Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00280/15.7BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/18/2018
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:NULIDADE PROCESSUAL, OMISSÃO DE ALEGAÇÕES, ARTIGO 120.º DO CPPT
Sumário:
I - Tendo havido junção ao processo de documentos, com relevo probatório (documentos juntos pela impugnante e processo administrativo), impunha-se a notificação das partes para alegarem – cfr. artigo 120.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
II A omissão da notificação das partes para alegações escritas, naquelas circunstâncias, porque susceptível de influir no exame e decisão da causa, constitui nulidade processual determinante da anulação dos pertinentes termos do processo (artigo 195.º do Código de Processo Civil e artigo 98.º n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário). *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:EP, Lda
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Anular a sentença recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório
A EP, Lda., pessoa colectiva n.º 5…58, com sede na Rua N…, 4870-160 Ribeira de Pena, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 17/05/2017, que julgou improcedente a impugnação judicial do acto de fixação do valor patrimonial, praticado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, com referência ao artigo 1723 da freguesia de VB, no valor de €356.680,00.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
“FACTOS PROVADOS
1. A recorrente entende que os factos a), b) e c) considerados como não provados devem ser considerados como provados uma vez que não foram impugnados e ao contrário do afirmado pelo tribunal a quo não resulta o inverso dos artigos 45, 48 e 49 da PI.
2. A recorrente entende que deve ser dado como facto provado 34 que “O objeto da avaliação impugnada foi o terreno, a sapata em betão e a torre dos aerogeradores. (cfr. doc. nº 10 da PI)”.
3. A recorrente entende que deve ser dado como facto provado 35 que “A torre é vendida conjuntamente com o aerogerador como um todo que é considerado como “uma máquina” a qual necessita de se conformar com a legislação europeia sobre máquinas” (conforme decorre do doc. nº 13 emitido pela DG Crescimento da Comissão Europeia).
4. A recorrente entende que deve ser dado como facto provado 36 que “O custo de construção da sapata do aerogerador é de Eur. 24.866,57” (cfr. Doc. 10 da PI)
Indeferimento da prova testemunhal
5. O tribunal a quo decidiu indeferir a produção de prova testemunhal não obstante a mesma ser crucial no presente processo porque a solução jurídica depende da resposta que for dada à questão factual da caracterização dos aerogeradores como “construção” ou “equipamento” pois só assim se poderá subsumir a realidade avaliada ao conceito de prédio constante do art. 2º CIMI.
6. Com a prova testemunhal a recorrente pretendia demonstrar que: (i) não existe qualquer efetiva utilização de utilidades urbanísticas prestadas pelo município (o que equivale à tributação em sede de IMI em violação do principio da equivalência ou benefício) pelo que era essencial a prova da inexistência de quaisquer infraestruturas, bens ou serviços municipais na área em que foram instalados os aerogeradores o que atenta a circunstância de se tratar de factos negativos só poderia ser convenientemente demonstrado por prova testemunhal das pessoas que acompanharam a instalação dos aerogeradores e que continuam a participar na respetiva manutenção e que (ii) em face das características próprias dos aerogeradores estes nunca poderão ser qualificados como “prédio” nos termos e para efeitos de IMI porquanto se trata apenas de equipamentos (isto é, maquinaria) e não de “construções” e mesmo que assim não se entendesse relativamente à sapata do aerogerador isso seria inequívoco em relação à torre do aerogerador que é manifestamente um componente do equipamento e que no entanto foi sujeito a avaliação como prédio pela AT.
7. Nos termos do art. 11º da LGT “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis” e nos termos do art. 9º do Código Civil “na fixação do sentido e alcance da lei, o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” pelo que quando, no art. 2º CIMI, o legislador circunscreveu o conceito de prédio aos casos de “águas, plantações, edifícios ou construções” tornou essencial que do ponto de vista factual a realidade a qualificar como prédio possa ser tecnicamente qualificada como “águas, plantações, edifícios ou construções” o que não acontece no presente caso e a prova testemunhal poderia provar isso mesmo.
8. O tribunal a quo incorre em erro de qualificação técnica da realidade avaliada ao afirmar sem qualquer base ou suporte factual existir uma construção não obstante a lei não definir o conceito de construção para efeitos fiscais e não existir nenhum facto nos autos que possa conduzir o tribunal a essa conclusão.
9. Como a lei não definiu os conceitos de “construção” ou de “equipamento” terá de ser feita prova dessa qualidade do ponto de vista técnico e apesar da prova documental já junta aos autos demonstrar que os aerogeradores (como um todo) são equipamentos, a prova testemunhal sobre a qualificação técnica dos aerogeradores é essencial para se poder aplicar a lei (no caso o art. 2º CIMI) uma vez que a discordância entre as partes está exatamente no facto de a AT admitir que certos componentes dos aerogeradores são equipamentos (por exemplo, pás, nacelle e posto de transformação) mas não admitir que a sapata e a torre sejam também equipamentos.
10. A factualidade alegada pela Recorrente, a ser dada como provada, teria influência decisiva para a boa decisão da causa, nomeadamente no que respeita à legitimidade da imposição de IMI sobre os aerogeradores da Recorrente à luz do princípio da equivalência e para a qualificação da realidade avaliada como “equipamento” pelo que não existe qualquer impertinência, inutilidade ou desnecessidade da prova testemunhal requerida pela Recorrente, o que deveria ter conduzido à sua admissão.
11. Existindo nos autos factos cuja prova era essencial para verificar se o proprietário dos aerogeradores, beneficia efetivamente de algum bem ou serviço público (único critério para apurar se o critério legitimador do IMI - o princípio da equivalência – está ou não verificado no caso concreto e portanto se autoriza ou não a tributação em sede de IMI dos aerogeradores do ora recorrente) e bem assim se os aerogeradores instalados no terreno devem ser considerados como equipamentos ou como construções para efeito de determinação da sua qualidade ou não de “prédio” nos termos do CIMI, essencial seria que os mesmos fossem dados como provados, sendo a prova testemunhal necessária para permitir que a recorrente cumprisse o respetivo onus probandi.
12. O indeferimento da produção de prova testemunhal é ilegal uma vez que a questão a decidir nos autos não é apenas de direito mas também de facto e esse indeferimento prejudicou o direito à prova da Impugnante, razão pela qual se impõe a revogação do despacho do meritíssimo Tribunal a quo que dispensou a produção de prova testemunhal e determinou a não realização da fase de instrução do processo, passando imediatamente para a fase de alegações das partes.
NULIDADE PROCESSUAL SECUNDÁRIA: NÃO NOTIFICAÇÃO PARA ALEGAÇÕES
13. Não tendo a Impugnante sido notificada para alegações, ocorreu no processo uma omissão suscetível de influir no exame e decisão da causa, o que determina a anulação da sentença nos termos do art. 195º do CPC e art. 2º, alínea e), do CPPT, que tem como consequência a anulação dos termos processuais subsequentes.
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
14. Padece de manifesta falta de fundamentação a decisão do tribunal a quo que afirma, em obter dictum, sem qualquer base factual ou justificação técnica que o aerogerador é uma construção, sendo certo que essa é a questão essencial que se visa discutir no pedido principal da presente ação pelo que se impunha uma maior fundamentação por parte do tribunal de modo a incluir as razões pelas quais se conclui que a realidade avaliada é uma construção e porque razão se qualifica como tal uma realidade cuja qualificação é controversa entre as partes de modo a garantir só se assim se dando cumprimento à obrigação de fundamentação expressa, clara, coerente e suficiente.
15. A sentença recorrida viola de forma manifesta e crassa o disposto no art. 205º nº 1 da CRP e art. 154º nº 1 e 2 do CPC aplicável ex vi art. 2º CPPT pondo em causa o exercício do direito ao recurso da recorrente que desconhece as razões pelas quais o tribunal a quo decidiu como decidiu sobre a qualificação dos aerogeradores como “construção” e contraria o dever de transparência e de reflexão decisória das sentenças, limitando-se a impor em vez de convencer porquanto existiam nos autos diversos documentos (por exemplo os doc. nº 3 e 4 da PI) que militavam no sentido de considerar o aerogerador como um equipamento e que portanto exigiam que o tribunal a quo pelo menos se pronunciasse sobre os mesmos, nem que fosse para afastar a sua aplicabilidade e o juízo técnico que deles se extrai.
16. Tendo o tribunal a quo respondido ao pedido principal da ação pela mera afirmação de que os aerogeradores são construções sem aduzir um único argumento para essa conclusão, a sentença padece de manifesta falta de fundamentação nos termos da lei e da Constituição da Republica Portuguesa e como tal é nula nos termos do art. 615º nº 1 b) ex vi art. 2º CPPT.
OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
17. A sentença recorrida deu como provado que “O equipamento E....., é equipamento de conversão da energia cinética em energia elétrica constituído por 4 grandes grupos: as pás, o rotor, a nacelle e a torre” e que “A torre é um equipamento do aerogerador, que contém em si mesmo um conjunto de estruturas elétricas que são indispensáveis à produção de energia elétrica de fonte eólica, sendo que não existe aerogerador (enquanto equipamento de produção de energia elétrica) se o mesmo não for dotado de uma torre”.
18. O tribunal foi categórico a afirmar que face à prova documental, o aerogerador E-40 e a respetiva torre são meros equipamentos pelo que terá de se concluir que não existe qualquer construção que possa justificar as avaliações impugnadas porque aquilo que foi avaliado foram as sapatas e torres de aerogeradores E..... E-40, e estes, de acordo com os factos dados como provados são meros equipamentos pelo que não caem no âmbito da incidência objectiva do IMI prevista no art. 2º CIMI que apenas considera como prédios “as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza”.
19. O tribunal a quo ignorou os factos dados como provados e afirma na decisão que “o aerogerador é uma construção” para daí retirar a incidência de IMI e concluir pela improcedência da impugnação pelo que os fundamentos da decisão (a afirmação nos factos provados de que o aerogerador é um equipamento) estão em contradição com a decisão (consideração do aerogerador como construção sujeita a IMI nos termos do art. 2º CIMI) o que determina a nulidade da sentença nos termos do art. 615º nº 1 c) CPC.
20. Considerando o tribunal a quo que os aerogeradores foram mal classificados pela AT porque são prédios de tipo “industrial” então impunha-se concluir que houve violação de lei por ter sido utilizado nas avaliações o método do custo em vez da fórmula prevista no art. 38º CIMI o que implicaria concluir pela ilegalidade das avaliações e imporia a anulação das mesmas.
21. Como o Tribunal a quo reconhece, o pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a ação, ou seja, a anulação das avaliações, independentemente do fundamento jurídico que seja usado para fundamentar essa anulação, pelo que não pode o tribunal invocar o principio da vinculação temática para se eximir a decidir sobre a ilegalidade das avaliações derivada de fundamento não alegado pela Impugnante mas suscitado pelo Tribunal a quo, pois compete aos tribunais conhecer oficiosamente do direito (jura novit curia – art. 5º nº 3 CPC ex vi art. 2º CPPT).
PEDIDO SUBSIDIÁRIO: OMISSÃO DE PRONÚNCIA
22. Existe manifesta omissão de pronúncia do tribunal a quo ao não apreciar o pedido subsidiário da Impugnante que visava discutir o VPT concretamente fixado e que, no seu entender, não poderia exceder para cada aerogerador Eur. 24.866,57 uma vez que a admitir a existência de um prédio, este só poderá corresponder à sapata dos aerogeradores (e nunca à respetiva torre que aliás consta dos factos provados como sendo equipamento).
23. A omissão de pronúncia determina a nulidade da sentença nos termos do art. 615º nº 1 d) CPC
ex vi art. 2º CPPT o que deve ser declarado com todas as consequências legais.
24. Nos casos, como o presente, em que o titular do terreno (neste caso baldio) não é o mesmo do da alegada construção nunca se poderá adicionar o valor do terreno ao VPT apurado por referência ao método do custo porque isso implicaria criar uma situação de dupla tributação da mesma realidade na esfera do proprietário do terreno e na esfera do promotor que instalou o equipamento nesse terreno, devendo ao invés interpretar-se o art. 46º CIMI em conformidade com o espírito e a ratio do CIMI o qual apenas prevê a tributação do património a proprietários e titulares de direitos reais menores, pelo que apenas se poderá adicionar o valor do terreno às avaliações feitas nos termos do art. 46º nº 2 quando o titular do terreno e da construção são uma e a mesma pessoa.
25. A AT incluiu no cálculo do VPT um valor para a torre mas o valor da torre não pode ser incluído no cálculo do VPT pois como resulta da factualidade dada como provada a torre é parte do equipamento que compõe o aerogerador, tem funções próprias na mecânica do aerogerador e portanto não é considerada, do ponto de vista técnico, uma “construção”.
26. O VPT apurado em sede de 2ª avaliação inclui um valor para a torre do aerogerador pelo que é ilegal e como tal deveria o Tribunal a quo ter anulado as avaliações impugnadas em vez de não se pronunciar sobre a inclusão do valor da torre no cálculo do VPT que era uma das questões essenciais a decidir na presente impugnação pelo que, a título subsidiário, deverá o Tribunal ad quem, conhecendo da procedência dos argumentos da Impugnante quanto a este ponto, determinar a anulação das avaliações impugnadas também porque incluem indevidamente o valor das torres dos aerogeradores que constituem meros equipamentos componentes dos mesmos.
27. O custo de construção da sapata de cada um dos aerogeradores foi de Eur. 24.866,57 pelo que a considerar algum VPT do aerogerador este não poderia ultrapassar o valor real, devidamente documentado nos autos, da sapata/fundação assim se cumprindo as regras do CIMI relativas ao método do custo, o que impõe concluir que as avaliações impugnadas são ilegais por excederem aquele valor e como tal devem ser anuladas.
CUSTAS
28. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o pedido de dispensa do pagamento do remanescente das taxas de justiça nos termos do art. 6º nº 7 do RCP.
29. Atenta a conduta processual das partes e a simplicidade das questões apreciadas pelo Tribunal a quo não se justifica a aplicação de qualquer remanescente da taxa de justiça já paga.
30. O presente caso é manifestamente uma situação em que se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo processo, ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do RCP, pois o montante da taxa de justiça devida se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado e por a questão decidenda não ter especial complexidade, não sendo sequer nova ou inédita para o tribunal que a decidiu.
31. Não tendo o Tribunal a quo se pronunciado sobre o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça verifica-se a omissão de pronúncia determinante de nulidade da sentença nos termos do art. 615º nº 1 d) CPC ex vi art. 2º CPPT o que deve ser declarado com todas as consequências legais.
32. Por dever de patrocínio a Recorrente requer a dispensa do remanescente da taxa de justiça.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência ser revogada a sentença recorrida, assim se fazendo o que é de Lei e de Justiça!
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A Recorrida não contra-alegou.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida enferma (i) de nulidade processual nos termos previstos no artigo 195.º do CPC, decorrente da falta de notificação às partes para apresentarem alegações escritas, nos termos do artigo 120.º do CPPT; (ii) de nulidade, por omissão de pronúncia, (iii) e se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito, por errada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis à situação dos autos e, consequentemente, ao ter concluído pela improcedência da impugnação.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Factos provados:
1. Por contrato-promessa de constituição de direito de superfície celebrado em 19-04-2001, a Junta de Freguesia de VB prometeu constituir o direito de superfície a favor da EHATB, S.A. (cf. doc. n.º 2);
2. A EHATB, S.A. cedeu a posição contratual de promitente superficiária à Impugnante (cf. doc. n.º 2).
3. Naqueles terrenos, a impugnante instalou, desde 2003, um aerogerador da marca E....., modelo E-40 - doc. 3 da PI e fl. 1/v do PA;
4. Aqueles aerogeradores E....., são equipamentos de conversão da energia cinética em energia eléctrica constituídos por 4 grandes grupos: as pás, o rotor, a nacelle e a torre (cfr. doc. 3 e 4 da PI
5. O rotor corresponde ao mecanismo capaz de permitir que o disco varrido pelas pás esteja sempre em posição perpendicular ao vento, sendo constituído por 3 pás e por um eixo, unidos através de um rolamento – art.º 6 da PI, não impugnado e doc. 3 e 4 da PI;
6. As pás captam a energia do vento e o gerador contido na nacelle transforma a energia mecânica deste movimento de rotação em energia eléctrica para posterior injecção na rede eléctrica – art.º 6 da PI, não impugnado, e doc. 3 e 4
7. A nacelle é o componente que abriga o gerador, o quadro controlo balizagem, o quadro de filtros do gerador, o quadro de comando da nacelle, o quadro ventiladores, o comando de excitação, os quadros motores de Y…, os motores de Y… e o rectificador – art.º 7 da PI, não impugnado, e doc 3 e 4 ;
8. A torre conecta o sistema de coroa à nacelle, que permite a orientação do equipamento - art.º 8.º da PI, não impugnado, e doc 3 e 4.
9. A torre é composta pelo quadro de comando, o quadro de distribuição BT, a esteira de cabos, o transformador de grupo, o quadro MT e os quadros de potência;
10. A torre integra ( doc 3 e 4):
(i) os sistemas de amortecimento de vibração do equipamento (sem o qual o equipamento não poderia funcionar);
(ii) os sistemas de transporte de energia de corte e protecção (cabos, e disjuntores); e
(iii) outros sistemas auxiliares de controlo e acesso;
11. A torre é um equipamento do aerogerador, que contém em si mesmo um conjunto de estruturas eléctricas que são indispensáveis à produção de energia eléctrica de fonte eólica, sendo que não existe aerogerador (enquanto equipamento de produção de energia eléctrica) se o mesmo não for dotado de uma torre;
Cfr. também, art.ºs 10 a 12 da PI, não impugnados.
12. Os equipamentos E..... em causa só funcionam, isto é, só produzem a energia eléctrica que constitui a sua função típica, se todos os seus componentes (pás, rotor, nacelle e torre) e subcomponentes estiverem instalados – art.º 17.º não impugnado;
13. Todas as componentes (pás, rotor, nacelle e torre) e subcomponentes do aerogerador são essenciais para o desenvolvimento do mecanismo de geração de energia eléctrica – art.º 17.º não impugnado;
14. O aerogerador constituído pás, rotor, nacelle e torre, que compõe o aerogerador, é objecto de análise para efeitos de certificação em conformidade com as normas internacionais IEC da “Internacional Electrotechnical Comission” (IEC) – art.º 19.º da PI, não impugnado;
15. As normas IEC têm por objecto uma vasta gama de equipamentos eléctricos ou electrónicos, nomeadamente equipamentos dedicados à produção de energia, como seja aerogeradores – art.º 20.º, não impugnado;
16. Os aerogeradores são analisados e rectificados em função das normas IEC – 61400 –a art.º 21.º, não impugnado;
17. As normas IEC destinam-se a verificar a conformidade de determinados equipamentos ou maquinaria com certos standards internacionais – art.º 23.º, não impugnado;
18. A verificação da conformidade dos equipamentos com as normas internacionais IEC dá origem à emissão de um “certificado de conformidade”
19. O conjunto composto por pás, rotor, nacelle e torre que compõe o aerogeradore da Impugnante instalados na freguesias de VB foi submetido a esta certificação e foi considerado como estando em conformidade com as normais IEC,
Cfr. art.ºs 20 a 27.º da PI, não impugnados, e doc 6 deste articulado
20. A Impugnante foi notificada para proceder à entrega da Declaração Modelo 1 de IMI para inscrição na matriz do aerogerador em causa- Cfr. fls. 1/V do PA;
21. Em 26/11/2013, e não tendo a ora impugnante procedido à entrega de qualquer Declaração Modelo 1 do IMI para inscrição do supra identificado prédio na respectiva matriz predial, a AT apresentou oficiosamente a declaração Modelo 1 do IMI para efeitos da sua inscrição oficiosa e respectiva avaliação. – Fls. 1/v do PA
22. Foi efectuada a avaliação oficiosa do prédio aqui em apreço, a qual foi notificada à Impugnante – Cfr. fls. 1 e 2 do PA;
23. A AT inscreveu o aerogerador no tipo (prédios) “Outros” sob o artigo P1723 da Freguesia de VB, com o valor de 538.380,00 € - fl. 1/v do PA e doc. 7 da PI;
24. A Impugnante solicitou à AT mais informações sobre este prédio e requereu 2ª avaliação – doc 8 da PI e fl. 2 do PA;
25. A AT voltou a avaliar este aerogerador, ao abrigo do art.º 46.º, n.º2 do CIMI, desta vez no valor de 356.680,00 € - doc. 9 da PI
26. Posteriormente a AT agendou nova segunda avaliação que teve lugar no dia 16/9/2014, com a participação de perito da Impugnante – doc 1 da PI e fl. 36/V do PA;
27. O perito da Impugnante discordou da avaliação efectuada porque, essencialmente, os aerogeradores não podem ser considerados prédios para efeitos do CIMI e se situam em terreno baldio, e, portanto, a área e a respectivo preço/m2 deveriam ser 0, e o custo m2 não pode ser superior ao custo real da sapata – cfr. “Termo de contestação de 2ª avaliação” – fls. 38/V da PA e doc. 10 da PI
28. O valor patrimonial apurado para o artigo matricial em causa foi de 356.680,00, de acordo com o cálculo ínsito na “Notificação da 2ª avaliação” de doc 1 da PI, que aqui se reproduz.
29. O aerogerador situa-se num local remoto – art.º 44.º da PI, não impugnado;
30. O aerogerador não é servido de qualquer rede pública de abastecimento de água, gás ou esgotos ou saneamento básico – art.º 46.º, da PI, não impugnado.
31. O aerogerador não dispõe de rede pública de iluminação – art.º 47 da PI não impugnado;
32. O aerogerador não é servido de qualquer serviço municipal de recolha de lixo ou resíduos ou de limpeza de qualquer género; - art.º 50 da PI não impugnado.
33. O caminho de acesso aos aerogeradores foi construído e mantido exclusivamente pela Impugnante – art.º 51 da PI, não impugnado.
Genericamente a AT não põe em causa os factos que constam dos artigos da PI supra discriminados.
Contudo dá-lhe o enquadramento que julgamos devido e que também se reflecte na fundamentação dos factos não provados. (Ver infra)
Não se provou
a) Que o aerogerador não beneficia de qualquer utilidade ou infra-estrutura municipal;
b) Que o aerogerador não é servido de arruamentos, estradas ou vias de circulação municipais;
c) Que o aerogerador não é servido de qualquer serviço municipal de segurança.
Notoriamente resulta o inverso do alegado nos art.ºs 45.º, 48.º e 49.º da PI. A não ser que o bem possuído pela impugnante constitua excepção, ou porque, por exemplo, o aerogerador foi instalado exclusivamente por via aérea, ela sempre teria beneficiado, e beneficiará, das infra-estruturas municipais que ligam o caminho de acesso aos aerogeradores a estradas municipais ou nacionais, também para efeitos de manutenção. Ou seja, apesar dos aerogerador se situar em local remoto do município não significa que esse local exista isoladamente do resto das infra-estruturas municipais (e nacionais) ou não beneficie dos serviços municipais de protecção civil, de manutenção de estradas e caminhos, bombeiros, etc.”
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2. O Direito
Conheceremos em primeiro lugar o facto de o tribunal recorrido não ter notificado as partes para apresentarem alegações escritas nos termos e para os efeitos do artigo 120.º do CPPT, por se tratar de questão – nulidade processual secundária, como procuraremos demonstrar adiante – susceptível de prejudicar o conhecimento das demais questões suscitadas, designadamente, do erro de julgamento imputado à decisão recorrida.
Assim, a primeira questão que cumpre apreciar é a de saber se se verifica ou não a invocada nulidade processual - cfr. conclusão 13 das alegações de recurso.
Está em causa, portanto, uma eventual nulidade secundária, anterior à sentença, e traduzida, segundo a Recorrente, na violação do direito ao contraditório quanto aos elementos constantes do processo administrativo, por ter sido omitida pelo tribunal recorrido a notificação das partes para produção de alegações escritas nos termos e para os efeitos previstos naquela norma legal (artigo 120.º do CPPT) e que configura uma nulidade processual nos termos do artigo 195.º do CPC ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
Nos casos em que ocorre uma omissão e é proferida uma decisão judicial em momento em que poderia ser ordenada a prática do acto em falta, é a própria decisão judicial que dá cobertura à falta cometida, pois apenas com a sua prolação se consuma a falta/desvio.
Relativamente às nulidades processuais que se consumam com a prolação da sentença, como a omissão de actos que deveriam ser praticados antes dela, o STA tem vindo a entender que, embora se trate de nulidades processuais, a respectiva arguição pode ser efectuada nas alegações do recurso jurisdicional que for interposto da sentença, como, efectivamente, ocorreu no caso em apreço – cfr. Acórdão do Pleno do STA, da Secção de Contencioso Administrativo, de 02/10/2001, proferido no âmbito do recurso n.º 42385, publicado no AP-DR de 16/04/2003, página 985. Também o Acórdão da Secção de Contencioso Administrativo, de 09/10/2002, recurso n.º 48236 e Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário, de 04/12/2002 e de 10/07/2002, proferidos nos recursos n.º 1314/02 e n.º 25998, respectivamente.
Vejamos.
As nulidades processuais “são quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder - embora não de modo expresso - uma invalidade mais ou menos extensa de actos processuais” - cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, pag.176.
Segundo o artigo 114.º do CPPT, “não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de produção de prova necessárias, as quais são produzidas no respectivo tribunal”.
Por seu turno, prescreve o artigo 120.º do CPPT que “finda a produção da prova, ordenar-se-á a notificação dos interessados para alegarem por escrito no prazo fixado pelo juiz, que não será superior a 30 dias”.
Apresentadas as alegações ou findo o respectivo prazo e antes de proferida a sentença, será dada vista dos autos ao Ministério Público (artigo 121.º, n.º 1 do CPPT).
Dos autos resulta que, após notificação à impugnante da contestação e da junção do processo administrativo, e sem qualquer notificação prévia às partes para produção de alegações escritas, foi ordenada a remessa dos autos para parecer final do Ministério Público e, após, foi proferida a sentença recorrida.
Portanto, o Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela proferiu a sentença que agora se encontra sob recurso., sem que tenha notificado as partes (Impugnante e Fazenda Pública) para produzirem alegações escritas nos termos previstos no artigo 120.º do CPPT.
E a questão que então se coloca é a de saber se ao omitir tal notificação, o tribunal recorrido praticou a nulidade processual que vem invocada pela Recorrente.
Ora, a resposta a esta questão já foi dada pela nossa jurisprudência, nomeadamente no Acórdão do STA (Pleno), de 8 de Maio de 2013, no âmbito do processo n.º 01230/12, cujo entendimento sufragamos e, por isso, nos limitamos a transcrever: “(…) tendo havido junção ao processo de documentos com relevo probatório (como é o caso dos documentos juntos pela impugnante e do PAT), os quais relevaram para a especificação da matéria de facto julgada provada, impunha-se que se concedesse às partes a possibilidade de alegarem sobre esta matéria, não só sobre a relevância factual que podem ter os elementos em questão, mas também sobre as ilações jurídicas que daí se podem retirar. É que, por um lado, e ao invés do entendimento apontado no acórdão recorrido, não vemos razões legais para limitar as alegações aos casos de produção de prova testemunhal. Mas, por outro lado e como, igualmente, se diz no acórdão fundamento, «O facto de cada uma das partes ter tido oportunidade de se pronunciar sobre os documentos apresentados pela parte contrária, não dispensa as alegações, designadamente porque, enquanto o prazo legal para as partes se pronunciarem sobre documentos apresentados pela parte contrária é o prazo geral de 10 dias [art. 153º, nº 1, do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2º, alínea e), do CPPT], o prazo para alegações é fixado pelo juiz, podendo estender-se até 30 dias, nos termos do transcrito art. 120º».
Também nos acórdãos desta Secção do STA, de 11/3/2009 e de 28/3/2012, respectivamente, nos procs. nº 01032/08 e nº 062/12, ficou consignado que «a junção do processo administrativo impõe que, em regra, se tenha de passar à fase das alegações, não podendo haver conhecimento imediato do pedido, sob pena de violação do princípio do contraditório e da igualdade dos meios processuais ao dispor das partes (artigos 3º, nº 3, do CPC e 98º do CPPT)».
E o Cons. Jorge Lopes de Sousa igualmente salienta que «No caso de se estar perante uma situação em que deva ocorrer o conhecimento imediato, designadamente se forem juntos documentos pelas partes após a contestação, não pode dispensar-se a notificação das partes para alegações, a fim de se poderem pronunciar sobre a relevância desses documentos para a decisão da causa.
Mesmo que, na sequência da junção de documentos por cada uma das partes, a parte contrária tenha sido notificada da junção e se tenha pronunciado, não pode dispensar-se a notificação das partes para alegações …». Aliás, o mesmo autor também acrescenta que, nos casos em que o representante da Fazenda Pública contestar, sendo obrigatória a junção do processo administrativo, que deverá conter informações oficiais [arts. 111º, nº 2, alíneas a) e b), do CPPT], que são um meio de prova (art. 115º, nº 2), em regra não poderá haver conhecimento imediato do pedido, tendo de passar-se à fase de alegações, mesmo que não haja outra prova a produzir, por imperativo do princípio do contraditório (art. 3º, nº 3, do CPC), pois só assim se torna possível evitar que a administração tributária usufrua de um privilégio probatório especial na instrução do processo e se confere aos princípios do contraditório e da igualdade dos meios processuais uma verdadeira dimensão substantiva (art. 98º da LGT).”
Na esteira deste entendimento, é, pois, de concluir que no caso dos autos, ao não se notificar as partes para alegações escritas (cfr. artigo 120.º do CPPT), ocorreu uma omissão susceptível de influir no exame e na decisão da causa, a qual determina a anulação da sentença recorrida nos termos do artigo 195.º do CPC, por implicar a anulação dos termos processuais subsequentes (cfr. artigo 98.º, n.º 3, do CPPT).
Em consequência do exposto, haverá que conceder provimento ao recurso nesta parte, o que acarreta a prejudicialidade do conhecimento das restantes questões nele colocadas.
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Conclusões/Sumário
I - Tendo havido junção ao processo de documentos, com relevo probatório (documentos juntos pela impugnante e processo administrativo), impunha-se a notificação das partes para alegarem – cfr. artigo 120.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
II A omissão da notificação das partes para alegações escritas, naquelas circunstâncias, porque susceptível de influir no exame e decisão da causa, constitui nulidade processual determinante da anulação dos pertinentes termos do processo (artigo 195.º do Código de Processo Civil e artigo 98.º n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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IV. Decisão
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso quanto à questão da nulidade processual suscitada e, em consequência, anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, a fim de ser fixado prazo para alegações das partes, nos termos do artigo 120.º do CPPT, seguindo-se os ulteriores termos.
Sem custas.
Porto, 18 de Outubro de 2018
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro