Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00215/14.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2014
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONTENCIOSO ELEITORAL
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
ARTIGO 27.º, N.º 1, AL.I) DO CPTA
Sumário:I. Do despacho do relator que, no âmbito de uma ação de contencioso eleitoral, decidiu nos termos do artigo 27.º, n.º1, alínea i) do CPTA, cabe reclamação para a conferência, no prazo de 10 dias e não diretamente recurso jurisdicional.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:JGSRSC e Outro(s)...
Recorrido 1:CAOV...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso Eleitoral (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL NORTE:
I.RELATÓRIO
JGSRSC..., contribuinte nº..., residente em Avanca; DAGC..., contribuinte nº..., residente em Estarreja; PRSGRC..., contribuinte nº..., residente em Estarreja; RJLF..., contribuinte nº..., residente em Estarreja; LMSM..., contribuinte nº..., residente em Estarreja; LMAA..., contribuinte nº..., residente em Estarreja; JAMP..., contribuinte nº..., residente em Pardilhó e RJOPS..., contribuinte nº..., residente em Estarreja, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Aveiro, datada de 09 de abril de 2014, que julgou improcedente a ação de CONTENCIOSO ELEITORAL contra CAOV..., contribuinte n.º..., residente em Avanca, na qual pediram a declaração de ilegalidade da eleição do R. como presidente da mesa da Assembleia Municipal de Estarreja, por violação do disposto no artigo 45.º, n.º4 da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na redação dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de janeiro.
**
Os ora Recorrentes, alegaram e formularam conclusões de recurso, tudo nos termos que constam de fls.230 a 248 dos autos (paginação referente ao processo em suporte físico).
**
O Recorrido, devidamente notificado, apresentou contra-alegação, na qual requereu a ampliação do objeto do recurso e formulou conclusões, tudo nos termos que constam de fls. 259 a 269 dos autos (paginação referente ao processo em suporte físico).
**
Os Recorrentes, quanto à matéria de ampliação do objeto do recurso, apresentaram a resposta de fls. 280 a 302 dos autos.
**
O MINISTERIO PÚBLICO, notificado nos termos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA emitiu parecer sobre o mérito do recurso, de fls. 316 a 318, concluindo pela improcedência do recurso jurisdicional.
**
Cumprido o disposto no artigo 146.º, n.º2 do CPTA [notificação do parecer emitido pelo Ministério Público], os Recorrentes, pronunciaram-se nos termos que constam de fls. 323 a 326 dos autos.
**
Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no artº 36º, nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
*****
II. DA QUESTÃO PRÉVIA DO NÃO CONHECIMENTO DO OBJETO DO RECURSO.
(1) Por despacho de 08/05/2014, inserto a fls. 254 dos autos, a senhora juiz a quo, admitiu a interposição de recurso jurisdicional apresentado pelos ora Recorrentes, da decisão por si proferida no âmbito da ação de contencioso eleitoral, cujo valor foi fixado em €30.000,01 [cfr. fls. 211 da sentença]
(2) Prima facie, importa assinalar que a decisão judicial que admite a interposição de recurso jurisdicional e lhe fixa os respetivos efeitos, tem natureza provisória, e, pese embora vincule o juiz que a proferiu, que fica, em consequência da mesma, impedido de proceder à sua alteração, não constitui caso julgado formal em relação ao tribunal ad quem, que tem a faculdade de rever a decisão, o que bem se compreende, uma vez que é ao juiz relator do tribunal de recurso que compete aferir, oficiosamente, da verificação dos pressupostos legais da regularidade e legalidade da instância de recurso jurisdicional, podendo proferir decisão que implique o não conhecimento do objeto do recurso ou, conhecendo-o, que determine a correção da qualificação que lhe foi dada, o momento de subida e o efeito atribuído – cfr. artigos 685.º-C, n.ºs 1 e 5, 700.º, n.º1, al.b), 702.º a 704.º todos do CPC/2013 ex vi arts. 1.º e 140.º do CPTA, e ainda art.º 27.º do CPTA.
(3) Posto isto, segundo o disposto no artigo 40.º, n.º 3 do ETAF nas “ …ações administrativas especiais de valor superior à alçada, o tribunal funciona em formação de três juízes, à qual compete o julgamento da matéria de facto e de direito”.
(4) Por seu turno, prevê-se na al. i) do n.º1 do artigo 27.º do CPTA que compete “… ao relator sem prejuízo dos demais poderes que lhe são conferidos neste Código:…Proferir decisão quando entenda que a questão a decidir é simples, designadamente por já ter sido judicialmente apreciada de modo uniforme e reiterado, ou que a pretensão é manifestamente infundada…”, determinando-se ainda no n.º2 do mesmo normativo que dos “…despachos do relator cabe reclamação para a conferência, com exceção dos de mero expediente, dos que recebam recursos de acórdãos do tribunal e dos proferidos no Tribunal Central Administrativo que não recebam recursos desse tribunal…”.
(5) Sobre a questão de saber se das decisões proferidas pelo juiz relator, ao abrigo da faculdade que lhe é reconhecida pela alínea i), do n.º1 do art.º 27.º do CPTA, no âmbito das ações administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, cabe reclamação para a conferência ou recurso jurisdicional, pronunciou-se o Pleno da 1.ª Secção do STA, no seu acórdão n.º 3/2012 de 05.06.2012 (processo n.º 0420/12), disponível in www.dgsi.pt, que firmou jurisprudência no sentido de que das «…decisões do juiz relator sobre o mérito da causa, proferidas sob a invocação dos poderes conferidos no artigo 27.º, n.º1, alínea i), do CPTA, cabe reclamação para a conferência, nos termos do n.º2, não recurso…»- neste sentido, vide ainda Acs. Do STA de 19.10.2010- proc. n.º 0542/10; de 30.05.2012- processo n.º 0543/12, também disponíveis in www.dgsi.pt .
(6) Na fundamentação do sobredito acórdão uniformizador de jurisprudência consignou-se, designadamente, que…o acórdão recorrido …concluiu no sentido de que o decidido apenas podia ser impugnado por via da reclamação para a conferência, nos termos do n.º 2 do preceito. O acórdão fundamento entendeu que, tratando-se de uma “sentença”, o meio próprio seria o recurso jurisdicional.5. Dir-se-á, desde já, que o acórdão recorrido é para confirmar nos seus precisos termos. De resto, ele próprio colhe o seu apoio num aresto deste tribunal (Acórdão STA de 19.10.10 proferido no recurso 542/10), que sintetiza a prática habitual em situações similares de decisões adoptadas pelo relator sob a invocação do referido preceito, donde resulta que se a decisão for “tomada pelo juiz relator, no quadro da invocação dos poderes conferidos pelo artigo 27.º, n.º 1, i), do CPTA” o meio próprio de reacção, nos termos do n.º 2, é a “reclamação para a conferência, salvo as excepções nele contempladas, nas quais não se enquadra a decisão sob recurso”, e não o recurso. E, como é óbvio, esta posição não viola qualquer preceito constitucional, designadamente os invocados pela recorrente, pois a reclamação para a conferência é uma forma como outra qualquer de reagir contra decisões desfavoráveis que não limita – antes acrescenta – as formas de reacção. Por outro lado, é irrelevante que em ambos os casos se lhe possa ter chamado “sentença” pois aquilo que foi emitido foi sempre e só a “decisão” a que alude a referida alínea i), alínea que foi invocada, desde o início, como fundamento para decidir por juiz singular aquilo que estava previsto na lei, como regra geral (art. 40º, n.º 3, do ETAF), para ser adoptado por tribunal colectivo. É, pois, a invocação desse preceito que captura definitivamente a regra contida no n.º 2. Das decisões proferidas por juiz singular que, nos termos da lei, devam ser apreciadas por tribunal colectivo, há sempre, e apenas, reclamação para a conferência. Nunca recurso. Acresce, ainda, que não é o nome dado aos actos pelos participantes processuais que altera a sua essência. Cada acto processual ou instituto jurídico é o que é em consequência do modo como a lei os caracteriza, das suas qualidades próprias, e não por virtude do nome que lhes atribuímos. Se assim não fosse, e seguindo a perspectiva da recorrente, qualquer despacho de um relator deixaria de o ser se lhe chamasse sentença, ficando sujeito a recurso jurisdicional e não à reclamação para a conferência que o legislador desenhou para essa situação.(…)».
(7) Tendo em conta que na situação sub judice, a decisão judicial recorrida foi proferida por juiz singular no âmbito de ação administrativa de contencioso eleitoral, de valor correspondente a €30.000,01, a cuja tramitação, no que não estiver especialmente regulado nos artigos 97.º a 99.º do CPTA, se aplica o regime legal estabelecido para a ação administrativa especial [vide artigo 99.º, n.º1 do CPTA], o seu julgamento, nos termos do preceituado no artigo 40.º, n.º3 do ETAF, caberia a uma formação de três juízes.
(8) Partindo deste quadro de referência [na linha da citada jurisprudência], forçoso é concluir que da decisão proferida pelo tribunal a quo cabia reclamação para a conferência a quem competiria o julgamento da matéria de facto e de direito caso não tivesse sido usado o poder conferido pelo art. 27°, n.º 1 al. i), do CPTA.
(9) Sucede que, da decisão proferida, vieram os Recorrentes, em 28.04.2014, interpor recurso jurisdicional, quando deveriam ter apresentado reclamação para a conferência, no prazo geral de 10 dias, nos termos do n.º 1, do art.º 29° do CPTA.
(10) Em face do exposto, importará indagar da possibilidade de convolação do recurso em reclamação, o que apenas sucederá caso se verifiquem os pressupostos para o efeito, máxime, estar respeitado o prazo de 10 dias estabelecido no art.º 29° nº. 1 do CPTA.
(11) É que, datando a decisão proferida de 04 de março de 2014, a mesma é posterior à publicação do acórdão uniformizador do STA, na 1ª Série do D.R. de 19/9/2012, pelo que os Recorrentes não podiam ignorar a fixação da jurisprudência efetivada pelo STA, e daí que a convolação só possa operar-se caso se verifique não ter sido ultrapassado o prazo para a reclamação.
(12) Conforme se afirmou, em situação similar, no Acórdão do Pleno do STA, de 6 de março de 2007, recurso n.º 46051, e se reiterou, entre outros, no Acórdão do STA de 19.10.2010, processo n.º 0542/10, «a interposição de recurso desse despacho consubstancia opção por um meio processual inadequado, situação em que em vez do despacho de admissão do recurso se deveria ter ordenado que o processo seguisse a forma processual adequada, nos termos do art. 199.º, n.º 1, do CPC» (…). Claro que só haverá um efectivo prosseguimento da forma processual adequada se for possível, se estiverem preenchidos todos os seus pressupostos.
Assim, e atento o solicitado agora pelo interessado, devem baixar os autos ao respectivo tribunal, (…), que decidirá se estão preenchidos os pressupostos para a apreciação do requerimento, enquanto reclamação, e, no caso afirmativo, conhecerá do seu mérito».
(13) Em conclusão, na situação sub júdice, os presentes autos devem baixar ao tribunal à quo, a fim de aí se aferir da possibilidade ou não da convolação do presente recurso jurisdicional em reclamação para a conferência, para o que deve ter-se em conta, designadamente, o regime legal previsto no artigo 139.º do CPC/2013.
**
III. DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com a jurisprudência uniformizada constante do Acórdão n.º 3/2012 de 05.06.2012 (processo n.º 0420/12), do Pleno da 1.ª Secção do STA, não tomar conhecimento do recurso jurisdicional interposto pelos Recorrentes e determinar a remessa dos autos ao TAF de Aveiro a fim do mesmo aferir da verificação dos pressupostos da sua convolação em reclamação para a conferência, seguindo-se os legais termos do processo.
Não são devidas custas nesta instância.
Notifique e d.n.
****
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 131º nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º do CPTA).
****
Porto, 15 de julho de 2014
Ass.: Helena Ribeiro
Ass.: João Beato Sousa
Ass.: Maria do Céu Neves