Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00083/14.6BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/13/2017
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Mário Rebelo
Descritores:OBJECTO DO RECURSO.
Sumário:1. O objecto do recurso é a impugnação da decisão judicial (art. 627º CPC).
2. Pelo que o recorrente terá de mobilizar os seus argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis da sentença sob pena de o decidido não poder ser alterado.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J..., Lda.
Recorrido 1:Direção Geral dos Impostos
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

J…, Lda, inconformada com a sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Mirandela que julgou totalmente improcedente a impugnação deduzida contra a liquidação de IRC e retenção na fonte no valor de € 23.451,52 com referência ao exercício de 2010, terminando as alegações com a seguintes conclusões:

1) É princípio estruturante do processo judicial tributário o princípio do Inquisitório pleno previsto nos artigos 13° do C.P.P.T. e 99º da L.G.T., nos termos do qual o Juiz deve ordenar as diligências necessárias para a descoberta da verdade material.
2) O Meritíssimo Juiz “a quo”, não apreciou todas as questões postas em crise pelos impugnantes, ora recorrentes, e aquelas que apreciou, fê-lo, salvo o devido respeito, de forma não fundamentada, sem conseguir dar respostas através dos factos e fundamentos de direito.
3) Para o efeito, o Tribunal “a quo” atendeu somente aos factos alegados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, designadamente aos constantes do Relatório elaborado pela Inspecção Tributária que promoveu a acção inspectiva e até transcreveu na Douta Sentença partes do Relatório da Inspeção Tributária (Páginas 4 a 8 da Sentença recorrida).
4) Na verdade, o Meritíssimo Juiz a quo não se pronunciou sobre os factos alegados e sobre a prova apresentada pela impugnante, todos absolutamente relevantes para a correta decisão da causa, designadamente, as constantes dos artigos 13° a 20º, 28° a 33°, 35° a 44º, todos da petição inicial.
5) É notório que as correcções que estiveram na origem da liquidação aqui impugnada carecem de fundamentação, nos termos do artigo 77°, n° 1 e 2, da Lei Geral Tributária.
6) A fundamentação do acto tributário de liquidação tem de externar-se mediante um discurso contextual, formal, acessível, congruente e suficiente, para permitir ao contribuinte entre conformar-se ou atacá-lo graciosa ou contenciosamente.
7) Mais, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões porque foi tomada a decisão, no caso, porque foram efectuadas as correcções (Nesse sentido, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 3ª Edição, nota 6, artigo 77°, página 384).
8) Com efeito, na falta de relevação das operações na contabilidade do sujeito passivo, cabia à Autoridade Tributária e Aduaneira a demonstração da real existência das operações tributáveis a partir dos recebimentos via TPA e, por isso mesmo, se e porque seriam ou não operações sujeitas a imposto em termos de IRC.
9) Porém, a Autoridade Tributária e Aduaneira não fez tal demonstração, preferindo antes, muito comodamente, ainda que de uma forma errada, presumir a existência das referidas operações na sua totalidade a partir dos dados fornecidos pelos TPAs.
10) Mas se assim procedeu a Inspecção Tributária, então haveria necessariamente de ter presumido a existência de tais operações, procedendo à respectiva determinação por métodos indirectos, nos termos do n° 2 do artigo 83° da Lei Geral Tributária, o que não fez, procedendo ao apuramento do imposto por métodos directos - correcções meramente aritméticas.
11) Por outro lado, existe um manifesto excesso na matéria tributável quantificada, e face aos elementos existentes no Relatório da Inspeção Tributária, conforme se verifica na página 20, onde se converte um prejuízo de - 66.877,79 €, num lucro tributável corrigido de 79.774,43 €.
12) Assim, como se verifica na página 20 do Relatório Final, o que se constata, de facto, é que a conversão do prejuízo declarado no exercício de 2010 no valor de 66.877,79 € para o lucro tributável corrigido de 79.774,79 €, representa um afastamento da matéria colectável superior a 30%, no caso, superior a mais de 100%.
13) Ao proceder à determinação do imposto devido por métodos directos, numa situação em que só lhe era permitido o apuramento através de métodos indirectos, a Autoridade Tributária e Aduaneira preteriu formalidade legal essencial do processo de liquidação, o qual deverá conduzir à sua anulação.
14) O absoluto desconhecimento a que a Sentença recorrida vota, substancialmente, os factos alegados pela impugnante, ora recorrente, menospreza os princípios do inquisitório e do contraditório, contido no artigo 58° da Lei Geral Tributária.
15) Como resulta do Relatório da Inspecção Tributária, as liquidações impugnadas foram efectuadas mediante correcções meramente aritméticas, mas apenas e só, a partir dos dados recolhidos nos extratos bancários dos terminais de pagamento Automático - TPA.
16) Verifica-se, assim, que os factos tributários que estiveram na origem da liquidação adicional, provêm de meros extratos bancários - TPA e que a Autoridade Tributária e Aduaneira os considerou na totalidade como vendas de sapatos.
17) Ora, a verdade é que, tais extratos bancários nunca poderão fundamentar directamente qualquer liquidação pelo que quaisquer liquidações que tenham apenas e só como fonte directa os extratos bancários dos TPA, são ilegais.
18) Com efeito, na falta de relevação das operações tributáveis na escrita da sujeito passivo, cabia à Autoridade Tributária e Aduaneira a demonstração da real existência das operações, já que lhe cabia o respectivo ónus probatório, ou não se estivesse em sede de correcções meramente aritméticas.
19) Porém, a Autoridade Tributária e Aduaneira não fez tal demonstração, preferindo antes, muito comodamente, presumir a existência de tais operações a partir dos extratos bancários.
20) Mas se assim foi, então haveria a Autoridade Tributária e Aduaneira necessariamente de ter presumido a existência de tais operações tributáveis, procedendo à respectiva determinação por métodos indirectos.
21) O que não fez, procedendo antes, ao apuramento do imposto por métodos directos - correcções meramente aritméticas, numa situação em que só lhe era permitido o apuramento através de métodos indiretos, nos termos do artigo 83°, n° 2 da Lei Geral Tributária (Neste sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 18 de Junho de 2015, Processo N° 05157/11, Recurso Jurisdicional Tributário, 2° Juízo – 2ª Secção (Contencioso Tributário), N° de Origem 401/08.6BECTB - Castelo Branco - TAF).
22) Ao proceder à determinação do imposto por métodos directos numa situação em que só lhe era permitido o apuramento através de métodos indirectos, a Autoridade Tributária e Aduaneira preteriu formalidade legal essencial do processo de liquidação, o qual conduz à anulação da liquidação de IRC, ano 2010.
23) A liquidação impugnada refere-se a sujeitos passivos cuja identidade é desconhecida, ou seja, faltam-lhe elementos essenciais, não se sabendo que operações são e, por isso mesmo, se e porque são operações sujeitas a imposto e até se foram sujeitos passivos ou não, que intervieram nas operações pretensamente tributáveis.
24) A Inspecção Tributária limitou-se a verificar os extractos das contas bancárias do ano de 2010, e depois considerou como vendas todos os depósitos bancários que a sujeito passivo terá realizado através dos terminais de pagamento automático - TPAs.
25) Contudo, tal procedimento, nunca poderá fundar por avaliação direta e sem necessidade de mais investigação, a liquidação de imposto de IRC.
26) Tanto mais que, por parte da sujeito passivo foi dada toda a colaboração e autorização ao acesso à informação e documentos bancários, cumprindo na integra o artigo 59° da Lei Geral Tributária.
27) Ora, a verdade é que, muitos dos depósitos bancários que a sujeito passivo realizou através dos terminais de pagamento automático - TPAs, foram feitos através do cartão de crédito das próprias testemunhas ouvidas na inquirição, que de uma forma clara explicaram ao Tribunal que cederam o seu próprio cartão de crédito pessoal, para que através deste meio e de uma forma rápida e urgente fosse possível dar liquidez à conta da Firma, que muitas vezes nem saldo disponível tinha para cobrir cheques entregues a fornecedores para pagamento de mercadoria.
28) Portanto, a Inspecção Tributária ao considerar como vendas todos os depósitos bancários que a sujeito passivo terá realizado através dos terminais de pagamento automático - TPAs, considerou também como vendas os próprios empréstimos.
29) Pelo que, qualquer liquidação que tenha por fonte directa apenas e só os movimentos dos depósitos efectuados nas instituições bancárias - TPA, no ano de 2010, será ilegal, e isto, porque nem todo o dinheiro realizado através dos terminais de pagamento automático - TPAs tiveram origem nos clientes da Firma e não há relevação das alegadas operações tributáveis, quais as datas das operações e quais os sujeitos passivos que intervieram nas operações em causa.
30) Ou seja, não há um nexo de causalidade entre os alegados factos tributáveis e os extratos bancários, no ano de 2010.
31) Na falta destes elementos essenciais - indeterminação dos factos tributários, do tempo dos factos tributários e dos sujeitos passivos, os actos de liquidação impugnados devem haver-se como nulos, em termos de correcções meramente aritméticas.
32) Quanto à liquidação de IRC referente a Retenção na Fonte, a Autoridade Tributária e Aduaneira não cumpriu o conteúdo mínimo do seu dever da descoberta da verdade material, ou seja, não provou, no presente caso, se o contribuinte tinha pago as rendas e, em consequência, efectuado as retenções na fonte, nos termos do n° 3 do artigo 8° do Decreto-Lei n°42/91, de 22 de Janeiro, como impunha e impõe o artigo 58° da L.G.T.
33) Portanto, a Inspecção Tributária não fez prova de que o contribuinte tenha efectuado o pagamento do aluguer pela cedência dos espaços em causa, existindo na sua contabilidade em 31-12- 20 10, um saldo devedor de 34.199,76€.
34) Pelo que, não tendo o contribuinte pago os alugueres dos espaços em causa, como é notório, não havia nem podia haver lugar às retenções na fonte com referência ao exercício de 2010.
35) Por último, a Impugnante, aqui recorrente, nunca foi validamente notificada das liquidações adicionais de IRC e de Retenção na Fonte impugnadas, como preceitua o artigo 45°, n° 1 da Lei Geral Tributária, o que constitui preterição de formalidade legal essencial.
36) E, não tendo sido notificadas à impugnante, ora recorrente, como, aliás, o confessa o Digno Representante da Fazenda Pública na sua Contestação através do seu n° 25 e 26, as liquidações adicionais de IRC e Retenção na Fonte não podem ter-se por eficazes, sendo, consequentemente, ilegais, porque a Fazenda Pública não cumpriu o disposto no n° 1 e 2 do artigo 41° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
37) A impugnante, ora recorrente, também não foi notificada do Documento de Fixação/Alteração em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas como preceitua o artigo 16°, n° 3 do Código do IRC, o que constitui, também, preterição de formalidade essencial.
38) É que, nos termos do n° 3 do artigo 103° da C.R.P., ninguém é obrigado a pagar impostos cuja liquidação e cobrança se não faça nos termos da lei.
39) Assim, na Douta Sentença, ao dar-se como correto a determinação do IRC por métodos diretos, numa situação em que só era permitido à Autoridade Tributária e Aduaneira apurar o imposto através de métodos indiretos, apreciou-se e decidiu-se mal, em clara violação dos normativos legais insertos nos artigos 87°, n° 1, alínea c) e 89° da Lei Geral Tributária. 40) Foram violados os normativos legais dos artigos 8°, 55°, 58°, 77°, n°s 1, 2 e 7 e 83°, n°2, 87°, n°1, alínea c) da L.G.T., artigo 41°, n° 1 do C.P.P.T. artigos 57° e 59° do Código do IRC, e ainda o n° 3 do artigo 103° da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V.Exas., entende a recorrente que deverá o presente Recurso ser julgado procedente e provado e, em consequência, seja proferida DECISÃO, na qual se reveja a matéria dada por provada e, em consequência, se revogue a DOUTA SENTENÇA recorrida, anulando-se por ilegais as liquidações adicionais de IRC e Retenções na Fonte, objecto dos autos, por falta de fundamentação e preterição de formalidades legais essenciais, a bem da JUSTIÇA.

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento da questão de facto e de direito ao julgar improcedente a impugnação e se omitiu pronúncia sobre diversas questões que lhe foram colocadas.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:
1. A Impugnante exerce desde 3/4/2007 a actividade “Comércio a retalho de calçado em estabelecimentos especializados”, com o CAE 47721, com enquadramento trimestral para efeitos de IVA e no regime geral para efeitos de IRC – Fls. 1 (que não é a 1º folha do PA) e 14/v do PA;
2. De 29/4/2013 a 12/7/2013 a contabilidade da Impugnante foi objecto de inspecção tributária, com a incidência temporal nos anos de 2009, 2010 e 2011 – Fls. 14/v do PA;
3. Dá-se aqui por reproduzido o projecto de relatório da inspecção (que posteriormente se tornou definitivo, ver infra), com o seguinte destaque:
- imagens omissas –
4. A Impugnante procedeu à retenção na fonte de IRC sobre os rendimentos prediais pagos à sociedade F…, SA, o montante de 358,95 €/ mês, referente aos meses de Janeiro a Junho, e de 394,84 €/mês, relativamente aos meses de Julho a Dezembro, todos do ano de 2010 – cfr. fls. 231/v a 237;
5. A Impugnante não declarou nem pagou à AT o imposto retido a que o facto anterior alude – Cfr. PA e PI, onde a Impugnante apenas defende que não pagou à “F…” quaisquer rendas, o que é desmentido pelas notas de débito enviadas por es ta sociedade à Impugnante, referidas nas fls . supra identificadas .
6. A Impugnante não contabilizou no ano de 2010 três facturas no montante total de 8.425,00 € - cfr. fl s . 18/v e anexo VII do PA;
7. Em 23/7/2013 a Impugnante foi notificada do projecto de relatório através do ofício n.º 1729, de 17/7/2013 e para exercer o direito de audição prévia – fl s . 244 e 245;
8. Em 31/7/2013 exerceu o direito de audição prévia por requerimento de fls. 246/v, que aqui se reproduz;
9. Após, a AT manteve a sua posição inicial, tornando definitivas as correcções apuradas no projecto de relatório – Fl s . 69 e 82;
10. Em data não alegada, por ofício sem referência ou data, a Impugnação toma conhecimento do relatório de inspecção – Fls. 21 ( doc. n.º 6 da PI);
11. Após, a Impugnante é notificada das liquidações adicionais de IRC, agora impugnadas – fls. 6 a 9 do PA e art.º 38.º, n.º 3 do CPPT, com a fundamentação infra melhor explicitada;
12. A AT deslocou-se à sede da Impugnante sita em Caravela, Mirandela, mas, nesse local, não existia qualquer sociedade com esse nome, a Impugnante detinha aí qualquer instalação física nem era conhecida pelos seus moradores – Fls. 17 do PA e depoimento de A…, inspectora tributária, autora do relatório de inspecção.
Com interesse para a decisão não se provou que:
a) Muitos dos depósitos bancários que a Impugnante recebeu através de TPA foram feitos através do cartão de crédito do próprio gerente, que, assim, efectuou empréstimos à sociedade.
Os depoimentos das testemunhas que depuseram este facto no sentido defendido pela Impugnante não se apresentaram consistentes, para além de não terem deposto sobre se o patrão emprestava ou não dinheiro à sociedade.
Como dos anexo IV e V do relatório se pode constatar, e não tendo a Impugnante identificado, na sua versão dos factos, quais eram os movimentos que correspondiam a pagamentos e quais os que correspondiam a empréstimos, alguns deles são de valores relativamente elevados. Ou seja, não vemos como é que a testemunha Justino… (trabalhador da Impugnante em 2010 e 2011), que afirmou ter emprestado dinheiro à sociedade Impugnante através do TPA, a pedido do seu patrão, poderia efectuar esses empréstimos superiores a 2.400,00 €, 1.500,00 €, 1.300,00 € ou 1.200,00, dos dias 2/1/2010 a 8/1/2010, ou em outros dias descriminados nas fls. 102 a 116/v, quando a própria afirmou que apenas tinha um salário de 500,00 € mensais.
Também inconsistente se revelou o depoimento de É…, cunhado do gerente da sociedade Impugnante, que declarou que o seu cunhado lhe pedia para fazer depósitos através do TPA, em montantes arredondados, e não em valores precisos - o que está em contradição com a listagem daqueles anexos.
Não se verifica nenhum movimento de valores arredondados, pelo menos, ao euro. Exs: (ano de 2010) 2.493,41 €, 526,94 €, 1.573,56 €, 224,05 €, 1.306,93 €, 171,22 € etc. (ano de 2011) 963,46 €, 530,12 €, 893,05 €, 67,18 €, 673,91 €, 154,73 € etc. Ora, não é usual que alguém empreste dinheiro em valores tão certos e precisos, que inclua os cêntimos, o que também retira credibilidade aos depoimentos daquelas testemunhas e dá consistência à versão da AT, de que aqueles montantes correspondem a pagamentos à Impugnante.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A Impugnante ora Recorrente foi sujeita a fiscalização externa de âmbito geral com incidência nos exercícios de 2009, 2010 e 2011 implicando correções ao lucro tributável declarado, sendo que para o exercício de 2010 tal correção foi no montante de € 146.652,22 o que implicou um lucro tributável corrigido de € 79.774,43 (o sujeito passivo declarou neste exercício - 66.877,79) por meras correções técnicas, baseando-se, sobretudo mas não só, nos elementos recolhidos através dos terminais de pagamento automático (TPA).
A Impugnante contestou a liquidação alegando, entre o mais, que os elementos recolhidos relativos ao recebimento através dos terminais de pagamento automático TPA no ano de 2010 no valor 443.323,26 através do Banco e 8.803,50 através do Banco… não podem fundamentar diretamente e sem necessidade de mais investigação as correções à matéria tributável. Presumindo a AT a existência de tais operações tributárias deveria ter procedido à determinação da matéria colectável por métodos indiretos, o que não fez.
Além disso, muitos dos depósitos bancários que o sujeito passivo recebeu através dos terminais TPA foram feitos através do cartão de crédito do próprio gerente que efetuou empréstimos à firma através desse meio para de uma forma rápida dar liquidez à conta da firma.
No que respeita à falta de retenção na fonte, o sujeito passivo não procedeu em 2010 ao pagamento de quaisquer rendas ao F…, pelo que não podia ter efetuado a retenção.
Além disso, a Impugnante não foi notificada da determinação da matéria colectável pelo Diretor de Finanças de Bragança como preceitua o art. 16º do CIRS, nem foi validamente notificada da liquidação adicional de IRC impugnada.
A sentença julgou totalmente improcedente a impugnação.

Mas a Impugnante não se conforma e recorre para este TCA identificando vários vícios da sentença: omissão de pronúncia (Conclusão 2, 3 e 4); as correções que estiveram na origem da liquidação carecem de fundamentação (Conclusões 5 a 9), errado método de tributação (Conclusões 10, 13, 20, 21, 22, 39) manifesto excesso na quantificação (Conclusões 11, 12, 27, 28, 29 e artigos 44º e 45 das alegações), omissão do dever de descoberta material (32 a 34), falta de notificação das liquidações adicionais e de retenção na fonte (35 e 36), falta de notificação do documento de fixação/alteração em sede de IRC como preceitua o art. 16º n.º 3 do CIRC (Conclusão 37, 38).

Começando pela omissão de pronúncia, alega a Recorrente que a sentença não se pronunciou sobre todos os factos relevantes para a decisão da causa designadamente os constantes dos artigos 13º a 20º, 28º a 33, 35º a 44º todos da petição inicial.

1ª Nos artigos 13º a 20º alega a Impugnante que do Relatório consta o recebimento através do terminal TPA em 2010, da quantia de 443.323,26 (do Banco…) e 8.803,50 (do Banco…), mas que isso não pode fundar as correções efetuadas. Por não ter sido relevadas tais operações na contabilidade do sujeito passivo, cabia à inspeção a demonstração da real existência das referidas operações. Não fez essa demonstração, preferindo comodamente presumir a existência de operações tributárias a partir dos TPAs. Procedeu a apuramento do imposto por métodos quando o devia ter feito por métodos indiretos.
2º Nos artigos 28º a 33º alega que nem todo o dinheiro recebido através dos terminais TPA teve origem nos clientes da firma e que algumas verbas correspondem a empréstimos do próprio gerente para de uma forma rápida e urgente dar liquidez à conta da firma. E que
2.1. Nem se sabe as datas das operações TPA e quais os sujeito passivos que intervieram nas operações em causa, pelo que na falta destes elementos essenciais a liquidação deve considerar-se nula.
2.2. Além de que houve erro e manifesto excesso na matéria tributável quantificada, porque no Relatório se quantificou uma diferença para mais no valor de € 41.395,08.

3º Nos artigos 35 a 44 alega que em as retenções na fonte não ocorreram porque no ano de 2010 não procedeu ao pagamento de quaisquer rendas ao F… Supermercados e que a AT não cumpriu o seu dever o seu dever de descoberta da verdade material no apuramento dessa matéria, tanto mais que a contabilidade da firma evidencia o não pagamento das rendas.

Ora sobre o 1º bloco de factos, o MMº juiz “a quo” fundamentou o seguinte:

“(…)
O art.º 75.° da LGT, com a epígrafe “Declaração e outros elementos dos contribuintes”, prevê que “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal” (n.º1).
Ora, se a Impugnante omitiu à contabilidade três facturas no montante total de 8.425,00€, e se o TPA é, como o nome indica, um mecanismo habitualmente usado pelas sociedades comerciais para receber pagamentos dos clientes, relativamente a bens que vendem ou serviços que prestam, então a Impugnante não poderá aproveitar a presunção do citado art.º 75.º da LGT – pelo que lhe caberá provar que os depósitos efectuados através do TPA não correspondem a pagamentos de bens, mas sim a empréstimos do seu sócio, ou, apesar de não ter sido alegado, de terceiros.
O n.º 3 do art.º 63.º-A da LGT, impõe às instituições de crédito e sociedades financeiras o dever de informação relativamente aos pagamentos que por seu intermédio sejam efectuados a determinados sujeitos passivos que auferem rendimentos da categoria B de IRS e IRC
No dizer de Leite de Campos e outros, in LGT, comentada e anotada ao preceito em causa (que, para o que interessa dirimir, se mantém substancialmente idêntico à actual redacção) com a imposição deste dever visa-se controlar a veracidade das declarações desses sujeitos passivos e possibilitar eventuais correcções das mesmas, ou apurar a matéria colectável, nos casos em que não existam declarações.
Sendo feitos através de cartões de crédito ou débito grande parte dos pagamentos a empresas que transaccionam bens directamente com o público, trata-se de uma forma potencialmente eficaz de determinar o volume de negócios dessas empresas.
(…).”

Como vemos, as questões suscitadas nos artigos em causa da pi foram analisadas na sentença. E quanto ao alegado erro do método de apuramento (por avaliação directa, quando no dizer da Impugnante deveria ter sido por avaliação indireta), também o MMº juiz se pronunciou como segue:
“A avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa aplicando-se, àquela, sempre que possível e a lei não prescrever em contrário, as regras de avaliação directa. – Cfr. Art.º 85.º da LGT
Há, portanto, uma preferência legal absoluta pela utilização de métodos de avaliação directa para a fixação da matéria tributável, que não é mais do que o corolário do princípio da tributação do rendimento real.
Os pressupostos de aplicação de métodos indirectos para determinar a matéria colectável, que tem como consequência a liquidação do imposto a pagar, é, de acordo com o disposto nos art.ºs 87.º e 88.º da LGT, e para o que o caso releva, a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto – 87.º, al. b).
Ora, neste caso, foi possível determinar directa e exactamente a matéria tributável pelos depósitos efectuados nas suas contas através dos TPA e através da consulta dos movimentos bancários realizados nos anos de 2009 a 2011, com autorização da Impugnante.
Portanto, não há nada a apontar ao método utilizado pela AT. Antes pelo contrário. Louva-se o esforço de apurar o rendimento real e efectivo da Impugnante e que constitui a matéria colectável, realizando, assim, o imperativo constitucional prescrito no art. 104º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. (Neste sentido Cfr. também, Alberto Xavier, in «Conceito e Natureza do Acto Tributário», Almedina, 1972, pág. 160/161.”

As partes transcritas da sentença demonstram que a Recorrente não tem razão, nesta parte, na invocação de omissão de pronúncia. E quanto ao alegado erro de julgamento a Recorrente não contraria os fundamentos que o MMº juiz desenvolveu na sentença, louvando-se no que alegou na douta petição inicial como se a questão não tivesse sido apreciada e decidida.

Ora, sendo objecto do recurso a impugnação da decisão judicial (art. 627º CPC), o recorrente terá de mobilizar os seus argumentos contra os vários fundamentos desfavoráveis da sentença sob pena de o decidido não poder ser alterado, na parte não impugnada Cfr. ac. do STA n.º 0508/13 de 15-05-2013 Relator: FRANCISCO ROTHES e o ac. do TCAN n.º 01806/09.0BEBRG de 15-02-2012 - Relator: Catarina Almeida e Sousa Sumário: III - Se, em sede de recurso jurisdicional, o Recorrente se alheou em absoluto das razões que fundamentaram a sentença recorrida, limitando-se a repetir o que já havia dito em sede de petição inicial de oposição, não ataca o julgado, pelo que não pode o Tribunal de recurso alterar o decidido pelo Tribunal a quo, já que a tal se opõe o preceituado no nº 4 do artigo 684.º do C.P.C.
.

Quanto ao segundo bloco de factos.
Na primeira parte do segundo bloco, a Impugnante alega que nem todo o dinheiro recebido através dos terminais TPA teve origem nos clientes da firma, sendo algumas das verbas correspondentes a suprimentos do sócio gerente “para de uma forma rápida e urgente dar liquidez à conta da firma”.

Mas também aqui a Recorrente não tem razão quanto à omissão de pronúncia, pois o MMº juiz pronunciou-se sobre a questão que lhe foi colocada:
“Defende a Impugnante que a liquidação em causa é ilegal porque a AT não demonstrou que os depósitos efectuados nas suas contas bancárias através dos terminais de pagamento automático (TPA), correspondam a proveitos ou a pagamentos de calçado.
Alega que esses depósitos bancários foram feitos através do cartão de crédito do próprio gerente, que efectuou empréstimos à sociedade.
(…)
A pergunta que se impõe é a de saber a quem cabe o ónus de provar que efectivamente os depósitos através do TPA correspondem a pagamento de bens que a Impugnante vendeu.
O art.º 75.° da LGT, com a epígrafe “Declaração e outros elementos dos contribuintes”, prevê que “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal” (n.º1).
Ora, se a Impugnante omitiu à contabilidade três facturas no montante total de 8.425,00€, e se o TPA é, como o nome indica, um mecanismo habitualmente usado pelas sociedades comerciais para receber pagamentos dos clientes, relativamente a bens que vendem ou serviços que prestam, então a Impugnante não poderá aproveitar a presunção do citado art.º 75.º da LGT – pelo que lhe caberá provar que os depósitos efectuados através do TPA não correspondem a pagamentos de bens, mas sim a empréstimos do seu sócio, ou, apesar de não ter sido alegado, de terceiros.
(...)
Não tendo a Impugnante provado o que alega, designadamente no que diz respeito aos empréstimos do seu sócio gerente, improcede a impugnação com fundamento nesta causa de pedir.”

Donde resulta que sobre esta matéria não foi omitida pronúncia e que o decidido não pode alterar-se uma vez que a Recorrente também aqui não contraria a argumentação da sentença.

No segundo parágrafo do segundo bloco, diz a Recorrente que a liquidação é nula porque “não há relevação das alegadas operações tributáveis, quais as datas das operações e quais os sujeitos passivos que intervieram nas operações em causa”.
O MMº juiz “a quo” não se pronunciou sobre esta nulidade específica da liquidação.

No terceiro parágrafo do segundo bloco de factos, a Recorrente invoca omissão de pronúncia sobre o excesso na quantificação da matéria tributável.
Este excesso, diz a Impugnante no art. 32º da douta petição inicial, verifica-se na página 8 do RIT que apurou os recebimentos através de TPA nos seguintes montantes sem IVA: 367.721,61 do Banco… e 7.275,62 do Banco… num total de € 374.997,23, enquanto os valores das vendas contabilizadas são do montante de € 319.608,90 pelo que assim existe uma diferença de 55.388,33 = (374.997,23-319.608,90). Assim, é notório que existe um erro manifesto nas correções descritas no ponto III – 4 página 20 do Relatório: onde consta o valor de € 96.783,41 deve constar o valor de € 55.388,33. Portanto, existe uma diferença para mais no valor de € 41.395,08.
O MMº juiz não se pronunciou sobre esta questão.

Quanto ao terceiro bloco de factos, diz a Recorrente não ter efetuado o pagamento de quaisquer rendas ao “F… “ pelo que assim também não efetuou qualquer retenção na fonte.

Esta questão foi apreciada pelo MMº juiz nos seguintes termos:
“O sujeito passivo é, para o que interessa realçar, a pessoa colectiva que, nos termos da lei, está vinculada ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável – cfr. art.º 18.º, n.º 3 da LGT
Nos termos do art.º 20.º, n.º 1 da LGT a substituição tributária verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte. O n.º 2 acrescenta que essa substituição é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido.
Constituem retenção na fonte as entregas pecuniárias efectuadas por dedução nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular pelo substituto tributário. Cfr. Art.º 34.º da LGT
O regime jurídico de substituição tributária concretiza-se, então, numa relação de tipo triangular entre o substituto, a AT e o contribuinte ou substituído.
Esta substituição tributária dá lugar a uma responsabilidade tributária quando, e para o que é de relevante para estes autos, o imposto for retido e não entregue nos cofres do Estado, caso em que o substituto é o único responsável, ficando o substituído desonerado de qualquer responsabilidade pelo seu pagamento. Cfr. Art.º 28.º, n.º 1 da LGT
Neste caso a impugnante/substituta tributária pagou rendas à sociedade F… S.A/ (substituída tributária). Esta sociedade procedeu à dedução das retenções na fonte em sede de IRC. Contudo, a Impugnante não fez a declaração nem o pagamento respectivo, contrariamente ao disposto no art.º. 94.º do CIRC e 119.º do CIRS, por remissão do art.º 128.º do CIRC.
Improcede, assim, a impugnação com fundamento na causa de pedir ínsita nos art.ºs 35.º a 45.º da PI”.

Uma vez que a questão foi apreciada, não ocorre omissão de pronúncia. Mas sobre esta matéria, a Recorrente impugna o acerto da prova alcançada que consta dos nºs nº 4 e 5 dos factos provados, cujo teor é o seguinte:

“4. A Impugnante procedeu à retenção na fonte de IRC sobre os rendimentos prediais pagos à sociedade F…, SA, o montante de 358,95 €/ mês, referente aos meses de Janeiro a Junho, e de 394,84 €/mês, relativamente aos meses de Julho a Dezembro, todos do ano de 2010 – cfr. fls. 231/v a 237;
5. A Impugnante não declarou nem pagou à AT o imposto retido a que o facto anterior alude – Cfr. PA e PI, onde a Impugnante apenas defende que não pagou à “F…” quaisquer rendas, o que é desmentido pelas notas de débito enviadas por esta sociedade à Impugnante, referidas nas fls. supra identificadas.”

A Recorrente contesta a prova destes factos remetendo para os documentos de fls. 302/367 (corresponde a fls. 302 de 367) e 315/367 (corresponde a fls. 315 de 367) que, no seu entender, provam o contrário.

O documento de 302 de 367 está junto aos autos s fls. 217 e é constituído pelo ofício n.º 1112 no qual a AT pede, entre o mais, ao Pingo Doce
“(...)
Documento comprovativos (anuais) emitidos, nos termos do artigo 119º n.º 1, alínea b) do CIRS por remissão do art.º 128º do CIRC, pela J… Lda. Das importâncias de IRC retido na fonte relativamente aos rendimentos relativos à cedência sede exploração do referido espaço dos 2009, 2010 e 2011 (...)”.
Neste ofício foi manuscrita a palavra “não recebemos”.

A fls. 316 de 367 (fls. 224 dos autos) consta o extrato da conta 62611 da Recorrente com um saldo negativo de € 34.199,76.

Os factos n.º 4 e 5 foram provados com base nos documentos de fls. 231/v a 237. Estes documentos constituem notas de débito emitidas pelo Pingo Doce à “J…” no valor de € 3.419,98 (cedência de exploração no montante de € 2.392,99 + 456,99 de despesas comuns acrescido de IVA) mas no final de cada um deles está escrito “Deverão V. Exa(s) liquidar-nos nos próximos 10 dias o valor indicado na presente Nota de Débito ao Pingo Doce Distribuição Alimentar, S.A. através do NIB...”.

Ou seja, o conteúdo destas notas de débito permitem concluir que na data em que foram emitidas os pagamentos ainda não tinham sido efetuados (por isso foram emitidas notas de débito).

Todavia, o MMº juiz considerou o seu conteúdo relevante para prova de que os pagamentos tinham sido efetuados e feitas as retenções.

Mas parece claro que tais notas não têm a aptidão probatória que o MMº juiz lhe conferiu. A não ser que sejam conjugadas com outros elementos probatórios que desconhecemos e de que não há notícia nos autos, delas não podemos retirar que foi efetuado qualquer pagamento/retenção.

Mas parece certo que o beneficiário da retenção (Pingo Doce) procedeu à dedução das retenções na fonte em sede de IRC nas respetivas declarações modelo 22 apresentadas por esta sociedade.

Se de um lado se diz que não houve retenção e do outro se procede como tendo havido, “quid juris”?

A questão terá que ser resolvida através da prova e das regras que a enformam. Como referimos, os documentos identificados pelo MMº juiz como relevantes para a prova da retenção não têm idoneidade probatória para tanto. E também não há nos autos qualquer outra prova que nos permita com segurança saber se as retenções foram ou não efetuadas, pelo que os autos deverão baixar à 1ª instância para a necessária averiguação.

Entrando agora na análise das outras questões submetidas a recurso, a Impugnante ora Recorrente, defende nunca ter sido validamente notificada das liquidações (de IRC e da retenção).

Mas sobre esta matéria, também o MMº juiz “a quo” se pronunciou nos seguintes termos:
“Contrariamente ao que a Impugnante alega quando invoca o art.º 45.º da LGT ( art.º 46.º a 63.º da PI), a liquidação de IRC não caducou porque as notificações das liquidações em causa ocorreram conforme a lei determina: Foram efectuadas apenas por carta registada porque, apesar de ter por objecto decisões susceptíveis de alterar a situação tributária da Impugnante, esta já tinha sido anteriormente notificada para efeitos do exercício do direito de audição – art.º 38.º, n.ºsº 1 e 3 do CPPT.
Improcede também a pretensão da Impugnante fundamentada nesta causa de pedir.”

A Impugnante discorda do decidido, mas não ataca os fundamentos da sentença que decidiram o contrário. Louva-se na “confissão” do Exmo. Representante da Fazenda Pública nesse sentido nos artigos 25 e 26 da contestação, mas estes artigos não contêm qualquer “confissão” antes se defende que a “...falta de recebimento de qualquer aviso ou notificação não é oponível à Administração Tributária nos casos de incumprimento da obrigação de participação de qualquer alteração, no prazo de 15 dias, do domicílio (...)
De resto, os constrangimentos e a alegada falta de notificação, a existir, parecem ter sido, intencionalmente, provocados pela impugnante ao proceder à alteração da sede social para domicílio físico inexistente” (artigos 26 e 27 da contestação).

De resto, o facto provado n.º 11 também regista que
“11. Após, a Impugnante é notificada das liquidações adicionais de IRC, agora impugnadas – fls. 6 a 9 do PA e art.º 38.º, n.º 3 do CPPT, com a fundamentação infra melhor explicitada“.

Ou seja, quer pelos factos provados não devidamente impugnados (art. 640º do CPC), quer pelos fundamentos da sentença também não devidamente não contrariados, a alegada falta de notificação das liquidações invocada neste recurso não procede.

A Recorrente defende ainda que as correções não se encontram fundamentadas (Conclusões 5 e segs.) como aliás também tinha defendido nas conclusões a) e b) da douta petição inicial, dizendo entre o mais, que as correções que estiveram na origem da liquidação aqui impugnada carecem de fundamentação nos termos do artigo 77º n.º 1 e 2 da Lei Geral Tributária.
O MMº juiz “a quo” também não se pronunciou sobre esta questão.

Nas conclusões 37 e 38 a Recorrente alega não ter sido notificada do documento de fixação/alteração em sede de IRC como preceitua o art.º 16º/3 do CIRC. Vício que também alegou no art. 46º da douta petição inicial.
O MMº juiz não se pronunciou sobre esta questão.

Como vemos, o MMº juiz não só não se pronunciou sobre várias questões como em relação à instrução para a prova de determinados factos da causa ficou aquém do que se aceita ser satisfatório.

Os autos deverão assim, baixar ao tribunal “a quo” a fim de que se proceda a melhor e mais completa indagação incluindo, se necessário averiguar junto do substituído se as retenções foram ou não efetuadas mediante cópia do recibo de quitação ou transferência bancária dos valores sujeitos a retenção, ou outras diligências que o tribunal considere adequadas, tudo nos termos do art. 13º do CPPT.

Por força da remessa dos autos ao tribunal “a quo” para instrução e nova sentença, consideramos inútil declarar a nulidade da sentença por omissão de pronúncia nos termos do art. 615º/1-d) do CPC, e apreciação nesta instância das questões omitidas - se para tanto os autos fornecessem os elementos necessários (art. 608º/2 "ex vi" do art.º 663º/2 CPC).

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à primeira instância para melhor instrução proferindo-se nova sentença desprovida dos apontados vícios, se nada mais obstar.
Sem custas.
Porto, 13 de julho de 2017.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira