Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00413/09.2BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/14/2012
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:NOTIFICAÇÃO
AVALIAÇÃO
OPOSIÇÃO
Sumário:I – A eventual falta de notificação ao contribuinte do resultado da avaliação, constitui um acto externo e posterior da mesma, que apenas contende com a respectiva eficácia que não com a sua validade, consequentemente, não integra o acto tributário, pelo que a sua falta ou irregularidade não afecta a validade deste mas apenas a sua eficácia.
II – A alegada falta de notificação da avaliação levada a efeito prévia a liquidação, não cabe na fórmula genérica da citada al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, nem da al. e) para efeitos de dedução de oposição à execução fiscal.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:I..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I. RELATÓRIO
I… - SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, LDA, CF 5…, deduziu oposição à execução fiscal nº 2364200901008153, que corre termos contra si no Serviço de Finanças de Alijó, por divida de IMT no valor de 12.299,57€.
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição, por não se enquadrar o fundamento invocado em nenhum dos previstos no art. 204° do CPPT, decisão com que a oponente não se conformou, tendo interposto o presente recurso jurisdicional.
Alegou, tendo concluído da seguinte forma:
1. Entendeu o Tribunal a quo que o fundamento invocado pela ora recorrente não se enquadra em nenhum dos previstos no artigo 204.º do CPPT, admitindo, contudo mais adiante, que a situação dos autos se enquadra naquele preceito.
2. Dá a sentença recorrida como facto provado que foi rececionado pela Senhora D. Maria… na sede da Oponente o oficio 4654191, em 03.07.2008, por confissão, pela conjugação dos artigos 5.º e 7.º da PI – o que afronta a leitura de tais artigos;
3. Há erro na seleção da matéria de facto por nunca se ter afirmado – em parte alguma – o que foi dado como assente, pois tanto na petição inicial, como as alegações e no processo administrativo nunca a recorrente afirmou tal;
4. A norma que especialmente regula a situação da notificação in casu é o art. 41.º do CPPT, logo não se compreende a razão pela qual a Administração Fiscal não admite que a notificação não foi feita a quem a lei obriga e nas condições previstas;
5. Trata-se de uma evidência que se diria palmar, e, como tal, inquestionável;
6. Fica, assim, provado que a oponente nunca foi notificada através do ofício n.º 4654191, de 17 de junho de 2008 e, portanto, não se pode pronunciar sobre o seu conteúdo, porque dele não teve conhecimento total ou parcial;
7. O facto do Tribunal a quo ter dado como assente o facto mencionado em 3 antecedente conduziu o mesmo a um erro de julgamento, afirmando que a suposta argumentação da recorrente configura uma situação de abuso do direito – o que justifica parcamente.
8. Face a tudo quanto exposto, outra conclusão não se pode tirar que não a de a recorrente não ter sido notificada – pois nem tomou conhecimento desse facto – , não há razão para que a Administração Fiscal mova este processo, pelo que deve a sentença ora em crise e recorrida ser revogada, in totum, com todas as legais consequências.
Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências a quanto alegado, deve ser dado provimento ao presente recurso, e integralmente revogada a decisão recorrida, substituindo-se tal decisão por outra, no sentido da extinção total da execução, por inexistência da divida exequenda, com todas as legais consequências.
Não houve contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Ao julgado é imputado erro de julgamento em matéria de facto ao ter sido dado como provado o constante do ponto 2. do probatório e erro de julgamento de direito ao considerar a validade da notificação da avaliação por via do ofício n.º 4654191, de 17 de junho de 2008.
III. FUNDAMENTOS
III.1. DE FACTO
O Tribunal a quo deu como assente a seguinte matéria de facto:
1. Em 11/10/2009 foi instaurado processo de execução fiscal para cobrança coerciva de uma divida de imposto sobre transmissões de imóvel referente ao ano de 2008, no montante de 11.010,35 € e acrescidos legais - cfr. PA;
2. O resultado da avaliação, transmitido através do oficio n.° 4654191, de 17/6/2008, foi enviado para a sede da Oponente e aí rececionado por Maria… em 3/7/2008 - confissão do Oponente, pela conjugação dos art. 5 e 7 da PI;
3. A dita Maria… não é gerente, trabalhadora ou prestadora de serviços da Oponente - art. 8 da PI, não contestado.
III.2 O julgamento da matéria de facto efetuado pela 1.ª instância vem posto em causa pela Recorrente nas conclusões 2 e 3 alegando que “2.Dá a sentença recorrida como facto provado que foi rececionado pela Senhora D. Maria… na sede da Oponente o oficio 4654191, em 03.07.2008, por confissão, pela conjugação dos artigos 5.º e 7.º da PI – o que afronta a leitura de tais artigos;3.Há erro na seleção da matéria de facto por nunca se ter afirmado – em parte alguma – o que foi dado como assente, pois tanto na petição inicial, como as alegações e no processo administrativo nunca a recorrente afirmou tal”, afigura-se-nos que a recorrente dissente, não só da valoração da prova, mas essencialmente da confissão extraída do por si alegado em sede de petição inicial no art. 5 e 7.
Efetivamente, a razão está do lado da Recorrente, o por si alegado em sede de petição apenas dá conta da posição defendida pela AT que considera que a notificação da avaliação foi operada através do oficio n.° 4654191, de 17/6/2008, enviado para a sede da Oponente e aí rececionado por Maria… em 3/7/2008, pelo que cumpre alterar o facto 2. do probatório, precisando o mesmo e a sua fundamentação, ao abrigo do disposto na norma do artigo 712º, nº 1, alínea a) e b), do CPC aplicável ex vi artigo 281º do CPPT, nos termos que passamos a explicitar e com o respetivo fundamento indicado após a enunciação do facto:
9. Em conformidade com as informações prestadas em sede de Reclamação Graciosa e Recurso Hierárquico a Oponente foi notificado do resultado da avaliação através do ofício n.º 4654191, de 17 de junho de 2008, enviada por carta registada com aviso de receção dirigida à sede da oponente, a qual foi rececionada no dia 03 de julho de 2008, por Maria…, portadora do documento de identificação n.º 7109355, de 11.07.2002, emitido em Vila Real (cfr. apenso do Recurso Hierárquico apresentado na sequência do indeferimento da Reclamação Graciosa )
III.3Enquadramento Jurídico
Para fundamentar a improcedência da oposição (por não se enquadrar o fundamento invocado em nenhum dos previstos no art. 204º do CPPT) o M.º Juiz do Tribunal “a quo”, referiu que:
“(…)
A falta de notificação do ato de liquidação quando não estiver em causa a caducidade do direito de liquidação, como é o caso dos autos, constituirá também um fundamento de oposição á execução fiscal por afetar a eficácia do ato e, consequentemente1 a exigibilidade da obrigação por ele constituída, a ser enquadrável na alínea i) e não na alínea e) do n.° 1 do art.° 204 do CPPT. Neste sentido, que se acompanha, Cfr. Jorge de Sousa, ia CPPT anotado, pag. 905.
Vejamos então se a Oponente foi validamente notificada do ato de liquidação.
Nem o RFP alude a tal notificação nem há nada nos autos que nos permita concluir em contrário ao que o Oponente alega.
Assim, a Oponente confessou que tal notificação foi recebida na sua sede em 3/7/2008 por Maria…. Conclui que não pode ser aplicado o disposto no art.° 41.°, n.° 2 do CPPT porque a dita senhora não tem nenhuma ligação com a sociedade Oponente porque não é gerente, trabalhadora ou prestadora de serviços da mesma.
Ora, a Oponente confessa que efetivamente alguém que estava na sua sede e recebeu a notificação da liquidação em causa. Se assim é presume-se, ou melhor, comprova-se que a entregou à sociedade oponente ( art.° 190.°, nº 5, 191.°, 192.°, n.° 1 do CPPT e 233.°, n.°4 e 238.° do CPC) . Dizemos que tal facto está comprovado porque a Oponente não fez prova em contrário (neste sentido, que se acompanha, Cfr. Jorge de Sousa, ob. Cit. pág. 235). Não basta afirmar.
De qualquer maneira vir agora a Oponente dizer que Maria… recebeu a notificação e não lha entregou configura um abuso de direito, uma vez que utiliza um argumento exclusiva e meramente formal para não ter conhecimento da notificação, prosseguindo um interesse (desconhecimento formal mas que afinal conhece) que exorbita do fim próprio do seu direito (alegação que teria de ser comprovada de que a entrega não foi feita). Ou seja, não é liquido, ou notório, que a dita senhora tivesse informado a sociedade Oponente que recebeu uma notificação da AT (e por isso mesmo é que a Oponente faz as afirmações que constam do art.° 7 e 8 da), informando-a que se referia a notificação de liquidação em causa e depois não lisa tivesse entregue ou não tivesse informado do conteúdo integral da dita liquidação.
Assim, não se enquadrando o fundamento invocado em nenhum dos previstos no artº 204° do CPPT, julgo improcedente a oposição.”
É assacado à sentença erro de julgamento quanto à matéria de facto dada como provada, originador de incorreta aplicação do direito ao caso, consistente na não aplicação ao caso do preceituado no art. 41º do CPPT, o que por si determinaria que se considerasse que a notificação da avaliação não se efetivou.
Portanto, cristalizada que se mostra a matéria de facto após alteração operada, cumpre reconduzir os mesmos às normas aplicáveis in casu.
Vejamos então.
Cumpre entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, aferir se a eventual falta de notificação é suscetível de ser reconduzida algum dos fundamentos da oposição à execução elencados no art. 204º e, subsequentemente em função da resposta dada, abordar a questão da validade da notificação.
Desde logo convém frisar, que a presente oposição foi deduzida pela recorrente no âmbito do processo de execução fiscal instaurado para cobrança de uma dívida decorrente de liquidação adicional de IMT, derivada de avaliação efetuada ao prédio inscrito sob o art. U – 0016141-A da matriz urbana da freguesia de Oeiras e São Julião, em cuja petição inicial, apenas invoca como fundamento para a extinção da execução, por inexistência da dívida exequenda, a falta do prévio conhecimento do resultado de tal avaliação (cfr. art.º4 .º e segs da mesma peça processual) o que só obteve com a notificação de tal liquidação adicional IMT, notificado pelo documento n.º 2008 401428503 (cfr. art. 1º da petição inicial). Em síntese, o fundamento de oposição reconduz-se exclusivamente ao facto de a notificação expedida para efeito da comunicação do resultado da 1.ª avaliação, ter sido a carta registada com o A/R assinada por uma Maria… que nada tem a ver com a sociedade oponente, com a sua gerência, não sendo nem trabalhadora nem prestadora de serviços da mesma, pelo que nunca teve conhecimento do resultado da avaliação e foi-lhe vedado o direito de reagir contra a mesma (como também foi entendido pelo M. Juiz do tribunal “a quo”, na sentença recorrida, apesar de incorretamente aludir a notificação da liquidação, sem que a ora recorrente, na matéria das suas conclusões, se insurja contra o objeto da oposição, assim erigido).
Ora, por este vício, que pretende a oponente assacar ao ato de liquidação e como tal configurar a inexistência da dívida exequenda, é destituído de força suscetível de por si abalar a liquidação, desde logo, por tal notificação (da avaliação) constituir um ato externo e posterior dessa própria avaliação, que apenas contende com a respetiva eficácia que não com a sua validade (Cfr. neste sentido, entre muitos outros, e ao que saibamos constitui jurisprudência pacífica, os acórdãos do STA de 17-5-2006 e de 3-5-2006, recursos n.ºs 231/06 e 154/06-30, respetivamente), pelo que nunca seria suscetível de inquinar de ilegalidade o posterior ato de liquidação que nessa avaliação se funda.
Assim, no caso, por um lado o invocado vício nunca seria suscetível de afetar a liquidação que constitui a dívida exequenda, na sua legalidade, pelo que a decisão andou mal ao discutir o eventual vício ocorrido em tal notificação do resultado da 1.ª avaliação, por outro lado, andou bem no resultado final ao considerar que o mesmo não se enquadrava em nenhum dos fundamentos elencados no art. 204º do CPPT.
Efetivamente, nos termos do disposto no art. 204. ° do CPPT, a oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos: (entre os quais) e) Falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade;
A falta de notificação do ato de liquidação quando não estiver em causa a caducidade do ato de liquidação (por ainda não ter decorrido o respetivo prazo), constituirá também fundamento de oposição à execução fiscal, por afetar a eficácia do ato e, consequentemente, a exigibilidade da obrigação por ele constituída.
No entanto, não será enquadrável nesta alínea e), mas sim na alínea i), deste mesmo nº l do art.204º.”
Ora, recapitulando, a oponente/recorrente argui a inexigibilidade da dívida exequenda como consequência jurídica da tal falta de notificação da 1ª avaliação, temos de concluir, que a falta de notificação da avaliação levada a efeito prévia a liquidação, não cabe na fórmula genérica da citada al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, nem da al. e), pelo que, como já referimos bem andou a sentença sob recurso al julgar improcedente o recurso, por não se enquadrar o fundamento invocado em nenhum dos previstos no art. 204º do CPPT.
E nem se diga que isso significa violar o princípio da plenitude da tutela efetiva dos direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado constitucionalmente no art. 268°, nº 4 da CRP. Na verdade, na sequência da notificação da liquidação adicional de IMT a Recorrente apresentou Reclamação graciosa, indeferida esta, o competente Recurso Hierárquico, sendo que o indeferimento deste abriu a via aos mecanismos legais ao seu dispor.
Improcede, assim, o recurso, mantendo-se o despacho recorrido, embora com diferente (a presente) fundamentação.
IV. DECISÃO
Termos em que, acordam, em conferência, os Juizes da Secção de Contencioso Tributário deste TCA em, negando provimento ao recurso, confirmar, com a presente fundamentação, a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Porto, 14 de junho de 2012
Ass. Irene Neves
Ass. Pedro Marques
Ass. Paula Ribeiro