Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01830/08.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/22/2018
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IMI
DOMÍNIO PÚBLICO HÍDRICO
CONCESSIONÁRIO
Sumário:Adquirindo o concessionário ou subconcessionário o estatuto de proprietário das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo como na matriz predial, como prédios urbanos, é ele sujeito passivo de IMI, nos termos do art. 8º nº 1 do Código do IMI.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:V..., S.A.
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 29-08-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida pela sociedade “V…, Lda.”, NIPC 505734028, na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com a liquidação de IMI referente ao ano de 2007, datada de 13/3/2008, no montante de € 48.099,00, relativa à inscrição matricial nº U-O....

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 168-174), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
I - O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida no processo supra referenciado que julgou procedente a impugnação judicial, anulando a liquidação impugnada, por se verificar, salvo o devido respeito por melhor opinião, que a mesma padece de erro de julgamento, quanto à matéria de facto, ao considerar que a liquidação de IMI em causa incidiu sobre as parcelas de terreno subconcessionado e, por essa razão, afigurando-a ilegal, reconhecendo que tal liquidação deveria ter incidido apenas sobre as construções edificadas pela Impugnante.
II - Na verdade, verifica-se que a liquidação impugnada incidiu apenas sobre as construções edificadas pela Impugnante nas ditas parcelas de terreno, construções que compõe o prédio urbano em causa sujeito a tributação em sede de IMI, constituído em “propriedade total sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente”, afeto a serviços, com 4 pisos e 60 divisões, de acordo com o teor da correspondente inscrição matricial.
III – Conforme resulta da douta sentença recorrida “a Impugnante outorgou com o Município de Viana do Castelo a escritura de subconcessão de uso privativo de uma parcela de domínio público hídrico, levada ao probatório em 2, na qual construiu um imóvel destinado à sua actividade de hotelaria, esse sim susceptível de tributação em IMI.”;
IV – No caso em apreço, é a referida construção destinada a atividade hoteleira que constitui o prédio sobre que incidiu a liquidação relativa à 2.ª prestação de IMI, do ano de 2007, em causa nos presentes autos, a que se refere a douta sentença no ponto 5, da matéria provada.
V – O Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou sobre a questão em apreciação, nos acórdãos proferidos em 2010-06-02, no processo n.ºs 027/10, e em 2015-01-14, no processo n.º 0280/12, em que estavam em causa situações materiais em tudo idênticas à presente, tendo concluído no sentido de que, “Adquirindo o concessionário ou subconcessionário o estatuto de proprietário das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo predial como na matriz predial, como prédios urbanos, é ele sujeito passivo de IMI, nos termos do nº 1 do art. 8º do Código do IMI.” (disponível em www.dgsi.pt).
VI - Em conformidade com o exposto, por incorreta apreciação e valoração da matéria de facto constante dos autos, terá sido feito um errado julgamento.
***
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e a impugnação julgada improcedente, com todas as consequências legais.”

A Recorrida V…, Lda., não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resume-se, em suma, em saber se a liquidação de IMI em causa incidiu sobre as parcelas de terreno subconcessionado e apreciar da legalidade da incidência do aludido imposto no caso de estarem em causa as construções edificadas pela Impugnante.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1- A Impugnante, “V…, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº 5…, em 9/11/2001, apresentou a declaração de início de actividade que se encontra a fls. 29 e se dá por reproduzida, na qual fez constar a actividade de “hotéis e restaurante” (55111) e “arrendamento bens imobiliários” (70200).
2- No dia 11/1/2002, no Notariado Privativo do Município de Viana do Castelo foi outorgada a escritura de subconcessão de uso privativo de uma parcela de domínio público hídrico, por 30 anos, documento que se encontra a fls. 33/37 e se dá por reproduzido, no qual figuram como outorgantes o Município de Viana do Castelo e a sociedade comercial “V…, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº 5….
3- A Impugnante, em 15/3/2006, apresentou o Modelo 1 de IMI que se encontra a fls. 2 do processo administrativo apenso e se dá por reproduzido, na qualidade de superficiária, em relação ao prédio urbano omisso sito na Avenida…– Parque Empresarial…, em Monserrate.
4- Dá-se por reproduzido o alvará de licença de utilização nº 1/2005, emitido pelo Município de Viana do Castelo em 27/5/2005, relativo ao empreendimento turístico - estabelecimento hoteleiro “Hotel…”, que consta do documento de fls. 6 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido.
5- A Autoridade Tributária remeteu à Impugnante o documento que se encontra a fls. 26 e se dá por reproduzido com vista ao pagamento da 2ª prestação de IMI do prédio inscrito na matriz predial urbana de Viana do Castelo sob o artigo U-O..., referente a 2007, no montante de € 24.049,50, a pagar no mês de Setembro de 2008.
6- A presente impugnação foi apresentada em 22/12/2008.
FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir.
*
A convicção do Tribunal estribou-se na análise crítica da documentação junta aos autos, referida no probatório em relação a cada um dos factos aí enunciados, bem como na factualidade alegada e não impugnada, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil.”
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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise do recurso jurisdicional “sub judice”, sendo que a Impugnante questionou a liquidação impugnada por não ser titular do direito de propriedade sobre a parcela em causa, que se integra no domínio público hídrico, nem superficiária, mas apenas concessionária da mesma.

Para atender a pretensão da ora Recorrida, a decisão recorrida ponderou que:

“…
Conforme decorre do probatório a Impugnante não é proprietária, nem usufrutuária da parcela em causa da qual emergiu a liquidação impugnada, que se integra no domínio público hídrico. Outrossim, a Impugnante só é proprietária dos edifícios aí construídos.
Por outro lado, o artigo 1524º do Código Civil prescreve que “O direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações.”
Deste modo, o direito de superfície desdobra-se em duas vertentes: “Por um lado, o superficiário é, ou virá a ser, proprietário da obra ou plantação. É de um verdadeiro direito de propriedade, sujeito à respectiva disciplina se trata. [...] A outra face do estatuto real do superficiário é a que se refere ao direito deste em relação ao terreno ou solo, no qual ficam implantadas a obra ou as árvores que lhe pertencem [...]. O art. 1524.º do Código Civil aponta inequivocamente como elemento fundamental (típico, específico) da superfície a relação do superficiário com o solo. É esse, de facto, não só o aspecto essencial, mas o elemento irredutível da superfície, visto a propriedade superficiária não existir enquanto a obra se não constrói ou a plantação não se faz” (Código Civil Anotado, Pires de Lima/Antunes Varela, vol. III, em anotação ao artigo 1524º).
Este instituto pressupõe a existência de uma “propriedade superficiária” a par da propriedade do solo, já que “é incontroverso que os poderes do superficiário sobre o implante se moldam nos do proprietário” (Carvalho Fernandes, “Lições de Direitos Reais”, p. 366).
Destarte, “o direito de superfície não se reconduz a nenhuma das figuras jurídicas que tradicionalmente faziam parte do direito das coisas, porque é um direito «novo e complexo», ele próprio e em si mesmo «típico», ainda que podendo abranger – como normalmente acontece – os dois referidos momentos: o inicial, configurando como direito potestativo ou faculdade de construir e o ulterior que na prática se traduz num (por assim dizer) direito de propriedade sobre o edificado, sem que os tais «dois momentos» lhe retirem a sua unidade e especificidade próprias” (J.A.Mouteira Guerreiro, “Reflexões sobre o Direito de Superfície, a sua Titulação e Registo, os Volumes e o Conceito de Prédio Urbano”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto, 2009, p. 217).
Conforme decorre do artigo 8º, nº 2, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, acima transcrito, o sujeito passivo deste tributo só pode ser o proprietário, usufrutuário e o superficiário, e tratando-se de uma norma de incidência não pode interpretar-se analogicamente por forma a abranger o concessionário ou o subconcessionário do uso privativo do domínio hídrico posto que o artigo 11º, nº 4, da Lei Geral Tributária prescreve que “as lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica”, e o princípio constitucional da legalidade fiscal ínsito no artigo 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa não permite a colmatação de lacunas mediante o recurso à analogia quando esteja em causa uma norma de incidência fiscal (Acórdão do STA de 2/6/2010, Processo nº 27/10, Acórdão do STA de 19/10/2011, Processo nº 351/11, e Acórdão do STA de 14/1/2015, Processo nº 280/12).
Na verdade a Impugnante outorgou com o Município de Viana do Castelo a escritura de subconcessão de uso privativo de uma parcela de domínio público hídrico, levada ao probatório em 2, na qual construiu um imóvel destinado à sua actividade de hotelaria, esse sim susceptível de tributação em IMI.
Porém, os terrenos do domínio público não podem ser objecto de contratos de natureza privada, designadamente contratos de constituição de direito de superfície. Efectivamente, o contrato outorgado entre a Impugnante e o Município de Viana do Castelo é um contrato administrativo de concessão/subconcessão, celebrado ao abrigo do estatuído no artigo 18º do Decreto-Lei nº 468/71, de 5 de Novembro, vigente à data, e entretanto revogado pela Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro, que aprovou as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas, que no artigo 61º possibilita a utilização privada de terrenos do domínio público hídrico mediante concessão.
Todavia, os contratos de concessão de uso privativo do domínio público hídrico não conferem ao particular o estatuto de superficiário tal como previsto no artigo 1527º do Código Civil. Outrossim, o concessionário fica sujeito a um regime jurídico autónomo e distinto do superficiário.
Consequentemente, uma vez que a parcela de terreno em causa integra o domínio público hídrico, e a Impugnante não pode considerar-se como superficiária, a liquidação de IMI que incidiu sobre as parcelas de terreno subconcessionado é manifestamente ilegal e não pode manter-se posto que tal liquidação deveria ter incidido apenas sobre as construções edificadas pela Impugnante. …”.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que o presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida no processo supra referenciado que julgou procedente a impugnação judicial, anulando a liquidação impugnada, por se verificar, salvo o devido respeito por melhor opinião, que a mesma padece de erro de julgamento, quanto à matéria de facto, ao considerar que a liquidação de IMI em causa incidiu sobre as parcelas de terreno subconcessionado e, por essa razão, afigurando-a ilegal, reconhecendo que tal liquidação deveria ter incidido apenas sobre as construções edificadas pela Impugnante.
Na verdade, verifica-se que a liquidação impugnada incidiu apenas sobre as construções edificadas pela Impugnante nas ditas parcelas de terreno, construções que compõe o prédio urbano em causa sujeito a tributação em sede de IMI, constituído em “propriedade total sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente”, afecto a serviços, com 4 pisos e 60 divisões, de acordo com o teor da correspondente inscrição matricial e conforme resulta da douta sentença recorrida “a Impugnante outorgou com o Município de Viana do Castelo a escritura de subconcessão de uso privativo de uma parcela de domínio público hídrico, levada ao probatório em 2, na qual construiu um imóvel destinado à sua actividade de hotelaria, esse sim susceptível de tributação em IMI.”;
No caso em apreço, é a referida construção destinada a actividade hoteleira que constitui o prédio sobre que incidiu a liquidação relativa à 2.ª prestação de IMI, do ano de 2007, em causa nos presentes autos, a que se refere a douta sentença no ponto 5, da matéria provada.

E tem toda a razão.
Com efeito, só uma leitura apressada da situação pode justificar o exposto na decisão recorrida, porquanto, a notificação da liquidação em apreço é inequívoca quanto à referência ao prédio inscrito sob o nº U-O..., que a Impugnante aponta no art. 88º da petição inicial como o “… “PRÉDIO URBANO - SERVIÇOS”, inscrito sob o número U-O..., correspondente ao bem imóvel construído sobre o Domínio Público Hídrico, que deu origem à liquidação de imposto aqui impugnada …”.
Aliás, a Impugnante começa por apontar (art. 1º da petição inicial) que foi notificada da liquidação, datada de 13 de Março de 2008, relativa ao Imposto Municipal de Imóveis, para o ano de 2007, num montante total de imposto de 48.099,00 €, decorrente da fixação de um Valor Patrimonial Tributário de 9.619.800,00 €, relativo à inscrição sob o nº U-O..., correspondente a um “prédio urbano”, sito no Município de Viana do Castelo.
Ora, tal como emerge do PA apenso, tal avaliação é feita na sequência de declaração (Modelo 1 do IMI) da ora Recorrida que se refere a Prédio Novo depois avaliado como constituído em “propriedade total sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente”, afecto a serviços, com 4 pisos e 60 divisões, de acordo com o teor da correspondente inscrição matricial, não subsistindo qualquer dúvida de que é a tal construção destinada a actividade hoteleira que constitui o prédio sobre que incidiu a liquidação relativa à 2.ª prestação de IMI, do ano de 2007.

E quanto à substância da liquidação em apreço.
Sobre esta matéria, cumpre ter presente o exposto no Ac. do S.T.A. de 14-01-2015, Proc. nº 0280/12, www.dgsi.pt, que envolve a ora Recorrida e o prédio descrito nos autos, do qual se retira que “… É, certo que é inquestionável que o terreno onde a impugnante procedeu à edificação do prédio constitui um terreno do domínio público hídrico.
Ora, o direito de superfície (isto é, a concessão para plantar ou edificar em terreno alheio) é um direito real inerente a um imóvel, na maioria dos casos um prédio rústico, e que, no caso vertente, teria necessariamente de incidir sobre a parcela de terreno do domínio público.
E, como é sabido, os terrenos do domínio público não podem ser objecto de contratos de natureza privatística, designadamente de contratos de constituição de direito de superfície. Eles apenas podem ser objecto de contratos administrativos de concessão, como resulta expressamente do DL nº 468/71, de 5/11, que prevê o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico.
Mas, embora sendo discutível se o direito do concessionário tem natureza jurídica de um verdadeiro direito real sobre coisa alheia, ou se tem natureza jurídica de direito pessoal de gozo sobre coisa pública (……), o que nos parece manifesto é que os contratos de concessão de uso privativo do domínio hídrico por particulares não conferem a estes o estatuto de superficiários (direito real típico previsto no art. 1524º e sgts. do CCivil), estando os respectivos concessionários sujeitos a um regime jurídico autónomo e diferenciado daquele a que está sujeito o superficiário (embora os respectivos regimes possam ter algumas semelhanças em determinados aspectos) (……)
Com efeito «a dominialidade pública não obsta a que parcelas determinadas dos terrenos públicos sejam «destinados a usos privativos» (art. 17º do citado DL 468/71).
Utilização privada essa que, atribuída mediante contrato administrativo, fica, como se disse, sujeita a um regime jurídico próprio, previsto no citado diploma legal e que é bem distinto do regime previsto no Código Civil para o direito de superfície.
Ora, de acordo com tal regime, as concessões, enquanto se mantiverem, conferem aos seus titulares «o direito de utilização exclusiva, para os fins e com os limites consignados no respectivo título constitutivo, das parcelas dominiais a que respeitam», abrangendo poderes tais como os de «construção, transformação ou extracção» (art. 20º) e caso a utilização permitida envolver a realização de obras ou alterações, o direito do uso privativo abrange poderes de construção, transformação ou extracção, conforme os casos, «entendendo-se que tanto as construções efectuadas como as instalações desmontáveis se mantêm na propriedade do titular da licença ou da concessão até expirar o respectivo prazo» (nº 2 do art. 21º, com sublinhado nosso), podendo mesmo, embora com autorização da entidade que conferiu a concessão, transmitir para outrem essas construções ou hipotecá-las (art. 25º), tendo direito, em caso de rescisão da concessão, a uma indemnização equivalente ao custo das obras realizadas e das instalações fixas que ainda não possa estar amortizado (nº 2 do art. 28º) e sendo que uma vez expirado esse o prazo «as obras executadas e as instalações fixas revertem gratuitamente para o Estado» (art. 21º e 26º, todos do citado DL). Ou seja, em termos de conteúdo do direito de uso privativo, o direito do concessionário sobre os edifícios ou prédios que tenha construído na área afectada ao seu uso privativo é, nos termos da lei, um verdadeiro direito de propriedade. E, assim sendo, adquirindo o concessionário ou subconcessionário o estatuto de proprietário das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo predial como na matriz predial, como prédios urbanos, torna-se inquestionável que ele é o sujeito passivo de IMI, nos termos do nº 1 do art. 8º do Código do IMI, segundo o qual «O imposto é devido pelo proprietário do prédio em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeitar», não havendo qualquer interpretação extensiva ou aplicação analógica do preceito (só ocorre interpretação extensiva quando a solução para uma determinada hipótese não está contida no texto da lei mas é abrangida pelo seu espírito e só ocorre integração analógica quando a solução de determinada hipótese não se encontra nem na letra nem no espírito da norma) nem, consequentemente se verificando as invocadas inconstitucionalidades.»
Em suma e independentemente de existência de algumas limitações ao direito de propriedade, a verdade é que face ao regime estabelecido no DL 468/71, tendo a recorrente adquirido, durante o período da concessão, o estatuto de proprietária das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo predial como na matriz predial, como prédios urbanos, torna-se inquestionável que ela é o sujeito passivo de IMI, nos termos do nº 1 do art. 8º do Código do IMI, não sendo através do recurso a qualquer integração analógica do normativo em causa (art. 8º do CIMI) que se há-de concluir que a mesma é sujeito passivo do imposto. …

7.5 Da inconstitucionalidade por violação do disposto nos artsº 103º, nº 2 e 266º da CRP e por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva e da propriedade privada - art°s 13°/2, 104°/3 e 62º/2 da CRP.
No que tange a esta matéria as questões suscitadas pela recorrente consistem em saber se tal integração analógica das normas de incidência, designadamente do conteúdo do artº 8º, ns. 1 e 2 do CIMI, integra ilegalidade e inconstitucionalidade por violação do disposto nos artsº 103º, nº 2 e 266º da CRP (conclusões 14º e 15º das alegações).
E ainda se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento ao não reconhecer a inconstitucionalidade, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva e da propriedade privada - art°s 13°/2, 104°/3 e 62º/2 da CRP quanto à tributação dos direitos reais menores, no âmbito do IMI (art. 8°/2 do CIMI).
Ora, como já se deixou exarado, face ao regime estabelecido no DL 468/71, tendo a recorrente adquirido o estatuto de proprietária das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo predial como na matriz predial, como prédios urbanos, torna-se inquestionável que ela é o sujeito passivo de IMI, nos termos do nº 1 do art. 8º do Código do IMI.
Ou seja, não é através do recurso a qualquer integração analógica do normativo em causa (art. 8º do CIMI) que se há-de concluir que a recorrente é sujeito passivo do imposto, como aliás também não foi através da integração analógica que a sentença recorrida chegou à conclusão que a impugnante devia ser tida como sujeito passivo do tributo em causa nos presentes autos.
Assim sendo fica irremediavelmente prejudicado o conhecimento da alegada inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade (arts. 103º, nº 2 e 266º da CRP) uma vez que se concluiu pela não verificação de integração analógica.
Do mesmo modo não se vislumbra qualquer violação dos princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e da propriedade privada.
Com efeito, e como já se sublinhou no citado Acórdão 351/11, quanto ao princípio da igualdade, considerando-se a recorrente proprietária das instalações, paga imposto nos mesmos termos dos outros proprietários de prédios urbanos.
Quanto ao princípio da capacidade contributiva, também não se vê a sua ofensa, já que não se exige imposto que não seja exigido a outros contribuintes com igual capacidade contributiva - proprietários de imóveis.
Finalmente, também não se vê onde esteja a violação do princípio da propriedade privada, se essa propriedade lhe é reconhecida pela lei (DL 468/71).
7.6 Do alegado erro de julgamento na interpretação dos artsº 1º e 2º do CIMI.
Sobre esta questão alega a recorrente que a sentença labora em erro de julgamento na interpretação dos artsº 1º e 2º do CIMI, porquanto, na sua tese, inexiste um património na sua esfera jurídica da R., correspondente a prédios, que pudesse determinar a sua tributação em IMI (arts. 1° e 2° do CIMI) - cf. artigos 28 e 29 das conclusões das alegações de recurso.
Esta argumentação também não procede e a ela já se deu resposta nos pontos antecedentes.
Efectivamente face ao regime estabelecido no DL 468/71, a recorrente adquiriu, durante o período de duração da concessão, o dito estatuto de proprietária das construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público. E se assim é, a recorrente é detentora de um património correspondente às construções que edificou no exercício do direito de uso privativo do terreno do domínio público, as quais são objecto de descrição autónoma tanto no registo predial como na matriz predial, como prédios urbanos, património esse que é objecto de incidência de IMI. …”.
Perante a bondade do que fica exposto, relativamente ao qual não se vê razão para divergir, até porque a matéria em apreciação nestes autos é essencialmente idêntica e tendo presente que não subsiste qualquer dúvida de que é a tal construção destinada a actividade hoteleira que constitui o prédio sobre que incidiu a liquidação relativa à 2.ª prestação de IMI, do ano de 2007, tal significa que a sentença recorrida não pode manter-se, devendo ser revogada por via da procedência do presente recurso.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a presente impugnação judicial.
Custas pela Recorrida.
Notifique-se. D.N..
Porto, 22 de Março de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos