Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01644/18.0BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/13/2019
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Helena Canelas
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL – NOVO REGIME – PERÍODO DE REFERÊNCIA
Sumário:I – De acordo com o disposto no artigo 2º nºs 4 e 5 do NRFGS o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, e caso não existam créditos vencidos naquele período ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo 3º, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.

II – Se é diferente entre si a natureza dos créditos laborais requeridos não pode afirmar-se sem mais, e genericamente, que os créditos laborais requeridos se venceram na data em que ocorreu a cessação do seu contrato de trabalho, na medida em que obrigações se vencem na data prevista na lei ou no contrato, momento em que se tornam exigíveis; o que significa que haverá que considerar os concretos créditos laborais cujo pagamento é solicitado ao Fundo de Garantia Salarial e respetiva natureza, para aferir à luz da lei ou do contrato, qual foi a respetiva data de vencimento.

III – O crédito relativo à indemnização por antiguidade decorrente de despedimento judicialmente declarado ilícito só se venceu com o trânsito em julgado da sentença que condenou a entidade patronal no respetivo montante, fixando o seu valor.

IV – Igualmente sucede com o crédito quanto às retribuições intercalares, isto é, quanto às retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento ilícito até ao trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude desse despedimento, a que aludem o artigo 390º do Código do Trabalho, o qual só se venceu com o trânsito em julgado da sentença que condenou a entidade patronal no respetivo montante, fixando o seu valor.

V – Diferentemente, os créditos referentes aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal referentes ao ano da cessação, devem ter-se por vencidos aquando da cessação do contrato, na medida em que são devidos, nos termos legais, pela sua mera cessação, seja sob que forma ou título operou (cfr. artigos 245º e 263º do Código do Trabalho), não dependendo de condenação judicial. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A. M. A. F. P.
Recorrido 1:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO

A. M. A. F. P. (devidamente identificada nos autos) instaurou em 09/07/2018 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga ação administrativa contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, IP (igualmente devidamente identificado nos autos) na qual impugnou o despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial que indeferiu o pedido de pagamento de créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho, peticionando que o mesmo fosse anulado ou, pelo menos, julgado ineficaz, com todas as legais consequências, e o réu condenado à prática do ato devido, concedendo à autora procedência ao requerimento por esta formulado em 20/04/2016, e condenado a pagar-lhe a quantia por aquela peticionada naquele seu requerimento, acrescido de juros contabilizados desde 20/05/2016 até efetivo e integral pagamento.
Por sentença (saneador-sentença) datada de 28/02/2019 a Mmª Juíza do Tribunal a quo julgou a ação improcedente, absolvendo o réu do pedido.
Inconformada a autora interpôs o presente recurso de apelação (que se mostra tempestivo face à autoliquidação e respetivo pagamento da multa devida, nos termos do artigo 139º do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA – cfr. fls. 494 SITAF), pugnando pela sua procedência, com condenação do recorrido, a final, à pratica do ato devido, anulando-se ou, pelo menos, julgando-se ineficaz o ato impugnado, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:
i. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos supra referenciados, em 28-02-2019, segundo a qual o Tribunal a quo decidiu: «Nos termos e com os fundamentos acima expostos, julgo improcedente, a presente acção administrativa e, em consequência, absolvo o Réu Fundo de Garantia Salarial do pedido.» (sic).

ii. A sentença recorrida assenta, em suma, não seguinte entendimento (errado) do Tribunal a quo: (i) o contrato de trabalho que uniu a Autora/Recorrente à entidade patronal em causa teria cessado em 28-08-2014 (facto 3. dado como provado) e, por isso, (ii) «Os créditos laborais da Autora venceram-se na data da cessação do contrato de trabalho, ou seja, em 28-08.2014, pelo que denota-se que tais créditos não se venceram nos seis meses anteriores à propositura da acção de insolvência – 11.03.2016.» (sic, sublinhado nosso).

iii. Acrescenta ainda o Tribunal a quo que «Mesmo a indemnização pelo despedimento ilícito, bem como, todas as retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento no dia 30.04.2015 (facto provado 4.), estão fora do período de referência.», o que afirma com base na mesma premissa de que os créditos da Recorrente se teriam vencido na data da cessação do contrato reportada a 28-08-2014.

iv. No entanto, não é assim, por um lado, porque os créditos laborais que a Recorrente pretendeu ver pagos pelo Réu/Recorrido não se venceram em 28-08-2014, e, por outro, os créditos laborais em causa estão abrangidos pelo período de referência.

A- Do erro de julgamento independentemente da necessária alteração à decisão factual

v. Sem prejuízo da alteração que se impõe à decisão factual contante da sentença (como adiante se verá circunstanciadamente) mesmo que se a decisão quanto aos factos, a sentença proferida, ainda assim, não se poderia manter na ordem jurídica por erro de julgamento.

É que:

vi. O Tribunal a quo afirma na sentença proferida: «Por sua vez, o artigo 2.° do mesmo DL, dispõe que:
Artigo 2.°
Créditos abrangidos
1- Os créditos referidos no n.° 1 do artigo anterior abrangem os créditos do
trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação.
[…]
4 – O Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.° 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.
5- Caso não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.° 1 do artigo seguinte, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.
[…]
8 - O Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento Ihe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
[…]
De acordo com o artigo 2.°, n.° 4, o FGS cobre os pagamentos que deveriam ter sido feitos ao trabalhador pela entidade empregadora nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência, da apresentação do requerimento do Processo Especial de Revitalização ou do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), até aos limites indicados no artigo 3.°. Preceitua o n.° 1 desta norma que o Fundo assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, com o limite máximo globa] equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida.
O pagamento dos créditos requeridos apenas é assegurado pelo FGS até um ano (antes 9 meses - artigo 319.°, n.° 3 da Lei n° 35/2004) a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
A ratio deste regime legal é, na sequência de determinações comunitárias, garantir, em tempo útil, o pagamento das prestações referidas na lei ao trabalhador, evitando que este fosse excessivamente penalizado pela morosidade dos processos judiciais, ficando o Fundo subrogado nos direitos dos trabalhadores.
[…]
«A Autora requereu a insolvência da sua entidade patrona] em 11.03.2016 (ponto 5 dos factos provados), sendo que, por tal facto, o período de referência está compreendido entre 11.09.2015 e 11.03.2016.
Os créditos laborais da Autora venceram-se na data da cessação do contrato de trabalho, ou seja, em 28.08.2014, pelo que denota-se que tais créditos não se venceram nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência - 11.03.2016.
Mesmo a indemnização pelo despedimento ilícito, bem como, todas as retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento no dia 30.04.2015 (facto provado 4.), estão fora do período de referência.» (sic, sublinhado e destaque nossos).

vii. O Tribunal a quo acrescenta ainda, na tentativa de fundamentar a conclusão vinda de citar:
«A decisão judicial do Tribunal do Trabalho não tem a virtualidade de fazer alargar o período de referência encontrado.
Sumariou-se no Acórdão do TCAN de 02.07.2015, Proc. n.° 01826/11.5BEPRT, o seguinte:
“ (...) II- O artigo 91.° do CIRE não se aplica aos créditos que já se tenham vencido em momento anterior à declaração de insolvência.
III- A exigência imposta pelo artigo 436.° do CT da ilicitude do despedimento ter de ser declarada por decisão judicial implica, correlativamente, o vencimento aos créditos salariais relativos à indemnização por despedimento ilícito e às retribuições vencidas desde a data do despedimento, apenas com o trânsito em julgado de decisão judicial que os reconheça.
IV- Não vale como decisão judicial para efeitos do disposto no artigo 436.º do CT a decisão que, no âmbito de processo de insolvência, declare a entidade empregadora insolvente".».

viii. Ora, desde logo, a citação do acórdão em causa, na senda de pretender fundamentar a decisão proferida, é contraditória com a decisão proferida na medida em que o que sedefende no acórdão citado na sentença é exactamente o oposto daquilo que o Tribunal a quo conclui e dispôs na mesma – aliás, do próprio sumário do acórdão citado se retira a contradição com a sentença proferida.

ix. É que, contrariamente ao que pretendeu o Tribunal a quo (que defende que os créditos laborais da Recorrente se teriam vencido em 28-08-2014, data em que ilicitamente a sua entidade patronal pôs termo ao contrato, conforme sentença que julgou ilícito tal despedimento), o que resulta do acórdão citado é que «III- A exigência imposta pelo artigo 436.° do CT da ilicitude do despedimento ter de ser declarada por decisão judicial implica, correlativamente, o vencimento aos créditos salariais relativos à indemnização por despedimento ilícito e às retribuições vencidas desde a data do despedimento, apenas com o trânsito em julgado de decisão judicial que os reconheça.» (sic, sublinhado e destaque nossos).

x. Nos apontados termos, com a fundamentação apresentada pelo Tribunal a quo, a sentença recorrida padece de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão – art. 615.º n.º 1 c) do CPC.
xi. Vale a pena ver, cuidadamente, o que se defendeu no aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte citado na sentença recorrida:
«Do quadro legal traçado resulta que o pagamento dos créditos salariais reclamados pelo trabalhador a título de indemnização por alegado despedimento ilícito e referentes às retribuições que deixou de auferir a contar da data do “despedimento”, só será exigível a partir do momento em que o despedimento seja declarado ilícito, e nos termos do art.º 435.º do CT/03, como vimos, a ilicitude do despedimento «só pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo trabalhador».
Assim sendo, afigura-se-nos insofismável que a obrigação da entidade empregadora indemnizar o trabalhador com fundamento em despedimento ilícito apenas se constitui com a decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento, o que tem como contraponto que o direito do trabalhador ao pagamento do crédito salarial daí decorrente apenas se firme na sua esfera jurídica após o trânsito em julgado da respetiva decisão judicial condenatória.
A este entendimento conduz claramente a consideração do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 439.º do CT/03, que para o caso do trabalhador optar por indemnização em substituição da reintegração, atribui ao tribunal a fixação do montante da indemnização devida, entre 15 a 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, para o que tem de se atender ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 429.º, e bem assim, a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial. Tais previsões legais são esclarecedoras em como só com a decisão judicial proferida no âmbito da competente ação e no culminar de um processo em que às partes seja assegurado o direito de apresentarem as razões em que suportam as suas posições, máxime, em que à entidade empregadora seja conferida a possibilidade de discutir os montantes peticionados, o valor da retribuição, a antiguidade do trabalhador, e dos demais pressupostos para a declaração do direito invocado pelo trabalhador, é que o crédito reclamado pelo trabalhador se constitui na sua esfera jurídica e se vence o direito a exigir da entidade empregadora o correspondente pagamento, para cujo cálculo, sublinhe-se, entra todo o tempo decorrido até ao trânsito em julgado da referida decisão, o que não teria sentido caso o direito em questão se vencesse com a cessação do contrato de trabalho. Por aqui se vê notoriamente que assim não é.
A igual conclusão se chega, quando consideramos o regime legal previsto no artigo 437.º, n.º1 do CT/03, de acordo com o qual, o trabalhador ilicitamente despedido tem direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, conquanto é cerro resultar da lei que na determinação desta indemnização contabiliza-se todo o tempo decorrido entre a cessação do contrato e o trânsito em julgado da decisão condenatória, o que, de per se, revela que esse crédito laboral apenas nasce na esfera jurídica do trabalhador com a prolação da decisão judicial que o reconhece, sendo inequívoco que o direito a exigir o seu pagamento apenas se vence na data do trânsito em julgado da decisão judicial que reconheceu a ilicitude do despedimento.» (sic, sublinhado e destaque nossos).

xii. É exactamente esse o caso dos autos em que, na sequência da declaração de cessação contratual por iniciativa da empregadora, a Recorrente intentou acção junto do Tribunal de Trabalho destinada a ver reconhecida a ilicitude do despedimento de que foi alvo.

xiii. Desses autos começou por resultar a declaração judicial de ilicitude do despedimento (cfr. fls. 140 a 143 do PA, proferida em 14-04-2015 e transitada nunca antes de 14-05-2015).

xiv. Nessa sequência, como resulta da documentação junto aos autos, porque a Recorrente havia peticionado naquele processo a respectiva reintegração e porque a lei lhe conferia o direito de, em substituição da reintegração, até ao encerramento da instrução, optar pelo direito a uma indemnização, a Recorrente exerceu tal direito e, por essa razão, foi notificada, após aquela sentença, para indicar o valor que entendia que lhe deveria ser atribuído (cfr. fls 145 a 148 do PA).

xv. E na sequência de requerimento apresentado pela Recorrente após tal notificação, em que esta declarou naqueles autos que pretendia a fixação de indemnização em determinado quantitativo, aquele Tribunal de Trabalho proferiu a sentença que lhe fixou os créditos a que esta tinha direito (cfr. fls 144 a 148 do PA), proferida em 25-05-2015, notificada à Recorrente por ofício de 30-06-2015, transitada em julgado nunca antes de 16-09-2015 – porque notificada à empregadora por ofício de 01-07-2015 (cfr. fls 149 do PA), com notificação presumida, pelo menos em 06-07-2015 (porque o terceiro dia posterior à data daquele ofício, assumindo que tenha sido expedido nessa mesma data, corresponde a um sábado, o que determina que a notificação se presuma ocorrida no primeiro dia útil seguinte, art. 249.ºn.º 1 do CPC ex vi art. 1.º n.º 2 a) do CPT), mais considerando que o prazo para o respectivo recurso era de 20 dias e é legítima a sua apresentação nos três dias úteis posteriores ao último dia do respectivo prazo, que ocorreria em 11-09-2015, sexta-feira, (face às férias judiciais decorridas entre 16-07-2015 e 31-08-2015), pelo que poderia ser apresentado até 16-09-2015 – art. 80.º n.º 1 do CPT e art. 139.º n.º 5 do CPC ex vi art. 1.º n.º 2 a) do CPT (cfr. fls 149 do PA).

xvi. Ora, a sentença que declarou ilícito o despedimento nunca transitou em julgado antes de 14-05-2015 (cfr. fls. 140 a 143 do PA) e a sentença que fixou os créditos da recorrente (que esta pretende ver pagos pelo Réu/Recorrido) nunca transitou antes de 16-09-2016 (cfr. fls. 144 a 148 e 149 do PA).

xvii. É a data do trânsito em julgado da sentença que fixa os créditos laborais da Recorrente que tem relevância para aferir do cumprimento do período de referência como resulta, aliás, da jurisprudência deste Tribunal ad quem que supra se deixou citada.

xviii. Efectivamente, não podia deixar de ser assim, na medida em que até aquela sentença ser proferida não era sequer possível determinar esses créditos laborais, pois que pressupõem uma apreciação judicial quanto à determinação do respectivo quantum (cfr. art. 389.º, 390.º e 391.º do CT).

xix. Daí que haja que concluir, como bem se decidiu na jurisprudência deste Tribunal ad quem, que só com o trânsito em julgado da decisão é que «esse crédito laboral apenas nasce na esfera jurídica do trabalhador com a prolação da decisão judicial que o reconhece», isto é, com o trânsito em julgado da decisão que condena ao pagamento das quantias em causa, pois que antes desse trânsito em julgado dessa decisão ainda não havia nascido o crédito do trabalhador, nem sequer era possível concretamente determinar o mesmo, na medida em que é nessa decisão que o Tribunal de Trabalho haverá de proferir o juízo que determine o quantum do crédito em causa por aplicação do disposto nos arts. 389.º, 390.º e 391.º do CT que determina que a fixação desse montante se haverá de fazer entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou completo ou fracção de antiguidade do trabalhador e, bem assim tendo em consideração o tempo decorrido entre o despedimento julgado ilícito e o trânsito em julgado da sentença respectiva.

xx. Daí também que a Recorrente, logo na petição da presente acção, tenha alegado o que deixou vertido nos pontos 42. a 62. daquela peça processual.

xxi. Com efeito, tendo os créditos cujo pagamento requereu ao Recorrido vencido em 16-09-2016, e considerando que o requerimento inicial da declaração de insolvência da empregadora foi apresentado em 11-03-2016 (facto 5. julgado provado), é manifesto que os créditos cujo pagamento se pretende estão abrangidos pelo período de garantia estipulado no n.º 4 do art. 2.º do DL n.º 59/2015, de 21 de Abril.

xxii. Em suma, contrariamente ao que decidiu o Tribunal a quo, os créditos da Recorrente, cujo pagamento peticionou ao Réu/Recorrido, venceram-se apenas com o trânsito em julgado da sentença que condenou a entidade empregadora ao seu pagamento, isto é, com o trânsito em julgado ocorrido nunca antes de 16-09-2016 (proferida em 25-05-2016) (cfr. fls. 144 a 148 do PA e, ainda, fls 149 do PA que corresponde ao ofício de notificação dessa sentença à entidade empregadora, ré naquela acção).

xxiii. E, por isso, uma vez que a declaração de insolvência foi requerida em 11-03-2016, os créditos cujo pagamento foi peticionado encontram-se abrangidos pelo período de referência.

xxiv. Ao assim não decidir, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por erro na interpretação e aplicação das normas ínsitas nos arts. 389.º, 390.º e 391.º n.º 1 do CT, art. 80.º n.º 1 do CPT, art. 139.º n.º 5 e 249.º n.º 1 do CPC ex vi art. 1.º n.º 2 a) do CPT, e n.º 4 do art. 2.º do Dec.-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril.

SEM PRESCINDIR

B- Do necessário aditamento de factos aos julgados provados nos autos e alteração aos factos que ali constam, e respectiva consequências

xxv. Como é bom de ver do que vem de se expor, há mais factualidade relevante para a decisão da causa que deveria ter sido feita constar da sentença, com o que o Tribunal a quo, incorreu, novamente, em vício de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 95.º n.º 3 do CPTA, ou, quando muito, em erro de julgamento, por violação daquela mesma norma.

xxvi. Era relevante para a boa decisão da causa, por contender com os pressupostos da decisão a proferir, nomeadamente os seguintes factos:

Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 15-04-2015, notificada à Recorrente em 20-04-2015 por ofício de 15-04-2015, transitada em julgado nunca antes de 14-05-2015.

xxvii. Isto mesmo foi alegado pela Recorrente nos pontos 42. a 45. da petição da presente acção e resulta dos documentos que ali foram juntos como doc. n.º 2, concretamente docs. n.º 3 e 5 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 81 a 84 e 140 a 143 deste.

xxviii. Não obstante, o Tribunal a quo deu como provado no ponto 4 dos factos provados que, por essa sentença de 15-04-2015, a empregadora teria sido «condenada a pagar determinadas quantias à Autora, a título de créditos pela cessação do contrato de trabalho (constando entre elas a indemnização por despedimento ilícito e todas as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento - 30.04.2015) e por sentença datada de 25.06.2015 foram liquidadas as quantias em dívida. - Cfr.fls. 01 e ss. do processo administrativo junto a fls. 212 c ss. do SITAF (doravante PA2), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.» (sic facto n.º 4 julgado provado na sentença recorrida).

xxix. Ora, basta ver os documentos supra referidos ( fls. 81 a 84 e 140 a 143 do PA ou doc. n.º 2 da petição, concretamente docs. n.º 3 e 5 deste) para imediatamente se concluir que daquela sentença resulta apenas que na mesma é julgado ilícito o despedimento de que a Recorrente foi alvo e condena-se genericamente a empregadora a pagar as quantias que vierem a ser liquidadas posteriormente.

xxx. Daí que se não possa manter a redacção que foi dada ao facto julgado provado sob o ponto n.º 4 daquela decisão, devendo a respectiva redacção ser alterada de modo a que passe a ter a seguinte redacção:

4. Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 15-04-2015, notificada à Recorrente em 20-04-2015 por ofício de 15-04-2015, transitada em julgado nunca antes de 14-05-2015.
[factos alegados em 42 a 45 da petição, e que se impõe que seja dados como provados pela análise dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, doc. n.º 2 junto com a petição, concretamente docs. n.º 3 e 5 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 27 a 31 deste].

xxxi. É também relevante para a decisão da causa, por contender com os pressupostos para a decisão a proferir, os seguintes factos:

Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 25-05-2015, notificada à Recorrente em 03-07-2015 por ofício de 30-06-2015, e notificada à entidade empregadora nunca antes de 06-07-2015 por ofício de 01-07-2015, transitada em julgado nunca antes de 16-09-2015.

xxxii. Isto mesmo foi alegado pela Recorrente nos pontos 48. a 56. da petição da presente acção e resulta dos documentos que ali foram juntos como doc. n.º 2, concretamente doc. n.º 6 do doc. n.º 4 e do doc. 3 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 85 a 89 e 144 a 148 e em especial fls. 149 e 246 vs. deste.

xxxiii. Por uma questão de encadeamento lógico e sistematização, impõe-se, portanto, o aditamento daquela matéria aos factos julgados provados, concretamente como ponto 4. a):

4. a) Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 25-05-2015, notificada à Recorrente em 03-07-2015 por ofício de 30-06-2015, e notificada à entidade empregadora nunca antes de 06-07-2015 por ofício de 01-07-2015, transitada em julgado nunca antes de 16-09-2015, pela qual a entidade empregadora foi condenada a pagar à autora os créditos cujo pagamento esta pretende ver pagos pelo réu.
[factos alegados em 48 a 56 da petição e que se impõe que seja dados como provados pela análise dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, juntos como doc. n.º 2 da petição, concretamente doc. n.º 6 e doc. n.º 4 deste e do doc. 3 e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 85 a 89, 144 a 148 e em especial fls. 149 e 246 vs deste.

xxxiv. Alterada que seja a decisão quanto aos factos provados e não provados, nos termos que vêm de se expor, torna-se manifesto que os créditos, relativamente aos quais a Autora pretende pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial, se venceram com o trânsito em julgado da decisão judicial que constituiu tais créditos a favor da Autora, o que ocorreu nunca antes de 16-09-2015 - como a Recorrente deixou expressamente invocado em 48. e 56. da petição.

xxxv. Antes do trânsito em julgado daquela sentença não existia ainda qualquer decisão judicial que tivesse condenado a empregadora ao pagamento à Recorrente das concretas quantias em causa (seja os valores indemnizatórios sejam as restantes quantias que ali foram determinadas que deveriam ser pagas à Recorrente a título de prestações remuneratórias devidas, incluindo remunerações intercalares).
xxxvi. É essa, aliás, a posição defendida pela nossa jurisprudência mais esclarecida, do que são exemplo os dois acórdãos já supra citados e referidos deste Tribunal Central Administrativo Norte, correspondentes aos acórdãos de 02-07-2015, proferido no processo n.º 1826/11.5BEPRT, e de 15-09-2017, dado no processo n.º 1508/11.8BEBRG, ambos in www.dgsi.pt.

xxxvii. Assim sendo, como é, haverá igualmente que concluir que os créditos em causa estão abrangidos pelo período de referência conforme estabelecido nos art.s 1.º n.º 1 a), 2.º n.º 1, 4 e 8, todos do DL n.º 59/2015, de 21 de Abril, e, ao assim não entender, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na definição da factualidade relevante para a decisão, na qualificação jurídica dos factos e na aplicação da lei, consubstanciada na errada interpretação e aplicação daquelas normas vindas de referir.

C- Da nulidade por omissão de pronúncia

xxxviii. O Tribunal a quo começa a análise do processo nos seguintes termos:
«O direito é de conhecimento oficioso do tribunal: ius novit curia, ou seja, o Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.°, n.° 3 do CPC, aplicável ex vi do disposto no artigo 1.° do CPTA). Assim, o juiz pode entender que os vícios imputados ao ato devem ser juridicamente qualificados de forma distinta da alegada pelas partes. A Autora peticiona a anulação do despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial do Instituto de Segurança Social que indeferiu o requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho. Portanto, a pretensão da Autora dirige-se, essencialmente, à prática do ato de deferimento do pedido de pagamento de créditos laborais. Assim, atendendo ao objeto da lide, delimitada pelo pedido e pela causa de pedir, e sendo objeto mediato dos autos um ato de estrito indeferimento, constata-se que estamos perante uma ação de condenação ã prática de ato devido, ou seja, conforme decorre do artigo 66.°, n.° 2 do CPTA o processo dirige-se, não à anulação contenciosa do ato, mas à condenação da Administração na prática de um ato que, desde logo, dê satisfação à pretensão da Autora, não se limitando o Tribunal a devolver a questão ao órgão administrativo competente, mas pronunciando-se sobre a pretensão material do interessado (artigo 71.°, n.° 1 do CPTA).
Nesta conformidade, analisada a factualidade alegada nos autos, a questão que ao Tribunal cumpre apreciar é de saber se assiste à Autora o direito ao pagamento dos seus créditos laborais, pelo Fundo de Garantia Salarial.» (sic).

xxxix. Mais adiante, refere ainda o Tribunal a quo:
«A Autora instaurou a presente ação administrativa contra o Fundo de Garantia Salarial (FGS) tendo em vista obter a remoção da ordem jurídica do despacho que lhe indeferiu o pagamento de créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho.
Como acima já foi adiantado, estamos perante uma ação de condenação à prática de ato devido, ou seja, o processo dirige-se, não à anulação contenciosa do ato, mas à condenação da Administração na prática de um ato que, desde logo, dê satisfação à pretensão da Autora.
Nesta conformidade, vejamos, então, se se mostram preenchidos os requisitos de que depende o deferimento do requerimento de pagamento de prestações emergentes do contrato de trabalho, incluindo não só aqueles que foram consignados na decisão de indeferimento, mas também outros se estiverem previstos na lei como pressupostos da atribuição das prestações requeridas.» (sic).

xl. Nos apontados termos, o Tribunal a quo, reconhecendo que a Recorrente peticionou não apenas a condenação do Recorrido à prática do acto devido, mas também a anulação do acto de indeferimento que proferiu, não analisou qualquer dos fundamentos de anulação invocados pela Recorrente, nem se pronunciou quanto ao formulado pedido de anulação do acto.

xli. Ora, se se admitiria que, sendo julgada procedente o pedido de condenação do Recorrido à pratica do acto devido nos termos em que tal pedido foi formulado, ficaria prejudicado o conhecimento do pedido de anulação do acto anteriormente praticado (pois que tal decisão implicaria, pela própria natureza a anulação do acto independentemente da eventual verificação dos concretos vícios que lhe foram apontados pela Recorrente), quando o Tribunal a quo julga improcedente o pedido de condenação à prática do acto devido, não podia deixar de conhecer de cada um dos vícios que a Recorrente invocou para fundamentar o pedido da respectiva anulação (ou outros vícios que fossem do conhecimento oficioso do Tribunal que levassem também àquela conclusão) e isto, sob pena de incorrer, como incorreu, em nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 95.º n.º 3 do CPTA e 615.º n.º 1 d) do CPC – o que expressamente se argui.

xlii. Não pode olvidar-se que na petição da presente acção a Recorrente apontou ao acto impugnado vícios diversos que se abstraem do pedido de condenação à prática do acto devido, nomeadamente, invocou que aquele acto padecia de (i) anulabilidade ou, pelo menos, ineficácia do mesmo face aos termos verificados relativamente ao procedimento e notificação dos actos instrumentais e acto final aí praticados; (ii) anulabilidade por violação do principio da participação e direito de audição prévia, violação dos princípios da legalidade, boa fé, proporcionalidade e adequação e por violação do princípio do inquisitório; (iii) anulabilidade por vício de fundamentação; e (iv) anulabilidade por violação dos princípios da proporcionalidade, adequação e justiça; além do invocado vício de erro nos pressupostos de facto, bem como a Recorrente concluiu aquela petição formulando expressamente pedido de que fosse «julgada anulada a decisão posta em crise, ou, pelo menos, julgada ineficaz» além do pedido de condenação à prática do acto devido.

SEM PRESCINDIR

xliii. Ainda que se entendesse que, nos termos em que o Tribunal proferiu a decisão, afirmando o que supra se deixou citado 7, que se pronunciou – no que não se concede, pois que em rigor não é o caso, uma vez que o Tribunal a quo nunca afirma sequer que ficava prejudicado o conhecimento dos vícios apontados ao acto cuja anulação de pretende ou o pedido respectivo – ainda assim se haveria de concluir que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por erro na interpretação e aplicação do disposto no art. 95.º n.º 3 do CPTA – com a consequente necessária revogação desta e substituição por outra decisão que não padeça daquele vício.

O recorrido não contra-alegou.

Indeferida pela Mmª Juíza a quo a arguida nulidade da sentença recorrida (cfr. despacho de 27/05/2019- fls. 498 SITAF), foram os autos remetidos a este Tribunal de recurso, e neste notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público não emitiu Parecer.
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Com dispensa de vistos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas pela recorrente as conclusões de recurso, vêm colocadas em recurso as seguintes questões essenciais:
- saber se ocorre a invocada nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão nos termos do artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC (vide, designadamente, conclusões viii), ix) e x) das alegações de recurso);
- saber se ocorre a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia por haver mais factualidade relevante para a decisão da causa que deveria ter sido feita constar da sentença - (vide conclusão xxv) das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro quanto ao julgamento da matéria de facto - (vide conclusões xxvi) a xxxiii) das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à decisão de improcedência do pedido de condenação do réu a praticar o ato administrativo de deferimento do requerimento da autora - (vide conclusões i) a iv), v) a viii), xi) a xxiv), xxxiv) a xxxvii) das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorre na invocada nulidade por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 95º nº 3 do CPTA, por face ao julgamento de improcedência do pedido impugnatório, não ter, ainda assim, apreciado todos e cada um dos vícios que a autora invocou para fundamentar o pedido de anulação do despacho de indeferimento impugnado na ação, ou, pelo menos, erro de julgamento por violação do disposto no artigo 95º nº 3 do CPTA - (vide conclusões xxxviii) a xliii) das alegações de recurso).
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, assim vertida, expressis verbis, na sentença recorrida:
1. Em 01.01.2012, a Autora foi admitida como trabalhadora da sociedade comercial “R. & M. D. – C. G. E., Lda.”. – Cfr. fls. 01 e ss. do processo administrativo junto a fls. 112 e ss. do SITAF (doravante PA), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

2. A Autora auferia o salário base mensal líquido de € 561,80 euros. - Cfr. fls. 01 e ss. do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

3. Em 28.08.2014, cessou o contrato de trabalho referido em 1). - Cfr. fls. 01 e ss. do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

4. Por sentença proferida em 15.04.2015 no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF foi a sociedade comercial “R. & M. D. – C. G. E., Lda.” condenada a pagar determinadas quantias à Autora, a título de créditos pela cessação do contrato de trabalho (constando entre elas a indemnização por despedimento ilícito e todas as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento – 30.04.2015) e por sentença datada de 25.06.2015 foram liquidadas as quantias em dívida. – Cfr. fls. 01 e ss. do processo administrativo junto a fls. 212 e ss. do SITAF (doravante PA2), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

5. Em 11.03.2016, a Autora interpôs ação para declarar a insolvência de “R. & M. D. – C. G. E., Lda.” na 2.ª Secção de Instância Central de Comércio de Vila Nova de Famalicão que correu seus termos sob o n.º de processo 1770/16.0T8VNF. – Cfr. fls. 54 e ss. do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

6. Por sentença proferida em 18.04.2016 no âmbito do processo de insolvência referido em 5. foi declarada a insolvência de “R. & M. D. – C. G. E., Lda.”. – Cfr. fls. 54 e ss. do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

7. Em 20.04.2016, a Autora apresentou nos serviços do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. (Modelo GS 1/2012-DGSS) um requerimento dirigido ao Fundo de Garantia Salarial, no qual requereu o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, no valor global de € 7.053,30 euros, cujo teor se tem por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. – Cfr. fls. 01 e ss. do PA e PA2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

8. Os serviços do Instituto da Segurança Social elaboraram as informações cujo teor consta de fls. 54/56 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nas quais propõem o indeferimento do requerido pela Autora por não estarem preenchidos os requisitos do n.º 4 do artigo 2.º do DL 59/2015 de 21 de abril.

9. Em 13.11.2017, o Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial emitiu despacho concordante. – Cfr. fls. 54 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

10. Mediante ofício datado de 13.11.2017, com o assunto “Fundo de Garantia Salarial – Audiência Prévia Indeferimento”, o Instituto da Segurança Social, IP notificou a Autora, nos seguintes termos:
”(…) Pelo presente ofício e nos termos do despacho de 13 de novembro de 2017, do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, fica notificado de que o requerimento apresentado por Vª Ex.ª será indeferido.
Nos termos do art.º 122º do Código do Procedimento Administrativo, Vª Ex.ª tem direito a pronunciar-se, antes de ser tomada a decisão final, dispondo de 10 dias úteis, a partir da presente notificação, para apresentar resposta por escrito, da qual constem os elementos que possam obstar ao indeferimento, juntando os meios de prova adequados.
Poderá igualmente, contactar os serviços, na morada indicada e pelos contactos mencionados em rodapé.
O(s) fundamento(s) para o indeferimento é(são) o(s) seguinte(s):
- Os créditos requeridos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da ação (insolvência, falência Revitalização ou procedimento extrajudicial de recuperação de empresas), nos termos do n.º 4 do artigo 2.º do Dec. Lei 59/2015, de 21 de abril, ou após a data da propositura da mesma ação, no termos do n.º 5 do mesmo artigo.
Mais se informa que, na falta de resposta, o indeferimento ocorre no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo acima referido, data a partir da qual se inicia a contagem dos prazos de:
- 15 dias úteis, para reclamar;
- 3 meses, para impugnar judicialmente (…)”. – Cfr. fls. 1 e ss. do PA, concretamente 100, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11. A Autora exerceu o direito de audição peticionando o pagamento dos créditos requeridos. – Cfr. fls. 16 e ss. do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

12. Os serviços do Instituto da Segurança Social elaboraram as informações cujo teor consta de fls. 56V.º/58 do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nas quais propõem manter o indeferimento do requerido pela Autora por não estarem preenchidos os requisitos do n.º 4 do artigo 2.º do DL 59/2015 de 21 de abril.

13. Em 28.03.2018, o Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial emitiu despacho concordante. – Cfr. fls. 56Vº do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

14. Mediante ofício datado de 28.03.2018, com o assunto “Fundo de Garantia Salarial – Notificação Indeferimento”, o Instituto da Segurança Social, IP notificou a Autora, nos seguintes termos:

” (…) Pelo presente ofício e nos termos do despacho de 28 de março de 2018, do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, fica notificado de que o requerimento (…) apresentado por Vª Ex.ª foi indeferido.
O(s) fundamento(s) para o indeferimento é(são) o(s) seguinte(s):
- Os créditos requeridos não se encontram abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da ação (insolvência, falência Revitalização ou procedimento extrajudicial de recuperação de empresas), nos termos do n.º 4 do artigo 2.º do Dec. Lei 59/2015, de 21 de abril, ou após a data da propositura da mesma ação, no termos do n.º 5 do mesmo artigo.
Mais se informa que a partir da presente notificação tem V. Ex.ª os prazos de:
- 15 dias úteis, para reclamar;
- 3 meses, para impugnar judicialmente (…)”. – Cfr. fls. 01 e ss. do PA2, concretamente 95/96, cujo
teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
15. A Autora apresentou reclamação peticionando o pagamento dos créditos requeridos. – Cfr. fls. 24 e ss. do processo físico, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

E consignou inexistirem «…outros factos, para além dos que foram dados como provados, que revelem interesse para a boa decisão da causa».
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B – De direito

1. Da decisão recorrida

Debruçando-se sobre o mérito da ação a Mmª Juíza a quo começou por explicitar, na sentença (saneador-sentença) recorrida, que a pretensão da autora se dirigia essencialmente à prática do ato de deferimento do pedido de pagamento de créditos laborais que havia sido objeto do impugnado despacho de indeferimento e que, assim, atendendo ao objeto da lide delimitada pelo pedido e pela causa de pedir, e sendo objeto mediato dos autos um ato de estrito indeferimento, estava perante uma ação de condenação à prática de ato devido, dirigindo-se o processo, nos termos do artigo 66º nº 2 do CPTA não à anulação contenciosa do ato mas à condenação da Administração na prática de um ato que dê satisfação à pretensão do autor (vide pág. 3 da sentença recorrida).
Nesse desiderato, e convocando o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo DL. nº 59/2015, de 21 de abril, que considerou ser o aqui temporalmente aplicável, que percorreu, concluiu que todos os créditos laborais requeridos pela autora se venceram fora do período de referência (seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência), previsto no artigo 2º nº 4 do regime do Fundo, tendo consequentemente julgado improcedente a ação, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«(…)
Nos termos do despacho de 28.03.2018 do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial e considerando o despacho de concordância com as informações seja do Núcleo Fundo de Garantia Salarial, constata-se que o indeferimento do requerimento da Autora para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho teve como fundamento o facto de os créditos requeridos não se encontrarem abrangidos pelo período de referência, ou seja, não se terem vencido nos seis meses que antecederam a propositura da ação insolvência.
A Autora requereu a insolvência da sua entidade patronal em 11.03.2016 (ponto 5 dos factos provados), sendo que, por tal facto, o período de referência está compreendido entre 11.09.2015 e 11.03.2016.
Os créditos laborais da Autora venceram-se na data da cessação do contrato de trabalho, ou seja, em 28.08.2014, pelo que denota-se que tais créditos não se venceram nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência – 11.03.2016.
Mesmo a indemnização pelo despedimento ilícito, bem como, todas as retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento no dia 30.04.2015 (facto provado 4.), estão fora do período de referência.
A decisão judicial do Tribunal do Trabalho não tem a virtualidade de fazer alargar o período de referência encontrado.
Sumariou-se no Acórdão do TCAN de 02.07.2015, Proc. n.º 01826/11.5BEPRT, o seguinte:
“(…) II- O artigo 91.º do CIRE não se aplica aos créditos que já se tenham vencido em momento anterior à declaração de insolvência.
III- A exigência imposta pelo artigo 436.º do CT da ilicitude do despedimento ter de ser declarada por decisão judicial implica, correlativamente, o vencimento dos créditos salariais relativos à indemnização por despedimento ilícito e às retribuições vencidas desde a data do despedimento, apenas com o trânsito em julgado de decisão judicial que os reconheça.
IV- Não vale como decisão judicial para efeitos do disposto no artigo 436.º do CT a decisão que, no âmbito de processo de insolvência, declare a entidade empregadora insolvente”.
Por tudo que ficou dito terá que improceder a presente ação.»

2. Da análise e apreciação dos fundamentos do recurso
2.1 Da invocada nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão nos termos do artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC
2.1.1 Sustenta o recorrente que a citação feita na sentença recorrida do acórdão deste TCA Norte de 02/07/2015, Proc. n° 01826/11.5BEPRT, com vista a pretender fundamentar a decisão proferida, é contraditória com a decisão proferida na medida em que o que se defende no acórdão é exatamente o oposto daquilo que o Tribunal a quo conclui e dispôs na mesma, retirando-se do próprio sumário do acórdão a contradição com a sentença proferida, e que, assim, a sentença recorrida padece de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão nos termos do artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC – (vide, designadamente, conclusões viii), ix) e x) das alegações de recurso)
2.1.2 Vejamos, por se tratar de questão logicamente antecedente, se assim é.
2.1.3 Em sintonia com o comando constitucional inserto no artigo 205º nº 1 da CRP dispõe o artigo 154º do CPC novo sob a epígrafe “dever de fundamentar a decisão” (correspondente ao artigo 158º do CPC antigo), que “…as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas” (nº 1), não podendo a justificação consistir “…na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade” (nº 2).
A fundamentação das decisões jurisdicionais, para além de visar persuadir os interessados sobre a correção da solução legal encontrada pelo Estado, através do seu órgão jurisdicional, tem como finalidade elucidar as partes sobre as razões por que não obtiveram ganho de causa, para as poderem impugnar perante o tribunal superior, desde que a sentença admita recurso, e também para este tribunal poder apreciar essas razoes no momento do julgamento.
Nessa decorrência a nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC novo tem como premissa a violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial. Com efeito entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. De modo que se o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, tal oposição será causa de nulidade da sentença – vide a este respeito Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, Coimbra Editora; Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, págs. 689 ss; José Lebre de Freitas, in “Código de Processo civil Anotado”, 2º Vol., Coimbra Editora, 2001, pág. 670, e Luís Filipe Brites Lameiras, in, “Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil”, Almedina, 2009, pág. 36 ss..
Para que ocorra nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º tem que se estar perante um paradoxo ou incoerência de raciocínio, de modo que as premissas consideradas (fundamentos) não poderiam conduzir, de forma lógica, à conclusão (decisão) a que se chegou, mas a outra, oposta ou divergente.
2.1.4 Ora, como facilmente se conclui da leitura da sentença recorrida, tal não sucede na situação dos autos, não havendo incoerência, ou contradição lógica, entre os fundamentos e a decisão. Com efeito, entendeu nela a Mmª Juíza a quo que «…os créditos laborais da Autora venceram-se na data da cessação do contrato de trabalho, ou seja, em 28.08.2014, pelo que denota-se que tais créditos não se venceram nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência – 11.03.2016.», e que «…mesmo a indemnização pelo despedimento ilícito, bem como, todas as retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento no dia 30.04.2015 (facto provado 4.), estão fora do período de referência», acrescentando que «…a decisão judicial do Tribunal do Trabalho não tem a virtualidade de fazer alargar o período de referência encontrado».
Razão pela qual concluiu que todos os créditos laborais da autora se venceram fora do período de referência de seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência, previsto no artigo 2º nº 4 do regime do Fundo, tendo consequentemente julgado improcedente a ação.
2.1.5 Se assim é, não pode dizer-se ocorrer contradição lógica entre os fundamentos e a decisão motivadora da nulidade da sentença nos termos do artigo 615º nº 1 alínea c) do CPC.
O que poderá ocorrer é erro de julgamento, designadamente por errada subsunção dos factos ao direito, se for de concluir que os créditos requeridos se venceram dentro do referido período de referência.
Mas isso é coisa diferente, e que no momento próprio, se analisará.
2.1.6 Eis porque não colhe, neste aspeto, o recurso.

2.2 Da omissão e incorreção de factualidade relevante para a decisão da causa
2.2.1 O recorrente sustenta que a sentença recorrida incorreu também em nulidade por omissão de pronúncia por haver mais factualidade relevante para a decisão da causa que deveria ter sido feita constar da sentença - (vide conclusão xxv) das alegações de recurso)
Ora, não constitui nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia a que alude o artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC se existir, na perspetiva do recorrente, factualidade relevante para a decisão da causa que deveria ter sido feita constar da sentença. A ocorrer tal circunstância ela consubstanciará erro de julgamento da matéria de facto, por não terem sido, devendo sê-lo, dados como provados factos relevantes para a decisão da causa, e não em nulidade por omissão de pronúncia.
Não colhe, por conseguinte, esta invocada nulidade da sentença.
2.2.2 A recorrente sustenta, também, que em face da factualidade que alegou nos pontos 42. a 45. da petição inicial da ação, e que resulta dos documentos que ali foram juntos como Doc. n.º 2, concretamente os docs. n.º 3 e 5 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 81 a 84 e 140 a 143, implica que não possa ser mantida a redação que foi dada ao facto julgado provado sob o ponto n.º 4 da sentença recorrida, devendo a mesma ser modificada, devendo passar a ser a seguinte (vide conclusões xxvi) a xxx.) das alegações de recurso):
«4. Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 15-04-2015, notificada à Recorrente em 20-04-2015 por ofício de 15-04-2015, transitada em julgado nunca antes de 14-05-2015.
[factos alegados em 42 a 45 da petição, e que se impõe que seja dados como provados pela análise dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, doc. n.º 2 junto com a petição, concretamente docs. n.º 3 e 5 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 27 a 31 deste].»

E propugna ainda que o que alegou nos pontos e 48. a 56. da petição inicial da ação, e que resulta dos documentos que ali foram juntos como doc. n.º 2, concretamente doc. n.º 6 do doc. n.º 4 e do doc. 3 deste e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 85 a 89 e 144 a 148 e em especial fls. 149 e 246 vs., impõe que deva ser aditados ao probatório o ponto 4-a), com a seguinte redação - (vide conclusões xxxi) a xxxiii) das alegações de recurso):
«4. a) Foi proferida sentença no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF, que correu junto da 4.ª Secção de Trabalho da Instância Central de Vila Nova de Famalicão, Comarca de Braga, em 25-05-2015, notificada à Recorrente em 03-07-2015 por ofício de 30-06-2015, e notificada à entidade empregadora nunca antes de 06-07-2015 por ofício de 01-07-2015, transitada em julgado nunca antes de 16-09-2015, pela qual a entidade empregadora foi condenada a pagar à autora os créditos cujo pagamento esta pretende ver pagos pelo réu.
[factos alegados em 48 a 56 da petição e que se impõe que seja dados como provados pela análise dos documentos juntos aos autos, nomeadamente, juntos como doc. n.º 2 da petição, concretamente doc. n.º 6 e doc. n.º 4 deste e do doc. 3 e, bem assim, documentos juntos do PA a fls. 85 a 89, 144 a 148 e em especial fls. 149 e 246 vs deste

2.2.3 Vejamos, então, se deve, ou não, proceder-se à modificação do julgamento da matéria de facto nos termos propugnados pelo recorrente.
2.2.4 Na sentença recorrida foi dado como provado sob o ponto 4. do probatório o seguinte:
«4. Por sentença proferida em 15.04.2015 no âmbito do processo n.º 182/14.4T8VNF foi a sociedade comercial “R. & M. D. – C. G. E., Lda.” condenada a pagar determinadas quantias à Autora, a título de créditos pela cessação do contrato de trabalho (constando entre elas a indemnização por despedimento ilícito e todas as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento – 30.04.2015) e por sentença datada de 25.06.2015 foram liquidadas as quantias em dívida. – Cfr. fls. 01 e ss. do processo administrativo junto a fls. 212 e ss. do SITAF (doravante PA2), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.»

Mas também foi dado como provado no ponto 3. do probatório da sentença recorrida, sem que venha questionado no presente recurso, que o contrato de trabalho da autora, ora recorrente, cessou em 28/08/2014.
Pelo que em face dos termos que vêm postos, a questão é a de saber em que momento se venceram os créditos laborais que foram requeridos pela autora ao FUNDO DE GARANTIA SALARIAL.
E isso o que convoca é a interpretação jurídica dos factos, incluindo daquelas duas sentenças, já referidas no ponto 4. do probatório da sentença recorrida.
2.2.5 A questão não se situa, pois, no âmbito do julgamento da matéria de facto, que não se mostra nem incorreta nem deficitária, mas das conclusões jurídicas a que se haverá de chegar à luz do quadro normativo aplicável.
Com efeito, saber se os créditos laborais requeridos ao FUNDO DE GARANTIA SALARIAL se venceram em 28/08/2014, data em que ocorreu a cessação do contrato de trabalho, como foi entendido na sentença recorrida, ou se, como propugna a recorrente, o seu vencimento só se verificou em 16/09/2016, com o trânsito em julgado da sentença datada de 25/06/2015, por só com ela ter sido fixado (liquidado) o quantitativo desses créditos, é questão de direito a ser resolvida com aplicação do quadro normativo vigente, que aliás a recorrente convocou, ao qual haverá, naturalmente, que fazer a respetiva subsunção do contexto factual apurado.
2.2.6 Não se impõe, pois, proceder à modificação do julgamento da matéria de facto nos termos propugnados pela recorrente.
Pelo que não colhe, também nesta parte, o recurso.

2.3 Do erro de julgamento quanto à decisão de improcedência do pedido de condenação do réu a praticar o ato administrativo de deferimento do requerimento da autora
2.3.1 A recorrente sustenta que a sentença recorrida incorre em erro de julgamento ao considerar que os créditos salariais requeridos se situam fora do período de referência previsto no artigo 2º nº 4 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo DL. nº 59/2015 (seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência), por se terem vencido em 28/08/2014, data em que ocorreu a cessação do contrato de trabalho, defendendo, em suma, que à luz dos normativos do Código de Trabalho, do Código do Processo de Trabalho e do Código de Processo Civil, que convoca, e da jurisprudência que cita, o seu vencimento só verificou em 16/09/2016, com o trânsito em julgado da sentença datada de 25/06/2015, por só com ela ter sido fixado (liquidado) o quantitativo desses créditos, situando-se, assim, dentro do período de referência, e que ao assim não decidir o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por erro na interpretação e aplicação das normas ínsitas nos artigos 389.º, 390.º e 391.º n.º 1 do Código de Trabalho, artigo 80.º n.º 1 do Código de Processo de Trabalho, artigos 139.º n.º 5 e 249.º n.º 1 do Código de Processo ex vi artigo 1.º n.º 2 a) do Código de Processo de Trabalho, e n.º 4 do artigo 2.º do DL. n.º 59/2015, de 21 de abril - (vide conclusões i) a iv), v) a viii), xi) a xxiv), xxxiv) a xxxvii) das alegações de recurso).
2.3.2 Vejamos se lhe assiste, ou não, razão.
Para tanto façamos, primeiramente, o enquadramento normativo.
2.3.3 De harmonia com o disposto no artigo 380º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto), a garantia do pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, que não pudessem ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil era assumida e suportada pelo FUNDO DE GARANTIA SALARIAL (sendo o respetivo financiamento assegurado pelos empregadores, através de verbas respeitantes à parcela dos encargos de solidariedade laboral da taxa contributiva global, e pelo Estado - cfr. artigo 321º do Regulamento do Código de Trabalho). Matéria que veio a ser regulamentada no Capítulo XXVI do Regulamento do Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 35/2004, de 29 de julho (cfr. artigos 316º ss.).
Esta legislação nacional, referente ao FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, resultava da transposição da Diretiva n.º 80/987/CEE, do Conselho, de 20 de Outubro, relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes à proteção dos trabalhadores em caso de insolvência do empregador, alterada pela Diretiva n.º 2002/74/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Setembro, com a qual se visou assegurar aos trabalhadores assalariados um mínimo de proteção em caso de insolvência do respetivo empregador, obrigando os Estados-Membros a criar uma instituição que garantisse aos trabalhadores em causa o pagamento dos seus créditos em dívida.
Entretanto a Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou a revisão do Código do Trabalho, revogou a Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (Código de Trabalho), na redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, e pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e a Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho (Regulamento do Código do Trabalho), na redação dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, e pelo Decreto-Lei n.º 164/2007, de 3 de Maio (cfr. artigo 12º alíneas a) e b)).
Todavia os normativos dos artigos 317º a 326º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, mantiveram-se em vigor até terem sido revogados pelo artigo 4º alínea a) do DL. n.º 59/2015, de 21 de abril, por força do artigo 12º n.º 6 alínea o) da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS).
Sendo que este resulta, por sua vez, na transposição da Diretiva n.º 2008/94/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador.
O que significa que a interpretação dos normativos nacionais haverá de ser feita em conformidade (interpretação conforme) com a Diretiva comunitária transposta.
O DL. n.º 59/2015, de 21 de abril, que aprovou o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS), entrou em vigor em 04/05/2015 (primeiro dia útil do mês seguinte ao da sua publicação – cfr. artigo 5º), e nele se prevê o seguinte, no que respeita à sua aplicação no tempo:
“Artigo 3.º
Aplicação da lei no tempo

1 - Ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente decreto-lei, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.
2 - Os requerimentos apresentados ao Fundo de Garantia Salarial e pendentes de decisão são apreciados de acordo com a lei em vigor no momento da sua apresentação.
3 - Ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente decreto-lei, sendo objeto de reapreciação oficiosa:
a) Os requerimentos apresentados, na pendência de Processo Especial de Revitalização, instituído pela Lei n.º 16/2012, de 20 de abril;
b) Os requerimentos apresentados entre 1 de setembro de 2012 e a data da entrada em vigor do presente decreto-lei, por trabalhadores abrangidos por plano de insolvência, homologado por sentença, no âmbito do processo de insolvência.”

Em conformidade com o disposto no artigo 1º do NRFGS o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL assegura ao trabalhador (que exerça ou tenha exercido habitualmente a sua atividade em território nacional ao serviço de empregador com atividade no território de dois ou mais Estados-Membros, ainda que este seja declarado insolvente por tribunal ou outra autoridade competente de outro Estado-Membro da União Europeia ou outro Estado abrangido pelo Acordo sobre o Espaço Económico Europeu) o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja: a) Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador; b) Proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de processo especial de revitalização.
Sendo que à luz do disposto no artigo 2º do NRFGS os créditos garantidos abrangem “…os créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação”.
A redação destes normativos é muito similar à que constava dos artigos 317º e 318º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, nos termos dos quais o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL assegurava ao trabalhador, em caso de incumprimento pelo empregador, “…o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação” (artigo 317º), abrangendo as situações em que “… o empregador seja judicialmente declarado insolvente” (artigo 318º nº1) ou “…desde que se tenha iniciado o procedimento de conciliação previsto no Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro” (artigo 318º nº 1).
O mesmo sucede com o disposto no artigo no artigo 2º nº 4 do NRFGS, o qual estipula que o Fundo assegura o pagamento dos créditos “…que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas” e com o nº 5 do mesmo artigo, nos termos do qual “…caso não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.”
Tratando-se, assim, de normas equivalentes às que constavam dos nºs 1 e 2 do artigo 319º do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004) que dispunham o seguinte:
“Artigo 319.º
Créditos abrangidos
1 - O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior.
2 - Caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo de Garantia Salarial assegura até este limite o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência.
(…)”

2.3.3 Na situação dos autos a recorrente requereu em 20/04/2016 ao FUNDO DE GARANTIA SALARIAL o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho que havia cessado em 28/08/2014. Requerimento esse que foi indeferido por despacho de 28/03/2018 do Presidente do Conselho de Gestão daquele Fundo de Garantia com fundamento na circunstância de os créditos requeridos não se encontrarem abrangidos pelo período de referência, ou seja, nos seis meses que antecedem a propositura da ação de insolvência, nos termos do n.º 4 do artigo 2.º do DL. nº 59/2015, de 21 de abril, ou após a data da propositura da mesma ação, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.
O processo de insolvência da entidade patronal da requerente foi instaurado em 11/03/2016 (vide 5. do probatório), pelo que apenas estavam abrangidos no período de referência os créditos salariais vencidos a partir de 11/09/2015, como corretamente foi entendido na sentença recorrida, e não é posto em causa pela recorrente.
2.3.4 O que esta não acata é o entendimento que foi feito pela Mmª Juíza a quo de que os seus créditos laborais se venceram na data da cessação do contrato de trabalho, ou seja, em 28/08/2014, situando-os, assim, fora do período de referência.
2.3.5 Os créditos salariais requeridos pela requerente ao Fundo de Garantia Salarial, num total de 7.053,30 € foram assim por ela identificados no impresso/modelo que do requerimento que lhe dirigiu em 20/04/2016 (vide 7. do probatório – fls 1 ss. do PA – fls. 122 SITAF):
- Retribuição (retribuições intercalares já deduzidas do subsídio de desemprego) = 3.765,86 euros
- Subsídio de férias (proporcionais janeiro a abril) = 187,26 euros
- Subsídio de Natal (proporcionais janeiro a abril) = 187,26 euros
- Indemnização/compensação por cessação de contrato de trabalho = 2.812,92 euros

2.3.6 Esses créditos laborais são os que estão integrados na sentença condenatória datada de 25/06/2015, proferia pelo Tribunal de Trabalho no âmbito do Proc. nº 182/14.4T8VNF (vide 4. do probatório – fls 1 ss. do PA – fls. 122 SITAF).
Ora, aquela sentença de 25/06/2015 foi proferida na sequência da anterior sentença datada de 15/04/2015, prolatada no mesmo processo instaurada pela recorrente com vista à impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento que a entidade patronal havia feito operar. Sendo que pela sentença primeiramente proferida (a de 15/04/2015) foi declarado ilícito esse despedimento, e condenada a entidade patronal a pagar à ora recorrente as quantias que se viessem a liquidar, inerentes a:
i) uma indemnização, em substituição ao direito à reintegração, que deveria considerar o mínimo de 30 dias de retribuição base e diuturnidades por ano ou fração e o período que decorresse até ao trânsito em julgado daquela decisão;
ii) as retribuições que a trabalhadora deixou de auferir desde 29/08/2014 até ao trânsito em julgado daquela decisão (com as deduções devidas nos termos do artigo 390º do Código do Trabalho);
A tudo acrescendo juros de mora à taxa de 4%. (vide 4. do probatório – fls 1 ss. do PA – fls. 122 SITAF)
Esta condenação, assim proferida naquela sentença de 15/04/2015, foi-o ao abrigo do artigo 98º-J nº 3 do Código de Processo de Trabalho, como nela expressamente foi referido, nos termos do qual, na situação ali prevista, “…o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:
a) Condena o empregador a reintegrar o trabalhador, ou, caso este tenha optado por uma indemnização em substituição da reintegração, a pagar ao trabalhador, no mínimo, uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, sem prejuízo dos n.ºs 2 e 3 do artigo 391.º do Código do Trabalho;
b) Condena ainda o empregador no pagamento das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até trânsito em julgado;
c) Ordena a notificação do trabalhador para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação.”

E aquela sentença deu expresso cumprimento ao previsto no artigo 98º-J nº 3 alínea c) do Código de Processo de Trabalho ao determinar a notificação da trabalhadora para aqueles efeitos, advertindo-a de que deveria liquidar as quantias peticionadas.
E é nesse contexto que emerge a posterior sentença, datada de 25/06/2015 que, debruçando-se sobre o requerimento apresentado pela trabalhadora com vista à liquidação das quantias devidas a título de indemnização e de remunerações complementares, e fixando-as, condenou a entidade patronal a pagar à trabalhadora as seguintes quantias:
- 2.809,00 € a título de indemnização por antiguidade prevista no artigo 391º nº 1 do Código do Trabalho;
- 2.555,00 € a título de retribuições intercalares prevista no artigo 390º nº 1 1 do Código do Trabalho (já considerando a dedução do subsídio de desemprego recebido pela trabalhadora);
- 1.123,60 € a título de remuneração de férias vencidas em 01/01/2015 e não gozadas;
- 561,78 € a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal referentes ao ano da cessação.
Perfazendo o montante total de 7.049,38 €, ao qual acresceriam juros de mora à taxa de 4%.
2.3.7 Como já se entendeu, entre outros, no acórdão do TCA Sul de 01/06/2017, Proc. nº 13/15.6BESNT, então por nós relatado, disponível in, www.dgsi.pt/jtca, e ali se sumariou, «As obrigações vencem-se na data prevista na lei ou no contrato, momento em que se tornam exigíveis; o que significa que haverá que considerar os concretos créditos laborais cujo pagamento é solicitado ao Fundo de Garantia Salarial e respetiva natureza, para aferir à luz da lei ou do contrato, qual foi a respetiva data de vencimento
2.3.8 Não pode, assim, atenta a diferente natureza dos créditos laborais em causa, subscrever-se a afirmação genérica contida na sentença recorrida de que os créditos requeridos pela autora (todos eles) se venceram na data em que ocorreu a cessação do seu contrato de trabalho (no caso, 28/08/2014).
2.3.9 Assim não é, garantidamente, quanto à indemnização por antiguidade prevista no artigo 391º nº 1 do Código do Trabalho.
Relembre-se que ocorrendo despedimento ilícito, e declarada judicialmente essa ilicitude no âmbito de ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, nos termos dos artigos 387º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro (na redação à data em vigor) e 98º-C do Código de Processo do Trabalho aprovado pelo DL n.º 480/99, de 9 de novembro (na redação à data em vigor), como sucedeu no caso, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais e na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa (cfr. artigo 387º nº 1 alíneas a) e b) do Código do Trabalho), podendo em substituição da reintegração o trabalhador pode optar por uma indemnização, cabendo nesse caso ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude (mas nunca inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades), para o que deve atender, ainda, ao tempo decorrido desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial (cfr. artigo 391º nºs 1, 2 e 3 do Código do Trabalho).
2.3.10 Tal significa que o crédito relativo à indemnização por antiguidade decorrente de despedimento judicialmente declarado ilícito só se vence com o trânsito em julgado da sentença que condene a entidade patronal no respetivo montante, fixando o seu valor.
2.3.11 Com efeito, sendo o crédito for ilíquido não há mora enquanto não se tornar líquido (cfr. artigo 805º nº 3 do Código Civil), devendo ter-se a obrigação como ilíquida quando é incerto o seu quantitativo (vide, ALBERTO DOS REIS, Processo de Execução, vol. I, p. 446) ou quando a obrigação cuja existência é certa, não tem ainda o seu montante fixado (vide, ANTUNES VARELA, in, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7.ª edição, pp. 918 e 920).
Neste sentido, já se decidiu, entre outros, no acórdão do TCA Sul de 01/06/2017, Proc. 13076/16, então por nós relatado, disponível in, www.dgsi.pt/jtca, em que se sumariou o seguinte: «I – Nos termos do disposto no artigo 319º do Regulamento do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, a garantia do Fundo de Garantia Salarial apenas abrange os créditos laborais que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação de insolvência. II – As obrigações vencem-se na data prevista na lei ou no contrato, momento em que se tornam exigíveis; o que significa que haverá que considerar os concretos créditos laborais cujo pagamento é solicitado ao Fundo de Garantia Salarial e respetiva natureza, para aferir à luz da lei ou do contrato, qual foi a respetiva data de vencimento. III - Se a indemnização prevista no artigo 396.º do Código de Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, deve ser determinada entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo-se nesse cômputo não só ao valor da retribuição mas também ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, tal significa que a mesma não é líquida no momento em que é operada a cessação do contrato. IV - Se o crédito respetivo é ilíquido, não havendo mora enquanto não se tornar líquido (cfr. artigo 805º nº 3 do Código Civil), a indemnização devida ao trabalhador quando este opere a cessação do contrato de trabalho com fundamento em justa causa, nos termos do 396.º do Código de Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, não se vence na data da cessação do contrato, mas apenas quando, fixado o seu exato valor, este seja exigível.»; no TCA Sul de 12/02/2015, Proc. 11452/14, in, www.dgsi.pt/jtcas, onde se sumariou que «(…)a indemnização prevista no art. 443º, do Cód. do Trabalho de 2003, não é líquida no momento da cessação do contrato – pois corresponde a um valor a fixar entre 15 e 45 dias, isto é, é variável entre dois limites legalmente estabelecidos -, pelo que, e de acordo com o disposto no art. 805º n.º 3, do Código Civil, a mesma só se venceria quando fosse fixado o seu exato valor» e no Acórdão do STA de 10/09/2015, Proc. 0147/15, in, www.dgsi.pt/jsta, onde se entendeu que a obrigação de indemnização por antiguidade ali em causa se venceu, nos termos do art.º 443.º do CT e do art.º 805/3 do C. Civil, com o trânsito em julgado da decisão proferida pelo Tribunal de Trabalho que fixou o seu quantitativo.
2.3.12 Sendo que no caso, muito embora pela sentença primeiramente proferida (a de 15/04/2015) tenha sido declarado ilícito o despedimento da autora, e condenada a entidade patronal a pagar-lhe uma indemnização, em substituição ao direito à reintegração, essa indemnização não foi ali imediatamente fixada (liquidada), já que nela o Tribunal de Trabalho apenas determinou, ao abrigo do artigo 98º-J nº 3 do Código de Processo de Trabalho, que essa indemnização deveria considerar o mínimo de 30 dias de retribuição base e diuturnidades por ano ou fração e o período que decorresse até ao trânsito em julgado daquela decisão, sendo a respetiva quantia ainda a liquidar.
E só na posterior sentença, datada de 25/06/2015 o Tribunal de Trabalho, procedeu à liquidação das quantias devidas, incluindo a respeitante à indemnização por antiguidade que fixou em 2.809,00 €.
Pelo que, no caso presente, o crédito relativo à indemnização por antiguidade decorrente de despedimento judicialmente declarado ilícito só se venceu com o trânsito em julgado desta sentença datada de 25/06/2015 do Tribunal de Trabalho.
2.3.13 O que se disse também vale, com as devidas adaptações, quanto às retribuições intercalares, isto é, quanto às retribuições que a trabalhadora deixou de auferir desde a data do despedimento ilícito (29/08/2014) até ao trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento, a que alude o artigo 390º do Código do Trabalho, ao dispor, sob a epígrafe “compensação em caso de despedimento ilícito” que para além da indemnização por antiguidade o trabalhador tem ainda direito “…a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento” (nº 1).
Isto porque também estas só vieram a ser liquidadas na sentença de 25/06/2015 do Tribunal de Trabalho, que as fixou em 2.555,00 € (já considerando a dedução do subsídio de desemprego recebido pela trabalhadora).
Pelo que o crédito a elas referente só se venceu com o trânsito em julgado desta mesma sentença, datada de 25/06/2015, do Tribunal de Trabalho.
2.3.13 Assiste, pois, neste aspeto, razão à recorrente, tendo a sentença recorrida feito incorreta interpretação do direito, quanto a estes identificados créditos.
2.3.14 Diferentemente, os créditos referentes aos proporcionais de férias, subsídio de férias e de natal referentes ao ano da cessação, devem ter-se por vencidos aquando da cessação do contrato, na medida em que são devidos, nos termos legais, pela sua mera cessação, seja sob que forma ou título operou (cfr. artigos 245º e 263º do Código do Trabalho), não dependendo de condenação judicial.
Podendo por esta razão, firmar-se que estes se situam fora do período de referência (que compreendia, no caso, os créditos vencidos a partir de 11/09/2015, dado que o processo de insolvência da entidade patronal da requerente foi instaurado em 11/03/2016) na medida em que se venceram 28/08/2014, data da cessação do contrato.
2.3.15 Aqui chegados tem que se concluir que a sentença recorrida não pode ser mantida quanto ao entendimento, que nela foi feito, de que todos os créditos laborais requeridos ao FUNDO pela autora se haviam vencido com a cessação do contrato, por assim não ser, nos termos supra vistos, quanto à indemnização por antiguidade e quanto às retribuições intercalares, na medida em que só se venceram com o trânsito em julgado da sentença de 25/06/2015 do Tribunal de Trabalho.
2.3.16 Porém, não é possível aferir se a data dos vencimentos de tais créditos requeridos se situa ou não em momento posterior a 11/09/2015 (período de referência) na medida em que desconhece a data em que ocorreu o trânsito em julgado daquela sentença de 25/06/2015. Não sendo também conhecida a data em que a mesma foi notificada às partes, sendo inultrapassável, por ora, por falta de elementos contidos nos autos, a dúvida quanto a tal facto, essencial para aferir se a data dos vencimentos dos créditos requeridos se situa ou não dentro do período de referência. Elementos que este Tribunal ad quem não dispõe, como dele também não dispunha o Tribunal a quo.
Não está, assim, este Tribunal ad quem em condições de poder firmar, por falta de elementos necessários, um juízo quanto ao preenchimento do requisito referente ao período de referência previsto no artigo 2º nº 4 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial aprovado pelo DL. nº 59/2015, cuja não verificação foi fundamento do despacho de indeferimento de 28/03/2018, mantido pela sentença recorrida.
2.3.17 Impõe-se, por conseguinte, ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 alínea c) do CPC, ex vi dos artigos 1º e 140º nº 3 do CPTA, a baixa dos autos à 1ª instância para que esta assegure a ampliação da matéria de facto com vista a determinar-se a data do trânsito em julgado da sentença de 25/06/2015, devendo proceder, ao abrigo do princípio do inquisitório, às diligências instrutórias para tanto necessárias (designadamente, e sem prejuízo de outras, oficiando junto do Tribunal de Trabalho onde correu o identificado Proc. nº 182/14.4T8VNF, no sentido de certificar a data em que a referida sentença de 25/06/2015 foi notificada às partes, e se foi ou não dela interposto recurso, e, consequentemente, quando ocorreu o respetivo trânsito em julgado). Com o que se anula a decisão proferida na 1.ª instância, com observância do disposto na alínea c) do nº 3 do mesmo artigo.

2.4 Dos demais fundamentos do recurso
2.4.1 A recorrente invoca por fim, e a título subsidiário, que a sentença incorre em nulidade por omissão de pronuncia, nos termos do disposto no artigo 95º nº 3 do CPTA, na medida em que tendo julgada improcedente o pedido de condenação do réu à pratica do ato devido, nos termos em que tal pedido foi formulado, não ficaria prejudicado o conhecimento do pedido de anulação do ato, como sucederia se o pedido condenatório tivesse sido procedente, pois que tal decisão implicaria, pela própria natureza, o afastamento do ato da ordem jurídica, e que assim, em face do que decidiu, o Tribunal a quo não podia ter deixado de conhecer todos e cada um dos vícios que a autora invocou para fundamentar o pedido da respetiva anulação, ou, pelo menos, erro de julgamento por violação do disposto no artigo 95º nº 3 do CPTA - (vide conclusões xxxviii) a xliii) das alegações de recurso).
2.4.2 Em face dos termos em que a recorrente fez esta invocação, fazendo-a depender da sorte do pedido à condenação à prática do ato devido, e atendendo aos termos do decidido supra, ficando esse desfecho ainda dependente da ampliação da matéria de facto a efetuar, e do juízo que nessa decorrência se venha a fazer, mostra-se naturalmente prejudicado o conhecimento deste fundamento do recurso, a que, assim, nos abstemos de proceder.
*

IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder parcial provimento ao recurso, ordenando-se a baixa dos autos à 1ª instância com vista à ampliação da matéria de facto, nos termos supra explicitados, anulando-se a decisão recorrida, nos termos do artigo 662º nº 2 alínea c) do CPC, ex vi dos artigos 1º e 140º nº 3 do CPTA, com observância do disposto na alínea c) do nº 3 do mesmo artigo.

Sem custas nesta instância de recurso, face à decisão proferida e à circunstância de o recorrido não ter contra-alegado - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigo 4º nº 1 alínea a) do RCP.
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Notifique.
D.N.

Porto, 13 de dezembro de 2019


M. Helena Canelas
Isabel Costa
João Beato