Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00094/12.6BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/17/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:ERRO DE JULGAMENTO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO; PRINCIPIO DA UTILIDADE;
Sumário:I-Nos termos do artigo 662.º, n.º1 do CPC o tribunal de recurso só deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

II- Por força do princípio da utilidade a que estão submetidos todos os atos processuais, o exercício dos poderes de controlo sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se estiverem em causa factos suscetíveis de influírem na decisão da causa, segundo os vários enquadramentos jurídicos possíveis do seu objeto.

III- Dependendo o pedido de alteração do decidido na sentença recorrida no que à interpretação e aplicação do Direito respeita, do prévio sucesso da impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, permanecendo inalterados os factos considerados provados e não provados na sentença recorrida, necessariamente fica prejudicado o conhecimento da decisão de mérito nela proferida. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MUNICÍPIO DE (...)
Recorrido 1:J. e Outra
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte:

I. RELATÓRIO

1.1. J. e Outra, residentes na Rua (...), em (...), (...), intentaram a ação administrativa comum contra o MUNICÍPIO DE (...), pedindo a condenação do Réu “(…) a pagar aos AA. a quantia de 107.100,00 Euros correspondente a indemnização pela não execução de caminho de acesso ao terreno, devendo ainda o Réu Município atribuir aos AA. uma compensação pela alteração do PDM que esteve na base do acordo entre os AA e RR e que prejudicou grande e seriamente os interesses e o património dos AA., que se vêm agora completamente manietados nas suas intenções de realização de negócio, compensação essa, que se computa, neste momento em 170.083,40 Euros”.

Alegam, para o efeito, em síntese, que por escritura de compra e venda celebrada em 27.12.2005 entre autores e Réu, venderam ao último uma parcela de terreno (parcela n.º 8) sita na Rua (...), em (...), (...), com a área de 910 m2, tendo-se simultaneamente celebrado um outro acordo por via do qual o R. assumiu a obrigação acessória para com os AA. de construir um caminho paralelo de acesso da área sobrante do terreno a executar em simultâneo com a execução da VL_ e no prazo de 2 anos, sem o que teriam direito a ser indemnizados.
Que decorridos dois anos o caminho continuava por executar pelo que, tendo formalmente demandado o R. aquele respondeu que nada mais havia a fazer e que o caminho já se encontrava executado.
Os AA. entendem que há incumprimento contratual do R. e que têm direito a ser indemnizados na quantia de 107.100,00€, prejuízo correspondente à desvalorização sofrida pelo terreno, que é um prédio encravado.
Mais alegam que foram prejudicados pela alteração entretanto aprovada ao PDM do que resultou a inserção da área sobrante do terreno em área de expansão urbana de tipologia de moradia quando antes estava inserido em zona de edificabilidade extensiva, contrariamente às legitimas expectativas que acalentaram aquando do contrato de compra e venda com o R., que não foram respeitadas pelo R.
Sentem-se gravemente prejudicados no seu património e defraudados nas suas expectativas, pela alteração do PDM, para o que reclamam uma indemnização de 170.083,40€.
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O R. contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação. Na defesa por exceção invocou a incompetência material do tribunal e prescrição do direito e na defesa por impugnação, sustentou a improcedência da ação, por ter cumprido todas as suas obrigações, tendo sido aberto o caminho em causa.
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Os AA. replicaram nos termos do articulado de fls. 85 a 87 dos autos.
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Foi realizada audiência preliminar na qual se julgaram as exceções invocadas como improcedentes, bem como selecionados os factos assentes e elaborada a base instrutória.
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Realizou-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo.
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Em 16 de fevereiro de 2015, o TAF do Porto proferiu sentença, que julgou a presente ação parcialmente procedente, constando a mesma do seguinte segmento decisório:
«Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente ação e, em conformidade, condena-se o R. a pagar aos AA. a quantia de €107.100,00, a título de indemnização pelo incumprimento do acordo firmado em 27 de dezembro de 2005, absolvendo-o do demais peticionado.
Custas pelos AA. e R., na proporção do decaimento.
Registe e notifique.»
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Inconformado com esta decisão, o Réu interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão recorrida seja revogada.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma:
«
I. É quanto à questão de facto e de direito o presente recurso, impugnando o julgado nessa ambivalente dimensão.
Com efeito,
II. A matéria de facto ínsita no ponto 17, qual seja, “Passados 2 anos sobre a data da outorga da escritura, a execução do caminho paralelo de acesso à área sobrante do terreno referido em 4) continuava por concretizar”, deverá ser alterada, decidindo-se essa formulação como “não provado” e alterada pela seguinte asserção: “Na pendência da execução da VL_ e no prazo convencionado foi executado o caminho paralelo”.
Outrossim,
III. Devendo ser aditados ainda 2 itens ao probatório, na respeitante sistemática:
- “O arruamento originário da Travessa de (...) continuou sempre ligado à própria VL_, mantendo essa ligação à rede viária”; e
- “Passando a beneficiar o terreno sobrante da parcela expropriada do caminho paralelo e do caminho originário da Travessa de (...)”
IV. Tanto resulta da articulação e compreensão de toda a prova documental, maxime os registos fotográficos de fls..., juntos com a p.i. em 11/04/2014 e testemunhal, maxime das testemunha do Réu Eng. J. (Cfr. Gravação digital de 27/03/2014, de 01:34:28 a 02:14:54) e Eng. N. (Cfr. Gravação digital de 27/03/2014, de 02:46:00 a 03:22:40), cujos depoimentos unívocos se acham extratadamente precisos e relevados, os quais tiveram responsabilidades funcionais diretas aquando da contratação e execução do acordo e do consignado em 14 dos Factos Assentes. Outrossim, o depoimento da testemunha Dr. M. (Cfr. Gravação digital de 27/03/2014, de 00:18:52 a 00:27:38), sobre o sentido negociado e assumido de “caminho paralelo”, pelo Município.
V. Por outro lado, o quesito nº 23 deve ser dado por não provado e sempre, não escrito, eliminando-se essa resposta – Artigo 467, nº 1, al. d), do C.P.C., cessante, hoje 562, nº 1, al. d), preceito adjectivo assim violado.
VI. Ademais, tanto resulta sempre também do depoimento da testemunha N., assinaladamente extratada e cujo sentido foi mesmo considerado na fundamentação da questão de facto.
VII. Deve, pois, o Tribunal ad quem alterar a decisão da questão de facto no alcance sobreditamente propugnado e seus efeitos, adentro do cometido poder cognitivo de facto – Artigo 662, do C. P. Civil.
Por outro lado,
E quanto à questão de direito,
VIII. O instituto da responsabilidade civil contratual supõe a verificação cumulativa e pressupostos, que no caso dos autos não concorrem, não sendo imputável ao Município o dever de indemnizar – Artigo 483, do C. Civil.
IX. Tendo o Réu Município, contratualizado e se vinculado a garantir apenas a acessibilidade à parcela sobrante expropriada por caminho paralelo à VL 5 e no prazo de 2 anos, essa execução e potencialidade de acesso para a normal fruição ao tempo, satisfaz as exigências do cumprimento da obrigação assumida.
X. Ademais, os autos inculcam e denunciam pelos registos fotográficos juntos do local, que os AA. vedaram a parcela sobrante pelo caminho paralelo gizado e construído.
XI. Não resulta do ajuizado acordo, enquanto encontro de vontades negociadas, que as partes tenham prevenido desvalorização fundiária da parcela sobrante “a se”, tão só desvalorização decorrente do não acesso, se ficasse porventura encravado e se fosse caso disso.
XII. O acesso foi garantido, a possibilidade de fruição foi mantida e a expectativa pelos autores de transformação fundiária para urbanização não seria suposto ser por caminho paralelo, comummente entendido como não conferindo frente urbana infraestruturada, apenas serve de acesso de alcance e aproveitamento rural. E a parcela sobrante passou a beneficiar de ligação ao caminho paralelo e à VL_ (Hoje Eixo Concelhio Estruturante) – Artigo 115, do PDM revisto, in DR, 2ª Série, nº 155 de 12/08/2009.
XIII. O Município cumpriu com o convencionado, não podendo ser responsabilizado a indemnizar os autores, não tendo violado nenhum direito ou interesse legalmente protegido, ao invés do sentenciado, não decorrendo dano, facto ilícito e culposo e nexo de causalidade imputáveis.
XIV. Decidindo em contrário e em desconformidade, vinculando-se a entendimento que os factos dirimidos não encerram e a sentido que os preceitos não contêm, violou os princípios de direito substanciados no instituto de responsabilidade civil contratual, expressos nos artigos 483 e seguintes do código civil, bem assim os preceitos adjetivos, queridos aplicar.
XV. Deve, pois, ser provido o recurso, como propugnado.

Termos em que, e nos melhores de direito, suprido o omitido, deve ser dado provimento ao recurso, assim se fazendo acostumada Justiça»
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Os Autores não contra-alegaram.
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O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n. º1 do CPTA, não emitiu parecer.
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Prescindindo-se dos vistos legais mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II.DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado em função do teor das conclusões do Recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso –cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e artigos 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do NCPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA – e, por força do regime do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem no âmbito dos recursos de apelação não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Nos presentes autos, as questões que a este tribunal cumpre ajuizar, cifram-se em saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento sobre a matéria de facto e na subsunção jurídica que efetuou por ter julgado parcialmente procedente a ação e condenado o Réu a pagar uma indemnização aos autores, quando nenhuma responsabilidade lhe deve ser assacada, por ter cumprido o acordo estabelecido.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III.A DE FACTO

3.1. O Tribunal de 1.ª instância considerou provados os seguintes factos, sem prejuízo das alterações que venham a ser introduzidas na sequência do erro de julgamento sobre a matéria de facto que vem assacado à decisão recorrida:
«1) Por escritura pública de compra e venda celebrada em 27.12.2005, entre Autores e Réu foi celebrado um contrato de compra e venda de uma parcela de terreno (parcela n.° 8) sito na Rua (...), em (...), (...), com a área de 910m2, que confronta a norte com J., a sul com M., a nascente com caminho e a poente com os Autores - Cfr. documento n.° 1 junto com a petição inicial (p.i.)
2) …que foi adquirida pelo Réu para construção da obra Via de Ligação VL_ acessos ao Aterro sanitário de (...) - Cfr. documento n.° 1 junto com a p.i.
3) Simultaneamente com a celebração dessa escritura de compra e venda, celebrou-se um outro acordo entre aquelas mesmas partes - Cfr. documento n.° 2 junto com a p.i.
4) … no qual o Réu assumiu a obrigação de executar um caminho paralelo de acesso à área sobrante do terreno, a realizar em simultâneo com a execução da VL_ e no prazo máximo de 2 anos a contar da data da outorga daquela escritura e em conformidade com o projecto já aprovado- Cfr. documento n.° 2 junto com a p.i.
5) … e sujeitaram as partes que se a execução do caminho referido em 4) não fosse concretizada no prazo máximo de 2 anos, passariam os Autores a ter direito a uma indemnização pela desvalorização verificada em função da sua não execução - Cfr. documento n.° 2 junto com a p.i.
6) Os Autores contrataram o auxílio de um técnico (Engenheiro Civil), o qual elaborou um relatório onde conclui que a desvalorização referida em E) corresponde ao valor de € 107.100,00 - Cfr. documentos n.° 3, 4 e 5 juntos com a p.i.
7) O PDM em vigor à data da expropriação incluía o terreno dos Autores em áreas urbanas e urbanizáveis em Zona de edificabilidade extensiva,
8) … permitindo a construção de habitação uni ou bifamiliar, isolada ou em banda, sem embargo da possibilidade de construção para outros usos e tipologias, sendo a cércea padrão de rio + 2, podendo ir até ao limite de r/c + 3.
9) … constituindo a Zona de transição, na parte interior, uma reserva potencial de áreas para futuras zonas industriais ou de armazenagem.
10) O PDM de (...) foi revisto e alterado, resultando dessa alteração que a área sobrante está agora inserida em Áreas Urbanas mais propriamente em áreas de expansão urbana de tipologia de mercadorias.
11) … só sendo possível, na prática, a construção de moradias de r/c e andar.
12) …e nem mesmo a construção de naves para a indústria ou armazenagem é já possível.
13) Em 3/7/2007 deu entrada na Divisão Municipal da Administração e Finanças requerimento do Autor, no qual alegava que o caminho paralelo previsto de acesso à parcela sobrante não tinha sido executado, solicitando informação sobre o estado do procedimento relativamente à sua execução, concedendo o prazo de um mês, sob pena de quantificar a desvalorização da parte sobrante - Cfr. resulta do documento n.° 5 junto com a contestação.
14) Instado e pedido pelo Réu esclarecimento à S., esta entidade informou que o caminho paralelo já havia sido executado aquando da construção da VL 5 com as mesmas características de todos os outros já anteriormente executados ao longo da via, como previsto e acordado - Cfr. resulta documento n.° 1 junto com a contestação.
15) Em 08.10.2007, realizou-se reunião na Divisão Municipal do Réu, na qual os seus técnicos Eng.º. J. e Dr. C. deram conhecimento ao Autor do cumprimento pelo Município e da informação prestada pela S./E. - Cfr. resulta do documento nº 6 junto com a contestação
16) Face a nova comunicação, através de mandatário dos Autores, foi, por ofício datado de 22.04.2008, comunicada a posição anteriormente já transmitida do Município e cumprimento da obrigação acessória no prazo convencionado - Cfr. resulta do documento n.° 6 junto com a contestação.
17) Passados 2 anos sobre a data da outorga da escritura, a execução do caminho paralelo de acesso à área sobrante do terreno, referido em 4) continuava por concretizar –
18) O valor acordado de 34.915,85 Euros, correspondente ao preço a pagar no dia da escritura, diz respeito apenas à área dos 910m2.
19) …no pressuposto que a área sobrante não sofria qualquer desvalorização.
20) …o que só aconteceria se se executasse o caminho paralelo em simultâneo com a execução da Via de Ligação (VL_) e num curto espaço de tempo.
21) … caso contrário só acordariam na venda se recebessem uma indemnização correspondente à perda do total da área e não apenas de 910m2.
22) O acordo referido em 3) resulta de uma exigência dos autores face a fundado receio que sentiam de ver a área sobrante do terreno do prédio sua propriedade ficar sem acessibilidades.
23) O valor de €107.100,00 corresponde à desvalorização sofrida pelo terreno sobrante pela não execução do caminho referido em 4).
24)Dá-se aqui por integralmente reproduzido o PA apenso.
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Não resultaram provados os factos seguintes:
- Na pendência da execução da VL 5, e no prazo convencionado, foi executado o caminho referido em 4).
- o arruamento originário da Travessa de (...) continuou sempre ligado à própria VL 5, mantendo essa ligação à rede viária.
- passando a beneficiar o terreno sobrante da parcela expropriada do caminho referido em 4) e do caminho originário da Travessa de (...).».
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III.B DO DIREITO
3.2. Delimitação objetiva do âmbito do recurso
O Apelante recorre da decisão recorrida que o condenou a pagar aos autores a «quantia de €107.100,00, a título de indemnização pelo incumprimento do acordo firmado em 27 de Dezembro de 2005» por ter julgado «provado que o R. não executou, como foi contratualizado, o designado “caminho paralelo” à VL_, para acesso á parcela sobrante do terreno dos AA., caminho esse que iria permitir o aproveitamento urbanístico dessa parcela». O Tribunal a quo considerou estar-se perante uma situação de incumprimento de obrigação a que se vinculou o R. e que foi formalmente consagrada em acordo escrito celebrado na mesma data em que foi celebrado o contrato de compra e venda de parte do terreno dos autores, necessário à execução da obra pública VL_, que provocou a desvalorização da parcela sobrante do prédio dos autores, dando como verificado o nexo de causalidade entre os prejuízos reclamados de 107.100,00 e a conduta do Réu. Lê-se na decisão recorrida «É, pois, incontroverso que os referidos danos reclamados, calculados no montante de €107.100,00 e resultantes do incumprimento do R. devem ser ressarcidos, sendo certo que, tratando-se de responsabilidade contratual como in casu se trata, há presunção legal de culpa do contraente faltoso, o ora R., nos termos do n.º 1 do artigo 799.º do Código Civil e que este refutou a obrigação de pagamento desta quantia com base na circunstância de ter construído o caminho paralelo tal como foi acertado com os AA., o que, como se constata, não corresponde a realidade».
O Recorrente discorda da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, fazendo assentar o seu dissentimento, no error in judicando, decorrente de erro na apreciação ou valoração das provas, dos factos- julgados provados e não provados- relativos à questão da não execução do “caminho paralelo” á VL_, que na sua perspetiva, foi executado.
A impugnação tem por objeto apenas a decisão da matéria de facto que na ótica do Recorrente, contrariamente ao que sucedeu, devia ter dado como provado que o mesmo abriu o caminho paralelo à VL_ e que o fez nos termos acordados com os autores no dito acordo escrito, gravitando toda a controvérsia à volta da execução ou não execução do aludido caminho.
Sendo esta a questão concreta controversa, importa, por conseguinte, proceder ao exame dos poderes e dos parâmetros de controle deste Tribunal relativamente à decisão da questão de facto.
3.3. Do Erro de Julgamento Sobre a Matéria de Facto.
3.3.1. O Apelante imputa à decisão recorrida erro de julgamento sobre a matéria de facto.
Antes de passarmos à análise dos concretos erros de julgamento que o Recorrente assaca à matéria de facto operada pelo tribunal a quo, impõe-se enunciar os critérios que presidem a essa impugnação e os termos a que este tribunal se encontra subordinado na reponderação da prova produzida.

3.2.2. Dos critérios impostos ao Recorrente em sede de impugnação da matéria de facto.

Com a reforma introduzida pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, ao CPC, o legislador introduziu o registo da audiência de discussão e julgamento, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, de modo que a alteração da matéria de facto, que no anterior regime processual era excecional, passou a ser uma função normal do tribunal de segunda instância.

Nessa operação foi propósito do legislador que o tribunal de segunda instância realize um novo julgamento em relação à matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta expressamente do estatuído no art.º 662º, n.º 1 do CPC, quando nele se expressa que a “Relação” deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Como vem sendo repetidamente afirmado pelo jurisprudência, na sequência daquelas alterações, são de rejeitar todas as interpretações minimalistas do enunciado art.º 662º que, refugiando-se nas dificuldades relacionadas com a audição dos depoimentos testemunhais captados sem registo de imagem, com prejuízo do princípio da imediação (prejuízo esse que, aliás, é uma realidade), se limitam a fazer um controlo meramente formal da fundamentação vertida pelo tribunal a quo, assim como aquelas que se limitam a fundamentar, de forma genérica, sem referência aos concretos meios de prova e a conectá-los entre si e com as regras da experiência comum, isto é, sem fazer um novo julgamento, por forma a demonstrar o acerto ou desacerto da decisão proferida pelo tribunal a quo em relação à matéria impugnada em sede recursória.

Na verdade, o desiderato do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe um novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil”.

Resulta do que se vem dizendo que perante as regras positivas enunciadas na atual lei processual, tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, o tribunal de segunda instância deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo, nessa tarefa, considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, tudo da mesma forma como o faz o juiz da primeira instância.

Como verdadeiro tribunal de substituição, a segunda instância aprecia livremente as provas produzidas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art.º 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).

Nessa sua livre apreciação, não está condicionada pela apreciação e fundamentação do tribunal recorrido uma vez que o objeto da apreciação em 2ª instância é a prova produzida, tal como na 1ª instância, e não a apreciação que a 1ª instância fez dessa mesma prova, podendo e devendo na formação dessa sua convicção autónoma, recorrer a presunções judiciais ou naturais nos mesmos termos em que o faz o juiz da primeira instância.

Não obstante o que se acaba de dizer, não foi propósito do legislador que o julgamento a realizar pela segunda instância em sede de matéria de facto se transformasse na repetição do julgamento realizado em primeira instância, sequer admitir recursos genéricos, e daí que tenha rodeado o recurso da impugnação da matéria de facto com a imposição ao recorrente de determinados ónus, que enuncia no art.º 640º do CPC., destinados a obstar que o recurso da matéria de facto se transforme numa repetição dos julgamentos e a rejeitar a admissibilidade de recursos genéricos, contra a errada decisão da matéria de facto, tendo “o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, pelo que se mantém o entendimento que, como tribunal de 2ª instância que é, este deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto, estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.

Acresce que tal como se impõe ao juiz a obrigação de fundamentar as suas decisões, também ao recorrente é imposto, como correlativo do princípio da auto- responsabilidade e dos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o seu recurso, demonstrando o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desses ónus, indicar não só a matéria que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, se impunha que tivesse sido proferida e os concretos meios de prova que reclamam essa solução diversa.

Deste modo, é que o art.º 640º, n.º 1 do CPC, estabelece que “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Depois, caso os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (al. a), do n.º 2 do art.º 662º do CPC).

Note-se que cumprindo a exigência de conclusões nas alegações a missão essencial da delimitação do objeto do recurso, fixando o âmbito de cognição do tribunal ad quem, é entendimento jurisprudencial uniforme que, nas conclusões, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados.

Já quanto aos demais ónus, os mesmos, porque não têm aquela função delimitadora do âmbito do recurso, mas se destinam a fundamentar o recurso, não têm de constar das conclusões, mas sim das motivações.
Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes, sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente:
a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos.

O cumprimento dos referidos ónus tem, como alerta Abrantes Geraldes, a justificá-la a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da Relação, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações. É que só na medida em que se conhece especificamente o que se impugna e qual a lógica de raciocínio expandido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a parte contrária a poder contrariá-lo em sede de contra-alegações.

A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação da matéria de facto deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de auto- responsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo”.
Por último, precise-se que porque se mantêm em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, o uso pela segunda instância dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.

A alteração da matéria de facto só deve, assim, ser efetuada pelo Tribunal ad quem quando, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância. O que se acaba de dizer encontra sustentação na expressão “imporem decisão diversa” enunciada no n.º 1 do art.º 662º do CPC, bem como na ratio e no elemento teleológico desta norma.

Deste modo, “em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”.

3.2.3.No caso, analisada a impugnação da matéria de facto operada pelo Recorrente, impõe-se reconhecer que o mesmo cumpriu com os ónus que sobre si impendiam e que acima se elencaram em sede de impugnação da matéria de facto, na medida que indica qual a concreta matéria de facto que, na sua perspetiva, devia ter sido dada como não provada e que foi dada como provada pelo tribunal a quo e a matéria que tendo sido dada como não provada devia ter sido julgada provada, quais os concretos elementos de prova que suportam essa matéria de facto que devia ter sido considerada e dada como provada, no que respeita à prova gravada, indica os concretos pontos do depoimento prestado pelas testemunhas que igualmente suportam, na sua perspetiva, a prova dessa matéria, transcrevendo, inclusivamente, os concretos excertos desses depoimentos que suportam essa matéria, pelo que, deste ponto de vista, nenhum obstáculo processual se levanta a que se conheça dessa impugnação.

3.3. Dos concretos erros de julgamento.

3.3.1.O Recorrente sustenta que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento por ter dado como provada a matéria lavrada no item 17 do probatório, requerendo que essa matéria seja dada como não provada, passando a constar desse item, como factos provados, que: “Na pendência da execução da VL_, e no prazo convencionado foi executado o caminho paralelo”

Para o efeito, alega que dos autos apenas resulta que o Réu se vinculou à construção de um caminho paralelo à VL_, para garantir a acessibilidade à parte sobrante do prédio dos autores, e que isso foi executado. Mais alega que tal «resulta demonstrado num modo e alcance talqualmente era anteriormente e ao tempo possibilitado pela Travessa interrompida».
Que apenas foi «acordado “caminho” (que não arruamento), para simples acesso e numa zona ao tempo profundamente rural, sem frente urbana infraestruturada.
E esse caminho paralelo, “qua tale” foi executado, como o Município sempre o entendeu e pré-concebeu, pese a diferente expectativa que os AA., alimentaram.»
Alicerça a prova desta matéria nos depoimentos testemunhais, que transcreve, dos funcionários do Réu: (i) M., jurista no Gabinete de Gestão do Património; (ii) J., engenheiro civil, que acompanhou a laboração da escritura e do acordo;(iii) N., engenheiro, Chefe de Divisão do Departamento do Património.

3.3.2.Desde já se antecipa que a decisão da Meritíssima juiz a quo de dar como provado no ponto 17 dos factos assentes, que «Passados 2 anos sobre a data da outorga da escritura, a execução do caminho paralelo de acesso à área do terreno, referido em 4) continuava por executar» não enferma de erro de julgamento.

Na verdade, considerada a prova documental carreada para os autos, a inspeção judicial ao local e os depoimentos testemunhais prestados em audiência de julgamento, que ouvimos integralmente -e não apenas os depoimentos das testemunhas apontadas pelo Réu- a matéria que consta do item 17 encontra-se corretamente julgada ao ter sido dada como assente pelo tribunal a quo.

Começando pelo depoimento da testemunha M., jurista no Gabinete de Gestão do Património, funcionário do Réu, a conclusão que dele se retira é que aquela testemunha nada sabe de relevante sobre a questão do caminho, concretamente, sobre o que foi acordado entre os autores e o réu quanto ao tipo de caminho a construir pelo Réu, quais as suas características, se esse caminho era um caminho igual ao que existia, constituído pela Travessa de (...) ou se estava em causa a construção de um caminho, tipo arruamento, destinado a servir a parte restante do prédio dos autores atenta a sua apetência urbanística e não para fins estritamente agrícolas.
Esta testemunha, por desconhecer o que foi acordado entre as partes, conhecendo apenas o que se encontra lavrado no acordo escrito, prestou um depoimento que não permite, a partir do mesmo, alicerçar uma convicção séria no sentido da prova em como o caminho que foi aberto, que referiu ser um caminho rural, corresponda ao caminho cuja construção foi acordada entre o Réu e os autores.

Já as testemunhas J., engenheiro civil, que acompanhou a elaboração da escritura e do acordo e, N., engenheiro, Chefe de Divisão do Departamento do Património, foram unânimes em afirmar que o caminho que o Réu acordou em construir, respeitava a um caminho paralelo igual a todos os demais, tratando-se de um caminho em terra batida, e que o concreto caminho a que o Réu se vinculou está executado.
Porém, tais depoimentos, não só não foram confirmados pelos depoimentos prestados pelas demais testemunhas, como a demais prova produzida, está em oposição aos que aquelas testemunhas afirmaram em julgamento.
Vejamos.
- a testemunha I., jurista a exercer funções na CM(...) desde 1989, confirmou em depoimento pessoal em audiência final, que o preço pago aos autores foi no pressuposto que área sobrante não sofreria nenhuma desvalorização, o que dependia da execução do caminho paralelo em simultâneo com a execução da VL_, posto que, de contrário, só acordariam na venda se recebessem uma indemnização pela totalidade do terreno, tendo confirmado que o acordo escrito resultou de uma exigência dos autores perante o receio de verem a parte restante do prédio sem acessibilidades;
- a testemunha M., que foi notária privativa da CM de P. até 2006 e que prestou assessoria ao autor, tendo estado presente numa reunião na CM(...) com o autor, afirmou que os documentos que lhe foram exibidos apontavam para a construção de um caminho com determinadas características, ou seja, pavimentado e com infraestruturas que permitissem a viabilização económica da parcela sobrante e que estiveram na génese da redação do acordo escrito, confirmando que a venda foi efetuada no pressuposto da parte restante do terreno não sofrer desvalorização o que só aconteceria se o réu executasse o caminho e em simultâneo com a VL_.

Também as testemunhas V., J. e J-., confirmaram que o valor acordado pela venda parcial que os autores efetuaram, foi fixado no pressuposto da área restante não sofrer desvalorização o que passava pela construção de um caminho paralelo e em simultâneo com a construção da VL_, num curto espaço de tempo, pois caso contrário os autores só teriam acordado na venda total do prédio.
A testemunha V. confirmou que o referido acesso, paralelo à VL_, que era de sul para norte, não foi construído, o que foi confirmado pela testemunha J., que referiu expressamente que na pendência da execução da VL_ e no prazo convencionado não foi executado o caminho referido no acordo escrito; e bem assim, pelas testemunhas J--., J---., e J-..
Esta última testemunha, engenheiro de profissão, que disse ter conhecido os autores porque lhes fez uma peritagem ao terreno em causa, afirmou ainda ter ele próprio sugerido aos autores que se construísse o caminho para que fosse permitida a urbanização do terreno que estava garantida antes da VL_, não permitindo a Travessa de (...) a urbanização da parte restante do terreno, afirmando que as condicionantes não foram executadas; estava em causa a construção de uma Rua de 6 metros de largura que permitia a construção, que embora não interferisse com a via permitisse o acesso da frente urbana, tendo a parcela sofrido desvalorização porque perdeu características de urbanização. Mais afirmou que esse caminho não se destinava apenas a permitir o acesso á parte sobrante do prédio mas a garantir a sua viabilidade urbanística.

3.3.3.Acresce que, compulsado o PA junto aos autos, concretamente, no que se reporta aos antecedentes negociais que ocorreram entre autores e réu, na parte em que os mesmos aí se encontram documentados, percebe-se que a exigência da construção do caminho que os autores fizeram questão que ficasse a constar de acordo escrito, foi determinante para que os mesmos tivessem alineado apenas a parcela de terreno adquirida pelo Réu e acabassem por não exigir a aquisição da totalidade do respetivo prédio, conforme pretendiam ab initio, conquanto, dessa forma, acautelavam que a parte sobrante do terreno do seu prédio não sofresse uma desvalorização com o referido negócio. Assim como se retira que se tratava de obter do Réu a sua vinculação á construção de um caminho pavimentado, com as necessárias infraestruturas.

Atentemos nos seguintes elementos probatórios:
(i)o autor por de carta de 14 de abril de 2000, de fls. 161 e 162 do PA, que dirigiram ao Senhor Diretor de Departamento Administrativo e Financeiro da CM(...), colocou as seguintes questões:
«1. Como é feito e garantido o acesso existente à minha propriedade através da Travessa de (...) já que o mesmo fica cortado com a execução da obra em título ?;
2. Quais são as potencialidades construtivas que a parte sobrante do prédio continuará a manter nessa frente, uma vez que detinha já essas potencialidades?
3. Está garantido o restabelecimento do caminho de acesso à minha propriedade em substituição do da Travessa de (...)?
3.1. E nesse caso esse restabelecimento admite a mesma potencialidade construtiva prevista no PDM como área de edificabilidade extensiva no qual o terreno se insere?
A satisfação destas questões permitirá garantir a continuidade das potencialidades da parte restante do terreno.
A não satisfação destas questões levanta a quantificação da desvalorização dessa mesma área a qual não está contemplada na proposta de indemnização oferecida por V. Ex.ª em 99-08-24 através do ofício n.º 447/SPE».
(ii) por carta de 30.05.2000 ( cfr. fls. 202 do PA), que o autor dirigiu ao Presidente da CM(...), solicitou que as questões que colocou nos pontos 1,2 e 3 da anterior missiva, fossem respondidas com toda a urgência «uma vez que estou interessado em promover o aproveitamento da parte restante do prédio» situação que «pode decidir os termos do possível acordo»;
(iii) a fls. 126 do PA, relativamente à pretensão do autor, consta da informação datada de 2002/07/02, subscrita pela Técnica Superior de Planeamento Dra. C., urbanista, que «segundo informação verbal do sector de Património e Expropriações o projeto de execução da via ( VL_) neste troço vai ser alterado por forma a garantir o acesso aos terrenos confrontantes, prevendo-se para o efeito a execução de uma faixa de rodagem lateral de acesso às propriedades.
Nestas circunstâncias esta via poderá permitir a eventual ocupação da parte restante da parcela para fins urbanos nos termos previstos do artigo 24.º do Regulamento o PDM…);
(iv) Sobre essa informação recaiu o seguinte despacho: « Ao Sector do Património e expropriações remetendo o parecer emitido, acrescentando no entanto que a ocupação da parcela para fins urbanos ficará cumulativamente dependente da garantia de arruamento pavimentado, redes de abastecimento de água, de energia elétrica e de saneamento, que actualmente não existem» ( fls. 126 do PA);
(v) por carta datada de 09.08.2004 de fls. 100 do PA, expedida pela advogada do autor para o Presidente da CM(...), e sobre o assunto relativo ao terreno do autor, apresentou uma proposta tendo em vista a aquisição por acordo da parcela a expropriar, do seguinte teor: « A nossa proposta pressupõe o pagamento de uma indemnização no valor de 302 835€ e a expropriação total do prédio e fundamenta-se no relatório de avaliação que remetemos em anexo, para uma melhor análise por parte dos serviços dessa autarquia»;
(vi) na informação n.º 357-2004/DME de fls. 97 a 99 do PA, elaborada pelo Eng. J. da Divisão Municipal de Expropriações, lê-se:« Recentemente e na sequência dos contactos efetuados com o proprietário foi-nos remetida uma contraproposta na qual nos é requerida a expropriação total da parcela, consubstanciada numa avaliação anexa. No referido documento considera-se que por força da restrição “non aedificandi”, a desvalorização resultante implicaria a perda do interesse económico da parcela restante.
(…) Em face do exposto, torna-se necessário definir qual o âmbito e a tipologia da via paralela a construir e se esta permitirá a ocupação para fins urbanos, uma vez que se encontra dependente desta definição o montante a acordar para atribuição da indemnização ao expropriado»;
(vii) a fls.94 do PA, em resposta subscrita pela Eng.ª Civil S., da CM(...), pode ler-se que: « Em resposta ao solicitado pela Divisão Municipal de Expropriações através da informação n.º 357-2004/DME no que diz respeito à definição do âmbito e tipologia dos caminhos paralelos da Via de Ligação VL_ e se estes permitirão a ocupação para fins urbanos da parcela P8, cabe-nos informar o seguinte:
*No relatório de avaliação apresentado pelo proprietário da parcela alvo de análise no ponto E.2, é referido que “por força da restrição “ non aedificandi” estabelecida pelo decreto lei nº 13/94, e demais normas Municipais complementares é desvalorizada a área sobrante da expropriação, dada a condicionante implícita de perda de acessibilidade”. Ora, a Via de Ligação VL_ é uma via municipal que apenas se rege pelo estabelecido no artigo 46º - Vias de Ligação do Plano Diretor Municipal. No artigo mencionado, nada é referido no que diz respeito a restrições “ non aedificandi”, apena na alínea f) do ponto 2 é referida a criação de “corredor de apoio à construção marginal quando se justifique”, ficando assim garantida a acessibilidade à parcela;
*Em reforço à resposta dada em tempo pelo Departamento Municipal do Ordenamento do Território, Paisagem Urbana e Ambiente, a ocupação para fins urbanos ficará cumulativamente dependente da garantia de arruamento pavimentado e redes de infraestruturas»;
(viii) sobre a informação supra referida de fls. 97 a 99 do PA, recaiu despacho do seguinte teor: « Ao Sr. Eng.º C. ( G.) para que, no âmbito da informação que antecede, se pronunciar sobre o que haja por mais conveniente, tendo em consideração a “expropriação total”»;
(ix) a fls.10 do PA, em nota de 2005/12/14 proveniente dos Serviços de Notariado da CM(...), elaborada por I., jurista, lê-se o seguinte: « No seguimento das negociações….vem …solicitar que na respetiva escritura ou em acordo escrito complementar à escritura, se faça constar que:
“a) O MUNICÍPIO DE (...) assume a obrigação de executar o caminho paralelo de acesso à área sobrante do terreno dos requerentes, em simultâneo com a execução da VL_ e no prazo máximo de dois anos, a contar da data da outorga da escritura e em conformidade com o projeto já aprovado, que fica arquivado.”
“b) Findo o prazo definido na alínea anterior, sem que esteja garantido o acesso à área sobrante, o Município reconhece aos requerentes o direito a uma indemnização pela desvalorização verificada”
(…) sugeri a elaboração de acordo escrito nos termos pretendidos, a realizar simultaneamente com a escritura de compra e venda e não complementar à escritura como era pretendido, que obteve concordância pelo que submeto o assunto à consideração de V. Exa.»;
(x)Sobre a informação que antecede recaiu o seguinte despacho de 05.12.2004: «Concordo. Proceda-se como se sugere».

3.3.4. Por conseguinte, a consideração dos depoimentos das testemunhas que o réu indica, não é suficiente para revogar o julgamento efetuado sobre a matéria de facto que foi dada por assente sob o ponto 17 do probatório.

A mera consideração dos elementos de prova que constam do processo administrativo, são esclarecedores, quer do porquê da exigência pelos autores do referido acordo escrito que vinculasse o réu à construção do caminho de acesso à parte sobrante do terreno, quer das características e tipo de caminho que era necessário construir de forma a que o prédio daqueles pudesse ser aproveitado para fins urbanísticos.

Resulta cristalinamente do PA que a não desvalorização dessa parte sobrante do prédio dos autores dependia da construção de um arrumamento com as características indicadas pelos próprios serviços do réu na fase pré-negocial.

A exigência feita pelos autores da celebração de um acordo escrito que vinculasse a CM(...) à construção do caminho, à luz das próprias regras normais da experiência de vida, tem um significado, que no contexto dos antecedentes que culminaram na celebração da escritura pública de alineação parcial desse prédio ao Réu, constitui um relevante elemento de prova em abono da versão dos factos sustentada pelos AA.

Conforme a Meritíssima juiz discorre na decisão recorrida «importa não esquecer que há fases que antecedem o contrato/acordo, como sucedeu no caso presente, em que se realizam várias diligências com vista à preparação e negociação entre as partes e que se revelam…como elementos preciosos na interpretação do sentido da declaração negocial dos AA…no caso concreto, na fase que antecedeu a escritura de compra e venda e o acordo simultâneo, não se podem ignorar as diversas interpelações e propostas que os AA. dirigiram ao R. bem assim como a opção final que ambos escolheram, de forma a perceber o exato alcance das exigências dos AA., que o R. acatou, de forma a que o processo de aquisição da parcela necessária à construção do acesso pudesse prosseguir sem entraves.»

Se estivesse apenas em causa garantir um acesso, qualquer que fosse, á parte restante do prédio, bastando-se os autores com a abertura de um caminho em terra batida e sem qualquer infraestruturação, não se percebe que tivessem exigido a redução desse compromisso a um acordo escrito.

Acresce que os autores conheciam a aptidão urbanística desse terreno e a desvalorização que o mesmo sofreria caso não fosse garantido um acesso que viabilizasse o seu aproveitamento para fins urbanísticos, daí a preocupação em assegurar a construção do caminho por parte do Réu.
E sabiam-no por informação dos próprios serviços técnicos do Réu, que em informações que constam do PA expressamente referiram que a forma de obviar a essa desvalorização da parcela restante do prédio passava, desde logo, pela construção de um acesso pavimentado e devidamente infraestruturado.

Note-se, que o acesso de que então os autores dispunham para o seu prédio e que se processava através da dita Travessa de (...), estava ele próprio, dotado de algumas infraestruturas, como as de rede de água e rede elétrica, conforme se retira do PA, donde, também por este prisma, se retira não ser minimamente credível que os autores se bastassem com um acesso que não tivesse sequer aquelas infraestruturas, como o réu insiste em fazer crer.

3.3.5.Em suma, pese embora o teor literal do acordo não ofereça nenhum indicador sobre as características do caminho a construir pelo Réu – fala-se apenas em caminho-, a verdade é que os elementos probatórios que supra elencamos e que constam do PA, quando concatenados com a exigência dos autores na celebração de um acordo escrito que vinculasse o Réu a construir o caminho, com a preocupação em garantir que a parte restante do terreno não sofresse desvalorização por força da cedência que fizeram ao réu, tratando-se de um terreno com elevada aptidão construtiva à luz do PDM então em vigor, tudo visto e ponderado, seria bastante para alicerçar a convicção do julgador necessária à prova em como o caminho que o réu se vinculou a construir não foi executado.
O que, aliás, foi também corroborado por prova testemunhal que o Tribunal a quo julgou credível e que não vemos razão para colocar em crise, de cuja razão de ciência, aliás, se não se olvida.

Termos em que, pelas razões expostas, se indefere o assacado erro de julgamento sobre a matéria de facto, mantendo-se inalterado o ponto 17 dos factos assentes.
*
3.4. Pretende ainda o Recorrente que sejam aditados os seguintes itens à matéria de facto assente que o tribunal a quo julgou não provados:
(i) “O arruamento originário da Travessa de (...) continuou sempre ligado à própria VL_, mantendo-se essa ligação à rede viária”; e
(ii) “Passando a beneficiar o terreno sobrante da parcela expropriada do caminho paralelo e do caminho originário da Travessa de (...).”

Alega que tal resulta da densa prova documental, maxime registos fotográficos, do P.A., bem assim e irrefragavelmente pela documentada e extratada prova das testemunhas apresentadas pelo Réu, com atribuições funcionais e trato direto no desenvolvimento do dissídio.
Vejamos.

3.4.1. Antes de mais, incumbe precisar que o direito à impugnação da decisão sobre a matéria de facto não subsiste a se mas antes tem caráter instrumental face à decisão de mérito.

Significa isto que por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processuais, o tribunal ad quem deve abster-se de reapreciar a matéria de facto quando os factos concretos objeto da impugnação forem insuscetíveis de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação e às várias soluções plausíveis de direito, nenhuma relevância jurídica assumirem, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente. Logo, o princípio da limitação dos atos consagrado no art.º 130º do CPC, deve ser observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto quando a análise da situação concreta evidenciar, ponderando todas as soluções plausíveis da questão de direito que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projeta na decisão de mérito a proferir.
No caso, independentemente da sorte que viesse a ter a impugnação da matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida, perante a precedente decisão sobre a matéria de facto vertida no ponto 17 dos factos julgados provados nessa mesma sentença, tendo presente as várias soluções plausíveis de direito aplicáveis ao caso, nenhuma utilidade teria aquela apreciação.

É que, ante a improcedência da impugnação apresentada pelo Apelante em relação ao erro de julgamento assacado ao ponto 17, cuja facticidade pretendia ver julgada como não provada e a preservação da matéria de facto dada como assente nesse item, independentemente da sorte que viesse a ter a impugnação daquela outra factualidade acima elencada, a sorte da presente ação encontra-se, em definitivo, traçada.

Na verdade, provado que está que o caminho referido no acordo escrito e a cuja construção o Réu se vinculou, se tratava de um caminho pavimentado e infraestruturado, que garantisse o acesso à parte sobrante do prédio dos autores de modo a assegurar a utilização urbanística do mesmo e, assim, a não provocar a desvalorização desse imóvel, não tem nenhum interesse para o mérito da decisão a proferir nos autos, saber se o Réu abriu um caminho em terra batida e/ou se à parte restante do prédio dos autores se continuou a poder aceder pela Travessa de (...).

É que, lembra-se, que por força do artigo 406.º, n.º1 do C.Civil os contratos devem ser pontualmente cumpridos e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.

Conforme se afirma e Ac. do TRC, de 18.02.14, proferido no processo n.º 527/11.9TFND.C1 «a) De harmonia com o princípio da utilidade a que estão submetidos todos os actos processuais, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa, segundo os vários enquadramentos jurídicos possíveis do seu objecto»

Termos em que, por falta de utilidade para a decisão de mérito a proferir, abstemo-nos, por inútil, de reapreciar a impugnação do julgamento de facto quanto à referida facticidade.

**
3.5. Por fim, pretende o Recorrente que o item 23 do probatório seja dado como não provado.

No ponto 23 dos factos assentes, o tribunal a quo deu como assente a seguinte facticidade: «O valor de € 107.100,00 corresponde à desvalorização sofrida pelo terreno sobrante pela não execução do caminho referido em 4)».

O Recorrente sustenta a alteração desta matéria, em consequência do erro de julgamento que imputa à matéria do ponto 17, alegando ainda que esse valor resulta sempre de mero relatório, sem a devida alegação factual, cujo ónus impendia sobre os AA. adentro do princípio do dispositivo, causal do seu desatendimento. (Ut. Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, ainda inédito, in “Recurso nº 1835/13 da 5ª Secção do Pleno do STA).
Mas sem razão.

3.5.1. Prima facie, porque contrariamente ao alegado pelo Recorrente os autores cuidaram de alegar o facto essencial que corresponde ao prejuízo quantificado nos factos provados de €107.100,00.

É certo que de acordo com o princípio do dispositivo impende sobre o autor o ónus de definir, na petição inicial, os elementos subjetivos (sujeitos) e objetivos (pedido e causa de pedir) da relação jurídica controvertida que submete ao tribunal e que pretende que este dirima, devendo para tanto individualizar, na petição inicial, os sujeitos dessa relação jurídica, qual a pretensão de tutela judiciária que solicita que o tribunal lhe reconheça (pedido) e quais os factos em que faz ancorar essa sua pretensão (causa de pedir), devendo, nesta sede, alegar os factos essenciais constitutivos da causa de pedir que elegeu para ancorar o pedido (arts. 5º, n.º 1 e 552º, n.º 1 als. a), d) e e) do CPC, aplicáveis ex vi art.º 1.º e 42.º do do CPTA).
Por sua vez, visando o demandado opor exceções dilatórias (que impeçam o tribunal de conhecer do mérito da causa e que, por isso, implicam a absolvição deste da instância ou a remessa do processo para outro tribunal – n.º 1 do art.º 493.º CPC ( art. 576º do NCPC) ou perentórias (que impeçam, modificam ou façam extinguir o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor – n.º 3 daquele art. 493º), sobre ele impende o ónus da alegação, na contestação, dos factos essenciais em que se baseiam essas exceções- artigos 264.º e 488.º do CPC ( arts. 5º, n.º 1 e 572º, al. c) do NCPC).
No domínio do CPC aplicável à situação em juízo, entendia-se que o ónus de substanciação que impendia sobre o demandante em sede de petição inicial abrangia não só os factos essenciais, como também os complementares ou concretizadores e, bem assim, os instrumentais, isto é, aqueles que exerciam no processo uma função puramente probatória, servindo para indiciar a verificação dos factos essenciais e/ou dos complementares.
Em síntese, é às partes que cumpre alegar os factos essenciais que integram a causa de pedir ou que fundamentam a exceção (artº 264 nº 1 do CPC de 1961, e 5 nº 1 do NCPC). No tocante aos factos essenciais vale, por inteiro, o princípio da disponibilidade objetiva: o tribunal não os pode considerar se não foram alegados pelas partes.

Compulsada a p.i., nos pontos 21 a 28, os autores alegaram que a ausência do caminho acordado, conforme estipulado, dava lugar a uma indemnização correspondente á desvalorização que tal ausência de caminho acarretasse para os autores. Por essa razão, contrataram um engenheiro civil que os ajudasse a quantificar a referida indemnização acordada para a desvalorização do prédio, o qual elaborou um relatório onde concluiu pela desvalorização correspondente ao valor de € 107.100,00 “correspondente ao pormenorizado no docs. 3, 4 e 5 que dão como reproduzidos para os devidos e legais efeitos”.
Mais alegaram que a ser esse o valor que vêm peticionar correspondente ao prejuízo que têm face à desvalorização verificada no terreno sobrante pela não execução do caminho de acesso na medida em que qualquer iniciativa de alineação da propriedade ou de construção está manietada pela falta de frente para caminho público.

Perante essa alegação, é apodítico que não se verifica qualquer falta de alegação de factos essenciais por parte dos autores do valor do prejuízo dado como provado pela 1.ª instância.

3.5.2. Secundo, manteve-se intacto o julgamento da matéria de facto lavrada no ponto 17 dos factos assentes.

Termos em que improcede o enunciado fundamento de recurso.
*
3.6. Dependendo o pedido de alteração do decidido na sentença recorrida no que à interpretação e aplicação do Direito respeita, do prévio sucesso da impugnação do julgamento da matéria de facto realizado pela 1ª Instância, não tendo o Apelante logrado obter sucesso nessa impugnação, fica impreterivelmente prejudicado o conhecimento do Direito.
Com efeito, o Apelante não assaca qualquer erro de direito à decisão de mérito proferida na sentença que não decorra do êxito da impugnação do julgamento da matéria de facto, mas antes a sua sindicância sobre a sentença recorrida incidiu sobre a impugnação da matéria de facto considerada como provada no ponto 17.º e 23.º e na julgada como não provada, naquela sentença, nos termos supra expostos.
A alteração da decisão de mérito que o Apelante sufraga é mera decorrência daquela impugnação do julgamento que incidiu sobre aqueles factos.
Ora, na improcedência da impugnação do julgamento da matéria de facto, permanecendo inalterados os factos considerados provados e não provados na sentença recorrida, necessariamente ficou prejudicado o conhecimento da decisão de mérito nela proferida, o que se declara, nos termos do art. 608º, n.º 2 do CPC, ex vi, art. 663º, n.º 2 do mesmo Código.

Em todo o caso, sempre se dirá, que se subscreve integralmente o enquadramento jurídico dos factos julgados provados e não provados na sentença recorrida, pelo que sempre se impunha confirmar o bem fundamentado e estruturado enquadramento jurídico nela realizado e, em consequência, confirmar a decisão de mérito nela proferida.

Aqui chegados, resta concluir pela improcedência de todos os fundamentos de recurso aduzidos pelo Apelante e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
**
IV-DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo apelante- artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
Registe e notifique.
*
Porto, 17 de abril de 2020.


Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro