Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00535/06.1BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/29/2019
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO PORTUGUÊS; PRESCRIÇÃO DO DIREITO; SUB-ROGAÇÃO; INÍCIO DA CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO; EXTENSÃO DO Nº.3 DO ARTIGO 498º DO CPC ÀS PESSOAS COLECTIVAS;
ARTIGOS 289º, Nº.2, 306º; 323º, 325º, 327 E 498º DO CC; DECRETO-LEI Nº. 48051, DE 21.09.1967.
Sumário:
I- Configurando a presente ação uma ação administrativa para efetivação de responsabilidade civil extracontratual dos Réus, atendendo à data dos factos em discussão, é de aplicar o artigo 2.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e das demais Entidades Públicas no domínio dos atos de gestão pública aprovado pela Decreto-Lei nº. 48051, de 21 de novembro de 1967, que dispõe que: “O Estado e demais pessoas coletivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de atos ilícitos culposamente praticados pelos respetivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício “.
II- O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido [cf. artigo 306.º n.º 1 do CC], correndo ininterruptamente, salvo ocorrendo motivo de suspensão ou interrupção, previsto na lei.
III- Não é pelo facto de a pessoa coletiva não ser responsabilizada penalmente, nem pelo facto de não se terem individualizado na ação as pessoas físicas sobre as quais deve recair a censura pela omissão causadora do acidente e dos danos, que deixa de se aplicar a previsão do nº 3 do artigo 498º do CCiv. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:JPSSMD
Recorrido 1:ICERR - INSTITUO PARA A CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE VIÁRIA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
JPSSMD, devidamente identificado nos autos, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferido no âmbito da presente Ação Administrativa Comum que o Recorrente intentou contra o MUNICIPIO DE VALONGO e contra o ICERR - INSTITUO PARA A CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE VIÁRIA - DIRECÇÃO DE ESTRADAS DO PORTO, que julgou procedente a invocada exceção de prescrição do direito do Autor, tendo, consequentemente, absolvendo os Réus do pedido.
Em alegações, o Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso:
“(…)
1. O presente recurso de apelação vem interposto da douta sentença proferida a fls., dos autos, a qual, julga procedente a exceção perentória da prescrição do direito de indemnização do Autor e, consequentemente, absolve os Réus do Pedido.
2. A douta decisão em causa não faz, com o devido respeito, uma correta interpretação dos factos e adequada aplicação do direito.
II. NOTA PRÉVIA
3. Não se mostrando a Justiça indissociável da realidade, importa referir que o Autor, ora Apelante, foi vítima de um acidente (que inquestionavelmente lhe provocou lesões), a culpa e responsabilidade do ente público já foram determinadas no âmbito do processo cível que correu termos sob o n.° 999/2002, no Tribunal Judicial de Valongo (volvidos cerca de 12 anos desde a data da instauração da ação), foi vítima da morosidade da Justiça, foi vítima da divergência jurisprudencial sobre uma questão técnico-jurídica e vê-se agora confrontado com uma decisão fundamentada na prescrição...
4. Tanto bastaria para justificar a aplicação do instituto do abuso de direito, que expressamente se invoca.
III. FUNDAMENTOS DO RECURSO
DA APRESENTAÇÃO TEMPESTIVA DA ACÇÃO ADMINISTRATIVA
5. Com relevo para a apreciação do presente recurso, designadamente da apresentação tempestiva da ação administrativa, atento o disposto no art. 289° n.° 2 do CPC, em vigor à data dos factos (atual art. 279° n.° 2 do NCPC), importa atender aos factos constantes da douta sentença e, ainda, os seguintes:
- O Autor interpôs recurso de agravo da decisão proferida em e) em 04-10-2005, (fls. 281 a 284 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo);
- Por despacho judicial proferido em 11-04-2006, no âmbito da ação judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo, foi admitido o recurso interposto pelo Autor identificado em f), (fls. 333 a 334 e 341 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo);
- No dia 11-05-2006, o Autor deu entrada das alegações do recurso da decisão proferida em e), (fls. 2 a 8 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002-A no Tribunal Judicial de Valongo);
- No dia 12-05-2006, o Autor foi notificado para proceder para os efeitos do art.
145 n.° 6 do CPC, designadamente para pagamento de custas processuais no valor de € 1.424,00, (fls. 19 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002-A no Tribunal Judicial de Valongo);
- Por requerimento apresentado em 29-05-2006, no âmbito do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo, o Autor desistiu do recurso interposto e melhor identificado em f), (fls. 386 a 388 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo);
- Por despacho judicial datado de 08-06-2006, proferido no âmbito do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo, as alegações do recurso identificado em f) foram consideradas sem validade por intempestivas, (fls. 129 do processo físico/ fls. 25 do apenso A do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002-A no Tribunal Judicial de Valongo);
- Por despacho judicial proferido em 12-10-2006, no âmbito da ação judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo, foi homologada a desistência do recurso, melhor identificada em j), (fls. 421 do processo judicial que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo);
6. Nos termos da douta sentença, o Tribunal “a quo” entendeu que o despacho saneador proferido no âmbito da ação que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo, transitou em julgado em 03-10-2005, (facto alegado no ponto G), do 2.1 da fundamentação de facto da sentença), o que, salvo o devido respeito, se discorda.
7. O regime da desistência do recurso (art. 681° n.° 5 do CPC, atual art. 632° do NCPC), sendo uma causa de extinção da instância, não está sujeita a limitações pois não depende da anuência da contraparte, podendo ser exercida, livremente, por simples requerimento ou por qualquer outro modo, processualmente admissível.
8. O regime legal da desistência do recurso diverge, neste sentido, do regime da desistência do pedido ou da instância a que aludem os artigos 37°, n° 2 e 293° a 301°, todos do CPC, quanto ao objecto, aos autores, ao ato processual e respetivos efeitos.
9. A desistência do recurso tem como consequência a consolidação da decisão recorrida, ou seja, o seu trânsito em julgado, equivalendo à aceitação da decisão proferida, com a única diferença quanto ao momento da prática do ato pela parte que, no caso de aceitação, tem lugar antes da interposição do recurso e, na hipótese de desistência, depois dela, (vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02.02.2010).
10. Considerada a posição doutrinária e jurisprudencial sufragada, a desistência do recurso não apresenta efeitos retroativos processuais, consolidando-se a decisão recorrida a partir desse exato momento.
11. No caso, sub judice, após a apresentação das alegações de recurso e por motivos de insuficiência económica, o Autor apresentou o requerimento de desistência do recurso, conforme melhor resulta dos factos alegados nas alíneas h), i) e j) do ponto III, n.° 1 da fundamentação do presente recurso.
12.O requerimento de desistência do recurso foi apresentado judicialmente em momento prévio ao término do prazo para pagamento das custas processuais, conforme melhor resulta dos factos alegados nas alíneas i) e j) do ponto III, n.° 1 da fundamentação do presente recurso.
13. Neste sentido, o despacho judicial identificado na alínea k) do ponto III, n.° 1 da fundamentação do presente recurso, foi proferido indevidamente, na medida em que o Tribunal Judicial de Valongo deveria - como o veio a fazer posteriormente em correção - decidir da homologação da desistência em primeiro lugar.
14. Assim, a desistência do recurso é anterior à decisão judicial que declarou as alegações apresentadas intempestivas, pelo que, sempre se deverá considerar que o trânsito em julgado da decisão ocorre com a homologação da desistência do recurso pelo Autor, ora Recorrente, em 12.10.2006.
15. Nestes termos, tendo o Autor interposto a ação administrativa em 20.07.2006, fê-lo antes do prazo dos 30 dias do trânsito em julgado da decisão, pelo que, deve ser declaro, nos termos do art. 289 n.° 2 do CPC (atual art. 279° n.° 2 do NCPC), que os efeitos civis derivados da propositura da primeira causa e da citação dos Réus mantêm-se para efeitos de prescrição.
16. Por tudo o exposto, deve ser declarada que a ação administrativa que corre termos sob o n.° 535/06.1BEPNF na Unidade Orgânica 1, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, foi intentada em 29.08.2002 e, consequentemente ser julgada improcedente a exceção perentória de prescrição.
DO PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NO ART. 498° N.° 3 DO CÓDIGO CIVIL
17. O Tribunal “a quo” entendeu pela não aplicabilidade do art. 498° n.° 3 do CC e, consequentemente julgou procedente a exceção perentória de prescrição com base nos fundamentos melhor descritos a fls. 17° e 18° da douta sentença, não podendo o Recorrendo conformar-se por tais fundamentos padecerem de uma incorreta aplicação do direito.
Pessoas Coletivas vs Procedimento Criminal
Regime excecional do art. 498 n.° 3 do Código Civil
18. Quanto ao primeiro fundamento invocado pelo Tribunal “a quo” importa referir que o art. 498 n.° 3 do Código Civil tratando-se de uma norma excecional prevê um prazo de prescrição extraordinário nos casos em que o facto ilícito que alicerça o pedido de indemnização civil constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, sendo este o aplicável.
19. É entendimento doutrinal e jurisprudencial dominante que para o alargamento do prazo prescricional previsto no n.° 3 do art.° 498° do CC basta a verificação de que a factualidade geradora de responsabilidade civil e da respetiva obrigação de indemnizar preenche os elementos de um tipo legal de crime, relativamente ao qual a lei penal admite o seu apuramento judicial em prazo mais alargado que o previsto no art.° 498°, n.° 1, do C. Civil, (e ainda que não existisse alegada, deveria o Tribunal convidar o Autor ao respetivo aperfeiçoamento).
20. A aplicabilidade do prazo prescricional previsto no n.° 3 do art.° 498° do CC não está dependente de, previamente, ter corrido processo-crime, nem da existência de uma condenação penal.
21. O alongamento do prazo prescricional radica na especial qualidade do ilícito (na maior gravidade do facto danoso) e não na circunstância de se demonstrar, em sede penal, o respetivo crime, sendo suficiente para a dedução da ação cível que o facto ilícito constitua crime e que a prescrição do respetivo procedimento penal esteja sujeito a um prazo mais longo que o previsto para aquela, não estando subordinada à condição de simultaneamente correr procedimento criminal contra o lesante, pelos mesmos factos.
22. Deste modo, com referência doutrinais e jurisprudências, vide Antunes Varela in RLJ, Ano 123, página 45 e seguintes, (anotação ao Ac. STJ de 30.01.1985), Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 21-04-2016, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 24-02-2012, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14/04/2010, todos in www.dgsi.pt.
23. Nos termos da doutrina e jurisprudência sufragada, para a aplicabilidade do n.° 3 do art. 498° do CC basta que o facto em si, atenta toda a sua complexidade material e danos provocados, possa ser qualificado, à luz das normas criminais, como um ilícito penal, ou seja, que se configure, em abstrato, a prática de um crime, para que se atenda à moldura abstrata do ilícito e se aplique o correspondente prazo de prescrição.
24. Neste sentido, deve improceder a fundamentação do Tribunal “a quo” que faz depender a aplicabilidade do prazo prescricional do ilícito penal do status do lesante, ou seja apenas às pessoas singulares, o que não é de admitir sob pena de os responsáveis cíveis não serem responsabilizados pelos respetivos atos.
Relação Comitente vs Comissário
25. Os arts. 22° e 271 n.° 1 da CRP c consagram um princípio geral de responsabilidade da Administração, independentemente da forma de atuar dos respetivos titulares de órgãos, funcionários ou agentes, abrangendo, portanto, quer a atividade de gestão privada, quer a atividade de gestão pública.
26. A relação jurídica controvertida nos presentes autos administrativos situa-se no plano da responsabilidade civil extracontraual do Estado por danos causados ao Autor, ora Recorrente, pelos seus órgãos ou agentes pela prática de facto ilícito culposo, no exercício de atividade de gestão pública, sujeita à disciplina do art. 501°, do CC onde se prescreve que «respondem pelos danos nos termos em que os comitentes respondem pelos danos causados pelos comissários».
27. À data da prática dos atos, o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por atos de gestão pública encontrava-se regulado pelo pelo Decreto-Lei n° 48051, de 21 de novembro de 1967 que previa, consoante as situações, a responsabilidade exclusiva do Estado (art. 2°), a dos titulares dos seus órgãos e/ou agentes administrativos (art. 3°) ou ainda a responsabilidade solidária do Estado (art. 3°).
28. Acontece, porém, que a Constituição da República Portuguesa de 1976 passou a consagrar no seu art. 21° a solidariedade do Estado, pelo que se tem entendido que o referido diploma legal, na parte em que previa a responsabilidade exclusiva do Estado por factos ilícitos culposos praticados pelos seus funcionários, já não se encontra em vigor, tendo ocorrido caducidade por inconstitucionalidade superveniente, (290°, n°2, da CRP), cf., a este respeito, Fausto Quadros, Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração Pública, 109. e ss.
29. Nessa medida, conclui-se que, mesmo no âmbito dos atos de gestão pública, verificada a existência de ato ilícito culposo funcional, o particular lesado poderia demandar quer o Estado, quer os titulares dos seus órgãos, quer ambos simultaneamente, ao abrigo do instituto jurídico de litisconsórcio voluntário, (art. 27° n.° 2 do CPC, atual art. 32° n.° 2 do NCPC), vide Antunes Varela in Direito das Obrigações, I Vol., 3§ edição, 532.
30. Assim, como resulta do exposto e na medida em que se trata de obrigações solidárias, o Autor, ora Recorrente tinha o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado, podendo demandar quer o ente público, quer o titular do órgão ou agentes, quer ambos conjuntamente, nos termos do, arts. 497°, 517° e 519°, n°1, todos do CC.
31. O art. 5° do Decreto-Lei n° 48051, de 21 de novembro de 1967, referindo que o direito de indeminização prescreve nos prazos fixados na lei civil, não concebe qualquer limitação ou exceção ao princípio contido no n.° 3 do art. 498° do CC.
32. Nestes termos, seria inadmissível legalmente por confrontar com os princípios fundamentais da Constituição da República Portuguesa, interpretar o art. 498° do Código Civil no sentido de que os prazos de prescrição da responsabilidade civil do comitente e do comissário sejam desiguais, ou seja três anos para o comitente e o prazo de prescrição criminal para o comissário, quando a responsabilidade de ambos é solidária, (vide Ac. STJ de 10.10.1985, in BMJ, 350°-318).
33. A defender-se tal tese, o prazo de prescrição seria diverso de acordo com o agente causador (individuo ou empregado/agente) o que é claramente inadmissível e inconstitucional.
34. Por outro lado, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30.01.1985, decidiu-se que “O prazo alongado do n.° 3 do art. 498° do CC é aplicável a quem nos termos do n.° 1 do art. 503° do CC tem mera responsabilidade pelo risco, se agiu por intermédio de um comissário cuja condução tenha integrado um ilícito criminal.”
35. Nestes termos, atento tudo o exposto, não subsistem dúvidas que o primeiro argumento utilizado pelo Tribunal “a quo” não merece reconhecimento doutrinal, nem jurisprudencial, o que aliás, salvo o devido e merecido respeito, redundaria numa violação clara e grosseira dos princípios fundamentais da CRP, designadamente dos princípios da igualdade e da não discriminação.
36. Porquanto não só resultaria numa limitação do direito de defesa dos lesados, como inversamente constituiria um duplo privilégios para os verdadeiros lesantes que se veriam locupletados com os lucros resultante da atividade dos comissários, como a sua obrigação de indemnizar pelos danos causados a terceiros prescreveria sempre em menor prazo do que uma pessoa singular.
37. Assim, pelo exposto, deve este douto Tribunal reconhecer que o prazo prescricional previsto no n.° 3 do art. 498° do CC é aplicável aos Réus e, consequentemente julgar improcedente a exceção perentória de exceção.
Ônus de Alegação do Elemento Objetivo e Subjetivo do Tipo Legal de Ofensas
38. Relativamente ao segundo argumento sufragado pelo Tribunal “a quo”, desde já, se refere que consta dos autos e da matéria de facto alegada em sede de petição inicial e reiterada em sede de réplica, que o acidente relatado e as consequências que do mesmo advieram para o Autor constituem um ilícito criminal.
39. O Autor alegou factos na petição inicial e reiterou-os em sede de réplica que, a serem provados, integram os elementos objetivos e subjetivos do crime de ofensas à integridade física grave, designadamente:
- O facto ilícito consubstanciado na omissão culposa do dever de zelo e diligências e das regras de segurança (factos alegados no art. 1°, 2°, 3°, 6°, 7°, 8°, 9°, 10°, 11°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 17°, 18°, 19°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 26°, 27°, 29° da petição inicial);
- O autor do facto ilícito, (factos alegados nos arts. 4°, 5°, 89°, 93°, 94° e 96° da petição inicial);
- A negligência, (facto alegado nos arts. 89°, 90°, 91°, 92°, 93°, 94°, 95° da petição inicial);
- A violação do direito absoluto de integridade física/ ofensa do corpo e lesão da saúde e respetivo dano corporal, (factos alegados nos arts, 40°, 41°, 42°, 43°, 44°, 45°, 46°, 47°, 48°, 49°, 50°, 51°, 52°, 53°, 54°, 55°, 67°, 68°, 69°, 70°, 71°, 73°, 74°, 75°, 76°, 77°, 78°, 79°, 80°, 81°, 82°, 84°, 85°, 86°, da petição inicial);
- O nexo de causalidade entre a omissão dos deveres de zelo e diligência e as agressões sofridas pelo Autor, ora Recorrente, apurada segundo um juízo de prognose póstumo e, de acordo com um critério de “causalidade adequada, nos termos do art. 10° do CP, (facto alegado nos arts. 1° a 96° da petição inicial);
40. Por conseguinte, considerando, na verdade, os elementos do tipo do crime em causa vemos que há lesões graves do corpo quando tal corresponde:
- privação de um importante órgão (facto alegado no art. 47.7 da petição inicial);
- episódios de dor (factos alegados nos arts. 47.8, 47.9, 47.15, 67° a 71° da petição inicial)
- alteração no plano estético (factos alegados nos arts. 47.2, 84° a 86° da petição inicial);
41. Considerando ainda o tipo legal do crime em causa vemos que há lesões graves funcionais quando a tal corresponde:
- incapacidade permanente, parcial ou temporária para o trabalho (sub-elemento integrado pelos factos alegados nos arts. 48° e 62° petição inicial);
- incapacidade para ocupações funcionais (sub-elemento integrado pelos factos também alegados nos arts. 47.11°, 47.12°, 47.14°, 49°, 50°, 76°, 77°, 78°, 79°, 80° e 81° na petição inicial).
42. E, por fim, considerando ainda o tipo legal do crime em causa vemos que há graves lesões da saúde quando a tal corresponde:
- a existência de doença particularmente dolorosa ou permanente (elemento integrado nos factos alegados nos arts. 47.1 °, 47.3 °, 47.4 °, 47.6 °, 47.8 °, 47.9 °, 47.10 °, 47.15 °, 49°, 50°, 67°, 68°, 69°, 70°, 71°, 73° e 74° petição inicial). (Veja-se, neste sentido, o citado autor Simas Santos, in “CP Anotado, anotação ao art° 144, vol. I, pág§ 148, Rei dos Livros).
43. Acresce que, os factos alegados pelo Autor, ora Recorrente, em sede de petição inicial e reiterados em sede de réplica, quanto ao acidente às respetivas consequências foram dados como devidamente provados na ação que correu termos sob o n.° 995/2002 no Tribunal Judicial de Valongo.
44. Nestes termos, conforme resulta do exposto, o Autor alegou os elementos objetivos e subjetivos do tipo de ilícito criminal, pelo que não poderia ter-se como verificada a prescrição sem se saber se os factos alegados, suscetíveis de integrar o tipo legal de crime ocorreram ou não, (vide Ac. Tribunal Central Administrativo Sul datado de 21.04.2016, supra identificado).
45. Com efeito, tendo o Autor, ora Recorrente, invocado na réplica que os factos alegados na petição inicial constituíam crime, tendo-o qualificado juridicamente, a prescrição não poderia proceder sem a produção de prova que seria o momento para determinar se os comportamentos negligentes e/ou culposos assumiam relevância penal, motivo, pelo qual, Em qualquer caso o conhecimento da exceção deveria ter sido relegado para o final (Ac. TCAS, Proc. n.° 06090/10, de 25.11.2010).
46. E, a serem provados os factos alegados pelos Autores são suficientes, por excesso, para integrarem os elementos do crime que, uma vez verificado, permite a extensão do prazo prescricional previsto no art° 498 n.° 3 do Código Civil.
47. Assim, uma vez prevista e aplicada a extensão do prazo prescricional sabemos também que, o Código Penal aplicável à prática do acidente previa, “in casu”, a pena de prisão de 2 a 10 anos (art° 143 - atual 144 e art° 148, do referido diploma), o que impõe a aplicação do prazo prescricional de 10 anos (art° 118 n° 1, alínea b) do Cód. Penal).
48. Assim sendo e considerando os factos, a ação judicial instaurada foi tempestivamente apresentada dentro do prazo legal fazendo com que o direito invocado pelo Autor, aqui Apelante, também por esta via não prescreveu.
49. Pelo que, contrariamente ao doutamente decidido e com todo e merecido respeito, deverá improceder a invocada exceção da prescrição e assim os autos prosseguirem os seus ulteriores termos até final, com seleção dos temas de prova, bem como, com julgamento de modo a se proferir boa decisão da causa.
50. Ao julgar como julgou, fez-se, salvo o devido respeito, uma inadequada aplicação do direito à situação em concreto, violando o estatuído no espírito subjacente aos arts. 13°, 22°, 271° da CRP, arts. 298°, 306°, 326°, 342° e 498° n° 3 do CC, arts. 10°, 11°, 15°, 118° n.° 1, al. b), 143°, 144°, 148° do CP, arts. 32° n.° 2 e 279° n.° 2 do NCPC, arts. 13°, 22°, 271° da CRP, arts. 2°, 3° e 5° do Decreto-Lei n.° 48051, de 21/11/1967).
51. A douta sentença em apreço deverá pois, e com o devido respeito, ser alterada em função das menções ora referenciadas e julgando improcedente a invocada exceção da prescrição, deverão os autos prosseguir os seus termos até final.
Nestes termos e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, julgando o presente recurso de apelação procedente em conformidade com as presentes conclusões, revogando a douta sentença e ordenando o prosseguimento dos autos farão, como de costume, inteira e sã JUSTIÇA.
“(…)”.
*
Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Município de Valongo apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:
“(…)
A presente ação foi interposta decorrido mais de 30 dias após o trânsito em julgado do despacho saneador, que absolveu os RR. da instância, proferido no processo n° 995/2002, que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo;
O A. não beneficia assim do disposto no n° 2 do art° 289º CPC (versão revogada);
Não se verificam nos autos os requisitos legais para a aplicação do prazo prescricional mais longo previsto no n° 3 do art° 498º CC;
A sentença “a quo” não merece qualquer censura ao decidir que o A. não beneficia do prazo de prescrição previsto no n° 3 do art° 498º CC;
5º Na data da propositura da presente ação, o direito do A. mostrava-se prescrito à luz do previsto no n° 1 do art° 483º CC;
Procede assim a exceção perentória de prescrição suscitada pelo Recorrido, Município de Valongo, impondo-se a absolvição dos RR. do pedido, nos termos do n° 3 do art° 576º CPC;
A sentença “a quo” faz uma acertada interpretação e aplicação das normas aplicáveis, não merecendo qualquer censura.
Nestes termos e nos melhores de Direito
que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado improcedente, com as devidas consequências legais.
Assim se cumprirá a Lei e fará Justiça!
(…)”
*
A igualmente Recorrida lnfraestruturas de Portugal, IP por fusão da empresa Estradas de Portugal S.A. com a REFER E.P.E. [doravante apenas designada por IP, S.A], também contra-alegou, que concluiu da seguinte forma:
“(…)
O Réu Município suscitou, os presentes autos, o incidente da prescrição, entendendo que, tendo o acidente ocorrido a 09-09-1999, já se encontraria ultrapassado o prazo perentório, que o art.498.0, n.°1 do CC estatui.
2. À data dos factos, a responsabilidade civil extracontratual do Estado era disciplinada pelo Decreto-Lei n.°48051, de 21 de novembro de 1967, cujo artigo 5.°, n.°1 estabelecia que o direito a indemnização previsto e regulado pelos artigos anteriores prescrevia, nos prazos fixados na lei civil. Pelo que, toma-se imprescindível chamar à colação o art. 498.° do CC.
3. Desta feita, o prazo para o que o Autor pudesse exercer o seu direito é de três anos, contados a partir da data do conhecimento dos factos, que sustentam esse mesmo direito, sem prejuízo do prazo mais dilatado, previsto no número 3 da mesma norma.
4. O despacho saneador-sentença, no qual os Réus são absolvidos da instância, proferido no processo n.° 995/2002, que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo, data de 15/07/2005, sendo que, o respetivo trânsito em julgado reporta-se a 03/10/2005.
5. A ação, de cuja sentença ora se recorre, foi proposta a 20/07/2006.
6. Pelo que, de nenhum modo, foi cumprido o prazo previsto para que ação fosse proposta.
7. Pelo que, a ação não se considera intentada a 29-08-2002, como assim defende o ora Recorrente. Por conseguinte, o seu direito encontra-se prescrito, ao abrigo do disposto pelo artigo 498º, n.°1 do CC.
8. Seguidamente, ao desistir do recurso, o ora Recorrente renunciou a um ato do processo, mas simultaneamente, abdicou de uma pretensão: “de uma nova apreciação Judicial, Já porque, entretanto, se conformou com o decidido, Já porque veio obter, por outra via, o efeito que pretendia alcançar com o recurso".
9. Mesmo que assim não fosse, o facto de as alegações serem apresentadas intempestivamente e, do tribunal vir a apreciá-las e a julgá-las inválidas, anteriormente à homologação do pedido de desistência, só confirma que o lapso temporal, decorrido entre o trânsito em julgado do despacho saneador, proferido no processo n.° 995/2002, que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo, e a propositura da nova ação, de cuja sentença agora se recorre, não permite que a pretensão do Autor proceda.
10. Quando o ora Recorrente alega que o recurso não aproveita as contrapartes, o que na verdade está em causa é a simples circunstância da desistência do recurso não estar dependente do assentimento do Recorrido, à semelhança do que sucede com a desistência da instância.
11. Concluímos, portanto, estar perante uma exceção perentória ou material, como denota o artigo 576.°, n.°3 do CPC, que conduz à extinção da instância e consequente absolvição da Ré no pedido.
12. Acresce que o ora Recorrente não pode lograr beneficiar da aplicação do prazo estatuído pelo artigo 498.°, n.°3 do CC, em virtude da Ré não corresponder a uma pessoa jurídica suscetível de constituir o agente responsável pela prática dos factos que integram o tipo legal de crime alegado, por força do artigo 11.° do CP, no qual se determina que apenas pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade criminal. O n.°2 do mesmo preceito estabelece, mesmo, quais os tipos legais que podem fundamentar a responsabilidade criminal de pessoas coletivas e, neles, não se encontra qualquer referência ao crime aclamado pelo ora Recorrente.
13. Com efeito, o que está em causa, e o que determina a absolvição da Ré, não é a falta de processo-crime que determine e conclua pela existência de um efetivo crime. A razão pela qual se nega provimento à pretensão do Autor, ora Recorrente, é porque este faltou ao cumprimento do ónus que sobre ele recaia, de alegar factos integradores do tipo legal invocado, objetivos e subjetivos.
14. A culpa (elemento subjetivo), seja sob a forma de dolo ou negligência, ficou por provar, pois os factos alegados e provados não chegam para concluir pela sua existência.
15. O mesmo se constata em relação ao nexo de causalidade: não conseguimos descortinar, do que dos autos consta, onde e quando a conduta dos Réus foi causa adequada dos danos sofridos pelo Autor, ora Recorrente.
16. Não estando alegados e provados os factos objetivos e subjetivos do crime de ofensa à integridade física grave, não pode proceder a solicitação do Autor, ora Recorrente.
17. Relativamente ao último bloco argumentativo do Autor, ora Recorrente, cumpre aplicar a regulamentação estatuída pelo Decreto-Lei n.°48051, de 21 de novembro de 1967. O mencionado diploma, no seu art.2.°, n.°1 prescrevia: “O Estado e demais pessoas coletivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de atos ilícitos culposamente praticados pelos respetivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.”
18. Mais uma vez, há que referir que não ficou provada qualquer culpa na atuação dos Réus, e principalmente da Ré, ora Recorrida, no que concerne à ocorrência do sinistro, nem tão-pouco dos seus órgãos ou agentes administrativos.
19. Não estando o pressuposto da culpa na atuação dos agentes provado, não pode aplicar-se, no caso, o regime da responsabilidade prescrito. 
20. Mesmo se diga relativamente ao regime da responsabilidade do comitente/comissário aludido, pelo ora Recorrente. O comitente responde independentemente de culpa, mas há que provar todos os pressupostos da responsabilidade civil do comissário, inclusive a culpa deste, que ficou por provar no caso em apreço.
21. Por tudo o dito e concluído, é de referir que a douta sentença recorrida interpretou corretamente o Direito e aplicou-o de forma adequada aos factos.
22. O que não pode ser tolerado e assentido pelo Direito, em nome do sentido de Justiça e do princípio da segurança e estabilidade das relações jurídicas, é que titulares de direitos pugnem pela sua tutela, depois dos mesmos se encontrarem prescritos.
23. Por tudo o exposto, o recurso apresentado pelo ora Recorrente deverá ser julgado improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.
Termos em que, conforme o Direito, deve negar-se provimento ao recurso, confirmando-se integralmente a douta sentença recorrida, assim se cumprindo a lei e fazendo-se (…)”.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, que, todavia, não vincula este Tribunal Superior [cfr. artigo 641º, nº. 5 do CPC].
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O Ministério Público neste Tribunal não emitiu o parecer a que alude o nº. 146º, 1 do C.P.T.A.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do CPTA e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, a única questão essencial a dirimir resume-se a saber se o Tribunal a quo, ao determinar a procedência da exceção de prescrição do direito do Autor, incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação direito, designadamente, por violação dos artigos 13°, 22°, 271° da CRP, arts. 298°, 306°, 326°, 342° e 498° n° 3 do CC, arts. 10°, 11°, 15°, 118° n.° 1, al. b), 143°, 144°, 148° do CP, arts. 32° n.° 2 e 279° n.° 2 do NCPC, arts. 13°, 22°, 271° da CRP, arts. 2°, 3° e 5° do Decreto-Lei n.° 48051, de 21.11.1967.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
A) No dia 09.09.1999, pelas 6h e 20m, na artéria denominada Rua E…, pouco antes do cruzamento que esta via efetua com a Rua V…, em Valongo, ocorreu um acidente de viação em que foi interveniente um veículo de matrícula xx-xx-LA, conduzido e pertencente ao Autor [facto confessado pelo Autor no art. 1º da PI];
B) Em 29.08.2002 o Autor deu entrada no Tribunal Judicial de Valongo a Ação com processo Ordinário contra a Câmara Municipal de Valongo, o Município de Valongo, a Portgás, SA e o ICERR — Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Viária — Direção de Estradas do Porto [cfr. documento junto a fls.127/144 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido];
C) A ação referida supra correu termos no Tribunal judicial de Valongo sob o n° 995/2002 [fls.354 do PA];
D) No âmbito da ação referida em C) os Réus Município de Valongo e ICERR — Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Viária — Direção de Estradas do Porto foram citados em 03.09.2002 [fls.359 e 361 do processo físico];
E) No âmbito da ação referida em C) foi proferido em 15.07.2005 despacho saneador no qual os Réus Município de Valongo e ICERR — Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Viária — Direção de Estradas do Porto foram absolvidos da instância [fls.367/385 do processo físico];
F) O Autor apresentou alegações de recurso da decisão referida em F) as quais foram consideradas sem validade por intempestivas [fls.129 do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido];
G) O despacho referido em E) transitou em julgado em 03.10.2005 [fls.354 do processo físico];
H) A presente ação deu entrada neste tribunal em 20.07.2006 [fls.1 do SITAF];
I) Os Réu foram citados para a presente ação em 27.07.2006 [fls.75 e 76 do processo físico].
III.2 - DE DIREITO
O Autor/Recorrente intentou a presente Ação Administrativa Comum com vista à condenação solidária das Rés no pagamento da quantia de € 149,998,15, acrescida de juros calculados à taxa legal.
Todavia, o T.A.F. de Penafiel, por despacho saneador-sentença, julgou procedente a exceção de prescrição do direito do Autor, tendo, consequentemente, absolvido os Réus do pedido.
Para tanto, socorreu-se, sobretudo, da seguinte fundamentação jurídica:
“(…) A prescrição é uma exceção perentória que determina a extinção do efeito jurídico em relação aos factos articulados pelo autor, nos termos do art. 304.° do Código Civil que a proceder importa a absolvição do Réu do pedido.
Estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis - art. 298° n° 1 do C. Civil.
A prescrição supõe a vontade da lei (ou das partes) em que o direito se exerça dentro de certo prazo, tendo em vista a rápida definição dos direitos e a correspondente segurança jurídica.
A prescrição não é de conhecimento oficioso, antes carece, para ser eficaz, de ser invocada por aquele a quem aproveita - art. 303° do C. Civil - ou por terceiro com interesse legítimo na sua declaração, ainda que o devedor ou primitivo interessado a não haja invocado - art. 305° do C. Civil.
Completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor ao exercício do direito prescrito - art. 304° n° 1 do C. Civil.
A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, ou por qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do ato àquele contra quem o direito pode ser exercido - art. 323° n°s 1 e 4, do Código Civil.
Se a citação ou notificação não for efetuada dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, a prescrição tem-se por interrompida logo que decorram os cinco dias (art. 323° n°2), mesmo que a demora fique a dever-se ao funcionamento de regras de custas ou de organização judiciária, por acumulação de serviço ou negligência do tribunal ou ter sido a ação proposta em tribunal incompetente.
Á data dos factos a que se reportam os autos — ato ilícito alegadamente praticado em 1999 - vigorava o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado constante do Decreto-lei n.° 48051, de 21 de novembro de 1967 a qual tinha por referência o regime geral de responsabilidade constante do Código Civil, sendo-lhe aplicável o disposto nos artigos 483° a 510° e 562° a 572° deste Código, sem prejuízo das regras constantes do referido Decreto-lei n°48051, de 21 de novembro de 1967.
Por força do artigo 2°, n°1 do Decreto-lei n° 48051, de 21 de novembro de 1967, “O Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de atos ilícitos culposamente praticados pelos respetivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício”.
Dispõe o artigo 5.°, n.°1 do Decreto-lei n.°48051, de 21 de novembro, “O direito de indemnização regulado nos artigos anteriores prescreve nos prazos fixados na lei civil”, sendo, por isso, aplicável, em sede de responsabilidade civil extracontratual do Estado, o disposto no artigo 498.° do Código Civil que estabelece o seguinte:
1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso.
2. Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.
3. Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
4. A prescrição do direito de indemnização não importa prescrição da ação de reivindicação nem da ação de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra.(negrito nosso)
Assim, o prazo geral de prescrição do direito de indemnização é de 3 anos, contado da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, sem prejuízo da aplicação de prazo mais longo no caso de o facto ilícito constituir crime para o qual lei preveja prazo mais longo.
O Autor começa por defender a tese de que o seu direito não se mostra prescrito porquanto a presente ação se deve considerar instaurada em 29-08-2002 por força do disposto no art. 289° n°2 do CPC em vigor à data os factos, uma vez que foi nesta data que deu entrada em juízo à primitiva ação que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo e m.i. na alínea C) do probatório.
Decorre do disposto no referido art. 289° n° 2 do CPC em vigor à data dos factos (atual art. 279° n°2 do NCPC) que “sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova ação for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.”.
Ora, no caso sub juditio é insofismável que a presente ação não foi intentada no prazo de 30 dias contados desde a data do trânsito em julgado do despacho saneador- sentença de absolvição da instância dos Réus proferido no processo n° 995/2002 que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo e m.i. na alínea E), o qual ocorreu em 03-10-2005 cfr. decorre da alínea G) do probatório.
Com efeito, está provado que a presente ação só deu entrada neste tribunal em 20-07-2006, ou seja, muito para lá do referido prazo de 30 dias a que se referia o art. 289° n°2 do CPC contado desde o trânsito em julgado do despacho saneador-sentença referido na alínea E) do probatório (que como vimos ocorreu em 03-10-2005), razão pela qual não é aplicável ao caso em apreço o disposto no art. 289° n°2 do CPC (atual art. 279° n°2 do NCPC), pelo que assim sendo, como é, não poderá a presente ação ser considerada como intentada em 29-08-2002 como defende o Autor, o que acarreta a prescrição do direito do Autor nos termos do disposto no art. 498° n°1 do CPC em virtude de a ação não ter sido instaurada dentro do prazo de três anos previsto no art. 498° n°1 do CC.
Coloca-se, contudo, a questão de saber se poderá o Autor, ainda assim, beneficiar do disposto na lei civil relativamente á prescrição e caducidade de direitos, questão a cuja análise passaremos de seguida.
Nos termos do art.° 323° do CC, refere-se o seguinte:
“1. A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
3. A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
4. É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do ato àquele contra quem o direito pode ser exercido.”.
O art. 326° do CC refere, com interesse para o caso, que a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n°s. 1 e 3 do artigo 327°.
Finalmente, o art. 327° do CC, sob a epígrafe “Duração da interrupção” prevê, com interesse para o caso sub juditio, o seguinte:
“1. Se a interrupção resultar de citação o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
2. Quando, 'porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o ato interruptivo.
3. (...)”.
Ora do cotejo dos preceitos legais supracitados, retira-se que a citação dos Réus efetuada no âmbito do processo m.i. na alínea C) do probatório, ocorreu em 03-09-2002 — alínea D) do probatório - pelo que, por força do disposto no art. 323° n°1 do CC, tal citação consubstancia ato interruptivo do prazo de prescrição que se havia iniciado em 10¬09-1999 (dia seguinte ao alegado acidente), sendo despiciendo o facto de o Tribunal Judicial de Valongo se ter declarado incompetente, cfr. resulta do art. 323° n°1 CC in fine.
Porém, também resulta da alínea E) do probatório, que foi proferido despacho saneador sentença relativamente aos ali e aqui Réus Município e IP, SA, tendo os mesmos sido absolvidos da instância pelo que assim sendo, por força do disposto no art. 327° n°2 do CC, nos casos de absolvição da instância um novo prazo prescricional (de três anos por força do disposto no art. 498° n°1 do CC, recorde-se) começou a correr logo após o ato interruptivo da prescrição o qual, no caso em apreço foi, como vimos, a citação efetuada no âmbito do processo n° 995/2002 que correu termos no Tribunal Judicial de Valongo, a qual ocorreu em 03-09-2002.
Assim sendo, como é, iniciou-se a contagem de um novo prazo de prescrição de três anos contado desde o ato interruptivo (ato de citação ocorrido em 03-09-2002), ou seja, em 04-09-2002, pelo que mister é concluir que o novo prazo de prescrição terminou em 03-09-2005, ou seja, muito antes da data de instauração da presente ação em 20-07-2006.
Assim sendo, ainda que considerado o regime da prescrição da lei civil, concluímos que, também por aqui, o direito do Autor se mostra prescrito.
Finalmente, o Autor defende, ainda, que obiter dictum ainda que se entenda que o prazo de prescrição de três anos se mostrasse ultrapassado, sempre estaríamos perante factos ilícitos integradores do crime de ofensa à integridade física grave do Autor (art. 144° do CP) cujo prazo de prescrição é de 10 anos (art. 118° n°1 b) do CP), sendo este o prazo aplicável por força do art. 498° n°3 do CC, pelo que o seu direito não estaria prescrito.
Porém, também nesta perspetiva entendemos que não assiste razão ao Autor.
Com efeito, o art. 498° n°3 do CC refere que se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
O Autor, para sustentar a aplicação ao caso em apreço do prazo de prescrição de 10 anos apenas em sede de réplica alude a tal prazo referindo, e passámos a citar in totum, “que atenta a gravidade das lesões sofridas pelo Autor, melhor descritas na PI e aqui reproduzidas, sempre estaríamos em face de factos ilícitos integradores do crime de ofensas à integridade física grave do Autor (art. 144° do CP) cujo prazo de prescrição é de 10 anos (art. 118o n01 b) do CP), sendo este o prazo aplicável por força do art. 498o n03 do CC.”.
Efetivamente, nos termos do Código Penal (CP) em vigor à data dos factos, o crime de ofensa à integridade física grave era punido com pena de prisão de 2 a 10 anos pelo que, por força do art. 118° n°1 al. b) do CP, a prescrição do prazo do procedimento criminal ocorreria logo que decorridos 10 anos sobre a prática do crime (no caso 02-09-1999), prazo este que seria o aplicável ao caso em apreço ex vi do art. 498° n°3 do CC.
A razão de ser do n° 3 do artigo 498° do CC tem na sua génese a premissa de que sendo o prazo de prescrição da ação penal mais longo do que o da ação civil, nada justifica que a prescrição se confine aos três anos estabelecidos no n° 1 do mesmo artigo, pois que, podendo, então, para efeitos penais, discutir-se durante tal prazo o facto e as circunstâncias dele, igualmente poderia discutir-se, durante o mesmo prazo, o direito de indemnização.
No entanto, e tal como sumariado no acórdão do STA, proferido em 02-12-2004, no processo n° 0145/04, “nos termos do disposto no artigo 498º, n0 1, do CCivil, é de três anos o prazo regra da prescrição do direito de indemnização pelo que para que o A. possa beneficiar do prazo de cinco anos, previsto no nº. 3, da mesma disposição, para o exercício do direito de indemnização deve alegar e provar factos integradores do elemento objetivo e subjetivo de um tipo legal de crime, ainda que imputável a apenas algum ou alguns dos RR”. (negrito nosso).
Tal significa que para beneficiar do prazo a que alude o n° 3 do artigo 498° do CC é necessário que o Autor:
i) alegue factos integradores do elemento objetivo e subjetivo de um tipo legal de crime, ou seja, que para além de constituírem ilícito civil, passível da reclamada responsabilidade civil, constituam outrossim ilícito penal ou crime, cujo prazo de prescrição ultrapasse o prazo legal de três anos;
ii) que pelo menos um dos Réus seja o autor dos factos que consubstanciam o crime.
Ora, a tese do Autor soçobra desde logo quanto a este último aspeto.
De facto, a ação foi proposta contra o Município de Valongo e contra o ICERR (atual IP, SA), ou seja, a ação foi proposta contra duas pessoas colectivas, as quais, além dessa natureza intrínseca, se caracterizam, ainda, por serem pessoas colectivas de direito público que exercem prerrogativas de poder público.
Ora, o prazo prescricional previsto no n° 3 do artigo 498° do CC só é aplicável quando o Réu é o autor do crime que fundamenta o pedido indemnizatório, como se refere no acórdão do STA, proferido em 25-09-2008 no âmbito do processo n° 0456/08, situação que, insofismavelmente, não é subsumível ao caso em apreço já que, quanto às pessoas colectivas aqui Rés, Município de Valongo e IP, SA, não pode ser imputada a prática do crime apontado pelo Autor face do disposto no art. 11° do Código Penal (CP) em vigor à data (atualmente correspondente aos n°s 1 e 2 do artigo 11° do CP) e segundo o qual, salvo disposição em contrário - que não se vislumbra nem vem invocada pelo Autor - só as pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade criminal.
Também no que concerne ao primeiro dos referidos aspetos — ónus de alegação dos factos integradores do elemento objetivo e subjetivo do tipo legal de crime de ofensas à integridade física grave -, considerámos que o Autor não cumpriu o ónus de alegação que se lhe exigia não resultando, quer da PI, quer da réplica apresentada (onde, note-se, pela primeira vez este faz referência à questão da aplicação do art. 498° n°3 e de forma genérica), a descrição concreta e individualizada dos factos de onde resultem condutas dolosas dirigidas à produção daqueles resultados, nem aos Réus imputa qualquer responsabilidade a esse título, tendo-se limitado, como acima se mencionou, a referir que em moldes genéricos - por remissão para um elenco de alegações inequivocamente dirigidas exclusivamente para a responsabilização dos Réus ex vi do regime de responsabilidade civil extracontratual e face à gravidade das lesões sofridas — que “sempre estaríamos em face de factos ilícitos integradores do crime de ofensas à integridade física grave do Autor”.
Ou seja, entendemos que não se mostra cumprido o ónus de alegação de tais factos (artigo 342° do CC), estando o tribunal sujeito aos factos alegados pelas partes (n° 1 do artigo 5° do CPC).
A jurisprudência dos Tribunais superiores, designadamente do TCAN e do STA, têm vindo a defender quanto ao dever de alegação de factos integradores do elemento objetivo e subjetivo de um tipo legal de crime e, designadamente, quanto ao dolo e negligência, que tal como previsto no artigo 13° do CP só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência, sendo certo que também a doutrina perfilha o entendimento de que para beneficiar do prazo mais longo que este artigo contempla, deve o autor alegar e provar que o facto ilícito constitui crime, o que pressupõe, desde logo uma alegação dos respetivos factos integradores do elemento objetivo e subjetivo do tipo legal de crime, não bastando a mera eventualidade de o ser.
Como se escreve no Acórdão do STA, de 07-05-2003, proferido no processo n° 0448/03, “o prazo previsto no n° 3 do artigo 498º é excecional, dependendo de um pressuposto, que é o de os factos constituírem crime, e, por isso, o lesado que queira usufruir do direito à utilização desse 'prazo, terá o ónus de alegar e provar que se verificam os pressupostos em que a lei admite a sua utilização, como resulta da regra basilar do ónus da prova que consta do no 1 do artigo 342o do Código Civil”.
No Acórdão do TCAN, de 07-10-2016, proferido no processo n° 00524/13.0BEAVR, sumariou-se que “I - Nos termos do disposto no artigo 498º, n° 1, do CCivil, é de três anos o prazo regra da prescrição do direito de indemnização, sendo excecional o prazo de cinco anos previsto no seu n° 3, que depende do pressuposto de os factos constituírem crime, tendo o lesado que queira usufruir do direito à utilização deste prazo de cinco anos o ónus de alegar e provar que se verificam os pressupostos da sua admissibilidade, como resulta da regra basilar do ónus da prova que consta do n° 1 do artigo 342° do Código Civil. II — O prazo prescricional previsto no n° 3 do artigo 498° do Código Civil só é aplicável quando o réu é o autor- do crime que fundamenta o pedido indemnizatório. ”.
Finalmente, como se refere no Acórdão proferido pelo TRP no âmbito do processo n° 1079/08.2TVPRT.P1, de 07-07-2016, “(…) importa não esquecer que, nesta fase processual, para se não tomar conhecimento da invocada exceção da prescrição por a respetiva factualidade estar carecida de prova, teria o Autor recorrente de ter alegado, nos articulados que apresentou, um continente factual que, uma vez provado, resultasse que a Ré recorrida teria praticado quer um ilícito criminal quer um ilícito civil (...) É preciso não esquecer que, em homenagem ao princípio dispositivo, a adução do material de facto a utilizar pelo juiz para a decisão da causa só compete, em princípio, às partes: a estas corresponde proporcionarem ao juiz, mediante as suas afirmações de facto (não notórias), base da decisão.
1 Vide Acórdão do TCAN de 07-10-2016 proferido no processo n° 00524/13.0BEAVR.
2 Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, anotação ao artigo 498°.
Cada uma das partes suporta, em resultado do princípio dispositivo, um ónus de afirmação (alegação). Decidir que o ónus de afirmação incumbe a uma das partes significa que será julgado o pleito contra si, se os não alegados forem indispensáveis à sua pretensão.
O problema do ónus de afirmação não deixa de ser idêntico ao do ónus da prova, de tal sorte que estamos com Manuel de Andrade [5] quando diz que os critérios gerais para a repartição do ónus da prova valem do mesmo modo para o ónus de afirmação.
Estes critérios, em conformidade com o artigo 342° do Código Civil, sintetizam-se no seguinte:
- Ao autor - cabe a afirmação dos factos que segundo a norma substantiva servem de pressupostos ao efeito jurídico pretendido. O autor - terá assim o ónus de afirmar os factos (constitutivos) correspondentes à situação de facto (Tatbestand) traçada na norma substantiva em que funda a sua pretensão;
-Ao réu incumbirá, por sua vez, a afirmação dos factos correspondentes à previsão (abstrata) da norma substantiva em que baseia a causa impeditiva, modificativa ou extintiva do efeito pretendido pelo autor -. Compete-lhe, portanto, a prova de factos impeditivos ou extintivos da pretensão da contraparte, determinados de acordo com a norma em que assenta a exceção por ele invocada.
O que se acaba de dizer, vem a significar que o Autor, invocada pela Ré a exceção da prescrição, teria, querendo beneficiar do prazo mais longo estatuído no artigo 498.°, n° 3 do CCivil, que alegar os factos pertinentes que consubstanciassem a prática por parte da Ré, ou de um seu funcionário, de um crime de falsificação de documento, pois que, neste conspecto, a referida alegação funcionava como uma contra exceção à exceção invocada pela Ré' (artigo 342.°, n° 2 do CCivil).
Por todo o exposto, tendo em consideração:
-que a presente ação foi intentada contra duas pessoas colectivas (que atuavam e atuam no exercício de prerrogativas de poderes públicos) e que, face ao disposto no art. 11° do CP em vigor à data (ou o atualmente em vigor), as pessoas colectivas não são suscetíveis de procedimento criminal, entendemos que mostrando-se vedada a possibilidade de qualquer responsabilização das Rés pelo alegado crime de ofensas á integridade física grave invocado pelo Autor, não é aplicável ao caso em apreço o prazo de prescrição de 10 anos previsto no art. 118° n°1 al. b) do CP por via do disposto no art. 483° n°3 do CC; e, bem assim,
-que, no entendimento do tribunal, o Autor também não cumpriu, como se lhe exigia, o ónus de alegação dos factos integradores do elemento objetivo e subjetivo do tipo legal de crime de ofensas à integridade física grave previsto no art. 144° do CP no sentido do preenchimento dos requisitos da responsabilidade jurídico-penal das Rés pelo supra referido crime, nem resultando da PI ou da réplica a descrição dos factos concretos e individualizados de onde resultem quais as condutas dolosas dirigidas à produção daqueles resultados nem, tão pouco, aos Réus é imputada qualquer responsabilidade a esse título, tendo o Autor se limitado como acima se mencionou a referir em moldes genéricos e por remissão para um elenco de alegações inequivocamente dirigida exclusivamente para a responsabilização dos Réus por via da responsabilidade civil extracontratual, que sempre estaríamos perante a ocorrência do crime previsto no art. 144° do CP, concluímos que não é aplicável ao caso em apreço o disposto no art. 498° n°3 do CC e, consequentemente, o prazo de prescrição de 10 anos previsto no art. 118° n°1 l. b) do CP conforme defende o Autor razão pela qual, também por aqui, se considera que o direito do Autor se mostra prescrito sendo aplicável ao caso em apreço o prazo de prescrição de três anos previsto no art. 498° n°1 do CC, o qual, á data da instauração da ação e por todas as razões supra elencadas, já se mostrava ultrapassado.
Assim sendo e face ao exposto, procede a exceção perentória da prescrição suscitada pelo Réu Município, impondo-se absolver os Réus do pedido, cfr. art. 576° n°3 do CPC.
(…)”.
Adiante-se, desde já, que o assim decidido não é de manter.
Na verdade, examinando a constelação argumentativa vertida no libelo inicial, resulta cristalino que o Autor intentou a presente ação visando a efetivação de responsabilidade extracontratual dos Réus, tendo fundamentado a sua pretensão, brevitatis causae, no direito de indemnização emergente do acidente de viação ocorrido em 09.09.1999, em que foi interveniente o veículo de matrícula xx-xx-LA.
Configurando a presente ação uma ação administrativa para efetivação de responsabilidade civil extracontratual dos Réus, atendendo à data dos factos em discussão, é de aplicar o artigo 2.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e das demais Entidades Públicas no domínio dos atos de gestão pública aprovado pela Decreto-Lei nº. 48051, de 21 de novembro de 1967, que dispõe que: “O Estado e demais pessoas coletivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de atos ilícitos culposamente praticados pelos respetivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício “.
A responsabilidade civil extracontratual, no que tange ao prazo de exercício do direito, encontra-se fixada no n° l do artigo 498° do Código Civil, para o qual remete, quer o Decreto-Lei n° 48051, de 21.11.1967, quer a atual Lei n° 67/2007, de 31.12, e que dispõe que "o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o prazo a contar do facto danoso".
Desta forma, a prescrição decorrente de responsabilidade civil extracontratual ocorrerá, por regra, no prazo de três anos, computado desde o conhecimento que o lesado teve do direito a ser ressarcido, ou seja, “O momento inicial de contagem do prazo de prescrição de três anos, prazo regra, coincide com o momento do conhecimento empírico dos pressupostos da responsabilidade pelo lesado concreto, conhecimento esse que deve enraizar nos factos provados, e deverá potenciar ao lesado o exercício do seu direito” [cfr. Acórdão deste Tribunal Central Administrativo do Norte, de 20/1/2012, proferido no processo n.º 00699/08.0BEPNF, disponível em www.dgsi.pt].
Deste modo, para que comece a correr o prazo da prescrição a que se reporta o citado n.º 1 do artigo 498.º do CC, é de exigir o conhecimento, pelo lesado de que é juridicamente fundado o direito à indemnização, ou seja, de que teve conhecimento do direito que lhe compete.
Por sua vez, o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido [cf. artigo 306.º n.º 1 do CC], correndo ininterruptamente, salvo ocorrendo motivo de suspensão ou interrupção, previsto na lei.
Diz a lei civil que a prescrição se interrompe pela “citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente” [artigo 323.º, nº 1 do CC], sendo que, se requerida a citação, e esta não se fizer dentro de cinco dias “por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias” [n.º 2 do artigo 323.º do CC].
A prescrição é “ainda interrompida pelo reconhecimento do direito efetuado perante o respetivo titular por aquele contra quem o direito pode ser exercido” [artigo 325.º, nº 1 do CC], sendo que a interrupção “inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr um novo prazo a partir do ato interruptivo” (artigo 326.º, n.º 1 do CC), e “se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo” [artigo 327.º, nº 1 CC].
Todavia, o ato interruptivo da prescrição é de natureza pessoal, só afetando a pessoa a quem se reporta por virtude da citação para a ação que lhe foi dirigida [artigo 323º, n.º 1 e n.º 4, do CC].
Não basta então, para interromper a prescrição, a mera introdução da ação em juízo, sendo indispensável que a ação seja proposta de tal modo que o devedor venha a tomar efetivo conhecimento da reclamação do direito que é feita, o que decorre do nº 4 do referido artigo 323.º do CC, com exceção de que se a citação não se fizer no prazo de cinco dias depois de requerida, tem-se por interrompida nesse prazo [cf. n.º 2 do mesmo preceito].
Retomando o caso dos autos, resulta do probatório que, na sequência de um acidente de viação ocorrido em 09.09.1999, em que foi interveniente um veículo de matrícula xx-xx-LA, conduzido e pertencente ao Autor, este deu entrada, no Tribunal Judicial de Valongo uma ação com processo ordinário contra a Câmara Municipal de Valongo, o Município de Valongo, a Portgás, SA e o ICERR, na qual foi proferido em 15.07.2005 despacho saneador, que absolveu os Réus Município de Valongo e ICERR - Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Viária - Direção de Estradas do Porto da instância, que transitou em julgado em 03.10.2005.
Dimana ainda do probatório que a presente ação deu entrada em juízo no T.A.F. de Penafiel em 20.07.2006.
Mostrando-se provadas estas datas, assoma evidente que não tem aqui lugar a aplicação do disposto no artigo 289° n° 2 do CPC em vigor à data dos factos [atual art. 279° n°2 do NCPC], que preceitua “sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova ação for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.”, por se mostrar claramente esgotado este prazo de 30 dias à data de propositura da presente ação no T.A.F. de Penafiel.
O Recorrente objeta esta conclusão, invocando factualidade que não se mostra fixada no probatório coligido nos autos, melhor substanciada na conclusão 5º do presente recurso.
Tal invocação, porém, não se pode admitir, atento os moldes em que foi a mesma delineada na motivação do recurso em análise.
Na verdade, e admitindo que se trata de uma impugnação implícita da matéria de facto fixada em 1ª instância, caberia o Recorrente, sob pena de rejeição imediata, especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; bem como indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados.
Neste sentido, ver, de entre muitos outros em sentido idêntico, aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte de 12.04.2015, tirado no processo 00418/12.6BEPRT, consultável em www.dgsi.pt.
Não tendo o Recorrente cumprido este ónus da impugnação da matéria de facto, logo fica este Tribunal Superior impedido de alterar a matéria de facto fixada na sentença recorrida nos termos invocados pelo Recorrente.
E não se invoque o disposto artigo 662º do CPC, aplicável ex vi artigos 1º e 140º do CPTA, pois o uso da faculdade de aditamento por este Tribunal dos “novos factos” alegados pelo Recorrente mostra-se claramente obstaculizada pelo facto de se tratar tecido fáctico que não se mostra sequer documentalmente comprovado nos autos.
Por conseguinte, o quadro fáctico a atender é o que resulta fixado em 1ª instância, e não um qualquer outro, como o pretendido pelo aqui Recorrente.
Sendo aquele o contorno fáctico imutável do caso a decidir, do qual este Tribunal Superior não se pode desviar, é nosso entendimento que a presente acção não poderá ser considerada proposta em 29.08.2002, por ser inaplicável o citado 289° n° 2 do C.P.C. em vigor à data dos factos, mas antes deduzida no T.A.F. de Penafiel em 20.07.2006.
Isto não significa que a contagem do prazo de prescrição inicie a sua contagem na data de ocorrência do acidente de viação visado nos autos, [09.09.1999], mas antes em 03.09.2002, pois é possível descortinar dos factos apurados uma causa de interruptiva da prescrição nos termos do artigo 323º do C.P.C., como seja, a citação dos Réu em 03.09.2002 no âmbito do processo nº. ° 995/2002, o que inutilizou todo o prazo até então decorrido.
Todavia, contrariamente ao decidido na 1ª instância, aqui é aplicável o disposto no artigo 498º, nº 3 do C.P.C., que preceitua que se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.
Efetivamente, não é pelo facto de a pessoa coletiva não ser responsabilizada penalmente, nem pelo facto de não se terem individualizado na ação as pessoas físicas sobre as quais deve recair a censura pela omissão causadora do acidente e dos danos, que deixa de se aplicar a previsão do nº 3 do artigo 498º do CCiv.
Nesta sede, entendemos reproduzir, na parte que releva, o teor da Jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão editado em 19.04.2005, no processo n.º 0211/05, porque esclarecedora da matéria em análise:” (…)
A questão a decidir consiste em saber se o alegado pelo A. na ação preenche a previsão do n. 2 do artigo 498.º do C. Civ., isto é, se o facto ilícito constitui crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo que o prazo de três anos referido nos números 1 e 2 do mesmo artigo.
Para saber se o facto constitui ou não crime é necessário que a materialidade das ocorrências que integram o ilícito civil integrem também um lícito penal.
O ilícito penal assenta necessariamente numa censura moral que apenas é possível desferir contra uma pessoa física.
Desta perspetiva parceria que em ações propostas contra pessoas colectivas de direito privado ou de direito público a regar do n.º 3 do artigo 498 do CCiv. nunca seria aplicável.
Mas não é assim, porque as pessoas colectivas são integradas por um substrato humano e são as pessoas físicas que agem em nome e no interesse das pessoas colectivas e entes públicos.
Ora, as pessoas físicas é que têm determinados comportamentos entre os quais omissões de deveres de diligência que podem estar na base de responsabilidade civil dos entes públicos em cuja esfera de interesses se inscreve a atividade em que surgiu o dano.
Evidentemente que a culpa individual não se transfere, dada a sua natureza psicológica e pessoal para as pessoas morais.
Mas, quando se diz que o Município demandado em ação de responsabilidade civil mantinha, devido a obras uma elevação do pavimento e da tampa de saneamento da rua a seu cargo, onde continuava a autorizar a circulação de veículos, sem que tal obstáculo estivesse sinalizado, dando assim origem a que nas circunstâncias específicas do caso o A. não tivesse podido evitar o embate sem culpa sua na elevação, do que resultaram ferimentos e danos, isto significa que houve pessoas físicas que terão deixado de cumprir o dever que incumbia ao Município de manter devidamente sinalizadas as obras e obstáculos ocasionais, para evitar consequências como as que estão na origem da ação.
E, como tais omissões, reportadas à pessoa coletiva pública são, pelo mecanismo jurídico da personalidade coletiva, as imputáveis às pessoas físicas que atuaram na esfera de gestão que à pessoa coletiva incumbe, então é de justiça e tem sido admitido que se considere existir a culpa do ente público que serve de fundamento à responsabilidade civil.
E, sendo assim efetuada esta transposição também nada impede, antes se justifica, que para efeitos de apreciação da prescrição desta responsabilidade civil se atenda também à existência de condutas dos servidores da pessoa coletiva, ainda que não individualmente identificados, para averiguar se elas tal como alegadas pelo A. são suscetíveis de integrar o ilícito criminal como se fossem ações ou omissões de uma pessoa física concreta e identificada. No caso de se verificarem os requisitos que seriam aplicáveis à responsabilidade penal das pessoas físicas tem entendido a jurisprudência que é de aplicar o prazo de prescrição mais longo referido no n.º 3 do artigo 498.º do CCiv., solução que se considera como mais ajustada, visto que de outro modo ficaria injustificadamente sujeito a um tratamento diferente e menos exigente a responsabilidade das pessoas colectivas apenas pelo facto de os interesses ou atividades que estão na origem do dano estarem na órbita do património ou das competências ou dos fins da pessoa coletiva.
Releva também decisivamente a favor da aplicação do prazo do n.º 3 o facto de existindo responsabilização conjunta ou mesmo em exercício de direito de regresso da pessoa ou pessoas físicas que deram origem ao dano imputável à esfera da pessoa coletiva em cujo nome e interesse agiram, tal responsabilidade criminal e civil poder ser exercida em cinco anos, pelo que não faria sentido submeter a prazo diferente a responsabilidade de apenas um dos obrigados civilmente a tal reparação dos danos, a pessoa coletiva.
Efetivamente, se em muitos casos não são demandados como Réus as pessoas físicas que cometeram a falta que está na origem da responsabilidade do ente público é apenas pela particular divisão de responsabilidades entre a administração e os atos culposos dos seus funcionários e agentes decorrente dos art.ºs 2.º n.º 2 e 3.º do DL 48051, de 21.11.67, e não pelo facto de não existir tal responsabilidade pessoal.
Daí que o Acórdão indicado pelo M.º P.º, de 2.12.2004, P. 0145/04, em sustentação do decidido não tenha exatamente o sentido que lhe parece emprestar o respetivo sumário, uma vez que ao referir que se devem provar os elementos do crime ainda que imputável a algum ou alguns dos Réus, quer-se significar a algum dos réus em sentido amplo, mesmo aos que podiam ser réus na ação ou demandados por aquela responsabilidade, quer estejam ou não concretamente como Réus na concreta situação em apreciação.
Claramente no sentido aqui adotado podem ver-se entre outros os Ac. deste STA de 14.01.2004, P. 01035/03; de 19.11.2003, P. 01602/03; de 16.01.2003, P. 046481; de 12.04.2000, P. 044060 e de 26.06.86, P. 020386.
No caso é pacífico que os factos alegados imputados às pessoas que omitiram a sinalização e os cuidados exigíveis para evitar o acidente constituem o ilícito criminal de ofensas corporais do artigo 148.º n.ºs 1 e 3 do C. Penal, pelo que o prazo de prescrição do respetivo procedimento (artigo 118.º n.º 1 – c) do CP) e também da ação de responsabilidade civil é de cinco anos.
(…)”.
Acompanhando e acolhendo a interpretação assim declarada por este Tribunal Superior, e apontados os factos descritos pelo Autor/Recorrente para a prática de um crime de ofensa à integridade física, como claramente aponta o Recorrente na sua réplica, que vai ao ponto o integrar na sua modalidade mais grave, tem-se, portanto, por assente que, no caso presente, o prazo de prescrição da presente ação é, no mínimo, de 5 anos.
Assim, iniciando-se em 03.09.2002 [data de verificação da causa interruptiva da prescrição] a contagem do prazo de 5 anos para o Autor exercer o seu direito, o mesmo terminou em 03.09.2007.
Logo, quando o Recorrente interpôs a presente ação [20.07.2006], ainda não havia prescrito o seu direito para interpor a presente ação, por não se mostrar esgotar o prazo de cinco anos para o seu exercício.
Sendo assim, é tempo de concluir, perante a evidência da manifesta tempestividade da interposição da ação em juízo, pela procedência do erro de julgamento de direito imputado à decisão recorrida, que, assim, se não pode manter.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a sentença recorrida, e ordenando-se a baixa dos autos para o prosseguimento dos mesmos, caso a tal nada mais obste.
Ao que se provirá em sede de dispositivo.
***
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em conceder provimento ao recurso jurisdicional “sub judice”, e, em consequência, revogam a sentença recorrida e determinam a baixa dos mesmos para prosseguimento dos respetivos trâmites, se nada mais a tal obstar.
Custas a cargo dos Recorridos.
Registe e Notifique-se.
Porto, 29 de março de 2019,
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco