Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01240/14.0BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/07/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:AUSÊNCIA DE CULPA NA INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO
Sumário:I- No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art. 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).

II - Assim, sendo as dívidas provenientes de IRC, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.

III - Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.

IV - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:F.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou procedente a pretensão do Recorrido na presente instância de OPOSIÇÃO com referência à execução fiscal n.º 1848201301013513 e apensos, originariamente instaurada contra a sociedade V., Lda, pelo Serviço de Finanças do Paredes, e revertida contra F., por dívidas de IRC dos exercícios de 2010 e 2011, no valor global de € 5.970,98.

A Recorrente não se conformando com a decisão interpôs recurso tendo formulado as seguintes conclusões, que se reproduzem:

“(…) A - Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a oposição deduzida contra o despacho de reversão lavrado no processo de execução fiscal (PEF) n.º 1848201301013513 e apensos, a correr termos no Serviço de Finanças de (...) (OEF), por dívidas de IRC, relativamente aos exercícios de 2010 e 2011, no valor global de € 5.970,98, a que acrescem custas e juros de mora.
B - Ressalvado o devido respeito com o que desta forma foi decidido, não se conforma a Fazenda Pública, sendo outro o seu entendimento, já que considera que a Douta Sentença sob recurso padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito, como a seguir se argumentará e concluirá.
C - Não pode a Fazenda Pública concordar com a Sentença recorrida, nomeadamente com o afastamento da presunção de culpa, e de que este resulte patente do probatório, pelo que dela se recorre, nos termos e com os fundamentos a seguir enunciados.
D - Relativamente à questão da culpa, refere a LGT, no seu artigo 24.º, n.º 1, alínea b), a responsabilidade dos gestores que “não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.
E - Estabelece a lei uma presunção legal de culpa, que recai sobre o administrador/gestor revertido, quando o prazo legal de pagamento termina durante o período da sua administração/gestão.
F - Terão os gerentes/administradores que provar que não foi por culpa sua (deles) que a sociedade devedora originária se colocou em posição de insuficiência patrimonial para fazer face às dívidas fiscais.
G - Entende a Fazenda Pública, ora Recorrente, que, ao contrário do que determinou a Meritíssima Juiz “a quo” no probatório, não resultam provados os factos relatados nos pontos 8.º, 9.º, 10.º e 11.º (fls. 5 da Sentença).
H - Pelo contrário, entende a Fazenda Pública que, dada a prova produzida, aqueles factos deveriam ser considerados como não provados, pelas razões que de seguida se aduzem:
I - Relativamente ao facto provado n.º 8, entende a Fazenda Pública, aqui Recorrente, que o testemunho efectuado não pode ser “de per si” condição para dar como provado que o Oponente realizou suprimentos à empresa;
J – Os “suprimentos” efectuados pelos gerentes nas sociedades que gerem terem que estar devidamente relevados na contabilidade, através de suportes físicos – documentos – que atestem a sua existência, condição "sine qua non” para serem considerados como reais.
K - No caso dos presentes autos, nenhum documento foi junto pelo Oponente ou carreado para os autos pelo Órgão de execução fiscal que directa ou indirectamente esteja relacionado com “suprimentos”.
L - Não se sabe, onde, quando, como e em que circunstâncias foram realizados os alegados “suprimentos”.
M - Em segundo lugar, a testemunha R., como bem refere a Sentença de que se recorre (fls. 6), “entre os anos de 2009 a 2011, o ajudou (o irmão, aqui Oponente e recorrido) na distribuição do jornal, porta a porta, depois do seu horário laboral.”.
N – Não é possível o tribunal recorrido considerar que o depoimento da testemunha, que se limitava à ajuda como ardina (“na distribuição do jornal, porta a porta, depois do seu horário laboral.”), sem qualquer contacto com a contabilidade ou com os serviços administrativos da sociedade, seja considerado como adequado e suficiente a sustentar que o Oponente fazia suprimentos à sociedade devedora originária.
O - Não tendo conhecimento directo do facto que afirma (que o Oponente fez suprimentos), pelas razões sustentadas no ponto anterior, a testemunha limitou-se a reproduzir em tribunal aquilo que ouviu dizer;
P - Entende a Fazenda Pública, que, nestas circunstâncias, jamais poderia o tribunal firmar como facto provado o depoimento da testemunha.
Q - Por último, o tribunal “a quo”, na valoração da prova, “esqueceu-se” que a única testemunha interveniente na produção da prova é irmão do Oponente.
R - Ora, os depoimentos de familiares directos das partes têm de ser devidamente escrutinados na valoração da prova.
S - Não podem, pura e simplesmente, ser valorados como se de uma outra testemunha se tratasse sem qualquer ligação com a parte, neste caso o Oponente.
T - Estando em causa uma testemunha com laços de sangue (irmão) e uma relação estreita com a parte (Oponente), a valoração da prova deve ser realizada com muito mais reserva e cuidado,
U - exigindo-se a apresentação de provas documentais que sustentem, ainda que minimamente, o que foi afirmado pelo testemunha,
V - ou que seja apresentada mais alguma prova testemunhal que possa corroborar o que foi dito pela testemunha familiar do Oponente.
W - Ora, nada disto foi feito.
X - Em face do exposto, deveria o tribunal recorrido julgar como não provado o facto n.º 8.º do probatório.
Y - Quanto ao facto provado n.º 9.º, entende a Fazenda Pública que também este deveria ser considerado como não provado;
Z - A testemunha R., cujo depoimento justifica o facto dado como provado, apenas colaborou com a sociedade devedora originária “entre os anos de 2009 a 2011”, conforme resulta do teor do 4.º (quarto) parágrafo de fls. 6 da sentença de que se recorre.
A.A. - Iniciando a testemunha apenas em 2009 a sua colaboração na sociedade executada originária, como ardina, não é possível que o seu depoimento seja apto e credível a sustentar como provado que em período anterior à sua entrada na sociedade (2007 e 2008) as receitas de publicidade da devedora originária tornavam-se cada vez mais escassas.
B.B. - Por outro lado, não tendo a testemunha contacto directo com a contabilidade da executada originária, ou com os serviços administrativos da mesma, o seu testemunho não pode ser apto ou credível, dada a função que desempenhou, como ardina, a poder ser dado como provado os factos referido no ponto 9.º do probatório;
C.C. - Ademais, inexiste qualquer outro meio probatório que possa sustentar o alegado.
D.D. - A testemunha é irmão do Oponente e, como tal, o seu depoimento deveria estar sujeito a um escrutínio muito mais exigente do que aquele que foi feito pelo Meritíssimo Juiz “a quo”,
E.E. - Motivo pelo qual deveria este facto (9.º) ser considerado como não provado.
F.F. - Quanto ao facto provado n.º 10.º, entende a Fazenda Pública que também este deveria ser considerado como não provado;
G.G. - O tribunal recorrido não sustenta com factos concretos a conclusão que firmou como provada, sendo entendimento da Fazenda Pública, aqui recorrente, que estamos perante uma singela afirmação genérica, sem qualquer sustentação fáctica, isto é,
H.H. – Não indicou a testemunha e, consequentemente, não identificou o tribunal recorrido, quais os concretos factos – actos e/ou omissões levados a cabo - que os levaram a concluir que o Oponente praticou de forma a concluir que lutou para “tentar cumprir todas as obrigações da devedora originária.”
I.I. - A vaga, singela e genérica conclusão de que o Oponente lutou para tentar cumprir com todas as suas obrigações não tem qualquer sustento ou suporte fáctico,
J.J. - Logo, deveria o tribunal recorrido, ao contrário do que fez, considerar como não provado o “facto” n.º 10 do probatório.
K.K. - Quanto ao facto considerado como provado n.º 11.º, entende a Fazenda Pública, aqui Recorrente, que também este facto deveria ter sido considerado como não provado;
L.L. - Não se compreende que se dê como provado a existência de “avales prestados” pelo Oponente.
M.M. - Não existe qualquer prova testemunhal ou sequer documental que permita retirar semelhante conclusão.
N.N. - Os mencionados “avales”, à semelhança dos também referidos “suprimentos” são expedientes/mecanismos a que por vezes se recorre, designadamente os sócios gerentes das respectivas sociedades, que têm de estar obrigatoriamente reflectidos em suportes documentais que permitam atestar a veracidade e a realidade dos mesmos.
O.O. - Para serem devidamente considerados e relevados na contabilidade, os “avales” (bem como os “suprimentos”) têm de estar devidamente suportados em documentação adequada.
P.P. - Nos presentes autos de oposição não consta qualquer documento, sublinhe-se, não consta qualquer documento, que permita sequer conjecturar-se a existência de um único “aval” (nem de qualquer “suprimento”), quanto mais dar-se como provado a existência de “avales”.
Q.Q. - À semelhança dos alegados “suprimentos”, olvidou-se o tribunal recorrido de indicar onde, quando, como e em que circunstâncias ocorreram os supostos “avales”.
R.R. – Por outro lado, perscrutados os presentes autos, não se descortina em que parte dos mesmos retirou o tribunal “a quo” a prova de que o Oponente, juntamente com a esposa, tenham sido declarados insolventes.
S.S. - Não existe um único documento que indique que o Oponente “foi declarado insolvente, juntamente com a esposa, por sentença de 15.05.2012, proferida no âmbito do processo n.º.., que correu termos pelo 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de …, a qual já transitou em julgado.”, conforme decorre do ponto 11.º do probatório.
T.T. - Sem qualquer suporte, quer testemunhal, quer documental, o tribunal recorrido parte de uma premissa (“O ora oponente, mercê dos avales prestados, não tendo conseguido regularizar as responsabilidades decorrentes daqueles avales”) para firmar uma conclusão (“foi declarado insolvente, juntamente com a esposa (…)”).
U.U. - Ainda que se admita, o que não se concede, nem concebe, face à prova produzida, que o Oponente, ou o Oponente ou a esposa, fosse(m) considerado(s) insolvente(s), jamais poderia o tribunal, no entendimento da Fazenda Pública, considerar, nos termos e com os fundamentos com que o fez, que a alegada prestação de “avales” e as supostas responsabilidades decorrentes da prestação dos mesmos, foi causa adequada a provocar insolvência do Oponente (ou do Oponente e da esposa), já que nenhuma base ou sustento apresenta o tribunal recorrido para chegar a tal conclusão.
V.V. - Deveria o tribunal “a quo”, ao contrário do que fez, considerar como não provado o “facto” n.º 10 do probatório.
W.W. - A Jurisprudência, a este respeito, tem sido unânime em considerar que não basta aos revertidos/oponentes singelas alegações genéricas de falta de culpa, indicando-se, a este respeito, os recentes Acórdãos do TCA – Norte, de 28.04.2016, no processo n.º 01504/12.8BEBRG, de 29.01.2015, no processo n.º 01307/10.4BEAVR e de 30.04.2014, no processo n.º 03694/10.5BEPRT, ou até no Acórdão do TCA – Sul, de 21.05.2015, no processo n.º 08445/155.
5 Todos disponíveis em www.dgsi.pt.
X.X. - Assim, entendemos que a douta Sentença fez uma incorrecta avaliação da prova produzida, considerando como provada a matéria dos Factos n.º 8, 9, 10 e 11, quando se impunha que fizesse precisamente o contrário, i.e., deveria ter considerado aqueles factos – 8, 9, 10 e 11 - como não provados,
Y.Y. - o que levaria a que o sentido da decisão tomada em 1.ª instância fosse precisamente o inverso, ou seja, ter sido a presente oposição considerada totalmente improcedente por não provada, conforme pugna a Fazenda Pública, aqui Recorrente.
Z.Z. - Padece assim a douta sentença sob recurso de erro de julgamento da matéria de facto e de direito, porquanto fez errónea interpretação dos factos e aplicação do disposto nas normas legais aplicáveis, designadamente do artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, pelo que deverá a mesma ser anulada e proferido acórdão que considere improcedente a presente oposição, assim se fazendo a desejada JUSTIÇA! (…)”

O Recorrido contra-alegou tendo formulado as seguintes conclusões:

A - A sentença recorrida não merece nem deve merecer qualquer censura, atenta a forma fundamentada, ponderada e equilibrada como foi proferida.
B - O Mmo Juiz “a quo”, atentos, entre outros, os princípios da imediação e da livre apreciação da prova, valorou e ponderou a prova produzida em audiência de discussão e julgamento e julgou, válida e legalmente, os factos como provados e como não provados.
C - Perante tal depoimento credível, conhecedor e isento, conjugado com a análise dos demais documentos existentes nos autos, o Mmo Juiz “a quo”, deu como provados os factos enunciados de 1º a 11º da sentença recorrida.
D - Com o presente recurso pretende o Recorrente que se considere como incorrectamente dados como provados os factos enunciados sob os números 8º, 9º, 10º e 11º da sentença recorrida.
E - No entanto, tal alegação não deve proceder uma vez que a prova de tais foi correctamente valorada e legalmente ponderada.
F - O Oponente alegou e provou toda a factualidade que envolveu a actividade da devedora originária e que desembocou na falta de meios financeiros para fazer face a algumas responsabilidades fiscais.
G - O Oponente/Recorrido alegou que fez suprimentos e prestou avales à devedora principal que permitissem manter a empresa a laborar, assegurando os postos de trabalho dos seus colaboradores e outros impostos anteriormente pagos.
H - Tal alegação não foi impugnada pelo Recorrente.
I - A testemunha ouvida em sede de julgamento referiu ao Tribunal, com conhecimento directo dos factos, que o Recorrente fez vários suprimentos à devedora originária.
J - Tais suprimentos certamente que estão reflectidos na contabilidade da empresa devedora, os quais registos contabilísticos o Recorrente deu como assentes e nunca questionou a sua veracidade.
K - O facto de a testemunha ter ajudado o irmão a distribuir o jornal entre os anos de 2009 e 2011, por si só não significa que só nestes anos teve contacto com a empresa devedora.
L - Na verdade, a testemunha já antes estava a par das dificuldades da empresa, bem como dos esforços que o Oponente fazia para manter a empresa a laborar.
M - É facto inverdadeiro e meramente especulativo que a testemunha apenas ajudasse o Oponente na distribuição do jornal, pois contactava com a realidade e as dificuldades diárias com que o jornal se deparava, tendo um conhecimento directo, factual e abrangente do que ali se passava.
N - Não sendo lícito concluir, como faz o Recorrente, que a testemunha não tivesse tido contacto com a contabilidade da empresa.
O - O Tribunal “a quo” nunca, em momento algum, olvidou que a testemunha é irmão do Oponente, antes atento o princípio da imediação e livre apreciação da prova, concluiu que não obstante esse grau de parentesco a testemunha abstraiu-se de tal facto, depondo de forma totalmente isenta, idónea e verdadeira, levando o Mmo Juiz “a quo” a dar-lhe total e indiscutível credibilidade.
P - A prova carreada para os autos é suficiente e hábil para que o Tribunal “a quo” tenha dado o facto constante no ponto 8º da sentença recorrida - como provado -.
Q - Naquele período entre 2009 e 2011 a testemunha ajudou na distribuição do jornal, no entanto tal não pode significar, como não significa, que não tenha tido conhecimento directo do que se passou antes, nos anos de 2007 e 2008, com a diminuição de receitas de publicidade, a necessidade de redução do pessoal e as dificuldades no pagamento dos salários.
R - Na verdade, já naqueles anos de 2007 e 2008, a testemunha tinha um conhecimento directo do que se passava no jornal, bem como das dificuldades que o mesmo atravessava, tal como bem apreendeu e julgou o Tribunal “a quo”.
S - Por outro lado o Tribunal “a quo” para dar este como os restantes factos como provados, teve necessidade de filtrar e ponderar o depoimento prestado pela testemunha, que se mostrou perfeitamente idónea, isenta e credível, bem ao contrário do que o Recorrente pretende fazer crer.
T - O Recorrente em momento algum impugnou a alegação de que as receitas da sociedade devedora diminuíram e se mostraram insuficientes para fazer face a algumas das obrigações tributárias.
U - A prova carreada para os autos é suficiente e hábil para que o Tribunal “a quo” tenha dado o facto constante no ponto 9º da sentença recorrida - como provado -.
V - O Oponente, ao contrário do que sustenta o Recorrente, carreou para os autos factos concretos que durante a sua gerência praticou no sentido de obviar ao incumprimento de algumas das obrigações tributárias.
X - Mas para além de alegar factos concretos, a testemunha arrolada pelo Oponente depôs de modo a provar o teor dessas mesmas alegações.
Y - Na verdade, referiu essa mesma testemunha que o Oponente, reduziu pessoal, de modo a manter alguns postos de trabalho e a reduzir custos fixos, procurou novos clientes, injectou dinheiro pessoal na empresa, sempre na esperança que o mercado publicitário melhorasse e o jornal não tivesse de encerrar, com todos os malefícios daqui decorrentes.
Z - Tal prova permitiu e sustentou que o Tribunal “a quo” pudesse concluir que o Recorrido efectuou uma gerência criteriosa e cuidada da sociedade devedora.
AA - Pelo que, bem andou o Tribunal “a quo” ao dar o facto constante no ponto 10º da sentença recorrida - como provado -.
AB - O Recorrente, tal como quanto aos suprimentos, não impugnou os avales dados à devedora originária.
AC - A testemunha ouvida nos autos tinha e tem conhecimento directo dos avales prestados pelo Oponente a essa sociedade.
AD - Por outro lado, também a insolvência do Recorrido e da Esposa não foi impugnada ou sequer questionada pelo Recorrente.
AE - Aliás, não se compreende como se pode agora vir questionar tal facto se dos autos consta a identificação de tal processo, o qual podia e pode ser consultado pelo Recorrente.
AF - Pelo que, o Tribunal “a quo” estava na posse de todos os elementos para dar, como deu, o facto constante do ponto 11º da sentença recorrida - como provado - .
AG - A matéria de facto dada como provada não é merecedora de qualquer censura, devendo a sentença recorrida ser integralmente mantida.
AH - Nos termos do preceituado no artigo 24º/LGT, os gerentes só podem ser responsabilizados subsidiariamente pelas dívidas da devedora principal quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
AI - Ora, no caso em apreço, face à matéria de facto dada como provada, o aqui Oponente não teve qualquer culpa quanto ao não pagamento das obrigações fiscais em causa.
AJ - O Recorrido tudo fez para que a sociedade cumprisse com todas as suas obrigações, fazendo uma gestão criteriosa de todo o movimento financeiro, chegando mesmo a injectar dinheiro pessoal na devedora principal.
AK - Apesar de todo o esforço do Recorrido, não se mostrou possível cumprir todas as obrigações, designadamente as obrigações fiscais em causa, sendo que muitas outras foram pagas.
AL - Assim, o incumprimento do pagamento das obrigações fiscais em causa resultou, única e exclusivamente, da impossibilidade financeira da devedora originária que não conseguiu angariar receitas suficientes.
AM - Nunca o Oponente praticou qualquer tipo de acto lesivo para a situação financeira da devedora originária.
AN - O aqui Oponente não teve culpa na insuficiência patrimonial da devedora originária para pagar as dívidas fiscais em apreço, sendo que o elemento “culpa” é um elemento essencial para a imputação da responsabilidade subsidiária, no que toca ao processo de reversão.
AO - Assim, faltando o elemento “culpa” não poderá ser imputada ao aqui Oponente/Recorrido a obrigação de pagamento das obrigações fiscais em apreço.
AP - Pelo que, outra não pode ser a decisão senão a absolvição do Oponente/Recorrido.
DO PEDIDO
Termos em que requer a V. Exa. se digne julgar improcedente por não provado, o presente Recurso, com a consequente manutenção integral da sentença recorrida, com as legais consequências.
Dada vista ao digno magistrado do Ministério Público emitiu parecer concluindo que o recurso merece provimento.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, e em errónea interpretação dos factos e aplicação no disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT.
3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:“(…):
1. 1.º - O Serviço de Finanças de (...) instaurou contra a sociedade executada originária V., LDA., NIPC: (…), o processo de execução fiscal (PEF) n.º1848201301013513 e apensos, por dívidas de IRC dos exercícios de 2010 e 2011, no valor global de € 5.970,98 - cf. teor da Informação do competente órgão de execução fiscal (OEF) a fls.18 do processo físico e docs. ínsitos nos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
2.º - Face à insuficiência do valor do veículo penhorado pelo competente OEF (Peugeot de mercadorias, motor a gasóleo do ano de 2007 – matrícula ….) e ao não pagamento das prestações requeridas para pagamento da dívida, em 12.07.2014, o competente OEF ordenou a preparação do processo para reversão contra o ora oponente (único gerente da sociedade executada).
3.º - O ora oponente foi notificado para o exercício da audição prévia - cf. doc. de fls.20 e 21 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
4.º - O oponente exerceu o seu direito de audição prévia em 28.08.2014 - cf. doc. de fls.23 a 25 do processo físico, cujo teor aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais.
5.º - Em 29.09.2014 foi proferido despacho de reversão, com os seguintes fundamentos:
1) Insuficiência de bens do devedor originário (artigos 23º/1 a 3 da LGT e 153º 1/2 b do CPPT), decorrente do resultado de penhoras efectuadas por este órgão de execução fiscal, sobre os potenciais bens conhecidos ao devedor originário, nomeadamente créditos, rendas, contas bancárias, imóveis ou veículos, do qual resultou o reconhecimento e entrega de valores insuficientes para pagar integralmente a dívida em questão, não sendo conhecidos mais bens penhoráveis.”. - cf. doc. de fls.26 do processo físico.
6.º - Em 06.10.2014 o competente OEF procedeu à citação do ora oponente - cf. doc. de fls.28 e 29 do processo físico.
7.º - A presente oposição à execução fiscal foi remetida via postal em 22.10.2014 ao competente OEF.
8.º - O ora oponente fez suprimentos à devedora principal - cf. Depoimento da testemunha R. .
9.º - A partir dos anos de 2007, 2008 e seguintes, as receitas de publicidade da devedora originária tornaram-se cada vez mais escassas e só com grande espírito de sacrifício se conseguiu manter a empresa a laborar, assegurando os salários dos seus trabalhadores - cf. depoimento da testemunha R. .
10.º - O oponente durante estes anos, esperançado na melhoria das condições de mercado, foi lutando para tentar cumprir com todas as obrigações da devedora originária - cf. depoimento da testemunha R. .
11.º - O ora oponente, mercê dos avales prestados, não tendo conseguido regularizar as responsabilidades decorrentes daqueles avales, foi declarado insolvente, juntamente com a esposa, por sentença de 15.05.2012, proferida no âmbito do processo n.º…, que correu termos pelo 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de…., a qual já transitou em julgado.
*
Não existem factos não provados com relevância para a apreciação da questão em apreço.
*
Motivação.
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também se encontram corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, conjugados com as regras da experiência e com o depoimento da testemunha R. , irmão do ora oponente, que, demonstrou um conhecimento direto da realidade da sociedade executada e do desempenho das funções do seu irmão na qualidade de sócio gerente da mesma.
O Tribunal ficou convencido de que a sociedade devedora originária a partir do ano de 2007 começou a sentir os reflexos da crise económica do país, tendo em conta que a sua fonte de receitas era exclusivamente a publicidade.
De acordo com o depoimento da testemunha, que se revelou sério e credível, o oponente tudo tentou para que a sociedade executada se mantivesse a laboral, nomeadamente aí investindo o seu capital próprio e reduzindo os trabalhadores.
De tal modo, que, a testemunha, irmão do oponente, entre os anos de 2009 a 2011, o ajudou na distribuição do jornal, porta a porta, depois do seu horário laboral.
O Tribunal ficou convencido de que o oponente não teve responsabilidade na falta de pagamento da liquidação que constitui a dívida exequenda.
Da prova produzida, nomeadamente do depoimento da testemunha que se revelou credível, (tanto mais que o que explicou ao Tribunal resulta de um conhecimento direto da situação), resultou que o oponente fez tudo para o cumprimento das respectivas obrigações, tendo esgotados todos os meios para o efeito, pois, não só procurou novos patrocinadores, como reduziu o pessoal, com vista a diminuir as despesas da sociedade executada, bem como colocou na empresa o seu património financeiro através de suprimentos e avales, que, originaram a sua insolvência pessoal.(…)”

3.2. A Recorrente inicia as suas conclusões de recurso invetivando contra o julgamento de facto efetuado em 1ª Instância, assacando-lhe erro, pugnando pela alteração de quatro dos factos dados como provados (8.º, 9.º, 10.º e 11.º) por entender que deveriam ser dado como não provados, face à sustentação factual da sentença recorrida.
A alteração pelo TCA da decisão da matéria de facto pressupõe que, para além da indicação dos pontos de facto considerados incorretamente julgados, sejam indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. (cfr. art.º 640.º e 662.º CPC).
Só se esses meios de prova determinarem e forçarem decisão diversa da proferida se pode concluir ter a 1ª instância incorrido em erro de apreciação das provas legitimando a correção pelo Tribunal Superior.
Assim, e tal como tem sido jurisprudencialmente aceite, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas (cfr. art.º 607º do CPC).
O juiz a quo, na decisão sobre a matéria de facto, aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que, na formação dessa convicção, não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que, em caso algum, podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio.
É, pois, pela fundamentação invocada para a decisão que normalmente se afere a correção do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Assentando a decisão da matéria de facto, no presente caso, na convicção criada no espírito do juiz e baseada na livre apreciação das provas testemunhal e documental que lhe foram apresentadas, a sindicância de tal decisão não pode deixar de respeitar a liberdade da 1ª instância, na respetiva apreciação.
É, pois, de concluir do expendido que a modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada e apreendida pela 1ª instância, só se justificará se, feita a reapreciação, for evidente a grosseira análise e valoração que foi efetuada na instância recorrida.
Analisadas as alegações de recurso, constata-se, desde logo, que a Recorrente cumpriu as regras impostas pelo artigo 640.º do CPC, condição indispensável para que este Tribunal possa apreciar o erro de julgamento da matéria de facto.
A Recorrente, insurge-se contra os pontos n.º 8.º a 11.º da matéria de facto provada, considerando que deveriam ser dados como não provados.
Apreciados os referidos pontos impugnados constata-se que não são factos mas sim juízos conclusivos. O juízo de facto é um julgamento baseado em análise isenta de valores ou interpretações subjetivas identificando somente aquilo que é visível comprovado ou objetivo.
No referido ponto n.º 8, diz-se que com base no depoimento da testemunha, o Oponente/ Recorrido fez suprimentos à devedora principal, porém, não se refere como alega a Recorrente onde, quando, como e em que circunstância e respetivos montantes, para além de nos autos não existir qualquer suporte documental.
No ponto n.º 9, diz-se que com base no depoimento da testemunha, nos anos de 2007, 2008 e seguintes, as receitas de publicidade da devedora originária tornaram-se cada vez mais escassas e só com grande espírito de sacrifício se conseguiu manter a empresa a laborar, assegurando os salários dos seus trabalhadores. Mais uma vez, não é mensurado o decaimento das respetivas receitas, por referência aos referidos anos ou indicada qualquer outra circunstância. Assim, este ponto encerra sem margem para dúvidas, um juízo conclusivo e não um facto.
No ponto n.º 10.º consta que o Oponente durante estes anos, esperançado na melhoria das condições de mercado, foi lutando para tentar cumprir com todas as obrigações da devedora originária. Também aqui não são descriminados factos ou atitudes do Oponente/Recorrido que demonstrem que praticou atos para cumprir as obrigações da executada.
Por fim, no ponto n.º 11.º consta que “oponente, mercê dos avales prestados, não tendo conseguido regularizar as responsabilidades decorrentes daqueles avales, foi declarado insolvente, juntamente com a esposa, por sentença de 15.05.2012, proferida no âmbito do processo n.º.., que correu termos pelo 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de …., a qual já transitou em julgado”
Relativamente aos avales prestados pelo Oponente/ Recorrido, não se concretiza se foram por dívidas da devedora principal se pessoais, o montante dos mesmos e as circunstâncias em que os mesmos foram efetuados.
Mais uma vez, estamos perante um duplo juízo conclusivo, uma vez que da prestação de avales e do seu incumprimento se retira a insolvência do Recorrente e da esposa, o que só deveria ser sustentado em prova documental (não existente nos autos).
Nesta conformidade, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto nos pontos números 8.º a 11.º pois deles, não decorrem factos positivos ou negativos que demonstrem a irresponsabilidade do executado na inexistência ou insuficiência dos bens da executada.
Nesta conformidade, dando provimento ao recurso eliminam-se do probatório os pontos supra-referidos.

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. A Recorrente não se conforma com a decisão, porquanto considera existir erro de julgamento facto e nessa medida o sentido da decisão seria inverso, devendo a ser considerada totalmente improcedente por não provada.
Alega a Recorrente que a sentença padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito, porquanto fez errónea interpretação dos factos e aplicação do disposto nas normas legais aplicáveis, designadamente do artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT.
Vejamos:
Desde logo importa relembrar que estamos perante a execução de dívidas de IRC de 2010 e 2011.
O regime de responsabilidade subsidiária aplicável é o vigente no momento em que se verifica o facto gerador dessa responsabilidade (artigo 12º do Código Civil), pelo que sendo as dívidas exequendas referentes aos referidos anos é de aplicar o regime previsto no artigo 24.º da LGT, que foi, aliás, o normativo invocado pelo órgão de execução fiscal no despacho de reversão e também pela sentença recorrida.
Prevê o artigo 24.º, n.º 1 da LGT que:“1. Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a). Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b). Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (…)”.
Como se relatou no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 10.10.2013, no âmbito do processo n.º 242/06.5BECBR: “Quanto às dívidas tributárias cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou quando o prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois desse exercício (mas em que o gerente ou administrador já não exercia funções à data em que a dívida foi posta à cobrança) o administrador ou gerente é responsável se tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para o seu pagamento. Neste caso, o ónus da prova da culpa recai, no entanto, sobre a Fazenda Pública. [alínea a) do n.º 1 do 24.º da LGT].
Quanto às dívidas cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, o administrador ou gerente é responsável pelo seu pagamento, salvo se provar que a falta de pagamento lhe não foi imputável. Neste caso, existe uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária. Ora, “esta presunção, apesar de contrária à regra geral da responsabilidade extracontratual prevista no artigo 487.º do Código Civil (CC), compreende-se neste caso, pois se o gestor não tiver culpa pela falta de pagamento ou de entrega do imposto ocorrida no período em que exerceu funções, ser-lhe-á fácil prová-lo (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., II volume, anotação 32 ao art. 204º, pág. 356.). Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida” - assim, por todos, acórdão do TCAN, de 29 de Outubro de 2009, Processo 228/07.2.”
Em síntese, a alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT comporta uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.
Demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora recai sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas coletivas ou ente fiscalmente equiparados “o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas” (art.º 32º da LGT).
Têm a jurisprudência entendido que a culpa consiste na omissão da diligência exigível, e exprime sempre um juízo de censura em relação à atuação do agente (por este, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, poder e dever ter agido de outro modo), tornava-se necessário que prove que administrou a empresa de molde a evitar que o seu património se tornasse insuficiente para a satisfação suas dívidas.
Sendo que, os deveres dos gerentes ou administradores que decorrem do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais "é a de dirigir, administrar, conduzir a gestão social, o que se deve concretizar, particularmente, no exercício da actividade para que a sociedade se constituiu.”
Assim, quem assume as funções de administrador ou gerente, deverá ter uma postura responsável e refletida, sem prejuízo da inerente discricionariedade técnica, no desempenho das suas funções, que se mostre, adequado ao alcance dos objetivos para que a sociedade se constituiu.
Tem a jurisprudência entendido que “No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art. 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).
II - Assim, sendo as dívidas provenientes de IVA [e IRC], ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.
III - Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
IV - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.
“Cfr. Acórdão TCA Norte n.º 00228/07.2BEBRG de 29.10.2019.
Neste mesmo sentido, entre muitos outros, acórdão TCA Norte n.º 0086/01 de 07.12.2005, 0032/02 de 23.02.2006, 0002/03, de 16.03.2006 e 0021/12 de 06.04.2006, 00242/06.5 BECBR de 10.10.2013, 00333/11.0BEAVR de 16.10.2014 e 0589/06.0 BEPNL de 16.10.2014, disponíveis em www.dgsi.pt.
No caso dos autos, sendo a situação enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, para que o Recorrido, afastasse a sua responsabilidade subsidiária teria que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passava pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
No caso dos autos, não é controvertido que o Recorrido exerceu a gerência de facto e que o prazo legal de pagamento da dívida exequenda terminou dentro do período do seu exercício na gerência da executada originária.
E tal resulta da conjugação da matéria provada nos pontos n.ºs 1.º a 6.º que o Recorrido foi gerente da sociedade executada e também não é controvertido na medida em que aquele admite tal facto na audição do despacho de reversão e na petição inicial nos pontos 4.º a 5.º.
O Recorrido, em sua defesa, na petição inicial alega que não teve culpa na insuficiência dos bens para pagamento das dívidas tributárias, uma vez que exerceu a gerência de facto criteriosa e cuidadamente, inclusive fez suprimentos à devedora originária prestou avales para obtenção de financiamentos que permitissem que a empresa se mantivesse em laboração. E por não ter sido cumpridas essas obrigações foi declarado insolvente conjuntamente com a sua esposa.
Mas que as receitas eram cada vez menores, acentuando-se a partir de 2007 e 2008, e que a falta de pagamento não é da sua responsabilidade, mas sim de factos externos, designadamente, uma conjuntura económica desfavorável no sector da atividade (publicidade).
Apesar de ter sido descritas situações que poderiam eventualmente conduzir à desresponsabilização do Recorrido, a verdade é que não resulta provado qualquer uma destas circunstâncias.
Com efeito, o facto gerador dos impostos reporta-se a 2010 e 2011, dos autos não resulta qualquer facto suscetível de afastar a presunção legal de culpa, nem mesmo existe um esforço probatório que a falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censurável do gestor.
Concluímos, pois, que não há nos autos prova alguma no sentido de que a falta de pagamento das dívidas de IRC ora em cobrança coerciva não seja imputável ao Recorrido. Nada logrando o Recorrido, demonstrar tal facto, no sentido de afastar a culpa pela não entrega do IRC, terá de ser responsabilizado pelas mesmas ao abrigo da alínea b) do art.º 24.º, n.º 1, da LGT.
Destarte, procedem as conclusões de recurso, concede-se provimento e revoga-se a sentença recorrida.

4.2. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário apropriando-nos, com a devida vénia das conclusões do Acórdão TCA Norte n.º 00228/07.2BEBRG supra citado:
I- No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (art. 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).
II - Assim, sendo as dívidas provenientes de IRC, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente.
III - Haverá, isso sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efetuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
IV - A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o oponente.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente revogar a sentença recorrida e julgar totalmente improcedente a oposição.

Custas pelo Recorrido, em ambas as instâncias, sem prejuízo do apoio judiciário.

Porto, 7 de maio de 2020


Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes