Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02700/14.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/22/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA POR IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
CUSTAS
DÉFICE INSTRUTÓRIO.
Sumário:I) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 662º do C. Proc. Civil, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
II) Nos termos do artigo 527º do C. Proc. Civil, aplicável por força do disposto na alínea e) do artigo 2º do CPPT e de acordo com o estabelecido no artigo 5º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, suporta as custas a parte que deu causa ao processo, isto é, a parte cuja pretensão não foi atendida, referindo o artigo 536º nº 3 do C. Proc. Civil que perante a extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, dispondo o nº 4 que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente.
III) Na situação dos autos, e com os elementos disponíveis, cremos que a conduta da AT não merece, por ora, uma postura tão severa em termos de análise no que diz respeito à condenação em custas, dado que, se é certo que o processo de execução fiscal foi extinto por anulação, crê-se que se mostra relevante apurar os termos em que tal situação foi enquadrada por forma a eventualmente produzir uma leitura diferente da realidade em apreço, potenciando outros elementos que já constam dos autos.
IV) Nestas condições, cabe concluir encontrar-se o julgamento da matéria de facto, inscrito na sentença, inquinado por défice instrutório, porquanto existe a possibilidade séria de a produção da prova em falta implicar o estabelecimento de outro, sobretudo, mais alargado cenário factual, capaz de, pela sua amplitude, esclarecer melhor todos os acontecimentos, com repercussão no sentido da decisão do mérito da causa e no âmbito dos poderes consignados nos art. 13º do CPPT e 99º da LGT competia ao Juiz realizar as diligências para apuramento da situação concreta e só após isso conhecer da oposição. Não o tendo feito, verifica-se insuficiência de instrução determinante de anulação da decisão tal como se prevê no art. 662º do C. Proc. Civil.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:V...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 14-09-2017, que julgou extinta por impossibilidade superveniente da lide, com custas a cargo da Fazenda Pública, a presente instância de OPOSIÇÃO intentada por V... relacionada com o processo de execução fiscal n.º 3514201401019686 a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 2 por dívidas de IRS do ano de 2011, no montante de € 20.624,71.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 172-181), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
A. Vem o presente recurso interposto da decisão que, no processo de oposição à execução deduzido por V…, NIF 2…, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3514201401019686, julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide e condenou a Fazenda Pública nas respetivas custas, na parte que versa sobre a condenação em custas, com a qual não se conforma atendendo ao circunstancialismo que justificou a extinção do processo executivo por anulação da quantia exequenda.
B. Decidiu o Tribunal a quo que a anulação da quantia exequenda e consequente anulação do processo de execução fiscal importou que o interessado não possa manter a pretensão formulada nestes autos, porquanto os mesmos ficaram sem objeto, determinando a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do que dispõe o artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tendo, em consequência imputado as custas à Fazenda Pública nos termos do disposto nos artigos 536.º n.º 3 do CPC, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT.
C. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto entende que a decisão proferida enferma de erro de julgamento de facto e de direito.
D. A regra geral em matéria de custas assenta no princípio da causalidade, ou seja, paga as custas a parte que lhes deu causa, a parte cuja pretensão não foi atendida, a parte que não tem razão no pedido que deduziu.
E. Subsidiariamente, deve atender-se ao princípio do proveito, segundo o qual, não havendo vencimento, paga as custas quem do processo tirar proveito.
F. Nos casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, é no artigo 536.º do CPC que encontramos as regras a observar.
G. De acordo com o n.º 1 da sobredita norma, nos casos em que a pretensão ou oposição deduzidas eram fundadas no momento em que foram deduzidas e o deixaram de ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis (ou seja, quando a inutilidade ou a impossibilidade resulte de circunstâncias não imputáveis ao autor ou ao réu), as custas serão repartidas por ambos em partes iguais.
H. Sendo que se considera que existe uma alteração das circunstâncias não imputável às partes quando ocorre uma das situações enumeradas no n.º 2 do art.º 536º do CPC.
I. O n.º 3 do artigo 536.º do CPC, aplicável ao processo tributário ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, refere que nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas”, estabelecendo assim a regra de que as custas ficam a cargo do autor, independentemente de o facto que provoca a inutilidade ou impossibilidade lhe ser ou não imputável, a menos que seja imputável ao réu.
J. Face à evidenciada impossibilidade superveniente da lide, não estando em causa nos presentes autos nenhum dos casos a que se refere o art.º 536º n.º 1 e 2, era de aplicar a regra prevista no art.º 536º n.º 3 do CPC, que refere que o autor é sempre responsável pelas custas quando não o for o réu, sendo que este só o é quando o facto de que resulta a impossibilidade ou a inutilidade lhe for imputável.
K. Ora, se a regra geral vertida neste artigo é a de que o pagamento das custas fica a cargo do autor, salvo de a impossibilidade ou a inutilidade resultar de facto imputável ao réu, que neste caso as pagará, impunha-se que o Tribunal a quo ao condenar a Fazenda Pública na totalidade das custas, nos termos do art.º 536º n.º 3 do CPC, indicasse qual o facto, imputável à AT, que deu origem à supramencionada impossibilidade superveniente da lide, o que não aconteceu.
L. A impossibilidade superveniente da lide, conforme decorre da decisão recorrida, foi determinada pela anulação da quantia exequenda e consequente anulação do processo de execução fiscal e foi a AT quem procedeu a essa anulação, mas tal não basta para que se considere verificado o juízo de imputabilidade que suporta a condenação em custas nos termos do n.ºs 3 do artigo 536.º do CPC.
M. O que importa indagar para formular aquele juízo é a quem é imputável o facto que determinou essa anulação, ou seja, mais do que indagar da causa imediata da impossibilidade superveniente da lide – anulação da quantia exequenda e consequente extinção do processo de execução fiscal – há que averiguar da causa mediata dessa anulação: qual o facto que lhe deu causa e a quem é imputável esse facto.
N. Ora, dos elementos constante dos autos, resulta evidente que a AT não procedeu à sobredita anulação da quantia exequenda no seguimento do argumentário expandido na petição inicial que subjaz os presentes autos, mas sim, na sequência do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos de ação ordinária n.º 862/13.1TBPTL da Instância Central, Secção Cível, J1 da comarca de Viana do Castelo, que declarou a nulidade da compra e venda do imóvel, cuja alienação esteve na origem da tributação da aqui oponente em sede de IRS.
O. De forma a subsumir a situação real explanada nos autos à boa decisão em matéria de custas, e não obstante a decisão recorrida não ter autonomizado a matéria de facto relevante para decidir desta questão, entende a Fazenda Pública que, face à prova documental produzida e dos factos alegados pelas partes que não foram contrariados, devem ser dados como assentes os factos referidos nos pontos 24 a 29 da alegações, que se dão como reproduzidos, de acordo com a verdade factual e ao abrigo do disposto no artigo 662.º n.º 1 do CPC (aplicável ex vi artigo 2º e) do CPPT).
P. Da factualidade que ressalta dos presentes autos resulta que a liquidação de IRS de 2011 supramencionada, cuja falta de pagamento despoletou a instauração do presente processo de execução fiscal, teve na sua origem os ganhos resultantes da venda do prédio urbano supramencionado, pelo que a declarada nulidade do contrato de compra e venda no referido processo n.º 862/13.1TBPTL, por sentença transitada em julgado, teve como consequência a anulação da liquidação/dívida exequenda tendo, por esse motivo, sido extinto o processo de execução fiscal.
Q. Ademais, ainda que se entenda que para gerar a sua responsabilização pelas custas, a imputação ao réu do facto causal da impossibilidade superveniente não tem de configurar uma imputação subjetiva, traduzida na eventual censura ético-jurídica pela sua reação tardia à pretensão deduzida na ação, sendo suficiente que essa imputação seja objetiva, isto é, que o facto que impossibilita a lide seja do domínio do réu, é entendimento da Fazenda Pública que a extinção do processo executivo, por anulação da dívida exequenda originada pela declarada nulidade da compra e venda do referido prédio urbano no processo n.º 862/13.1TBPTL, por sentença transitada em julgado em momento posterior à apresentação da presente oposição, não pode ser objetivamente imputável à Fazenda Pública.
R. Pelo que, aplicando a regra vertida no art.º 536º n.º 3 do CPC, as custas ficam a cargo do autor, independentemente de o facto que provocou a impossibilidade da lide lhe ser ou não imputável.
S. Nestes termos, com ressalva do devido respeito, entende a Fazenda Pública que a decisão recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito, por não considerar os factos que resultam da prova documental produzida e os factos alegados pelas partes que não foram contrariados, julgando a Fazenda Pública responsável pelas custas, fazendo uma errónea aplicação e interpretação do art.º 536º n.º 3 do CPC.
T. Sem prescindir, ainda que se entenda que dos elementos juntos aos autos não resulta demonstrado inequivocamente o motivo da anulação da dívida exequenda, face aos factos atrás expostos, entende a Fazenda Pública, com a ressalva do devido respeito, que sempre teria o Tribunal a quo de ter procedido à realização das diligências que se afigurassem úteis ao apuramento da verdade relativamente ao motivo que levou à anulação da dívida, ao abrigo dos princípios da oficialidade e do inquisitório (art.º 13º do CPPT e 99º da LGT), com vista ao apuramento da responsabilidade por custas.
U. Pelo que, ao não proceder a tais diligências, o Tribunal a quo incorre na violação do principio do inquisitório e da investigação plasmado nos artigos 99º n.º 1 da Lei Geral Tributária, 13º n.º 1 do CPPT e 436.º do Código de Processo Civil, traduzindo-se a final em défice instrutório, com repercussão no sentido da decisão em matéria de custas o que, nos termos da aliena c) do n.º 2 do atual artigo 662.º do CPC, implica anulação da decisão recorrida.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA.”

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento de facto e ainda indagar da bondade da decisão recorrida que julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, condenando a Recorrente no pagamento das custas.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta a seguinte decisão:
“…
I – Relatório
V..., contribuinte n.º 2…, residente na Rua…, Matosinhos, veio deduzir oposição judicial ao processo de execução fiscal n.º 3514201401019686 a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 2 por dívidas de IRS do ano de 2011, no montante de €20.624,71.
Em síntese, veio a Oponente sustentar a suspensão dos autos de execução fiscal, assim como a inexigibilidade da obrigação tributária.
Remetida a Tribunal, foi a presente oposição recebida liminarmente (a fls. 104 dos autos).
A Exequente, regularmente notificada nos termos do disposto do artigo 210.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, apresentou contestação, sustentando a inadequação do meio processual apresentado (cfr. fls. 104, 109 a 110 dos autos).
Por requerimento de 13.10.2016 veio a Oponente requerer a extinção da instância por inutilidade da lide (a fls. 148 dos autos).
Em 13.07.2017 veio a Fazenda Pública requerer a extinção da instância por inutilidade da lide, face à anulação da quantia exequenda, resultando na extinção do processo de execução fiscal por anulação em 15.03.2016 (a fls. 157 e 160 dos autos).
Dada vista ao Magistrado do MP foi emitido parecer no sentido da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (a fls. 162 dos autos).
Cumpre apreciar e decidir.
A questão que importa apreciar e decidir, nesta sede processual, consiste em determinar, desde logo, da viabilidade do prosseguimento dos presentes autos.
A Oponente veio intentar os presentes autos contra o processo de execução fiscal n.º 3514201401019686 a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 2, por dívidas de IRS do ano de 2011 no montante de €20.624,71.
Ora, como decorre de fls. 157 a 160 dos autos, o processo de execução em questão nos presentes autos foi extinto por anulação pelo Serviço de Finanças de Matosinhos 2.
Ora, parafraseando José Lebre de Freitas in Código de Processo Civil Anotado, volume 1 a pág. 512 “A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”.
In casu, a anulação da quantia exequenda e consequente anulação do processo de execução fiscal importou que o interessado não possa manter a pretensão formulada nestes autos, porquanto os mesmos ficaram sem objecto, determinando a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do que dispõe o artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
**
Nos termos do que dispõe o artigo 306.º do CPC, fixo o valor da acção em €20.624,71 (vinte mil, seiscentos e vinte e quatro euros e setenta e um cêntimos).
***
Decisão
Ante o exposto, julgo extinta a presente instância.
***
Custas pela Fazenda Pública, nos termos do disposto nos artigos 536.º n.º 3 do CPC, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT.
Registe e notifique.
Porto, 14 de Setembro de 2017.
«»
3.2. DE DIREITO
Nas suas conclusões de recurso, a Recorrente questiona a sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto, sendo que constituindo tal erro de julgamento não só o primeiro aduzido mas, em especial, aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Vejamos.
Na óptica da Recorrente, de forma a subsumir a situação real explanada nos autos à boa decisão em matéria de custas, e não obstante a decisão recorrida não ter autonomizado a matéria de facto relevante para decidir desta questão, entende a Fazenda Pública que, face à prova documental produzida e dos factos alegados pelas partes que não foram contrariados, devem ser dados como assentes os factos referidos nos pontos 24 a 29 da alegações, de acordo com a verdade factual e ao abrigo do disposto no artigo 662.º n.º 1 do CPC (aplicável ex vi artigo 2º e) do CPPT), a saber:
“…
24. O processo de execução fiscal com o nº 3514201401019686, foi instaurado contra a oponente para cobrança de dívida proveniente de IRS, relativa ao ano de 2011, conforme consta da respetiva certidão de dívida.
25. Da informação prestada pelo Serviço de Finanças de Matosinhos 2, em cumprimento do disposto no artigo 208º do CPPT, consta que: “(…) em 2012/05/30, foi entregue declaração de IRS/2011, pela executada onde declarou a transmissão do referido imóvel aos seus irmãos, pelo preço de venda de €120000,00 e de aquisição €119210.00, a fls. 84. Foi notificada para corrigir o valor de aquisição.
Em 2013.10.25 foi elaborada a declaração correção oficiosa para o ano de 2011, de fls 85 a 86, a qual deu origem à liquidação n.º 2013 50005513317, com prazo de pagamento voluntário até 2013.12.23, a fls 87, que deu origem ao processo executivo 3514201401019686.”
26. Consta da petição inicial da presente oposição que “a presente ação executiva tem como objecto a cobrança, a título de IRS, do montante de €20.975,04, devido pela transmissão realizada pela oponente a seus irmãos (…)” e que foi contra si instaurada “uma ação sumária que corre os seus termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima sob o n.º 862/13.1TBPTL”, tendo junto aos autos cópia da respetiva citação e petição inicial como documento n.º 5, referindo ainda que “se a referida acção tiver êxito, serão anulados todos os actos que deram origem à tributação da Oponente em sede de IRS (…).”
27. Através de requerimento apresentado em 2015/10/15, a oponente juntou aos presentes autos certidão judicial da sentença, transitada em julgado em 2015/09/04, proferida nos autos de ação ordinária n.º 862/13.1TBPTL da Instância Central, Secção Cível, J1, da comarca de Viana do Castelo, nos termos da qual foi decidida a nulidade da compra e venda outorgada pela aqui oponente/recorrida e os seus irmãos, aí autores, que teve por objeto o prédio urbano inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 7… da freguesia e concelho de Ponte de Lima.
28. Por requerimento de 2016/10/13, veio a oponente requerer a extinção da instância por inutilidade superveniente referindo que “ …por requerimento de 15/10/2015, a requerente informou estes autos, juntando a respetiva certidão judicial, da sentença proferida nos autos de ação ordinária n.º 862/13.1TBPTL, da Instância Central de Viana do Castelo, Secção Cível -J1, da Comarca de Viana do Castelo, em resultado da qual serão anulados todos os actos que deram lugar à tributação da oponente em sede de IRS, uma vez que a mesma não teve qualquer mais valia na transmissão operada, face à declaração de nulidade da compra e venda entre os aí autores e a ré, aqui requerente.
29. Através de ofício de 2017/07/13, que se encontra junto aos presentes autos, o Serviço de Finanças de Matosinhos 2, informou que “o processo executivo supra identificado, no qual foi deduzida a oposição n.º 3514201409000194, foi extinto por anulação em 15/03/2016. …”.
Neste domínio, e com referência à matéria descrita, temos por claro que os elementos apontados em 24., 25. e 29. estão já ponderados na decisão recorrida, sendo que em relação aos demais, temos por adquirido que se encontram provados por documento e tendo presente as soluções plausíveis em direito, nos termos do art. 662º do C. Proc. Civil, adita-se à realidade factual a ponderar nesta sede o seguinte:
- Consta da petição inicial da presente oposição que “a presente acção executiva tem como objecto a cobrança, a título de IRS, do montante de €20.975,04, devido pela transmissão realizada pela oponente a seus irmãos (…)” e que foi contra si instaurada “uma acção sumária que corre os seus termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima sob o n.º 862/13.1TBPTL”, tendo junto aos autos cópia da respectiva citação e petição inicial como documento n.º 5, referindo ainda que “se a referida acção tiver êxito, serão anulados todos os actos que deram origem à tributação da Oponente em sede de IRS (…).”
- Através de requerimento apresentado em 2015/10/15, a oponente juntou aos presentes autos certidão judicial da sentença, transitada em julgado em 2015/09/04, proferida nos autos de acção ordinária n.º 862/13.1TBPTL da Instância Central, Secção Cível, J1, da comarca de Viana do Castelo, nos termos da qual foi decidida a nulidade da compra e venda outorgada pela aqui oponente/recorrida e os seus irmãos, aí autores, que teve por objecto o prédio urbano inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 7… da freguesia e concelho de Ponte de Lima.
- Por requerimento de 2016/10/13, veio a oponente requerer a extinção da instância por inutilidade superveniente referindo que “ …por requerimento de 15/10/2015, a requerente informou estes autos, juntando a respectiva certidão judicial, da sentença proferida nos autos de acção ordinária n.º 862/13.1TBPTL, da Instância Central de Viana do Castelo, Secção Cível - J1, da Comarca de Viana do Castelo, em resultado da qual serão anulados todos os actos que deram lugar à tributação da oponente em sede de IRS, uma vez que a mesma não teve qualquer mais valia na transmissão operada, face à declaração de nulidade da compra e venda entre os aí autores e a ré, aqui requerente.

Com este pano de fundo, cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que julgou extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, condenando a Fazenda Pública em custas nos termos do art. 536º nº 3 do C. Proc. Civil.

Para o efeito, a decisão recorrida sublinhou que:
“…
Por requerimento de 13.10.2016 veio a Oponente requerer a extinção da instância por inutilidade da lide (a fls. 148 dos autos).
Em 13.07.2017 veio a Fazenda Pública requerer a extinção da instância por inutilidade da lide, face à anulação da quantia exequenda, resultando na extinção do processo de execução fiscal por anulação em 15.03.2016 (a fls. 157 e 160 dos autos).
Dada vista ao Magistrado do MP foi emitido parecer no sentido da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (a fls. 162 dos autos).
Cumpre apreciar e decidir.
A questão que importa apreciar e decidir, nesta sede processual, consiste em determinar, desde logo, da viabilidade do prosseguimento dos presentes autos.
A Oponente veio intentar os presentes autos contra o processo de execução fiscal n.º 3514201401019686 a correr termos no Serviço de Finanças de Matosinhos 2, por dívidas de IRS do ano de 2011 no montante de €20.624,71.
Ora, como decorre de fls. 157 a 160 dos autos, o processo de execução em questão nos presentes autos foi extinto por anulação pelo Serviço de Finanças de Matosinhos 2.

In casu, a anulação da quantia exequenda e consequente anulação do processo de execução fiscal importou que o interessado não possa manter a pretensão formulada nestes autos, porquanto os mesmos ficaram sem objecto, determinando a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do que dispõe o artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário. …”.

Nas suas alegações, a Recorrente defende que face à evidenciada impossibilidade superveniente da lide, não estando em causa nos presentes autos nenhum dos casos a que se refere o art.º 536º n.º 1 e 2, era de aplicar a regra prevista no art.º 536º n.º 3 do CPC, que refere que o autor é sempre responsável pelas custas quando não o for o réu, sendo que este só o é quando o facto de que resulta a impossibilidade ou a inutilidade lhe for imputável.
Ora, se a regra geral vertida neste artigo é a de que o pagamento das custas fica a cargo do autor, salvo se a impossibilidade ou a inutilidade resultar de facto imputável ao réu, que neste caso as pagará, impunha-se que o Tribunal a quo ao condenar a Fazenda Pública na totalidade das custas, nos termos do art.º 536º n.º 3 do CPC, indicasse qual o facto, imputável à AT, que deu origem à supramencionada impossibilidade superveniente da lide, o que não aconteceu, sendo que a impossibilidade superveniente da lide, conforme decorre da decisão recorrida, foi determinada pela anulação da quantia exequenda e consequente anulação do processo de execução fiscal e foi a AT quem procedeu a essa anulação, mas tal não basta para que se considere verificado o juízo de imputabilidade que suporta a condenação em custas nos termos do n.ºs 3 do artigo 536.º do CPC, pois o que importa indagar para formular aquele juízo é a quem é imputável o facto que determinou essa anulação, ou seja, mais do que indagar da causa imediata da impossibilidade superveniente da lide - anulação da quantia exequenda e consequente extinção do processo de execução fiscal - há que averiguar da causa mediata dessa anulação: qual o facto que lhe deu causa e a quem é imputável esse facto.
Ora, dos elementos constante dos autos, resulta evidente que a AT não procedeu à sobredita anulação da quantia exequenda no seguimento do argumentário expandido na petição inicial que subjaz os presentes autos, mas sim, na sequência do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos de ação ordinária n.º 862/13.1TBPTL da Instância Central, Secção Cível, J1 da comarca de Viana do Castelo, que declarou a nulidade da compra e venda do imóvel, cuja alienação esteve na origem da tributação da aqui oponente em sede de IRS.
Da factualidade que ressalta dos presentes autos resulta que a liquidação de IRS de 2011 supramencionada, cuja falta de pagamento despoletou a instauração do presente processo de execução fiscal, teve na sua origem os ganhos resultantes da venda do prédio urbano supramencionado, pelo que a declarada nulidade do contrato de compra e venda no referido processo n.º 862/13.1TBPTL, por sentença transitada em julgado, teve como consequência a anulação da liquidação/dívida exequenda tendo, por esse motivo, sido extinto o processo de execução fiscal.
Ademais, ainda que se entenda que para gerar a sua responsabilização pelas custas, a imputação ao réu do facto causal da impossibilidade superveniente não tem de configurar uma imputação subjectiva, traduzida na eventual censura ético-jurídica pela sua reacção tardia à pretensão deduzida na acção, sendo suficiente que essa imputação seja objectiva, isto é, que o facto que impossibilita a lide seja do domínio do réu, é entendimento da Fazenda Pública que a extinção do processo executivo, por anulação da dívida exequenda originada pela declarada nulidade da compra e venda do referido prédio urbano no processo n.º 862/13.1TBPTL, por sentença transitada em julgado em momento posterior à apresentação da presente oposição, não pode ser objectivamente imputável à Fazenda Pública, pelo que, aplicando a regra vertida no art.º 536º n.º 3 do CPC, as custas ficam a cargo do autor, independentemente de o facto que provocou a impossibilidade da lide lhe ser ou não imputável.
Nestes termos, com ressalva do devido respeito, entende a Fazenda Pública que a decisão recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito, por não considerar os factos que resultam da prova documental produzida e os factos alegados pelas partes que não foram contrariados, julgando a Fazenda Pública responsável pelas custas, fazendo uma errónea aplicação e interpretação do art.º 536º n.º 3 do CPC.
Sem prescindir, ainda que se entenda que dos elementos juntos aos autos não resulta demonstrado inequivocamente o motivo da anulação da dívida exequenda, face aos factos atrás expostos, entende a Fazenda Pública, com a ressalva do devido respeito, que sempre teria o Tribunal a quo de ter procedido à realização das diligências que se afigurassem úteis ao apuramento da verdade relativamente ao motivo que levou à anulação da dívida, ao abrigo dos princípios da oficialidade e do inquisitório (art.º 13º do CPPT e 99º da LGT), com vista ao apuramento da responsabilidade por custas, pelo que, ao não proceder a tais diligências, o Tribunal a quo incorre na violação do principio do inquisitório e da investigação plasmado nos artigos 99º n.º 1 da Lei Geral Tributária, 13º n.º 1 do CPPT e 436.º do Código de Processo Civil, traduzindo-se a final em défice instrutório, com repercussão no sentido da decisão em matéria de custas o que, nos termos da alínea c) do n.º 2 do actual artigo 662.º do CPC, implica anulação da decisão recorrida.

Que dizer?
Como é sabido, a impossibilidade ou a inutilidade superveniente da lide (al. e) do art. 277º do CPC verificam-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a resolução do litígio se torna impossível ou deixa de ter interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância, pois que a pretensão do autor não poderá, então, manter-se, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou por se encontrar fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar - além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio.

Diga-se ainda que, nos termos do que estatui o artigo 527º do C. Proc. Civil, aplicável por força do disposto na alínea e) do artigo 2º do CPPT e ainda do estabelecido pelo artigo 5º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, suporta as custas a parte que deu causa ao processo, isto é, a parte cuja pretensão não foi atendida.

Por outro lado, o artigo 536º nº 3 do C. Proc. Civil estabelece que perante a extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, dispondo o nº 4 que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente.

A partir daqui, e para cabal análise desta matéria, sem prejuízo da matéria que foi aditada, cremos que o ponto essencial a reter e que tem influência decisiva sobre a sorte dos autos prende-se com os termos da decisão que levou à extinção do processo de execução fiscal por anulação em 15-03-2016, até porque a decisão recorrida valorizou o facto em apreço, sem mais, nos termos apontados pela ora Recorrente, que pretende agora que a decisão vá mais longe, considerando a razão de ser de tal anulação.

Nesta sequência, apenas podemos acompanhar a Recorrente na sua leitura alternativa da situação, quando aponta para a situação em que dos elementos juntos aos autos não resulta demonstrado inequivocamente o motivo da anulação da dívida exequenda, situação que apenas pode ser ultrapassada com a junção aos autos do despacho que determinou a aludida anulação do processo executivo.
Na situação dos autos, e com os elementos disponíveis, cremos que a conduta da AT não merece, por ora, uma postura tão severa em termos de análise no que diz respeito à condenação em custas, dado que, se é certo que o processo de execução fiscal foi extinto por anulação, crê-se que se mostra relevante apurar os termos em que tal situação foi enquadrada por forma a eventualmente produzir uma leitura diferente da realidade em apreço, potenciando outros elementos que já constam dos autos.

Diga-se ainda que sempre teria de se ter presente que o art. 662º do C. Proc. Civil, ao fixar a perspectiva e orientação para o julgamento, por parte do tribunal de recurso, da decisão proferida em 1.ª instância sobre a matéria de facto, prevê, no respectivo nº 2 al. c), a hipótese de esta ser anulada sempre que se “não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”. Trata-se da conferência de uma faculdade processual, coberta pela força das decisões proferidas por tribunais de grau hierárquico superior, tendente a, por princípio, permitir buscar todos os dados factuais disponíveis, com potencial interesse e relevo para um julgamento o mais acertado possível das pretensões formuladas pelas partes numa concreta demanda judicial, que, no âmbito específico da jurisdição tributária, pressupõe particular enfoque e atenção, por virtude do privativo ónus que impende sobre os juízes dos tribunais tributários de realizar ou ordenar todas as diligências consideradas úteis ao apuramento da verdade material - cfr. arts. 13º n.º 1 CPPT e 99º nº 1 LGT. Não se olvide, ainda, que é no estabelecimento da matéria de facto relevante que o juiz exercita o núcleo, a excelência, do seu múnus, é nesse momento que tem de fazer jus à sua condição de julgador, que se lhe impõe o acertado e responsável exercício do poder de julgar, aqui ao serviço da melhor, mais justa e equitativa, apreensão e tradução da realidade, da verdade, dos factos, com relação aos quais importa, sequentemente, aplicar o direito, tarefa, sobretudo, de cariz e apuro técnico (acessível, pois, a qualquer cultor do direito), determinada, condicionada, pelo quadro factual previamente traçado.
Nestas condições, cabe concluir encontrar-se o julgamento da matéria de facto, inscrito na sentença, inquinado por défice instrutório, porquanto existe a possibilidade séria de ser produzida prova capaz de implicar o estabelecimento de outro, sobretudo, mais alargado cenário factual, capaz de, pela sua amplitude, esclarecer melhor todos os acontecimentos, com repercussão no sentido da decisão do mérito da causa.
E no âmbito dos poderes consignados nos art. 13º do CPPT e 99º da LGT competia ao Juiz realizar as diligências para apuramento da situação concreta e só após isso conhecer da questão suscitada nos autos, de modo que, não o tendo feito, tem de proceder o presente recurso, na medida em que não se pode manter o decidido, volvendo os autos à 1ª instância para a realização das diligências tendentes a apurar a matéria acima descrita, procedendo à notificação da AT para juntar aos autos cópia da decisão que determinou a extinção do referido processo de execução fiscal por anulação, ponderando depois os demais elementos presentes autos, no sentido de se estabelecer um eventual quadro factual mais amplo, que servirá de base à decisão a proferir no âmbito dos presentes autos.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida na parte impugnada, devolvendo-se o processo ao Tribunal de 1ª instância para instrução e demais termos.
Sem custas.
Notifique-se. D.N..
Porto, 22 de Março de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos