Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00942/15.9BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/13/2017
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Vital Lopes
Descritores:OPOSIÇÃO
FUNDAMENTOS
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
REJEIÇÃO LIMINAR
Sumário:1. Quer a nulidade da citação, quer a nulidade por falta de requisitos essenciais da certidão de dívida em que se consubstancia o título executivo, não constituem no regime do CPPT fundamento válido de oposição à execução fiscal, devendo ser arguidas no próprio processo executivo.
2. A oposição não é o meio próprio para se conhecer da idoneidade das garantias oferecidas mas sim a reclamação judicial, prevista no art.º276.º do CPPT, a interpor da decisão desfavorável que em concreto venha a ser tomada pela entidade competente sobre a susceptibilidade de a garantia assegurar o pagamento da quantia exequenda e do acrescido.
3. Não encontra enquadramento em nenhuma das alíneas do n.º1 do art.º204.º do CPPT, a apreciação da legalidade concreta da dívida exequenda, a tanto se reconduzindo a questão de saber se se verificam os pressupostos factuais e jurídicos da liquidação ou isenção de tributação.
4. As provas apresentadas e/ ou requeridas pelas partes relativas a questões que o tribunal não pode conhecer no processo, não devem ser apreciadas nem diligenciadas pelo tribunal, sob pena de incorrer na prática de actos inúteis.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Z..., Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

Z..., Lda., recorre da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que indeferiu liminarmente a oposição à execução fiscal n.º0051201501103253 contra si instaurada no serviço de finanças de Aveiro 1 para cobrança do IVA de 2013-03, pela quantia exequenda de 4.449,00€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo (fls.197).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:
Matéria de facto

1. A sociedade comercial Recorrente foi notificada que os fundamentos relacionados com a ilegalidade do liquidação de IVA, não se enquadram no artigo 204.º do C.P.P.T, desde logo, a Citação da A.T, feita por via eletrónica, com assinatura digital possuía e possui uma validade desconhecida, cfr., Prova junta nos autos,

2. A Recorrente deduziu então Oposição, nos termos e para os efeitos dos artigos
204.º e ss do Código de Procedimento e de Processo Tributário. art.º 20.º da
Constituição da República Portuguesa, e ainda art.º 9.º e art.º 95.º da Lei Geral Tributária, e alegou em SÍNTESE (“quadro síntese”, a que o Parecer do M. P. se refere),

3. a existência de questão prejudicial e litispendência, na medida em que não há trânsito em julgado;
4. Alegou ainda nulidade insuprível da própria Citação,
5. Nulidade da Certidão de dívida por não indicar qual a norma do C.I.V.A que afinal foi violada para lhe ser movida à Recorrente execução fiscal e qual a data das operações que deram origem à liquidação e à dívida exequenda;
6. Ilegalidade da liquidação e do procedimento que a antecedeu.
7. Ora, salvo devido respeito, de toda a factualidade apresentada a Oposição não deveria ter sido por aquele TAF de Aveiro rejeitada liminarmente com as razões ali expostas, porque os factos que a A.T. diz consubstanciarem falta de entrega de imposto exigível e que discrimina como correção de Imposto (IVA), concretamente para o período de tributação não consubstanciam factos tributários de que dependa receita tributária em sede de I.V.A,
8. EFETIVAMENTE o TAF de Aveiro, deveria ter atentado ANTES no facto de a Recorrente ter entregue Prova Documental que consta dos autos e que é apta a contrariar a presente Execução, e o seu título, e nessa medida ainda que outro motivo não existisse sempre se verificaria esse que desde logo e como é evidente se encontra efetivamente previsto no art.º 204º. n.º 1 alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, portanto, sustenta o Recorrente que o TAF de Aveiro, simplesmente não aplicou o Art.º 204.º, n.º 1 al. a) do C.P.P.T, ou se quisermos e IMPORTA AQUI explanar que, na interpretação do TAF de Aveiro, simplesmente o recorrente não poderia ter recorrido invocando aquele artigo aqui citado, limitando-se a dizer que a Recorrente não tinha factos paro o sua invocação,
9. OU SEJA: a Recorrente defende justamente o contrário, pois possui prova nomeadamente documental que é subsumível àquela norma, (portanto o sentido de aplicação do TAF de Aveiro deveria ANTES de afastar a norma, pela sua não aplicação, deveria ter apreciado de mérito os concretos factos e documentos e não simplesmente vir dizer como diz no texto da Sentença que a Recorrente não poderia ter invocado uma norma jurídica, caso contrário equivaleria uma tal interpretação que à Recorrente não restaria outra solução do que efetuar o pagamento da dívida peticionada pela A.T, tanto mais que além da citada prova testemunhal e documental de que exportou bens aplicando-se por isso o isenção legal prevista, art° 14.º R.I.T.I.,
10. Portanto perante a matéria de facto junto nos autos o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, tribunal de primeira instância, decidiu mal na medida em que estamos perante prova por documentos sempre também estaríamos perante uma situação factual inscrita na citada alínea i) do C P. P. T, OU SEJA, existe um nítido erro na apreciação da matéria de facto, assim se violando o princípio do fundamentação, e normas do art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa,
SEM PRESCINDIR, relativamente à,
Matéria de Direito,
11. A nulidade da citação deve ser pelo Executado suscitada no prazo da Oposição à execução Fiscal, segundo os princípios da economia processual, e da concentração da defesa na contestação, art.º 569.°, 572.º, 573.º e 574.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, Código de Processo Civil, aplicável ao C.P.P.T., ex vi, art.º 2.º Lei Geral Tributária e artº Código de Processo Tributário, o executado deve por isso deduzir toda a sua defesa na peça processual que se lhe oferece, i.e, na Oposição, NÃO PODE DEIXAR DE SE REFERIR NESTAS CONCLUSÕES QUE é o caso da nulidade da citação já que em primeiro lugar o Despacho do Tribunal de primeira instância alega que a nulidade da citação não se encontra previsto nas alíneas a) a h) do art.º 204.º do C.P.P.T, mas depois admite que a executada possa invocar a alínea i) do mesmo artigo, portanto fez o TAF de Aveiro também com este sentido interpretativo uma errada apreciação do citado Art.º 204.º, alíneas i) do C.P.P.T., caso contrário violar-se-ia nitidamente o princípio do contraditório e art.º 32.º da Constituição da República Portuguesa, nem o tribunal não se encontra impedido de conhecer essa matéria sob pena de violação das mesmas normas citadas e dos artigos 202.º, 204.º e 205.º da Constituição da República Portuguesa,
12. Discorda também a Recorrente da interpretação que o tribunal de primeira instância) faz nomeadamente do art.º 204.º, n.º 1 do C.P.P.T, já que existem factos que são subsumíveis à aplicação da norma citada, tendo por isso de ser apreciada o Oposição,
13. É que estamos na presença de prova documental que demonstra a inexistência de imposto de IVA, (reitera-se prova documental), indiciária de inexistência de imposto, o que sempre pugnamos lhe seja reconhecido com o teor do presente recurso, já que o sentido da aplicação da norma citada 204.°, alínea 1) do C.P.P.T, não é o correto e implica a não apreciação do mérito da questão, (o sentido da interpretação daquela norma pelo tribunal Recorrido deveria ser pois a apreciação da questão subjacente concreta, que a mesma garantia permitia,
14. MAIS: DESTACANDO O SENTIDO DE INTERPRETAÇÃO do tribunal Recorrido - ao interpretar a norma citada desta forma violou desde logo o Art.º 32.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que diminuiu as possibilidades de defesa da Recorrente, aplicando um indeferimento liminar, sem apreciar o fundo da causa, tendo elementos para isso,
15. Acarretando na prática uma denegação de justiça devida ao caso, violando POR AQUI (isto é, com essa interpretação do art.º 204.º alínea i), do C.P.P.T, o já citado art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que a decisão judicial de primeira instância não assegura o acesso ao direito e prejudica os direitos e interesses legalmente protegidos da Recorrente,
16. Mas também o texto da decisão judicial da tribunal Recorrido, é de molde a violar o n.º 4 daquela enunciada norma, no medida em que ao decidir como decidiu, interpretando os factos alegados impediu materialmente que o processo - este processo executivo - fosse afinal justo e equitativo,
17. ESTAMOS também perante o texto da decisão judicial de primeira instância, em presença de uma violação do art. 410.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, na medida em que interpretando o tribunal de primeira instância que os factos aduzidos pelo Executada não se enquadram na previsão legal do art.º 204.º do C.P.P.T., tal configuraria e configura em termos normais processuais um tema de prova, no mínimo carecido de produção do mesma em audiência, violando assim o princípio do contraditório, Art.º 3.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, conjugado com o art.º 2.º desde logo da Lei Geral Tributária, d), bem como pelo próprio art.º 2.°, e), do C.P.P.T, PORTANTO em lado nenhum e de modo nenhum poderia ter concluído ou sustentado o aplicação ou a interpretação como o faz o tribunal Recorrido no texto da sua Sentença um suposto regime de fundamentação da oposição a execução fiscal, e para mais citando os artigos 84.º e 86.º do então Código das Execuções Fiscais...(codificação de 1913), na medida em que não prova qualquer “protelamento excessivo da cobrança coersiva dos créditos do Estado” uma interpretação do tribunal Recorrido que assim feita afeta os mais básicos princípios estruturantes da república portuguesa, assim a eminente doutrina do Dr. Jorge Reis Novais, in, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, Coimbra Editora, 2011,
18. EFETIVAMENTE as diligências requeridas pela Recorrente na peça de Oposição coadunam-se com as provas apresentados, e são idóneas a descobrir a verdade material, não havendo nenhum caso de “flagrante injustiça” para o credor tributário (Exequente), como vem por este alegado, DE TAL MODO que nunca poderia estar em causa o Acórdão citado do Tribunal Central Administrativo do Sul, Proc. n.º 06061/12, porque os factos ali versados não encontram correspondência com o caso concreto, logo existe falta de fundamento perante a factologia dos autos,
19. Colhe-se afinal do texto do tribunal Recorrido, que a apresentação de uma Impugnação judicial da liquidação tem por efeito a suspensão, Artigo 169.° do C.P.P.T, “A execução fico suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, (...), desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art.º 195.º , a aqui recorrente prestou efetivamente garantia, e a Recorrente nessa impugnação colocou em causa a legalidade do imposto em causa,
20. EFETIVAMENTE não há nenhuma confusão entre pedidos e causas de pedir, aliás nem o texto da decisão do tribunal Recorrido, enumera, exibe ou confronto os pedidos, e também não identifica ou confronta as “causas de pedir”,
21. Também não diz expressa e claramente quais afinal as causas de pedir que estão em confusão autêntica e irreversível com o pedido, com um pedido ou com vários pedidos, ora um processo e uma decisão judicial para ser justo, razoável e equitativa carece sempre de ser fundamentada, art.º 2.º, 20.°, 32.º, 205.º, 266.°, 268.º da C.R.P,
22. Relativamente ao meio processual utilizado, o texto da decisão judicial afirma que não é a Oposição, “O meio processual adequado para a discussão da legalidade concreta da liquidação não é, em regra o processo de Oposição à Execução, MAS então significa que legal e processualmente o pode ser em sede de Oposição à Execução, logo é uma interpretação que viola o Art. 20.º da C.R.P, e assiste razão à Recorrente já que subsiste nessa interpretação um vício na apreciação da matéria de facto e deficiente apreciação de direito, NA MEDIDA EM QUE não estaria preenchida a alínea c) do Art.º 209.º do C.P.P.T, nem resultaria violado o art.º 204.º do C.P.P.T, SENDO QUE não poderia ter sido, de direito, indeferida liminarmente a Oposição apresentada pela Recorrente, por força do art.º 209.º, n.º 1 c) do C.P.P.T e absolvida o Fazenda Pública do instância, com todos as legais consequências.
NESTES TERMOS, deve ser admitido o recurso à matéria de facto e de direito e as suas motivações, e dado total provimento ao mesmo com revogação do Despacho de rejeição liminar do presente OPOSIÇÃO JUDICIAL TRIBUTÁRIA sendo declarados e reconhecidos os vícios invocados, bem como as inconstitucionalidades suscitados, ou seja, por violação das normas Art.º 2.º, 20.°, 32.º; 205.º, 266.º, 268.º CRP, e art.º 410.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, C.P.C, com todas as demais consequências.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (artigos 635.º, n.º4 e 639.º, n.º1, do CPC), a questão a resolver reconduz-se a indagar se a decisão incorreu em erro de julgamento ao indeferir liminarmente a oposição.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

A decisão recorrida não fixou quaisquer factos, o que se passa a fazer:
1. – Foi instaurada contra a oponente, em 05/06/2015, a execução fiscal n.º0051201501103253 pela quantia exequenda de 4.499,00€ proveniente de IVA do período de tributação 2013-03 (capa do PEF e certidão de dívida, fls.83 e 83 dos autos);
2. A oponente foi citada em 16/08/2015, conforme “print” da tramitação do processo a fls.84 e informação executiva de fls.85;
3. Deduziu oposição em 28/08/2015 conforme informação executiva de fls.85.
Não resultaram «provados» nem «não provados» quaisquer outros factos com interesse para a decisão a proferir.

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

As questões que a Recorrente coloca no recurso prendem-se com a alegada existência de questão prejudicial e litispendência; nulidade insuprível da citação; nulidade da certidão de dívida; ilegalidade da liquidação e do procedimento que a originou.

Invoca a Recorrente a existência de questão prejudicial ou litispendência na medida em que impugnou judicialmente a liquidação exequenda.

Como é sabido, a litispendência, materializando-se na repetição de uma causa pendente, constitui excepção dilatória, que tem por objectivo evitar que o tribunal contradiga ou reproduza uma decisão anterior. O conceito nuclear da litispendência radica, pois, na definição dos parâmetros que permitem aferir da identidade das causas, com vista a determinar se uma é, ou não, a repetição da outra.

Ora, o art.º581º do CPC, sob a epígrafe «Requisitos da litispendência e do caso julgado», estabelece, no seu nº 1, que a causa se repete «quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir», esclarecendo, no nº 2, que «Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica», e no nº 3, que «Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico», esclarecendo no nº 4, que «Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.».

O que significa que a litispendência só ocorrerá se, cumulativamente, nas acções em apreciação intervierem as mesmas partes, sob a mesma qualidade jurídica, pretendendo obter o mesmo efeito jurídico e, esse efeito jurídico tiver por causa o mesmo facto jurídico.

Ora, como se extrai da doutrina do Acórdão do STA, de 19/09/2012, tirado no proc.º0472/12, ainda que os pedidos formulados numa e noutra acção sejam os mesmos e a causa de pedir seja idêntica, o sujeito não intervém nas duas acções na mesma qualidade jurídica – pois que o faz na qualidade de oponente na oposição e na de impugnante na impugnação judicial – não se verificando pois repetição da causa.

É que, numa situação como a dos autos, como se deixou dito naquele Acórdão, «não ocorre risco de contradição ou repetição de decisões, pois que o efeito jurídico que é possível obter através da oposição à execução – a respectiva extinção em relação ao oponente – e o visado pela dedução de impugnação judicial – a anulação do acto tributário impugnado – são inconfundíveis, tendo, aliás, por objecto, actos diversos».

Não se verifica, pois, a invocada excepção de litispendência.

Por outro lado, a pendência de impugnação judicial não determina, ipso facto, a suspensão do processo de execução fiscal.

A impugnação judicial da liquidação será causa de suspensão da execução fiscal cumpridas que estejam as condições expressas no art.º169º do CPPT, pelo que não determina, só por si, a inexigibilidade da dívida exequenda – vd. Ac. do STA, de 14/10/2009, tirado no proc.º0445/09.

Dispõe n.º1 do art.º52.º da LGT que «a cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda».

E diz o n.º2 do mesmo preceito que «a suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias»

Por outro lado, de acordo com o disposto no n.º1 do art.º169.º do CPPT, «a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda (…), desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente».

Ora, no caso vertente, não se provando, como não se prova, que se acha prestada garantia, não estão reunidos todos os pressupostos para a suspensão da execução.

Na verdade, não basta para que ocorra a suspensão da execução o mero pedido de prestação de garantia. A virtualidade suspensiva só ocorre se a garantia for aceite pelo credor tributário.
E salienta-se que não é a oposição à execução o meio próprio para a discussão da idoneidade da garantia oferecida, mas sim a reclamação judicial, prevista no art.º276.º do CPPT, a interpor da decisão desfavorável que em concreto venha a ser tomada pela entidade competente sobre a susceptibilidade de a garantia assegurar o pagamento da quantia exequenda e do acrescido.

A pendência de impugnação judicial não prejudica, pois, o prosseguimento da execução fiscal, a menos que se demonstre ter sido prestada garantia idónea, aceite pela entidade tributária competente (art.º199.º, n.º8, do CPPT), o que não feito.

Improcede este segmento do recurso.

Quanto à nulidade da citação.

É unânime na doutrina e na jurisprudência do STA o entendimento de que a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição à execução.

Como aquele alto tribunal tem vindo a afirmar repetida e uniformemente, «a nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos do disposto no art. 204.º do CPPT, não sendo subsumível, designadamente, na previsão da alínea i) do n.º 1 daquele artigo e, como nulidade, deverá ser invocada perante o órgão da execução fiscal [cf. n.ºs 1 e 2 do art. 191.º do Código de Processo Civil (CPC), que corresponde ao art. 198.º na anterior versão do Código], com possibilidade de reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável (art.º276.º do CPPT) (Neste sentido, vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 28 de Fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 803/04 publicado no Apêndice ao Diário da República de 5 de Dezembro de 2007 http://dre.pt/pdfgratisac/2007/32410.pdf), págs. 36 a 44, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/29187a21aba2ec588025729d00551d75?OpenDocument;
- de 24 de Fevereiro de 2010, proferido no processo n.º 923/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 3 de Março de 2011 (http://dre.pt/pdfgratisac/2010/32410.pdf), págs. 58 a 62, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6603a143389bd257802576dd00504304?OpenDocument.
No mesmo sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, “Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado”, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 13 ao art. 165.º, págs. 144/145.)» - vd. Ac. do STA, de 07/05/2014, tirado no proc.º0198/14.

Compreende-se que a nulidade da citação não constitua fundamento de oposição, pois esse vício, a verificar-se, não determina a extinção da execução fiscal, que é o escopo da oposição, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas.

Assim, tal como refere a Recorrente, a questão da nulidade da citação resolve-se efectivamente na execução, com possibilidade de reclamação de uma eventual decisão desfavorável, para o tribunal tributário nos termos do artº276.º do CPPT, mas não, como pretende, na oposição à execução.

Este fundamento do recurso também não procede.

Quanto à nulidade da certidão de dívida

Invoca a Recorrente nulidade da certidão de dívida «por não indicar qual a norma do C.I.V.A. que afinal é violada para lhe ser movida a execução fiscal e qual a data das operações que deram origem à liquidação e à dívida exequenda».

Dispõe o art.º163.º do CPPT:
«São requisitos essenciais dos títulos executivos:
a) Menção da entidade emissora ou promotora da execução;
b) Assinatura da entidade emissora ou promotora da execução, por chancela nos termos do presente Código ou, preferencialmente, através de aposição de assinatura electrónica avançada;
c) Data em que foi emitido;
d) Nome e domicílio do ou dos devedores;
e) Natureza e proveniência da dívida e indicação do seu montante.
2 - No título executivo deve ainda indicar-se a data a partir da qual são devidos juros de mora e a importância sobre que incidem, devendo, na sua falta, esta indicação ser solicitada à entidade competente.
3 - Os títulos executivos são emitidos por via electrónica e, quando provenientes de entidades externas, devem, preferencialmente, ser entregues à administração tributária por transmissão electrónica de dados, valendo nesse caso como assinatura a certificação de acesso.
4 - A aposição da assinatura electrónica avançada deve ser realizada de acordo com os requisitos legais e regulamentares exigíveis pelo Sistema de Certificação Electrónica do Estado - Infra-Estrutura de Chaves Públicas».

Por outro lado, dispõe o art.º165.º, n.º1 do CPPT, que são nulidades insanáveis em processo de execução fiscal «a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental» (alínea b)).

Se, por um lado, da alegação que faz não se vê em que possa a Recorrente assentar a alegada ocorrência de nulidade insanável por falta de requisitos essenciais do título executivo à luz do disposto no art.º163º do CPPT, essa aventada nulidade do título, também não constitui fundamento de oposição à execução fiscal; deve, antes, ser arguida perante o órgão da execução fiscal com a inerente possibilidade de reclamação para o tribunal tributário de eventual decisão desfavorável – cf. os acórdãos do STA (Pleno do CT), de 23/2/2005, tirado no proc.º574/04; de 19/11/2008, no proc.º430/08; de 17/12/2008, no proc.º364/08 e de 6/5/2009, no proc.º632/08.

Na verdade, como, por exemplo, no último aresto citado se salienta, «(…) o artigo 165.º do CPPT considera nulidade insanável em processo de execução fiscal “a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental”.
E estabelece o respectivo regime, e efeitos: a anulação dos termos subsequentes do processo que do acto anulado dependam absolutamente, sendo (a nulidade) de conhecimento oficioso e podendo ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão.
A lei elegeu, pois, tipicamente, o respectivo regime legal: trata-se de uma nulidade.
E, como tal, estabelece-se igualmente o seu regime de arguição.
Assim sendo, foi propósito legal desconsiderá-la como fundamento de oposição, ainda que seja a mesma, substancialmente, a consequência resultante: a extinção da execução consubstanciada na nulidade do próprio título.
Por outro lado, a tutela jurídica concedida à nulidade é, até, mais consistente do que a resultante da oposição, na medida em que pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, que não apenas no prazo de 30 dias contados da citação – cfr. artigo 203.º, n.º 1, do CPPT.
Aliás, a entender-se dever ser conhecida pelo Chefe do Serviço de Finanças (ou, porventura, pelo juiz – cfr. o artigo 151.º, n.º 1, do CPPT), sempre o respectivo processo seria urgente – artigo 278.º, n.º 5 – o que é mais consentâneo com a celeridade querida para o processo de execução fiscal, atenta essencialmente a sua finalidade de cobrança de impostos que visam “a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas” e a promoção da justiça social, da igualdade de oportunidades e das necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento – artigo 5.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.
Nada, pois, parece justificar a apontada dualidade – em termos de nulidade processual da execução fiscal e de fundamento de oposição à mesma -, aliás proibida nos termos do referido artigo 2.º do Código de Processo Civil.
Conclui-se, assim, que a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo – nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i).».

Improcede igualmente este fundamento do recurso.

Quanto, por último, à invocada ilegalidade da liquidação e do procedimento que a antecedeu

De há muito constitui jurisprudência pacífica do STA, que a oposição à execução fiscal tem como fundamentos os taxativamente indicados no artº204º do CPPT.

E como se salienta no Acórdão daquele alto tribunal de 12/06/2007, tirado no proc.º0115/07, «Esta taxatividade dos fundamentos de oposição não implica uma restrição aos direitos fundamentais de acesso aos tribunais, à tutela judicial efectiva, ao recurso contencioso e ao princípio do favorecimento do processo ou pro actione, uma vez que a impugnação de actos lesivos é permitida sempre que a lei assegurar um meio de os impugnar contenciosamente, como expressamente se refere na alínea h) do seu n.º1.
Assim, deste artº204.º não pode resultar, em nenhuma hipótese, uma situação em que um particular, que tenha sido atingido na sua esfera jurídica por um acto da administração, fique privado, antes ou depois da instauração da execução, da possibilidade de acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos.
Por isso, o carácter taxativo dos fundamentos de oposição não consubstancia uma restrição daqueles direitos, mas sim um seu condicionamento, que não é proibido pela Constituição».

Regressando aos autos, pretendia a oponente, ora Recorrente, produzir na oposição prova testemunhal «de que nenhum imposto de IVA tem de entregar ou tem de ser liquidado, em função de que possui também prova documental em como exportou os bens aplicando-se a isenção legal prevista, art.º14.º RITI». E prossegue a Recorrente, nestes termos, «Portanto perante a matéria de facto junta nos autos o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, tribunal de primeira instância, decidiu mal na medida em que a ora Recorrente sempre possuiu provas de que nenhum imposto lhe teria que ser liquidado, estaríamos como estamos na presença pois de factos que se inscrevem na dita alínea a) do art.º 204.º do C P. P. T, e de uma vez que estamos perante prova por documentos sempre também estaríamos perante uma situação factual inscrita na alínea i) da C.P.P.T,
Havendo por isso - sustentamos- um nítido erro na apreciação da matéria de facto, assim se violando o princípio da fundamentação, e normas do art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa (…)».

Como se vê, a Recorrente não se conforma com o decidido em 1.ª instância na parte em que rejeitou a oposição por a invocada ilegalidade da liquidação do IVA não ser subsumível na alínea h) do n.º1 do art.º204.º do CPPT, na medida em que os fundamentos que invoca, são subsumíveis ou na alínea a) ou na alínea i) do n.º1 do art.º204.º do CPPT.

Mas não tem razão a Recorrente.

A inexistência do facto tributário – que é, em suma, o que invoca –, fere de ilegalidade o acto de liquidação de IVA concretamente praticado, mas não configura uma ilegalidade em abstracto ou absoluta como as referidas na alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, ilegalidade esta da própria lei (por violação de norma de hierarquia superior) e não do acto que a aplica, sendo esta ilegalidade em concreto e não aquela ilegalidade abstracta, a que se verifica quando é liquidado imposto a quem dele está isento ou não sujeito, como bem se entendeu na decisão recorrida.

A questão de saber se o imposto “existe ou não”, em concreto, para a ora Recorrente – ou seja, se lhe foi ou não legalmente liquidado – constitui, isso sim, fundamento de impugnação judicial, não podendo proceder a oposição deduzida com esse fundamento salvo nos casos, que não é o dos autos, em que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação (cf. a alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT).

Como se escreveu no Ac. do STA, de 09/04/2014, tirado no proc.º076/14, em linha com doutrina e jurisprudência pacífica daquele alto tribunal, «A ilegalidade em abstracto a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT - não reside directamente no acto que faz aplicação da lei ao caso concreto, mas na própria lei cuja aplicação é feita, decorrente da inexistência de lei em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação que preveja a sua liquidação ou da não autorização da sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação.
Cabem neste conceito de ilegalidade abstracta todos os casos de actos que aplicam normas que violam regras de hierarquia superior, designadamente, além das normas constitucionais, as de direito comunitário ou internacional vigente em Portugal ou mesmo normas legislativas de direito ordinário quando é feita aplicação de normas regulamentares».
Por outro lado, e no que respeita ao possível enquadramento da situação na alínea i) do n.º1 daquele art.º204.º do CPPT, aí se refere que podem constituir fundamento de oposição «quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título» (sublinhado nosso).

Envolvendo, como se disse, a invocada questão da verificação da existência ou inexistência dos pressupostos de incidência ou isenção do IVA na operação económica praticada pelo sujeito passivo, a apreciação da legalidade concreta da liquidação exequenda, é manifesto que a mesma não encontra enquadramento naquela alínea i) do art.º204.º do CPPT, sendo irrelevante que a questão pudesse ser resolvida unicamente com a prova documental dos autos, como pretende a Recorrente.

Como assim, bem andou a decisão recorrida em não ordenar a produção da prova testemunhal requerida, bem como em não ter feito qualquer apreciação da prova documental dos autos, o que configuraria acto inútil e proibido por lei (art.º130.º do CPC), pois não poderia conhecer das questões suscitadas na oposição e em vista das quais aquelas provas foram requeridas e apresentadas pela oponente e ora Recorrente.

Concluindo, a ilegalidade da liquidação de IVA por erro nos pressupostos factuais e jurídicos, não pode erigir-se em fundamento da oposição à execução fiscal onde está a ser cobrada coercivamente a dívida resultante desse acto, não sendo subsumível a nenhuma das alíneas do elenco taxativo do n.º1 do art.º204.º do CPPT, antes devendo a sua discussão judicial ser efectuada através do processo de impugnação judicial previsto e regulado nos artigos 99.º e seguintes do CPPT.

A decisão recorrida não incorreu no apontado erro de julgamento ao rejeitar liminarmente a oposição nos termos do n.º1 alíneas b) e c), do art.º209.º do CPPT, por não ter sido invocado fundamento válido de oposição e ser manifesta a sua improcedência em vista dos fundamentos invocados, merecendo ser inteiramente confirmada, assim se negando provimento ao recurso.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente.
Porto, 13 de Julho de 2017
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro