Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00175/12.6BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/07/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:IVA; IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; FATURAS FALSAS; ÓNUS DA PROVA.
Sumário:I. Resulta da conjugação dos art.ºs 662.º e 640.º do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa e desde que o recorrente especifique nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios e a decisão que, no seu entender deve ser proferida.

II. Decorre da interpretação do n.º 1 do art.º 627.º do CPC º (ex . art.º 676.º) n. º2 do art.º 639.º e n.º 1 art.º 640.º do CPC (ex-art.ºs 685-A e 685-B) o tribunal de recurso fica impedido de conhecer questões que não tenham sido anteriormente apreciadas.

III. Dispõe o n.º 1, do art.º 74.° da LGT, que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

IV.Assim, compete à Administração Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas faturas foram simuladas, ou seja, recai o ónus de provar a ocorrência de factos de que deriva o direito à liquidação do IVA e o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que se arroga a Administração. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:O., LDA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Recorrente, O., LDA., pessoa coletiva n.º (…), interpôs recurso da sentença prolatada, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou improcedente a impugnação judicial visando as liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios, referente ao ano de 2005, que perfazem no montante global de € 84.250,20.

A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

“(…) CONCLUSÕES

DA DISCORDÂNCIA NA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO E NAS RAZÕES DE DIREITO, EM SEDE DE SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

DOS CONCRETOS PONTOS DE FACTO CONSIDERADOS INCORRECTAMENTE JULGADOS

MATÉRIA DADA COMO PROVADA E QUE NO ENTENDER DA RECORRENTE MERECE SER DADA COMO NÃO PROVADA

1.
B) A impugnante foi sujeita a um procedimento de inspeção externo, parcial, aos exercícios de 2005 e 2006 que está documentado no RIT, cujo teor, consta de fls. 208 a 217 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido. [Na parte de procedimento de inspeção interno]
C) O procedimento de inspeção foi motivado pela existência de indícios da utilização de faturas que não correspondem a operações reais
[O procedimento de inspeção foi motivado pela existência do operador/contribuinte N. Lda. actuar á margem da lei]
E) Nos exercícios de 2005 e 2006 a impugnante tinha registado na sua contabilidade as seguintes faturas emitidas em nome de N., Ld.ª, pessoa coletiva n.º (...), com sede em (...), (...), (…), abreviadamente designada N.:
FACTURA N.ºDATAPRESTAÇÕES SERVIÇOSIVA LIQUIDOTOTAL FACTURADO
1422005-03-31€ 13.875,00€ 2.636,25€ 16.511,25
1432005-03-31€ 12.725,00€ 2.417,75€ 15.142,75
1442005-03-31€ 14.955,00€ 2.841,45€ 17.796,45
1452005-03-31€ 13.975,00€ 2.655,25€ 16.630,25
1492005-04-23€ 19.000,00€ 3.610,00€ 22.610,00
1502005-05-14€ 22.500,00€ 4.275,00€ 26.775,00
1512005-06-19€ 19.750,00€ 3.782,50€ 23.502,50
1632005-07-22€ 52.750,00€ 11.077,50€ 63.827,50
1642005-08-31€ 35.490,00€ 7.452,90€ 42.942,90
1652005-09-30€ 49.760,00€ 10.449,60€ 60.209,60
1722005-10-20€ 35.500,00€ 6.825,00€ 39.325,00
1732005-11-29€ 29.750,00€ 6.247,50€ 35.997,50
1742005-12-21€ 33.750,00€ 7.087,50€ 40.837,50
SUBTOTAL 2005€ 350.780,00€71.328,20422.108,20
1782006-01-15€ 16.550,00€ 3.475,50€ 20.025,50
1792006-02-15€ 14.750,00€ 3.097,50€ 17.847,50
1812006-03-15€ 11.600,00€ 2.436,00€ 14.036,00
1852006-04-28€ 2.066,00€ 433,86€ 2.499,86
1862006-05-31€ 11.003,00€ 2.310,63€ 13.313,63
1872006-06-30€ 10.000,00€ 2.100,00€ 12.100,00
SUBTOTAL 2006€ 65.969,00€ 13.853,49€ 79.822,49
TOTAL€ 416.149,00€ 85.181,69€ 501.930,69

[Na parte respeitante ao ano de 2006] Isto porque a presente demanda respeita tão só ao ano de 2005 e já não aos fatos relativos a 2006 que deverão ser omitidos da matéria dada como provada
H) A administração tributária, com base nessa fundamentação e conclusões, considerou ainda que as faturas emitidas em nome de N. e registadas na contabilidade da impugnante no exercício de 2005 e 2006, não titulavam operações económicas reais, por os produtos e serviços delas constantes não terem sido fornecidos pela emitente (fls. 208 a 217 verso).
[na parte em que deveria constar titulam operações económicas reais]

MATÉRIA DADA COMO NÃO PROVADA E QUE NO ENTENDER DA RECORRENTE MERECE SER DADA COMO PROVADA
2.
AA - O teor dos recibos números 112, 120, 119, 129 que constam do documento n.º 5 junto com a Impugnação no seguimento de informação prestada pela Impugnante e recepcionada pela Administração Tributária em 21 de Abril de 2009 cujo teor se deve dar por reproduzido.
AB - Sr. P. utilizou e serviu-se dos elementos de contabilidade e das faturas da N., (por ser essa a própria convicção do tribunal)
AC - A D. na sequência da cessação da actividade da N. ficou de forma não apurada com os equipamentos desta (por ser essa a própria convicção do tribunal). A testemunha S. declarou, conforme consta da página 7 da sentença declarou que o Sr M. vendeu tudo ao Sr. (...).
AD - Até pelo menos ao ano de 2005 a N. manteve a capacidade produtiva em forma jurídica não concretamente apurada. E o gerente de facto era o Sr. P.. Isto porque resulta da própria convicção do Tribunal que a N. tinha trabalhadores, tinha equipamento e os seus livros de facturação e de recibos estavam na posse do Sr. (...). É um fato passível de ser inferido por presunção judicial ou legal, dos factos provados, dos factos notórios e de conhecimento oficioso 351º do CC e artigo 660.º, n.º 2 do CPC.
AE - A N. forneceu à impugnante os produtos e serviços que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária referidas em E).
- As faturas emitidas em nome de N., registadas na contabilidade da impugnante, titulam operações económicas reais.
AF - Aditamento ao ponto G da matéria de facto dada como provada que todos os elementos em falta são suprimidos pelas “Notas de lançamento/conferimento” constantes da contabilidade e pelos mapas da Impugnante nos quais se descrimina a quantidade, a denominação usual dos bens e/ou serviços prestados, onde são quantificadas e especificadas as operações, discriminados os valores do material aplicado e da mão-de-obra, identificadas as obras, o local das obras e data da realização e o trabalho realizado.
AG – Em aditamento ao ponto Y) da matéria de fato dada como provado “Os factos constantes do RIT que originaram as liquidações impugnadas deram origem à instauração do procedimento criminal, processo n.º.., da Comarca do Porto, que está em sede de instrução, por indícios da prática do crime de fraude fiscal qualificada (fls. 591, ata da audiência contraditória e RIT).” deverá constar como provado que [o procedimento criminal iniciou-se no ano de 2010 (ver ano do processo judicial)]
AH - O custo associado a esta subcontratação da N. Lda. foi incluído na facturação final aos seus clientes [conforme reconhece expressamente a AF no relatório, parte final, pagina 16, que refere “precisamente que estes serviços nunca colocaram em causa a efectiva realização das obras, bem como a facturação a jusante, ou seja a facturação da O. Lda. aos seus clientes”].

DA PROVA QUE IMPÕE DECISÃO DIVERSA DA RECORRIDA
3.
A própria convicção do Tribunal na parte que considera que o Sr. (...) se serviu dos elementos da contabilidade (faturas e recibos), da existência de equipamento e trabalhadores da N. que por forma não cabalmente apurada, mas que, transitaram para a esfera e disponibilidade do Sr. (...).
As presunções judicias e legais indicadas.
O depoimento das testemunhas da Impugnante, que não obstante o enorme espaçamento temporal (cerca de 10 anos da ocorrência dos fatos), depuseram de forma circunstanciada e isenta.
Toda a prova documental junta pela Impugnante/Recorrente designadamente os “Lançamentos/conferimentos”, prática usual á data da Impugnante, que apesar de serem da autoria da Impugnante, mas para o que não pode deixar de relevar a prontidão da apresentação e a espontaneidade. Note-se que a mesma é comunicada e apresentada á Administração Tributária numa fase excepcionalmente precoce e ainda em sede do dever de colaboração da Impugnante/Recorrente e aquando da inspecção externa á N.. Os quais especificam e descriminam detalhadamente preços e quantidades que nunca foram postos em causa pela Administração Tributária.
As fotografias das obras. O fato das existência das obras não ser posta em causa.
A estrutura organizacional da empresa.
A contextualização do início das relações comerciais.
O documento n.º 5 junto com a Impugnação que revela a existência dos recibos emitidos pela N. que não foram levados em consideração nem pelo Tribunal a quo nem pela Administração Tributária.
O relatório final.

IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO
DA EXISTÊNCIA DE INSPECÇÃO EXTERNA (INTERNA) AO SUJEITO PASSIVO AQUI IMPUGNANTE
3.
Entende a Impugnante sublinhar a relevância da distinção entre procedimentos de inspecção tributária interna e externa, incidindo em especial sobre a necessidade de assegurar o cumprimento do princípio da substância sobre a forma, na sua vertente de relevância material dos actos inspectivos.
No âmbito das acções de fiscalização tributária, a distinção entre procedimento de inspecção interna e externa assume particular relevo.
4.
Nos termos do n.º 1º do artigo 2º do RCPIT “o procedimento de inspecção visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias”, sendo o procedimento classificável como interno sempre que os actos de inspecção tenham lugar exclusivamente nos serviços da AF (vide al. a) do artigo 13º do RCPIT). Ao invés, tal procedimento inspectivo será qualificado como externo quando os “actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso” (vide artigo 13.º citado).
5.
A classificação dos procedimentos de inspecção como interno ou externo não se pode resumir a uma mera distinção de ordem espacial ou de localização dos actos inspectivos, pois que, acarreta importantes consequências, na medida em que o procedimento de inspecção externa pode restringir os direitos e liberdades fundamentais dos sujeitos passivos, desde logo na matéria relativa á caducidade do direito à liquidação de tributos.
6.
O procedimento de inspecção externa – procedimento absolutamente essencial para que a AF divise a verdade material subjacente aos factos tributários sobre os quais pode incidir uma inspecção – pode iniciar-se até ao termo do prazo de caducidade do direito á liquidação do tributo (n.º 1do artigo 36º do RCPIT). Considera-se iniciada na data da assinatura, pelo sujeito passivo, da ordem de serviço ou despacho que determinou a necessidade de inspecção, documento esse que lhe deverá ser notificado no inicio físico do procedimento, conforme dispõe o artigo 51º do RCPIT, e terminará com a notificação do encerramento dos procedimentos e com a posterior emissão de um relatório final (61º e 62 do RCPIT).
O procedimento de inspecção externa é objecto de regras legalmente previstas, que o limitam, conferindo ao sujeito passivo visado pelos actos de inspecção um catálogo de direitos substantivos, ou de garantias mínimas.
7.
Contudo tais direitos e garantias não podem confinar-se ao catálogo que se encontra expressamente plasmado no RCPIT, impondo-se tal alargamento pelo conjunto de legislação fiscal e pela aplicação dos princípios gerais a que está sujeita a actividade administrativa, tal como, aliás, tem vindo a ser salientado pela jurisprudência dos tribunais superiores.
Entre as diferenças que podem ser apontadas entre estes dois tipos de procedimento de inspecção tributária, afigura-se que uma das mais relevantes, é a suspensão do prazo de caducidade do direito á liquidação durante o desenrolar dos actos de inspecção externa, bastando para tanto que o sujeito passivo seja notificado do início do procedimento (vide artigo 46º n.º 1º da LGT), suspensão essa, que não se verifica nos casos de inspecção interna.
8.
Daí que importa procurar traçar a fronteira entre estes dois tipos de procedimento de inspecção, posto que se entende, como se procurará demonstrar, que o procedimento á aqui Impugnante, formalmente qualificado como externo, se revela, em substância, como interno.
9.
Da análise do relatório (página 9) sob o ponto 4. “ Acção inspectiva ao sujeito passivo O. Lda.” constata-se que os Serviços de Inspecção Tributária se deslocaram á sede da Impugnante para “confirmar os elementos que já nos tinham sido remetidos anteriormente”.
Note-se que, anteriormente, os Serviços de Inspecção Tributária já tinham analisado esses esmos documentos, já lhe tinham sido exibidos, sobre eles já tinha firmado opinião e até emitido um juízo de valor, aquando da inspecção externa ao contribuinte N. Lda. (veja-se a este respeito o que consta do relatório a páginas 4 a 9 sob os pontos “2.1.2. Notificação para exibição de escrita e/ou documentos fiscalmente relevantes” [s.n.], “3. Circulação de clientes”, “a) Facturas”, “b) Meios de pagamento” e “c) Contratos / autos de medição / Orçamentos”)
10.
A questão que necessariamente tem que se colocar é a de que, se este acto de inspecção inócuo, sem substrato material, mas porque realizado na sede da empresa, pode por si só qualificar todo o procedimento como um procedimento de inspecção externa. [?] Sem que para tanto nesse acto se tenha feito verdadeira e efectiva recolha de informação [?]
11.
Lido e relido o relatório no referido ponto 4. “Acção inspectiva ao sujeito passivo O. Lda.” consta-se que apenas a referência a dois actos de inspecção. O primeiro a referida deslocação á sede da empresa, Impugnante, e o segundo acto de inspecção, a solicitação de cópia de frente e verso de cheques á Caixa Geral de depósitos e ao Millenium BCP.
12.
Contudo apenas, e salvo melhor opinião, apenas existe um acto material de inspecção (a solicitação e respectiva recolha da cópia dos cheques), pois que no entender da Impugnante, a deslocação á sede é um acto tao só formal, desprovido de conteúdo material porque isento de objectivação em recolha de informação tenha feito verdadeira e efectiva
Além do referido acto material de solicitação e recolha das cópias frente e verso dos cheques nenhum outro acto de inspecção é praticado durante toda a inspecção externa.
A análise formal e de coerência destes documentos (cópia dos cheques) foi realizada exclusivamente nos Serviços da Administração Fiscal.
Ora, o procedimento nos termos do artigo 13º alínea a) do RCPIT é classificável como interno sempre que os actos tenham lugar exclusivamente nos serviços da AF.
13.
Pelo que o presente procedimento há-de ser qualificado como procedimento de inspecção interno.

DO VICIO DE PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES ESSENCIAIS NO ÂMBITO DO PROCEDIMENTO INSPECTIVO, CONSUBSTANCIADAS NA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, DA ADEQUAÇÃO, DA COOPERAÇÃO, DOS PRINCÍPIOS DO INQUISITÓRIO, DA VERDADE MATERIAL, DA LEGALIDADE DA ACTUAÇÃO ADMINISTRATIVA E DA IMPARCIALIDADE, PREVISTOS NOS ARTIGOS 7º, 9º N.º 1, 29º N.º 1 AL. A), E NA FORMALIDADE E PROCEDIMENTO DA RECOLHA DE ELEMENTOS 55º , 56º TODOS DO RCPIT, 58º e 63º da LGT e 266ª da CONSTITUIÇÃO.
14.
Os Serviços de inspecção na deslocação ante referida á sede da Impugnante qualificam o procedimento de inspecção como externo com base na deslocação á sede da empresa.
15.
Contudo, na datam o referido acto de inspecção.
Não cumprem o estipulado nos artigos 55º e 56º do RCPIT quanto á formalidade e procedimento da recolha de elementos. Não fazem menção ou identificação cabal dos documentos. Não referem nem transcrevem declarações, nem procedem á identificação de pessoas e respectivas funções. Não tiram cópias, não imprimem extractos. Limitam-se a dar conta de que já dispõem de toda essa informação e documentação. E não o fazem, porque efectivamente não faz sentido analisar informação que já foi analisada, confirmada e testada.
16.
Tal acto de inspecção visou tão só ser utilizado como modo de qualificar a inspecção como externa, e desse modo prolongar, temporal e artificialmente, o direito á liquidação e cobrança de imposto.
Daí que não possa ser aceitável que a suspensão prevista no artigo 46º da LGT do prazo de caducidade do direito á liquidação dos tributos, possa ter-se como efeito automático da mera abertura do procedimento inspectivo externo, nomeadamente quando não sejam praticados quaisquer actos materiais de inspecção externa.
17.
A AT ao considerar o procedimento de inspecção aqui em crise como externo violou os princípios da proporcionalidade e da adequação.
18.
A única informação que a inspecção tributária procurava era a cópia dos cheques que serviram de meio de pagamento. Os restantes cheques bem como a restante informação já estava na posse da AF, aquando da inspecção interna e externa à contribuinte N. Lda., conforme resulta do relatório.
Para obter tal desidrato (recolha da cópia da frente e verso dos cheques) é desproporcional e desadequado o recurso á inspecção externa. Trata-se de elementos cuja análise pode ser feita nos serviços da AT.
19.
O artigo 63º da LGT impõe limites à actuação administrativa no âmbito da inspecção tributária, mormente o seu n.º 3, posto que ali estabelece que “ o procedimento de inspecção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir”.
No mesmo sentido se reporta o artigo 7º do RCPIT que dispõe que “as acções integradas no procedimento de inspecção tributária devem ser adequadas e proporcionais aos objectivos de inspecção tributária”.
20.
Incide expressamente sobre as inspecções tributárias o princípio da cooperação (artigo 9º n.º 1 do RCPIT) segundo o qual “a inspecção tributária e os sujeitos passivos ou demais obrigados tributários estão sujeitos a um dever mútuo de cooperação”
Tos estes princípios, conjugados ainda com o principio da verdade material (artigo 6º do RCPIT) e da imparcialidade (constante no n.º 2 do artigo 266 da CRP) impõem que o procedimento seja considerado como procedimento de inspecção interna.

21.
Serão, assim, e salvo melhor entendimento, actos materiais de inspecção aqueles que se traduzam em verdadeiras e efectivas recolhas de informação e análise, verificação e comprovação de elementos, só podendo designar-se uma inspecção como externa quando tais condutas sejam praticadas fora das instalações da AT.
Sob pena de os formalismos prevalecerem indevidamente sobre a substância dos actos.
Nem tao pouco sujeitar-se à margem de livre apreciação ou à discricionariedade técnica da AF a questão de saber se, de facto, determinada inspecção é materialmente externa ou interna.

DA CADUCIDADE
22.
Daí que, caso seja o entendimento do Tribunal, que o procedimento inspectivo em causa não é materialmente externo, e por essa via classificável como interno, por outro lado, nos termos do artº 46º, nº 1, da LGT, tal prazo suspende-se durante o decurso de acto inspectivo externo, desde que o mesmo não ultrapasse o prazo de 6 meses, o qual resulta da determinação, constante do artº 36º, nº 2, do RCPIT.
23.
Determina o artº 45º da LGT que o direito de liquidar tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte o prazo de quatro anos.
Os prazos de caducidade contam-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.
24.
Ou seja, relativamente ao IRC de 2005 o prazo de caducidade conta-se a partir de 31 de Dezembro de 2005.
Não existindo suspensão ou interrupção do prazo de caducidade esta operou em 31 de Dezembro de 2009
25.
No que respeita ao direito de liquidar o IVA termina decorridos que sejam 4 anos sobre o termo do ano em que se verificou o facto tributário.
26.
Não existindo suspensão ou interrupção do prazo de caducidade esta operou em 31 de Dezembro de 2009
27.
A liquidação reclamada, enviada por via postal simples, foi efectuada na data de 2010/06/01. (cfr doc n.º 17)

Sem prescindir,
Caso não seja esse o douto entendimento, sempre se dirá que,

DA ELISÃO DA PRESUNÇÃO
28.
O relatório final (cfr doc. n.º 2) foi notificado, em obediência ao disposto no artº 62º do RCPIT, através de carta registada, cujo registo foi efectuado em 20010/05/25, e recebida a 2010/06/04 (cfr doc. n.º 15, conforme consta do sítio da internet do CTT).
29.
Considerando o direito, que decorre do nº 2 do artº 39º do CPPT, a ilidir esta presunção, (cfr. Doc. n.º 16), o reclamante apresentou, em 2010/08/19, o competente requerimento, de cuja resposta se apresentou Recurso hierárquico o qual veio a ser indeferido com o fundamento de que que tal ato em questão não é passível de se caracterizar como um ato destacável pelo que não é directamente recorrível. Vindo a considerar a final que atento o princípio da impugnação unitária (art.º 54º do CPPT) deverá ser em sede de impugnação. Ónus que deu cumprimento na presente impugnação.
30.
Pelo que, atento aquele princípio da impugnação unitária (art.º 54º do CPPT) e ao abrigo do n.º 2 do artº 39º do CPPT, REQUEREU, a este Tribunal que junto dos CTT se obtenha informação sobre a data efectiva da recepção (n.º de objecto RM592328181PT) ou a dispensa desta formalidade atendendo a que já se encontra junto aos autos comprovativo obtido junto da página da internet dos CTT, aqui junto sob o n.º 15 do qual consta como data efectiva de recepção a data de 2010/06/04.
31.
Referimo-nos, como é óbvio, à questão da data em que o relatório definitivo da inspecção externa se deve considerar validamente notificado, para que se conheça se se verifica a causa de suspensão do prazo de caducidade prevista no nº 1 do artº 46º da LGT, isto é, conhecer se a acção de inspecção não ultrapassou o prazo de 6 meses.
32.
No projecto de decisão da reclamação graciosa defende-se que a data da conclusão do procedimento de inspecção ocorreu em 28/05/2010, data correspondente ao 3º dia útil posterior ao do registo da notificação.
33.
Mais se entendendo que a data em que o reclamante recepcionou efectivamente tal notificação, 04/06/2010, não releva pelo facto do reclamante não ter comprovado, junto da AF que não lhe era imputável a responsabilidade por ter recebido a notificação em data posterior à presumida.
34.
A AF pretendeu que a presunção de notificação funcione em termos absolutos, pois, perante a evidência de predisposição para validar todos os actos tributários reclamados, ora, nunca os contribuintes teriam argumentos suficientes para demonstrar a sua ausência de culpa, escudam a sua posição no Acórdão do TCA (Sul), processo 07534/02, de 27/04/2004.
35.
A aqui Impugnante forçou a necessidade de pronúncia sobre decisão adoptada pela Administração Tributária em recurso hierárquico de outro contribuinte, a qual, possuindo contornos em tudo idênticos ao objecto da reclamação graciosa que importava decidir, foi resolvida considerando, sem mais, que o contribuinte estava validamente notificado na data da recepção efectiva e não na data presumida. (cfr doc n.º 16);
Citamos a posição constante do Acórdão do STA, de 02/03/2011 em que, sem deixar qualquer margem para dúvidas, se conclui pela desnecessidade de apresentar qualquer tipo de prova de que a notificação não foi conseguida em tempo oportuno por facto não imputável ao contribuinte.
E, assim sendo, afasta de todo a presunção que decorre do nº 1 do artº 39º do CPPT, para considerar que o contribuinte só está validamente notificado na data da recepção definitiva da notificação.
36.
O que, aplicado ao caso controverso, resulta que a notificação do relatório definitivo de inspecção só foi conseguida em 04/06/2010.
DA CADUCIDADE
37.
Determina o artº 45º da LGT que o direito de liquidar tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos.
38.
Os prazos de caducidade contam-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.
Ou seja, relativamente ao IRC de 2005 o prazo de caducidade conta-se a partir de 31 de Dezembro de 2005.
Não existindo suspensão ou interrupção do prazo de caducidade esta operava em 31 de Dezembro de 2009
39.
No que respeita ao direito de liquidar o IVA termina decorridos que sejam 4 anos sobre o termo do ano em que se verificou o facto tributário.
40.
Não existindo suspensão ou interrupção do prazo de caducidade esta operava em 31 de Dezembro de 2009
41.
Por outro lado, nos termos do artº 46º, nº 1, da LGT, tal prazo suspende-se durante o decurso de acto inspectivo externo, desde que o mesmo não ultrapasse o prazo de 6 meses, o qual resulta da determinação, constante do artº 36º, nº 2, do RCPIT.
42.
Assim sendo, importará determinar quando ocorrem os dois momentos relevantes para conhecer o período em que ocorre a suspensão naqueles termos para se poder proceder à análise da situação controvertida.
43.
O início da suspensão dá-se com a notificação aos sujeitos passivos, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho que determina a execução da acção externa.
44.
Ao referir que tal notificação deverá ser efectuada nos termos legais, o legislador remete-nos para o já mencionado RCPIT, diploma que, em obediência à previsão do artº 54º, nº 5, da LGT, regulamenta o procedimento de inspecção.
Aí se refere, artº 51º, nº 1, que no início do procedimento de inspecção será entregue cópia da credencial, ordem de serviço ou despacho.
45.
Mais estabelece aquele diploma, artº 36º, nº 2, que o procedimento é contínuo.
46.
Ou seja, todos os actos de inspecção dirigidos à investigação dos factos relevantes para o apuramento da situação tributária do mesmo imposto e período, terão que ser desenvolvidos de modo seguido, devendo todos eles ficar compreendidos dentro do prazo de 6 meses que se encontra consignado naquele mesmo preceito legal.
O que equivale a dizer que a Administração Fiscal deverá abster-se de práticas artificiosas que conduzam ao alargamento do prazo de 6 meses para desenvolver o procedimento de inspecção.
Dito de outro modo, não pode a Administração Fiscal ir desenvolvendo actos de inspecção dirigidos ao conhecimento da realidade tributária dos contribuintes, procedendo à formalização do início do procedimento de inspecção mais tarde e quando considera que já não ocorre perigo de, para desenvolver os restantes actos de inspecção, vir a ultrapassar o prazo de 6 meses.
47.
Temos, então, que o início do procedimento de inspecção ocorre: na data da assinatura da credencial pelo sujeito passivo: na data do primeiro acto de inspecção, caso este anteceda a referida assinatura formal da credencial.
48.
No que respeita à conclusão da inspecção externa, expressão que consta do citado artº 46º, nº 1, da LGT e que disciplina a suspensão da caducidade, somos levados a constatar que o RCPIT refere a conclusão de duas realidades diferentes: - o artº 61º reporta-se à conclusão dos actos de inspecção, para referir que os mesmos se consideram concluídos na data da notificação da nota de diligência; o artº 62º explicita quando se considera concluído o procedimento de inspecção, definindo que tal sucede com a notificação do relatório final.
49.
Tal como foi referido, a empresa foi submetida a procedimento de inspecção, subordinado às credenciais OI200905437 e OI200905438.
O início do procedimento de inspecção foi formalizado por notificação pessoal em 2009/11/30.
A notificação do relatório definitivo de inspecção, ditando o fim do procedimento de inspecção ocorreu em 2010/06/04
50.
Assim sendo, o prazo de 6 meses para concluir o procedimento de inspecção teria expirado em 2010/05/30, estando, pois, prejudicada qualquer suspensão do prazo de caducidade por aplicação da disciplina do artº 46º da LGT, o que implica que a caducidade, nos termos do artº 45º do mesmo diploma, ocorreu em 2009/12/31.

Subsidiariamente e sem prescindir,
Caso não seja esse o douto entendimento, sempre se dirá que,

DA DUPLICIDADE DE INSPECÇÕES EXTERNAS E DO PRAZO DE RECURSO DA INSPECÇÃO EXTERNA Á IMPUGANTE
DA CREDENCIAL OI200905437
52.
Os elementos que sustentam a liquidação ora recorrida foram apurados em acção de inspecção desenvolvida ao abrigo das credenciais OI200905437 e OI200905438.
O início do procedimento de inspecção foi formalizado por notificação pessoal em 2009/11/30. Em violação do 63º, nº 3, da LGT como adiante se procurará demonstrar.
A nota de diligência, a dar por concluídos os actos de inspecção, nos termos do artº 61º do RCPIT, foi notificada por carta registada (oficio n.º 30080) em 2010/05/06.
O relatório final foi notificado, em obediência ao disposto no artº 62º do RCPIT, através de carta registada, cujo registo foi efectuado em 20010/05/25.

DAS CREDENCIAIS OI200901907 E OI200902219
53.
Se o início do procedimento de inspecção, desenvolvido ao abrigo da credencial OI200905437, foi formalizado por notificação pessoal em 2009/11/30.
O certo é que, já antes, como muito bem se expressa a págs. 5/17 do Relatório de Inspecção Tributária, através de carta registada datada de 2009/04/27, remetida pelo mesmo técnico dos Serviços de Inspecção Tributária (SIT) que veio a concretizar a acção de inspecção autorizada pelas mencionadas credenciais, haviam sido solicitados documentos contabilísticos e extracontabilísticos relativos ao fornecedor N….Lda., designadamente: extractos de contas-correntes e fotocópias das facturas emitidas por aquele; cópias de contratos, autos de medição, orçamentos e quaisquer outros documentos que permitissem comprovar a efectiva prestação de serviços; identificação precisa das obras, tipo específico de serviços executados e respectivas datas; cópia dos comprovativos de pagamento; identificação dos trabalhadores ao serviço do fornecedor.
54.
Tenha-se em consideração que tal pedido já havia sido precedido de um outro, embora com menos desenvolvimento datado de 2009/04/08;
Solicitação que, após insistências, face à morosidade da recolha dos elementos pedidos, do referido técnico dos SIT, veio a merecer resposta, por parte do reclamante, em 2009/07/17, por documento entregue na Direcção de Finanças do Porto (anexo junto em sede de reclamação graciosa)
A análise deste pelo técnico dos SIT motivou diversos contactos e a solicitação de elementos adicionais.
Daí, terem sido enviados sucessivos documentos complementares, antecedendo a data em que foi formalizado o início da acção de inspecção (anexos juntos em sede de reclamação graciosa)
55.
Por outro lado, «dos elementos juntos ao processo e em conformidade que foram retirados do sistema informático da DGCI (fls. 174-176) a sociedade comercial “N. Lda.”, NIPC (...), foi sujeita a dois procedimentos de inspecção, um de âmbito interno (OI200901907 – acções de controlo de sujeitos passivos não declarantes) e outro de âmbito externo (OI200902219 – determinado pelo Director de Finanças) na sequência dos quais a reclamante foi solicitada enquanto presumida cliente da inspeccionada, a apresentar documentos das relações económicas mantidas com aquela sociedade comercial. Estas solicitações tiveram lugar, não enquanto sujeito passivo inspeccionado, mas enquanto agente económico, ao abrigo do dever de cooperação pautado no artigo 9º do RCIPT, corolário do princípio geral da colaboração do artigo 59º da LGT.» cfr fls 70/100 do douto parecer constante do projecto de decisão cujos termos e fundamentos aderiu sem reservas o despacho final que indeferiu a reclamação graciosa.
56.
Ora, aqui, salvo devido respeito parece, labora em erro a AF. Pois que se tratou de uma verdadeira inspecção externa á aqui Reclamante.
57.
E isto por duas ordens de razão. A primeira, pelo lapso de considerar que a aqui reclamante estava obrigada ao dever de cooperação na veste de agente económico. Posição tida pela AF em sede de apreciação e indeferimento da Reclamação Graciosa de IRC 2006. Ora, o dever de cooperação está pautado nos precisos termos e nos precisos limites nos citados artigos do parecer (constante referente á reclamação Graciosa de IRC 2006) aos quais se acrescenta o art.º 48º do CPPT que adiante se transcrevem e dos quais a figura de agente económico não consta como obrigado a qualquer dever de cooperação. Assim nunca na qualidade de agente económico cooperaria a Recorrente. Quem está obrigado a cooperar são os contribuintes os sujeitos passivos e com dever especial de cooperação estão os elencados no n.º 2 do art.º 9º do RCPIT.
58.
Com os demais interessados é que impende sobre a AF um dever de cooperação, não destes sobre aquela. A lei é absolutamente clara e inequívoca. Os contribuintes estão obrigados pelo dever de cooperação a prestar esclarecimentos que mantenham designadamente com terceiros, mas os terceiros não têm qualquer dever de cooperação com a AF a não ser que sejam sujeitos passivos ou contribuintes.
Artigo 59º LGT Princípio da colaboração (Redacção pela Lei nº 64-A/2008, de 31-12)
1 - Os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco.
2 - Presume-se a boa fé da actuação dos contribuintes e da administração tributária.
3 - A colaboração da administração tributária com os contribuintes compreende, designadamente:
a) A informação pública, regular e sistemática sobre os seus direitos e obrigações;
b) A publicação, no prazo de 30 dias, das orientações genéricas sobre a interpretação e aplicação das normas tributárias;
c) A assistência necessária ao cumprimento dos deveres acessórios;
d) A notificação do sujeito passivo ou demais interessados para esclarecimento das dúvidas sobre as suas declarações ou documentos;
e) A prestação de informações vinculativas, nos termos da lei;
f) O esclarecimento regular e atempado das fundadas dúvidas sobre a interpretação e aplicação das normas tributárias;
g) O acesso, a título pessoal ou mediante representante, aos seus processos individuais ou, nos termos da lei, àqueles em que tenham interesse directo, pessoal e legítimo;
h) A criação, por lei, em casos justificados, de regimes simplificados de tributação e a limitação das obrigações acessórias às necessárias ao apuramento da situação tributária dos sujeitos passivos;
i) A publicação, nos termos da lei, dos benefícios ou outras vantagens fiscais salvo quando a sua concessão não comporte qualquer margem de livre apreciação da administração tributária;
j) O direito ao conhecimento pelos contribuintes da identidade dos funcionários responsáveis pela direcção dos procedimentos que lhes respeitem;
l) A comunicação antecipada do início da inspecção da escrita, com a indicação do seu âmbito e extensão e dos direitos e deveres que assistem ao sujeito passivo.
4 - A colaboração dos contribuintes com a administração tributária compreende o cumprimento das obrigações acessórias previstas na lei e a prestação dos esclarecimentos que esta lhes solicitar sobre a sua situação tributária, bem como sobre as relações económicas que mantenham com terceiros.
5 - A publicação dos elementos referidos nas alíneas a), b), e), f) e i) do n.º 3 é promovida por meios electrónicos.
6 - A administração tributária disponibiliza a versão electrónica dos códigos e demais legislação tributária actualizada.
Artigo 9.º RGIT
Princípio da cooperação
1 - A inspecção tributária e os sujeitos passivos ou demais obrigados tributários estão sujeitos a um dever mútuo de cooperação.
2 - Em especial, estão sujeitos a um dever de cooperação com a inspecção tributária os serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais, as associações públicas, as empresas públicas ou de capital exclusivamente público, as instituições particulares de solidariedade social e as pessoas colectivas de utilidade pública.
Artigo 48º CPPT
Cooperação da administração tributária e do contribuinte
1 – A administração tributária esclarecerá os contribuintes e outros obrigados tributários sobre a necessidade de apresentação de declarações, reclamações e petições e a prática de quaisquer outros actos necessários ao exercício dos seus direitos, incluindo a correcção dos erros ou omissões manifestas que se observem.
2 – O contribuinte cooperará de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso.
59.
Pela segunda razão, e se duvidas existissem, poder-se-ia dizer que a situação tributária do sujeito passivo aqui Recorrente teria sido apurada numa inspecção dirigida a terceiros com que a “N., Lda.”, NIPC (...), foi alvo e com quem mantinha relações económicas. Mas não foi esse o caso, nos termos da parte final do n.º 3 artigo 63º LGT. O apuramento da situação tributária da Recorrente não resultou apenas da inspecção dirigida á “N., Lda.”, mas antes da colaboração numa inspecção camuflada á Recorrente. Até porque OI 200901907 referente á inspecção interna da “N., Lda.” era acções de controlo de sujeitos passivos não declarantes. Aquele sujeito passivo não declarava afinal nada. Como seria possível chegar á Recorrente se a inspecção não se iniciasse na Recorrente, esta sim, declarante e na contabilidade da qual constavam as facturas daquela relapsa.
60.
Aquela até não apresentou documentos contabilísticos, não os tinha. Relapsa incumpridora, esta sim, e não a aqui Reclamante, que vê o comportamento daquela sancionado em sede alheia. Ou seja a AF sanciona a aqui Recorrente pelo comportamento tido por um outro contribuinte.
O gerente da “N., Lda.” sempre negou que tivesse contactos comerciais com a aqui Recorrente.
61.
Por questão de lógica, tão só pela fiscalização (diga-se externa e camuflada) á Recorrente.
62.
E cuja notificação do início do procedimento de inspecção não foi produzida com respeito pelos mais elementares requisitos legais, como se passará a demonstrar.
63.
Nos termos do n.º 3 do art.º 2 da RCPIT o procedimento pode abranger em simultâneo os sujeitos passivos que presumidamente tenham colaborado nas infracções fiscais a investigar. O procedimento de âmbito externo OI200902219 abrangeu a aqui Recorrente e a “N., Lda.”. Contudo o n.º 4 do referenciado artigo impõe que as entidades gozem dos mesmos direitos o que não se verificou relativamente á aqui Recorrente.
64.
E ainda que a acção de inspecção á aqui Recorrente tivesse por objectivo um dos elencados no n.º 4º do art.º 46º do RCPIT nos termos do n.º 5 do mencionado artigo sempre o despacho que determina a ordem daquele acto deveria referir os seus objectivos e a entidade a inspeccionar, bem como sempre seria necessário que por parte do funcionário fosse entregue nota de diligencia com a indicação da tarefa executada nos termos do n.º 7 do referenciado artigo.
65.
Dispõe o nº 3 do artº 63º da LGT que “… só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.”
66.
Ora, os actos de inspecção desenvolvidos ao abrigo das credenciais externas OI200905437 e OI200905438, já haviam assim estado envolvidas na matéria ante exposta.
67.
Desta forma, com a abertura do procedimento externo determinado pelas mesmas credenciais os SIT desenvolveram um segundo procedimento externo em clara violação pelo disposto no artº 63º, nº 3, da LGT, porquanto não se verifica nenhuma das circunstâncias de excepção da sua aplicação, nem foi o mesmo autorizado por decisão do dirigente máximo do serviço.
A este respeito (cfr. LGT Anotada – António Lima Guerreiro em comentário ao referenciado n.º 3 do art.º 63º) a acção fiscalizadora de âmbito externo é irrepetível, a não ser nos casos ali salvaguardados ou sejam: [1] “A existência de factos a cujo acesso a inspecção tributária não dispunha no momento da realização da acção, por não constarem da documentação posta á sua disposição pelo sujeito passivo ou dos arquivos da administração tributária”. Isto é a AF nunca teria acesso através da contabilidade da “N., Lda.” em sede de inspecção externa a esse contribuinte, porque este nada declarava, também não acederiam a qualquer informação da Recorrente pois o gerente dessa empresa sempre afirmou que não tinha os documentos contabilísticos. Não existiu decisão Fundamentada do Director Geral dos Impostos. O acesso aos cheques, facturas, fotografias de obras, só poderiam chegar ao acesso da AF mediante inspecção externa á aqui Recorrente. Quando a AF diz que o início do procedimento de inspecção externa foi formalizado por notificação pessoal em 2009/11/30 ao abrigo das credenciais OI200905437 e OI200905438 já dispunha de todos os elementos da Recorrente a que só poderia aceder mediante inspecção externa. [2] Quando se destine á confirmação dos pressupostos de direito que o contribuinte invoque perante a administração tributária (por exemplo a invocação de um beneficio fiscal), ou ainda [3] Quando for dirigida contra os responsáveis solidários ou subsidiários que não tenham sido investigados na primeira acção.
68.
Dos elementos constantes dos autos, designadamente dos documentos que constituem a vidência do trabalho desenvolvido no procedimento de inspecção, nenhum dos pressupostos que legitimam a repetição de uma inspecção se verificam no presente caso. Na origem de liquidação de IRC projectadas nas credenciais OI200905437 e OI200905438 encontram-se correcções obtidas em duplicação de inspecção externa.

DA CREDENCIAL OI2010003712
69.
Por douta decisão em sede de apreciação de reclamação graciosa contra liquidação de IRS 2010 6410000603 na qual o imposto ali reclamado bem como a sua exigibilidade foram detectadas no âmbito do procedimento de inspecção efectuado a coberto das OI200905437 e OI200905 foi dado provimento á anulação de tal liquidação e respectivos juros compensatórios. Tendo a reclamante invocado a ilegalidade daquele procedimento externo por, além do mais, contrariar o disposto no n.º 3 do art.º 63º da LGT. Invocou em audição a coberto das OI200905437 e OI200905 a falta de notificação do alargamento da acção. Ainda hoje aguarda notificação do alargamento. Sendo que, como tem conhecimento que existiu alargamento aguarda o término daquela inspecção, que sempre ocorrerá em prazo posterior ao legal de seis meses, com as inerentes consequências legais das liquidações já notificadas ao abrigo da mencionada inspecção a coberto das OI200905437 e OI200905.

DO VÍCIO DE PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES ESSENCIAIS NO ÂMBITO DO PROCEDIMENTO INSPECTIVO, CONSUBSTANCIADO NA VIOLAÇÃO DO DIREITO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA, PREVISTO NOS ARTIGOS 60º DO RCPIT E 60º DA LGT

DO VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO, NO PLANO FORMAL, POR NÃO CONSTAREM EXPRESSAMENTE DO RELATÓRIO, OS INDÍCIOS APRESENTADOS COMO FUNDAMENTO DAS LIQUIDAÇÕES ORA EM CRISE, E POR NÃO SEREM SUFICIENTES PARA SUPORTAR UM JUÍZO DE FALSIDADE QUANTO ÀS FACTURAS EMITIDAS PELA SUB-EMPREITEIRA DA IMPUGNANTE.

DO VÍCIO DE PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES ESSENCIAIS NO ÂMBITO DO PROCEDIMENTO INSPECTIVO, CONSUBSTANCIADAS NA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO INQUISITÓRIO E DA VERDADE MATERIAL, PREVISTOS NOS ARTIGOS 58º DA LGT E 6º DO RCPIT.

DO VICIO DE VIOLAÇÃO DE LEI, POR A ACTUAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EVIDENCIAR ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO E DE DIREITO, E POSTO QUE AS TRANSACÇÕES TITULADAS PELAS FACTURAS DESCONSIDERADAS PELA AT TITULAREM OPERAÇÕES MATERIAIS REAIS.
70.
Consta do relatório, em síntese conclusiva, que as facturas emitidas à empresa aqui reclamante não traduzem operações comerciais, por serem operações inexistentes ou realizadas por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das operações subjacentes.
71.
Ora, a contradição da conclusão fundamental é demais notória e insanável. Ou as operações são inexistentes, isto é, não existiram, ou se tiveram valores diferentes é porque existiram. Ou pode ser uma coisa ou outra. Simultâneas são simplesmente contraditórias. Depois se tiveram valores diferentes, desses valores nada se sabe. Que valores existiram então? Mas se tiveram valores diferentes porque não foi colocado em causa que foram feitas por valores diferentes do mercado? A reclamante facultou os valores unitários a fim de averiguar tal desiderato.
Tal contradição intrínseca no relatório radica na factualidade pura e simples de a administração se ter recusado a ponderar a hipótese de existirem a operar, ainda hoje no mercado, agentes económicos à margem de toda e qualquer legalidade. Emitem facturas, mas não cumprem com qualquer obrigação fiscal quer declarativa quer contributiva. Têm equipamento, mas que não consta no mobilizado. Têm funcionários que não estão inscritos na segurança social. Mas será por isso que não têm capacidade produtiva?
72.
Certo é que as obras foram feitas. Certo é que a Reclamante não tinha capacidade para as fazer na parte em que subcontratou. Certo é que em ponto nenhum do relatório se colocam em causa que foram feitas pelo valor do mercado.
73.
Da inspecção levada a cabo pela Administração Fiscal resulta ausência de esforço tendente à demonstração da prova da não realização dos serviços constantes das facturas;
A administração Fiscal não logrou sequer alegar qualquer manifestação de animus nocendi, de animus defraudandis, ou de comportamento extra legem;
Não coloca em causa, nem da fundamentação da Administração Fiscal, é possível extrair uma conclusão pela ausência de materialidade económica das operações plasmadas nas facturas em causa;
74.
A administração fiscal violou o princípio do Inquisitório e o da verdade material;
75.
A administração fiscal ignorou o facto de existirem subempreiteiros de construção civil que operam à margem da legalidade, designadamente a preconizada N., confundindo contribuintes faltosos com contribuintes defraudadores do fisco, em hipotética passagem de papel falso;
Ignorou a administração Fiscal a “capacidade produtiva instalada” da aqui reclamante. Bastaria a confirmação das obras de construção civil tituladas pelas facturas passadas por N…, Lda.. Era absolutamente necessário trabalho de campo. Facilmente se concluiria que o volume de negócios declarado, não teria sido possível, senão, com concurso de mão-de-obra externa.
Quer a simples inquirição dos operários assalariados afectos à N. Lda., quer a inquirição de funcionários da Reclamante quer a inquirição dos Donos de Obras, bem como os procedimentos qualificados de rotina da administração Fiscal, facilmente permitiria aferir da participação directa e activa desta firma naquelas obras na realização desses trabalhos em regime de subempreitada;
Essencial era também a inquirição do contabilista, funcionários e legal representante da aqui Impugnante. Basta atentar para as duas inspecções que constam do relatório final para se ver que no caso do procedimento da N. Lda. os SIT inquiriram contabilista, gerente de facto. Na inspecção externa à aqui Impugnante o único acto material de inspecção foi a recolha de cópias de cheques. (da fundamentação do Tribunal consta a referencia á inquirição da contabilista da impugnante mas terá sido pro lapso de escrita pretendendo referir-se á contabilista da N. Lda.)
76.
Pois bem, discorrida a factologia dos acontecimentos, conformadora do alegado cometimento do delito de falsidade ideológica, consistente na utilização de facturas desprovidas de substrato económico, é convicção abalizada da Reclamante, de que o acto tributário aqui pleiteado, se apresenta inquinado do vício de falta de fundamentação, sancionador da sua anulabilidade, por sua recondução à figura do vício de forma, ou preterição de formalidades legais.
77.
A Inspecção Tributária, quando muito, circunscreveu a sua actuação instrutória, à junção do maior número de dados oficiais comprobatórios da deformação do perfil comportamental de N., Lda.., em matérias tributárias e contributivas, tendo-se, pois, concentrado no historial extravasado pela base de dados da DGCI e dos resultados que advieram das acções de fiscalização, que sobre os clientes daquela empresa, se empreenderam.
78.
Efectivamente, da prudente leitura do Relatório, deduz-se com toda a objectividade, que a acusação da utilização de facturas desprovidas de substrato económico, se reconduz, como supra adiantado, à formulação de um juízo de censura contra o comportamento lesivo prosseguido por N., Lda.., em face do seu historial fiscal. Apenas e tão só, isto.
É à Administração Fiscal que está legalmente cometida a competência para prevenir, controlar e reprimir tais comportamentos desviantes.
79.
O princípio da Verdade Material, ou do Inquisitório, demandava, in casu, uma actividade de ampliação da prova, agora direccionada à confirmação (ou eventual infirmação) das obras de construção civil tituladas pelas facturas passadas por N., Lda..
80.
É que o ónus da prova dos actos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca (no caso, inequivocamente, o ónus da prova recai sobre a Administração Tributária) — art.74º, n° 1 da LGT.
81.
No caso aqui decidendo constata-se com a toda a transparência e objectividade, a inexistência da prova requerida, pelo que à Administração Fiscal não lhe restava outra solução jurídica senão abster-se de praticar os actos, mais concretamente os de ordenar a extracção da liquidação adicional de IVA e do IRC.
82.
A ausência de prova bastante faz inquinar o acto tributário ora contraditado, de vício de forma por violação do dever expresso de fundamentação.
Conforme pronúncia tirada do Processo nº 00925/03 de 11/10/2005, do Tribunal Central Administrativo do Sul, no que à arguição da falta de prova respeita, foi assim proferido: O não cumprimento de obrigações fiscais por parte dos emitentes e pagamentos em dinheiro, não chegam, como indícios, para implicar o impugnante num acordo simulatório com vista a ludibriar o fisco. Em obediência ao princípio da legalidade, que tem como consequência o princípio da verdade material, a AF só deverá proceder à liquidação adicional se, no exercício dos poderes que lhe competem de controlo da veracidade dos elementos declarados, conclui seguramente, com base nos factos - índice que apurou, que às facturas em causa não correspondem serviços realmente prestados.
Outrossim, convirá trazer à colação o que doutamente entendeu o Tribunal Central Administrativo Sul, em 16/12/2004, no Recurso nº 272/04, condensado nos seguintes termos: Se os únicos indícios, em que a inspecção se baseou para concluir que tais facturas eram falsas, consistiram nas circunstâncias de aquele fornecedor estar indiciado como emitente de facturas falsas e de não entregar as declarações de IVA, então tais indícios, pecam por insuficientes para suportar a conclusão retirada pela administração. (Em idêntico sentido, veja-se Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul 03045/99 12/04/2005).
83.
Atente-se ainda, e por outro lado, a que percorrendo detalhadamente o corpo do Relatório da acção de inspectiva, constata-se que a Inspecção Tributária, escudou-se em termos de fundamentação fáctica, na consubstanciada hipotética arguição de falsidade das operações tituladas pelas facturas processadas pela sociedade N., Lda., NIPC (...), relacionadas a folhas 6/15 de Projecto e que se dão aqui por reproduzidas.
84.
Para tanto, coligiu, a título de “factos índice” fundamentadores da decisão de destituir de relevância fiscal, para efeitos de IVA e do IRC, das facturas antes citadas, os de seguida, e em síntese, elencados: a) As facturas, não descrevem o tipo específico dos serviços prestados, nem as quantidades (área ou horas), pelo que a impugnante incumpriu o disposto no art. 36º/5 alínea b) (antes 35º) do CIVA, com o consequente comprometimento da dedução do IVA, nos termos do art. 19º; b) As facturas não indicam a data/período em que os serviços terão sido prestados, nem a obra em causa; c) São preenchidas manualmente; d) A Identidade da caligrafia, o que permite concluir que terá sido a mesma pessoa a preencher as facturas.
85.
Concluído o diagnóstico preliminar aos aspectos extrínsecos das facturas em mãos, a Inspecção, com o intuito de aprofundar o Procedimento Inspectivo, no seu vector intrínseco ou material, entendeu pertinente ouvir o Sócio gerente da N., Lda., Sr. M., que terá referido que não prestou serviços à reclamante em 2005 e 2006.
86.
Quanto aos “autos de medição”, estes que tinham por base os mapas de obras, funcionavam em regra como autorização para pagamento das facturas. Existindo um Orçamento de obras, não foi possível apresentá-lo por extravio como resultado da mudança de instalações da empresa.
87.
Quanto a P.., o gerente de facto, em nome de quem se obrigava “N., Lda..”, as diligências investigatórias desenvolvidas pela Inspecção Tributária, conducentes à sua interpelação pessoal, saldaram-se infrutíferas, admitindo-se que esteja em parte incerta, provavelmente a trabalhar no estrangeiro.
88.
Ultimadas as diligências exploratórias, assim expostas, concretamente aferindo do conteúdo descritivo das facturas e dos contornos em que a relação comercial se desenvolveu entre a Impugnante e o representante de “N., Lda..”, a Inspecção, inflectiu a auditoria tributária para a construção do “perfil cadastral” reflectido por esta empresa, à face da acção inspectiva que recaiu sobre a predita Empresa, apurando-se o seguinte: Não tem cumprido com as suas obrigações fiscais, quer em termos declarativos quer em termos de pagamento desde o ano de 2002; Cessação oficiosa por parte da A.F. desde 31/12/2002; Inexistência, de quaisquer declarações na Segurança Social referentes a 2005 e seguintes; Não possui Alvarás ou Título de Registo para o exercício da actividade de Construção; Declarada insolvente por sentença de 12/09/2006, com registo feito na C.R.C de….; Inexistência duma “estrutura produtiva, de que não se pode dissociar do facto de inexistirem folhas da Segurança Social;
89.
Perante a realidade factual assim recortada, do qual emerge um “quadro patológico” prefigurado no incumprimento dos deveres de actuação, por banda de “N., Lda..”, a Inspecção concluiu, sem mais, que esta Empresa limitou-se a emitir facturas relativamente às quais existem fortes indícios de que não traduzem operações REAIS.
90.
Pois bem, discorrida a factologia dos acontecimentos, conformadora do alegado cometimento do delito de falsidade ideológica, consistente na utilização de facturas desprovidas de substrato económico, é convicção abalizada da Reclamante, de que o acto tributário aqui pleiteado, se apresenta inquinado do vício de falta de fundamentação, sancionador da sua anulabilidade, por sua recondução à figura do vício de forma, ou preterição de formalidades legais.
91.
Efectivamente, lido e relido o Relatório das Conclusões da acção inspectiva, não se vislumbra, em caso algum, qualquer esforço tendente à demonstração da prova da não realização de quaisquer serviços, por parte de N., Lda..
A Inspecção Tributária, quando muito, circunscreveu a sua actuação instrutória, à junção do maior número de dados oficiais comprobatórios da deformação do perfil comportamental de N., Lda.., em matérias tributárias e contributivas, tendo-se, pois, concentrado no historial extravasado pela base de dados da DGCI e dos resultados que advieram das acções de fiscalização, que sobre os clientes daquela empresa, se empreenderam.
92.
Destarte, a construção da base fáctica da Decisão, nos moldes supra plasmados, afigura-se manifestamente perfunctória e, portanto totalmente inibitória do sancionamento do acto tributário, com a infirmação da veracidade das facturas processadas por N., Lda..
Senão, veja-se:
93.
Antes do mais, salta à vista a circunstância das correcções infringidas à Reclamante se apoiarem em factos que lhe são totalmente alheios e inequivocamente fora do seu controlo.
Efectivamente, da prudente leitura do Relatório, deduz-se com toda a objectividade, que a acusação da utilização de facturas desprovidas de substrato económico, se reconduz, como supra adiantado, à formulação de um juízo de censura contra o comportamento lesivo prosseguido por N., Lda.., em face do seu historial fiscal. Apenas e tão só, isto.
94.
Todavia, se a empresa prestadora de serviços de construção, fornecedora da Reclamante, tem pautado a sua conduta, na acepção tributária e contributiva (Segurança Social), pela violação dos seus deveres de boa prática tributária, é matéria cujo conhecimento deve ser totalmente subtraída ao seu conhecimento.
Neste sector de actividade (como nos demais), o que releva é a garantia do cumprimento das cláusulas contratuais ajustadas pelas partes, tanto em termos de facturação, como de pagamento nas datas aprazadas e bem como assegurar em termos operacionais, a prestação de garantia, pós-conclusão das obras.
95.
Tudo o que transcenda este restrito limite de competências em que actuam os empresários, é matéria exclusivamente fora da sua alçada.
96.
Donde resulta que não pode a Reclamante, de todo renunciar de reafirmar que N., Lda.., prestou efectivamente os serviços de construção, titulados pelas facturas, em lide, no total de € 416.749,00, respeitante ao exercício de 2005 o valor de € 350.780,00 e respeitante ao exercício de 2006 o valor de € 65.969,00).
97.
Sendo que, para o efeito, a sobredita empresa, colocou pessoal assalariado a operar nas respectivas obras e emitindo, pontualmente, todas as facturas referentes a tais serviços.
98.
Decorre do que aqui fica dito, a Recorrente, cumpriu, dentro do estrito domínio da sua esfera de competências formais, o dever de exigir as facturas representativas da prestação de serviços, em regime de subcontratação ou subempreitada.
99.
Tendo, concomitantemente, honradas pontualmente as suas obrigações, pagando nas datas convencionadas, por meio de cheque ou em numerário, consoante o interesse das partes contraentes.
100.
Sendo assim, qualquer medida que implique a desconsideração do IVA, em termos de dedutibilidade, ou para efeitos de apuramento do Resultado Fiscal em IRC, não pode prosperar, por grosseiramente ilegal.
101.
Quanto às alegadas deficiências de natureza formal de que padecem as facturas processadas por N., Lda.., a Reclamante não pode deixar de se compenetrar da bem fundada crítica que foi assacada pela Inspecção Tributária.
Com efeito, atento o conteúdo descritivo das facturas em pauta, constata-se que se regista a falta de elementos reputados indispensáveis ao conhecimento concreto das operações que pretendem consignar, conforme vem justamente asseverado no Projecto de Relatório.
102.
Todavia, tendo a Inspecção compulsado os “autos de medição”, os autos de obra, deveria, in fine, ter empreendido a competente concatenação destes documentos com as respectivas facturas, pois à emissão destas, está subjacente, aqueles.
Consabidamente, a emissão da factura representativa dos serviços prestados, é, por via de regra, precedida da feitura dum auto de medição, em razão dos trabalhos já executados, durante um determinado período de tempo.
Sendo assim, a aferição do aspecto formal, no que às ditas facturas concerne, em sede de IVA, não poderia seguir em frente, por inconclusiva e falaciosa, senão, associando-as com os questionados “autos de medição”.
Efectivamente, o eventual deficit de natureza conteudística, de que enfermavam as facturas, poderia e deveria ser complementado com a avocação a estas, da informação relevante fornecida pelos autos de medição/conferencia, que lhes deu causa.
103.
A articulação documental, assim preconizada, concerteza que atingiria os objectivos informacionais requeridos, ou seja, teria proporcionado o conhecimento necessário da exacta natureza dos serviços prestados.
Pois bem, afiguram-se estarem preenchidos os requisitos formais para a confirmação do direito à dedução do IVA, ao abrigo do artº 19º do CIVA, porquanto, como se viu, se a Inspecção promovesse a articulação das facturas com os autos de medição que lhes estão subjacentes, facilmente teria alcançado o conhecimento necessário da tipologia das operações sub judice.
104.
Desta feita, se na vertente formal, a Inspecção andou mal, ao comprometer a dedutibilidade do IVA, por diagnosticar a existência de deficiências de ordem descritiva na emissão das facturas, no mesmo vício incorre, a fortiori, na vertente substantiva, ou seja, no labor (ou melhor na sua ausência) dispendido na obtenção da prova material da comissão do delito de falsidade das operações, aqui litigadas.
Devendo, a final, ser considerado para efeitos de apuramento do Resultado Fiscal em IRC o valor constante das facturas reportadas a 2005 e desconsideradas pela AF.
105.
A administração fiscal só deve praticar o acto tributário - liquidação - quando "formar convicção da existência e conteúdo do facto tributário" (assim postulou Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 150).
Esta convicção deve assentar em pressupostos objectivos e não em meras suposições ou juízos de natureza puramente subjectiva.
Na esteira de Vieira de Andrade, in "A Justiça Administrativa" (Lições), 2° edição, pág. 569, dir-se-á que «há-de caber, em princípio, à Administração o ónus de prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados estes Pressupostos».
Em prol de tal tese afina Jorge Lopes de Sousa, in "Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado", 2ª edição, pág. 470, a propósito do art. 74º/1LGT.
106.
Ainda no que tange à falta de assinatura do contrato de empreitada e dos autos de medição, tais anomalias não podem em si mesmo reputadas intrinsecamente relevantes, pois poderiam, no limite, nem existir, como de resto, foi reconhecido no caso tratado no Procº nº 0300.04 DE 12.10.06 do TCA Norte, sob os auspícios do princípio da liberdade formal.
Tanto é dizer que as insuficiências formais criticadas nos autos de medição, valem o que valem, ou seja, seguramente nada, à vista da necessidade da elaboração dum discurso fundamentador que aponte, isso sim, para a existência de anomalias substantivas, legitimadoras da arguição da falsidade das operações.
107.
À vista do que vem assim alinhado, concluiu-se que a Administração Fiscal, salvo o devido respeito, fez errada qualificação dos factos tributários ao considerar como simuladas as operações realizadas pela aqui Impugnante.
Sendo que, como é entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência, "operação simulada" tem aqui o sentido de operação total ou parcialmente inexistente (Cfr., dentre os demais, Ac. TCA 19.02.02).
108.
Ora, no caso aqui contendido, está por demais comprovado que os trabalhos de construção civil facturados por N…, Lda., foram efectivamente realizados.
109.
Nos termos do artigo 76.° da Lei Geral Tributária, as informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé quando fundamentadas e baseadas em critérios objectivos.
110.
Cabe-lhe, portanto, o ónus de prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções, cumprindo-lhe demonstrar a factualidade que a leva a considerar determinada factura, quer como não preenchendo os requisitos formais contidos na lei, quer a considerar determinada operação documentada como simulada.
111.
Ora, como ex abundanti ficou aqui demonstrado, a Inspecção demitiu-se de reunir prova indiciária legalmente sustentável, que fizesse acreditar com séria e forte probabilidade, da violação de um bem jurídico protegido, sob a forma de utilização de papel falso.
112.
Em sede de audição do reclamante solicitou a prova material in loco de todas as obras, solicitou a inquirição de testemunhas, solicitou a inquirição do Sr. P., fornecendo inclusive contacto telefónico móvel, solicitou ainda a inquirição do administrador de Insolvência. Pugnou ainda para que a administração em sede de inspecção e na presença de um contribuinte faltoso, (N.) aprofundasse a auditoria tributária. Fundamentando a essencialidade de tais diligências e elementos.
Alertou para a necessidade de apurar a verdade material no tocante ao triângulo Sr. P., N. Lda. e D.. Sublinhou no ponto o) das suas conclusões na qual expressamente se referia que “se duvidas existissem da possibilidade da gerência de facto estar afecta ao Sr. P., os dados constantes do relatório de projecto, em sede de transcrição do depoimento do gerente de direito que atesta a entrega da documentação contabilística e dos meios produtivos (equipamentos e homens) as mesmas parecem agora dissipadas. A gerência de facto era exercida por este, senão em conluio com o Sr. N., pelo menos do seu conhecimento. Ora não é incontactável (número de telemóvel 9XXXXXXXX)”.
113.
A falta de interesse da A.F. em apurar a verdade material é demais patente. Ignorou mais uma vez os elementos novos suscitados pelo reclamante. Escudou-se na versão adiantada pelo Sr. M. da qual se aflorava que à N. Lda. não lhe é conhecida qualquer estrutura comercial/industrial. Tal versão compreendia ainda a entrega por parte do Sr. N. de todos os elementos ao Sr. P., incluindo livro de facturas e livro de recibos, o qual era gerente da D., Lda.. Constatava-se ainda que nesta versão e a partir de 2003 o Sr. N. trabalhou para aquela imobiliária como funcionário pontual. Ainda que, transitou para a D., Lda. camião, carrinhas, betoneiras, escoramentos, paneis metálicos etc da N. .., Lda.. Relevou a AF tal versão no seguimento de contacto com a TOC M. que dava conta que a N. Lda. não tinha qualquer elemento da contabilidade. Vindo a concluir-se no relatório que não foi possível ter acesso a qualquer elemento da contabilidade.
114.
Porém, se já de si é verdadeiramente estranho entregar livro de recibos e facturas a um terceiro, mais estranho se torna que tal questão e relação triangular com este terceiro não tenha sido dissecada pela AF. Volvida a audição da reclamante que adiantou que o comportamento do Sr. P., agora enquadrado com os novos elementos, indiciava que se tratava de gerente de facto. Devendo, pois, ser inquirido como tal. E inquirido igualmente como gerente da D., Lda. a fim de apresentar a contabilidade desta de modo a aferir daquela versão de cedência de pessoal e equipamento que havia pertencido á N., pois que deveria constar do imobilizado o camião, carrinhas, betoneiras, escoramentos, paneis metálicos etc.
115.
Enfim, a reclamante suscitou novos elementos, e porque ao abrigo do disposto no n.º 7 do art.º 60 da LGT deveriam ser tidos pela AF obrigatoriamente tidos em consideração na fundamentação da decisão, a preterição de tal exigência configura falta de cumprimento do direito de audição e violação do princípio do contraditório plasmado no art.º 45 da LGT.
116.
À face do critério de repartição do ónus da prova, será a Administração Fiscal que incumbe o ónus de provar a existência dos factos em que assentou as correcções.
Cabia à A.F. provar a verificação dos pressupostos legais que legitimam a sua actuação, através da enunciação de indícios sérios, fortes e consistentes da eventual situação irregular da Impugnante.
Efectivamente, na situação em análise, a A.T., partiu do pressuposto que, no âmbito de uma inspecção à N., se haviam recolhido indícios e depois colidiu no âmbito da inspecção à aqui Impugnante apenas cópia frente e verso de alguns cheques de que ainda não dispunha.
A A.F. em momento algum teve a preocupação de questionar e conferir se os serviços discriminados nas facturas detidas pela Impugnante tinham ou não sido, efectivamente, contratados por esta, para serem utilizadas no exercício da sua actividade comercial.
Do relatório consta na parte final, pagina 16, que “E precisamente que estes serviços nunca colocaram em causa a efectiva realização das obras, bem como a facturação a jusante, ou seja a facturação da O. Lda. aos seus clientes”. E em bom rigor o Tribunal também aceita a realização das obras
117.
Assim, terá de necessariamente concluir-se estarmos em presença da assunção, pela sociedade Impugnante, de encargos relativos à aquisição de serviços indispensáveis ao exercício lucrativo do seu comércio, enquadráveis na previsão do art. 23º, n.º 1, alínea a) do CIRC.
118.
Ora, nos termos do art. 58° da Lei Geral Tributária (LGT), a administração tributária deve, no procedimento, no exercício do princípio do inquisitório, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido.
119.
Neste domínio, cabe referir que o Imposto sobre o Valor Acrescentado, pode definir-se como um imposto indirecto tanto de um ponto de vista jurídico, como de um ponto de vista económico, dado que recai sobre a despesa, é percutível (o encargo fiscal é transferível para o consumidor final) e o respectivo facto tributário apresenta um carácter transitório ou acidental.
Caracteriza-se, igualmente, como um imposto plurifásico porque incide sobre todas as fases do circuito económico, desde a produção ao consumidor final, e não cumulativo, na medida em que em cada fase do circuito económico tributa apenas o valor acrescentado, isto é, o acréscimo de valor que os bens ou serviços passam a ter na fase em que se encontram, evitando, assim, o efeito cumulativo de imposto sobre imposto.
120.
Além das características apontadas, o I.V.A. apresenta ainda a da neutralidade, dado que, mercê do mecanismo das deduções, o imposto virá a ser suportado, na totalidade, pelo consumidor final, tornando fiscalmente irrelevante o número de fases que integrem o circuito económico.
121.
Por último, refira-se que a liquidação do imposto é feita pelos operadores económicos que procedem a autoliquidação e repercutem para o cliente o imposto liquidado a montante.
122.
O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas a incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição "sine qua non" da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.
123.
Nos termos do C.I.V.A., a obrigação geral dos sujeitos passivos disporem de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto deriva do estabelecido no artº.28, nº.1, al.g).
Assim se explica que os sujeitos que face a lei comercial e fiscal estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, devam observar, igualmente, certas obrigações contabilísticas em ordem a obter segurança e clareza no registo das operações decorrentes da aplicação do Código do IVA e necessárias ao cálculo do imposto, bem como para permitir o seu controlo (cfr.artºs.44 a 52, do C.I.V.A.; António Borges e Martins Ferrão, A Contabilidade e a Prestação de Contas, 8ª. Edição, Editora Rei dos Livros, pág.114).
124.
Ainda no que diz respeito ao específico regime do I.V.A., igualmente se dirá que o legislador se socorre de presunções que estabelecem a prova legal para alguns factos particulares, as quais implicam uma verdadeira inversão do ónus da prova e se explicam pela natureza deste tributo (cfr.artº.80, do C.I.V.A.; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.314 e seg.). Por último, atendendo mais uma vez à especificidade do I.V.A., mais se refere que não pode a A. Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 26/11/97, rec.21676, Ap.Dr., 30/3/2001, pág.3108 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/10/98, rec.20568, Ap. Dr., 21/1/2002, pág. 2964 e seg.; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 16/3/1999, proc.280/97, Antologia de Acórdãos, ano II, nº.2, pág. 288 e seg.).
125.
Neste particular, é sabido que, como tem sido jurisprudência praticamente uniforme dos tribunais superiores, quando a administração tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária, competindo à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade.
126.
Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção - cfr. entre outros, Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.
127.
De notar que a AT não precisa de demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-10-2004, processo n.º 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – artigo 75.º da Lei Geral Tributária.
128.
Neste domínio, em princípio, se os indícios denunciam que com forte probabilidade os emitentes das facturas não tinham capacidade empresarial para realizar as obras, parte de construção civil mencionadas, nas facturas, tanto bastaria para se criar um juízo sério de que aquelas transacções não existiram, ou seja, que aquela emitente não prestou à Impugnante aqueles serviços e materiais, traduzindo assim a factura uma simulação de transacção entre o emitente e o utilizador da factura.
E assim dir-se-ia que bastaria à administração tributária, para cumprir o seu ónus, carrear factos relativos aos emitentes das facturas indiciadores da sua incapacidade para prestar os serviços e materiais constantes das facturas e autos de medição. E ficaria desonerada de averiguar qualquer facto na esfera do utilizador das facturas indiciador da sua participação ou conhecimento ou dever de conhecer da falsificação. Poderia limitar-se, como aconteceu no caso dos autos, a constatar na contabilidade do sujeito passivo a existência de facturas daqueles emitentes para, sem mais, considerar indevidamente deduzido o IVA, passando a competir ao sujeito passivo o ónus de demonstrar a veracidade das transacções.
129.
Em suma, a ser assim entendido, a administração tributária, conhecedora que determinado sujeito passivo se dedicava à emissão de facturas falsas, poderia sem mais, desconsiderar os custos de qualquer outro sujeito passivo inspeccionado que tivesse contabilizado facturas daquele emitente.
130.
Com este pano de fundo, crê-se pertinente, o contributo do Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte de 31-01-2014, Proc. nº 01380/05.7BEBRG, www.dgsi.pt, onde se, refe que “… Como ponto de partida da nossa análise, adiantamos desde já que, para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, não constitui requisito do direito à dedução, nas operações internas, que tenha sido o emitente da fatura a transmitir os bens ou a prestar os serviços. O que constitui requisito desse direito é que tenha sido o utilizador a adquirir esses bens e serviços. É o que resulta do n.º 1 do artigo 20.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, segundo o qual «só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens e serviços adquiridos…».
131.
Assim sendo, os indicadores de facto de que o emitente da fatura não tem capacidade para prestar o serviço não bastam, por si só, para obstar à dedutibilidade do imposto mencionado nessa fatura, se não houver razões para pôr em causa a realização desse serviço por terceiro.
132.
Pode, à partida, parecer estranho que o legislador se tenha abstraído da relação subjacente titulada na fatura que, para ser subjetivamente verdadeira, teria que existir entre aqueles dois sujeitos (o emitente da fatura e o utilizador da fatura). Mas há uma razão para tal: é que o legislador também abstrai da relação subjacente para exigir o imposto do emitente.
Com efeito, e nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea c), do mesmo código, o imposto também pode ser exigido ao emitente da fatura que ali o mencione indevidamente. Cada fatura onde seja mencionando imposto constitui um «cheque sobre o Tesouro» (cit. José Guilherme Xavier de Basto, in «A Tributação do Consumo e a sua Coordenação Internacional», Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 164, Centro de Estudos Fiscais 1991, pág. 140). E isto acontece precisamente porque o destinatário da fatura também não deixa, por esse facto, de ter o direito a utilizá-la, no exercício do seu direito à dedução.
133.
Assim, não sendo a existência da relação subjacente entre aqueles dois sujeitos um requisito de dedutibilidade do imposto, esta só pode ser afastada por uma norma de exclusão.
O Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado contém várias normas que excluem especialmente o direito à dedução, mas só nos interessa analisar aqui uma delas: o n.º 3 do seu artigo 19.º. Porque foi com base nessa norma que a administração tributária procedeu às correções impugnadas.
E segundo esta norma, não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.
134.
No entanto, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado também não nos diz o que se deve entender por operação simulada para os efeitos desse Código, pelo que terá que ser interpretada com o sentido que o termo tem no direito civil - artigo 11.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária.
135.
Ora a simulação é a divergência entre a vontade real e a vontade declarada dos sujeitos do negócio jurídico, por acordo entre o declarante e o declaratário e com o intuito de enganar terceiros – artigo 240.º do Código Civil. Pode ser absoluta (quando não existe vontade de realizar negócio nenhum) ou relativa (quando existe a vontade de dissimular um outro negócio). E, neste último caso, pode ser subjetiva (quando o negócio dissimulado é realizado com outro sujeito) ou objetiva (quando o negócio dissimulado tem natureza ou conteúdo diverso, como sucede com a simulação de valor).
136.
Analisemos mais detalhadamente a simulação subjetiva (que é a que para o caso releva). Para que haja simulação é necessário que exista um acordo entre os sujeitos os sujeitos reais da operação e o interposto (interposição fictícia). Se o acordo existe apenas entre o interposto e um dos sujeitos reais da operação, atuando aquele em nome próprio, mas no interesse e por conta desse sujeito (interposição real), não se nos apresenta uma simulação, mas antes um mandato sem representação (cfr. artigos 1180.º e seguintes do Código Civil – neste sentido, Carlos Alberto da Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição atualizada, pág. 476).
137.
A comissão mercantil, regulada nos artigos 266.º e seguintes do Código Comercial, é uma modalidade de mandato sem representação, com a particularidade de ter por objeto, não a prática de atos jurídicos, mas a prática de atos do comércio. Também neste caso existe uma interposição real e lícita de sujeitos (e que se contrapõe, por isso, a interposição fictícia ou simulada - Pires de Lima e Antunes Varela, in «Código Civil Anotado», volume II, pág. 747). Ou seja, o negócio é realmente celebrado entre o mandatário ou comissário e o destinatário dos serviços. Mas aquele fica com a obrigação de transferir para o mandante a titularidade dos direitos que tenha adquirido em execução do mandato.
138.
Assinale-se que o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado acolheu expressamente a figura jurídica da comissão mercantil, como decorre dos seus artigos 3.º, n.º 3, alínea c) (no caso de interposição na transferência de bens) e 4.º, n.º 4 (no caso da prestação de serviços). O que significa que, também para os efeitos deste imposto, a prestação de serviços por conta de outrem não é uma interposição fictícia ou simulada.
139.
Assim sendo, a interposição de um sujeito entre o emitente da fatura e o seu utilizador só será uma operação simulada para efeitos do disposto no artigo 19.º, n.º 3, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e, por conseguinte, só excluirá o direito à dedução se existir acordo entre eles com o intuito de enganar terceiros, nomeadamente o fisco.
140.
Pelo que a existência de acordo entre o verdadeiro prestador do serviço e o seu utilizador, no sentido de simular a celebração do negócio entre um deles apenas e terceiro com o intuito de enganar terceiros (e o fisco em particular) é elemento essencial da simulação subjetiva.
141.
A este propósito o recente Ac. do Tribunal Central Administrativo do Norte 01091/07.BEBRG de 11-04-2014 em sede de apreciação de saber se o tribunal recorrido incorria ou não em erro de julgamento na apreciação da suficiência ou insuficiência do dever da administração reunir indicadores suficientes para a concussão de averiguar da efectividade das transacções. Ali se conclui de forma lapidar que recai sobre a Administração fiscal ónus de recolher indicadores suficientes da existência de simulação, quando pretenda por em causa o exercício do direito á dedução do imposto nos termos do artigo 19º n.º 3 do CIVA. E não são suficientes os indícios de que a operação é titulada em venda a dinheiro é simulada o facto de o emitente ter declarado que a operação não existiu e não existir outra prova do pagamento respectivo.
A questão de saber se compete à administração tributária provar o acordo simulatório. É o problema da repartição do ónus probatório entre a administração tributária e o sujeito passivo na aferição da legalidade do exercício à dedução.
142.
Sobre esta matéria, dispõe com interesse o artigo 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária que o ónus de prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Assim, e tomando como modelo o procedimento de liquidação da iniciativa da administração tributária, esta terá o ónus de demonstrar a ocorrência dos factos de que deriva o direito à liquidação (os factos-pressupostos da existência, qualificação e quantificação do facto tributário). E o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito.
Todavia, o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 2003-05-07 (Processo n.º 01026/02, disponível a redação integral in www.dgsi.pt, seguindo o entendimento do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2002-04-17, processo n.º 026635, também ali disponível), firmou jurisprudência no sentido de que recai sobre o contribuinte a prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado.
A razão de ser deste entendimento é a seguinte: ao contrário do que sucede em regra, em que a administração tributária afirma a ocorrência do facto de que deriva o direito à tributação, neste caso é o sujeito passivo que afirma o facto tributário de que deriva o direito à dedução e a administração tributária que põe em causa a sua ocorrência.
143.
Deve salientar-se, porém, que esta regra do ónus probatório só opera verdadeiramente depois de a administração tributária ter reunido e invocado indícios fundados de que o facto tributário não ocorreu (no caso, que não ocorreu entre os sujeitos mencionados na fatura. Ou seja (para utilizar as palavras do mesmo aresto), depois da administração tributária ter emitido «um juízo administrativo de adequação entre os factos e as valorações em que a administração diz, formalmente, suportar a sua decisão e o resultado desse juízo no sentido de se lhe afigurar ter sido declarado uma dedução superior à devida e com a prova perante o tribunal da pertinência desse juízo ou seja, com a prova, perante o tribunal, da existência dos elementos que tornam possível ter como adequada a consideração por si feita de que o contribuinte declarou uma dedução superior à permitida pela lei».
144.
O exercício do direito à dedução tem por base a declaração. Declaração essa que, nos termos do artigo 75.º da Lei Geral Tributária, se presume verdadeira quando seja apresentada nos termos previstos na lei e os dados dela constantes se encontram inscritos na sua contabilidade ou escrita, por sua vez organizadas de acordo com a legislação comercial ou fiscal. E quando alguém tem a seu favor uma presunção legal não tem que provar o facto a que ela conduz – artigo n.º 350.º, n.º 1, do Código Civil.
Pelo que, quando o direito à dedução tenha por base declaração do sujeito passivo apresentada nos termos da lei, a administração tributária que pretenda infirmar a ocorrência do facto em que se suporta essa dedução invocando a simulação de sujeitos, não tem que demonstrar que o acordo simulatório existiu (o que seria muito difícil demonstrar, na generalidade dos casos), mas tem que reunir indicadores objectivos de que tal acordo deveria ter existido. …”.
145.
Repare-se que no âmbito da inspecção á aqui Impugnante apenas se recolheu cópia de cheques. Bastou-se a AT com outros elementos recolhidos no âmbito de duas inspecções interna e externa á N. Lda.. É certo que naquelas inspecções à N. solicitou elementos á aqui Impugnante. Mas por certo há-de haver diferenças entre a aqui Impugnante prestar declarações ao abrigo de inspecções a outros contribuintes ou de declarações que prestasse se a visada fosse ela própria. Na dita inspecção externa á aqui impugnante a AT não ouvi a Impugnante, não recolheu qualquer depoimento de funcionários, de contabilistas, não visitou qualquer obra, não ouvi outros empreiteiros ou donos de obra. Limitou-se a complementar informação (as tais cópias de cheque) mas com a convicção já formada ao abrigo de anteriores inspecções.
146.
A partir daqui, e considerando a situação particular em apreciação nos autos, tem de entender-se que para haver simulação seria necessário que a administração fiscal tivesse reunido elementos que relacionassem a utilizadora das facturas com o esquema de fraude, ou seja, que tivesse reunido indícios de que a utilizadora das facturas participou ou que sabia ou devia saber que a emitente das facturas não era o verdadeiro fornecedor da mercadoria em apreço, na medida em que pode acontecer que a utilizadora de facturas falsas não saiba nem tenha possibilidades de saber da falsidade.
147.
Com efeito, basta que um operador, obtendo as necessárias quantidades de mercadorias, munindo-se de um livro de facturas e abrindo uma conta bancária em nome do titular da factura, se desloque às instalações de um outro revendedor, ofereça as mercadorias, acorde um preço e desconte o cheque usado como meio de pagamento.
148.
A aceitar-se que o ónus da Fazenda Pública se basta com a recolha de indícios de falsidade relativamente aos emitentes das facturas levaria a que os utilizadores das facturas falsas, que não sabem que são falsas, não pudessem deduzir custos que efectivamente suportaram, sem que tivessem participado em qualquer esquema fraudulento.
149.
Dir-se-á que, sempre tais utilizadores inocentes poderiam fazer prova da veracidade das transacções - na aplicação do quadro probatório acima fixado: à administração tributária cabe o ónus de demonstrar indícios da falsidade; cumprido tal ónus passa a caber ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das transacções.
Mas facilmente se percebe que tal prova, nestas circunstâncias, de fraude a montante, que desconhece, será impossível para o utilizador das facturas provar o que quer que seja para além do que resulta da sua contabilidade, e que, não se deve esquecer, goza de presunção de veracidade. Se houve fraude e o utilizador das facturas desconhece não pode provar o que quer que seja.
O que pode fazer o utilizador das facturas nestas circunstâncias é tão-só esclarecer como é que as negociações se desenvolveram e com quem se desenvolveram.
150.
Importa relevar os seguintes aspectos, já referenciados mas que aqui se sublinham, e que não se encontram postos em causa na presente demanda, nem na fase de inspecção:
151.
Do relatório consta na parte final, pagina 16, que “E precisamente que estes serviços nunca colocaram em causa a efectiva realização das obras, bem como a facturação a jusante, ou seja a facturação da O. Lda. aos seus clientes”.
152.
A actividade comercial da Impugnante é de instalação de equipamentos ambientais compreendendo a instalação de estações de tratamento de águas e águas residuais, vulgo etar´s.
Para a aplicação destes equipamentos é necessário conjugar trabalhos de construção civil que, por não existir essa especialidade internamente, subcontrata a entidades terceiras. O custo associado a esta subcontratação é incluído na facturação final aos seus clientes.
As Etar’s têm como cliente final, essencialmente, Câmaras Municipais ou entidades públicas.
Daqui decorre que sendo os clientes finais, entidades públicas, como estão sujeitas a financiamento nas obras que realizam, e porque estão sujeitas a inspecções, não simulam, nem é plausível que possam vir a simular, o preço efectivo que pagam pelas obras. Existe, assim, um tecto fixo do preço a final das obras realizadas pela O..
153.
Ora, a AT não põe em causa a facturação a jusante, antes pelo contrário aceita-a e com ela se conforma. Daí que, por um mero raciocínio lógico, não pode a simulação invocada pela AT consistir na simulação do preço.
Não pode consistir também na simulação dos serviços prestados. As Etar´s necessária e imprescindivelmente, ao serem colocadas em obra, ou seja no terreno, necessitam de trabalhos de construção civil. Sendo certo que cada Etar terá as suas especialidades (a este propósito remete-se para o depoimento da testemunha F.) mas facilmente se intui da necessidade de limpeza de terrenos, escavações e aterros, lajes de assentamento, construção de caixas de entrada e muros.
154.
Se a Impugnante tivesse inflacionado artificialmente os custos, estes seriam repercutidos a jusante, ao cliente final, que teria, assim, um custo de obra acrescido. Não se percebe a fundamentação do Tribunal a quo a quando da contradição da testemunha J. e reportando-se á testemunha o Eng.ª F., procura descredibilizar aquela primeira quando refere que a impugnante trabalharia mais com subempreiteira em obras particulares, como sucedia consigo. Ora, tal é um manifesto lapso. Aliás a empresa da testemunha é Empreiteira Geral e o Dono de Obra nas obras em causa é a Câmara Municipal de…., e a O., Impugnante é precisamente subempreiteira nessas obras com Dono de Obra uma entidade Publica.
155.
A existir simulação, esta não poderia revestir o carácter de simulação objetiva (quando o negócio dissimulado tem natureza ou conteúdo diverso, como sucede com a simulação de valor), mas antes teria quer ser simulação subjectiva (quando o negócio dissimulado é realizado com outro sujeito).
156.
Do RIT consta que não pode ter sido a N. Lda. a prestar aqueles serviços porquanto não possuía estrutura empresarial, o sócio gerente M. referiu que não prestou esses serviços à aqui Impugnante, não foram identificados funcionários nem constava da base de dados da segurança social a existência de funcionários da N. Lda., a caligrafia constante das facturas não é do sócio gerente, nem foi exibida a totalidade dos comprovativos de pagamento.
157.
Analisando estes indícios importa referir:
Consta do RIT páginas 4 e 5 que o gerente de direito da N. Lda. que este “ não possui qualquer documento, tendo entregue todos os documentos, incluindo livros de facturas e livro de recibos ao Sr. P., gerente da D., Lda. entre os anos 2003 e 2004 … tendo transitado para esta os funcionários e imobilizado (camião, carrinhas, betoneiras, escoramentos, painéis metálicos, etc) da N., Lda.”.
A Impugnante identifica aquele Sr. P.. como gerente de facto.
Assim, quanto ao indício da caligrafia constante das facturas não ser da autoria do gerente de direito, parece evidente que nem poderia ser de outra forma. Se o gerente de facto da N., Lda. era o Sr. P., se o sócio gerente lhe entregou todos os documentos, incluindo livros de facturas e livro de recibos, certamente que a letra constante das facturas há-de ser a do Sr. (...). Estranho seria se fosse do gerente de direito que deixou de ter acesso a esses documentos.
158.
Quanto aso restantes indícios apontados pela IT será necessário valorá-los por confronto com a prova produzida em julgamento. Não obstante Não ser este o momento sempre se dira que:
Da capacidade produtiva da N., Lda.. Além do que consta do RIT na parte em que afirma ter transitado para o Sr. (...) os funcionários e imobilizado (camião, carrinhas, betoneiras, escoramentos, painéis metálicos, etc) da N., Lda.. Importa atentar ao referido pelos funcionários da N. e do Sr. (...).
Do depoimento do Sr. M. resulta a identificação do seu cunhado N. como sendo o gerente da N., Lda.. Afere-se ainda a existência de uma reunião nos estaleiros da empresa N., Lda., na qual esta testemunha estava presente, e em que o Sr. (...) afirmou perante todos os funcionários que daí em diante passava a assumir a empresa, deixando de ser gerente o seu cunhado. Referiu ainda que na data a empresa teria uns 20 funcionários, não inscritos na segurança social, que recebiam maioritariamente em dinheiro, esteve a trabalhar na dita firma cerca de um ano nestas condições. Identificou O Sr. S. que mais tarde também trabalhou nessa empresa. Identificou ainda o trabalhou, manobrador da máquina, como sendo o Sr. J. que ainda ficou a trabalhar na firma mesmo depois deste sair. Máquina que pertencia ao imobilizado erava no estaleiro da referida empresa. Afirmou ainda que desde que a firma passou para o Sr. (...) os cheques de pagamento vinham em nomes de firmas diferentes. Identificou alguns equipamentos da N. Lda.. Só mais tarde soube que não tinha descontos na segurança social. Havia uma situação muito complicada financeiramente nas empresas.
Do depoimento do Sr. S. ressalta que conhece a O. porque a situa numa Etar de….. Refere que trabalhou para o Sr. (...) e que este tinha outras empresas designadamente uma imobiliária. Refere que nos anos de fins de 2002 ou 2003 o Sr. (...) toma conta de uma firma que não se recorda do nome mas sabe que o sócio era o Sr. C.. Identificou cerca de 22 funcionários nas mesmas circunstâncias que ele, não estavam inscritos na segurança social, recebiam muitas vezes em dinheiro, e por vezes directamente dos clientes do Sr. (...). Identificou um estaleiro em…, que tinha máquinas, muito material de construção civil e inclusive uma retroescavadora. Os escritórios da D. eram na….. Sabia que o Sr. P. usava o dinheiro dos clientes para pagar aos funcionários. Havia 15 trabalhadores em Fafe pagos directamente pelo cliente. Não trabalhou na N. Lda. enquanto era gerente do Sr. C., contudo em 2008 foi trabalhar para outra firma e para o Sr. C.. Identificou igualmente o manobrador da máquina como o Sr. J., funcionário da N. Lda. desde os tempos em que o Sr. C. era o gerente.
As duas testemunhas, E. e J., funcionários da Impugnante identificaram e localizaram no tempo a troca do subempreiteiro para os trabalhos de construção civil. Identificaram que tais trabalhos de construção civil, a que a Impugnante recorria para a instalação das Etar´s, passaram a ter como interlocutor o Sr. (...) e circunstanciaram a data. Circunstanciaram ainda os procedimentos internos actuais e os que a empresa tinha antes de a Impugnante possuir a alvará INCI nem certificação da qualidade designadamente no ano 2005. Reconheceram os documentos que lhe foram apresentados e as letras neles constantes.
A testemunha F. identificou várias obras nas quais a Impugnante instalou Etar´s, e nas quais esta era subempreiteira da empresa da testemunha. Obras nas quais os donos de obra eram Câmaras Municipais. Confirmou que a Impugnante não disponha da especialidade de construção civil e que tinha que recorrer a entidades terceiras para a realização desses serviços. Refere que a Impugnante trabalhou para a sua empresa tenho acordado que era na modalidade de “chave na mão”, isto é que na facturação que a Impugnante fez á sua empresa estavam incluídos os trabalhos de construção civil na implementação da Etar´s. Circunstanciou as razões pelas quais estas Obras têm um preço fixo a final, uma vez que os clientes finais são entidades públicas sujeitas a financiamento e controlo. Circunstanciou ainda a variação dos trabalhos a realizar na especialidade de construção civil para a colocação das Etar´s e a consequente variação dos preços.
A testemunha J. não sendo funcionária da O. Lda. identificou o gerente da Impugnante como sendo este que lhe pagou em dinheiro pelos serviços que realizou nas obras da O.. Quem o contratou foi um Senhor J.. Não sabe quem era o patrão do Sr. J., sabe que este Sr. foi para Espanha e que faleceu a alguns anos mais tarde. Fez trabalhos de pedreiro, juntamente com esse Sr. J.. Também trabalhava com um Senhor V. que era quem lhe dava boleia de …até uma aldeia de ….., local da Obra. A testemunha J. frisou que o gerente da Impugnante adiantou várias vezes a fornecedores da N. valores para as obras não pararem. A testemunha sabe identificar O Engenheiro P. para o pagamento, mas já não a identifica para a contratação ou mesmo para a ter como entidade Patronal.
159.
Importa ainda levar em linha de consideração toda a documentação junta ao processo designadamente o circunstancialismo do relacionamento comercial com N. – Construções Lda., respectivas empresas do grupo D., Lda. e sócios e gerentes Sr. P.. e M., iniciou-se em 2001 na altura com a adjudicação projecto Etar Predio da Rua (...), (...) processo da CM…, nº…..
160.
Da cópia dos cheques juntos afere-se que alguns foram endossados pela firma N. Lda. ás empresas D. Lda., P., Lda., empresas do Sr. (...), e ainda a firmas como S., Lda.
161.
Naturalmente, não se olvida mostrar-se subentendido, no relatório que, teriam sido recolhidos indícios da utilização abusiva de facturas emitidas sob a chancela da N. no âmbito de duas inspecções. Mas aqui Impugnante desconhece em absoluto os exactos contornos dessas inspecções. Apenas conhece as informações que naquelas inspecções prestou e depois no relatório ficou a conhecer um sumário do que naquelas inspecções se passou.
162.
Salvo melhor opinião, não foram recolhidos indícios suficientes, sérios e objectivos de que a Impugnante tivesse actuado em combinação com terceiro, nomeadamente, o Sr. (...) no sentido de enganar e prejudicar terceiros e também não foram recolhidos indícios de que a Impugnante sequer soubesse que estava a adquirir bens e serviços ao Sr. (...) (através da N. Lda.).
163.
A circunstância de os pagamentos serem feitos por cheques recebidos todos pela N. mas posteriormente endossados a outras empresas. Existiram ainda valores que foram adiantados pelo Gerente à Empresa N., funcionários e fornecedores, e que por essa via o gerente depois solicitou o endosso dos cheques para si. Mas esta actuação do Gerente e do Sr. (...) não pode ser assacada à aqui Impugnante. Mas a At também nunca questionou o gerente a título pessoal. A gerência não se confunde com a própria sociedade.
164.
Deste modo, havendo indícios de que a emitente das facturas não forneceu a mercadoria e os serviços mencionados nas facturas, impunha-se que a administração fiscal indagasse da participação da ora Recorrida no esquema simulatório.
Ora, a administração tributária não diz que a recorrente sabia ou devia saber que estava a utilizar serviços de sociedade diferente da que figura na factura e o utilizador da factura não está obrigado a saber a situação empresarial ou fiscal do emitente da factura que lhe entrega a mercadoria e lhe presta serviços.
165.
Aceitar-se que um utilizador de facturas veja os custos desconsiderados sem que de alguma forma a administração tributária o ligue ao esquema fraudulento, seria violador do princípio da justiça. E poria em causa a confiança nas relações comerciais.
Este entendimento vai de encontro ao do Tribunal de Justiça que no Acórdão de 31 de Janeiro de 2013, processo C-642/11 - que tratava de uma questão de dedutibilidade de IVA, reportando-se aos casos em que as irregularidades se verificam na esfera dos emitentes, pronunciou-se assim:
166.
Assim, cabe às autoridades e aos tribunais nacionais recusar o direito a dedução, se se demonstrar, face a elementos objectivos, que esse direito é invocado fraudulenta ou abusivamente (v., neste sentido, acórdão de 6 de Julho de 2006, Kittel e Recolta Recycling, C-439/04 e C-440/04, Colet., p.I-6161; e acórdãos, já referidos, Mahagében e David, n.º 42, e Bonik, n.º 37).
167.
Contudo, também segundo jurisprudência bem assente, não é compatível com o regime do direito a dedução prevista pela Diretiva 2006/112 sancionar, com a recusa desse direito, um sujeito passivo que não sabia nem podia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou que outra operação incluída na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior à realizada pelo referido sujeito passivo, estava viciada por fraude ao IVA (v., especialmente, acórdão de 12 de Janeiro de 2006, Optigen e o., C-354/03, C-355/03 e C-484/03, Colet., p. I-483, n.ºs 52 e 55; e acórdãos, já referidos, Kittel e Recolta Recycling, n.ºs 45, 46, e 60, Mahagében e Dávid, n.º 47, e Bonik, n.º 41).
168.
Além disso, o Tribunal de Justiça declarou, nos n.ºs 61 a 65 do acórdão Mahagében e David, já referido, que a Administração Fiscal não pode exigir de maneira geral que o sujeito passivo que pretenda exercer o direito a dedução do IVA, por um lado, verifique que o emitente da fatura referente aos bens e aos serviços em função dos quais o exercício deste direito é pedido dispõe da qualidade de sujeito passivo, possui os bens em causa e está em condições de os entregar e cumpre as suas obrigações de declaração e de pagamento do IVA, a fim de se certificar de que não há irregularidades ou fraude ao nível dos operadores a montante, ou, por outro, possua documentos a este respeito.
169.
Daqui decorre que o tribunal nacional que deva decidir se, num determinado caso, existe operação tributável, tendo a Administração Fiscal alegado no processo que a existência de irregularidades cometidas pelo emitente da fatura ou por um dos seus fornecedores, como omissões contabilísticas, deve zelar por a apreciação da prova não conduza a esvaziar de sentido a jurisprudência recordada no n.º 48 do presente acórdão, obrigando de forma indireta o destinatário da fatura a proceder a verificações junto do seu contratante que, em principio, não lhe incumbem.»
170.
Os princípios da neutralidade fiscal, da proporcionalidade e da confiança legitima devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que seja o direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante seja recusado ao destinatário de uma factura, por inexistência de uma operação tributável efectiva, quando, no aviso retificativo de tributação enviado ao emitente da fatura, o imposto sobre o valor acrescentado declarado pelo emitente não tiver sido corrigido. Contudo, se, por causa de fraudes ou irregularidades cometidas pelo emitente ou a montante da operação invocada como base do direito a dedução, se considerar que essa operação não foi efectivamente realizada, deve provar-se, perante elementos objectivos e sem exigir ao destinatário da fatura verificações que lhe não incumbem, que o mesmo destinatário sabia ou tinha obrigação de saber que a operação estava implicada numa fraude ao imposto sobre o valor acrescentado, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.» (sublinhado nosso).
171.
No caso, repete-se, estando demonstrado que a ora Recorrida realizou as obras em causa designadamente na parte da construção civil de implementar no terreno as Etar´s, facturou esses serviços a montante, teria a administração tributária que recolher indícios bastantes de que a recorrida sabia ou devia saber que quem lhe estava a vender mercadoria e a prestar esses serviços não era a sociedade que figurava nas facturas.
172.
E não tendo tal acontecido, parece ser de perfilhar o entendimento de que a administração tributária não recolheu indícios que legitimam a sua actuação no sentido de não aceitar a dedução do IVA mencionado nas facturas em causa nos autos, ou seja, não cumpriu com o ónus que sobre si impendia no sentido de fundamentar as liquidações impugnadas, as quais estão, assim, feridas de ilegalidade, impondo-se assim determinar a anulação das liquidações impugnadas.
173.
Também aqui a questão a decidir, é a de saber se as facturas emitidas pela subempreiteira da Impugnante N. Lda., correspondem a operações comerciais reais ou se são facturas não suportadas por qualquer negócio económico real e efectivamente realizado entre a a Impugnante e aquela subempreiteira e ou seja, se essas prestações de serviços foram efectivamente realizadas e não se trataram de negócios fictícios.
174.
Importa aditar, ao já anteriormente explanado, de modo a evitar duplicação de argumentos, que determina o n.º 1 do artigo 23º n,º 1 do CIRC, que para o apuramento do imposto devido, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora.
175.
Daí que seja curial a administração rejeitar como custos as quantias tituladas por facturas quando, após averiguações sérias e credíveis, concluir haver sérios indícios de que aquelas titulam operações simuladas (simulação objectiva) e consequentemente tais custos não são reais.
176.
Implementar Etar´s no terreno sem conjugar trabalhos de construção civil não é sequer equacionável. A Impugnante não tem internamente essa especialidade. Tem que necessariamente subcontratar a entidades terceiras.
O custo associado a esta subcontratação foi incluído na facturação final aos seus clientes (conforme reconhece expressamente a AF no relatório, parte final, pagina 16, que refere “precisamente que estes serviços nunca colocaram em causa a efectiva realização das obras, bem como a facturação a jusante, ou seja a facturação da O. Lda. aos seus clientes”.
177.
E considerando que o IRC visa a tributação do lucro real, não é permitido a dedução de custos fictícios.
Por sua vez, o n.º 1 do artigo 100º do CPPT, preceitua que” 1- Sempre que da prova produzida resulte fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tribuário, deverá o acto impugnado ser anulado.

DAS NORMAS JURIDICAS VIOLADAS
178.
Ao não decidir no sentido articulado, violou a Decisão: artigos 45.º;46º; 50º; 58º; 59º, 63º; 74º, 77º; todos da LGT; artigos. 4.º, alínea b); 7º; 9º; 13º alínea a); 21º; 36º; 55º; 56º todos do RCPIT; artigos 9º; 46.º, n.º 1, do RGIT; artigos 39.º n.º 2; 48º; 54º; o n.º 1 do artigo 100º todos do CPPT; n.º1, al. b), c) e d) do artigo 615º todos do CPC; artigos. 19.º,n.ºs 2 e 3; 35.º, n.º 5 todos do CIVA; artigo 23º n,º 1 do CIRC; os princípios da neutralidade fiscal, da proporcionalidade e da confiança legítima.

DA NULIDADE DA SENTENÇA
179.
Nos termos do n.º1, al. b), c) e d) do artigo 615º CPC, é nula a Decisão quando “b. Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c. Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d. O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
180.
Na sentença o Tribunal a quo aprecia e dá como provados fatos respeitantes a 2006 que estão fora do âmbito da presente acção de impugnação pois que apenas se reporta ao ano de 2005.
Pelo que, se invoca a nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº1 al. d) CPC, por tomar conhecimento de questões de que não podia.
181.
Não decide nem aprecia a ilição da presunção (artigo 39 n.º 2 do CPPT) não obstante a Impugnante a ter apresentado tempestivamente e ao abrigo da impugnação unitária que decorre do artigo 54º do CPPT
182.
O Tribunal não aprecia a questão submetida respeitante à qualificação da inspecção á Recorrente como interna ou externa, não obstante o dever de conhecer tal questão.
183.
Pois a obrigação de cognição do Tribunal abrange todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas, naturalmente, aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Pelo que, se invoca a nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº1 al. d) CPC, por omissão de pronúncia quanto a tais questões.

NESTES TERMOS E AINDA PELO MUITO QUE, COMO SEMPRE, NÃO DEIXARÁ DE SER PROFICIENTEMENTE SUPRIDO, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO À APELAÇÃO, REVOGANDO-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, SENDO SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE JULGUE PROCEDENTE O PETICIONADO, TUDO COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.
FARÃO ASSIM JUSTIÇA!..(…)”

1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida incorre em:
(i) Erro de julgamento de facto – conclusões 1.ª a 3ª;
(ii) Da existência de inspeção externa (interna) à Recorrente – conclusões 3.ª (repetida) a 12ª;
(iii) Do vicio de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciadas na violação dos princípios da proporcionalidade, da adequação, da cooperação, dos princípios do inquisitório, da verdade material, da legalidade da atuação administrativa e da imparcialidade, previstos nos artigos 7º, 9º n.º 1, 29º n.º 1 al. a), e na formalidade e procedimento da recolha de elementos 55º, 56º todos do RCPIT, 58º e 63º da LGT e 266ª da Constituição. – conclusões 13. ª a 21.ª;
(iv) Da caducidade - conclusões 22. ª a 27. ª e 37. ª a 50. ª;
(v) Da elisão da presunção - conclusões 28. ª a 36. ª;
(vi) Da duplicidade de inspeções externas e do prazo de recurso da inspeção externa à Recorrente das credenciais n.ªs: oi200905437 das credenciais oi200901907 e oi200902219¸ da credencial oi2010003712 - conclusões 52. ª a 69. ª;
(vii) Do vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciado na violação do direito de audiência prévia, previsto nos artigos 60º do RCPIT e 60º da LGT do vício de fundamentação, no plano formal, por não constarem expressamente do relatório, os indícios apresentados como fundamento das liquidações ora em crise, e por não serem suficientes para suportar um juízo de falsidade quanto às faturas emitidas pela sub-empreiteira da Recorrente; do vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciadas na violação dos princípios do inquisitório e da verdade material, previstos nos artigos 58º da LGT e 6º do RCPIT; do vicio de violação de lei, por a atuação da administração tributária evidenciar erro nos pressupostos de facto e de direito, e posto que as transações tituladas pelas faturas desconsideradas pela AT titularem operações materiais reais. - conclusões 70. ª a 178. ª;
(viii) Da nulidade da sentença - conclusões 179. ª a 183. ª.

3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1 Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
A) A impugnante está enquadrada no regime normal de IVA, com periodicidade trimestral, e no regime geral de tributação de IRC (fls. 208 a 217 verso).
B) A impugnante foi sujeita a um procedimento de inspeção externo, parcial, aos exercícios de 2005 e 2006 que está documentado no RIT, cujo teor, consta de fls. 208 a 217 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
C) O procedimento de inspeção foi motivado pela existência de indícios da utilização de faturas que não correspondem a operações reais (fls. 208 a 217 verso).
D) A ação inspetiva iniciou-se, por notificação pessoal, realizada em 30/11/2009 e foi concluída em 06/05/2010 (fls. 208 a 217 verso, 269 e 299 a 308).
E) Nos exercícios de 2005 e 2006 a impugnante tinha registado na sua contabilidade as seguintes faturas emitidas em nome de N., Ld.ª, pessoa coletiva n.º (...), com sede em (…) (...), (...), (…), abreviadamente designada N.:
Factura n.ºDataPrestações ServiçosIVA LiquidadoTotal Facturado
1422005-03-31€ 13.875,00€ 2.636,25€ 16.511,25
1432005-03-31€ 12.725,00€ 2.417,75€ 15.142,75
1442005-03-31€ 14.955,00€ 2.841,45€ 17.796,45
1452005-03-31€ 13.975,00€ 2.655,25€ 16.630,25
1492005-04-23€ 19.000,00€ 3.610,00€ 22.610,00
1502005-05-14€ 22.500,00€ 4.275,00€ 26.775,00
1512005-06-19€ 19.750,00€ 3.782,50€ 23.502,50
1632005-07-22€ 52.750,00€ 11.077,50€ 63.827,50
1642005-08-31€ 35.490,00€ 7.452,90€ 42.942,90
1652005-09-30€ 49.760,00€ 10.449,60€ 60.209,60
1722005-10-20€ 35.500,00€ 6.825,00€ 39.325,00
1732005-11-29€ 29.750,00€ 6.247,50€ 35.997,50
1742005-12-21€ 33.750,00€ 7.087,50€ 40.837,50
Subtotal 2005€ 350.780,00€71.328,20422.108,20
1782006-01-15€ 16.550,00€ 3.475,50€ 20.025,50
1792006-02-15€ 14.750,00€ 3.097,50€ 17.847,50
1812006-03-15€ 11.600,00€ 2.436,00€ 14.036,00
1852006-04-28€ 2.066,00€ 433,86€ 2.499,86
1862006-05-31€ 11.003,00€ 2.310,63€ 13.313,63
1872006-06-30€ 10.000,00€ 2.100,00€ 12.100,00
Subtotal 2006€ 65.969,00€ 13.853,49€ 79.822,49
Total€ 416.149,00€ 85.181,69€ 501.930,69
F) O teor destas faturas e a descrição dos produtos fornecidos e serviços prestados constam dos documentos de fls. 220 verso a 221 verso, 223, 224 verso, 225, 229 verso a 231 verso, 232 verso, 233, 234, 235 a 236, 238 e 239 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
G) Com base na fundamentação e conclusões constantes do RIT referido em B), a administração tributária considerou que as faturas emitidas em nome de N. e registadas na contabilidade da impugnante nos exercícios de 2005 e 2006, não estavam passadas na forma legal prevista no art. 35.º, n.º 5, do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), por não conterem a quantidade e a denominação usual dos bens e/ou serviços prestados, não são quantificadas, nem especificadas as operações, não são discriminados os valores do material aplicado e da mão-de-obra, com exceção das faturas n.ºs 185, 186 e 187, que embora separem o valor da mão-de-obra do material, não discriminam este último (fls. 208 a 217 verso).
H) A administração tributária, com base nessa fundamentação e conclusões, considerou ainda que as faturas emitidas em nome de N. e registadas na contabilidade da impugnante no exercício de 2005 e 2006, não titulavam operações económicas reais, por os produtos e serviços delas constantes não terem sido fornecidos pela emitente (fls. 208 a 217 verso).
I) Com essa fundamentação a administração tributária considerou que as faturas emitidas com o nome de N. e registadas na contabilidade da impugnante nos exercícios de 2005 e 2006, não conferem o direito à dedução, nem são suscetíveis de serem consideradas custos fiscais, por não terem sido passadas na forma legal e por não titularem operações económicas reais, não se mostrando indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da força produtora (fls. 208 a 217 verso).
J) Com esses fundamentos, os serviços de inspeção tributária (SIT) não aceitaram a dedução do IVA e dos custos correspondentes às referidas faturas (fls. 208 a 217 verso).
K) Em consequência, os SIT procederam à correção meramente aritmética da matéria tributável da impugnante no exercício de 2005, no valor de €350.780,00, tendo ainda apurado um IVA em falta, no valor de €71.328,20, correspondendo aos seguintes valores por trimestre: €10.550,70, n.º 1.º trimestre; €11.637,50, no 2.º; €28.980,00, no 3.º; e €20.160,00, no 4.º (fls. 208 a 217 verso).
L) Estas correções deram, origem às liquidações adicionais de IVA impugnadas que constam de fls. 341 verso a 345, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
M)As liquidações impugnadas datam todas de 05/06/2010 e foram notificadas à impugnante por ofícios de 15/06/2010, remetidos por cartas registadas, e tinham como data limite de pagamento voluntário 31/08/2010 (fls. 341 verso a 345 dos autos, 17 e 18 do PA e 5 do procedimento de recurso hierárquico (PRH) e 214 do PRG).
N) As liquidações foram notificadas à impugnante em 16/06/2010 (confissão da impugnante art. 19.º da petição inicial).
O) A impugnante foi notificada do projeto de RIT que consta de fls. 299 a 308, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
P) A impugnante exerceu o direito de audição pelo requerimento de fls. 309 a 316, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Q) Os SIT pronunciaram-se sobre o exercício do direito de audição no RIT, no capítulo denominado “IX – DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO”, cujo teor consta de fls. 216 217 verso, que aqui se dá por reproduzido.
R) O RIT foi notificado à impugnante por carta registada em 25/05/2010, remetida em nome da impugnante e para o seu domicílio fiscal (fls. 329 verso dos autos e fls. 165 e 166 do procedimento de reclamação graciosa (PRG) apenso).
S) A carta registada em 25/05/2010, com o RIT não foi entregue ao destinatário em 26/05/2010, por estar ausente, encerrado, tendo sido avisado para levantar a correspondência na estação de Santo Tirso dos CTT (fls. 329 verso).
T) A carta registada em 25/05/2010, com o RIT foi entregue ao destinatário em 04/06/2010 (fls. 329 verso).
U) A requerimento da impugnante, nos termos do art. 39.º, n.º 2, do CPPT, os CTT prestaram, as informações de fls. 413 e 414, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
V) Na sequência da notificação referida em E), a impugnante apresentou o requerimento de fls. 330 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
W) Sobre o requerimento recaiu a decisão de fls. 334 verso a 336 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
X) A impugnante recorreu hierarquicamente dessa decisão, tendo o recurso hierárquico sido indeferido pela decisão de fls. 339 a 340 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Y) Os factos constantes do RIT que originaram as liquidações impugnadas deram origem à instauração do procedimento criminal, processo n.º…., da Comarca do Porto, que está em sede de instrução, por indícios da prática do crime de fraude fiscal qualificada (fls. 591, ata da audiência contraditória e RIT).
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga não provado:
1) P.. era gerente de facto da N..
2) As faturas referidas em E) foram emitidas na forma legal.
3) A N. forneceu à impugnante os produtos e serviços que constam das faturas desconsideradas pela administração tributária referidas em E).
4) As faturas emitidas em nome de N., registadas na contabilidade da impugnante, titulam operações económicas reais.


3.2. A Recorrente nas conclusões 1.ª a 3.ª alega que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto quer na matéria de facto provada quer não provada.
Vejamos:
O n.º 1 do artigo 662.° do Código de Processo Civil, determina que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Por sua vez, o art.º 640.º do mesmo diploma impõem que “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender deve ser proferida sobre questões de facto impugnadas.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. (…)”
Como refere António Abrantes Geraldes, in Recursos do Novo Código de Processo Civil – Novo Regime. Almedina, 2014, 2º edição, pag 135 e segs.
“(…) A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto, deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto;
b) Falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
c) Falta de especificação nas conclusões dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registado (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente ao segmento da impugnação;
f) Apresentação de conclusões deficientes, obscuras ou complexas, a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos que traduzem alguns dos elementos referidos…)
Adianta ainda o mesmo autor que as referidas exigências “...devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor.” (op. cit. pág. 135).
Resulta da conjugação dos art.ºs 662.º e 640.º do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa e desde que o recorrente especifique nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios e a decisão que, no seu entender deve ser proferida.
Compete ao TCA reapreciar, não apenas a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável na prova indicada e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas, também, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção, como refere António Santos Abrantes Geraldes in Recurso no Novo Código do Processo Civil, pag. 232, um “juízo autónomo”, relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação.
E consequentemente modificar a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
E desde já se diz que a Recorrente não cumpriu o ónus que sobre si recaia.


Na 1ª conclusão indica os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados reportando-se aos factos B), C), E) e H) que no seu entender devem ser dados como não provados. Limita-se a introduzir pequenas observações e a indicar as páginas do Relatório de Inspeção.
Relativamente ao facto provado em E) sempre se dirá que não há erro de julgamento de facto, pela simples razão da presente demanda se reporta ao ano de 2005.
Com efeito decorre do relatório de inspeção, que no ano de 2005 e 2006, a Recorrente tinha registada na sua contabilidade as enumeradas faturas emitidas pela N. Construções, Lda..
Na 2. º conclusão a Recorrente impugna a matéria de facto não provada que no seu entender deveria ser dado como provada.
Se bem entendemos as prolixas motivações de recurso reporta-se aos factos não provados nos pontos 1) a 4) da sentença recorrida.
No entanto, não explica nas conclusões as razões nem os meios probatórios que conduzem a tal.
Entretanto. nas alíneas AA) a AH) - conclusão n.º 2 - limita-se a tecer genericamente argumentos alguns deles conclusivos, sem indicar os meios de prova que o sustentam.
Nas alíneas AF) a AH) pretende a Recorrente o aditamento aos factos provados nas alíneas G) e Y) porém, na conclusão n.º 3 indica genericamente a prova que impõe decisão diversa da sentença recorrida, remetendo-nos para depoimento das testemunhas, para a prova documental, para as fotografias, estrutura organizacional, documento 5 e relatório e procedimento criminal.
Importa ainda referir que apesar de nas motivações das alegações a Recorrente introduzir a transcrição dos depoimentos das testemunhas, não dá cumprimento ao art.º 640.º do CPC, de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, e as conclusões a retirar daí.

Como supra se disse, a Recorrente não cumpriu o ónus que sobre si recaia. Assim, não tendo dado cabal cumprimento aos ónus de especificação da sua dissidência quanto à decisão de facto, como é imposto pelas alíneas a), b) e c) do nº 1, 2 e 4 do artigo 640.º, do Código de Processo Civil, é de rejeitar o recurso no que concerne à decisão da matéria de facto.
4. JULGAMENTO DE DIREITO
Questão Prévia:
4.1. Por requerimento apresentado neste Tribunal a Recorrente requereu a junção de certidão de ata de inquirição de testemunhas efectuada no processo n.º 176/12.4BEPNF, da mesma Impugnante com questões factuais idênticas.
Concluiu pela alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, aproveitando-se a prova testemunhal efectuada no âmbito do referido processo.
Vejamos:
Determina n.º 1 do art.º 425.º do CPC que “depois de encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento.”
Por sua vez, o art.º 651.º do mesmo diploma que” [a]s partes só podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o art.º425º do CPC ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância.
A regra geral é de os documentos serem apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes por força do n.º3 do art.º 108.º do CPPT e nº 1 do art.º 423.º, CPC, ou seja, com a petição inicial, caso visem fazer prova dos fundamentos da ação, podendo, contudo, ser apresentados até 20 dias antes da data que se realize a audiência final e decorrido este prazo só são admitidos os documentos que não tenham sido possível até aquele momento ou quando se mostre necessária em virtude de ocorrência posterior.(cfr. art. 423.º n.º2 e 3).
Como decorre deste normativo a junção de documentos na fase de recurso assume carácter excecional, só devendo ser consentida nos casos especiais previstos na lei (art.º 651º, nº 1, CPC).
Ora em sede de recurso é legitimo às partes juntar documentos com as alegações quando a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento, em virtude de ter ocorrido superveniência objetiva (documento formado depois de ter sido proferida a decisão) ou subjetiva (documento cujo conhecimento ou apresentação apenas se tornou possível depois da decisão e ou se tenha revelado necessária em virtude do julgamento proferido) . (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, p. 191 e seg.).
No caso em apreço pretende a Recorrente juntar certidão da ata produzida na impugnação judicial n.º 176/12.4 BEPNF e cópia da transcrição dos depoimentos de P.. e de J.
Tal situação não se enquadra nos supra citados normativos, para além da Recorrente em sede de inquirição de testemunhas, ocorrida nos presentes autos, e titulada pela ata de inquirição de 29 de setembro de 2014, ter prescindido do depoimento dessa testemunha e de outras.
Relativamente ao depoimento de J., bem ou mal, aqui não está em questão, foi ponderado pelo tribunal a quo na motivação de recurso (pag. 6/7 da sentença recorrida).
Assim sendo, não se admite a referida junção de documentos, por não ter qualquer suporte legal para o efeito.

4.2 A Recorrente alega que a sentença recorrida incorreu em nulidade por três ordens de razões, uma vez que, o Tribunal a quo aprecia e dá como provados factos respeitantes a 2006 que estão fora do âmbito da presente ação de impugnação pois que apenas se reporta ao ano de 2005.
Por excesso de pronúncia, uma vez que conheceu de questão que não podia.
Omissão de pronúncia por não decidir nem apreciar a ilição da presunção (artigo 39.º n.º 2 do CPPT) não obstante a Impugnante a ter apresentado tempestivamente e ao abrigo da impugnação unitária que decorre do artigo 54º do CPPT.
E que não apreciou a questão submetida respeitante à qualificação da inspeção à Recorrente como interna ou externa, não obstante o dever de conhecer tal questão.
Vejamos:
A Recorrente alega nas suas alegações a nulidade da sentença nos termos das alíneas d) e e) do art.º 615.º do CPC, por omissão e excesso e pronúncia ainda por condenação em objeto diverso do pedido.
Nos termos do nº 1 do artigo 125.º do CPPT, constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.
Por sua vez, a alínea d), do artigo art.º 615.º do CPC aplicável ao contencioso tributário por força da alínea e) do art.º 2 do CPPT, prevê a nulidade da sentença quando o juiz conheça ou não de questões de que não podia tomar conhecimento.
Quer a omissão quer o excesso de pronúncia estão relacionados com o dever que é imposto ao juiz, pelo n.º 2 do artigo 608. º do CPC, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, ressalvando aquelas que forem prejudicadas pela solução dada a outra não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
É entendimento pacífico e reiterado da jurisprudência que a omissão de pronúncia existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.
Portanto, a nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013 e 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014).
O excesso de pronúncia pressupõe que a decisão do julgador vá além do que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do decidido (causa judicandi) não se identifique com a causa de pedir ou com o pedido (causa petendi).
E nesta conformidade, será nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o juiz invoque, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).
Como se consignou no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 20.15.2015, no processo 0116/14, “(…) importa recordar Alberto dos Reis, sobre o que deve entender-se pelo vocábulo «questões» inserto no art. 660º/agora 608º do CPC, “O juiz, para se orientar sobre os limites da sua actividade de conhecimento, deve tomar em consideração, antes de mais nada, as conclusões expressas nos articulados”, pois a função específica dos articulados consiste exactamente em fornecer ao juiz a delimitação nítida da controvérsia e é pelos articulados que o juiz há-de aperceber-se dos termos precisos do litígio e da «questão ou questões, substanciais ou processuais, que as partes apresentam ao juiz para que ele as resolva», sendo que para «caracterizar e delimitar, com todo o rigor, as questões postas pelas partes, não são suficientes as conclusões que elas tenham formulado nos articulados; é necessário atender também aos fundamentos em que elas assentam. Por outras palavras: além dos pedidos, propriamente ditos, há que ter em conta a causa de pedir», não bastando «que haja coincidência ou identidade entre o pedido e o julgado: é necessário, além disso … que haja identidade entre a causa de pedir (causa petendi,) e a causa de julgar (causa judicandi)» devendo «anular-se, por vício de ultra petita, a sentença em que o juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que as partes, por via de acção ou de excepção, puseram na base das suas conclusões».
E, continua o ilustre mestre a «palavra “questões”, que se lê no art. 660º e no nº 4º do art. 668º ... designa não só o pedido, propriamente dito, mas também a causa de pedir. Desta maneira, quando o juiz julga procedente a acção com fundamento em causa de pedir diversa da alegada pelo autor, conhece de questão que o autor não submeteu à sua apreciação, isto é, de questão de que não devia tomar conhecimento, atento o disposto no art. 660º; a sentença, incorre, portanto, na nulidade prevista na 2ª parte do nº 4º do art. 668º. (...) Desde que a questão se caracteriza pelo pedido e pela causa de pedir, é claro que uma questão fundada em causa de pedir diversa da invocada pela parte … é questão diferente da que a parte submeteu ao conhecimento do tribunal...».(() Cfr. A. Reis, CPC Anotado, Vol. V, anotações ao art. 661º, pp. 53 e ss.) (…)“(destacado nosso).
No caso em análise, a Recorrente alegou que, o tribunal a quo não decide nem aprecia a ilição da presunção (artigo 39.º n.º 2 do CPPT) não obstante a Impugnante a ter apresentado tempestivamente e ao abrigo da impugnação unitária que decorre do artigo 54º do CPPT e que não apreciou a questão respeitante à qualificação da inspeção como interna ou externa.
No que concerne à ilição da presunção (artigo 39.º n.º 2 do CPPT) como melhor infra se verá a sentença recorrida pronunciou-se sobre a questão a respeito da apreciação da caducidade da liquidação do IVA pelo que não ocorreu qualquer omissão, poderá eventualmente ocorrer erro de julgamento.
No que tange à qualificação da inspeção à Recorrente como interna ou externa, pese embora, a questão esteja subjacente ao julgamento da caducidade do direito de liquidar, a Recorrente não alegou expressamente essa questão.
E como melhor infra se verá, o julgamento efetuado tem por pressuposto a existência de inspeção externa, logo eventualmente ocorreria erro de julgamento, mas não omissão de pronúncia.
Por último, e no que concerne ao ter dado como provados factos respeitantes a 2006 que estão fora do âmbito da presente ação de impugnação por só se reporta ao ano de 2005. Não se verifica qualquer excesso de pronúncia, ou condenação em objeto diverso, uma vez que, a sentença não se debruçou sobre o IVA do ano de 2006, mas tão só deu como provado a existência de várias faturas que a inspeção considerou não ter subjacente operações reais.
Não podemos olvidar que tal facto, tem interesse para caracterizar o emitente e o utilizador de faturas e conjugar com as regras de experiências de modo a formar a sua convicção.
Nesta conformidade a sentença recorrida não incorre em nulidade.

4.3. A Recorrente nas conclusões 3.ª a 21.ª questiona a existência de inspeção externa (interna). E alega que é de sublinhar a relevância da distinção entre procedimentos de inspeção tributária interna e externa, incidindo em especial sobre a necessidade de assegurar o cumprimento do princípio da substância sobre a forma, na sua vertente de relevância material dos atos inspetivos.
Conjugados ainda com o princípio da verdade material (artigo 6º do RCPIT) e da imparcialidade (constante no n.º 2 do artigo 266.º da CRP) impõem que o procedimento seja considerado como procedimento de inspeção interna.
Alega que os atos materiais de inspeção aqueles que se traduzam em verdadeiras e efetivas recolhas de informação e análise, verificação e comprovação de elementos, só podendo designar-se uma inspeção como externa quando tais condutas sejam praticadas fora das instalações da AT.
E que a Administração Fiscal ao considerar o procedimento de inspeção aqui em crise como externo violou os princípios da proporcionalidade e da adequação.

Nas conclusões 52.ª a 69.ª questiona a duplicidade de inspeções externas e do prazo de recurso da inspeção externa à Recorrente relativas às credenciais n.ºs: oi200905437; oi200901907 e oi200902219; e oi2010003712.
Vejamos:
Dispõe o n.º 1 do art.º 627.º do CPC (ex . art.º 676.º ) que “as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos.”, ou seja, o recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes, in Recurso no Novo Código de Processo Civil, 2.ª ed., 2014, Almedina, pp. 92 “(…) A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão, determina uma importante limitação ao objecto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal a quem com questões novas.
Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados à reapreciar as decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo se quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha os elementos imprescindíveis. (…)“(grifado nosso).
Assim da interpretação do n.º 1 do art.º 627.º do CPC º (ex . art.º 676.º) n. º2 do art.º 639.º e n.º 1 art.º 640.º do CPC (ex-art.ºs 685-A e 685-B) o tribunal de recurso fica impedido de conhecer questões que não tenham sido anteriormente apreciadas.
Analisada a petição inicial bem como os demais articulados constata-se que as citadas questões não foram equacionadas nem a sentença recorrida se pronunciou nem tinha o dever, uma vez que, não se tratam de questões de conhecimento oficioso.
Assim, o recurso como meio de impugnação de uma decisão judicial, apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas sendo que delas não se conhece.

4.4. A Recorrente nas conclusões – 22.ª a 27 ª e 37.ª a 50.ª -- traz à colação a questão da caducidade do IRC e IVA ambos de 2005. Alegando que o procedimento inspetivo em causa não é materialmente externo, e por essa via classificável como interno, Por outro lado, nos termos do artº 46º, nº 1, da LGT, tal prazo suspende-se durante o decurso de ato inspetivo externo, desde que o mesmo não ultrapasse o prazo de 6 meses, o qual resulta da determinação, constante do artº 36º, nº 2, do RCPIT.
No que respeita ao direito de liquidar o IVA termina decorridos que sejam 4 anos sobre o termo do ano em que se verificou o facto tributário.
Não existindo suspensão ou interrupção do prazo de caducidade esta operou em 31 de dezembro de 2009, uma vez que a liquidação reclamada, enviada por via postal simples, foi efetuada na data de 04.06.2010.
Vejamos:
Importa relembrar que o recurso tem por base somente as liquidações de IVA do ano de 2005 e respetivos juros compensatórios e como tal não está em questão as liquidações de IRC do mesmo ano, questão que este Tribunal está impedido de conhecer uma vez, que a sentença sobre ele também não se pronunciou.
Em síntese o Recorrente invoca a caducidade do direito à liquidação do IVA, do ano de 2005 em 31.12.2009, porquanto o procedimento de inspeção iniciou-se em 30.11.2009 e foi concluído em 04.06.2010, pelo que decorreram mais de 6 meses desde o seu início, o que tem por consequência a caducidade.
A Recorrente sufraga o entendimento que o procedimento inspetivo deve ser classificado de interno e não externo, uma vez que face à inspeção efetuado ao fornecedor N., Lda.., a Administração Fiscal já detinha os elementos em sua posse.
Entende que a deslocação às instalações da Recorrente é um ato formal desprovido de conteúdo material isento de objetivação em recolha de informação feita verdadeira e efetiva.
Importa de imediato saber se o procedimento de inspeção a que alude a ordem de serviço n.º OI200905437 e 0020099054438 emitidas em 12.11.2009 deve ser classificado como uma ação externa ou interna.
Para melhor enquadramento da questão, deve assinalar-se que, de acordo com o próprio relatório de inspeção, a ação inspetiva desencadeada a coberto da ordem de serviço n.º OI200905437 e 0020099054438 teve por base: ação inspetiva levada a efeito à sociedade D…., verificando-se que este era emitente de faturas falsas que não correspondiam a operações reais.
Perante tal situação a Recorrente foi notificada no âmbito da inspeção externa à N., Lda.., a coberto da carta registada, oficio n.º 306633/0506 de 2009-04-27, para que facultassem os elementos contabilísticos e extra-contabilísticos comprovativos das operações efetuadas, designadamente o seguinte:
1. Extratos das contas, bem como fotocópias das faturas, desde janeiro de 2005;
2. Cópias de contratos, Autos de Medição; Orçamentos ou de qualquer outro elemento e/ou documentos que permitam comprovar a efetiva prestação de serviços efetuada por esse sujeito passivo;
3. Identificação precisa das obras onde a prestação de serviços foi realizada, bem como do tipo específico do serviço feito e datas;
4. Cópia dos comprovativos de pagamentos dos montantes constantes em cada uma daquelas faturas (designadamente cheques frente verso); identificação dos trabalhadores que se encontravam a trabalhar por conta do sujeito passivo acima identificado, emitente das faturas em causa, beneficiários dos rendimentos tutelados pelas faturas em análise, designadamente, nome morada, NIF ou outros elementos considerados relevantes.
Em 12.11.2009 foram emitidas as ordens de serviço n.ºs OI200905437 e 0020099054438 a qual deu lugar ao inicio da visita inspetiva às instalações da Recorrente. A Administração Tributária contactou o sócio gerente, P., acedeu aos documentos contabilísticos e documentos de suporte dos exercícios de 2005 e 2006, confirmando os elementos remetidos no âmbito da inspeção ao fornecedor e citada sociedade. Foi ainda solicitada informação complementar à Caixa Geral de Depósitos e outos bancos.
O art.º 13.º do RCIPIT, na redação à data dos factos, previa que: “ Quanto ao lugar da realização, o procedimento pode classificar-se em:
a). Interno, quando os actos de inspecção se efectuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos;
b). Externo, quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso. (…)
No caso em apreço ocorreram três tipos de diligências: análise de elementos detidos serviços da Administração Tributária; análise de elementos da contabilidade do sujeito passivo; deslocação às instalações da Recorrente, com recolha de elementos e ainda para recolha de outros elementos junto entidades bancárias.
Face à alínea b) do art.º 13.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) teremos de concluir que a deslocação às instalações, para contactar o sócio gerente para esclarecimentos, declarações e recolha e apreensão de documentos constitui uma diligência externa, uma vez que se trata de uma diligência em instalações ou dependências que não pertencem aos serviços da Administração Tributária.
E, assim sendo, não temos dúvida em qualificar o procedimento de inspeção que inclua essas diligências é um procedimento externo, na medida em que foi efetuado parcialmente em instalações ou dependências de terceiros.
Pese embora, o ato inspetivo tenha tido efetuado nas instalações da Administração Fiscal, pelo confronto de documentos e dados existentes no processo inspetivo à sociedade N., Lda.. também foram desenvolvidas diligências nas instalações da Recorrente e outras entidades.
Como refere no acórdão do STA n.º 072/13 de 17.12.2019, com o qual concordamos e transcrevemos: “(…) Na verdade, a classificação de um procedimento de inspeção tributária como procedimento externo ou interno deve ter em conta, não apenas o disposto no artigo 13.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária, mas também o seu artigo 34.º, que dispõe sobre o local onde os atos de inspeção devem ser praticados. Ao aludir atrás ao lugar do procedimento de inspeção, o legislador não podia deixar de ter em mente o que regulou adiante a propósito do lugar dos atos de inspeção.
E o que deriva daquele outro dispositivo legal é que há um conjunto de atos de inspeção que são ordinariamente realizados nas instalações ou dependências onde estejam ou devam estar legalmente localizados, neles incluídos a verificação da contabilidade, dos livros de escrituração ou de outros documentos relacionados com a atividade da entidade a inspecionar.
É claro que esses atos também podem realizar-se no serviço da Administração Tributária nos termos do n.º 4 daquele artigo 34.º. Mas, tendo em conta que tal sucede a solicitação dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários ou ainda em caso de «motivo justificado que não prejudique o procedimento de inspeção», nele incluída a inexistência de instalações ou dependências da entidade inspecionada, parece seguro que, nessas situações, o lugar em que o procedimento é efetivamente realizado já não interfere com a classificação do procedimento e, por conseguinte, com o funcionamento das garantias procedimentais instituídas para o denominado procedimento externo.
Porque seria incompreensível que a realização desses atos da inspeção nos serviços da Administração Tributária fosse instituída a benefício do sujeito passivo ou dos demais obrigados tributários e pudesse redundar, por causa disso, em diminuição das garantias destes. Ou que fosse prevista para casos de necessidade (como a da inexistência de instalações da entidade inspecionada) e pudesse derivar daí a diminuição (desnecessária e, por isso, desproporcionada) dessas garantias.
Isto implica que há um conjunto de atos da inspeção que devem ser considerados diligências externas independentemente do local onde são efetivamente realizados. Neles incluídos os atos de verificação e de apreensão da contabilidade, de livros de escrituração e de outros elementos que devam estar legalmente localizados em instalações ou dependências externas. Mas também as declarações prestadas no exercício de colaboração a que estejam adstritos os contribuintes que são alvo dessas inspeções e no âmbito das mesmas.
Pelo que, incluindo as diligências realizadas no procedimento inspetivo a recolha de cópias de faturas relativas a serviços prestados pelo sujeito passivo e respetivos comprovativos de pagamento, bem como a análise de diversos elementos da contabilidade do sujeito passivo e de autos de declarações colhidas no âmbito desta, também por aqui seria de concluir que estávamos perante um procedimento externo. “(destacado nosso)
Nesta conformidade, ter-se-á de concluir que a inspeção titulada, pelas ordens de serviço n.ºs OI200905437 e 0020099054438, se trata de uma inspeção externa, sendo que sentença recorrida sustentou-se neste pressuposto.
Prosseguindo importa agora analisar se ocorreu a caducidade do direito de liquidar o tributo.
Como é sabido trata-se de IVA de vários trimestres do ano de 2005 pelo que se lhe aplicava o disposto no art.º 45.º da LGT o qual preceituava que: “
1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.
2 (…)
3 (…)
4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
5 - Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.
6- (…)”
Sendo o IVA do ano 2005, por força do n.º 4 do art.º 45.º da LGT, na versão à data dos factos, o prazo de caducidade iniciou-se em 01.01.2006 e numa situação normal completar-se-ia em 01.01.2010.
Porém preceitua o n.º 1 do art.º 46.º da LGT que “1 - o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação, acrescido do período em que esteja suspenso o prazo para a conclusão do procedimento de inspeção.”
Tendo a inspeção à Recorrente iniciado em 30.11.2009 ainda ocorreu dentro do prazo de caducidade pelo que a notificação da ordem de serviço teve a virtualidade de suspender o prazo.
A questão que importa agora apurar é de saber se a inspeção teve uma duração superior a 6 meses e em que data ocorreu a notificação efetuada à Recorrente do relatório de inspeção.
A Recorrente alega que a liquidação reclamada enviada por via postal foi efetuada em 01.06.2010 (o que se julga, por lapso, que se refere ao relatório e data de 04.06.2010).
Decorre da matéria de facto das alíneas R) a U) que o relatório foi notificado à impugnante/Recorrente, por carta registada em 25.05.2010, remetida em seu nome para o seu domicílio fiscal.
A carta registada em 25.05.2010, com o relatório não foi entregue ao destinatário em 26.05.2010, por estar ausente, encerrado, tendo sido avisado para levantar a correspondência na estação de Santo Tirso dos CTT, sendo que a referida carta registada, com o relatório foi entregue ao destinatário em 04.06.2010.
A questão que importa agora apreciar é a de saber se o relatório final foi validamente notificado e em que data.
Preceitua o art.º 39.º que “(…)- 1. As notificações efetuadas nos termos do n.º 3 do artigo 38.º presumem-se feitas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.
2 - A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida, devendo para o efeito a administração tributária ou o tribunal, com base em requerimento do interessado, requerer aos correios informação sobre a data efectiva da recepção.
Resulta
do n.º 2 do art.º 39.º do CPPT, que “a presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida”.
A sentença recorrida relativamente à questão da caducidade pronunciou-se nos seguintes termos:
“(…) Por outro lado, decorre da matéria de facto julgada provada que o procedimento de inspeção foi notificado à impugnante em 30/11/2009 e que o RIT foi notificado à impugnante por carta registada em 25/05/2010, terça-feira, pelo que tem de presumir-se notificada em 28/05/2009, sexta-feira, por força dos arts. 4.º, alínea b), Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) e 39.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT.
Com efeito, a impugnante juntando o documento constante da base de dados dos CTT que indica que a correspondência com a notificação do RIT só lhe foi entregue em 04/06/2010, invocou a elisão da presunção da notificação prevista no n.º 1 do art. 39.º do CPPT, nos termos do seu n.º 2.
Todavia, resulta de forma manifesta do referido art. 39.º, n.º 2, do CPPT, que “a presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida ” (o sublinhado é da nossa autoria). Ora resulta da impugnação e do requerimento anteriormente apresentado pela impugnante a requerer a elisão da data da notificação que a impugnante nunca invocou qualquer motivo que demonstrasse que não lhe era imputável o facto da notificação ocorrer em data posterior à presumida, isto é, a impugnante não alegou e, por isso, não provou, qualquer facto que demonstrasse que a notificação não lhe foi entregue até ao dia 28/05/2010 por motivo que não lhe era imputável. De resto, o facto da notificação não lhe ter sido entregue no dia 26/05/2010 não pode deixar de lhe ser imputável, porquanto a notificação foi remetida em dia útil para a sua sede, pelo que a correspondência não lhe foi entregue foi porque a impugnante não quis ou criou as condições para a não receber.
No entanto, e caso tivessem existido, sempre lhe competia alegar e provar os motivos que levaram a não receber a notificação até 28/05/2010 e demonstrar que não lhe eram imputáveis. Não o tendo feito, não pode elidir-se a presunção da notificação do RIT prevista no art. 39.º, n.º 1, do CPPT, no dia 28/05/2010.
Acresce que tendo-se requerido a informação os CTT, nos termos do art. 39.º, n.º 2, do CPPT, os CTT não prestaram essa informação pelo que não pode proceder-se à elisão da presunção por falta de elementos de prova, por o documento emitido pelos CTT junto aos autos a fls. 329 verso não foi a informação prestada no âmbito do procedimento de elisão da presunção.
Mas, mesmo que para este procedimento se desse relevância a essa informação, ainda assim não se poderia julgar ilidida a presunção porquanto esse documento embora demonstre que a notificação só foi entregue à impugnante em 04/06/2010, também demonstra que foi enviada em 25/05/2010 e que só não lhe foi entregue porque no dia 26/05/2010, terça-feira, dia útil, a impugnante tinha as suas instalações encerradas, pelo que a entrega só não foi conseguida por motivo imputável a ela própria. Além disso, a impugnante foi avisada nesse dia para levantar a correspondência na estação dos correios de Santo Tirso e não apresentou qualquer explicação para não proceder ao levantamento da notificação até ao dia 28/05/2010, nem qualquer motivo que não lhe fosse imputável para não a ter levantado até essa data.
Finalmente, o procedimento de afastamento da elisão da presunção da notificação intentado junto da administração tributária foi indeferido e tem de julgar-se definitivamente indeferido pela decisão do recurso hierárquico que não foi judicialmente impugnada, pelo que constitui caso decidido.
Por tudo isto, a impugnante tem forçosamente de julgar-se notificada do RIT em 28/05/2010, pelo que desde a data da notificação do início da inspeção tributária – 30/11/2009 – até à conclusão do procedimento, não decorreram mais de 6 meses, pelo que o prazo de caducidade das liquidações impugnadas tem de julgar-se suspenso nos termos do art. 46.º, n.º 1, do RGIT, pelo que não ocorreu a caducidade do direito à liquidação do IVA de 2005.
Nesta parte, a impugnação judicial tem de improceder por falta de fundamento. (…)”
E tal julgamento não nos merece qualquer reparo, nem a Recorrente se quedou em contraria este julgamento, limitando-se a repetir os fundamentos invocados na petição e não contrariando o que foi dito decidido na sentença recorrida.
A Recorrente limita-se a atacar o ato recorrido e não se debruça sobre julgamento efetuado pela sentença recorrida.
Limita-se, nas alegações bem com nas conclusões, a pugnar pela caducidade do direito à liquidação, ignorando o que sobre a questão foi decidido em primeira instância.
A Recorrente não contraria os fundamentos e a posição sustentado pelo MMº juiz na sentença, suportando na generalidade no que foi dito na petição inicial – pontos 48. º a 63º, como se a questão não tivesse sido objeto de apreciação judicial.
Importa referir que o objeto do recurso, nos termos do n. º1 do art.º 627. º do CPC são as decisões judiciais e não os atos administrativos e tributários praticados pela Administração Fiscal.
O recurso terá de demonstrar a sua discordância com a decisão proferida, ou melhor, os fundamentos por que a Recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie.
A Recorrente terá de convocar argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis sob pena de o decidido não poder ser alterado, na parte não impugnada.
Como se referiu no acórdão do STA de 11/5/2011, Processo 04/11, constituindo o recurso jurisdicional “um meio de impugnação da decisão judicial com vista à sua alteração ou anulação pelo tribunal superior após reexame da matéria de facto e/ou de direito nela apreciada, correspondendo, assim, a um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça”, estará votado ao “insucesso o recurso que se alheia totalmente da fundamentação factual e/ou jurídica que determinou a decisão de improcedência da impugnação.”
É jurisprudência deste TCAN que se em sede de recurso jurisdicional, o Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito em sede de petição inicial, não ataca o julgado, não pode o tribunal de recurso alterar o decidido pelo tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no nº 5 do artigo 635.º do CPC (Cf. TCAN n.º 01806/09.0BEBRG de 15.02.2012 e ac. do STA n.º 0508/13 de 15-05-2013).
Nesta conformidade, não sendo a questão em causa de conhecimento oficioso, não vindo questionado o julgamento em que assentou, não pode este Tribunal conhecer agora essa questão, pelo que o recurso nunca poderia obter provimento nesta parte.
Por fim, não obstante a valorização da existência de processo criminal - facto provado Y não impugnado com sucesso, que também é causa de suspensão do prazo de caducidade, - ter-se-á de concluir que tendo a Recorrente sido notificada do relatório em 28.05.2010, e não tendo ilidido a presunção da notificação a caducidade não ocorreu.
Destarte a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento, pelo que improcedem as conclusões de recurso.
4.5. Nas conclusões 70.ª a 176.ª vem a Recorrente alegar vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciado na violação do direito de audiência prévia, previsto nos artigos 60º do RCPIT e 60º da LGT do vício de fundamentação, no plano formal, por não constarem expressamente do relatório, os indícios apresentados como fundamento das liquidações ora em crise, e por não serem suficientes para suportar um juízo de falsidade quanto às faturas emitidas pela sub-empreiteira da Recorrente; do vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciadas na violação dos princípios do inquisitório e da verdade material, previstos nos artigos 58º da LGT e 6º do RCPIT; do vicio de violação de lei, por a atuação da administração tributária evidenciar erro nos pressupostos de facto e de direito, uma vez, que as transações tituladas pelas faturas desconsideradas pela AT titularem operações materiais reais.
Vejamos:
Uma vez que a Recorrente alega vários vícios, concatenandos entre si, começaremos por analisar o vicio de violação de lei, por a atuação da Administração Tributária evidenciar erro nos pressupostos de facto e de direito, uma vez que, as transações tituladas pelas faturas desconsideradas pela Administração Tributária titularem operações materiais reais.
A Recorrente nas suas prolixas e extensas conclusões, no essencial, alega que as liquidações impugnadas são ainda ilegais por erro quanto aos pressupostos de facto em que se sustentam, uma vez que foram tratados como fictícios e simulados custos que de facto e na verdade ocorreram.
Vejamos:
O art.º 20º, n.º 1, do CIVA preceitua que “Só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos (…) pelo sujeito passivo (…)
A Administração Tributária fundou a sua atuação no n.º 3 do art.º 19º e n.º5 do art.º 35.º do CIVA não aceitando a dedução do IVA.
A Administração Tributária não aceitou as faturas constantes da contabilidade da Recorrida, emitidas pela sociedade N. Lda.. por não corresponderem a aquisição bens e serviços efetivamente prestados.
Dispõe o n.º 1, do art.º 74. ° da LGT, que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Assim, compete à Administração Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas faturas foram simuladas, ou seja, recai o ónus de provar a ocorrência de factos de que deriva o direito à liquidação do IVA e o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que se arroga a Administração.
É jurisprudência firmada do Supremo Tribunal Administrativo - cfr. acórdão 026635 de 17.04.2002 - no que concerne ao IVA recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado.
Neste sentido, vide jurisprudência do STA nos acórdãos nº 0871/02 de 09.10.2002; 001483/02 de 20.11.2002; 001480/03 de 14.01.2004; 0241/03 de 30.04.2003, bem como a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Norte, nos acórdãos n.º 01834/04, de 24.01.2008; 00166/04, de 03.02.2005, 00167/04 de 04.11.2004 e 00143/04 de 11.11.2004, in www.dgsi.pt.
Isto por que é o sujeito passivo que se arroga ao direito à dedução e a administração fiscal põe em causa o facto tributário.
No entanto esta regra só funciona após a Administração ter invocado a existência de indícios fundados de que o facto tributário não ocorreu.
Como consta do acórdão n.º 026635 de 17.04.2002, “ a lei basta-se com um juízo administrativo de adequação entre os factos e valorações em que a administração diz, formalmente, suportar a sua decisão e o resultado desse juízo no sentido de se lhe afigurar ter sido declarado uma dedução superior à devida, e com a prova perante o tribunal da pertinência desse juízo ou seja, com a prova, perante o tribunal, da existência dos elementos que tornam possível ter como adequada a consideração por si feita de que o contribuinte declarou uma dedução superior à permitida pela lei.(…)”
Refere o acórdão do STA - Pleno da Secção do CT, Recurso nº 01026/02, de 07.05.2003 que Tendo a Administração Fiscal, por considerar não se terem efectivamente realizado as operações consubstanciadas em determinadas facturas, existentes na escrita do contribuinte, obstado à dedução do IVA que daquelas facturas consta, ao abrigo do disposto no artigo 19º nº 3 do CIVA, cabe ao contribuinte, no processo em que impugne a actuação da Administração, a prova dos pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.”
Prossegue o mesmo acórdão dizendo que: “…. é aquele que correntemente se vem chamando de “facturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correcta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem, na verdade, não tiveram lugar.
E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, não impõe à Administração a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protector da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios”. (destacado nosso).
Como se refere no acórdão n.º 300/11.4BEVIS de 29.09.2016 deste Tribunal, ainda inédito, cuja jurisprudência aderimos, por economia de meios, “(...) De acordo com o Código Civil, no art. 240º a simulação é a divergência entre a vontade real e a vontade declarada dos sujeitos do negócio e que entre eles haja um acordo nesse sentido (simulatório) com o intuito de enganar terceiros. Tanto pode haver simulação simples atos jurídica e em negócios jurídicos unilaterais Código Civil Anotado, 4ª Edição, Vol. I, página 227, de Pires de Lima e Antunes Varela. A simulação pode ser absoluta [quando não há vontade de realizar algum negócio] ou relativa [quando há vontade de dissimular um outro negócio], esta simulação ainda pode ser subjetiva [quando o negócio dissimulado é realizado com outro sujeito] ou objetiva [quando o negócio dissimulado tem natureza ou conteúdo diverso, como sucede com a simulação de valor] podendo ainda ser uma simulação fraudulenta.
A simulação subjetiva é aquela que se enquadra nos factos em apreciação, haja um acordo dos sujeitos no sentido de que a vontade declarada não representa a vontade real e que com ela se queira enganar alguém, no caso a Fazenda.
Quer isto dizer que a existência de acordo entre o verdadeiro prestador do serviço e o seu utilizador, no sentido de simular a celebração do negócio entre um deles apenas e terceiro com o intuito de enganar a Administração Fiscal é elemento essencial da simulação.
Estando em causa, no caso, imposto sobre o valor acrescentado deduzido com base em faturas que, alegadamente, não têm subjacente nenhuma transação, cabe à administração fiscal demonstrar a adequação entre os factos-índice recolhidos no procedimento e o juízo sobre a existência do facto que confere o direito à dedução e ao sujeito passivo demonstrar a existência do facto tributário.
Realça-se, mais uma vez, que não é necessário que a administração tributária efetue uma prova direta da simulação; como em muitos casos (talvez a maioria) há que recorrer à prova indireta, a factos indiciantes, dos quais se extraem, com auxílio das regras da experiência comum, da ciência e da técnica, uma ilação consistente.
Tal circunstância entra na problemática da repartição do ónus da prova, sobre a qual dispõe o art. 74º, nº1, da LGT. (…)”
Transpondo para este acórdão a jurisprudência supra citada teremos de concluir que a Administração não precisa de demonstrar o intuito, os acordos simulatórios quer o “animus nocendi” em desfavor do Estado nas relações ente a Recorrente e o seu fornecedor.
No caso em apreço a sentença recorrida considerou que atendendo aos elementos apurados em sede de inspeção entre si conjugados, que a Administração Fiscal fez prova dos pressupostos legais que legitimam a correção e subsequente liquidação impugnada.
Desde já se diz que a sentença recorrida não merece qualquer reparo, uma vez que, fez uma correta apreciação dos indícios carreados para o processo pela Administração Fiscal.
O relatório de inspeção, datado de 24.05.2010 sustenta-se em indícios recolhidos junto do emitente das faturas e indícios recolhidos no utilizador aqui Recorrente.
Como resulta da matéria de facto provada e não impugnada, relativamente aos indícios recolhidos junto do emitente, a Administração Fiscal, apurou, que no ano de 2005:
- Não constavam quaisquer declarações de remunerações de trabalhadores à Segurança Social;
- Desde 2002 não cumpria às suas obrigações fiscais, nomeadamente não entregou as declarações periódicas de IVA e declarações de rendimentos Modelo 22 - IRC, relativas aos anos de 2005;
Em 15.10.2007 os Serviços Centrais da DGCI cessaram oficiosamente a atividade do sujeito passivo reportado ao ano de 2002;
- O domicilio fiscal da sociedade era uma moradia unifamiliar, residência dos sócios gerentes;
- A sociedade N., Lda.. não era possuidora qualquer Alvará ou Titulo de Registo para o exercício da atividade de construção.
- M. afirmou que não possuía quaisquer documentos contabilísticos, tendo entregue todos os documentos, incluindo os livros de faturas ao Sr. P.., gerente da D., Lda.. entre 2002 e 2003.
Informou que a partir dessa data (2002 a 2003) deixou de prestar qualquer serviço de construção civil, quer a título individual quer através da sociedade, sendo funcionário pontual da D. e tendo transitado para esta os funcionários e imobilizado (camião, carrinhas, betoneiras escoramentos, paneis metálicos etc.) da N., Lda..
A N., Lda.., nas datas das emissões das faturas não possuía estrutura empresarial, nem ficou demonstrado que recorreu a uma terceira entidade para realizar as referidas prestações de serviços.
Quantos aos indícios apurados junto do utilizador, a Administração Fiscal verificou que a Recorrente não exibiu comprovativos da totalidade dos pagamentos não cumprindo o disposto no n.º 3 do art.º 63.º-C da Lei Geral Tributária (LGT), onde se prevê que "os pagamentos respeitantes a faturas ou documentos equivalentes de valor igual ou superior a 20 vezes a retribuição mensal mínima devem ser efetuados através de meio de pagamento que permita a identificação do respetivo destinatário, (sendo os limites em: 2005 - € 7.494,00 e 2006 - € 7.718,00).
Não exibiu cópias da totalidade dos cheques emitidos à N., Lda..
Não identificou os trabalhadores que supostamente prestaram os serviços, nem apresentaram autos de medição, ou outros elementos que evidenciassem o controlo de pessoal afetos cada obra ou sub-empreiteiro N., Lda..; n.º de pessoas, categorias profissionais, dias e horas de trabalho, bem como qualquer correspondência trocada.
Não demonstrando assim que os serviços faturados foram efetivamente prestados por N., Lda.., limitando-se a indicar o interlocutor P., sem apresentar qualquer elemento comprovativo dessa afirmação.
Relativamente aos meios de pagamento, e relativamente aos cheques emitidos em 2005, pela Recorrente foram endossados/depositados em conta bancária da sociedade P. , Lda.. que tem por responsável P.. ou ainda em contas à ordem particular de P., sócio-gerente da Recorrente.
A Administração Fiscal conclui que existiam sérios e credíveis indícios de que as faturas n.ºs 142, 143, 144, 145, 149, a 151, 163 a 165, 172 a 174, emitidas pela " N., Lda.., no ano de 2005 num total de € 350 780,00 contabilizadas na escrita da Recorrente não correspondem a transmissão de bens/serviços efetivamente prestados.
Nesta conformidade, teremos de concluir tal como a sentença recorrida, que a Administração Tributária recolheu indícios sérios da inexistência de operações reais, ou seja, da ocorrência de factos tributários, de que deriva o direito à dedução do IVA.
Face a esta circunstância competia ao sujeito passivo o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que aquela se arroga.
A Recorrente não logrou com sucesso, impugnar a matéria de facto, como supra se decidiu, pelo que perante a prova levada ao probatório importa verificar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito e facto.
Resulta da matéria de facto provada que a Administração Fiscal na inspeção efetuada à Recorrente, desconsiderou as faturas emitidas por sociedade N., Lda.., no ano de 2005, no valor de € 350 780,00 valor sem IVA como decorre dos factos provados.
Resultou ainda não provado que a sociedade N., Lda.., prestou à Impugnante os serviços que constam das faturas elencadas no facto provado em E) e que as faturas emitidas pela N., Lda.., descritas na matéria de facto provado e, relativas ao exercício de 2005, registadas na contabilidade da Impugnante/Recorrente, titulam operações económicas reais.
Destarte, recaindo o ónus da prova sobre a Recorrente, competia-lhe demonstrar que a materialidade das operações económicas subjacentes às faturas, nomeadamente, que os fornecimentos de mão de obra / prestações de serviços se haviam efetivado com a sociedade emitente, e não com qualquer outra entidade, as quantidades em causa, local, natureza, preços praticados em relação ao preço/hora dos serviços que estariam em causa em cada uma das faturas.
Nomeadamente que foram fornecidos os serviços a que correspondem os documentos contabilísticos que suportam as respetivas transações pelos preços e valores nelas indicadas.
Cabia, pois, à Recorrente demonstrar a existência das operações materiais tituladas pelas faturas desconsideradas, nomeadamente, uma pormenorizada e detalhada descrição dos serviços (natureza, quantidades, locais e datas da realização das operações subjacentes às faturas), trabalhadores utilizados, meios de transporte entre outros elementos.
Nesta conformidade, as faturas em crise não conseguem, só por si, comprovar a realidade que se pretende demonstrar, nem mesmos outros elementos documentais constantes da contabilidade, junto ao processo, bem como a prova testemunhal produzida.
Resulta assim que a Recorrente não logrou demonstrar as prestações de serviços que constam das faturas e que as mesmas foram fornecidas pelos emitentes das mesmas, ou outrem, não tendo feito tal prova a impugnação teria de improceder, pelo que bem decidiu a sentença recorrida.

Acresce ainda salientar que, e como consta do relatório de inspeção, e ajuizado pela sentença recorrida, as correções à matéria tributável da Recorrente também ocorreram, por se verificar violação do art.º 35.º, n.º 5, do CIVA, uma vez que as faturas com os n.ºs 142, 143, 144, 145, 149, a 151, 163 a 165, 172 a 174, todas do ano de 2005, em que sustentam as respetivas liquidações adicionais, não cumprem os requisitos formais.

Consequentemente o presente recurso, não poderia proceder, uma vez que, era caso decidido.

Como é sabido, resulta da conjugação do n.º 2 do art.º 19.º e n.º 5 do art.º 35.º do CIVA que só confere direito à dedução o imposto mencionado em faturas e documentos equivalentes passados em forma legal, desde que cumprindo os requisitos do n.º 5 do art.º 35.º CIVA.

Destarte, ter-se-á de concluir que a Administração Fiscal cumpriu o ónus que estava obrigada, demonstrando os pressupostos da sua atuação, com a recolha de indícios, objetivos e relevantes que a faturação aqui em causa, para além de não cumprir os requisitos legais previsto no n.º 5 do art.º 35.º do CIVA, não correspondem a aquisição de serviços reais e efetivamente prestados.

Nesta conformidade o recurso terá de improceder.

Por fim, importa referir que ao longo das conclusões 70.ª a 176.ª envolvido com a questão de falta de pressupostos é alegado ainda o seguinte: (i) vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciado na violação do direito de audiência prévia, previsto nos artigos 60º do RCPIT e 60º da LGT; (ii) do vício de fundamentação, no plano formal, por não constarem expressamente do relatório, os indícios apresentados como fundamento das liquidações ora em crise, e por não serem suficientes para suportar um juízo de falsidade quanto às faturas emitidas pela sub-empreiteira da Recorrente; (iii) do vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciadas na violação dos princípios do inquisitório e da verdade material, previstos nos artigos 58º da LGT e 6º do RCPIT.

No que concerne à questão da violação do direito de audiência prévia, previsto nos artigos 60.º do RCPIT e 60.º da LGT a sentença tratou a questão no item (iv) com o título “A falta de resposta ao exercício do direito de audição”, em conformidade com o explanado nos pontos n.º 129.º a 133.º. na petição inicial.

A sentença recorrida analisou a questão e concluiu que: o “(…) RIT apreciou as questões suscitadas pela impugnante, no exercício do direito de audição e explicou o motivo porque não realiza as diligências de prova requerida pela impugnante, pelo que inexiste, de todo, qualquer violação quer do principio do contraditórios quer do exercício do direito de audição.” (…)”.

No que concerne ao vício de fundamentação, no plano formal, por não constarem expressamente do relatório, os indícios apresentados como fundamento das liquidações ora em crise, e por não serem suficientes para suportar um juízo de falsidade quanto às faturas emitidas pela sub-empreiteira da Recorrente bem como o vício de preterição de formalidades essenciais no âmbito do procedimento inspetivo, consubstanciadas na violação dos princípios do inquisitório e da verdade material, previstos nos artigos 58º da LGT e 6º do RCPIT foi também tratado na sentença recorrida.

A sentença no item (iii) com o título “A falta de fundamentação por violação dos princípios do inquisitório e da verdade materialanalisou a questão em conformidade com o explanado na petição inicial, tendo concluído que as liquidações impugnadas e o respetivo RIT em que se fundamentam estão cabalmente fundamentadas, não concedendo provimento ao vício alegado bem como não foram violados os princípios do inquisitório e da verdade material.

A Recorrente quer nas motivações das alegações quer nas conclusões limita-se a alegar aquilo que defendeu na petição inicial, sem cuidar de esclarecer o Tribunal de recurso em que medida o julgamento efetuado pelo tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento.

A Recorrente não questiona a sentença recorrida, ignorando o que nela foi decidido, não contrariando os fundamentos e a posição sustentado pelo MMº juiz.

Como supra se referiu no ponto 4.4 deste acórdão, para onde se remete, que o objeto do recurso, nos termos do n. º 1 do art627. º do CPC são as decisões judiciais e não os atos administrativos e tributários praticados pela Administração Fiscal.

O recurso terá de demonstrar a sua discordância com a decisão proferida, ou melhor, os fundamentos por que a Recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento deles e os aprecie.
Nesta conformidade, não vindo questionado o julgamento em que assentou, não pode este Tribunal conhecer agora essa questão.


4.5. E assim formulamos as seguintes conclusões/Sumário:

I. Resulta da conjugação dos art.ºs 662.º e 640.º do CPC que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa e desde que o recorrente especifique nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios e a decisão que, no seu entender deve ser proferida.
II. Decorre da interpretação do n.º 1 do art.º 627.º do CPC º (ex . art.º 676.º) n. º2 do art.º 639.º e n.º 1 art.º 640.º do CPC (ex-art.º s 685-A e 685-B) o tribunal de recurso fica impedido de conhecer questões que não tenham sido anteriormente apreciadas.
III. Dispõe o n.º 1, do art.º 74.° da LGT, que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
IV. Assim, compete à Administração Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas faturas foram simuladas, ou seja, recai o ónus de provar a ocorrência de factos de que deriva o direito à liquidação do IVA e o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que se arroga a Administração.



5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.

Após trânsito em julgado do presente acórdão remeta-se cópia aos Serviços do Tribunal Judicial da Comarca de Porto, juízo Instrução Criminal de Matosinhos, melhor identificado nos autos.

Custas pela Recorrente.


Porto, 07 de maio de 2020


Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes