CCP, do artigo 334.º do Código Civil e da cláusula 41.º, n.º 7 do Caderno de Encargos -
Neste ponto, e em especial, no que toca à alegação relativa à violação do artigo 321.º do CCP pela sentença recorrida, apresenta a Recorrente argumentação algo contraditória.
Diz que “nenhuma das partes, à data, incluindo a Ré, pretendia afastar o disposto naquelas normas [artigo 321.º do CCP e n.º 7 da cláusula 41.º do CE]. Aliás diríamos até que, se alguém pretende afastar o disposto naquelas normas, esse alguém é agora a Ré!” (de acordo com página 22 das alegações de recurso).
Ora, a sentença recorrida defende, e bem, a aplicação do artigo 321.º do CCP aos presentes autos e a impossibilidade de afastar tal disposição por vontade das partes.
E, de momento, em sede de alegações de recurso, parece que também a Recorrente concorda com tal entendimento, apesar de imputar invalidade à sentença recorrida por violação do artigo 321.º do CCP.
Prevê o artigo 321.º do CCP:
“Nos casos de subcontratação, o cocontratante permanece integralmente responsável perante o contraente público pelo exato e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais”.
Diz o artigo 41.º do Caderno de Encargos, sob a epígrafe "Subcontratação e cessão da posição contratual":
1 – O empreiteiro pode subcontratar as entidades identificadas na proposta adjudicada, desde que se encontrem cumpridos os requisitos constantes dos n.°s 3 e 6 do artigo 318.° do CCP.
2 – O dono da obra apenas pode opor-se à subcontratação na fase de execução quando não estejam verificados os limites constantes do artigo 383.° do CCP, ou quando haja fundado receio de que a subcontratação envolva um aumento de risco de incumprimento das obrigações emergentes do Contrato.
3 - Todos os subcontratos devem ser celebrados por escrito e conter os elementos previstos no artigo 384.° do CCP, devendo ser especificados os trabalhos a realizar e expresso o que for acordado quanto à revisão de preços.
4 - O empreiteiro obriga-se a tomar as providências indicadas pelo director de fiscalização da obra para que este, em qualquer momento, possa distinguir o pessoal do empreiteiro do pessoal dos subempreiteiros presentes na obra.
5 - O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável aos contratos celebrados entre os subcontratados e terceiros.
6 - No prazo de cinco dias após a celebração de cada contrato de subempreitada, o empreiteiro deve, nos termos do n.° 3 do artigo 385.° do CCP, comunicar por escrito o facto ao dono da obra, remetendo-lhe cópia do contrato em causa.
7 - A responsabilidade pelo exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais é do empreiteiro, ainda que as mesmas sejam cumpridas por recurso a subempreiteiros.
8 - A cessão da posição contratual por qualquer das partes depende da autorização da outra, sendo em qualquer caso vedada nas situações previstas no n.° 1 do artigo 317.° do CCP.".
Sucede que o "acordo" em causa nos presentes autos não afastou o disposto no artigo 321.º do CCP nem o disposto no n.º 7 da cláusula 41.º do CE, no que respeita à responsabilização do empreiteiro pelos defeitos de obra, ainda que imputáveis à atuação de terceiros que por este tenham sido contratados.
Com efeito, como resulta do texto do "acordo" e ainda da sentença recorrida, "do que se tratou foi de vincular os intervenientes à aceitação da existência dos defeitos detetados (pela perícia) na obra e à assunção da medida da sua responsabilidade por aqueles e, bem assim, aos termos da sua reparação. Mas daqui não emerge que, por esta via, se pretendesse eximir o empreiteiro da responsabilidade pelo exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações contratuais, mesmo no caso em que fossem cumpridas por recurso a subempreiteiros.”.
Ora, neste sentido aponta também a alegação da Recorrente, que expressamente refere que nenhuma das partes pretendeu afastar o disposto nas normas em causa (artigos 321.º CCP e 41.º, n.º 7 do CE).
Assim, não existe qualquer violação por parte da sentença recorrida dos artigos 321.º do CCP e do artigo 41.º, n.º 7 do CE.
Acresce que, conforme refere o aresto, mesmo que o acordo afastasse a aplicação do artigo 321.º do CCP e do artigo 41.º do CE, o que não se verifica, certo é que estamos perante uma norma de caráter imperativo - artigo 321.º do CCP - que, como tal, não admite derrogação ou restrição por mera vontade das partes, pelo que sempre seria o “acordo” em causa nulo quanto a essa parte, caso a mesma existisse (artigo 294.º do CC).
Como sentenciado, “O disposto no art. 321.º do CCP emerge, desde logo, da consideração de que na subcontratação não há uma substituição de sujeitos, mas antes uma sobreposição, de tal forma que, pelo facto de o dono da obra ser alheio ao contrato de subempreitada, a responsabilidade do empreiteiro mantém-se perante o dono da obra. Sendo que, quando os defeitos denunciados respeitem à execução da subempreitada o empreiteiro não se exime da sua responsabilidade perante o dono de obra, antes podendo fazer repercutir tal reclamação, por via do direito de regresso, na esfera do subempreiteiro.
A manutenção da responsabilidade do empreiteiro perante o dono de obra, mesmo no caso de subcontratação, assume particular relevância no domínio das obras públicas. Com efeito, é o caráter intuito personae do ato de adjudicação, cuja prolação decorre de um procedimento pré-contratual regulado no sentido de maximizar a concorrência e tendente à escolha da proposta que melhor serve os interesses públicos, em que se demanda a estabilidade subjetiva dos concorrentes/candidatos/adjudicatário, que justifica as restrições legalmente previstas que rodeiam institutos, como a subcontratação, em que está em causa a modificação subjetiva do co-contratante.
Ou seja, os interesses públicos que subjazem à escolha do co-contratante e que justificam as limitações e requisitos de que depende o recurso à subcontratação, e inerentes à própria execução do empreendimento público, não se coadunam com a desresponsabilização do subcontratante, perante o dono de obra, pelos atos do subcontratado.
(...) No domínio das empreitadas de obras públicas estamos aqui, pois, perante uma norma de interesse público, que assume uma tal relevância (no quadro dos interesses e valores que aos ordenamentos jurídicos compete tutelar) que a renúncia ao mesmo ofenderia a ordem pública.
Neste sentido, compreende-se que a previsão da imputabilidade ao empreiteiro da responsabilidade perante o contraente público, mesmo nos casos de subcontratação, se assuma nas empreitadas de obras públicas como norma imperativa, ou seja, norma de interesse e ordem pública, que não pode ser derrogada ou sequer restringida por vontade das partes. Trata-se, pois, o art. 321.º do CCP de previsão inderrogável por convenção das partes.”.
Assim, não pode falar-se em abuso de direito por parte do Recorrido, uma vez que não exerceu nem exerce qualquer direito que exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, pelo que, consequentemente, não se verifica qualquer violação do artigo 334.º do Código Civil por parte da sentença recorrida.
Com efeito existe (apenas existe) abuso de direito quando alguém, detentor embora de um determinado direito, válido em princípio, o exercita, todavia, no caso concreto, fora do seu objetivo natural e da razão justificativa da sua existência e em termos, apoditicamente, ofensivos da justiça e do sentimento jurídico dominante, designadamente com intenção de prejudicar ou de comprometer o gozo do direito de outrem ou de criar uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular e as consequências a suportar por aquele contra o qual é invocado.
Ora, tal condicionalismo está ausente na situação dos autos.
Como se escreveu no Ac. do TR Guimarães de 16.2.2017, P. 1452/14.7TBVCD.G1, “não podemos considerar abusiva [...], na medida em que estando em causa o interesse público decorrente da violação de normas imperativas que não permitem derrogações, logicamente que também se não poderá sacrificar o cumprimento de tais normas, em razão de um exercício reprovável de um direito, por parte do seu titular, que mesmo sendo-o, não deixa de ter por fundamento a violação de normas imperativas e, portanto, de incontroverso interesse e ordem pública”.
Ou seja, atenta a imperatividade do disposto no art. 321.º do CCP - que seria determinante da nulidade do Acordo caso este previsse o afastamento da regra imperativa -, naturalmente que a responsabilização do empreiteiro pelos defeitos da obra, ainda que imputáveis a terceiro a que o empreiteiro recorreu para a execução dos trabalhos, não se assume como abusiva.
Em suma, não se pode considerar que a atuação do Município, com a prolação do despacho de 12.10.2021, exigindo da A. a reparação dos defeitos detetados na obra na proporção de 70%, consubstancie abuso de direito, pelo que naturalmente não há que reconhecer a inexigibilidade à A. do dever de correção de defeitos, nem condenar o R. a abster-se de exigir da A. a reparação (na proporção de 70%) das anomalias detetadas na empreitada.
Da alegada violação do artigo 295.º do CCP e da cláusula 39.º do Caderno de Encargos -
Prevê a cláusula 39.ª do Caderno de Encargos, sob a epígrafe “Restituição dos depósitos e quantias retidas e liberação da caução”:
“1 - Feita a recepção definitiva de toda a obra, são restituídas ao empreiteiro as quantias retidas como garantia ou a qualquer outro título a que tiver direito.
2 - Verificada a inexistência de defeitos da prestação do empreiteiro ou corrigidos aqueles que hajam sido detectados até ao momento da liberação, ou ainda quando considere os defeitos identificados e não corrigidos como sendo de pequena importância e não justificativos da não liberação, o dono da obra promove a liberação da caução destinada a garantir o exacto e pontual cumprimento das obrigações contratuais, nos seguintes termos:
a) 25 % do valor da caução, no prazo de 30 dias após o termo do segundo ano do prazo a que estão sujeitas as obrigações de correcção de defeitos, designadamente as de garantia;
b) Os restantes 75 %, no prazo de 30 dias após o termo de cada ano adicional do prazo a que estão sujeitas as obrigações de correcção de defeitos, na proporção do tempo decorrido, sem prejuízo da liberação integral, também no prazo de 30 dias, no caso de o prazo referido terminar antes de decorrido novo ano.
3 - No caso de haver lugar a recepções definitivas parciais, a liberação da caução prevista no número anterior é promovida na proporção do valor respeitante à recepção parcial.”.
Resulta, pois, da supracitada cláusula que, apenas após a receção definitiva da obra e somente perante a inexistência de defeitos ou ainda nos casos em que a entidade adjudicante considere que os defeitos são de pequena importância, é que deverão ser restituídas ao empreiteiro, neste caso, à Recorrente as quantias retidas como garantia.
No caso posto, conforme resulta do probatório e da própria argumentação das Partes, dúvidas não restam de que existem defeitos e que estes ainda se encontram por reparar.
Assim, não há qualquer violação deste preceito por parte da sentença recorrida. Pelo contrário, a mesma faz uma aplicação perfeita do disposto no Caderno de Encargos ao caso em apreço, determinando que não poderá haver restituição da caução prestada enquanto os defeitos perdurarem.
Prescreve ainda o artigo 295.º do CCP:
“1- O regime de liberação das cauções prestadas pelo cocontratante deve ser estabelecido no contrato, não podendo as partes acordar em regime diverso durante a fase de execução contratual, salvo havendo fundamento de modificação do contrato que justifique uma alteração do regime de liberação das cauções e desde que sejam respeitados os limites previstos no presente Código.
(...)
8 - A liberação da caução prevista nos n.ºs 4 a 7 depende da inexistência de defeitos da prestação do cocontratante ou da correção daqueles que hajam sido detetados até ao momento da liberação, sem prejuízo de o contraente público poder decidir diferentemente, designadamente por considerar que os defeitos identificados e não corrigidos são de pequena importância e não justificam a não liberação”.
Decorre, desde logo, deste artigo que o regime de liberação das cauções deve ser estabelecido e aplicado de acordo com o disposto no Caderno de Encargos, no presente caso, nos termos do disposto no artigo 41.º, supramencionado.
Diz-nos ainda o artigo em causa (295.º do CCP) que não podem as partes acordar em regime diverso, relativo à liberação das cauções, durante a fase de execução contratual.
Por fim, determina o artigo que o contraente público só poderá alterar este regime de liberação das cauções desde que respeite os limites previstos no Código.
A este propósito, vem a Recorrente, pela primeira vez, invocar a ressalva prevista na última parte do número 1, do artigo 295.º do CCP. Sem prejuízo da preclusão do direito de alegação, nos termos dos números 3 e 5 do artigo 83.º do CPTA, a verdade é que tal ressalva não tem nem podia ter qualquer aplicação ao caso posto, uma vez que, em primeiro lugar, o regime de liberação das cauções não foi alterado, e em segundo lugar, mesmo que este tivesse sido objeto de alteração no “acordo” em causa, que não foi, tal alteração sempre seria nula e não aplicável por não respeitar os limites previstos no CCP.
Com efeito, a liberação de caução sem reparação dos defeitos colide com o espírito e os normativos previstos no CCP, em especial, o artigo 321.º do CCP que, conforme se referiu, tem natureza imperativa e não permite derrogação pelas partes.
Da alegada violação do artigo 542.º do Código de Processo Civil -
Conforme referido no aresto sub judice, o Recorrido não litigou nem litiga de má fé ou em abuso de direito.
Com efeito, o Recorrido sempre alegou e defendeu a mesma posição, seja no âmbito procedimental, nomeadamente na informação ...21, seja no âmbito do presente processo judicial, pelo que tem de ser arredada a litigância de má fé.
Conforme ficou assente foi a Recorrente quem teve a iniciativa da celebração do "acordo" em causa nos presentes autos, tendo sido esta que o redigiu e assegurou a assinatura por todas as partes, após o Recorrido ter denunciado a existência de defeitos, bem sabendo a Recorrente não ter cumprido com os requisitos contratual e legalmente impostos, relativamente aos contratos de subempreitada que celebrou com duas entidades totalmente estranhas ao Recorrido.
Acresce que, em momento algum, disse o Recorrido não pretender liberar as cauções à Recorrente, nem alegou pretender que esta suporte os custos dos defeitos que, de acordo com o relatório junto aos presentes autos, são da alegada responsabilidade do Recorrido (30%).
O que resulta da posição vertida pelo Recorrido e da legislação aplicável ao presente caso, é apenas e somente que, enquanto os defeitos subsistirem, não pode o Recorrido liberar as cauções.
A sentença concluiu, e bem, que é patente que a R. não litigou de má fé. Na realidade limitou-se a, no exercício do seu direito de defesa, a invocar a exceção de inimpugnabilidade do ato por não se tratar de ato administrativo. Não está em causa qualquer dedução de oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, da alteração da verdade, nem tão pouco do uso reprovável do processo ou dos meios processuais, e que, ademais, o tivesse feito a título de dolo ou negligência grosseira.
Como é sabido, a litigância de má fé traduz-se no exercício de forma abusiva de direitos processuais.
Dispõe o art.º 542º, n.º 1, do CPC que, “tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”. Acrescenta o n.º 2 do mesmo preceito que “diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Assim, para não caírem no âmbito de aplicação do normativo acima transcrito e nas correlativas sanções, as partes deverão litigar com a devida correcção, ou seja, no respeito dos princípios da boa-fé e da verdade material e, ainda, na observância dos deveres de probidade e cooperação expressamente previstos no art.º 8º do CPTA e nos artºs 7º e 8º do CPC, para assim ser obtida, com eficácia e brevidade, a realização do direito e da justiça no caso concreto que constitui o objecto do litígio.
Para que possa falar-se de litigância de má-fé e se justifique a aplicação de alguma das sanções previstas para tal situação deverá ter-se como assente que a actuação de alguma das partes desrespeitou o Tribunal ou a Parte que lhe é contrária no processo.
Daí que a conduta da parte, para que possa integrar-se no conceito de litigância de má-fé, deva estar viciada por dolo ou negligência grave, não abrangendo, assim, situações de erro grosseiro ou lide ousada ou temerária em que alguém possa ter caído por mera inadvertência;
No presente caso, entendeu-se que a conduta do Recorrido não é passível de ser enquadrada em nenhuma das alíneas do n.º 2 do art.º 542º do CPC, pois que a mesma resulta do normal exercício do direito de acção que lhe assiste e dos argumentos para esse efeito expendidos.
I - A má fé substancial verifica-se quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 542º, do CPC, enquanto a má fé instrumental se encontra prevista nas als. c) e d) do mesmo artigo;
II - Em qualquer dessas situações nos encontramos perante uma intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da atuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva.
III - A condenação como litigante de má fé assenta num juízo de censura sobre um comportamento que se revela desconforme com um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de Direito - Acórdão do STJ de 12/11/2020 no proc. 279/17.9T8MNC-A.G1.S1.
Ora, esta asserção é tão mais patente quanto, como vimos, o Tribunal a quo deu razão à ED, entendendo que efetivamente o ato é uma mera declaração negocial, não impugnável, e que quanto ao mais, efetivamente não assistiam à A. os direitos reclamados.
Desatende-se, assim, a argumentação da Recorrente.
Da contradição entre a decisão patente na sentença recorrida e os fundamentos legais aplicáveis e invocados por esta -
A nulidade da decisão judicial por oposição dos fundamentos com o decidido, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 615.º CPC, é um vício que afecta a estrutura lógica da decisão, por contradição entre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão, motivo por que não lhe são subsumíveis meras discordâncias do recorrente com que o foi decidido -
Acórdão do STA de 29/9/2022 no proc. 0128/20.0BALSB.
Não ocorre nulidade da sentença recorrida se esta é coerente entre os fundamentos e a decisão, sem prejuízo da eventual ocorrência de erro de julgamento quanto às questões a apreciar - Acórdão do STA de 11/7/2012, no proc. 0235/12.
Esta nulidade (contradição entre os fundamentos e a decisão) ocorre quando os fundamentos invocados na decisão deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada na decisão.
Na verdade, a sentença pode padecer de vícios de duas ordens:
Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e, então, a consequência é a sua revogação.
Por outro lado, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC.
Ora, nos termos do citado preceito legal, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154º, nº 1, do CPC.
O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar, como referimos, somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada.
Quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziram ao resultado expresso na decisão, inexistindo uma real contradição entre os fundamentos e a decisão pois que a fundamentação aponta num determinado sentido e a decisão segue esse caminho não se verifica a nulidade p. na al. c) do nº 1 do artº 615º do CPC.

Tal é a situação do aresto recorrido; aliás, nem a Recorrente tão pouco densifica ou justifica tal alegação, pelo que se desatende a invocada nulidade ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC.
Improcedem, assim, as Conclusões da peça processual da Apelante.
DECISÃO
Termos em se nega provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Notifique e DN.
Porto, 05/5/2023

Fernanda Brandão
Hélder Vieira
Alexandra Alendouro