Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01122/04.4BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/28/2017
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:IVA
NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
MÉTODOS INDIRECTOS
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I) Em termos de omissão de pronúncia, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
II) A lei impõe um especial dever de fundamentação na utilização de métodos indirectos – n.º4 do art.º77.º da LGT.
III) Como assim, não contém a fundamentação legal exigida a decisão de aplicação de métodos indirectos que, na motivação de direito, se limita a remeter para os artigos 87.º e 88.º da LGT, sem especificar em que alínea deste último preceito se enquadram as pretensas irregularidades e anomalias que impossibilitam a determinação directa e exacta da matéria tributável. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
J…, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 26-11-2014, que julgou improcedente a pretensão pelo mesmo deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com a liquidação adicional de IVA do ano de 1997, liquidação n.º 01212024, no montante de € 3 866,46.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 46-55), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
1. O presente recurso vem interposto de douta sentença que julgou improcedente a impugnação apresentada contra a liquidação de IVA, referente ao exercício de 1997, e absolveu a Fazenda Pública.
2. O recorrente, em sede de impugnação judicial, invocou que lhe assistia o direito de ser ouvido antes da tomada de decisão de recurso aos métodos indirectos, sobre a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável e antes do acto de liquidação.
3. No entanto, o Tribunal a quo nunca se pronunciou sobre tais questões, já que o recorrente não pôs em causa o direito de audição sobre o projecto de relatório ou sobre o projecto de decisão da reclamação graciosa, pôs, sim, cm causa, o direito de audição previamente à tomada de decisão de recurso aos métodos indirectos e à liquidação.
4. O mesmo se diga em relação à “ilegalidade da avaliação indirecta”, que foi invocada.
5. Houve, assim, omissão de pronúncia.
6. Como toda e qualquer decisão emanada de um ente administrativo, está a decisão de recurso aos métodos indirectos sujeita a fundamentação, até porque, por maioria de razão, o n.º 1 do art. 87° prevê que “A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de...”
7. Ora, salvo o devido respeito, os fundamentos apresentados para fundamentar o recurso aos métodos indirectos não são suficientes,
8. Ou seja, a douta sentença admite como sendo possível que o relatório SIT não tenha considerado os diversos factos externos que pendem em benefício do recorrente, existindo designadamente uma ou duas divergências - que se ignora quais são - que facilmente se percebe e que não foram tidas em conta.
9. Por outro lado, do relatório SIT não aparecem demonstradas quaisquer irregularidades que, sem margem para dúvidas, possam ser imputáveis ao contribuinte.
10. Responde a douta sentença recorrida “Não se especificou qual das alíneas do art.º 88° da LGT mas é fácil de intuir face à descrição realizada...”
11. Ora, não se está no âmbito das intuições, a AT tem de apresentar uma fundamentação expressa.
12. O certo é que, contrariamente ao legado pela douta sentença, a Administração Tributária não logrou afastar a presunção de veracidade de que gozam as declarações do impugnante, não fornecendo, assim, os pressupostos para a determinação da matéria colectável por métodos indirectos de tributação.
13. Pois, a omissão de vendas na escrita pode fundamentar um erro ou inexactidão no registo contabilístico para os efeitos do art. 88°, n.º 1, al. a) da LGT, no entanto tal facto não é suficiente, por si só, para determinar o recurso à avaliação indirecta, já que a omissão em causa tem de inviabilizar a determinação da matéria colectável.
14. E, a douta sentença, em parte alguma, referencia que a Administração Tributária verificou a impossibilidade de comprovação directa e exacta da matéria tributável nos termos do artigo 87°, n.º1, al. b), da LGT, nem tampouco situa essa impossibilidade em nenhum dos factos do relatório da inspecção tributária, não tendo por consequência dado a conhecer qualquer materialidade factual relativa à dita impossibilidade de comprovação directa e exacta da matéria tributável.
15. Por conseguinte, importa reconhecer que a douta sentença recorrida exorbitou, porquanto também não fundamentou nenhum dos pressupostos invocados pela Administração Tributária.
16. Para prova do excesso da respectiva quantificação foi apresentada prova consistente e persuasiva, salvo o devido respeito por douta opinião contrária, designadamente diversos documentos que, segundo a douta sentença “As divergências resultantes dos documentos não são objeto de qualquer explicação: Salvo uma ou duas que podem facilmente perceber-se as demais no se compreendem.”
17. É manifesto que os critérios a que a AT recorreu, no ponto 5.1 do relatório SIT encontram-se fora do princípio da verdade material, até porque a AT não presumiu quaisquer Custos em função das condições concretas do exerci cio das actividades do contribuinte.
18. Esta situação de contradição teve influência na errónea quantificação da matéria tributável fixada, como é evidente, sendo que quanto a esta questão a douta sentença recorrida limita-se a emitir um juizo de valor, sem verdadeiramente se pronunciar, omitindo, deste modo, pronúncia.
19. Como evidencia o probatório da douta sentença, é manifesto que esta se apoiou no relatório da inspeção tributária mas não discriminou os factos e inexatidões que a Administração Tributária detetou.
20. Assim, a douta sentença por um lado, não se pronunciou sobre diversas situações referenciadas na impugnação judicial, conforme supra se mencionou, como também, por outro lado, quanto aos factos invocados a propósito da “errónea quantificação da matéria tributável”, da “inexistência do fato tributário” e da “falia de fundamentação do recurso aos métodos indirectos”, a douta sentença refere “Os três primeiros argumentos serão analisados em conjunto pois que conexos como se verá...”.
21. Ora, trata-se de situações que não se acham esclarecidas já que a douta sentença restringiu-se a considerações vagas, remetendo-se tão só para os fundamentos, invocados no Relatório da Administração Tributária, quando este, por sua vez, já padecia do vício da falta de fundamentação, desconhecendo-se quando é que a douta sentença se pronuncia quanto à “errónea quantificação da matéria tributável quanto à “inexistência do fato tributário” ou quanto à ‘falta de fundamentação do recurso aos métodos indirectos”.
22. Aliás, no modesto entender do recorrente, a douta sentença nem sequer se pronuncia quanto à “inexistência do fato tributário”, o que expressamente se invoca.
23. Em face do exposto, a douta decisão violou ou deu errada interpretação ao disposto nos artigos 56°, 74°, 77°, 81°, 82°, 87° e 88°, todos da LGT, 124° e 125°, ambos do CPA e 268° da CRP, sendo consequentemente nula, nulidade essa que expressamente se invoca.
24. Também, a douta sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, já que o Tribunal a quo deixou por conhecer questões que o recorrente submeteu à sua apreciação e nula por falta de fundamentação (cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT).
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser revogada a douta Sentença, proferida em 1ª Instância, e substituída por outra que defira a impugnação judicial apresentada.”

A recorrida A.T.A. não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido na improcedência do recurso – cfr. fls. 63/70 dos autos.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resume-se, em suma, em indagar da invocada nulidade por omissão de pronúncia quanto às questões da preterição da audição prévia antes da decisão do recurso à avaliação indirecta e antes da liquidação e da errónea quantificação bem como avaliar da falta de fundamentação do recurso a métodos indirectos e preterição de formalidades legais, apreciar o suscitado erro nos pressupostos da aplicação de métodos indirectos e valorar a apontada errónea quantificação da matéria tributável, nomeadamente, por falta de consideração de quaisquer custos associados aos proveitos presumidos.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
A) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 27 151 de 30/0l/2001,com o cód. PNAIT 32 237, com início em 02 de Fevereiro de 2001e fim em 15/02/2001, os Serviço de Inspeção Tributária da D. de Finanças de Viseu inspecionaram o Impugnante J…, relativamente aos exercícios de 1996, 1997,1998, 1999 e 2000, IVA e IRS, cfr. folha 38 a 41 do Processo administrativo (doravante PA) que correspondem a cópia de fls. Do relatório de inspeção, aqui dado por reproduzido, o mesmo se dizendo dos demais elementos infra referidos;
B) “… O Sujeito Passivo encontra-se registado no cadastro da DGI com a actividade de " Construção de edifícios ", CAE 45211. … O Sujo Pas. exerce a actividade de construção civil e ainda possui um aviário, mas nos seus elementos contabilísticos não separou nem os custos, nem os proveitos de ambas as actividades. “, idem anterior, fls. 41 do PA;
C) Na Inspeção referida em A) e a cujo relatório também já ali aludimos consignou-se:
IV - Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos.

No ramo da construção civil, possuindo os equipamentos necessários e usuais ao exercício da actividade, tendo em média 5 trabalhadores ao seu serviço, sendo que o seu método de trabalho é o normal ou seja o ajuste completo da obra, conhecido como tipo" chave na mão", ajuste de só parte da obra como seja só a montagem ou só o reboco ou pintura, ajuste só de mão de obra e trabalhos ao dia.
No entanto nos trabalhos de ajuste de construção total ou parcialmente, adquire a totalidade dos materiais em nome do dono da obra, pelo que os materiais nunca são contabilizados nos seus elementos contabilísticos.
Na facturação processada durante os anos em análise só mencionou" serviços prestados", sem indicação do tempo, custo por trabalhador, indicação do tempo, custo por trabalhador, indicação do trabalho efectuado, uso ou aluguer de equipamentos.
Nem para todas as obras efectuadas é solicitada a respectiva licença camarária, no entanto nos anos de 1996 a 2000 foram emitidas as licenças a seguir mencionadas onde foi indicado como sendo o responsável pela construção, tendo sido contactados alguns dos donos dessas obras que nos fizeram as declarações indicadas em observações no mapa que segue:

Segundo os elementos escriturados e os declarados pelos suj. pas. a quem foram prestadas as obras é possível estabelecer a seguinte relação:
Nome a quem foi prestado o serviçoN° Proc CâmaraValor do serviço efectivamente pagoValor facturado
João… 283/96 500 000$ 167 310$
José…84/971 000 000$ 117 000$
José F… 126/97 1 600 000$ 1 117 350$
António… 120/97 2 500 000$ 1 139 660$
Maria… 107/991 800 000$950 260$
Total7 400 000$ 3 491 580$

Pelo que se deduz que somente 47,1% dos serviços prestados efectivamente realizados na área da construção civil é que foram facturados ao longo dos anos.
Exercício do ano de 1996
Segundo os seus elementos de escrita registou os seguintes movimentos:

Ex. iniciais Compras Ex. finais CEVC Sr. Prt. DeclaradosCustos declarados Resultado apurado
-$ -$ -$ -$ 5 259 904$ 4 815 456$ 444 448$

Depois de separados os proveitos e custos de ambas as actividades teremos:
Sector de avicultura:
Serv. Prest. Custos imputados ao aviário com excepção das amortizações, com a colaboração do responsável pelo sistema de escrita filha do Suj. Pas.
443859$ 2 079 213$2 523 072$

Sector de construção civil:
Serv. Prest. Facturados Custos do sector const. CivilLucro do sector const. Civil
2 736 832$4 371 597$ (-1 634 765$)

Exercício do ano de 1997
Segundo os seus elementos de escrita registou os seguintes movimentos:
Ex. iniciais Compras Ex. finais CEVC Ser. Prt. declarados Custos declaradosResul. Apurado
-$ -$ -$ -$ 6 007 579$ 5 552 987$ 454 592$

Depois de separados os proveitos e custos de ambas as actividades teremos:
Sector de avicultura:
Proveitos facturadosCustos imputados ao aviário com excepção das amortizações, com a colaboração do responsável pelo sistema de escrita, filha do suj o pas.Lucro sector avicultura
1 933 836$ 345 912$ 1 587 924$

Sector de construção civil
Proveitos facturados Custos sector const. Civil Lucro sector const. Civil
4 073 743$ 5 207 075$ (- 1 133 333$)

4.3 - Exercício de 1998
Segundo os elementos de escrita do sujo pas. registou os seguintes movimentos

Ex.iniciais Compras Ex. finais CEVC Servo Prest. DeclarCustos registadosResultado apurado
-$ -$ -$ -$ 7 131 519$ 6 495 643$ 635 876$

Depois de separados os proveitos e custos de ambas as actividades teremos:
Sector de avicultura:
Servo Prest. FaturadosCustos imputados ao aviário com excepção amortizações, com a colaboração do responsável pelo sistema de escrita, filha do sujo pas.Lucro sector avícola
2 722 883$ 167 543$ 2 555 340$

Sector da construção civil
Servo Prest. Facturados Custos sector const. Civil Lucro sector const. Civil
4 409 068$ 6 328 100$ (-1 919 032$)

Exercício de 1999
Segundo os seus elementos de escrita registou os seguintes movimentos:
Ex.iniciais Compras Ex. finaisServ. Prest.Decl.Custos totais.Resultado declarado
-$ -$ -$ 8 239 999$7 503 362$ 736 637$

Sector de avicultura:
Servo Prest. FacturadosCustos imputados ao aviário, com excepção das amortizações, com a colaboração do responsável pelo sistema de escrita, filha do suj. pas.Lucro sector do aviário
1 972 499$ 67 197$ 1 905 302$

Sector de construção civil
Ser. Prest. Facturados Custos sector const. Civil Lucro sector const. Civil
6 267 500$ 7436 165$ (- 1 168 665$)

Exercício de 2000
Segundo os seus elementos de escrita registou os seguintes movimentos:
Ex. in. Compras Ex. fi. S. Prest. Facturados Custos totais
9 309 323$ 6 140 604$ (amortizações não incluídas)

Sector de avicultura
Servo Prest. Facturados 2 145 362$

Sector da construção civil
Servo Prest. Facturados 7 163 961$

v - Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.
5.1 - Critérios:
Conforme o referido no ponto anterior o sujo pas, apenas facturou como serviços prestados 47,18% dos efectivamente realizados no sector da construção civil. Assim, que para cálculo da importância em falta vamos aplicar a percentagem de 111,93% (7 400 000$ valor dos serviços efectivamente realizados, 3 491 580$ valor serviços prestados factura dos, 3 908 420$ de serviços prestados omitidos (3 908 420$: 3 491 580$ = 111,93%)) ao valor facturado como serviços prestados.
Estando, assim, reunidas as condições para apuramento da matéria colectável através dos métodos indirectos consignados no art° 87° e 88° da Lei Geral Tributária. 5.1.1 - Ano de 1996
5.1.1.1 - IRS
Conforme o referido nos pontos anteriores o sujo pas, omitiu os seguintes valores aos serviços prestados no sector da construção civil.
Servo Prest. Registados % omitida Servo Prest. Omitidos
2 736 832$ 111,93% 3 063 336$
5.1.1.2 - IVA
As omissões referidas no ponto anterior originam Iva nos seguintes valores:520 767$
Servo Prest. Omitidos Taxa IVA Imposto em falta
3 063 336$ 17% 520 767$

5.2 - Ano de 1997

5.2.1- IRS
Conforme referido nos pontos anteriores o sujo pas. omitiu os seguintes valores aos serviços prestados no sector da construção civil
Servo Prest. Registados % omitida Servo Prest. Omitidos
4 073 743$ 111,93% 4 559 740$

5.2.2 - IVA
As omissões referidas no ponto anterior originam IVA não entregue nos Cofres do Estado no montante de: 775 156$
Servo Prest. Omitidos Taxa IVA Imposto em falta
4 559 740$ 17% 775 156$

5.3. - Ano de 1998
5.3.1 - IRS
Conforme o referido nos pontos anteriores presume-se de serviços prestados os seguintes valores:
Servo Prest. Registados % omitida Servo Prest. Omitidos
4 409 068 111,93% 4 935 069$
5.3.2 -IVA
As omissões referidas no ponto anterior originam IVA que não deu entrada nos Cofres do Estado no montante seguinte: 838 962$
Servo Prest. Omitidos Taxa IVA Imposto em falta
4 935 069$ 17% 838 962$
5.4.- Exercício de 1999
5.4.1 - IRS
Conforme o referido nos pontos anteriores estima-se que os serviços prestados omitidos sejam nos seguintes valores:
Servo Prest. Declarados % omitida Compra omitidas/custos
6 267 500$ 111,93% 7 015 212$

5.4.2 - IVA
As omissões referidas no ponto anterior originam IV A que não deu entrada n os Cofres do Estado no montante de: 1 192 586$
Serv. Prest. Omitidos Taxa IVA Imposto em falta
7 015 212$ 17% 1 192 586$
5.5 - Exercício de 2000
5.5.1 - IRS
Conforme o referido nos pontos anteriores estima-se que os serviços prestados omitidos sejam nos seguintes valores:
Servo Prest. Declarados % omitida Ser. Prest. Omitidos
7 163 961$ 111,93% 8 018 621$
5.5.1.1
Relativamente a este exercício e dado que ainda decorre o prazo para a entrega da decl. Periódica anual de IRS, desconhecendo-se se o Suj. Pas. a vai entregar com os dados constantes dos registos que possui mencionados no ponto IV e das declarações já enviadas ao SIVA, seria de toda a conveniência, aguardar o decurso do prazo para entrega das respectivas declarações e posteriormente agir de conformidade.
5.5.2 - IVA
As omissões referidas no ponto anterior originam IVA que não deu entrada nos Cofres do Estado no montante de: 1 363 165$
Serv. Prest. Omitidos Taxa IVA Imposto em falta
8 018 621$ 17% 1 363 165$
…”, cfr. fls. 41 a 47 do PA;
D) O Impugnante foi notificado, nos termos dos art.º 60º da LGT e art.º 60º do RCPIT, para exercer o direito de audição sobre o projeto de correções mas nada disse ou requereu pelo que o projeto se converteu em relatório definitivo, o qual lhe foi comunicado em 30-08-2001, vide fls. 35 a 38 do PA e 75 a 77 extraídas do processo 1131/04 3B cuja cópia certificada se ordenou no despacho imediatamente antecedente a esta sentença;
E) Não concordando com os valores ali fixados o Impugnante apresentou, em 01-10- 2001, reclamação nos termos do art.º 91º do LGT onde esgrimiu argumentos e apresentou provas similares aos esgrimidos e apresentadas nesta sede de impugnação judicial, cfr. 83 a 89 idem parte final da antecedente alínea;
F) O perito indicado pelo Impugnante foi notificado para a reunião, nela participou e apresentou, tal como o da AT, o respetivo laudo e, porque não chegaram a acordo foi proferida decisão, em 2001-11-08 “…por falta de elementos que, nesta fase, os ponham em causa, manter os valores fixados, aqui, em discussão.”, comunicada ao Impugnante em 13-11-2001, vide docs. de fls. 48 a 55 do PA e 69 e 72 extraídas do processo 1131/04 3B cuja cópia certificada se ordenou no despacho imediatamente antecedente a esta sentença;
G) Considerando os fundamentos referidos no relatório, vide al. C) foi emitida, em 13-11-2001, a liquidação adicional de IVA do ano de 1997, liquidação n.º 01212024, no montante de € 3 866,46, com data limite de cobrança de 31 -01-.2002, cfr. doc. de fls. 33 do PA;
H) O Impugnante não se conformando com a liquidação deduziu Reclamação Graciosa, que remeteu via postal, em 15-04-2002, procedendo ao nível da argumentação e prova como se descreveu quanto ao pedido de revisão referido em E), vide fls. 10 a 31 do PA;
I) A Entidade Reclamada louvou-se no descrito no relatório de inspeção, disse que o Reclamante não apresentou elementos novos e emitiu projeto de indeferimento sobre o qual o Reclamante não se pronunciou apesar de ser notificado para exercer o direito de audição, cfr. fls. 57 a 59;
J) Dada a postura do Reclamante vinda de referir o projeto de indeferimento converteu-se em decisão de indeferimento, proferido em 31-05-2002 e comunicado ao Reclamante através de carta expedida na data já referida, vide docs. de fls. 60 e 62 do PA;
K) O Impugnante mais um vez inconformado com o decidido em 2002-07-04 deduziu recurso hierárquico onde alegou, no essencial, “o indeferimento (entenda-se da RG) surge sem que a posição do reclamante tenha sido alguma vez real e validamente contraditada”, cfr. últimas 19 fls. do PA;
L) A Entidade Recorrida depois de fazer uma resenha de todo o iter da decisão, desde a inspeção até ao presente recurso concluiu que “o facto tributário existe, é mensurável, quantificável e não cometeu de nenhuma das enfermidades/ilegalidades que o recorrente alega, que possa conduzir à sua nulidade” e, por despacho proferido em 2004-04-19, negou provimento ao recurso, idem anterior;
M) Despacho comunicado ao Recorrente em 2004-05-03 tendo o mesmo deduzido a presente impugnação em 16-09-2004, cfr. fls. 1 e segs. destes autos e o demais que dos autos conexos consta dos quais consta documentada a comunicação na referida data;
N) Relativamente ao cliente do Impugnante, o João…, em vez do valor faturado ser 167 310$00 foi de, pelo menos, 166 310$00+ 558 090$00, vide docs. De fls. 11 e 12 e relação de faturas, a 158 e 185, aludidas em 41 e 42 do PA, sendo que a última, quiçá por lapso de escrita, consta como sendo de João…, Atente-se no fato de os valores declarados e documentados, num total de Esc. 725 400$00 é superior aos 500 000$00 que declarou em sede de inspeção, cfr. fls. 41 do PA;
O) O cliente José… transformou os mais de mil contos referidos à inspeção em 117 000$00 que foi o único valor a ele faturado, cfr. declaração constante de fls. 13 destes autos e fls. 41 e 43 nesta relevando a fatura nº 169;
P) O cliente António… em sede de inspeção apenas referiu o pagamento de cerca de 2 500 contos ao Impugnante mas, a pedido do Impugnante, declarou que aquele montante respeitou 1 631 060$00 a serviços efetuados na sua moradia e 889 200$00 no estabelecimento comercial da firma Jorge… Lda., vide fls. 14 a 19 destes autos, 41 e 43 do PA;
Q) Também a cliente Maria… Abreu teve comportamento diverso perante a inspeção e a pedido do Impugnante: àquela referiu o total do valor pago como sendo Esc. 1 800 000$00 e a este esclareceu que ao Impugnante pagou 920 260$00 correspondendo ao valor faturado e o demais “foi relativo a materiais fornecidos por conta da Câmara Municipal de Santa Comba Dão.”, cfr. fls. 20 destes autos e 42 a 44 do PA; dificilmente se compreende a divergência apontada pois se os materiais foram fornecidos por conta da C. M. de S. C. Dão não se traduziu em valor pago.
III II Factos não provados
Inexistem.
*
A convicção do Tribunal formou-se com base nos elementos documentais indicados em cada alínea dos factos provados e na análise crítica e concatenada dos mesmos.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Com efeito, no âmbito das suas alegações, o Recorrente aponta que, em sede de impugnação judicial, invocou que lhe assistia o direito de ser ouvido antes da tomada de decisão de recurso aos métodos indirectos, sobre a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável e antes do acto de liquidação, sendo que o Tribunal a quo nunca se pronunciou sobre tais questões, já que o recorrente não pôs em causa o direito de audição sobre o projecto de relatório ou sobre o projecto de decisão da reclamação graciosa, pôs, sim, cm causa, o direito de audição previamente à tomada de decisão de recurso aos métodos indirectos e à liquidação e o mesmo se diga em relação à “ilegalidade da avaliação indirecta”, que foi invocada, o que significa que houve, assim, omissão de pronúncia.
Segundo o disposto no artigo 125º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, sendo que esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660º nº 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.

Por outro lado, cabe notar que deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se é diferente de deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte, na medida em que quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista, sendo essencial é que o tribunal decida a questão posta, não tendo que analisar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão, ou seja, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições, apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas, o que significa que só haverá nulidade da sentença por omissão de pronúncia, quando o julgador não tiver conhecido de questões que aquelas submeteram à sua apreciação.

Diga-se ainda que nos processos anulatórios, como a impugnação judicial, cada um dos vícios imputados ao acto impugnado constitui uma causa de pedir, como decorre do estatuído no artigo 581º nº 4, in fine do C. Proc. Civil, ex vi do artigo 2.º al. e) do CPPT e tem de haver identidade entre o pedido e o julgado e entre a causa de pedir e causa de julgar, o que quer dizer que se for pedida a anulação de determinado acto de liquidação com base em determinado vício não pode o tribunal anulá-lo com fundamento em vício diferente não invocado pelo impugnante (Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª edição, 2011, II volume, pág. 319).
Nesta matéria, a Recorrente alude a várias questões alegadas em sede de petição inicial, a saber, falta de fundamentação do recurso à avaliação indirecta, nomeadamente, por não se indicar em qual dos factos tipificados no art.º88.º da LGT se incluem as pretensas irregularidades que determinaram o recurso a métodos indirectos (artigos 65º e ss.), inexistência de facto tributário, na medida em que os factos enunciados no RIT não determinam a existência de omissões à contabilidade (artigos 87º e ss.) e errónea quantificação da matéria tributável, nomeadamente, por não se terem presumido custos mínimos inerentes à actividade presumida (artigos 101º e ss.).
A partir daqui, é manifesto que o Recorrente não tem razão no que diz respeito à invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia, pois que a sentença recorrida tomou posição sobre a matéria a que alude o Recorrente, ponderando que:
“…
Para responder à argumentação do Impugnante sobre a falta de fundamento para o recurso aos métodos indiretos entendemos que a factualidade assente é suficiente, mormente o referido no relatório de Inspeção, o qual, por essa razão, foi transcrito, praticamente na íntegra, na al. C) dos factos provados. Aí, ao contrário do alegado pelo Impugnante, faz-se o enquadramento legal, explicaram-se as razões para afastar a presunção de verdade dos elementos contabilísticos. É certo que na parte do enquadramento legal a fundamentação é parcimoniosa mas suficiente para ser percebida como o foi pelo Impugnante. Não se especificou qual das alíneas do art.º 88º da LGT mas é fácil de intuir face à descrição realizada: Num cálculo que, dizemos nós foi benéfico para o Impugnante apenas se consideraram os clientes decorrentes de licenças camarárias dizendo a Inspeção que “Nem para todas as obras efectuadas é solicitada a respectiva licença camarária.”; há o “ajuste de só parte da obra como seja a montagem ou só o reboco ou pintura, ajuste só de mão de obra e trabalhos ao dia”, atingiu-se uma faturação inferior aos serviços efetivamente prestados. E atente-se que, para atingir a percentagem apurada pela Inspeção apenas se consideraram os valores indicados pelos clientes, divergentes do faturado e muito divergentes dos comunicados à Câmara. Quanto a estes a Inspeção a eles não aludiu mas é fato notório que os mesmos são significativamente inferiores ao valor real.
Sobre a percentagem de 47,18% de serviços faturados diz o Oponente que contrariou esse elemento com a apresentação dos dez documentos com que instruiu a Impugnação, documentos que também apresentou em sede de pedido de Revisão e Reclamação Graciosa.
Os referidos documentos tiveram tradução nas alíneas N) a Q) dos fatos provados. Os aludidos fatos, como nas notas de fundamentação e do próprio relato consta, para além de apresentarem algumas incongruências revelam uma contradição que não é explicada entre o que os referidos clientes do Impugnante disseram à inspeção e o que vieram a declarar ou o que resulta das faturas.
A inspeção não o diz, mas sendo fato que facilmente se retira dos fatos relatados veja-se a tão grande discrepância dos valores declarados à Câmara e o que os proprietários das obras declararam ter pago ao Impugnante. Dos oito proprietários ouvidos apenas dois declararam valores superiores aos referidos na documentação remetida à Câmara para efeito de licenciamento.
As divergências resultantes dos documentos não são objeto de qualquer explicação: Salvo uma ou duas que podem facilmente perceber-se as demais não se compreendem. O Impugnante não indicou qualquer razão e, por isso se justifica que não tenha arrolado, como testemunhas, os referidos declarantes.
Considerando as divergências apontadas entre o descrito no relatório de inspeção e o que resulta dos documentos apresentados pelo Impugnante entendemos que estes não são suficientes para abalar o núcleo de fundamentação constante daquele. E isto porque, como supra se disse, inquestionavelmente existe uma divergência entre o que foi faturado e o que os proprietários declararam que pagaram ao Impugnante. E veja-se também a divergência entre estes valores e os apresentados no pedido de licença à Câmara. E os demais proprietários a quem o Impugnante realizou serviços de construção como por exemplo o “ajuste de só parte da obra como seja a montagem ou só o rebocou ou pintura, ajuste só de mão de obra e trabalhos ao dia”? Por isso é que se referiu que o cálculo foi benéfico para o Impugnante.
O recurso aos métodos indiretos radicou num conjunto de situações ao longo dos quatro anos inspecionados; não se limitando à divergência para menos entre o faturado e o declarado como pago (este elemento foi usado, em sede de amostragem para apurar as omissões) veja-se também o fato de ao longo dos anos os materiais usados nas construções “nunca foram contabilizados nos seus elementos contabilísticos” e, mesmo assim no setor da construção civil os custos foram sempre superiores aos serviços faturados, ao contrário do que aconteceu no setor avícola. Pense-se no fato notório da expansão que o setor da construção viveu no período objeto da inspeção, bem diverso do de crise que se começou a instalar na segunda metade da primeira década deste século.
Curiosamente o ataque que o Impugnante desferiu à quantificação foi o de não terem sido presumidos custos. Como compreender esta alegação com o paradoxo descrito no antecedente parágrafo: Não foram contabilizados os custos dos materiais empregues nas construções e, mesmo assim, os custos verificados nos anos inspecionados foram superiores, em cerca de 30%, aos serviços prestados faturados.
Do que se vem dizendo parece o Impugnante confundir ausência de fundamentação legal e fáctica do recurso aos métodos indiretos, consequente quantificação da matéria tributável e respetivos critérios com fundamentação diversa daquela que ele propugna.
Nos termos do artigo 125.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, "A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto".
No caso dos autos a liquidação está indissociavelmente ligada à Inspeção que a antecedeu. A factualidade relatada em C) da factualidade provada resulta do Relatório de Inspeção. Daquela consta a “sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão” a que se refere o transcrito art.º 125º, nº 1 do CPA.
É possível extrair o percurso cognitivo seguido pelo agente que fixou a liquidação, percurso claro e suficiente, legal e factualmente; é possível saber a razão por que se decidiu em determinado sentido e, consequentemente, permite, como permitiu ao Impugnante, exercer o seu direito impugnação do ato tributário.
A uma concretização constante do relatório respondeu o Impugnante com dez documentos, alguns deles, para não dizer a maior parte deles, resultantes também daquele e os que do relatório divergiram não foi dada qualquer explicação (para além as situações compreensíveis, por exemplo a faturação à pessoa singular e faturação a uma sociedade de que aquele é gerente) para a divergência. Por isso e pelo demais que supra se disse, se entendeu, tal como ocorreu em sede de revisão, de RG e RH, que os referidos documentos não perturbaram o núcleo fundamentador do relatório.
E quanto ao demais referido no relatório o Impugnante nada disse ou referiu limitando-se a meras alegações genéricas, insuscetíveis de beliscarem aquele.
Em conclusão o Impugnante não logrou abalar os alicerces de facto e de direito da liquidação impugnada pelo que improcedendo os argumentos apresentados, deve manter-se a liquidação» (sublinhados da nossa responsabilidade).
Nesta sequência, resulta claro que a sentença tomou conhecimento das questões suscitadas e ainda quando omita o tratamento de razões ou argumentos esgrimidos pelas partes e se socorra de uma motivação pobre, tal não inquina de nulidade a sentença, podendo estar-se perante um eventual erro de julgamento, o que significa que improcede a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
A partir daqui, cumpre ter presente que o Recorrente continua a discutir a falta de fundamentação do recurso à avaliação indirecta, nomeadamente, por não se indicar em qual dos factos tipificados no art. 88º da LGT se incluem as pretensas irregularidades que determinaram o recurso a métodos indirectos.
Ora, neste âmbito, a análise da situação não difere do exposto no recente Acórdão deste Tribunal de 14-09-2017, Proc. nº 1127-04.5BEVIS Em que o Relator deste processo teve intervenção como 2º Adjunto, www.dgsi.pt, onde se refere que:
“…
Como estabelece o n.º1 do art.º77.º da LGT, «A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».
Dispõe o n.º 2 daquele preceito que «A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
O n.º 4 do mesmo art.º 77.º da LGT impõe um especial dever de fundamentação no recurso a métodos indirectos, estabelecendo que «A decisão da tributação pelos métodos indirectos nos casos e com os fundamentos previstos na presente lei especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade de base científica ou fará a descrição dos bens cuja propriedade ou fruição a lei considerar manifestações de fortuna relevantes, ou indicará a sequência de prejuízos fiscais relevantes, e indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável».
Assim, o acto estará fundamentado quando contenha os requisitos gerais e especiais de fundamentação previstos na lei, que impõe se dêem a conhecer ao contribuinte não só as razões factuais que motivaram a decisão como também as disposições legais aplicáveis, dito de outro modo, se dê a conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido na prática do acto.
Pois bem, as razões factuais na base da decisão estão vertidas no RIT (cf. fls.113 dos autos), como se alcança do ponto B) da matéria assente, aí se referindo, no essencial, que «o sujeito passivo exerce a actividade de construção civil e ainda possui um aviário, mas nos seus elementos contabilísticos não separou os custos, nem os proveitos de ambas as actividades»; «nos trabalhos de ajuste de construção total ou parcialmente, adquire a totalidade dos materiais em nome do dono da obra, pelo que os materiais nunca são contabilizados nos seus elementos contabilísticos»; «na facturação processada durante os anos em análise só mencionou “serviços prestados”, sem indicação do tempo, custo por trabalhador, indicação do trabalho efectuado, uso ou aluguer de equipamento»; em obras com licença camarária referenciadas ao período de 1996 a 2000, facturou valores inferiores aos apurados pela inspecção com base em declarações dos donos dessas obras.
Por outro lado, no ponto V do RIT (a fls.115v. dos autos), indicam-se os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável, aí se referindo, tendo por base a relação constante de fls.114v. do RIT, que «Conforme o referido no ponto anterior, o sujeito passivo apenas facturou como serviços prestados 47,18% dos efectivamente realizados no sector da construção civil. Assim, que para cálculo da importância em falta vamos aplicar a percentagem de 111,93% (7.400.000$, valor dos serviços efectivamente realizados, 3.491.580$, valor dos serviços prestados facturados, 3.908.420$ de serviços prestados omitidos (3.908.420$ : 3.491.580$ = 111,93%)) ao valor facturado como serviços prestados».
Porém, no que respeita à fundamentação de direito das correcções, refere o RIT unicamente que estão «…reunidas as condições para o apuramento da matéria colectável através dos métodos indirectos consignados nos artigos 87.º e 88.º da Lei Geral Tributária».
Não é especificada a concreta alínea do art.º87.º da LGT em que se enquadra a situação factual descrita, nem sobretudo é especificada a alínea do art.º88.º da mesma LGT em que se subsume, na óptica da Administração tributária, a irregularidade que inviabiliza a determinação directa e exacta da matéria tributável, sendo certo que as diferentes alíneas daqueles preceitos enumeram casos e condições muito distintos em que é possível proceder à avaliação indirecta ou em que a impossibilidade de comprovação e quantificação directa da matéria tributável ocorre.
Ora, como se referiu já, a lei impõe um especial dever de fundamentação na utilização de métodos indirectos, dever esse que é instrumental ao carácter subsidiário da avaliação indirecta (art.º85.º, n.º1, da LGT) e à manifesta preferência do legislador pela utilização de métodos de avaliação directa na fixação da matéria tributável, atentas as maiores garantias de rigor que estes métodos fornecem (artigos 81.º, n.º1 e 83.º, n.º1, da LGT).
Tal como referimos já, quando a lei imponha especiais requisitos de fundamentação – como se exige na tributação por métodos indirectos – o cumprimento do dever de fundamentar por parte da Administração tributária afere-se não apenas face ao disposto nos nºs 1 e 2 do art.º77.º da LGT e atendendo aos fins visados pelo dever de fundamentação que é, no fundo, o esclarecimento do contribuinte quanto às razões, de facto e de direito, que levaram à prática do acto, como ainda pelo preenchimento dos requisitos adicionais de fundamentação exigidos.
O n.º4 do art.º77.º da LGT exige como requisito especial da fundamentação que a decisão de utilização de métodos indirectos nos casos e com os fundamentos previstos na lei (art.º87.º da LGT), “especifique os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável”, impossibilidade que só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicada nas várias alíneas do art.º88.º da LGT, como decorre do seu art.º81.º, n.º1, ao estabelecer que a Administração tributária só pode proceder a avaliação indirecta nos casos e condições que a lei definir – vd. Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, “Lei Geral Tributária – Anotada e Comentada”, Encontro de Escrita, 4.ª ed. 2002.
Ao remeter apenas para o art.º88.º da LGT, sem especificação de qualquer das suas alíneas, a decisão de recurso a métodos indirectos não cumpre a especial exigência de fundamentação jurídica imposta pelo n.º4 do art.º77.º da mesma LGT.
O argumento da sentença recorrida, de que tal se intui e apreende da motivação factual vertida no RIT, não colhe nas situações em que a lei impõe requisitos especiais de fundamentação porque se os mesmos visam, por um lado, permitir o controlo jurisdicional da decisão, por outro, também têm por escopo prevenir decisões menos ponderadas da Administração tributária na utilização de métodos indirectos de avaliação em casos e condições não expressamente previstos na lei, podendo legitimamente equacionar-se se, no caso dos autos, a própria AT não teve afinal dúvidas no enquadramento jurídico da situação factual descrita no RIT num dos casos tipificados de impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável e, nesse cenário de dúvida, optou por avançar na aplicação de métodos indirectos furtando-se à indicação expressa da alínea do art.º88.º da LGT em que as irregularidades ou anomalias constatadas poderiam encontrar, ou não, eventual enquadramento.
Quer dizer, a AT conseguiria subtrair-se, no controlo jurisdicional da decisão, a uma eventual censura em sede de erro nos pressupostos de direito, fornecendo uma insuficiente fundamentação formal do acto, o que justamente o legislador terá pretendido acautelar e prevenir.
De qualquer modo, ainda que a motivação jurídica da decisão, isto é, o itinerário valorativo seguido pelo autor do acto, fosse cognoscível para o destinatário partindo da motivação factual da decisão, a verdade é que ele tem o direito de saber qual foi a concreta situação de “impossibilidade de comprovação e quantificação directa da matéria tributável” enumerada nas alíneas do art.º88.º da LGT que foi levada em consideração pelo autor do acto ao praticá-lo, e essa informação tem de integrar a fundamentação do acto.
Nesta linha de entendimento, entendemos que a decisão de recurso a métodos indirectos não contém a fundamentação legalmente exigida, tal como sustenta o Recorrente, tendo a sentença incorrido em erro de julgamento ao decidir diferentemente.
A falta de fundamentação da decisão de utilização de métodos indirectos de avaliação da matéria tributável inquina de vício de forma as impugnadas liquidações nela assentes, determinando a sua invalidade. …”.
Perante a bondade do que fica exposto, sendo que a matéria em apreciação nestes autos é essencialmente idêntica, e não se vislumbrando na alegação das partes matéria capaz de determinar uma outra leitura da realidade em apreço, cabe dar guarida à posição do Recorrente, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões do recurso.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar procedente a impugnação judicial e anular a liquidação impugnada.
Custas pela Recorrida apenas em 1ª Instância
Notifique-se. D.N..
Porto, 28 de Setembro de 2017
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova