Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02021/18.8BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/08/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:INCAPACIDADE PERMANENTE - INSTITUTO SEGURANÇA SOCIAL, ERRO GROSSEIRO
- COMISSÃO DE VERIFICAÇÃO DO SISTEMA DE VERIFICAÇÃO DE INCAPACIDADE PERMANENTE E COMISSÃO DE REVISÃO
Sumário:Não vindo assacado às decisões das Comissões e do acto de indeferimento que as acolheu erro grosseiro, manifesto de julgamento, sequer mesmo erro, não compete aos tribunais sindicar as decisões dessas Comissões.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:L.
Recorrido 1:INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
*

I
RELATÓRIO

1 . L. identif. nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 16 de Setembro de 2020, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa que havia instaurado contra o INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL, IP, na qual pedia a declaração de nulidade das deliberações da Comissão de Verificação de Incapacidade Permanente da Segurança Social e da Comissão de Recurso da Pensão de Invalidez Relativa que lhe indeferiu o pedido da verificação de incapacidade permanente e ainda a consequente condenação do ISS, IP no pagamento da quantia de 10.000,00€, a título de indemnização por danos não patrimoniais.
*
Nas suas alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões:

"- Da notificação dos actos de indeferimento que a Recorrente impugnou não resulta os factos dados como provados nos pontos 3., 4., e 7. da sentença.
- Dos actos de indeferimento que se impugnou somente resulta “que o requerimento de pensão de invalidez relativa, foi indeferido…” nada mais.
- A comunicação efectuada pela Recorrida à Recorrente, do indeferimento do seu Requerimento de Pensão de Invalidez Relativa, não se encontra devidamente fundamentada.
- A falta de fundamentação é condição indispensável da realização da garantia dos direitos fundamentais da Recorrente.
- À Recorrente não é dado a conhecer quais as circunstâncias de facto e de direito que fundamentam a decisão de indeferimento em ambos os actos administrativos, quer da Comissão de Avaliação quer da Comissão de Recurso.
- A falta de fundamentação acarreta necessariamente a nulidade da decisão.
- Devem os:
- Acto administrativo de Indeferimento, de que a Autora tomou conhecimento em 11/05/2018, de Requerimento de Pensão de Invalidez Relativa, proferido pela Comissão de Recurso, mantendo a deliberação da Comissão de Verificação de Incapacidade Permanente da Segurança Social – Centro Nacional de Pensões, proferida em 07/03/2018, que não a considerou com incapacidade permanente para o exercício da sua profissão.
- Acto administrativo de indeferimento proferido em 07/03/2018, pela Comissão de Verificação de Incapacidade Permanente da Segurança Social – Centro Nacional de Pensões, que não a considerou com incapacidade permanente para o exercício da sua profissão.
Serem declarados nulos.
- Dá-se por verificada a existência de erro na apreciação da situação de incapacidade e tal é confirmado pelo Atestado Médico de Incapacidade Multiuso cuja veracidade ou exactidão do documento não foi impugnada.
- Donde resulta uma incapacidade permanente de 60%.
- Da referida incapacidade resultam verificados os pressupostos do art.º 14º do Dec. Lei 187/2007 de 10 de Maio:
- Incapacidade Permanente
- não pode auferir na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal (a Recorrente detém uma incapacidade permanente de 60%)
- é de presumir que a recorrente não irá recuperar dentro dos três anos subsequentes a capacidade de auferir no desempenho da sua profissão mais de 50% da retribuição correspondente. (a incapacidade não é suscetível de variação futura pelo que o atestado não está sujeito a revalidação).
- A recorrente cumpre todos os requisitos necessários à atribuição de pensão de invalidez.
- Dados por verificados os requisitos de atribuição da pensão de invalidez dão-se por verificados os elementos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual da Recorrida
- Ilicitude por violação de princípios fundamentais e do Dec-lei 187/2007 de 10 de Maio, culpa e nexo de causalidade.
- A Recorrente encontrava-se e encontra-se desempregada, não auferindo qualquer rendimento atento a sua incapacidade.
- A Recorrente por via do facto de não trabalhar não aufere qualquer rendimento.
- A Recorrente doente, depende de terceiros para sobreviver.
- Facto que causa necessariamente angústia, tristeza e agrava o seu estado de saúde.
- A Recorrida deve ser condenada no pagamento de indemnização nunca inferior a 10.000,00 €
NORMAS VIOLADAS
Artigo 268.º n.º 3 da CRP, artigo 152.º do CPA, artigo 14.º do Dec. Lei 187/2007 de 10 de Maio, artigo 7º e seguintes da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro.
Termos em que, por tudo quanto vem exposto, sendo dado provimento ao presente recurso e em consequência:
Declarar nulo o:
– Acto administrativo de Indeferimento, de que a Autora tomou conhecimento em 11/05/2018, de Requerimento de Pensão de Invalidez Relativa, proferido pela Comissão de Recurso, mantendo a deliberação da Comissão de Verificação de Incapacidade Permanente da Segurança Social – Centro Nacional de Pensões, proferida em 07/03/2018, que não a considerou com incapacidade permanente para o exercício da sua profissão.
- Acto administrativo de indeferimento proferido em 07/03/2018, pela Comissão de Verificação de Incapacidade Permanente da Segurança Social – Centro Nacional de Pensões, que não a considerou com incapacidade permanente para o exercício da sua profissão.
Condenar a Recorrida à prática do acto administrativo de deferimento da atribuição da pensão por invalidez à Recorrente por reconhecimento do preenchimento, por esta, das condições de atribuição da referida pensão e ao pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 10.000,00 (dez mil euros)".
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Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, o Instituto de Segurança Social, IP não apresentou contra alegações.
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O Digno Procurador Geral Adjunto, neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não se pronunciou.
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Sem vistos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO

1. MATÉRIA de FACTO

São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida, que não foram impugnados, ainda que, no início das suas alegações (e também, nas respectivas conclusões) questione o facto de, na notificação de indeferimento que impugnou, não resultarem os factos dados como provados nos pontos 3, 4 e 7 da sentença, questão que, não pondo em causa os factos provados, retirados do PA, infra melhor se analisará e decidirá:

1. A Autora é copeira em churrasqueira, encontrando-se desempregada há 4 anos, por encerramento da empresa – cfr. fls. 8 a 11, do processo administrativo.
2. Em 19 de abril de 2017, a Autora requereu, junto dos serviços do Réu, a avaliação da sua capacidade, para efeitos de atribuição da pensão de invalidez – cfr. fls. 10 e 11, do processo administrativo, 3.ª parte.
3. No dia 27 de agosto de 2017 é elaborado um relatório médico, após a realização de um exame médico à Autora, do qual consta o seguinte: «(…) 3.1. Descrição da situação clínica (queixas do examinado, inicio da doença, evolução terapêuticas aplicadas) – 56 ANOS
SEGUIDA EM PSIQUIATRIA NO HSJ DESDE 2002 TENDO O DIAGNÓSTICO DE ATRASO MENTAL (QI58) E DISTIMIA
INICIOU ACOMPANHAMENTO POR CRISES CONVERSIVAS
LUTO PATOLÓGICO APÓS SUICÍDIO DA FILHA EM 2014
ESTABILIZADA DO PONTO DE VISTA PSICOPATOLÓGICO COM A TERAPÊUTICA ACTUAL – TRAZONEC AC 150+LEVOMEPROMAZINA25+FLURAZEPAM15
3.2. Antecedentes pessoais e familiares
HIPOACUSIA BILATERAL MODERADA
DM TIPO2
BOCIO
(…)
4.2. Especifico (face às queixas do examinado)
VIGIL E ORIENTADA, COLABORANTE, CALMA E COM COMPORTAMENTO ADEQUADO. RACIOCÍNIO POBRE. DISCURSO COERENTE DE ACORDO COM NÍVEL INTELECTUAL E CULTURAL. HUMOR SUBDEPRESSIVO SEM OUTROS DEFICES COGNITIVOS SIGNIFICATIVOS
MARCHA SEM LIMITAÇÕES MOBILIDADE GERAL CONSERVADA
(…)
7. PARECER DO PERITO MÉDICO RELATOR
7.1. Fundamentação do médico pericial
ATRASO MENTAL + DISTIMIA. ATUALMENTE ESTABILIZADA COM A TERAPÊUTICA.
NENHUMA DESTAS SITUAÇÕES INCAPACITA PARA O DESEMPENO DA SUA ATIVIDADE PROFISSIONAL
7.2. Conclusões do perito médico relator
7.2.1. Incapacidade permanente
O examinado:
(…) encontra-se com capacidade para o trabalho podendo auferir na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal. Fundamenta esta situação ELEMENTOS PROCESSO
(…)
Assim, deve ser considerada a seguinte situação:
Invalidez: Não
(…)» (cfr. fls. 1 a 12, da 1.ª parte do processo administrativo).
4. Posteriormente, a Comissão de Verificação do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente emite um parecer/deliberação, com o seguinte teor: «(…) 2. PARECER
56 ANOS DE IDADE
COPEIRA EM CHURRASQUEIRA
SEGUIDA EM PSIQUIATRIA POR ATRASO MENTAL E DISTIMIA
REGISTADA FUNCIONALIDADE CONSERVADA, SEM ALTERAÇÃO DA MARCHA OU DA MOBILIDADE
SEM REGISTO DE PSICOPATOLOGIA INVALIDANTE
AO EXAME DOCUMENTADO E OBJECTIVO NÃO EXISTE EVIDÊNCIA DE ALTERAÇÃO DEFINITIVA DA FUNCIONALIDADE GERAL QUE LHE CONFIRA CRITÉRIOS DE ATRIBUIÇÃO DE INCAPACIDADE PERMANENTE
4. DELIBERAÇÃO
4.1. Incapacidade Permanente
O examinado:
(…)
Pode recuperar a capacidade de auferir, no desempenho da sua profissão, mais de 50% da retribuição dentro dos próximos 3 anos. Fundamenta esta situação: NÃO TEM CRITÉRIOS CLINICOS PARA A ATRIBUIÇÃO DE INCAPACIDADE PERMANENTE.
(…)
Assim deve ser considerada a seguinte situação:
Invalidez: Não» - cfr. fls. 13 a 15, do processo administrativo, 1.ª parte.
5. Em 2 de agosto de 2017, foi comunicada a deliberação da Comissão de Verificação – cfr. fls. 16 a 18, do processo administrativo, 2.ª parte.
6. Em 22 de outubro de 2017, a Autora requereu novo exame à Comissão de Recurso – cfr. fls. 6, do processo administrativo, 3.ª parte.
7. Em 16 de abril de 2018, a Comissão de Recurso emite o seguinte parecer/deliberação: «(…)2. Parecer
SEXO F, 57ª, CASADA, COPEIRA EM CHURRASQUEIRA.
SEGUIDA EM PSIQUIATRIA DESDE 2002, NO HSJ, COM DIAGNÓSTICO DE ATRASO MENTAL E DISTIMA.
EM 2014 PROCESSO DE LUTO PATOLOGICO APÓS SUICIDO DA FILHA SEM HISTÓRIA DE INTERNAMENTOS COM TERAPEUTICA ENCONTRA-SE ESTABILIZADA DE ACORDO COM A INFORMAÇÃO DE PSIQUIATRIA DE 25/01/2017, E DO OBSERVADO PELA MR (PERITA PSIQUIATRA)
HIPOACUSIA MISTA MODERADA BILATERAL, CORRIGIDA COM PROTESE. NÃO APRESENTOU NOVOS ELEMENTOS EM PRAZO.
APRESENTA-SE PSIQUICAMENTE COMPENSADA. ATRASO MENTAL LIGEIRO.
SEM LIMITAÇÃO NA FUNCIONALIDADE GLOBAL QUE CONDICIONE IP PARA A PROFISSÃO
(…)
4. DELIBERAÇÃO
4.1. Incapacidade Permanente
O examinado:
Encontra-se com capacidade para o trabalho podendo auferir, na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal. Fundamenta esta decisão: CRITÉRIOS CLÍNICOS CONSTANTES NO PROCESSO QUE FUNDAMENTAM A DECISÃO.
Assim, deve ser considerada a seguinte situação:
Invalidez: Não» cfr. docs. 21 a 27, do processo administrativo.
8. A Autora é portadora de uma incapacidade física permanente de 60% - cfr. Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, de 18 de junho de 2018 – cfr. doc. n.º 7, junto com a p.i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
9. A situação de incapacidade física permanente de 60% da Autora é anterior a 2017 – cfr. doc. n.º 7, junto com a p.i. . e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

2 . MATÉRIA de DIREITO

No caso dos autos, as questões a decidir resumem-se em determinar se, na situação vertente, a decisão recorrida, ao julgar improcedente a acção, enferma de erro de julgamento, mais concretamente:

- o facto de na notificação de indeferimento que impugnou, não resultarem os factos dados como provados nos pontos 3, 4 e 7 da sentença;
- se a decisão impugnada sofre da invalidade formal de falta de fundamentação, acrescendo que o Atestado Médico de Incapacidade Multiuso refere que a recorrente sofre de uma incapacidade permanente de 60%;
- porque violada a lei, tem direito à indemnização peticionada, por danos morais, no valor de 10.000,00€.

Desde já, em termos muito simples, a razão do dissídio emerge da seguinte controvérsia:

Tem a recorrente direito a beneficiar da invalidez por incapacidade permanente, uma vez que, por um lado, tem um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso que lhe atribuiu 60%, apesar das Comissões de Avaliação, seja a de Verificação de Incapacidades, seja a de Revisão, terem concluído que a A./recorrente se encontra em situação de capacidade para o trabalho, uma vez que o seu quadro clínico não a incapacita para o desempenho da sua actividade profissional?

Carece de total razão a recorrente:
Em primeiro lugar, ainda que não lhe tivessem sido enviados com a notificação os factos constantes dos pontos 3, 4 e 7 da factualidade dada como provada ---- factos que têm a ver com documentos que constam do PA, sejam o Relatório Médico de 27/8/2017 - ponto 3 -, seja a deliberação da Comissão de Verificação do Sistema de Verificação de Incapacidade Permanente - ponto 4 , seja a deliberação da Comissão de Recurso - ponto 7 ---, nada implicaria a insubsistência da decisão final de indeferimento, com base nas decisões dessas Comissões.
Porém, a A./recorrente teve conhecimento dessas mesmas decisões clínicas das Comissões, conforme, aliás, consta do ponto 5 dos factos provados e que a recorrente não questiona, porque, efectivamente, se demonstra do PA e ainda o facto de ter requerido novo exame à Comissão de Recurso, o que manifestamente induz o conhecimento das demais decisões, com as quais não concordou.
Mas, mesmo que assim não fosse, sempre a A./recorrente poderia ter solicitado o envio/notificação desses elementos primordiais para questionar a validade substancial desses Relatórios/decisões das diversas Comissões.

Em segundo lugar, não vindo assacado às decisões das Comissões e do acto de indeferimento que as acolheu erro grosseiro, manifesto de julgamento, sequer mesmo erro, insistindo apenas e só no facto de ter uma opinião médica - Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, de 18/6/2018 que lhe atribui uma incapacidade física permanente de 60%, mas anterior a 2017, como consta expressamente desse documento - cfr. pontos 8 e 9 dos factos provados -, não compete aos tribunais sindicar as decisões dessas Comissões.

Aliás, a sentença ... que a recorrente, nesta parte, parece ignorar... é bem elucidativa das normas legais aplicáveis e da insubsistência da tese da A./recorrente.
Assim, na parte mais relevante... dispensando-nos, assim, de repetir e reproduzir, além do mais, as normas legais aí já exaradas ... escreveu-se na sentença recorrida:

"...O Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, define e regulamenta o regime jurídico de proteção nas eventualidades invalidez e velhice do regime geral de segurança social, tendo a proteção prevista no presente decreto-lei por objetivo compensar a perda de remunerações de trabalho motivada pela ocorrência das eventualidades referidas no número anterior (cfr. artigo 1.º, n.ºs 1 e 2).
Nos termos do artigo 2.º do referido diploma legal «integra a eventualidade invalidez toda a situação incapacitante de causa não profissional determinante de incapacidade física, sensorial ou mental permanente para o trabalho».
Como decorre do n.º 1 do artigo 10.º do diploma, «o reconhecimento do direito às pensões de invalidez e de velhice depende do preenchimento do prazo de garantia e de apresentação de requerimento». Nos termos do artigo 13.º, a invalidez pode ser relativa ou absoluta, considerando-se em situação de invalidez relativa o beneficiário que, em consequência de incapacidade permanente, não possa auferir na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal (n.º 1 do artigo 14.º), e em situação de invalidez absoluta, o beneficiário que se encontre numa situação de incapacidade permanente e definitiva para toda e qualquer profissão ou trabalho (n.º 1 do artigo 15.º).
De acordo com o artigo 17.º, o reconhecimento do direito à pensão de invalidez depende da certificação da situação de invalidez (n.º 1), sendo tal situação certificada pelo sistema de verificação de incapacidades em função da incapacidade permanente para o trabalho apresentada pelo beneficiário, nos termos definidos por lei (n.º 2).
Assim, nos termos do Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de dezembro, o sistema de verificação de incapacidade tem por objeto, entre outros, a verificação e revisão de situações de incapacidade permanente determinantes do direito a pensões de invalidez e sobrevivência dos regimes de segurança social (artigo 1.º, n.º 1, alínea b), consubstanciando-se tanto na análise dos dados relativos às condições físicas, motoras, orgânicas sensoriais e intelectuais dos beneficiários, como as referentes às suas repercussões socioprofissionais (n.º 2 do artigo 2.º).
Essa análise é efetuada por um médico relator (artigo 16.º) e uma comissão de verificação, constituída por três peritos médicos (n.º 1 do artigo 18.º), aos quais compete, em geral: «a) Verificar os danos físicos, orgânicos, anátomo-funcionais, psíquicos e psicológicos dos requerentes ou titulares de prestações pecuniárias dos regimes de segurança social, determinando, com base em todos os elementos de diagnóstico que forem necessários, a origem, a natureza e a extensão da redução física motora, orgânica, sensorial ou intelectual provocada pela incapacidade; b) Considerar as capacidades remanescentes do interessado e avaliar as repercussões socioprofissionais da incapacidade face às perspetivas concretas e atuais da sua reabilitação profissional e inserção no mercado normal de emprego; c) Estudar e propor os métodos mais adequados a uma eficaz, objetiva e justa avaliação da incapacidade com base na ponderação das necessidades específicas decorrentes das limitações funcionais detetadas, bem como proceder à definição dos meios necessários à recuperação, com vista ao aproveitamento das capacidades remanescentes.» (artigo 15.º).
Em particular compete ao médico relator preparar os processos de verificação de incapacidade permanente ou de dependência e elaborar os relatórios clínicos que sirvam de base à deliberação das comissões de verificação e à aplicação de instrumentos internacionais de segurança social, bem como, em caso de doença profissional, promover a apreciação do beneficiário pelos serviços clínicos competentes (artigo 16.º), tendo como funções: «a) Verificar se a informação médica enviada ao centro regional está completa e, caso contrário, dar conhecimento do facto ao beneficiário; b) Realizar o exame clínico dos requerentes das prestações, bem como dos beneficiários sujeitos aos processos de verificação oficiosa de eventual incapacidade permanente ou de revisão da situação de incapacidade que abriram direito a prestações; c) Promover a obtenção dos meios auxiliares de diagnóstico, bem como dos exames e pareceres especializados que considerar necessários, especialmente nos casos de verificação oficiosa; d) Articular-se diretamente com os serviços e estabelecimentos de saúde ou médicos que tenham intervindo na situação clínica do requerente, ou do beneficiário, objeto de verificação de incapacidade permanente, de forma a obter os elementos necessários ao estudo da situação; e) Participar aos serviços competentes as situações passíveis de serem consideradas como doenças profissionais; f) Elaborar um relatório circunstanciado do exame feito com base nos elementos reunidos, organizar o processo clínico do requerente e submetê-lo à comissão de verificação de incapacidade permanente; g) Propor que da comissão de verificação de incapacidade permanente faça parte perito de determinada especialidade, sempre que tal se mostre indispensável; h) Analisar e dar parecer sobre o fundamento invocado pelo beneficiário nos requerimentos por agravamento do estado de saúde.» (n.º 1, do artigo 17.º).
Por sua vez, compete às comissões de verificação: «a) Apreciar os processos clínicos dos requerentes das prestações ou dos beneficiários sujeitos a processo oficioso de verificação de incapacidade com base nos dados coligidos pelo médico relator e nos demais elementos de diagnóstico constantes do respetivo processo; b) Verificar a origem, a natureza, a extensão e a presumível duração de incapacidade detetada, não suscetível de superação através de ações de recuperação funcional ou de adequados e viáveis meios de compensação; c) Determinar, com base nas capacidades remanescentes e nas efetivas possibilidades de reabilitação profissional e inserção no mercado normal de emprego, a redução da capacidade profissional do beneficiário; d) Concluir sobre o enquadramento das situações verificadas nos critérios legais de atribuição das prestações em causa, especificando as datas a que se reporta a verificação de incapacidade ou de dependência; e) Proceder à revisão das situações de incapacidade permanente que abriram direito às prestações, tendo em vista pronunciar-se sobre a evolução das mesmas.» (artigo 20.º).
Competindo, por outro lado, às comissões de recurso apreciar as deliberações das comissões de verificação relativas à situação dos requerentes, não só em relação às condições de saúde, mas também às repercussões socioprofissionais da incapacidade (artigo 22.º).
De acordo, com as normas acabas de transcrever, o reconhecimento do direito à pensão de invalidez depende da certificação da situação de invalidez, sendo tal situação certificada pelo sistema de verificação de incapacidades em função da incapacidade permanente para o trabalho apresentada pelo beneficiário.
No caso dos autos, a Autora requereu junto dos serviços do Réu a avaliação da sua capacidade para efeitos de atribuição da pensão de invalidez, tendo sido submetida a uma avaliação pela comissão de verificação de incapacidades que, nos termos constantes do parecer do médico relator, concluiu que a Autora se encontra com capacidade para o trabalho, uma vez que o seu quadro clínico não a incapacita para o desempenho da sua atividade profissional (cf. pontos 2, 3, e 4 da matéria de facto assente).
Requerida novo exame à Comissão de Recurso, esta entidade manteve a deliberação da comissão de avaliação, com fundamento nos critérios clínicos que constam do processo da Autora.
Nessa medida, a pensão de invalidez não pode ser atribuída quando a comissão de verificação de incapacidade permanente e a comissão de recurso, a pedido da Autora, concluem e certifiquem que “Encontra-se com capacidade para o trabalho podendo auferir, na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal”.
E, no caso concreto, a posição de ambas as comissões é clara e inequívoca, não competindo ao tribunal sindicar as deliberações assim tomadas, pois não foi alegado nem se vislumbra a existência de qualquer erro grosseiro ou manifesto.
A Autora não alegou nem demonstrou a existência de erro na apreciação da sua situação de incapacidade permanente, fazendo assentar apenas a sua defesa na incapacidade de 60%, atestada por certidão multiuso e da situação ser anterior a 2007 (ponto 8 e 9 da matéria de facto). Ora, não obstante tal grau de incapacidade, as comissões de avaliação e de recurso concluíram com unanimidade que a Autora se encontra com capacidade para o trabalho, podendo auferir, na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal, e, como tal, ao abrigo do disposto no artigo 13.º, do Decreto-Lei n.º 186/2007, de 10 de maio, não lhe pode ser atribuída pensão de invalidez, quer absoluta quer relativa.
Assim, sendo um dos requisitos para a atribuição da pensão de invalidez que o interessado se encontre numa situação de incapacidade permanente para o trabalho, certificada pelo sistema de verificação de incapacidade, e tendo a Autora capacidade para o trabalho, podendo auferir, na sua profissão, mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal, não estão reunidos os requisitos para se atribuir a referida pensão.
Termos em que, no que respeita à peticionada invalidade do acto em crise, cumpre julgar improcede a pretensão da Autora.
...".

Soçobra, igualmente, o que se refere ao pedido indemnizatório, na medida em que faltam os respectivos e cumulativos requisitos da responsabilidade civil, como se evidencia, sem necessidade de outras considerações por despiciendas, na sentença recorrida, ao discorrer:

"Do direito indemnizatório
A Autora peticiona ainda o pagamento de uma quantia de €10.000,00 pela demora do deferimento da atribuição da pensão de invalidez, o que lhe causa uma angústia e agravamento do seu estado depressivo, agravando ainda a sua situação financeira, correspondente a danos patrimoniais e não patrimoniais.
Estamos aqui perante um pedido de uma indemnização fundada no regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e Entidades Públicas.

Como é sabido a responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais entidades públicas por danos resultantes do exercício da função administrativa, isto é, por ações ou omissões adotadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo, rege-se, em geral, pelo Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas constante do Anexo à Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro (artigo 1.º, n.ºs 1 e 2 do RRCEEEP).

Atente-se que tanto a responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas coletivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes, como responsabilidade extracontratual por facto ilícito prevista na lei civil assentam nos mesmos pressupostos, sem prejuízo das especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos.
Esses pressupostos, cumulativos, são o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Verificados estes pressupostos, constitui-se o lesante na obrigação de indemnizar o lesado por todos os danos que aquele sofreu e não teria sofrido se não fosse o facto ilícito e culposo do lesante, e que, em relação àqueles se apresenta como causa adequada à sua produção.
É aquele que invoca um direito que tem de fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (artigo 342.º CC). É, pois, ao lesado que cabe a alegação e a prova dos elementos constitutivos da responsabilidade civil, ou seja, de todos os pressupostos enunciados. Mais concretamente, dispõe o artigo 487.º, n.º 1 do CC, que é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
No caso dos autos, a Autora não faz qualquer alegação e prova dos elementos constitutivos da responsabilidade civil (desse logo, o facto ilícito), limitando-se a alegar que a demora na decisão de deferimento lhe causa a si e ao seu marido uma grande angústia, resultando num agravamento do seu estado depressivo e da sua situação financeira, e que a atuação do Réu causa graves danos patrimoniais e não patrimoniais que devem ser ressarcidos.
Nestes termos, é forçoso concluir pela improcedência da pretensão indemnizatória formulada pela Autora nos presentes autos".


III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a sentença recorrida.
*
Custas pela recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
*
Notifique-se.
*
DN.



Porto, 8 de Outubro de 2021

Antero Salvador
Hélder Vieira, em substituição
Conceição Silvestre