Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00493/14.9BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/15/2015
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ana Paula Santos
Descritores:CUSTAS
ISENÇÃO
EECUPERAÇÃO EMPRESA
Sumário:I- A isenção de custas prescrita na al. u) do nº 1 do art. 4º do RCP para uma sociedade comercial em situação de insolvência não se destina exclusivamente à própria acção em que se opera a sua apresentação ou citação para a insolvência, mas a toda e qualquer acção em que a sociedade seja parte, desde que se verifiquem os pressupostos da situação de insolvência, com excepção das acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho;
II- A sentença que declara a insolvência de uma sociedade comercial faz cessar a situação de insolvência em que a mesma se encontrava, determinando a constituição de uma massa insolvente à qual já não é aplicável a isenção subjectiva constante da al. t) do nº 1 do art. 4º do RCP.
III- Não coincidindo o conceito de sociedade comercial em estado deinsolvência com o de massa insolvente de uma sociedade comercial já declarada insolvente, só à primeira se aplica a isençãodecustas prescrita no art. 4º, nº 1, al. u) do RCP, pelo que a ora Recorrente não goza da pretendida isençãode custas.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:S..., S.A.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO

S…, S.A., devidamente identificado nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, datado de30.09.2014, que indeferiu a requerida isenção de custas nos termos do artigo 4º, nº1, alínea u) do Regulamento das Custas Processuais

Peticionou ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel nos seguintes termos:«(…)informa que foi aprovado plano de insolvência que visa a recuperação da Reclamante, encontrando-se ainda em vigor(…)Nesta conformidade, a Reclamante encontra-se isenta de custas nos termos do disposto no artigo 4º , nº1, al. u), face à sua declaração de insolvência e posterior processo de recuperação de empresa

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:
a) Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, alínea u), do Regulamento das Custas Processuais, estão isentos de custasas sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho” (sublinhados nossos);

b) A ora Recorrente juntou aos autos a publicação da sentença de declaração de insolvência - cfr. fls. dos autos;

c) De facto, e como bem refere o despacho ora recorrido “após a declaração de insolvência, a massa insolvente, que sucede à sociedade em situação de insolvência, deixa de beneficiar da isenção de custas”;

d) Acontece que, a ora Recorrente não baseou a sua isenção de custas no facto de ter sido declarada insolvente, mas sim pela aprovação do plano de insolvência que visa a sua recuperação, juntando para o efeito o despacho de aprovação do mencionado plano - cfr. 3.° parágrafo do despacho ora reclamado e documento n.° 1;

e) Para efeitos da al. u), do n.° 1, do artigo 4.°, do Regulamento das Custas Processuais, encontra-se isento de custas tanto as sociedade que se encontram em situação de insolvência, como as sociedades que se encontram em processo de recuperação, nos termos da lei;

f) Ora, como é consabido o plano de insolvência tanto pode visar a liquidação como a recuperação;

g) Nos termos do artigo 192.°, n.° 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, “o plano que se destine a promover a recuperação do devedor designa-se plano de recuperação, devendo tal menção constar em todos os documentos e publicações respeitantes ao mesmo”;

h) A ora Recorrente juntou aos autos o despacho que aprovou o plano de recuperação, mencionado o despacho “Aprovação do Plano de Insolvência/Recuperação” - cfr. documento n.° 1;

i) Sendo o plano de recuperação aprovado um processo de recuperação, nos termos da lei, a ora Recorrente comprovou a sua isenção de custas, ao ter junto aos autos o mencionado despacho de aprovação do plano de recuperação, ao contrário do alegado no despacho ora recorrido;

j) Porém, o despacho ora recorrido entendeu que a ora Recorrente não se encontrava isenta de custas porque não comprovou o estado do processo falimentar;

k) De facto, a ora Recorrente apenas juntou o despacho de aprovação do plano de recuperação transitado em julgado, não tendo comprovado o estado do processo falimentar;

l) Mas seria necessária tal comprovação, após ter junto o despacho de homologação do plano de insolvência?

m) Decorre da lei que, com o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, o processo de insolvência encerra, nos termos da alínea b), do n.° 1 do artigo 230.°, do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas;

n) Para além disso, mesmo que não decorresse da lei o efeito automático do encerramento do processo de insolvência, como bem refere o douto despacho recorrido, com a declaração de insolvência, a massa insolvente, que sucede à sociedade em situação de insolvência, deixa de beneficiar da isenção de custas;

o) Face ao exposto, e uma vez que o plano de recuperação ainda não encerrou, a ora Recorrente encontra-se em processo de recuperação, beneficiando, deste modo, da isenção de custas, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 1, al. u), do Regulamento das Custas Processuais, ao contrário do alegado pelo despacho ora recorrido.

Termos em que deve ser dado inteiro provimento ao presente recurso e, consequentemente ser o despacho recorrido revogado, substituindo-se por outro que declare a isenção de custas da ora Recorrente, com as demais consequências legais.



A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.


O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do presente do recurso.


Dispensados os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, atenta a natureza urgente do presente processo, foi este submetido à Conferência para julgamento.





DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

A questão suscitada pela Recorrente e delimitada pela alegação de recurso e respectivas conclusões nos termos dos artigos 608º, 635ºnº s 3 e 4 todos do CPC“exvi” artigo 2º, alínea e) e art. 281º do CPPT consiste simplesmente em definir se a sua situação, como massa insolvente de uma sociedade comercial assim declarada por sentença transitada, a isenta ou não do pagamento de taxa de justiça na Reclamação de acto do órgão de execução fiscal nos termos no artigo 4º , nº1, al. u) do Regulamento das Custas Processuais .


FUNDAMENTOS

DE FACTO

A Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel não efectuou o julgamento da matéria de facto de modo destacado, o que bem se compreende em face do teor o despacho proferido.

Em todo o caso, do despacho recorrido, bem como dos elementos constantes dos autos, extraímos a seguinte factualidade pertinente à decisão:

1- S..., S.A.foi declarada insolvente por sentença de 28/11/2011, proferida no processo que correu termos sob o nº 555/11.4TYVNG no 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia (cf. informação nos termos do artigo 38º nº3 do CIRE ) a fls. 24 dos presentes autos.

2- Por decisão da Assembleia de credores nomeada nos autos de insolvência de pessoa colectiva nº 555/11.4TYVNG a correr termos no 1º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia em que é requerida a S..., S.Afoi aprovado Plano de Recuperação/Insolvência. ”(cf.fls. 101 dos presentes autos).

3- Em 26.05.2014 a Reclamante apresentou Reclamação nos termos do artigo 276º do CPPT no âmbito do Processo executivo a correr termos sob o nº 1899201301002708, no Serviço de Finanças de Valongo 1 (cfr. fls.2 dos presentes autos).

DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise do recurso jurisdicional “subjudice”, sendo que, a questão essencial suscitada pela recorrente resume-se, em suma, em saber se a Recorrente beneficia da isenção de custas prevista no artigo 4º, nº1 alínea u) do Regulamento de Custas Processuais uma vez que decretada a respectiva insolvência, foi aprovado pela Assembleia de Credores um Plano de Recuperação.
O tribunal a quo proferiu o despacho de indeferimento de isenção de custas, nos seguintes termos: «S... -, SA, reclamante nos presentes autos, notificada do conteúdo da sentença proferida, veio a fls.99 a 100 dos autos, expor e requerer o seguinte:

Na página 2 da sentença refere-se que “A reclamante invoca a isenção de custas nos termos do artigo 4.°, n.°1, alínea u), do Regulamento das Custas Processuais (RCP), todavia, e não obstante ter sido notificada para o efeito, não comprovou o direito a essa isenção...”.

Acontece que, na reclamação apresentada a reclamante não se limitou a invocar a isenção de custas nos termos do art.4.°, n.°1, alínea u), do RCP, tendo junto publicação da sentença de declaração de insolvência, bem como a lista de bens compreendidos no processo de insolvência, juntos com a reclamação sob os documentos n.°s 3 e 4, respetivamente.

Não obstante, informa que foi aprovado plano de insolvência que visa a recuperação da reclamante, encontrando-se este ainda em vigor, cf. doc.1, agora junto.

Nessa conformidade, a reclamante encontra-se isenta de custas nos termos do disposto no art.4°, n.°1, alínea u), face à sua declaração de insolvência e posterior processo de recuperação de empresa.

Notificada a Fazenda Pública do requerimento apresentado pela reclamante (fls.99 a 101), veio a fls.111 a 112 dizer, que, pese embora a reclamante pretenda ver reconhecido o direito à isenção de custas, face à sua declaração de insolvência e posterior processo de recuperação de empresa, nos termos do disposto na alínea u), do n.°1doart.4°, do RCP, o estado do processo de insolvência é determinante para aferir do efetivo direito à isenção subjetiva de custas.

Na sua opinião, ainda que a reclamante possa ter comprovado encontrar-se em processo de insolvência, através da junção à sua petição inicial do doc.3 — “informação -Publicidade de sentença (de insolvência)”, o mesmo data de 05.12.2011 e não cumpre a finalidade para que, posteriormente, foi expressamente notificada, pois, não comprova o estado desse processo falimentar, designadamente, a eventual existência de um plano de recuperação.

Pelo que, no entender da Fazenda Pública, a sentença, não enferma de qualquer vício ou erro suscetível de alteração, correção ou retificação, devendo manter-se inalterada na ordem jurídica.

A Digna Magistrada do Ministério Público no seu douto parecer a fls.114 a 115 dos autos pugna pela improcedência do requerido pela reclamante no seu requerimento de fls.99 a 100 dos autos.

Cumpre apreciar e decidir:

A reclamante pretenda ver reconhecido o direito à isenção de custas, face à sua declaração de insolvência e posterior processo de recuperação de empresa, nos termos do disposto na alínea u), do n.°1doart.4°, do RCP.

Sucede que, após a declaração de insolvência, a massa insolvente, que sucede à sociedade em situação de insolvência, deixa de beneficiar da isenção de custas.

Sendo o pressuposto essencial da isenção em causa, a verificação dos requisitos de apresentação à insolvência e não a sua prévia declaração.

Ou seja, são distintos os conceitos de sociedade em situação de insolvência e massa insolvente de sociedade já declarada insolvente, Só àquela se aplica a isenção de custas prevista no art.4°, n°1, alínea u), do RCP.

Ainda que a reclamante, ora requerente tivesse comprovado encontrar-se em processo de insolvência, através da junção à sua petição inicial do doc.3, o mesmo data de 05.12.2011 e não cumpre a finalidade para que, posteriormente foi expressamente notificada, pois, não comprova o estado do processo falimentar.

Pelo que, indefere-se a pretensão da reclamante.(…).

Importa, pois, saber a sentença recorrida errou o julgamento na aplicação do direito, como alega a Recorrente, violando o regime ínsito no artigo4º nº1 al. u) do Regulamento das Custas Processuais que dispõe que estão isentas de custas: “As sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei, salvo no que respeita às acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho.”.

A questão colocada impõe que se pondere sobre se essa isenção tem por objecto todas as acções em que é parte uma sociedade comercial quando se encontra em estado de insolvência declarada por sentença – com exclusão dos litígios laborais.

Antes do mais, e porque tal se nos afigura imprescindível à boa compreensão da questão controvertida, impõem-se alguns considerandos em torno do regime da insolvência e respectivas implicações para o devedor impossibilitado de cumprir as suas obrigações, o que faremos louvando-nos no douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de proferido em 06.11.2012 no processo 352/11.7TBPVZ.B.PI, que parcialmente transcrevemos: « (…)haverá que ponderar sobre o que seja essa situação de insolvência e em que momento ela cessa. Ora o que vem sendo mais debatido nos tribunais é precisamente o contrário daquela primeira hipótese, na sequência de várias decisões nos termos das quais se impôs à apresentante à insolvência a obrigação de pagamento de taxa de justiça, não se lhe reconhecendo a citada isenção, com fundamento em que esta vale precisamente para as demais acções em que a insolvente seja parte, e não para a própria insolvência.

Tal conclusão vem, no entanto, sendo afastada pela jurisprudência das Relações, citando-se, a título de exemplo, o seguinte Ac. do TRL (de 15/6/2011, proc nº 25489/10.2T2SNT-A.L1-1, in www.dgsi.pt) “1. Sendo a requerente da declaração de insolvência (devedora) uma sociedade comercial, aquando da apresentação do requerimento inicial não tem a mesma que proceder ao pagamento da taxa de justiça, atenta a isenção de custas prevista no art. 4, nº 1 al. t) do Regulamento das Custas Processuais, que se lhe aplica. 2. Da conjugação da citada al. t) e do nº 4 do art. 4 do RCP não se vê que tenha de resultar que a isenção, no seu âmbito objectivo, não se aplique aos processos de insolvência pois a redacção das normas é ampla e abrange de todo o tipo de processos, salvo aqueles expressamente ressalvados: litígios relativos ao direito do trabalho. 3. A letra da lei em nada aponta para a interpretação feita pelo tribunal de 1ºinstância, no sentido de que a isenção de custas prevista no art. 4º, nº1, al. t), do RCP, não tem aplicação no próprio processo de insolvência.”

Porém, como se referiu antes, a decisão em crise dispôs precisamente ao contrário daquela outra que foi objecto do acórdão que vem de se citar. Com efeito, entendeu a decisão recorrida que a isenção visa apenas as apresentações à insolvência.

Ora a primeira nota de desconformidade desta interpretação com o sentido do preceito legal advém, desde logo – e tal como alega a apelante – do facto de que a mesma deixaria sem sentido a excepção prescrita na norma para as acções laborais. Com efeito, se desta norma resultasse que a isenção de custas valia só para a apresentação à insolvência, qual o sentido de prever que essa mesma isenção se não verificará nos litígios laborais, como ali se faz? É que, a ser como se entende na decisão recorrida, não valia a pena excluir os litígios do foro laboral da isenção, pois eles já estariam excluídos, a par de qualquer outro tipo de processo, na medida em que a isenção só valia para a apresentação à própria insolvência.

Pelo seu lado, a decisão recorrida também apresenta um argumento do qual sobressai a inadequação da tese da apelante: se a sociedade declarada insolvente continuasse a beneficiar da isenção prescrita na al. t) do nº 1 do art. 4º do RCP, mesmo no âmbito do processo de insolvência, então não teria sentido a imputação da responsabilidade pelas custas do processo à massa insolvente, tal como consta do art. 304º do CIRE.

Será, eventualmente, entre estes dois extremos interpretativos do sistema legal, que se deve situar a solução adequada, já que, como vimos, nenhuma das hipóteses propostas merece acolhimento.

E isso implica que se analise criteriosamente o texto do preceito e se compreenda o seu fundamento.

Nos termos da norma, a isenção subjectiva é conferida a “sociedades civis ou comerciais, as cooperativas e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que estejam em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, nos termos da lei”.

No caso que nos importa, que é o de uma sociedade comercial, a isenção é conferida a uma tal entidade que esteja em situação de insolvência ou em processo de recuperação de empresa, tal como estes conceitos estão legalmente definidos. Esse é o significado da expressão “nos termos da lei”, aferida às expressões “em situação de insolvência” ou “em processo de recuperação de empresa”.

Cumpre, então, buscar nos termos da lei o que seja uma sociedade comercial em situação de insolvência, dispensando-se a análise do que seja uma sociedade em processo de recuperação de empresa, por esse não ser, desde logo no âmbito deste recurso, uma situação a que se possa subsumir a apelante.

Ora o art. 3º do CIRE define com precisão o que é uma situação de insolvência. Diz ele: “1 - É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.

2 - As pessoas colectivas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma directa ou indirecta, são também considerados insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao activo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis.

3 - Cessa o disposto no número anterior quando o activo seja superior ao passivo, avaliados em conformidade com as seguintes regras:

a) Consideram-se no activo e no passivo os elementos identificáveis, mesmo que não constantes do balanço, pelo seu justo valor;

b) Quando o devedor seja titular de uma empresa, a valorização baseia-se numa perspectivade continuidade ou de liquidação, consoante o que se afigure mais provável, mas em qualquer caso com exclusão da rubrica de trespasse;

c) Não se incluem no passivo dívidas que apenas hajam de ser pagas à custa de fundos distribuíveis ou do activo restante depois de satisfeitos ou acautelados os direitos dos demais credores do devedor.

4 - Equipara-se à situação de insolvência actual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação pelo devedor à insolvência.”

Verificada a situação de insolvência, seja por iniciativa do próprio devedor, seja por requerimento de um credor, a insolvência é declarada por sentença (art. 36º do CIRE). A partir daí a sociedade deixa de existir em situação de insolvência, constituindo-se todo o seu património numa massa patrimonial – a massa insolvente – destinada à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo (art. 46º, nº 1 do CIRE). Esse é, de resto, o objectivo da insolvência, tal como prescreve o art. 1º do CIRE: “O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores.”

Do exposto resulta que, declarada a insolvência, a sociedade que dessa medida foi objecto deixa de estar em “situação de insolvência”, passando a apresentar-se sob a forma de uma massa patrimonial destinada à satisfação dos credores daquela sociedade.

Esta massa insolvente, que sucede à sociedade em situação de insolvência, deixa de beneficiar da isenção de custas prescrita na al. t) do nº 1 do art. 4º do RCT, pois estaisenção visa, especifica e literalmente, a sociedade “em situação de insolvência”. Com efeito, a actual Massa Insolvente da D…, S.A., é diferente e lógica e cronologicamente sucessiva à D…, S.A. em situação de insolvência. Por isso não se subsume já àquela disposição legal.Esta conclusão, apoiada numa interpretação literal e sistemática das normas em questão, é também a que resulta da ponderação da sua teleologia. Conforme expressou o Ministério da Justiça, numa edição que designou por «Perguntas & Respostas» a propósito do RCT (acessível em www.mj.gov.pt/), o «artigo 4.º do RCP contém um conjunto de isenções, que se podem dividir em 4 categorias, consoante os objectivos da isenção em questão, que vão desde a defesa do interesse público, o exercício de funções públicas, a tutela do acesso ao direito, até razões de racionalidade e oportunidade processuais». A este último grupo, no qual se incluiria a previsão do nº 1-t), se reconduzem «isenções que assentam na natureza obrigatória ou simplificada do processo, em objectivos de racionalização processual ou em critérios de oportunidade processual».

Ora se pensarmos no dever imposto à sociedade em situação de insolvência de desencadear o respectivo processo (art. 18º, nºs 1 e 3 do CIRE), ou na sua necessidade de demandar ou inevitabilidade de ser demandada no contexto económico típico destas circunstâncias, compreendem-se os fundamentos e a teleologia da norma. Porém, tais razões deixam de persistir a partir do momento em que o estado de insolvência é declarado, pois em face deste as custas processuais passam a ser um, entre outros, dos custos que a massa insolvente deve garantir até ao limite da sua existência.

Daí, pois, que já esteja prevista a responsabilidade da massa insolvente pelas custas do próprio processo de insolvência, nos termos do art. 304º do CIRE, quando a insolvência seja declarada. E daí, também, em total coerência, que a isenção da sociedade em situação de insolvência cesse em todas as acções no âmbito das quais haja beneficiado da isenção, caso ocorra a desistência do pedido de insolvência ou quando este seja indeferido liminarmente ou por sentença, nos termos do nº 4 do art. 4º do RCP. Nestes casos, conclui-se a posteriori pela inexistência da situação de insolvência, pelo que não se justificava a isenção antes concedida.

De resto, também o texto desta norma evidencia a anterioridade dos casos de isenção em relação à declaração da insolvência.

Temos, em conclusão, que não coincidindo o conceito de sociedade comercial em estado de insolvência com o de massa insolvente de uma sociedade comercial já declarada insolvente (passe a tautologia), só à primeira se aplica a isenção de custas prescrita no art. 4º, nº 1, al. t) do RCP.( vide ainda o Ac. da Relação de Lisboa de 18.4.2013, proferido no Proc. 1398710.8).

Neste preciso sentido se pronunciou, mui recentemente o Tribunal Central Administrativo Norte,nos doutos Acórdãos de 15.05.2014, proferidos no Processos 567/13.3PNF e 627/13.0 BEPNF.

Por conseguinte, e na esteira do citado aresto, não beneficia a Massa insolvente da S...-, S.A da isenção de custas prescrita na al. u) do nº.1do arte. 4º do RCP, não obstante ter sido aprovado o plano de “recuperação da empresa compreendida na massa insolvente”(cf. artigo 1º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas)

Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.

Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.

SUMÁRIO

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I- A isenção de custas prescrita na al. u) do nº 1 do art. 4º do RCP para uma sociedade comercial em situação de insolvência não se destina exclusivamente à própria acção em que se opera a sua apresentação ou citação para a insolvência, mas a toda e qualquer acção em que a sociedade seja parte, desde que se verifiquem os pressupostos da situação de insolvência, com excepção das acções que tenham por objecto litígios relativos ao direito do trabalho;

II- A sentença que declara a insolvência de uma sociedade comercial faz cessar a situação de insolvência em que a mesma se encontrava, determinando a constituição de uma massa insolvente à qual já não é aplicável a isenção subjectiva constante da al. t) do nº 1 do art. 4º do RCP.

III- Não coincidindo o conceito de sociedade comercial em estado de insolvência com o de massa insolvente de uma sociedade comercial já declarada insolvente, só à primeira se aplica a isenção de custas prescrita no art. 4º, nº 1, al. u) do RCP, pelo que a ora Recorrente não goza da pretendida isenção de custas.



DECISÃO

Termos em que, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Porto,15 de Janeiro de 2015

Ass. Ana Paula Santos

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Ana Patrocínio