Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00277/19.8BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/06/2019
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO. CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO. DESPACHO LIMINAR. DECISÃO-SURPRESA. FORMA DE NOTIFICAÇÃO.
Sumário:
I) A imposição de um despacho prévio ao despacho de indeferimento liminar parece ser em si mesmo contraditório porque se o despacho liminar está legalmente previsto como podendo ser de rejeição liminar, não faz sentido a parte ser ouvida preliminarmente, sendo que não pode falar-se de “decisão surpresa” na prolação de despacho de indeferimento liminar na sequência de o meio processual em apreço ter sido accionado quando o prazo para o efeito já se encontrava esgotado, até porque a lei contempla esta matéria como causa específica de rejeição - art. 63º do RGCO, verificando-se que a lei postula as causas de indeferimento liminar, consubstanciando-se em situações de inviabilidade “lato sensu”, e como tal insupríveis, tornando inútil qualquer instrução e discussão posterior, patenteando-se, então, ser desnecessária a audição prévia sobre um projecto de indeferimento.
II) As notificações das decisões cominatórias de coimas não se inserem no âmbito do estatuído no nº 1 do art. 38º do CPPT, razão por que não carecem de ser realizadas por via postal sob AR.
III) Da matéria de facto dada como assente resulta que a decisão de aplicação de coima foi notificada por correio registado sob o nº RF366337692PT, foi aceite em 27-11-2018 e entregue em 28-11-2018, sendo identificado como Local 4740 Esposende e como Recetor “G…”, remetido para a descrita morada da Recorrente (que nada questiona sobre este ponto), o que significa que deve considerar-se ter operado a presunção de notificação, uma vez que existe prova do registo e remessa da carta para a morada da Recorrente, constando dos autos informação dos correios comprovativa da data em que ocorreu o registo dos CTT e da efectiva entrega da notificação na morada da Recorrente.
IV) Portanto, encontrando-se reunidas as condições para que funcione a presunção prevista no n.º 1, do artigo 39.º do CPPT, deve considerar-se a Recorrente notificada no 3.º dia posterior ao do registo, ou seja, no dia 30/11/2018. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:ATT unipessoal, Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
ATT unipessoal, Lda., devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 19-02-2019, que rejeitou liminarmente o presente Recurso de Contra-ordenação deduzido pela arguida, com fundamento na sua intempestividade.
Formulou as respectivas alegações ( cfr. fls. … dos autos ) nas quais enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
1.º O despacho recorrido teve por base o indeferimento liminar do recurso de contraordenação por intempestividade.
2.º Entendeu o Tribunal recorrido que resultava dos autos que a decisão contraordenacional deu entrada no serviço postal a 27 de novembro de 2018 e que, por força do artigo 39.º, número 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, presumindo-se que a arguida foi notificada no 3.º dia útil, ou seja, 30 de novembro, o último dia para a apresentação do recurso foi o dia 4 de janeiro de 2019 (atenta a interpretação do artigo 279, alínea e do Código Civil).
3.º Salvo o devido respeito, a ora recorrente discorda de tal decisão, uma vez que entende que a Arguida não foi notificada para exercer o contraditório; e que no exercício do contraditório, a arguida provaria que não foi notificada no dia 30 de novembro de 2018, mas somente no dia 7 de dezembro de 2018.
4.º A presunção de notificação é uma presunção iuris tantum, motivo pelo qual admite prova em sentido contrário.
5.º Assim, a presunção de notificação prevista no Código de Procedimento e de Processo Tributário pode ser ilidida, cabendo esse ónus ao notificado.
6.º De forma a que o ónus de prova contra quem recai a presunção de notificação seja devidamente cumprido, o destinatário daquela notificação tem de poder exercer o seu exercício do contraditório.
7.º Antes de qualquer decisão jurisdicional, o sujeito sobre quem recai aquele ónus deve ser notificado dos efeitos da presunção de notificação, de forma a que este, querendo, requeira a respetiva ilisão.
8.º A falta de notificação da arguida sobre a eventual extemporaneidade antes do despacho que julgou o recurso contraordenacional extemporâneo transformou de facto, contra legem, uma presunção de notificação ilidível numa presunção de notificação inilidível.
9.º No caso, a arguida não foi notificada da eventual extemporaneidade antes do despacho de que se recorre.
10.º Nestes termos, a despacho recorrido é nulo, por violação do princípio da proibição da indefesa e do contraditório, o que se invoca.
11.º O princípio da publicidade implica que qualquer ato derivado dos poderes públicos não produza efeitos enquanto o respetivo destinatário não o conhece ou não tem a possibilidade de o conhecer; nesse sentido, há uma proibição de atos secretos dos poderes públicos.
12.º A publicidade em sentido amplo concretiza-se através de duas formas distintas, oficiais e formais, consoante a natureza jurídica do ato que é comunicado: publicação ou notificação.
13.º A Constituição, no seu artigo 268.º, número 3, remeteu para o legislador ordinário a definição da forma das notificações de atos do poder público.
14.º Efetuando a autoridade administrativa a notificação na forma prevista na lei, se nada mais houver a obstar, a notificação cumprirá as suas finalidades, consagradas constitucionalmente enquanto garantias dos cidadãos, por força do referido artigo 268.º, número 3 e do artigo 165.º, número 1, alínea s – finalidades informativas e finalidades adjetivas.
15.º O artigo 70.º, número 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias constitui uma exceção ao disposto no artigo 3.º, alínea b do mesmo diploma, uma vez que remete expressamente para os artigos 38.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário a matéria relativa à forma das notificações.
16.º A correspondência postal, verifica-se que a mesma está juridicamente enquadrada, através de normas jurídicas vinculativas, quer pela entidade operadora que presta o respetivo serviço, quer pelos utentes que o utilizam, onde aqui se inclui a administração sancionatória.
17.º Nestes termos, existem unicamente as seguintes modalidades de envios de correspondência postal, definidas no Regulamento do Serviço Público de Correios, publicado no Decreto-Lei 176/88, cujos destacados são nossos:
i. Correspondência sem tratamento especial: a entrega desta correspondência faz-se no recetáculo postal domiciliário do destinatário, como dispõe o artigo 23.º, número 1, alínea a do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 1 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
ii. Correspondência com tratamento especial, sob registo: a entrega desta correspondência faz-se na morada indicada pelo remetente, como dispõe o artigo 23.º, número 1, alínea b do Regulamento do Serviço Público de Correios. A entrega é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
iii. Correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de receção: nos termos do artigo 30.º do Regulamento do Serviço Público de Correios, o remetente solicita no ato de registo que lhe seja enviado o aviso de receção. A entrega é efetuada ao destinatário ou outrem em nome deste e é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
iv. Correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de receção a entregar em mão ao próprio destinatário: nos termos do artigo 31.º do Regulamento do Serviço Público de Correios, o remetente solicita no ato de registo que a correspondência seja entregue em mão ao próprio destinatário. A entrega é efetuada ao destinatário e é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata
devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
18.º O legislador não regulou outras modalidades de envio de correspondência física através do serviço público de correios.
19.º Excecionalmente, as notificações podem ser efetuadas através de correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de receção, nos termos do artigo 38.º, número 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sempre que se esteja perante atos suscetíveis de alterarem a situação tributária ou se esteja perante a convocação para o destinatário assistir ou participar em atos ou diligências.
20.º Deve ser entendido como ato suscetível de alterar a situação tributária, o ato que cria ou restringe direitos ou deveres presentes ou futuros para os respetivos destinatários.
21.º Assim, no domínio contraordenacional, os atos parasancionatórios (sem finalidades sancionatórias) e os atos sancionatórios (com finalidades sancionatórias, de prevenção geral e especial) que criam direitos do arguido, como a notificação para o exercício do direito de defesa previsto no artigo 70.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, ou que restrinjam direitos, como a notificação da decisão de aplicação de coima que tem finalidades de prevenção geral e finalidades de prevenção especial, são atos que têm de ser notificados por correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de receção.
22.º Não é demais relembrar que a notificação da decisão de aplicação de sanção contraordenacional pode implicar não só o pagamento de uma coima, como também a aplicação de um extenso leque de sanções acessórias, como por exemplo a privação do direito de participar em concursos públicos, a perda de benefícios fiscais concedidos, a cassação de licenças ou concessões ou o encerramento de estabelecimento, nos termos do artigo 21.º do Regime Geral das Contraordenações e do artigo 28.º do Regime Geral das Infrações Tributárias.
23.º Por isso, em abstrato, a notificação para o direito de audição e de defesa e a notificação da decisão de aplicação de sanção são atos suscetíveis de alterar a situação tributária do destinatário, pelo que lhes é aplicável a forma de notificação prevista no artigo 38.º, número 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
24.º Acresce ainda que a aplicação da norma final do artigo 38.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, para a qual a norma remissiva do artigo 70.º, número 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias remeteu, deve ser efetuada de uma forma “correspetiva”, com as devidas adaptações.
25.º Assim, mesmo que a norma remissiva não tenha referência a uma adaptação, deve o intérprete e aplicador de Direito entender que é sempre devido o respetivo ajustamento de acordo com a natureza de cada norma em questão.
26.º Ora, face às finalidades sancionatórias do Direito contraordenacional, só a notificação de atos sancionatórios através de correio registado com aviso de receção assegura que as finalidades do princípio da publicidade inerentes à notificação de atos contraordenacionais sejam cumpridas.
27.º Nem se diga, salvo o devido respeito, que também o Código de Processo Penal afasta a aplicação da notificação com aviso de receção, porque nesse caso o arguido presta termo de identidade e residência, o que não ocorre no domínio contraordenacional;
28.º É que antes da consagração do tremo de identidade e residência, o arguido criminal era notificado através de carta registada com aviso de receção.
29.º Quanto aos atos que se está perante a convocação para o destinatário assistir ou participar em atos ou diligências, devem ser atos cuja finalidade é proporcionar ao destinatário a possibilidade de defesa dos seus direitos; por isso, também por aqui, a notificação para o exercício do direito de defesa previsto no artigo 70.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, ou a notificação da possibilidade de recurso contraordenacional da decisão de aplicação de coima é enquadrável nesta obrigação de notificação por correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de receção.
30.º A primeira conclusão a retirar é que a arguida não foi notificada por carta registada com aviso de receção e devia-o ter sido.
31.º A escolha do legislador em relação à forma das notificações dos atos sancionatórios contraordenacionais envolve sempre uma dicotomia entre a celeridade do procedimento contraordenacional e a garantia do efetivo conhecimento do ato por parte do destinatário do mesmo em condições (1) seguras e (2) idóneas, de forma a que o mesmo possa, querendo, exercer os meios de reação legalmente previstos.
32.º As condições serão seguras quando está garantido de forma certa, por isso sem margem para dúvidas, de que o destinatário tem a possibilidade de tomar conhecimento do ato.
33.º As condições serão idóneas sempre que a notificação é efetuada em condições aptas ou adequadas a transmitir ao destinatário o ato em causa.
34.º Tendo em conta a distinção entre notificação pessoal e não pessoal, o legislador previu que à notificação pessoal se aplicam os termos da citação, nos termos do artigo 38.º, número 6 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
35.º Já quanto à notificação não pessoal, o legislador apenas previu um artigo relativo à notificação de pessoas coletivas – o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
36.º Não se aplicando as normas da citação pessoal à notificação não pessoal, as normas aplicáveis são as do artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e, para o que interessa a estes autos, as regras do artigo 99.º do Decreto de 14-06-1902, acessível em http://legislacaoregia.parlamento.pt/V/1/87/136/p348
37.º Assim, as regras relativas à identificação do destinatário e aos poderes para receber notificações têm de ser interpretadas nos termos do artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e do artigo 99.º, §1 do Decreto de 14-06-1902.
38.º Ora, a entrega de correspondência registada com aviso de receção no domicílio do destinatário tem de ser efetuada, mediante prévia identificação, na pessoa do destinatário «ou por indivíduo especialmente autorizado por escrito», de acordo com o disposto no artigo 99.º, §1.º, alínea b do Decreto de 14-06-1902.
39.º Ora, o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário possibilita que a notificação de pessoas coletivas seja efetuada no representante legal em primeira linha.
40.º Só nos casos em que o representante legal não seja encontrado, na sede ou no seu próprio domicílio, é que a administração tributária deve notificar a pessoa coletiva na pessoa de (1) qualquer empregado (2) capaz de transmitir o ato, como impõe o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
41.º Assim, o legislador impõe que, em primeiro lugar, se tente encontrar o representante legal e só se este não for encontrado, é que se parte para a notificação através do respetivo empregado; em segundo lugar, a administração tributária está obrigada a certificar-se que a pessoa em causa é trabalhadora da pessoa coletiva;
42.º E, terceiro, sendo trabalhadora, tal pessoa tem de ter poderes para receber notificações da pessoa coletiva - tem de se aferir se pode representar a pessoa coletiva.
43.º É por isso que o legislador impõe que o trabalhador «seja capaz de transmitir os termos do acto».
44.º Esta capacidade de transmitir os termos do ato tem de ser aferida pelos poderes que a pessoa coletiva lhe dá, previamente – daí a especial autorizado por escrito, a que se refere o legislador no artigo 99.º, §1.º, alínea b do Decreto de 14-06-1902.
45.º Em suma, para que a notificação não pessoal com carta registada com aviso de receção produza efeitos, há-de ser efetuada por esta ordem:
1. A administração tributária tenta encontrar o representante da pessoa coletiva para o notificar pessoalmente;
2. Não encontrando o representante legal, a administração tributária certifica-se que quem se propõe receber é trabalhador da pessoa coletiva;
3. Sendo trabalhador da pessoa coletiva, a administração tributária certifica-se que tem poderes para ser notificado.
46.º E tanto é assim que, se a carta tiver de ser levantada na estação de correios, o indivíduo que se propõe recebê-la tem de provar perante o funcionário que é o representante legal ou, não o sendo, tem de demonstrar tais poderes, através do transporte do próprio cartão de cidadão do destinatário ou representante legal - veja-se no sítio em linha em https://www.ctt.pt/faq/correio-e-encomendas/solucoes-decorreio/correio-com-aviso-de-entrega.html
47.º Mas ainda que se entenda que no caso não tem de haver notificação com carta registada com aviso de receção, sempre se entende que este artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário é aplicável na notificação registada, uma vez que a notificação tem de ser efetuada em pessoas físicas, como estabelece o artigo 246.º do Código de Processo Civil.
48.º E também neste caso, tem de se verificar que quem assina, se não for o representante legal, é pelo menos funcionário da referida pessoa coletiva.
49.º Entendendo-se que a notificação não foi bem feita porque não obedeceu à formalidade legalmente prevista, importa aferir se com o recurso contraordenacional a eventual falta de eficácia não foi suprida.
50.º No caso, a arguida só tomou conhecimento da notificação da decisão condenatória no dia 7 de dezembro de 2018, uma vez que a carta estava depositada na caixa de correio nesse dia e não estava no dia anterior.
51.º Assim, a arguida junta a lista completa de trabalhadores seus, para que, em confronto com os dados dos CTT que a arguida desde já requer sejam solicitados, se verifique que nenhum trabalhador seu recebeu a notificação.
TERMOS EM QUE,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso, proferindo-se douto Acórdão que decida pela revogação do despacho de rejeição liminar do recurso contraordenacional dos presentes autos.
NESTES TERMOS,
Farão V.as Ex.as, Venerandos Desembargadores, a habitual e sempre esperada JUSTIÇA.
*
Não foram produzidas contra-alegações.
*
Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
No artigo 75.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGIMOS) estabelece-se que a decisão do recurso jurisdicional pode alterar a decisão recorrida sem qualquer vinculação aos seus termos e ao seu sentido, com a limitação da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A do mesmo diploma.
Não obstante, o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões (cfr. artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal ex vi artigo 74.º, n.º 4 do RGIMOS), excepto quanto aos vícios de conhecimento oficioso; pelo que este tribunal apreciará e decidirá as questões colocadas pela Recorrente, sendo que importa apreciar o invocado erro de julgamento na decisão que conheceu a caducidade do direito de acção e, consequentemente, rejeitou o Recurso de Contra-ordenação.
3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. Em 03/05/2017 foi levantado pela Direcção de Serviços de Cobrança do IVA, auto de notícia contra a arguida pela prática da infracção de falta de pagamento de imposto, prevista nos artigos 27º, nº 1 e 41º, nº 1, alínea a) do CIVA, e punida pelos artigos 114º, nº 2 e nº 5, alínea a) e 26º, nº 4 do RGIT, autuado pelo Serviço de Finanças de Vila Verde sob o nº 04692017060000024173 – cfr. auto de notícia e autuação de fls. 2 e 3 dos autos;
2. Em 27/11/2018 foi proferida decisão de fixação de coima - cfr. decisão de fls. 18 e 19 dos autos;
3. Por ofício datado de 27/11/2018, remetido, na mesma data, por carta registada sob o nº RF366337692PT, foi a arguida notificada da decisão de fixação de coima - cfr. ofício e talão de registo de fls. 20 e 21 dos autos;
4. Em 08/01/2019 foi apresentada no Serviço de Finanças de Braga-1 a petição dos presentes autos - cfr. documentos de fls. 23 a 45 dos autos.
Ao abrigo do disposto no artigo 83.º do RGIT, 74.º, n.º 4 do RGCO ex vi alínea b) do artigo 3.º do RGIT e 410.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do Código de Processo Penal (CPP), decide-se aditar ao probatório o seguinte:
5. O ofício referido em 2., remetido por carta registada sob o nº RF366337692PT, foi aceite em 27-11-2018 e entregue em 28-11-2018, sendo identificado como Local 4740 Esposende e como Recetor “GLORIA ROCAS” - (http://www.ctt.pt/feapl_2/app/open/objectSearch/objectSearch.jspx).
6. Por ofício datado de 23/11/2018, remetido, na mesma data, por carta registada sob o nº RF366337542PT, foi a arguida notificada do despacho proferido em 22-11-2018 no processo de contra-ordenação identificado nos autos - cfr. ofício e talão de registo de fls. 15 e 16 dos autos.
7. O ofício referido em 6., remetido por carta registada sob o nº RF366337542PT, foi aceite em 23-11-2018 e entregue em 26-11-2018, sendo identificado como Local 4740 Esposende e como Recetor “PEDRO BRITO” - http://www.ctt.pt/feapl_2/app/open/objectSearch/objectSearch.jspx).
3.2 DE DIREITO
A partir daqui, importa avançar para o conhecimento da matéria que integra o presente recurso, sendo que está em causa a caducidade do direito de acção.
Na verdade, a decisão recorrida ponderou que:
“…
Nos presentes autos, verifica-se que o Serviço de Finanças de Vila Verde expediu, em 27/11/2018, carta registada dirigida à arguida, com vista à notificação da decisão proferida no âmbito do processo de contra-ordenação em causa, pelo que a arguida se presume notificada no dia 30/11/2018 (3º dia útil após o registo).
Assim, dispondo a arguida do prazo de 20 dias para reagir à decisão de fixação de coima, verificado que o recurso foi entregue no Serviço de Finanças em 08/01/2019, já se encontrava ultrapassado o prazo legal para a apresentação do recurso.
De facto, o termo inicial do prazo de interposição do recurso ocorreu em 03/12/2018 (suspenso dias 01/12 e 02/12 – sábado e domingo) e, efectuado o cômputo do prazo para interposição do recurso nos termos supra expostos, conclui-se que o mesmo teve o seu termo final no dia 31/12/2018, que por corresponder a férias judiciais (in casu, no período de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro - cfr. artigo 28º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovado pela Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto), passa para o dia 04/01/2019 - primeiro dia útil após as férias judiciais.
O requerimento de recurso é, portanto, intempestivo, devendo ser rejeitado nos termos previstos no artigo 63º, nº 1 do RGCO, aplicável ex vi artigo 3º, alínea b) do RGIT. …”.
Nas suas alegações, a Recorrente começa por referir que não foi notificada para exercer o contraditório e que no exercício desse direito, provaria que não foi notificada no dia 30 de Novembro de 2018, mas somente no dia 7 de Dezembro de 2018, sendo que a presunção de notificação é uma presunção iuris tantum, motivo pelo qual admite prova em sentido contrário e de forma a que o ónus de prova contra quem recai a presunção de notificação seja devidamente cumprido, o destinatário daquela notificação tem de poder exercer o seu exercício do contraditório, pelo que, antes de qualquer decisão jurisdicional, o sujeito sobre quem recai aquele ónus deve ser notificado dos efeitos da presunção de notificação, de forma a que este, querendo, requeira a respectiva ilisão, o que significa que a falta de notificação da arguida sobre a eventual extemporaneidade antes do despacho que julgou o recurso contraordenacional extemporâneo transformou de facto, contra legem, uma presunção de notificação ilidível numa presunção de notificação inilidível, pois que não foi notificada da eventual extemporaneidade antes do despacho de que se recorre, o que torna o despacho recorrido nulo, por violação do princípio da proibição da indefesa e do contraditório, o que se invoca.
Pois bem, neste domínio, importa reter que a imposição de um despacho prévio ao despacho de indeferimento liminar parece ser em si mesmo contraditório porque se o despacho liminar está legalmente previsto como podendo ser de rejeição liminar, não faz sentido a parte ser ouvida preliminarmente.
Por outro lado, não parece que se deva, em rigor, falar de “decisão surpresa” na prolação de despacho de indeferimento liminar na sequência de o meio processual em apreço ter sido accionado quando o prazo para o efeito já se encontrava esgotado, sendo que a lei contempla esta matéria como causa específica de rejeição - art. 63º do RGCO, verificando-se que a lei postula as causas de indeferimento liminar, consubstanciando-se em situações de inviabilidade “lato sensu”, e como tal insupríveis, tornando inútil qualquer instrução e discussão posterior, patenteando-se, então, ser desnecessária a audição prévia sobre um projecto de indeferimento.
No fundo, nas situações de indeferimento liminar, a lei difere o contraditório na medida em que se prevê sempre a admissibilidade do recurso, independentemente do valor e da sucumbência e se determina que o réu seja citado para os termos do recurso e da causa, situação que aponta para a dispensa da audição prévia do autor, porque desnecessária, permitindo-se o contraditório diferido e em situação de igualdade.
A tal decisão-surpresa pressupõe que a parte não possa perspectivar como sendo possível, ou seja, quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tinham a obrigação de prever, quando não fosse exigível que a parte interessada a houvesse prognosticado no processo.
Assim sendo, não se vislumbra como defender que a Recorrente não pudesse prognosticar que o Tribunal iria analisar a tempestividade do presente recurso de contra-ordenação, até porque se lhe impunha essa apreciação, de modo que, cabe concluir que no caso de indeferimento liminar da petição inicial, o princípio do contraditório não impõe a audição prévia do autor sobre o motivo do indeferimento (despacho preliminar), além do mais porque a lei prevê o contraditório diferido, dada ampla admissibilidade legal de recurso, independentemente do valor e da sucumbência, e em situação de igualdade das partes, não podendo proceder o exposto pela Recorrente nesta sede.
A Recorrente refere depois que o princípio da publicidade implica que qualquer acto derivado dos poderes públicos não produza efeitos enquanto o respectivo destinatário não o conhece ou não tem a possibilidade de o conhecer; nesse sentido, há uma proibição de actos secretos dos poderes públicos, sendo que a publicidade em sentido amplo concretiza-se através de duas formas distintas, oficiais e formais, consoante a natureza jurídica do ato que é comunicado: publicação ou notificação.
O artigo 70.º, número 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias constitui uma exceção ao disposto no artigo 3.º, alínea b do mesmo diploma, uma vez que remete expressamente para os artigos 38.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário a matéria relativa à forma das notificações.
A correspondência postal, verifica-se que a mesma está juridicamente enquadrada, através de normas jurídicas vinculativas, quer pela entidade operadora que presta o respectivo serviço, quer pelos utentes que o utilizam, onde aqui se inclui a administração sancionatória e existem unicamente as seguintes modalidades de envios de correspondência postal, definidas no Regulamento do Serviço Público de Correios, publicado no Decreto-Lei 176/88, cujos destacados são nossos:
i. Correspondência sem tratamento especial: a entrega desta correspondência faz-se no receptáculo postal domiciliário do destinatário, como dispõe o artigo 23.º, número 1, alínea a do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 1 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
ii. Correspondência com tratamento especial, sob registo: a entrega desta correspondência faz-se na morada indicada pelo remetente, como dispõe o artigo 23.º, número 1, alínea b do Regulamento do Serviço Público de Correios. A entrega é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
iii. Correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de recepção: nos termos do artigo 30.º do Regulamento do Serviço Público de Correios, o remetente solicita no ato de registo que lhe seja enviado o aviso de recepção. A entrega é efectuada ao destinatário ou outrem em nome deste e é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
iv. Correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de recepção a entregar em mão ao próprio destinatário: nos termos do artigo 31.º do Regulamento do Serviço Público de Correios, o remetente solicita no ato de registo que a correspondência seja entregue em mão ao próprio destinatário. A entrega é efectuada ao destinatário e é comprovada por recibo, nos termos do artigo 28.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios. A não entrega da correspondência leva à sua imediata devolução, por força do artigo 24.º, número 4 do Regulamento do Serviço Público de Correios.
O legislador não regulou outras modalidades de envio de correspondência física através do serviço público de correios e, excepcionalmente, as notificações podem ser efectuadas através de correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de recepção, nos termos do artigo 38.º, número 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sempre que se esteja perante actos susceptíveis de alterarem a situação tributária ou se esteja perante a convocação para o destinatário assistir ou participar em actos ou diligências e deve ser entendido como acto susceptível de alterar a situação tributária, o acto que cria ou restringe direitos ou deveres presentes ou futuros para os respectivos destinatários.
Assim, no domínio contraordenacional, os actos parasancionatórios (sem finalidades sancionatórias) e os actos sancionatórios (com finalidades sancionatórias, de prevenção geral e especial) que criam direitos do arguido, como a notificação para o exercício do direito de defesa previsto no artigo 70.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, ou que restrinjam direitos, como a notificação da decisão de aplicação de coima que tem finalidades de prevenção geral e finalidades de prevenção especial, são actos que têm de ser notificados por correspondência com tratamento especial sob registo com aviso de recepção, até porque a notificação da decisão de aplicação de sanção contraordenacional pode implicar não só o pagamento de uma coima, como também a aplicação de um extenso leque de sanções acessórias, como por exemplo a privação do direito de participar em concursos públicos, a perda de benefícios fiscais concedidos, a cassação de licenças ou concessões ou o encerramento de estabelecimento, nos termos do artigo 21.º do Regime Geral das Contraordenações e do artigo 28.º do Regime Geral das Infracções Tributárias.
Por isso, em abstracto, a notificação para o direito de audição e de defesa e a notificação da decisão de aplicação de sanção são actos susceptíveis de alterar a situação tributária do destinatário, pelo que lhes é aplicável a forma de notificação prevista no artigo 38.º, número 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Acresce ainda que a aplicação da norma final do artigo 38.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, para a qual a norma remissiva do artigo 70.º, número 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias remeteu, deve ser efectuada de uma forma “correspectiva”, com as devidas adaptações e mesmo que a norma remissiva não tenha referência a uma adaptação, deve o intérprete e aplicador de Direito entender que é sempre devido o respectivo ajustamento de acordo com a natureza de cada norma em questão e face às finalidades sancionatórias do Direito contraordenacional, só a notificação de actos sancionatórios através de correio registado com aviso de recepção assegura que as finalidades do princípio da publicidade inerentes à notificação de actos contraordenacionais sejam cumpridas e nem se diga, salvo o devido respeito, que também o Código de Processo Penal afasta a aplicação da notificação com aviso de recepção, porque nesse caso o arguido presta termo de identidade e residência, o que não ocorre no domínio contraordenacional;
A primeira conclusão a retirar é que a arguida não foi notificada por carta registada com aviso de recepção e devia-o ter sido e a escolha do legislador em relação à forma das notificações dos actos sancionatórios contraordenacionais envolve sempre uma dicotomia entre a celeridade do procedimento contraordenacional e a garantia do efectivo conhecimento do ato por parte do destinatário do mesmo em condições (1) seguras e (2) idóneas, de forma a que o mesmo possa, querendo, exercer os meios de reacção legalmente previstos e as condições serão seguras quando está garantido de forma certa, por isso sem margem para dúvidas, de que o destinatário tem a possibilidade de tomar conhecimento do ato.
Tendo em conta a distinção entre notificação pessoal e não pessoal, o legislador previu que à notificação pessoal se aplicam os termos da citação, nos termos do artigo 38.º, número 6 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e quanto à notificação não pessoal, o legislador apenas previu um artigo relativo à notificação de pessoas colectivas – o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Não se aplicando as normas da citação pessoal à notificação não pessoal, as normas aplicáveis são as do artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e, para o que interessa a estes autos, as regras do artigo 99.º do Decreto de 14-06-1902, acessível em http://legislacaoregia.parlamento.pt/V/1/87/136/p348, o que significa que as regras relativas à identificação do destinatário e aos poderes para receber notificações têm de ser interpretadas nos termos do artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e do artigo 99.º, §1 do Decreto de 14-06-1902.
Ora, a entrega de correspondência registada com aviso de recepção no domicílio do destinatário tem de ser efectuada, mediante prévia identificação, na pessoa do destinatário «ou por indivíduo especialmente autorizado por escrito», de acordo com o disposto no artigo 99.º, §1.º, alínea b do Decreto de 14-06-1902 e o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário possibilita que a notificação de pessoas colectivas seja efectuada no representante legal em primeira linha e só nos casos em que o representante legal não seja encontrado, na sede ou no seu próprio domicílio, é que a administração tributária deve notificar a pessoa colectiva na pessoa de (1) qualquer empregado (2) capaz de transmitir o acto, como impõe o artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ou seja, o legislador impõe que, em primeiro lugar, se tente encontrar o representante legal e só se este não for encontrado, é que se parte para a notificação através do respectivo empregado; em segundo lugar, a administração tributária está obrigada a certificar-se que a pessoa em causa é trabalhadora da pessoa colectiva e, terceiro, sendo trabalhadora, tal pessoa tem de ter poderes para receber notificações da pessoa colectiva - tem de se aferir se pode representar a pessoa colectiva.
Em suma, para que a notificação não pessoal com carta registada com aviso de recepção produza efeitos, há-de ser efectuada por esta ordem:
1. A administração tributária tenta encontrar o representante da pessoa colectiva para o notificar pessoalmente;
2. Não encontrando o representante legal, a administração tributária certifica-se que quem se propõe receber é trabalhador da pessoa colectiva;
3. Sendo trabalhador da pessoa colectiva, a administração tributária certifica-se que tem poderes para ser notificado.
Mas ainda que se entenda que no caso não tem de haver notificação com carta registada com aviso de recepção, sempre se entende que este artigo 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário é aplicável na notificação registada, uma vez que a notificação tem de ser efectuada em pessoas físicas, como estabelece o artigo 246.º do Código de Processo Civil e também neste caso, tem de se verificar que quem assina, se não for o representante legal, é pelo menos funcionário da referida pessoa colectiva, de modo que, entendendo-se que a notificação não foi bem feita porque não obedeceu à formalidade legalmente prevista, importa aferir se com o recurso contraordenacional a eventual falta de eficácia não foi suprida.
Que dizer?
Nesta matéria, tal como defende a Recorrente, às notificações em processo de contra-ordenação aplicam-se as disposições correspondentes do Código do Procedimento e de Processo Tributário, nos termos do disposto no art. 70º, nº 2, do RGIT.
Depois, é sabido que a notificação tem por objectivo dar conhecimento pessoal aos interessados dos actos administrativos susceptíveis de afectar a sua esfera jurídica, como exigência da garantia constitucional consagrada no nº 3 do art. 268º da CRP, segundo a qual impende sobre a Administração o dever de dar conhecimento aos administrados dos actos que lhes respeitam.
Nesta sequência, tal como aponta o Ac. do S.T.A. de 18-06-2013, Proc. nº 0595/13, www.dgsi.pt, “… Neste sentido, diz o nº 1 do art. 36º do CPPT que “os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesse legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.
E embora a CRP relegue para a liberdade constitutiva do legislador ordinário o encargo de determinar as formalidades das notificações, a verdade é que esse formalismo deverá mostrar-se constitucionalmente adequado e observar o princípio constitucional da proibição da indefesa (Cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 130/2002, de 14/3/2002, proc nº 607/01.).
Tratando-se de matéria sancionatória, fazem-se sentir aqui particularmente as exigências do art. 268º, nº 3, da CRP.
No que respeita às exigências de notificação em matéria de coimas, pronunciou-se este Supremo Tribunal, entre outros, no Acórdão de 12/4/2012, proc nº 331/11, no qual interviemos como relatora e que passamos a reproduzir.
“Assim, admitindo, em conformidade com alguma doutrina, que “as notificações das decisões cominatórias de coimas não se inserem no âmbito do estatuído no nº 1 do art. 38º do CPPT, razão por que não carecem de ser realizadas por via postal sob AR” (Ver, por todos, PAULO MARQUES, Infracções Tributárias, Ministério das Finanças e da Administração Pública, Direcção-Geral dos Impostos - Centro de Formação, Lisboa, 2007, vol. II, pp. 88 ss., e JORGE LOPES DE SOUSA/SIMAS SANTOS, Regime Geral das Infracções Tributárias, 4ª ed., Áreas Editora, Lisboa, 2010, pp. 477 ss.), …”.
Quanto a estes últimos Autores, tal como se destaca na decisão recorrida “(…) não se reporta a qualquer acto ou decisão nem se relaciona com qualquer alteração da situação tributária do contribuinte nem visa a sua convocação para assistir ou participar em qualquer acto ou em qualquer diligência. Por isso, esta notificação não tem de ser efectuada por carta registada com aviso de recepção, devendo realizar-se por carta registada(...)”, o que significa que, apesar do esforço de alegação da Recorrente, não pode acolher-se a tese esgrimida nesta sede.
No entanto, a Recorrente sustenta ainda que só tomou conhecimento da notificação da decisão condenatória no dia 7 de Dezembro de 2018, uma vez que a carta estava depositada na caixa de correio nesse dia e não estava no dia anterior, juntando ainda a lista completa de trabalhadores seus, para que, em confronto com os dados dos CTT, se verifique que nenhum trabalhador seu recebeu a notificação.
Neste ponto, o probatório informa que:
2. Em 27/11/2018 foi proferida decisão de fixação de coima - cfr. decisão de fls. 18 e 19 dos autos;
3. Por ofício datado de 27/11/2018, remetido, na mesma data, por carta registada sob o nº RF366337692PT, foi a arguida notificada da decisão de fixação de coima - cfr. ofício e talão de registo de fls. 20 e 21 dos autos; …
5. O ofício referido em 2., remetido por carta registada sob o nº RF366337692PT, foi aceite em 27-11-2018 e entregue em 28-11-2018, sendo identificado como Local 4740 Esposende e como Recetor “GLORIA ROCAS” - (http://www.ctt.pt/feapl_2/app/open/objectSearch/objectSearch.jspx).
Como já ficou dito, por força do estatuído no citado n.º 2, do artigo 70.º do RGIT, as notificações em processo de contra-ordenação fazem-se nos termos previstos no CPPT, que estabelece o seu regime nos artigos 35.º e segs., constituindo uma excepção à regra de aplicação subsidiária do RGCO.
Quanto à forma de notificar a pessoas colectivas, regula o artigo 41.º do CPPT.
Quando a notificação é feita por correio registado, aplica-se o disposto no artigo 39.º, n.º 1 do CPPT, que estabelece a presunção iuris tantum de que a notificação se considera feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.
Como presunção elidível que é, admite demonstração em contrário.
Da matéria de facto dada como assente resulta que a decisão de aplicação de coima foi notificada por correio registado sob o nº RF366337692PT, foi aceite em 27-11-2018 e entregue em 28-11-2018, sendo identificado como Local 4740 Esposende e como Recetor “GLORIA ROCAS”, remetido para a descrita morada da Recorrente (que nada questiona sobre este ponto)
Como tal, deve considerar-se ter operado a presunção de notificação, uma vez que existe prova do registo e remessa da carta para a morada da Recorrente, constando dos autos informação dos correios comprovativa da data em que ocorreu o registo dos CTT e da efectiva entrega da notificação na morada da Recorrente.
Portanto, encontrando-se reunidas as condições para que funcione a presunção prevista no n.º 1, do artigo 39.º do CPPT, deve considerar-se a Recorrente notificada no 3.º dia posterior ao do registo, ou seja, no dia 30/11/2018.
Na verdade, independentemente da tentativa da Recorrente em evidenciar que a entrega da carta não teve qualquer relação com os seus trabalhadores (tendo apresentado nos autos uma lista dos mesmos), se a carta em apreço foi remetida para a morada da Recorrente e foi recepcionada por quem ali se encontrava, presume-se que estaria em condições o efeito, dado que, não é de aceitar que um estranho permanecesse nas suas instalações e se “entretesse” a recepcionar cartas, apropriando-se das mesmas, (para que fim....?) tanto mais que a Recorrente não alegou nem demonstrou ter participado criminalmente contra “incertos” por apropriação indevida de bens que lhe pertencem.
Nestas condições, nada impede a afirmação vertida na decisão recorrida no sentido de que o termo inicial do prazo de interposição do recurso ocorreu em 03/12/2018 (suspenso dias 01/12 e 02/12 – sábado e domingo) e, efectuado o cômputo do prazo para interposição do recurso nos termos supra expostos, conclui-se que o mesmo teve o seu termo final no dia 31/12/2018, que por corresponder a férias judiciais (in casu, no período de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro - cfr. artigo 28º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovado pela Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto), passa para o dia 04/01/2019 - primeiro dia útil após as férias judiciais, de modo que, dispondo a arguida do prazo de 20 dias para reagir à decisão de fixação de coima, verificado que o recurso foi entregue no Serviço de Finanças em 08/01/2019, já se encontrava ultrapassado o prazo legal para a apresentação do recurso.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
***
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 06 de Junho de 2019
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Cristina Bento