Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00749/11.2BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/05/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:REVERSÃO, PRESSUPOSTOS, SUSTAÇÃO DA EXECUÇÃO, INSOLVÊNCIA, CULPA, ÓNUS DA PROVA, RETENÇÃO NA FONTE, IRS
Sumário:I - A inexistência ou insuficiência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se ao momento em que a reversão ocorre e não ao momento em que o administrador ou gerente/responsável subsidiário exerceu esse cargo societário.

II - É legalmente viável a instauração de processo de execução fiscal contra a sociedade devedora após a declaração judicial da sua insolvência, pese embora as execuções fiscais instauradas para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência devam ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência, e as instauradas para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência devam prosseguir com a penhora de bens não apreendidos no processo de insolvência.

III - É legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora, com a penhora de bens do património do revertido independentemente da data da sua aquisição, na medida em que só relativamente à entidade insolvente fica a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos, não fazendo sentido invocar a restrição do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT relativamente ao responsável subsidiário caso inexista declaração de insolvência quanto a si.

IV - No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).

V - Assim, sendo as dívidas provenientes de IRS – retenções na fonte, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.

VI - Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

VII - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores, pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.

VIII - O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que o órgão da execução fiscal considere haver “fundada insuficiência” do património da sociedade originária devedora, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 7, da LGT).

IX - A execução fiscal não prosseguirá contra o revertido enquanto não findar o processo de insolvência e se apurar se, e em que medida, os bens da sociedade originária devedora são insuficientes para o pagamento da dívida exequenda, assim se assegurando o benefício da excussão prévia (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, da LGT). *
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

J., contribuinte fiscal n.º (…), residente na Rua (…), (…), em (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 25/05/2016, que julgou improcedente a oposição por si deduzida, na qualidade de revertido, contra a execução fiscal n.º.. , a correr termos no Serviço de Finanças de (...) 2 - (...), em que é devedora originária “A., Lda.”, por falta de pagamento de IRS – retenções na fonte, nos anos de 2007 e 2008, no montante de €90.255,78.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
I. O Oponente juntou prova cabal de que todos os trabalhadores da primitiva executada cujos créditos se encontram reconhecidos nos autos de insolvência desta sociedade foram transferidos com todos os seus direitos para a sociedade que no processo de insolvência adquiriu o estabelecimento comercial;
II. Que a venda do estabelecimento da primitiva executada importou na quantia de € 172.000,00, sendo certo que, à data de 14/10/2013, se encontrava depositado nos referidos autos de insolvência o valor de € 176.632,08;
III. E que a primitiva executada, desde 20/06/2007 até à data da declaração da insolvência, pagou impostos, juros, custas e coimas à Autoridade Tributária em valor superior a € 400.000,00;
IV. A Exequente não invocou a falsidade dos documentos autênticos nem impugnou a letra e a assinatura dos documentos particulares juntos, pelo que todos estes documentos têm força probatória plena;
V. Trata-se in casu de factos absolutamente essenciais à boa decisão da causa e à justa composição do litigio, pelo que devem os mesmos ser aditados à matéria de facto provada;
VI. Os créditos dos trabalhadores, constantes da lista de créditos, foram qualificados como condicionais, encontrando-se subordinados à condição de rescisão dos respectivos contratos de trabalho que mantinham com a primitiva executada;
VII. Tendo todos os trabalhadores da primitiva executada sido transferidos, com todos os direitos, para a sociedade que adquiriu o estabelecimento da insolvente;
VIII. Pelo que a condição a que se encontravam subordinados os créditos não se verificou, tudo se passando, afinal, como se estes não existissem;
IX. Assim, todo o valor depositado nos autos de insolvência destina-se a pagar os créditos da Exequente e da Segurança Social;
X. Sendo o valor depositado - 176.632,08 - mais do que suficiente para pagamento da quantia exequenda;
XI. Não se verificando, assim, qualquer insuficiência de bens penhoráveis da primitiva executada;
XII. A execução apenas pode reverter contra o Oponente depois de vendidos todos os bens penhorados, e pagos os respectivos créditos, entre os quais o da Exequente;
XIII. Qualquer outra interpretação dos artigos 23° n° 2 da LGT e 153° do CPPT é inconstitucional, violando os princípios da justiça, da legalidade e da proporcionalidade;
XIV. Encontra-se demonstrado que o Oponente tudo fez para que a primitiva executada pagasse os impostos, tendo pago, desde 20/06/2007 até à data da declaração da insolvência, valores superiores a € 400.000,00 em juros, coimas e impostos;
XV. O Oponente não praticou qualquer facto ilícito ou culposo, donde a sua ilegitimidade para a execução que contra si reverteu;
XVI. Atenta a prova produzida nos autos, deveria a execução ter sido sustada logo após a declaração da insolvência da primitiva executada, não podendo esta reverter contra o Oponente enquanto esta se encontrar sustada;
Termos em que, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, impondo-se, em consequência, a revogação da sentença proferida e a sua substituição por outra que julgue a oposição totalmente procedente, com todas as consequências legais, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, ao concluir ser o despacho de reversão legal, mesmo não tendo ficado sustada a execução fiscal - artigo 180.º, n.º 1, n.º 4 e n.º 5 do CPPT, e no que tange ao pressuposto da fundada insuficiência dos bens penhoráveis da devedora principal, e ao julgar o revertido parte legítima, por não ter demonstrado não lhe ser imputável a falta de pagamento das dívidas exequendas.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
3.1 – De facto.
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga provado:
A) Em 22/09/2009 o Serviço de Finanças de (...) – 2, (...), instaurou contra a executada originária o PEF n.º…, por dívidas de IRS no montante de €4.280,00, a que foram apensados os PEF por dívidas de IRS, retenção na fonte, dos períodos, montantes e datas limite de pagamento constantes discriminadas a fls. 265 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, passando a quantia exequenda para o montante total de €90.255,778 (fls. 265, 266 e 269 a 288).
B) Pelo despacho de fls. 259 a 265 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, complementado pela nota de citação de fls. 266 e 266 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido, os PEF referidos em A) foram revertidos contra o oponente.
C) A executada originária foi declarada insolvente por sentença de 08/01/2010, transitada em julgado em 01/03/2010 (f ls. 218 a 224 e 289 a 290).
D) Em 25/03/2011 foi proferida sentença de graduação de créditos no processo de insolvência da executada originária (f ls. 307 a 309).
E) No processo de insolvência da executada originária constava a relação dos créditos reconhecidos, junto a estes autos de fls. 310 a 311 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
F) No processo de insolvência o ativo da insolvente apreendido no processo foi o seu estabelecimento comercial e industrial a que foi atribuído o valor de €228.571,00, que foi vendido por €172.000,00 (f ls. 1469, 303 verso e 304).
G) Em 23/09/2010 foi decidida a venda do estabelecimento da executada originária por €172.000,00 à A., SA, pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), (...) (f ls. 291 a 304).
H) O oponente é presidente do conselho de administração da A., SA, e o seu irmão J. é vogal do conselho de administração (f ls. 191).
Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal julga não provado:
1 – A falta de pagamento das dívidas revertidas não é imputável ao oponente.
3.1.1 – Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, conjugados com as regras da experiência.
Aqui releva ainda o facto de, no essencial, o oponente não ter impugnado a matéria de facto julgada provada, tendo-a até aceite conforme resulta da petição inicial.
A matéria de facto julgada provada resultou da insuficiência da prova e da prova do contrário.
Vejamos.
Desde logo, cumpre esclarecer a redação da matéria de facto julgada não provada.
O oponente alegou uma série de circunstancialismos económicos e financeiros – designadamente, a crise económica que o setor de atividade da executada originária atravessou, a diminuição de clientes, as exigências feitas pela administração tributária para cobrara as dívidas fiscais e tributárias pendentes, os encargos financeiros suportados para pagar essas dívidas, a realização de hipotecas para obter meios financeiros para pagar essas dívidas – para justificar a ausência de culpa sua pela falta de pagamento das dívidas revertidas.
Uma vez que o despacho de reversão está fundamentado no art. 24.º, n.º 1, alínea a), da LGT, o facto essencial que o oponente tem de alegar e provar é que a falta de pagamento da dívida revertida não lhe é imputável, facto alegado na segunda parte do artigo 79 da petição inicial.
Os restantes factos alegados pelo oponente são factos instrumentais desse facto essencial porquanto destinavam-se a revelar a ausência de culpa sua. Por isso, o Tribunal relevou-os juntamente com o depoimento das testemunhas e da prova documental, na valoração da prova do facto essencial julgado não provado.
Cumpre agora explicar a motivação da matéria de facto julgada não provada.
Como se disse, competia ao oponente alegar e provar factos que revelassem que não lhe era imputável a falta de pagamento das dívidas revertidas recaindo sobre si o ónus da prova (arts. 24.º, n.º 1, alínea b), e 74.º, n.º 1, da LGT).
Para prova dos factos alegados o oponente juntou documentos e arrolou testemunhas.
A prova documental comprova a realização de pagamentos.
A testemunha J., irmão e sócio da testemunha, tem por essa razão um interesse ainda que indireto nesta oposição. Esta testemunha declarou que antes da insolvência não houve atrasos nos pagamentos aos trabalhadores e não há créditos por salários e que o estabelecimento da executada originária foi vendido pro €172.000,00, com anuência dos trabalhadores. Como causa da insolvência e da falta de pagamento das dívidas esta testemunha referiu o valor elevado das dívidas fiscais e tributárias que a administração tributária estava a exigir o pagamento conjugado com a crise do setor. Como o Serviço de Finanças lhes disse que em 2010 tinham de pagar as dívidas, porque não era possível o pagamento em prestações, decidiram apresentar a executada originária à insolvência porque não conseguiram obter financiamento para pagar as dívidas. Além disso, há 120 anos que não distribuíam dividendos da executada originária para tentar fazer face aos pagamentos.
Embora não coincida com a prova documental, porque existem outros mas poucos credores, a testemunha declarou que só havia dívidas fiscais, que não havia dívidas a trabalhadores, a fornecedores e a bancos.
Do depoimento de A. seu fornecedor resulta que a executada originária sempre foi uma empresa cumpridora e que não sabe porque motivo foi declarada insolvente, nem se tinha dívidas. O oponente dizia-lhe que fazia entregas mensais de impostos, mas não tem conhecimento direto desse facto. Sabe que este setor de atividade passou por uma crise mas não sabe se a executada originária teve uma redução drástica de clientes.
Analisando conjugadamente toda a prova produzida, o Tribunal ficou convencido que o oponente não demonstrou que a falta de pagamento das dívidas revertidas não lhe é imputável.
Desde logo, resulta do depoimento das testemunhas que a executada originária era cumpridora das suas obrigações e que pagava aos seus trabalhadores e fornecedores e que não tinha dívidas para além das dívidas fiscais. Este facto conjugado com a petição inicial da insolvência em que são identificados como únicos dois credores a Autoridade Tributária e Aduaneira e o Instituto da Segurança Social, IP (fls. 225 a 232), revelam que a executada originária tinha capacidade e meios financeiros para fazer face às suas obrigações tendo optado por cumprir umas obrigações – as dos trabalhadores e fornecedores – em detrimento de outras – das obrigações fiscais e com a Segurança Social.
Apesar de na relação de créditos reconhecidos existirem outros credores, para além dos trabalhadores por créditos de indemnizações laborais, e não de salários, do depoimento das testemunhas resultou que a executada originária cumpria as suas obrigações com os seus fornecedores e prestadores de serviços, o que revela o cumprimento de obrigações económicas e financeiras.
Além disso, não podemos olvidar que as dívidas revertidas reportam-se aos anos de 2007 e 2008, tendo a data limite de pagamento voluntário das dívidas situado entre 20/06/2007 e 20/08/2008 e que a executada originária apresentou-se à insolvência no final do ano de 2009, tendo-se mantido em laboração até aí o que revela que tinha meios financeiros para satisfazer as dívidas exequendas. Acresce que as dívidas em causa são dívidas de retenção na fonte de IRS que é rendimento dos próprios trabalhadores e que tendo sido pagos os respetivos ordenados, como salienta o próprio oponente e a testemunha J., então tinha a obrigação de entregar os montantes em dívida correspondentes à retenção da fonte do IRS dos ordenados pagos.
A alegada exigência da administração tributária para pagamento das dívidas tributárias e fiscais também não é motivo para o não pagamento das dívidas revertidas porquanto respeitam a obrigações assumidas e não cumpridas atempadamente pela executada originária. Caso contrário não havia acumulação de dívidas fiscais.
E não se diga que foi este facto conjugado com a crise económica do setor e com a diminuição de clientes que fez com que a executada originária não tivesse possibilidade de pagar as dívidas, porque resulta dos autos que o estabelecimento comercial da executada originária foi vendido a uma sociedade comercial administrada pelo oponente e pelo irmão, continuando a sua atividade comercial e industrial com as mesmas pessoas e instalações, o que evidencia que a executada originária não tinha viabilidade económica e capacidade económica e financeira para prosseguir a sua atividade comercial e industrial normal e satisfazer as suas obrigações, pois caso contrário o oponente e o irmão não entrariam na administração de uma sociedade comercial – a A. – votada para o insucesso.
Mesmo a constituição de hipoteca em 2002 não é bastante para justificar o esforço da executada originária no pagamento das dívidas. A hipoteca revela que destinou -se a garantir financiamento da executada originária, mas não revela que destinou-se a pagar as dívidas revertidas ou dívidas fiscais. Mas independentemente disso, a executada originária manteve a sua atividade comercial normal e se pagava a trabalhadores e fornecedores é porque tinha meios financeiros para manter a sua atividade e se optou por não pagar as dívidas fiscais e à Segurança Social é uma opção sua imputável à sua administração.
O esforço financeiro para pagar as suas obrigações tinha de ser repartido por todos os credores e não só por alguns, não sendo a crise, nem a alegada diminuição drástica de clientes que impediria o pagamento das dívidas revertidas, tanto mais que não tendo a alegada crise e diminuição drástica de clientes impedido que o oponente e o irmão encabeçassem um projecto comercial e industrial exatamente idêntico ao da executada originária, com as mesmas instalações e funcionários, mas com outra pessoa coletiva, é porque a atividade era rentável e a alegada crise não impedia o desenvolvimento da sua atividade comercial.
Por tudo isto, o Tribunal ficou convencido que a executada originária tinha capacidade e meios económicos e financeiros para pagar as dívidas revertidas e que se não o fez foi por uma opção da sua gerência que era exercida pelo oponente e pelo irmão J..
Face à prova produzida no processo, o Tribunal ficou convencido que a falta de pagamento das dívidas revertidas é imputável ao oponente e ao irmão, motivo pelo qual julgou não provada essa matéria de facto alegada pelo oponente.
A restante matéria de facto alegada não foi julgada provada ou não provada, por revelar–se inútil ou irrelevante para a decisão da causa ou por constituir alegação de factos conclusivos ou matéria de direito, designadamente a questão dos créditos laborais suscitada pelo oponente, porquanto é irrelevante para a decisão da causa conforme melhor resultará da fundamentação de direito. Sem prejuízo, diga-se que o oponente não tem razão porquanto os créditos laborais por indemnizações embora sob condição constavam da lista de créditos reconhecidos e graduados.”

2. O Direito

Foi suscitado erro de julgamento quanto à decisão da matéria de facto, por entender o Recorrente que não foram atendidos nem levados ao probatório factos que seriam de extrair de documentos, que se mostram relevantes para a decisão da causa.
O Recorrente afirma que os factos indicados nos pontos I, II e III das conclusões das alegações do recurso são absolutamente essenciais à boa decisão da causa e à justa composição do litigio, pelo que devem os mesmos ser aditados à matéria de facto provada e que o tribunal recorrido nem sequer tomou posição sobre os mesmos.
Porém, tal não é verdade, dado que na motivação da decisão da matéria de facto o tribunal “a quo” esclareceu o seguinte:
“A restante matéria de facto alegada não foi julgada provada ou não provada, por revelar-se inútil ou irrelevante para a decisão da causa ou por constituir alegação de factos conclusivos ou matéria de direito, designadamente a questão dos créditos laborais suscitada pelo oponente, porquanto é irrelevante para a decisão da causa conforme melhor resultará da fundamentação de direito. Sem prejuízo, diga-se que o oponente não tem razão porquanto os créditos laborais por indemnizações embora sob condição constavam da lista de créditos reconhecidos e graduados”.
Na verdade, o tribunal recorrido ponderou toda a matéria de facto alegada e seleccionou a factualidade que considerou relevante para a decisão da causa, certamente tendo em vista as várias soluções plausíveis de direito. Contudo, poderá ter errado no seu julgamento quanto à selecção efectuada.
Mas, como veremos no âmbito do conhecimento do presente recurso, a matéria invocada nas primeiras conclusões das alegações afigura-se-nos irrelevante, não sendo essencial para a decisão do recurso nem para o julgamento da causa.
Pelo exposto, deverá, então, considerar-se a decisão da matéria de facto estabilizada.

As questões que foram decididas no tribunal recorrido e sobre as quais cumpre apreciar se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento são a ilegalidade do despacho de reversão, por falta de verificação dos seus pressupostos, e a ilegitimidade do Recorrente, uma vez que a invocada ilegalidade do despacho de reversão, por falta de fundamentação, já está decidida nos autos por via do Acórdão deste TCA Norte ínsito nos mesmos.
Alega, ainda, o Recorrente, na sua última conclusão das alegações do recurso, que, atenta a prova produzida nos autos, deveria a execução ter sido sustada logo após a declaração da insolvência da primitiva executada, não podendo esta reverter contra o Oponente enquanto esta se encontrar sustada.
A sentença recorrida motivou a improcedência desta questão da seguinte forma: “(…) A reversão também não é ilegal por ser extemporânea. Na verdade, o art. 23.º, n.ºs 2, 3 e 7, da LGT, permitem que a reversão seja realizada contra os executados revertidos ainda antes da verificação da falta de pagamento da dívida exequenda pelo devedor principal e quando esteja pendente processo de insolvência quanto a si. (…)”
O Recorrente não se conforma com este julgamento, alertando para o facto de estarem em causa dívidas de IRS, relativas aos exercícios de 2007 e 2008; sendo que a devedora originária foi declarada insolvente em 08/01/2010, não tendo ainda o respectivo processo sido encerrado; resultando que o processo de execução fiscal foi instaurado em 2009, tendo o Recorrente sido citado, na qualidade de responsável subsidiário, em 13/05/2011. Neste enquadramento, o Recorrente conclui que, sendo a dívida anterior à declaração de insolvência da primitiva executada, deveria a execução ser sustada logo após a sua instauração, não podendo, por via disso, a execução reverter contra o Oponente.
A este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da verificação dos pressupostos para a reversão decretada no âmbito do processo de execução fiscal descrito nos autos.
Efectivamente, está em causa saber se, estando pendente o processo de insolvência da principal devedora, podia a execução reverter contra o responsável subsidiário, ou se deveria antes ter sido imediatamente sustada e avocada pelo Tribunal Judicial onde corria termos a insolvência, com devolução somente após findar o processo de insolvência e prosseguir apenas se a insolvente ou os responsáveis subsidiários viessem a adquirir bens.
O artigo 23.º da Lei Geral Tributária (LGT) estabelece no n.º 1 que «a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal», dispondo no n.º 2 que «a reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão»; e o n.º 3 prescreve que «caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei».
Por sua vez, o n.º 2 do artigo 153.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) preceitua que «o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores;
b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido».
Estas normas estabelecem os pressupostos da reversão e o momento em que ela deve ocorrer, tendo por ponto de partida a salvaguarda do benefício da excussão. Ora, perante o carácter subsidiário da responsabilidade tributária (n.º 3 do artigo 22.º da LGT) e a natureza do benefício da excussão, decorre que a execução fiscal só pode reverter contra o responsável subsidiário depois de excutidos os bens do devedor originário, isto é, desde que se verifique a ocorrência desse pressuposto no momento em que se pretende chamar o responsável subsidiário ao pagamento das dívidas exequendas.
Daqui resulta, por um lado, que o órgão de execução fiscal está obrigado a exigir a prestação tributária em primeiro lugar ao devedor originário ou aos eventuais responsáveis solidários, satisfazendo o crédito somente à custa dos seus bens, e apenas pode exigi-la do devedor subsidiário no caso de se vir a evidenciar a inexistência ou insuficiência de bens daqueles; e, por outro lado, que o devedor subsidiário pode recusar o cumprimento da dívida tributária enquanto não tiver sido excutido o património daqueles devedores. O que significa que, ainda que não existissem bens à data da constituição ou do vencimento das dívidas exequendas ou à data em que o responsável subsidiário exerceu o cargo de gerente, sempre estará inviabilizada a reversão caso se detecte que a sociedade os adquiriu e possui, em termos de suficiência para pagamento dessas dívidas, à data em que se pretenda chamar à execução os respectivos gerentes através do instituto da reversão.
Por outras palavras, só no caso de o devedor principal não ter mais bens, pode o órgão de execução fiscal fazer reverter a execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, por nada mais haver a excutir, razão por que esse órgão está vinculado a fazer uma investigação sobre a existência de bens no património do devedor originário no momento em que pretende reverter a execução contra aqueles.
Como é pacífico na jurisprudência, a inexistência ou a insuficiência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se, portanto, ao momento em que a reversão ocorre e não ao momento em que o administrador ou gerente/responsável subsidiário exerceu esse cargo societário – cfr. Acórdão do STA, de 16/03/2016, tirado no processo n.º 0647/15.
Saliente-se que nem sequer se mostra necessário que a devedora originária não possua bens, mas tão-só que os mesmos sejam insuficientes para pagamento da quantia exequente (Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 19/01/2006, 2ª Secção – Contencioso Tributário, “Em face do preceituado no art. 23º nºs 1 e 2 da LGT não é necessária a prévia excussão do património do devedor originário para que seja possível a reversão, sendo bastante que se verifique a fundada insuficiência desse património, resultante do auto de penhora ou de outros elementos de que o órgão de execução fiscal disponha.” - Processo n.º 00032/05.2BEPNF).
Assim sendo, face ao vertido no artigo 23.º da Lei Geral Tributária, verifica-se que a actuação da Administração Fiscal não merece censura, pois no âmbito do procedimento de reversão chegou ao seu conhecimento a declaração de insolvência da sociedade devedora principal.
Importa, ainda, referir que serve de base ao presente processo de execução fiscal dívidas respeitantes a retenções na fonte de IRS, cujo pagamento não foi satisfeito no prazo de cobrança voluntária que terminou em 20/06/2007 sucessivamente (mensalmente) até 20/01/2009, respectivamente – cfr. ponto A da decisão da matéria de facto e documentos anexos à sentença recorrida, que da mesma fazem parte integrante.
Dispõe o artigo 180.º do CPPT, sob a epígrafe “Efeito do processo de recuperação da empresa e de falência na execução fiscal”:
«1 - Proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser instaurados contra a mesma empresa, logo após a sua instauração.
2 - O tribunal judicial competente avocará os processos de execução fiscal pendentes, os quais serão apensados ao processo de recuperação ou ao processo de falência, onde o Ministério Público reclamará o pagamento dos respectivos créditos pelos meios aí previstos, se não estiver constituído mandatário especial.
3 - Os processos de execução fiscal, antes de remetidos ao tribunal judicial, serão contados, fazendo-se neles o cálculo dos juros de mora devidos.
4 - Os processos de execução fiscal avocados serão devolvidos no prazo de 8 dias, quando cesse o processo de recuperação ou logo que finde o de falência.
5 - Se a empresa, o falido ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens em qualquer altura, o processo de execução fiscal prossegue para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição.
6 - O disposto neste artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção.»
Também o CIRE no artigo 88.º dispunha que (na redacção aqui aplicável):
«1 - A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.
2 - Tratando-se de execuções que prossigam contra outros executados e não hajam de ser apensadas ao processo nos termos do n.º 2 do artigo 85.º, é apenas extraído, e remetido para apensação, traslado do processado relativo ao insolvente. (…)».
A Secção de Contencioso Tributário do STA já por diversas vezes afirmou, assumindo uma posição jurisprudencial que se encontra actualmente consolidada, ser legalmente viável a instauração de processo de execução fiscal contra a sociedade devedora após a declaração judicial da sua insolvência, pese embora as execuções fiscais instauradas para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência devam ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência, e as instauradas para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência devam prosseguir com a penhora de bens não apreendidos no processo de insolvência – cfr., entre outros, o acórdão do STA, de 27/05/2015, no âmbito do processo n.º 424/14.
Não oferece dúvidas que, no caso dos autos, o processo de execução fiscal respeita a dívida relativa a créditos vencidos (em 20/06/2007 até 20/01/2009) antes da declaração de insolvência da sociedade devedora originária (cfr. ponto C: 08/01/2010, sentença transitada em julgado em 01/03/2010).
Quanto à prossecução do processo de execução fiscal para cobrança de dívidas vencidas antes da declaração de insolvência, já tomou posição o tribunal superior, por acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 17/02/2016, no processo n.º 0122/15, segundo o qual é legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora, com a penhora de bens do revertido independentemente da data da sua aquisição, na medida em que só relativamente à entidade insolvente fica a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos, não fazendo sentido invocar a restrição do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT relativamente ao responsável subsidiário caso inexista declaração de insolvência quanto a si.
Nesta conformidade, improcede a última conclusão das alegações de recurso.

Importa, agora, entrar na questão da validade substancial dos fundamentos apontados no despacho de reversão, quanto ao pressuposto da reversão relativo à fundada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária para assegurar o pagamento da dívida, que a AT considerou verificar-se, apoiando-se, além do mais, na insolvência da sociedade executada, que já havia sido declarada no momento da prolação do despacho de reversão – 09/05/2011 – cfr. ponto B do probatório que remete para os documentos anexos à sentença e que, como referimos, fazem parte integrante da mesma.
A questão que cumpre apreciar e decidir é, assim, a de saber se pode ou não considerar-se verificada a fundada insuficiência de bens penhoráveis da sociedade originária devedora requerida pelo n.º 2 do artigo 23.º da Lei Geral Tributária (LGT) e pela alínea b) do n.º 2 do artigo 153.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), por forma a permitir decisão de chamamento do responsável subsidiário à execução fiscal, mediante reversão.
Esta problemática foi recentemente julgada pelo nosso mais alto tribunal, no âmbito do processo n.º 783/17 – cfr. o Acórdão do STA de 12/07/2018 – da seguinte forma:
«(…) O juízo de fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário para responder pela dívida exequenda, legalmente requerido para que seja proferido despacho de reversão, deve ter como base a recolha de elementos de facto que permitam concluir que o património do devedor originário susceptível de penhora não é bastante para garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido.
Nos casos em que foi declarada a insolvência do devedor originário, o conhecimento dessa declaração, por si só, preenche aquele requisito. Tanto assim é que o legislador – no n.º 7 do art. 23.º da LGT, aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2012) – veio impor que fosse efectuada a reversão contra os responsáveis subsidiários, desde que se verifiquem os demais requisitos, nas «situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis». Nessas situações, «é presumível a insuficiência do património do sujeito passivo devedor originário para o pagamento da totalidade das suas dívidas» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 23.º, pág. 223.).
Assim, não pode aceitar-se o argumento do Recorrente, de que a reversão foi ordenada sem que tivesse sido recolhida informação sobre a insuficiência patrimonial do originário devedor: o conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora – que pode resultar do pedido efectuado pelo tribunal por onde corre termos o processo de insolvência de remessa do processo de execução fiscal para avocação (cfr. art. 181.º, n.º 2, do CPPT) – é fundamento bastante para que o órgão da execução fiscal considere haver “fundada insuficiência” do património da sociedade originária devedora, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (cfr. art. 23.º, n.ºs 2 e 7, da LGT) (Neste sentido, o seguinte acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - de 8 de Novembro de 2017, proferido no processo n.º 420/17, …) (…).»
Como consta do probatório, o órgão de execução fiscal, aquando do despacho de reversão, tinha conhecimento da declaração de insolvência da sociedade devedora originária, fazendo, inclusivamente, referência na fundamentação do acto ao processo de insolvência n.º 1054/09.0TYVNG – 3.º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia e à sentença proferida no seu apenso B, sustentando, assim, a “fundada insuficiência” do seu património, pressuposto da reversão.
Nesta conformidade, a declaração de insolvência legitima a reversão, não a obstaculiza – cfr. o citado artigo 23.º, n.º 7 da LGT. E é por este motivo que os factos que se pretendiam aditar ao probatório são irrelevantes, designadamente, os relativos aos créditos laborais e a sua (diminuta) influência no juízo de “fundada insuficiência patrimonial”.
Todavia, a execução fiscal não prosseguirá contra o revertido enquanto não findar o processo de insolvência e se apurar se, e em que medida, os bens da sociedade originária devedora são insuficientes para o pagamento da dívida exequenda, assim se assegurando o benefício da excussão prévia (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, da LGT).
Sendo esta interpretação respeitadora dos princípios constitucionais da justiça, da legalidade e da proporcionalidade, improcedem, assim, todas as conclusões das alegações de recurso até à XIII.

Aqui chegados, constatamos ser pacífico ter o Recorrente exercido a gerência da sociedade originária, dado tudo indicar existir correspondência entre a gerência de direito e a gerência de facto e tal nunca ter sido questionado, nem delimitado temporalmente. Logo, tudo aponta para a aplicabilidade do disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT, conforme, aliás, consta da fundamentação do despacho de reversão.
O enquadramento jurídico ao abrigo do qual operou a reversão é fulcral, uma vez que a última questão colocada no presente recurso se prende com a invocação de inexistência de culpa por parte do Oponente – cfr. conclusões XIV e XV das alegações de recurso:
“XIV. Encontra-se demonstrado que o Oponente tudo fez para que a primitiva executada pagasse os impostos, tendo pago, desde 20/06/2007 até à data da declaração da insolvência, valores superiores a € 400.000,00 em juros, coimas e impostos;
XV. O Oponente não praticou qualquer facto ilícito ou culposo, donde a sua ilegitimidade para a execução que contra si reverteu”.
A execução fiscal a que se reporta a presente oposição destina-se à cobrança coerciva de dívidas provenientes de retenções na fonte de IRS, relativas aos anos de 2007 e 2008.
É sabido que o regime da responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador da responsabilidade (artigo 12.º do Código Civil), pelo que sendo as dívidas exequendas referentes aos anos de 2007 e 2008, dúvidas não restam que é de aplicar o regime previsto no artigo 24.º da LGT.
Este artigo 24.º, n.º 1 da LGT estabelece o seguinte:
1. Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (…)”.
Neste normativo está, assim, prevista a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes relativamente a dívidas cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento tenha terminado depois deste exercício [alínea a) supra] ou vencidas no período do seu mandato [alínea b)].
Como se escreveu no Acórdão deste TCAN de 10/10/2013, no âmbito do processo n.º 242/06.5BECBR: «Quanto às dívidas tributárias cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois desse exercício (mas em que o gerente ou administrador já não exercia funções à data em que a dívida foi posta à cobrança) o administrador ou gerente é responsável se tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para o seu pagamento. Neste caso, o ónus da prova da culpa recai, no entanto, sobre a Fazenda Pública.
Quanto às dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, o administrador ou gerente é responsável pelo seu pagamento, salvo se provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável. Neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária. Ora, “esta presunção, apesar de contrária à regra geral da responsabilidade extracontratual prevista no artigo 487.º do Código Civil (CC), compreende-se neste caso, pois se o gestor não tiver culpa pela falta de pagamento ou de entrega do imposto ocorrida no período em que exerceu funções, ser-lhe-á fácil prová-lo (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., II volume, anotação 32 ao art. 204º, pág. 356.). Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida” - assim, por todos, acórdão do TCAN de 29 de Outubro de 2009, Processo 228/07.2.»
Ora, da concatenação de todos os elementos dos autos, resulta que a responsabilidade do Recorrente se subsume ao disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT. O que significa que lhe cabe ilidir a presunção de culpa constante daquele normativo.
Feito o enquadramento jurídico, resultando a aplicabilidade à reversão do artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT, por o prazo legal de pagamento ou entrega das dívidas tributárias ter ocorrido no período do exercício do cargo de gerente pelo Oponente e ora Recorrente, é o gerente responsável pelo seu pagamento, salvo se provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável. Como já referimos, neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.
Tratando-se de dívidas enquadradas no âmbito dessa alínea b), impõe-se esclarecer que o facto ilícito susceptível de fazer incorrer o gestor em responsabilidade não se consubstancia apenas na falta de pagamento da obrigação tributária, mas também numa actuação conducente à insuficiência do património da sociedade, pois que, sendo o propósito da norma inverter o ónus da prova de que foi por acto culposo do gestor que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida, naturalmente que para provar que não lhe pode ser imputada a falta de pagamento deve exigir-se que se prove que não foi por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente.
Ora, incumbindo ao Oponente demonstrar que a falta de pagamento das dívidas tributárias vencidas durante a sua gerência não lhe pode ser imputada, porque a inexistência ou insuficiência de bens na empresa que geriu não é da sua responsabilidade, a verdade é que não alegou factos simples, concretos, de que assim foi, nem susceptíveis de prova capaz de ilidir tal presunção de culpa, dado que, de forma conclusiva, se limitou a invocar na petição inicial que só não pagou as dívidas fiscais por manifesta impossibilidade financeira da primitiva executada – cfr. artigo 83.º da oposição.
Antes, descreveu, na petição inicial, um cenário de sufoco e asfixia financeira, num circunstancialismo estrutural e conjuntural, relativo ao impacto do Mercado Único e à crise que se abateu sobre todo o mundo na segunda metade de 2008, sobre a sua actividade na área da indústria metalúrgica, que se especializou no fabrico de máquinas para as indústrias de preparação e transformação de carne, com uma diminuição drástica de clientes.
Na alínea b) do referido artigo 24.º, ao responsabilizar-se os gestores que «não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento», estabelece-se uma presunção legal de culpa, no pressuposto de que, tendo o prazo legal de pagamento terminado no período da sua gestão, não podem desconhecer a existência da dívida, e por conseguinte, ao colocarem a empresa numa situação de insuficiência patrimonial, indiciam uma conduta dolosa que é especialmente grave para os interesses do Estado Fiscal, e por isso, só lhes resta provar que não foi por culpa sua que a empresa caiu em tal situação.
O acto ilícito culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido. O que se presume é que o gestor não actuou com a diligência de um bonus pater familiae, com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial ao do artigo 64.º do Código das Sociedades Comerciais, que lhe impõe a observância de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios, que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade – cfr., entre muitos, o Acórdão deste TCAN, de 23/11/11, proferido no âmbito do processo n.º 00972/09.0 BEVIS.
Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, o Oponente não podia deixar de alegar e provar factos concretos de onde se possa inferir que a insuficiência patrimonial da empresa se deveu a circunstâncias que lhe são alheias e que não lhe podem ser imputadas. Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.
Realmente, o normativo que subjaz à nossa análise faz recair sobre o gestor o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária, pois tal imputabilidade presume-se. Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida.
Assim, demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora, recairá sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas colectivas ou entes fiscalmente equiparados «o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas» (artigo 32.º da LGT).
Vejamos o julgamento efectuado no tribunal recorrido a este propósito:
“(…) O oponente alegou diversas circunstâncias para demonstrar que não era responsável pela falta de pagamento dessas dívidas e que não lhe era imputável a falta de pagamento.
Porém, da matéria de facto julgada não provada e da respetiva motivação, cujo teor aqui se dá por reproduzido, resultou que o oponente não logrou demonstrar, como lhe competia, que a falta de pagamento das dívidas revertidas não lhe é imputável.
Pelo contrário, da prova produzida resultou até que a falta de pagamento das dívidas revertidas é imputável à sua gerência, porquanto da prova produzida o Tribunal ficou convencido que a executada originária não só tinha meios e capacidade económico financeira para pagar essas dívidas, como o seu não pagamento ficou a dever-se a uma opção de gestão da executada originária tomada pelo oponente e pelo seu irmão, enquanto seus gerentes. Só assim se compreende que a executada originária tenha mantido a sua atividade até apresentar-se à insolvência em finais de 2009 e até aí tenha pago aos seus trabalhadores e fornecedores e depois disso tenha sido vendido o seu estabelecimento a uma outra sociedade administrada pelo oponente e pelo irmão para continuar a atividade comercial e industrial da executada originária no mesmo estabelecimento e com os mesmos trabalhadores, o que evidencia que não havia crise económica que justificasse a dificuldade de pagamento das dívidas revertidas.
A existir tal crise e tais dificuldades económicas o oponente e o irmão não continuariam com a mesma atividade comercial e industrial da executada originária, nas mesmas instalações e com os mesmos funcionários.
O oponente é, por isso, responsável pelo pagamento das dívidas revertidas porquanto não demonstrou que não lhe é imputável a falta de pagamento dessas dívidas (art. 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT). (…)”
Conforme consta do probatório, relembramos, estão em causa dívidas de IRS - retenções na fonte, dos anos de 2007 e 2008.
Nos impostos retidos na fonte [bem como no caso especial do IVA] a falta da sua entrega ganha particular gravidade, na medida em que se trata de impostos que traduzem um fluxo monetário na empresa que, ao não serem entregues nos cofres do Estado, estão a ser «desviados» do seu destino legal único, em proveito de «objectivos» alheios à sua finalidade.
Efectivamente, as dívidas em causa são dívidas de retenção na fonte de IRS, que são rendimento dos próprios trabalhadores e que, tendo sido pagos os respectivos ordenados, então a devedora originária tinha a obrigação de entregar os montantes em dívida correspondentes à retenção na fonte do IRS dos salários pagos.
Não só da prova, mas da própria alegação do Recorrente, resulta que o Recorrente terá optado por dar prioridade ao pagamento aos fornecedores, aos trabalhadores e aos bancos, em detrimento da Administração Tributária [apesar de também ter efectuado, parcialmente, pagamentos fiscais].
O Recorrente deve ficar ciente que, se pretendia ilidir a presunção de culpa que sobre si impendia, não podia ficar-se por generalidades relativas ao contexto económico-financeiro global, tinha que demonstrar que não teve fundos para fazer face à totalidade das suas obrigações fiscais e que a inexistência/insuficiência de tal liquidez não lhe era imputável. Queremos com isto significar que, se orientou verbas para outros fins, como parece tê-lo realizado, em vez de assegurar os seus compromissos fiscais, jamais conseguirá provar a sua falta de culpa como gestor.
Desde logo, no artigo 59.º da petição de oposição, o Recorrente afirma ter pago obrigações fiscais, mas revela ter pago encargos financeiros aos bancos além de ter pago à Administração Tributária.
Desde 2005, pelas razões referidas, nomeadamente conexas com a crise e com o corte de apoio dos bancos, a primitiva executada viu-se a braços com acrescidas dificuldades e começou a atrasar o pagamento dos impostos – cfr. artigo 61.º da petição inicial.
Por outro lado, se na executada principal se verificou excesso de estrutura de mão-de-obra – cfr. artigo 51.º da petição inicial – a lógica determinaria, sem qualquer pretensão de ingerência na política decisória ou gestionária da empresa, que o gestor diligente direccionasse a sua administração para os recursos humanos, eventualmente reduzindo-os, e não atrasando o pagamento dos seus compromissos fiscais.
Toda a alegação do Recorrente demonstra preocupação social e com os seus trabalhadores, designadamente nos artigos 74.º e 77.º da petição de oposição:
“Nunca, ao longo da vida da sociedade, foram distribuídos quaisquer dividendos aos sócios, vivendo, assim, o Oponente, tal como os restantes trabalhadores, apenas do seu salário. (…)
Todas estas acções foram sempre feitas tendo em vista a responsabilidade social que o Oponente entendia pesar sobre si, dado que a quase totalidade dos trabalhadores da empresa com ele trabalham há décadas e eram adolescentes quando para ali foram dar o seu contributo.”
Compreendem-se as ilações retiradas pelo tribunal recorrido, pois, na verdade, existiam fundos; Pense-se nos salários dos trabalhadores e dos próprios gerentes, a que o despacho de reversão faz menção:
“Mais se informa que, apesar do “sufoco financeiro” da sociedade devedora originária relatado pelos responsáveis subsidiários em sede de audição prévia, os mesmos auferiram rendimentos pagos pela mesma, no montante de 70.000,00€ anuais referente ao ano de 2009 e 50.000,00€ anuais relativo ao ano de 2010, conforme constam dos prints infra (…).”
Assim, é forçoso recuperar aqui a convicção formada pelo Meritíssimo Juiz “a quo”:
“(…) O oponente alegou uma série de circunstancialismos económicos e financeiros – designadamente, a crise económica que o setor de atividade da executada originária atravessou, a diminuição de clientes, as exigências feitas pela administração tributária para cobrara as dívidas fiscais e tributárias pendentes, os encargos financeiros suportados para pagar essas dívidas, a realização de hipotecas para obter meios financeiros para pagar essas dívidas – para justificar a ausência de culpa sua pela falta de pagamento das dívidas revertidas. (…)
A prova documental comprova a realização de pagamentos. (…)
Analisando conjugadamente toda a prova produzida, o Tribunal ficou convencido que o oponente não demonstrou que a falta de pagamento das dívidas revertidas não lhe é imputável.
Desde logo, resulta do depoimento das testemunhas que a executada originária era cumpridora das suas obrigações e que pagava aos seus trabalhadores e fornecedores e que não tinha dívidas para além das dívidas fiscais. Este facto conjugado com a petição inicial da insolvência em que são identificados como únicos dois credores a Autoridade Tributária e Aduaneira e o Instituto da Segurança Social, IP (fls. 225 a 232), revelam que a executada originária tinha capacidade e meios financeiros para fazer face às suas obrigações tendo optado por cumprir umas obrigações – as dos trabalhadores e fornecedores – em detrimento de outras – das obrigações fiscais e com a Segurança Social.
Apesar de na relação de créditos reconhecidos existirem outros credores, para além dos trabalhadores por créditos de indemnizações laborais, e não de salários, do depoimento das testemunhas resultou que a executada originária cumpria as suas obrigações com os seus fornecedores e prestadores de serviços, o que revela o cumprimento de obrigações económicas e financeiras. (…)
A alegada exigência da administração tributária para pagamento das dívidas tributárias e fiscais também não é motivo para o não pagamento das dívidas revertidas porquanto respeitam a obrigações assumidas e não cumpridas atempadamente pela executada originária. Caso contrário não havia acumulação de dívidas fiscais.
E não se diga que foi este facto conjugado com a crise económica do setor e com a diminuição de clientes que fez com que a executada originária não tivesse possibilidade de pagar as dívidas, porque resulta dos autos que o estabelecimento comercial da executada originária foi vendido a uma sociedade comercial administrada pelo oponente e pelo irmão, continuando a sua atividade comercial e industrial com as mesmas pessoas e instalações, o que evidencia que a executada originária não tinha viabilidade económica e capacidade económica e financeira para prosseguir a sua atividade comercial e industrial normal e satisfazer as suas obrigações, pois caso contrário o oponente e o irmão não entrariam na administração de uma sociedade comercial – a A. – votada para o insucesso.
Mesmo a constituição de hipoteca em 2002 não é bastante para justificar o esforço da executada originária no pagamento das dívidas. A hipoteca revela que destinou-se a garantir financiamento da executada originária, mas não revela que destinou-se a pagar as dívidas revertidas ou dívidas fiscais. Mas independentemente disso, a executada originária manteve a sua atividade comercial normal e se pagava a trabalhadores e fornecedores é porque tinha meios financeiros para manter a sua atividade e se optou por não pagar as dívidas fiscais e à Segurança Social é uma opção sua imputável à sua administração.
O esforço financeiro para pagar as suas obrigações tinha de ser repartido por todos os credores e não só por alguns, não sendo a crise, nem a alegada diminuição drástica de clientes que impediria o pagamento das dívidas revertidas, tanto mais que não tendo a alegada crise e diminuição drástica de clientes impedido que o oponente e o irmão encabeçassem um projecto comercial e industrial exatamente idêntico ao da executada originária, com as mesmas instalações e funcionários, mas com outra pessoa coletiva, é porque a atividade era rentável e a alegada crise não impedia o desenvolvimento da sua atividade comercial.
Por tudo isto, o Tribunal ficou convencido que a executada originária tinha capacidade e meios económicos e financeiros para pagar as dívidas revertidas e que se não o fez foi por uma opção da sua gerência que era exercida pelo oponente e pelo irmão J..
Face à prova produzida no processo, o Tribunal ficou convencido que a falta de pagamento das dívidas revertidas é imputável ao oponente e ao irmão (…).”
Grande parte da matéria de facto invocada na petição de oposição apresenta-se manifestamente vaga e insuficiente – elevadas dificuldades económicas e financeiras, falta de clientes, corte de apoio dos bancos e outros motivos exógenos. Nada sendo alegado em concreto, muito menos que nos permita concluir no sentido de que o Oponente não tenha culpa pela falta de entrega ao Estado de IRS - retenções na fonte.
Para tanto, sempre haveria que provar-se factualidade que permitisse a conclusão de que a sociedade não tinha os fundos necessários à entrega do imposto e que a Oponente nenhuma responsabilidade tinha nessa situação. O que não ocorreu.
Concluímos, pois, que não há nos autos alegação alguma no sentido de que a falta de pagamento das dívidas ora em cobrança coerciva não seja imputável ao Oponente.
Neste domínio, cabe ter presente que a culpa traduz-se na falta do cumprimento diligente das obrigações a que o ora Recorrente estava adstrito por força das suas funções de gerente da devedora originária, além de que se os bens da devedora originária são entretanto insuficientes para o pagamento das respectivas dívidas é porque o seu património foi dissipado em prejuízo dos credores.
Sendo assim, como é, estando demonstrado que a situação de insuficiência patrimonial foi antecedida do incumprimento de obrigação em relação ao fisco, afirma-se o apontado nexo de causalidade entre a actuação negligente do gerente e a insuficiência do património social, de modo que se impõe concluir estar demonstrada a culpa do ora Recorrente na insuficiência do património da executada originária para a satisfação das dívidas tributárias revertidas, sendo que, por outro lado, na presente oposição, o Oponente não conseguiu pôr em causa tal presunção, pelo que improcede a alegação da ilegitimidade do Recorrente para a execução fiscal.
Nada se demonstrando no sentido de afastar a culpa do Oponente pela não entrega dos impostos, deve ele responder pelas dívidas ao abrigo da alínea b) do artigo 24.º, n.º 1, da LGT.
Pelo exposto, urge negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida na ordem jurídica.

Conclusões/Sumário

I - A inexistência ou insuficiência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se ao momento em que a reversão ocorre e não ao momento em que o administrador ou gerente/responsável subsidiário exerceu esse cargo societário.
II - É legalmente viável a instauração de processo de execução fiscal contra a sociedade devedora após a declaração judicial da sua insolvência, pese embora as execuções fiscais instauradas para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência devam ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência, e as instauradas para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvência devam prosseguir com a penhora de bens não apreendidos no processo de insolvência.
III - É legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora, com a penhora de bens do património do revertido independentemente da data da sua aquisição, na medida em que só relativamente à entidade insolvente fica a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos, não fazendo sentido invocar a restrição do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT relativamente ao responsável subsidiário caso inexista declaração de insolvência quanto a si.
IV - No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).
V - Assim, sendo as dívidas provenientes de IRS – retenções na fonte, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.
VI - Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
VII - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores, pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.
VIII - O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que o órgão da execução fiscal considere haver “fundada insuficiência” do património da sociedade originária devedora, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 7, da LGT).
IX - A execução fiscal não prosseguirá contra o revertido enquanto não findar o processo de insolvência e se apurar se, e em que medida, os bens da sociedade originária devedora são insuficientes para o pagamento da dívida exequenda, assim se assegurando o benefício da excussão prévia (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, da LGT).

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo do Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Porto, 05 de Março de 2020

Ana Patrocínio
Cristina Travassos Bento
Paulo Ferreira de Magalhães