Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00710/17.3BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/25/2018
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:RECURSO
MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO E DE DIREITO
Sumário:I) De acordo com o exposto nos artigos 87.º, n.º 1, alínea f) e 89.º-A, n.º 5 da Lei Geral Tributária, constituem pressupostos legais vinculativos da actuação da administração tributária no sentido da determinação da matéria tributável nos termos ali previstos e que esta está, portanto, obrigada a provar (cf. artigo 74º, nº 1 da LGT e artigo 342º, nº 1 do Código Civil): (i) acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000 e bem assim (ii) a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.
II) O facto manifestado não se subsume apenas a uma realidade que é do conhecimento público, podendo derivar, como no caso, dos elementos registados e que vieram ao conhecimento da AT na sequência do acesso à conta bancária descrita.
III) A partir do momento em que a AT fez a prova da verificação dos pressupostos legais do recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável que suporta o acto posto em crise, passou então a recair sobre os Recorrentes o ónus da prova da inexistência dos factos tributários ou de erro ou excesso na quantificação da matéria tributável efectuada, sendo que para afastar a utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável o contribuinte tem de demonstrar que detinha proventos que não tinham de ser declarados para efeitos de imposto sobre o rendimento, suficientes para assegurar a manifestação de fortuna que estiver na base de tal utilização, só sendo esta afastada se esses proventos chegarem para assegurar a totalidade da manifestação de fortuna em causa, sendo ainda necessário que se demonstre que ela foi efectivamente assegurada com esses bens.
IV) Nestas condições, não merece censura o exposto na decisão recorrida, posto que alegar que levantou o dinheiro ao balcão e que o entregou a uma outra pessoa e / ou que assinou cheques e documentos indispensáveis à realização de transferências desses montantes a seu pedido, inviabilizando a determinação do destino efectivo desse dinheiro, sem comprovar tais factos e sem identificar minimamente essa pessoa, versão que além de inverosímil inviabiliza a identificação do beneficiário efectivo desse dinheiro, não constitui matéria susceptível de livrar a Recorrente do ónus da prova já apontando, tornando inclusivamente bem mais pesado o fardo que pretende afastar.
V) Além disso, perante a bondade do procedimento da AT nos termos já afirmados e considerando que a Recorrente não logrou demonstrar a origem e o destino efectivo do rendimento apurado, só pode concluir-se que o rendimento colectável e o imposto em falta apurados pela AT são compatíveis com a sua capacidade contributiva, na medida em que têm em conta o rendimento apurado, não existindo aqui qualquer sanção, mas apenas a aplicação da lei em função daquilo que foi apurado nos autos.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:V...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
V..., com os sinais nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, datada de 04-12-2017, que julgou improcedente o recurso judicial da decisão do Senhor Director de Finanças do Porto, de 15/09/2017, que lhe fixou o rendimento colectável do IRS no ano de 2013, por métodos indirectos, nos termos dos arts. 87.º, n.º 1, alínea f), e 89.º-A, n.º 5, alínea a), da LGT, a enquadrar na Categoria G do IRS, conforme alínea d) do n.º 1 do art. 9.º do CIRS, no montante de € 269.852,45.

Formulou nas respectivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
I. O recurso contencioso foi interposto após a fixação de rendimentos, determinada por avaliação indirecta nos termos dos n.º 3 e 5, do Art. 89º-A da LGT (ex vi alínea f) do n.º 1, do Art. 87º do mesmo diploma legal, relativo ao ano de 2013.
II. De acordo com Relatório da Inspecção Tributária (RIT), a inspecção tributária foi motivado pelas declarações Modelo 40 apresentadas ao abrigo do n.º 3 do Art. 63º-A da Lei Geral Tributária (LGT), relativamente aos valores dos fluxos de pagamentos com cartões de crédito e débito, efectuados por intermédio de instituições de crédito e sociedades financeiras, a sujeitos passivos que aufiram rendimentos da categoria B de IRS e IRC, considerando a AT existir “incremento patrimonial do s.p. naquele montante”, constituindo aumento de património não justificado, que a Recorrente não aceita.
III. A associação dum TPA serviu indiscutivelmente para movimentar receitas e despesas confinadas no desenvolvimento de uma actividade de natureza comercial, que não da Recorrente, mas sempre uma actividade comercial, pelo que, nunca enquadrável como manifestações de fortuna previstas no Artº 87º da L.G.T. .
IV. Espera a Recorrente que seja reconhecida a sua verdadeira situação tributária, despenalizando-a de uma carga tributária totalmente absurda, incompatível e injusta, face aos mais elementares princípios de justiça e imparcialidade, no respeito pelas garantias dos contribuintes, conforme dispõe o Art. 55º da L.G.T., sem prescindir os direitos igualmente consignados nos Art. 5º, 6º e 7º do RCPITA.
V. Salvo o devido respeito que muito é, a AT não andou bem, pois, inexistem os pressupostos de aplicação do Art. 87º, n.º 1, alínea f) e n. 3 e 5, do Art. 89º-A da Lei Geral Tributária (LGT), nem os previstos na alínea d) do n.º 1 do Art. 9º do CIRS (Acréscimos patrimoniais não justificados, determinados nos termos dos artigos 87.º, 88.º ou 89.º-A da Lei Geral Tributária).
VI. A tributação por via das manifestações de fortuna visa alcançar rendimentos que, face ao património ostentado pelo contribuinte, presumivelmente terão sido subtraídos à tributação em IRS.
VII. Com a derrogação do sigilo bancário, a AT ficou a perceber que não existiam sinais de quaisquer manifestações de fortuna na acepção que o legislador que confere.
VIII. É certo que, impende sobre a Recorrente o ónus da prova à luz do Art. 89º-A da LGT, só que, a inversão do ónus da prova, não é uma porta aberta para a AT partir para a tributação nas situações em que se torna praticamente impossível a prova exigida, antes devendo conformar-se com uma prova razoável, que permita concluir da não omissão de rendimentos sujeitos a declaração.
IX. A avaliação indirecta tem, por isso, carácter excepcional - última ratio fisci - a ela apenas se procedendo quando não seja viável a determinação da matéria tributável por meio da avaliação directa, seja por falta de elementos para se operar com esta, seja por existirem razões para suspeitar que o valor a que conduz a aplicação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real.
X. De acordo com o Art. 104º da CRP, nem o rendimento colectável nem o imposto apurado pela AT são compatíveis com a capacidade contributiva da Recorrente.
XI. O imposto assim determinado e que a AT quer cobrar à Recorrente resultante do mecanismo da “Manifestação de Fortuna” assume uma verdadeira natureza de sanção que viola a sua própria natureza e que a recorrente naturalmente contesta.
XII. Destarte, o acto de fixação e rendimentos em sede de IRS à Recorrente no ano fiscal de 2013 está ferido de ilegalidade, por inexistência do facto tributário, muito menos qualquer manifestação de fortuna.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado provado e procedente e, consequentemente, ser anulado o acto de fixação de IRS, assim se fazendo a habitual Justiça.

A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
“(…)
a) A AT pugna pela manutenção na ordem jurídica da sentença sob recurso, a qual entende que não está ferida de qualquer erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito.
b) A modificabilidade pelo TCA da decisão da matéria de facto pressupõe que, para além da indicação dos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, que sejam indicados os concretos meios de prova constantes no processo ou de gravação realizada que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (art.º 690º-A, nº1, e 712º, nº1, al. a) e b) do CPC).
c) O erro na apreciação das provas relevante para a alteração da decisão de facto pressupõe pois, que estas (provas) deveriam conduzir a uma decisão necessária e forçosamente diversa e não uma decisão possivelmente diferente.
d) Se a interpretação, apreciação e valoração das provas permitir uma decisão, diversa da proferida, mas sem excluir logicamente a razoabilidade desta, neste caso pode haver erro na apreciação das provas, mas não será juridicamente relevante para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior.
e) A decisão proferida com base numa interpretação e valoração (ainda que discutíveis) fundamentadas nas provas produzidas contida no espaço definido pela livre apreciação das provas e pela convicção por elas criada no espírito do juiz, não pode ser alterada, a menos que contra ela se apresentem provas irrefutáveis, já existentes nos autos e desconsideradas ou supervenientes.
f) Com a pretensão recursiva, pretende a Recorrente uma nova decisão, assentando toda a sua fundamentação num novo pedido de apreciação, sem imputar à sentença qualquer erro de julgamento quanto aos factos.
g) Ora, sendo os critérios que nortearam a análise crítica da prova objectivos, lógicos e racionais, obedecendo às regras da experiência e àquilo que é a normalidade do acontecer, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas, motivo pelo qual a modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada e aprendida pela decisão recorrida, só se justificaria se, feita a reapreciação, fosse evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada pela instância recorrida, o que manifestamente não acontece.
h) O que ficou provado, pelo depoimento de parte é que “ quanto à questão da titularidade e propriedade do dinheiro, a recorrente não fez prova que o dinheiro depositado na sua conta bancária (matéria de facto julgada provada em H) e I) e matéria de facto julgada não provada em 1) é do referido Senhor T…”, a este propósito esclarece a sentença recorrida que: “ A recorrente apesar de ter alegado tais factos não fez prova dos mesmos. Aqui não pode deixar de salientar-se que além da falta de verosimilhança e de prova dos factos alegados, a recorrente não logrou demonstrara que não foi a beneficiária efectiva desses montantes, nem que a sua origem não resulta de qualquer atividade sua. O facto de não ter exercido a atividade declarada para efeitos fiscais, não significa que não possa ter tido outra atividade por si ou interposta pessoa, tanto mais que não justificou a origem dos montantes aí depositados, nem apresentou uma versão coerente e consciente para a sua origem, limitando-se a alegar que na sua maioria eram depósitos realizados por terminal de TPA durante a noite, pelo que não era atividade exercida por si.”
i) Não poderão por isso proceder, as conclusões de recurso, uma vez que a Recorrente não provou quaisquer factos susceptíveis de infirmar o juízo permitido pelo artigo 89.º – A da LGT, na fixação de rendimento padrão apurado nos termos do n.º5 do mesmo artigo, não apresentando nenhuma prova razoável que pudesse suportar as suas alegações.
j) Ou seja, toda a argumentação que agora é exposta, não afasta os pressupostos e condições legalmente exigidas e que determinaram a decisão de fixação do rendimento colectável para o ano de 2013, porquanto à mesma e ao contrário do alegado pela Recorrente, não pode ser imputada nenhuma ilegalidade.
k) A administração Tributária, tal como resulta da decisão a quo fez todas as diligências que lhe impunham os princípios do inquisitório e da descoberta da verdade material e os arts. 87.º, n.ºs 1, alínea f), e 2, e 89.º-A, n.º1, da LGT, para a determinação e apuramento da matéria tributável de IRS resultante de incremento patrimonial enquadrável na Categoria G do IRS, nos termos da alínea d) do n.º 1 do art.º 9.º do CIRS.
l) Prossegue a sentença sob recurso que “ a alegada origem efectiva dos rendimentos, designadamente, através da alegada hora e origem dos depósitos realizados na conta da recorrente e do negócio efectivo que esteve na origem desses rendimentos, quer a própria origem dessa conta, são factos que dependem de prova da recorrente e que não é tão difícil quanto pretende fazer crer, quando imputa essa falta de prova à administração tributária.
Mesmo o período de tempo decorrido entre os factos em apreço - 2013 - e o ano da inspecção e da notificação para a comprovação da origem desses rendimentos 2017- não é assim tanto que impossibilite ou inviabilize a sua prova. O que a recorrente não pode é vir alegar que a conta não é sua, que é de favor, que é uma conta do Senhor T…, e não fazer qualquer prova desse facto.
m) Realçando que: “ Além disso, também não pode vir alegar que levantou esse dinheiro ao balcão e que o entregou ao Senhor T… e/ou que assinou cheques e documentos indispensáveis à realização de transferências desses montantes a seu pedido, inviabilizando a determinação do destino efectivo desse dinheiro, sem comprovar tais factos e sem identificar minimamente essa pessoa, versão que além de inverosímil inviabiliza a identificação do beneficiário efectivo desse dinheiro.”
n) Acompanhando a AT o entendimento do Tribunal “ a quo”, quando este evidencia que, “Mesmo a questão da alegada falta de prova da origem do dinheiro estar ou não efectivamente ligada à atividade comercial para a qual a recorrente se tinha colectado no ano de 2013 está fora de questão, na medida em que é a própria recorrente que confessa, quer no procedimento de inspecção, quer nestes autos, quer nas suas declarações de parte, que não exerceu a atividade para que se tinha colectado no ano de 2013 e que o dinheiro depositado na sua conta não proveio dessa atividade.
Todavia, também não demonstrou qual a origem desses depósitos e qual foi o seu destino efectivo.”.
o) Em síntese, a Recorrente não demonstrou a origem, titularidade e mobilização dos fundos/ valores, obtidos através do TPA, ficando-se por uma fundamentação desconexa e inverosímil.
p) Por seu turno, em sede inspectiva, a AT cumpriu o contraditório e desenvolveu todas as diligências necessárias à determinação da capacidade patenteada pelos actos que configuram o acréscimo patrimonial, mormente a análise aos extractos bancários do ano de 2013, de acordo com os pressupostos legalmente consignados.
q) “Assim sendo, o rendimento colectável e o imposto em falta apurados pela administração tributária são compatíveis com a sua capacidade contributiva, na medida em que têm em conta o rendimento apurado.”.
r) E nenhumas outras diligências lhe seriam exigíveis atenta a versão dos factos da Recorrente.
s) É sobre a Recorrente que impendia o ónus de demonstrar que correspondem à verdade os valores declarados e de que é outra a fonte da manifestação de fortuna ou acréscimo de património ou de despesa efectuada, ora, a Recorrente não cumpriu minimamente esse ónus probatório.
t) Mais se diga, tal como e bem se estabelece na decisão a quo, que, “Verificada a legalidade do recurso à aplicação dos métodos indirectos e à correcção da matéria colectável pela verificação dos pressupostos do art.º 87.º, n.º 1, alínea f), da LGT, e não tendo comprovado que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património, competia aos recorrentes alegar e demonstrar algum erro ou excesso de quantificação (art.º 74.º, n.º 3, da LGT). Aqui a Recorrente não invoca expressa e concretamente qualquer erro ou excessos ou excesso de quantificação, nem impugna os valores apurados pela administração tributária. A única referência indirecta foi o facto de ter alegado que não teve qualquer proveito, por não ser seu, o que não significa que tivesse havido erro ou excesso de quantificação no apuramento desse valor. Todavia, também não provou esse facto. Donde tem de concluir-se que a Recorrente não alegou, nem comprou a existência de qualquer erro ou excesso de quantificação de matéria tributável”.
u) Nenhum vício pode, pois, ser imputado à decisão recorrida, a qual fez uma correcta apreciação e aplicação da lei face ao quadro legal aplicável.
v) Nos termos supra expostos, será de manter a sentença sob recurso, a qual julgou o recurso da decisão do Senhor Director de Finanças do Porto, que fixou o rendimento colectável do IRS no ano de 2013, por métodos indirectos, nos termos dos arts. 87.º, n.º 1, alínea f), e 89.º-A, n.º 5, alínea a) da LGT, a enquadrar na Categoria G do IRS, conforme alínea d) do n.º 1 do art.º 9.º do CIRS, no montante de €269.852,45.
Nos termos supra expostos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, devem ser julgadas improcedentes as pretensões recursivas da Recorrente.”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso.

Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em apreciar a legalidade da decisão de fixação da matéria tributável, por erro nos pressupostos de facto e de direito no que concerne à decisão de aplicação dos métodos indirectos.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
I) Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provado:
A) A recorrente foi sujeita a um procedimento de inspeção que foi concluído pelo relatório de inspeção tributária de folhas 125 a 134 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
B) A recorrente esteve inscrita desde 13/02/2013 para o exercício da atividade de “Comércio a Retalho de louças, cutelarias e outros artigos similares para uso doméstico, em estabelecimento especializado” com o CAE 47592 (fls. 125 a 134 e confissão da recorrente).
C) A recorrente cessou a atividade em 31/12/2013 (fls. 125 a 134 e confissão da recorrente).
D) A recorrente não emitiu qualquer recibo dessa atividade (fls. 125 a 134 e confissão da recorrente).
E) Não obstante ter-se inscrito, a recorrente não exerceu essa atividade no ano de 2013 (fls. 125 a 134 e confissão da recorrente).
F) A recorrente não apresentou/submeteu qualquer declaração para efeitos de IRS relativamente ao ano de 2013 (fls. 125 a 134).
G) A recorrente apresentou as declarações de rendimentos de IRS dos anos de 2010, 2011, 2015 e 2016 (fls. 125 a 134).
H) No ano de 2013, a recorrente foi titular da conta bancária identificada pelo número PT…, do Banco BIC Português, SA (fls. 125 a 134 e confissão da recorrente).
I) No ano de 2013 foram depositados nesta conta €269.852,45 (fls. 125 a 134).
II) Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga não provado:
1) O montante referido em I) depositado na conta referida em H) não pertence à recorrente, mas a um Senhor T…, não é proveniente de qualquer atividade sujeita a IRS e não é rendimento sujeito a IRS (fls. 125 a 134 e declarações de parte da recorrente).
3.1.1 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, conjugados com as regras da experiência e com a prova documental e as declarações de parte produzidas em audiência contraditória, na parte em que constituem confissão da recorrente (arts. 341.º, 352.º e seguintes e 362.º e seguintes do CC).
Quanto à matéria de facto julgada provada cumpre apenas explicar que além da prova documental que a comprova, a própria recorrente não a impugna, em particular no que respeita à titularidade da conta identificada em H) e ao valor global aí depositado no ano de 2013, identificado em I).
Da matéria de facto julgada não provada cumpre explicar a sua redação e a motivação.
A recorrente, embora não invoque expressamente na petição inicial, refere, em síntese, os factos invocados no direito de defesa em que alega que apesar de ser titular da referida conta bancária em causa o dinheiro aí depositado não é seu, porque essa conta foi aberta a pedido dum Senhor chamado T…, que lhe deu o dinheiro para abrir a conta e era ele que usava o TPA através do qual foram feitos os depósitos, que usava os meios eletrónicos de movimentação da conta e que dava destino ao dinheiro aí depositado, através dos cheques levantados ao balcão e utilizados para fazer outros pagamentos, que eram assinados por si em branco a pedido do T… que era quem beneficiava desse dinheiro e era o seu titular.
Estes factos, embora alegados indiretamente, são factos instrumentais dos factos essenciais à decisão da causa a saber: que o dinheiro referido em I) da matéria de facto julgada provada não pertence à recorrente, não é proveniente de qualquer atividade sujeita a IRS e não é rendimento sujeito a IRS, porquanto são estes factos que a julgarem-se provados ou não provados são suscetíveis de determinar a anulação ou não da decisão impugnada.
Por isso, o Tribunal reduziu os factos instrumentais alegados indiretamente pela recorrente a estes factos essenciais que julgou não provados.
Cumpre agora explicar a motivação da decisão do Tribunal.
O Tribunal julgou não provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa por insuficiência da prova.
A recorrente alegou, em síntese, que não é a beneficiária ou dona do dinheiro depositado na sua conta bancária, porque abriu essa conta a pedido dum Senhor T… e que era ele que a usava, apesar de ter sido aberta por si e de ser ela que assinava os documentos necessários a movimentá-la, designadamente cheques e demais documentos necessários mesmo para a movimentação eletrónica da conta e do TPA.
A recorrente alegou que o fez a pedido do T… que era uma pessoa que conheceu nas imediações da escola e que lhe pediu o favor de abrir a conta para estar isenta de custos, bem como para pedir o TPA, tendo-lhe pedido igualmente que para esse efeito se coletasse nas finanças para o exercício duma atividade, o que também fez a seu pedido, apesar de nunca exercer a atividade. Esclareceu ainda que pedia os cheques, assinava-os em branco e entregava-os ao T… e ia levantar dinheiro ao balcão que entregava ao T….
Apesar de nas suas declarações ter corroborado esta versão, o Tribunal não a valorou.
Desde logo, pelo manifesto interesse direto da recorrente no desfecho da causa.
Por outro lado, pela manifesta falta de verosimilhança dos factos alegados e declarados, sobretudo atendendo ao facto da recorrente alegar que não tem qualquer espécie de contacto do e com o T…, nem qualquer conhecimento de qualquer elemento da sua identificação.
Finalmente, porque esta sua versão não demonstra que não tenha sido ela própria a beneficiária direta ou indireta desses valores, não demonstra que não possa ter exercido outra atividade, diferente da declarada, nem que esses valores não estavam sujeitos a IRS, na medida em que não demonstrou a origem efetiva desses valores.
A falta de assertividade das declarações da recorrente, conjugada com a falta de verosimilhança dos factos alegados e a falta de demonstração e de qualquer outra prova dos factos alegados por si, fazem com que o Tribunal não fique convencido da veracidade dos factos alegados por si.
As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (art. 341.º do CC).
Perante a inconsistência da prova produzida e a falta de credibilidade dos factos alegados, o Tribunal não ficou convencido da demonstração da realidade dos factos alegados pela recorrente.
Sendo factos alegados por si recorrente e constitutivos do seu direito de anulação da decisão recorrida, recaía sobre a recorrente o respetivo ónus da prova (arts. 74.º, n.º 1, e 89.º-A, n.º 3, da LGT), pelo que não tendo feito prova suficientemente consistente dos mesmos, os factos alegados têm de ser julgados contra si, isto é, têm de ser julgados não provados (art. 414.º do CPC).
A restante matéria de facto alegada não foi julgada provada ou não provada, por revelar-se inútil para a decisão da causa ou por integrar conceitos de direito ou alegações conclusivas quer de facto quer de direito ou por ser irrelevante para a decisão da causa.”
«»
3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a sentença recorrida decidiu julgar improcedente o recurso deduzido, em virtude da recorrente, através da prova efectuada, não ter logrado comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados (no caso dos autos não declarado) e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património no ano de 2013.

Nas suas alegações, a Recorrente aponta que de acordo com Relatório da Inspecção Tributária (RIT), a inspecção tributária foi motivado pelas declarações Modelo 40 apresentadas ao abrigo do n.º 3 do Art. 63º-A da Lei Geral Tributária (LGT), relativamente aos valores dos fluxos de pagamentos com cartões de crédito e débito, efectuados por intermédio de instituições de crédito e sociedades financeiras, a sujeitos passivos que aufiram rendimentos da categoria B de IRS e IRC, considerando a AT existir “incremento patrimonial do s.p. naquele montante”, constituindo aumento de património não justificado, que a Recorrente não aceita, sendo que a associação dum TPA serviu indiscutivelmente para movimentar receitas e despesas confinadas no desenvolvimento de uma actividade de natureza comercial, que não da Recorrente, mas sempre uma actividade comercial, pelo que, nunca enquadrável como manifestações de fortuna previstas no Artº 87º da L.G.T., esperando a Recorrente que seja reconhecida a sua verdadeira situação tributária, despenalizando-a de uma carga tributária totalmente absurda, incompatível e injusta, face aos mais elementares princípios de justiça e imparcialidade, no respeito pelas garantias dos contribuintes, conforme dispõe o Art. 55º da L.G.T., sem prescindir os direitos igualmente consignados nos Art. 5º, 6º e 7º do RCPITA.
Além disso, a tributação por via das manifestações de fortuna visa alcançar rendimentos que, face ao património ostentado pelo contribuinte, presumivelmente terão sido subtraídos à tributação em IRS e com a derrogação do sigilo bancário, a AT ficou a perceber que não existiam sinais de quaisquer manifestações de fortuna na acepção que o legislador que confere.
É certo que, impende sobre a Recorrente o ónus da prova à luz do Art. 89º-A da LGT, só que, a inversão do ónus da prova, não é uma porta aberta para a AT partir para a tributação nas situações em que se torna praticamente impossível a prova exigida, antes devendo conformar-se com uma prova razoável, que permita concluir da não omissão de rendimentos sujeitos a declaração.
A avaliação indirecta tem, por isso, carácter excepcional - última ratio fisci - a ela apenas se procedendo quando não seja viável a determinação da matéria tributável por meio da avaliação directa, seja por falta de elementos para se operar com esta, seja por existirem razões para suspeitar que o valor a que conduz a aplicação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real e de acordo com o Art. 104º da CRP, nem o rendimento colectável nem o imposto apurado pela AT são compatíveis com a capacidade contributiva da Recorrente, pois o imposto assim determinado e que a AT quer cobrar à Recorrente resultante do mecanismo da “Manifestação de Fortuna” assume uma verdadeira natureza de sanção que viola a sua própria natureza e que a recorrente naturalmente contesta.
Destarte, o acto de fixação e rendimentos em sede de IRS à Recorrente no ano fiscal de 2013 está ferido de ilegalidade, por inexistência do facto tributário, muito menos qualquer manifestação de fortuna.

Que dizer?
Nos termos do artigo 1.º do CIRS, o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares incide sobre o valor anual dos rendimentos das categorias, ali enunciadas, mesmo que provenientes de actos ilícitos, depois de efectuadas as correspondentes deduções e abatimentos, sendo que a categoria que interessa aos presentes autos é a categoria G - incrementos patrimoniais, que está definida no artigo 9.º do CIRS, norma de acordo com a qual (nº 1 al. d)) constituem incrementos patrimoniais «os acréscimos patrimoniais não justificados, determinados nos termos dos artigos 87.º, 88.º ou 89.º-A da lei geral tributária», acrescentando o nº 3 da citada norma que “São igualmente considerados incrementos patrimoniais aqueles a que se refere o n.º 5 do artigo 89.º-A da lei geral tributária", pelo que, há uma remissão para os artigos que regem a avaliação indirecta da matéria tributável.
Nos termos do citado artigo 87.º, n.º 1, alínea f) e 89.º-A, n.º 5 da Lei Geral Tributária, a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de “acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000, verificados simultaneamente … com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.”

Decorre, pois, das normas agora apontadas, que constituem pressupostos legais vinculativos da actuação da administração tributária no sentido da determinação da matéria tributável nos termos ali previstos e que esta está, portanto, obrigada a provar (cf. artigo 74º, nº 1 da LGT e artigo 342º, nº 1 do Código Civil): (i) acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000 e bem assim (ii) a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.
Como assinala a melhor doutrina, “a tributação dos rendimentos inferidos das manifestações de fortuna tem como fundamento o dever fundamental de pagar impostos e a necessidade, daí decorrente, de combater a evasão fiscal [que] visa evitar que certo tipo de rendimentos, actuais ou passados, que tenham escapado ao controlo legal, deixem de ser tributados” - nestes termos, João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um Contributo para Reequacionar os Métodos Indirectos de Determinação da Matéria Tributável, Almedina, 2010, pág. 273.
Na sequência do exposto, cabe então à Administração Tributária (art. 74.º, n.º 1, da LGT e art. 342.º, n.º 1, do C. Civil) provar o facto que, segundo a lei, constitui uma manifestação de fortuna e ao sujeito passivo cabe o ónus de provar que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo do património ou da despesa efectuada (ou seja, ocorre uma inversão do ónus da prova).
Diga-se ainda que o facto manifestado não se subsume apenas a uma realidade que é do conhecimento público, podendo derivar, como no caso, dos elementos registados e que vieram ao conhecimento da AT na sequência do acesso à conta bancária descrita.

No caso presente, na sequência do procedimento de inspecção tributária, temos como adquirido que não existe rendimento colectável declarado, na medida em que a Recorrente não declarou quaisquer rendimentos no ano de 2013 e bem assim que, na sequência do acesso à conta bancária da Recorrente, no ano de 2013 foram depositados na aludida conta € 269.852,45, dos quais foram movimentados a débito, nesse ano, € 264.466,96.
Com este pano de fundo, resulta evidente uma desproporção entre o total de depósitos realizados nesses anos e os rendimentos declarados pela Recorrente, motivo pelo qual tais valores foram fixados como rendimento colectável resultante de correcção à matéria tributável por métodos indirectos, como incremento patrimonial injustificado, a enquadrar na categoria G (art. 9.º, n.º 1, alínea d), do CIRS), nos termos do disposto da alínea a) do n.º 5 do art. 89.º-A da LGT.

Assim, e na medida em que o recurso ao método indirecto foi fundamentado na alínea f) do nº 1 do artigo 87.º da LGT, norma que estabelece que “a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: … f) Acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”, face à factualidade que vem provada, tem de considerar-se justificado.

Nesta sequência, e a partir do momento em que a AT fez a prova da verificação dos pressupostos legais do recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável que suporta o acto posto em crise, passou então a recair sobre a Recorrente o ónus da prova da inexistência dos factos tributários ou de erro ou excesso na quantificação da matéria tributável efectuada.
Com efeito, e como referem Diogo Leite Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, 4ª edição, 2012, pág. 782-783, “… De harmonia com o n.º 3 deste art. 89.º-A, quando se prova a existência de uma das manifestações de fortuna dos tipos previstos no n.º 4 ou uma situação enquadrável na alínea f) do n.º 1 do art. 87.º da LGT, cabe ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas não é rendimentos sujeitos a declaração em sede de impostos sobre o rendimento. …
Para afastar a utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável o contribuinte tem de demonstrar que detinha proventos que não tinham de ser declarados para efeitos de imposto sobre o rendimento, suficientes para assegurar a manifestação de fortuna que estiver na base de tal utilização, só sendo esta afastada se esses proventos chegarem para assegurar a totalidade da manifestação de fortuna em causa.
Porém, se o sujeito passivo conseguiu demonstrar que parte dos proventos que asseguraram a manifestação de fortuna não tinham de ser declarados, não será afastada a utilização de métodos indirectos, mas ao rendimento presumido nos termos deste art. 89.º-A, que é a base da tributação, será de abater a parte dos proventos que se tiver provado que não tinham de ser declarados.
Para tal demonstração, não basta que se demonstre que o sujeito passivo possuía, no período de tempo em causa, bens suficientes que lhe permitiriam assegurar a manifestação de fortuna, sendo necessário que se demonstre que ela foi efectivamente assegurada com esses bens. …”.

Ora, de acordo com o probatório, é manifesto que a Recorrente não demonstrou que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que era outra a fonte do acréscimo do património, não tendo demonstrado que não se verificavam os pressupostos para a tributação por métodos indirectos.
E diga-se, desde já, que a Recorrente apenas se pode queixar de si própria.
Na verdade, quando se analisa a petição inicial, verifica-se que a ora Recorrente começa por referir que o valor depositado na conta bancária não é seu mas do Senhor T…, depois, que o valor a considerar teria de ser tributado, não como manifestação de fortuna, mas como rendimento da actividade declarada e, finalmente, a inexistência de facto tributário.
Quanto ao primeiro elemento, a alegação da ora Recorrente não tem qualquer sustentação, não merecendo a decisão recorrida qualquer censura nesta parte, na medida em que não tem qualquer sentido que a Recorrente tenha protagonizados os actos referidos no RIT e depois não seja capaz sequer de identificar a pessoa em causa, exibindo um comportamento em que, pelo contrário, opta por não permitir tal identificação. Sibi imputet.

Mas mais.
A Recorrente insiste que a associação dum TPA serviu indiscutivelmente para movimentar receitas e despesas confinadas no desenvolvimento de uma actividade de natureza comercial, que não da Recorrente, mas sempre uma actividade comercial, pelo que, nunca enquadrável como manifestações de fortuna previstas no Artº 87º da L.G.T., esperando a Recorrente que seja reconhecida a sua verdadeira situação tributária, despenalizando-a de uma carga tributária totalmente absurda, incompatível e injusta, face aos mais elementares princípios de justiça e imparcialidade, no respeito pelas garantias dos contribuintes, conforme dispõe o Art. 55º da L.G.T., sem prescindir os direitos igualmente consignados nos Art. 5º, 6º e 7º do RCPITA.

Neste ponto, importa notar que o princípio da verdade material está consagrado no artigo 6º R.C.P.I.T., e impõe que a Administração Tributária, no âmbito do procedimento de inspecção, procure recolher elementos probatórios que possibilitem mais tarde fundamentar o acto tributário que venha a ser praticado, ou seja, está em causa investigar e apurar o correcto cumprimento das obrigações fiscais pelos sujeitos passivos e, com base nessa investigação, recolher elementos que permitam apurar a eventual existência de irregularidades sempre no sentido da descoberta da verdade material.
Aliás, o princípio do inquisitório previsto no artigo 58º da LGT obriga a administração tributária a realizar todas as diligências que se afigurem necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, o que significa que todas as diligências devem ser efectuadas ainda que as mesmas não tenham sido requeridas, não dependendo por isso de um qualquer impulso procedimental do sujeito passivo.

Com este pano de fundo, e mais uma vez, a Recorrente apenas pode queixar-se de si própria, na medida em que, perante a informação disponibilizada à AT, esta desenvolveu os mecanismos necessários ao apuramento da realidade que envolvia a situação e, se porventura não foi mais longe, foi porque a Recorrente não deu qualquer contribuição nesse sentido, não forneceu qualquer esclarecimento em relação à situação em apreço, pretendendo agora retirar benefício dessa situação.
Assim, tal como se refere na decisão recorrida, “o facto de não ter exercido a actividade declarada para efeitos fiscais, não significa que não possa ter tido outra actividade por si ou interposta pessoa, tanto mais que não justificou a origem dos montantes aí depositados, nem apresentou uma versão coerente e consistente para a sua origem, limitando-se a alegar que na sua maioria eram depósitos realizados por terminal de TPA durante a noite, pelo que não era actividade exercida por si.”
Por outro lado, e ao contrário do que refere a Recorrente, com a derrogação do sigilo bancário, a AT ficou a perceber que existiam sinais de uma manifestação de fortuna nos termos da lei, pois que como se disse, o facto manifestado não é apenas aquele que é do domínio público, mas também aquele a que a AT acede em função dos registos, neste caso, constante da conta bancária que interessa aos autos.
Depois, quanto à prova, está na altura da Recorrente enfrentar a realidade e perceber que produziu muito pouco para o trabalho que a lei lhe cometia nesta sede, nada tendo aportado aos autos em termos de permitir outra percepção ou enquadramento da situação em apreço.

Na verdade, como também refere a decisão recorrida, alegar que levantou o dinheiro ao balcão e que o entregou ao Senhor T… e / ou que assinou cheques e documentos indispensáveis à realização de transferências desses montantes a seu pedido, inviabilizando a determinação do destino efectivo desse dinheiro, sem comprovar tais factos e sem identificar minimamente essa pessoa, versão que além de inverosímil inviabiliza a identificação do beneficiário efectivo desse dinheiro, não constitui matéria susceptível de livrar a Recorrente do ónus da prova já apontando, tornando inclusivamente bem mais pesado o fardo que pretende afastar.

Quanto à questão da capacidade contributiva em articulação com a avaliação indirecto, cabe notar que na tributação dos acréscimos patrimoniais não justificados, a AT não tem que demonstrar a falta de veracidade da declaração e/ou escrita ou documentação de suporte do contribuinte, bastando-lhe demonstrar o facto que o legislador considera constituir motivo para a realização da avaliação indirecta, ou seja, a existência de uma divergência não justificada entre os rendimentos líquidos declarados pelo sujeito passivo em determinado período de tributação e o património adquirido e/ou despesa efectuada (de valor superior a € 100.000,00) nesse mesmo período e também não tem que demonstrar a impossibilidade de aceder à verdadeira situação tributária do contribuinte por métodos directos, uma vez que o legislador lhe permite passar directamente à tributação por métodos indirectos, sem necessidade de qualquer outra justificação, além de que não necessita de encontrar e justificar um método de quantificação que seja adequado a uma maior aproximação à verdadeira situação tributária do contribuinte, pois que o legislador determinou como rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, o valor que resultar da diferença entre o acréscimo de património e/ou despesa efectuada e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.

Neste contexto, perante a bondade do procedimento da AT nos termos já afirmados e considerando que a Recorrente não logrou demonstrar a origem e o destino efectivo do rendimento apurado, só pode concluir-se que o rendimento colectável e o imposto em falta apurados pela AT são compatíveis com a sua capacidade contributiva, na medida em que têm em conta o rendimento apurado, não existindo aqui qualquer sanção, mas apenas a aplicação da lei em função daquilo que foi apurado nos autos.

No que concerne à inexistência de facto tributário, também aqui a pretensão da Recorrente está condenada ao insucesso, na medida em que é inequívoco o rendimento decorrente dos depósitos bancários existentes na conta bancária que está comprovado nos autos e que não foi impugnado pela recorrente, sendo que em relação à falta de exercício da actividade, como já se disse, apesar daquilo que se apurou - o não exercício da actividade para a qual estava colectada -, tal não significa que não possa ter tido outra actividade e obtido rendimentos doutra proveniência.
Assim sendo, na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, impõe-se, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.


4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 25 de Janeiro de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos