Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00003/07.4BCPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/08/2011
Relator:José Luís Paulo Escudeiro
Descritores:INCOMPETENCIA RELATIVA
DELEGAÇÃO DE PODERES
LEI DE HABILITAÇÃO
REVOGABILIDADE DOS ACTOS ADMINISTRATIVOS
O CASO DOS ACTOS ADMINISTRATIVOS CONSTITUTIVOS DE DIREITOS
A TRANSMISSIBILIDADE DOS PREJUÍZOS FISCAIS EM CASO DE FUSÃO DE SOCIEDADES
RESPECTIVOS PRESSUPOSTOS LEGAIS
OS CONCEITOS DE “RAZÕES ECONÓMICAS VÁLIDAS” E “INSERÇÃO NUMA ESTRATÉGIA DE REDIMENSIONAMENTO E DESENVOLVIMENTO EMPRESARIAL DE MÉDIO OU LONGO PRAZO, COM EFEITOS POSITIVOS NA ESTRUTURA PRODUTIVA” PARA EFEITOS DE TRANSMISSIBILIDADE DOS PREJUÍZOS FISCAIS
CONCEITOS INDETERMINADOS
DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA.
Sumário:I- A delegação de poderes consiste no acto pelo qual um órgão normalmente competente para a prática de certos actos jurídicos autoriza um outro órgão ou agente, indicados por lei, a praticá-los também;
II- A delegação de poderes pressupõe que a lei a preveja, ou seja depende de uma lei habilitante, isto porque a delegação de poderes não pode resultar da mera vontade de um órgão administrativo, uma vez que a competência que lhe é conferida é irrenunciável e inalienável;
III- Sem essa habilitação a delegação é ilegal e os actos praticados ao abrigo dela ficam feridos do vício de incompetência relativa, geradora de anulabilidade – Cfr. artºs 99º-b) do CPPT e 135º do CPA;
IV- Esta doutrina não se aplica ao procedimento tributário que dispõe de norma própria, no caso o artº 62º da LGT que, sob a epígrafe “Delegação de poderes” estabelece (na redacção alterada pela Lei 55º-A/2010, de 31 de Dezembro), o seguinte:
“1 - Salvo nos casos previstos na lei, os órgãos da administração tributária podem delegar a competência do procedimento no seu imediato inferior hierárquico.
2 - A competência referida no número anterior pode ser subdelegada, com autorização do delegante, salvo nos casos em que a lei o proíba.”;
V- Estabelece tal norma uma regra geral de admissibilidade de delegação de poderes do órgão competente no imediato inferior hierárquico, ao contrário do que acontece com o artigo 35º, n.º 1 do CPA;
VI- A regra geral é, assim, no procedimento tributário, a possibilidade de delegação dos poderes, constituindo a proibição de delegação a excepção, o que significa que toda e qualquer competência pode ser delegada, salvo excepção legal, e daqui decorrendo que não é necessária para a delegação de poderes no procedimento tributário a existência de lei habilitante exterior à LGT, ao contrário do que acontece no procedimento administrativo.
VII- Os actos administrativos que sejam válidos são livremente revogáveis, excepto, designadamente, quando forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos – Cfr. artº 140º-1-b) do CPA;
VIII- Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida – Cfr. artº 141º-1 do mesmo Código;
IX- O acto de deferimento tácito configura um acto constitutivo de direitos, pelo que só pode ser revogado com fundamento em invalidade e dentro do prazo de um ano a contar da data em que se formou - Cfr. artºs 140º e 141º do CPA, ex vi dos artº 2º-c) da LGT e 2º-d) do CPPT;
X- Os conceitos de “Razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” para efeitos de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, prevista no artigo 69.º do CIRC, são, segundo o entendimento que vem sendo a ser perfilhado pela jurisprudência, conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto, constituindo tais conceitos indeterminados matéria de discricionariedade técnica, insindicável judicialmente.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Tributário do TCAN:
I- RELATÓRIO
“C.., SA”, com sede na Avenida…, Vila Nova de Gaia, instaurou a presente Acção Administrativa Especial contra o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (nos termos do artº 10º, nºs 2 e 4 do CPTA, a acção considera-se regularmente proposta contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS), pedindo a anulação do Despacho n.º 338/2007, de 03.ABR.07, por ele proferido, e que indeferiu o requerimento no qual, ao abrigo e nos termos do artigo 69º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), a A. solicitara a dedução dos prejuízos fiscais que, relativamente aos exercícios de 2001 a 2003 e no montante total de € 2.541.398,01, foram registados pelas sociedades incorporadas “S…, SA” e “S… (Lisboa), SA”, bem como, em acumulação, a condenação à prática de acto de deferimento tácito do requerimento, nos termos do nº 7 do artigo 69º do CIRC.
Alega para tanto, em síntese, a incompetência do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para a prolação do despacho impugnado, sendo competente para o efeito o Ministro das Finanças, não prevendo a lei delegação de poderes; a produção de deferimento tácito do pedido de dedução dos prejuízos fiscais; a ilegalidade de violação de lei, decorrente de revogação de acto tácito de deferimento constitutivo de direitos, com infracção do disposto no artº 140º, n.º 1, alínea b) do CPA; e, por fim, a ilegalidade de violação de lei, por violação dos artºs 67º a 69º do CIRC.
Na Contestação, o R. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais defendeu-se por impugnação negando que o despacho, em referência, padeça das apontadas ilegalidades, porquanto a competência para a prática daquele despacho foi objecto de acto de delegação de poderes; e que o invocado deferimento tácito foi validamente revogado dentro do prazo de um ano em que a lei o permite, uma vez que o pedido formulado foi correctamente indeferido dado que a operação de fusão efectuada não é passível de enquadramento no regime de neutralidade fiscal previsto nos artºs 67º e seguintes do CIRC.
Cumprido o disposto no artº 91º-4 do CPTA, as partes alegaram reafirmando o constante dos respectivos articulados.
Colhidos os vistos legais, o processo é submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento.
II – QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR
a) A ilegalidade de incompetência relativa; e
b) A ilegalidade de violação de lei, por infracção do disposto nos artºs 140º-1-b) do CPA e 67º a 69º do CIRC.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III-1. Matéria de facto
Com interesse para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
1 - Em 29.OUT.04, os respectivos Conselhos de Administração elaboraram, em conjunto, o projecto de fusão-incorporação das sociedades “S…, SA” e “S… (Lisboa), SA”, mediante a transferência global do património da sociedade incorporada “S… (Lisboa), SA” para a sociedade incorporante S…, SA” – Cfr. doc. de fls. 39 e segs.;
2 - O projecto de fusão foi fiscalizado, registado, submetido à deliberação dos sócios de cada uma das sociedades participantes na fusão e sujeito a publicações, sendo que as assembleias-gerais de cada uma das referidas sociedades deliberaram proceder à fusão, a qual foi consignada em escritura pública e registada na competente Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia – Cfr. doc. de fls. 39 e segs.;
3 - Nos exercícios de 2001 a 2003, a sociedade incorporada “S… (Lisboa), SA”, registou prejuízos fiscais no montante de € 2.541.398,01 – Cfr. Processo Administrativo;
4 - A A. solicitou ao Ministra das Finanças, ao abrigo do disposto no artigo 69º do CIRC, autorização para proceder à dedução de tais prejuízos, mediante requerimento endereçado à Direcção-Geral dos Impostos – Direcção de Serviços do IRC, e entregue no Serviço de Finanças de V. N. de Gaia, 1, em 31.JAN.05 – Cfr. Processo Administrativo.
5 - Pelo despacho n.º 338/2007-XVII do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, datado de 03.ABR.07, proferido por delegação de competências ao abrigo do despacho nº 17829/2005 (2ª Série), publicado no DR, nº 159, II Série de 19.AGO.2005, foi indeferido o requerimento da autora e revogado o acto de deferimento tácito, que se havia produzido em 05.JAN.2007, por ilegalidade – Cfr. doc. de fls. 68 e segs.;
6 - A A. foi notificada deste despacho, pelo ofício nº 3621/03.54, da Direcção de Finanças do Porto, datado de 26.ABR.07 – Cfr. doc. de fls. 48 e segs.;
7 - O despacho referenciado no ponto 5. foi proferido sobre Nota Informativa, que a seguir se reproduz, e na qual foi aposta a menção de “Concordo”:
1- Considerando que a concessão do beneficio fiscal estipulado no artigo 69.º. n.º 1 e 2 do Código do IRC, está subordinado à autorização do Ministro das Finanças e à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. E que,
2- O carácter excepcional próprio dos benefícios fiscal, como resulta do n.º 1 do artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, traduz a evidente tipificação dos casos que estão subordinados à autorização supra mencionada, como seja, no caso concreto, a necessária verificação do interesse económico da operação.
3- Dado que, nessa operação, a incorporada legou para a incorporante um património negativo, o que torna inaplicável qualquer dedução, tendo em conta o constante no Despacho nº 79/2005-XVII, de 15 de Abril, desta Secretaria de Estado, posteriormente desenvolvido pela Circular nº 7/2005, de 16 de Maio, em concreto a alínea c) do nº 1.
4- É de determinar, assim, que pela falta de verificação dos pressupostos quanto à concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos nºs 1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC, seja indeferido o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais formulado pela sociedade “S…, SA”, confirmando, assim, a Informação 1204/2006, da DGCI, bem como a sua Adenda posterior ao exercício do direito de audição prévia, quando ao projecto de decisão da DGCI, pela sociedade requerente. E que,
5- Ao abrigo do artigo 141º do do Código de Procedimento Administrativo, seja revogado o acto de deferimento tácito produzido, porquanto está ferido de ilegalidade, por não ter sido realizada a presente operação de fusão por razões económicas válidas, ex vi o artigo 69º do Código do IRC, que transpôs o conteúdo da alínea a) do artº 11º da Directiva nº 90/434/CEE, do Conselho, de 23 de Julho de 1990” - Cfr. doc. de fls. 67 e 67 v..
III-2. Matéria de direito
Como atrás se deixou dito, constitui objecto da presente Acção Administrativa Especial indagar se o acto impugnado enferma das imputados ilegalidades de incompetência relativa e de violação de lei (por por infracção do disposto nos artºs 140º-1-b) do CPA e 67º a 69º do CIRC).
III-2.1. Da incompetência relativa
Alega a A. que tendo formulado o pedido de autorização para proceder à dedução dos prejuízos fiscais registados dos exercícios de 2001 a 2003 pela sociedade que incorporou, ao Ministro das Finanças, nos termos do artigo 69º do CIRC, tal pedido foi objecto de decisão pelo Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais pelo despacho impugnado n.º 338/2007-XVII, de 03.ABR.07, sem que esta entidade detivesse competência para o efeito, por falta de lei de delegação.
Cumpre decidir.
Dispunha, na redacção anterior à Lei n.º 50/05, de 30 de Agosto, e anterior à republicação efectuada pelo DL 159/09, de 13 de Julho (com efeitos a partir de 01-01-2010), o artigo 69º do CIRC, com a epígrafe “Transmissibilidade dos prejuízos fiscais”:
1 - Os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante até ao fim do período referido no n.º 1 do artigo 47.º, contado do exercício a que os mesmos se reportam, desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados entregue na Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do mês seguinte ao do registo da fusão na conservatória do registo comercial. (Redacção do Decreto-lei n.º 221/2001, de 7 de Agosto - em vigor até à lei 50/05-30/05)
...
6 - Sempre que, durante o período de aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades previsto no artigo 63.º ou imediatamente após o seu termo, e em resultado de uma operação de fusão envolvendo a totalidade das sociedades abrangidas por aquele regime, uma das sociedades pertencentes ao grupo incorpore as restantes ou haja lugar à constituição de uma nova sociedade, pode o Ministro das Finanças, a requerimento da sociedade dominante apresentado no prazo de 90 dias após o registo da fusão, autorizar que os prejuízos fiscais do grupo ainda por deduzir possam ser deduzidos do lucro tributável da sociedade incorporante ou da nova sociedade resultante da fusão, nas condições referidas nos números anteriores. (Vigorou até à entrada em vigor do Decreto-Lei 211/2005, de 7 de Dezembro)
7 - O requerimento referido no n.º 1, quando acompanhado dos elementos previstos no n.º 2, considera-se tacitamente deferido se a decisão não for proferida no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais anti-abuso eventualmente aplicáveis. (Redacção da Lei 32-B /2002 de 30 de Dezembro)
8 - Para efeitos do cômputo do prazo referido no número anterior, considera-se que o mesmo se suspende sempre que o procedimento estiver parado por motivo imputável ao requerente.
9 - No caso de ocorrer o deferimento tácito, a dedução dos prejuízos fiscais considera-se automaticamente escalonada por um período mínimo de três anos, não podendo em cada um dos dois primeiros praticar-se dedução superior a um terço do total dos prejuízos.
10 - A limitação referida na parte final do número anterior não se aplica na medida em que importe perda do direito à dedução por aplicação do disposto no artigo 47.º “.
De acordo com o disposto neste normativo legal, os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças.
A lei atribui, assim, a competência ao Ministro das Finanças para decidir de tal pedido de autorização.
Estabelece o Código de Procedimento Administrativo (CPA), no nº 1 do seu artigo 35º, com a epígrafe “Da delegação de poderes”:
1. Os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um acto de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique actos administrativos sobre a mesma matéria.”.
A delegação de poderes consiste «no acto pelo qual um órgão normalmente competente para a prática de certos actos jurídicos autoriza um outro órgão ou agente, indicados por lei, a pratica-los também» – Cfr. Marcello Caetano, in Manual de Direito Administrativo, I, Almedina, pp. 226.
Como resulta daquele normativo legal, a delegação de poderes pressupõe que a lei a preveja, ou seja depende de uma lei habilitante, isto porque a delegação de poderes não pode resultar da mera vontade de um órgão administrativo, uma vez que a competência que lhe é conferida é irrenunciável e inalienável – Cfr. artºs 114º- 2 da CRP e 29º do CPA) e José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in Código do Procedimento Administrativo, anotado e comentado, 5ª edição, 2002, pp. 214.
Esta lei permissiva da delegação de poderes tem de ter o valor hierárquico-formal da lei originariamente atributiva da competência em causa, de harmonia com os princípios reguladores da hierarquia das normas jurídicas – Cfr. Ac. do STA de 17.OUT.84, sumariado no Código do Procedimento Administrativo de José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, p. 26-27 – embora não tenha de constar da mesma lei onde é atribuída a competência.
Sem essa habilitação a delegação é ilegal e os actos praticados ao abrigo dela ficam feridos do vício de incompetência relativa, geradora de anulabilidade – Cfr. artºs 99º-b) do CPPT e 135º do CPA).
Acontece que o disposto no artigo 35º do CPA não se aplica ao procedimento tributário que dispõe de norma própria, no caso o artº 62º da LGT que, sob a epígrafe “Delegação de poderes” estabelece (na redacção vigente ao tempo dos factos – redacção que foi alterada pela Lei 55º-A/2010, de 31 de Dezembro), o seguinte:
1 - Salvo nos casos previstos na lei, os órgãos da administração tributária podem delegar a competência do procedimento no seu imediato inferior hierárquico.
2 - A competência referida no número anterior pode ser subdelegada, com autorização do delegante, salvo nos casos em que a lei o proíba.”.
Estabelece tal norma uma regra geral de admissibilidade de delegação de poderes do órgão competente no imediato inferior hierárquico, ao contrário do que acontece com o artigo 35º, n.º 1 do CPA – Cfr. neste sentido Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária, 1999, Vislis, p.208.
A regra geral é, assim, no procedimento tributário, a possibilidade de delegação dos poderes, constituindo a proibição de delegação a excepção, o que significa que toda e qualquer competência pode ser delegada, salvo excepção legal, e daqui decorrendo que não é necessária para a delegação de poderes no procedimento tributário a existência de lei habilitante exterior à LGT, ao contrário do que acontece no procedimento administrativo.
Donde decorre que o Ministro das Finanças para delegar a competência que lhe está atribuída pelo artº 69º do CIRC no Secretário de Estado, não precisava de lei habilitante contrariamente ao que defende a A., bastando, para o efeito, que tivesse delegado tais poderes mediante despacho prolatado para esse efeito, o que, aliás, ocorreu no caso dos autos, conforme consta do teor do próprio despacho impugnado, onde se faz menção do despacho que conferiu tal delegação de competências, no caso o Despacho nº 17829/2005 (2ª Série), publicado no DR, nº 159, II Série de 19.AGO.2005.
Com efeito, é o seguinte o teor deste despacho:
Despacho n.º 17 829/2005 (2.ª série).— Ao abrigo do disposto nos artigos 35º, 36º e 37º o Código do Procedimento Administrativo, e tendo em conta o disposto no artigo 9º o Decreto-Lei nº 79/2005, de 15 de Abril, bem como na Lei n.º 47/2005, de 24 de Fevereiro, delego no Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, licenciado João José Amaral Tomaz, o seguinte:
1—A competência relativa a todos os assuntos respeitantes aos serviços, organismos e entidades sob tutela, conjunta ou não, a seguir indicados:
1.1—Direcção-Geral dos Impostos (DGCI);
1.2—Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo;
1.3—Direcção-Geral da Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros;
1.4—Inspecção-Geral de Finanças, no que se refere à área do controlo da receita tributária;
1.5—Comissão de Normalização Contabilística.
2—Delego ainda no Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais:
2.1—As competências que me são atribuídas pelos Decretos-Leis nºs 132/83, de 18 de Março, 324/89, de 26 de Setembro, e 404/90, de 21 de Dezembro;
2.2—As competências que me são atribuídas pelos nºs 3 do artigo 6.o e 2 do artigo 13.o, ambos do Decreto-Lei nº 124/96, de 10 de Agosto, nas matérias respeitantes a dívidas de natureza fiscal;
2.3—As competências relativas à atribuição, ao processamento e ao abono do suplemento previsto no artigo 1º do Decreto-Lei nº 335/97, de 2 de Dezembro, no âmbito do Fundo de Estabilização Tributária;
2.4—As competências relativas ao Fundo de Estabilização Aduaneira previstas no artigo 5.o do Decreto-Lei nº 274/90, de 7 de Setembro;
2.5—As competências que me são atribuídas para apreciar e decidir os recursos hierárquicos em matéria tributária da competência da DGCI;
2.6—As competências que me são atribuídas pelo Decreto-Lei nº 281/91, de 9 de Agosto;
2.7—As competências que me são atribuídas pelo Decreto-Lei nº 4/99, de 16 de Março, com as alterações que lhe foram introduzidas, e no Estatuto do Mecenato.
3—Autorizo a subdelegação nos dirigentes dos serviços referidos no nº 1 das competências por mim delegadas.
4—O presente despacho produz efeitos desde o dia 22 de Julho de 2005, ficando por esta forma ratificados todos os actos que, no âmbito dos poderes delegados, tenham sido praticados pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
27 de Julho de 2005.— O Ministro de Estado e das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos.”.
É certo que no despacho de delegação de poderes não é invocado o artº 62º da LGT, norma, que como se viu, é a que permite a delegação, antes nele se fazendo referência aos artigos 35º, 36º e 37º do CPA.
Tal omissão, porém, não se configura como relevante, uma vez que aos requisitos da delegação de poderes previsto no artiº 62º da LGT se aplicam supletivamente os artigos 36º a 38º do CPA e não consta do artº 37º do CPA, norma que estabelece os requisitos da delegação de poderes, como obrigatória a menção da norma que permite a delegação – cfr. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, ob. cit., pp. 223.
Assim sendo, no caso sub judice, a prolação do despacho impugnado da autoria do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais foi proferido ao abrigo de delegação de competências, configurando-se esta como legal.
Termos em que improcede a imputada ilegalidade de incompetência relativa.

III-2.2. Da ilegalidade de violação de lei, por infracção do disposto nos artºs 140º-1-b) do CPA e 67º a 69º do CIRC.
Sustenta a A. que, atenta a data da formulação do pedido de dedução de prejuízos e o decurso do prazo estabelecido no nº 7 do artº 69º do CIRC, aquando do seu indeferimento expresso, por parte do despacho impugnado, já se havia produzido acto de deferimento tácito, pelo que a prolação daquele importou a revogação deste.
Por outro lado, tratando-se de revogação de acto tácito de deferimento constitutivo de direitos, o mesmo é ilegal, por violação do disposto no artº 140º-1-b) do CPA.
Finalmente, imputa ao despacho ministerial impugnado, a infracção ao disposto nos artºs 67º a 69º do CIRC, por entender que atentos os motivos e os objectivos da fusão constantes do Estudo Demonstrativo das Vantagens da Fusão e dos Balanços e Demonstrações de Resultados Previsionais, a fusão foi realizadas por razões económicas válidas, contrariamente ao entendimento que subjaz à prolação daquele despacho.
Vejamos se lhe assiste razão.
Em matéria de revogabilidade de Actos Administrativos dispõem os artºs 140º e 141º do CPA, o seguinte:
Artº 140º
(Revogabilidade dos actos válidos)
1 - Os actos administrativos que sejam válidos são livremente revogáveis, excepto nos casos seguintes:
a) Quando a sua irrevogabilidade resultar de vinculação legal;
b) Quando forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos;
c) Quando deles resultem, para a Administração, obrigações legais ou direitos irrenunciáveis.
2 - Os actos constitutivos de direitos ou interesses legalmente protegidos são, contudo, revogáveis:
a) Na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses dos seus destinatários;
b) Quando todos os interessados dêem a sua concordância à revogação do acto e não se trate de direitos ou interesses indisponíveis.
Artº 141º
(Revogabilidade dos actos inválidos)
1 - Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida.
2 - Se houver prazos diferentes para o recurso contencioso, atender-se-á ao que terminar em último lugar.
Resulta de tais normativos legais, que tratando-se de actos administrativos válidos os mesmos são livremente revogáveis excepto, designadamente, quando forem constitutivos de direitos; e, por outro lado, que, com relação aos actos administrativos inválidos os mesmos só podem ser revogados com fundamento em invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso ou impugnação judicial.
No caso dos autos, tal como resulta da matéria de facto assente, tendo a A. solicitado ao Ministra das Finanças, ao abrigo do disposto no artigo 69º do CIRC, autorização para proceder à dedução de tais prejuízos, mediante requerimento endereçado à Direcção-Geral dos Impostos – Direcção de Serviços do IRC, e entregue no Serviço de Finanças de V. N. de Gaia, 1, em 31.JAN.05, por despacho n.º 338/2007-XVII do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, datado de 03.ABR.07, proferido por delegação de competências ao abrigo do despacho nº 17829/2005 (2ª Série), publicado no DR, nº 159, II Série de 19.AGO.2005, foi indeferido o requerimento da autora e revogado o acto de deferimento tácito, que se havia produzido em 05.JAN.2007, por ilegalidade – Cfr. doc. de fls. 68 e segs..
A produção de acto de deferimento tácito resulta assente nos autos, sendo reconhecido pelo próprio despacho impugnado que para além de indeferir o pedido da A. procede à revogação expressa do acto de deferimento tácito, nos termos do disposto nos artºs 140º e 141º do CPA em conjugação com o artº 28º-1-c) da LPTA.
Com efeito, produzido acto de deferimento tácito nos termos do n.º 7 do artigo 69º do CIRC, ele configura um acto constitutivo de direitos para a A., pelo que só podia ser revogado com fundamento em invalidade – Cfr. artºs 140º e 141º do CPA ex vi dos artº 2ºc) da LGT e 2º-d) do CPPT – Cfr. Ac. do STA de 22.ABR.09, in Rec. nº 0548/08 – e dentro do prazo de um ano de um ano a contar da data em que se formou o deferimento tácito – Cfr. artºs 141º- 1 e 2 e 58º-2-a) do CPTA e José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 5ª edição, 2002, Almedina, p. 904.
Vejamos, então se o acto de deferimento tácito, constitutivo de direitos se configura inválido, sob pena de se configurar como inválido o acto que procedeu à sua revogação.
O Despacho n.º 338/2007-XVII do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, indeferiu o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais formulado pela sociedade “S…, SA”, por falta de verificação dos pressupostos quanto à concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos nºs 1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC, que transpôs o conteúdo da alínea a) do artº 11º da Directiva nº 90/434/CEE, do Conselho, de 23 de Julho de 1990” - Cfr. doc. de fls. 67 e 67 v..
A A. imputa-lhe a ilegalidade de violação de lei por infracção ao disposto nos artºs 67º a 69º do CIRC, por entender que atentos os motivos e os objectivos da fusão constantes do Estudo Demonstrativo das Vantagens da Fusão e dos Balanços e Demonstrações de Resultados Previsionais, a fusão foi realizadas por razões económicas válidas, contrariamente ao entendimento que subjaz à prolação daquele despacho.
Acontece que os conceitos de “Razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” para efeitos de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, prevista no artigo 69.º do CIRC, são, segundo o entendimento que vem sendo a ser perfilhado pelo STA, conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto, constituindo tais conceitos indeterminados matéria de discricionariedade técnica, insindicável judicialmente.
Com efeito refere-se no Ac. do STA de 06.JUL.05, in Rec. nº 0142/06 que:
“(…)
Nos termos do artigo 69.º, n.º 2, do CIRC, “a concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos”.
A transmissibilidade dos prejuízos fiscais da sociedade fundida carece, pois, da autorização do Ministro das Finanças – cfr. n.º 1 daquele normativo - que só deferirá o pedido se entender “que a fusão é realizada por razões económicas válidas (…) e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”.
“Razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, os dois requisitos cumulativos do artigo 69.º, n.º 2, do CIRC, são conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto – Cfr. Azevedo Moreira, Conceitos indeterminados, p. 35, citando Tesch.
Ora, o SEAF, após fazer a sua interpretação, concluiu que os requisitos não estavam verificados (cfr. pontos 13, 15, 16, 18 e 20 do probatório).
E, em sede de acção administrativa especial, o tribunal a quo decidiu pela verificação dos mesmos pressupostos: “Ora, num juízo de normalidade, tem de aceitar-se como um facto notório, que a existência, no Grupo Seguros e Pensões, de duas companhias de seguros para exercer actividade no âmbito dos seguros de saúde (…) prejudicava o objectivo de optimização daquela variável e das consequências dela decorrentes (…). Assim, (…), à partida, é razão económica válida a eliminação de estruturas duplicadas e de obrigações cujo cumprimento é exigido em duplicado” – fls. 153; “E o ‘redimensionamento empresarial’ que faz parte da estratégia na qual a fusão se insere, relevante para efeitos do n.º 2 do artigo 69.º do CIRC, consiste precisamente numa operação em que [todas] as sociedades intervenientes (…) desempenham um papel.” – fls. 155.
Como escreve Freitas do Amaral, “o que importa é saber se a interpretação de conceitos indeterminados é uma actividade vinculada ou discricionária e, por conseguinte, sindicável, ou não, pelos tribunais” – Curso de Direito Administrativo - vol. II, p. 107.
Para este Autor, os conceitos indeterminados “não têm todos a mesma feição, e (…) alguns deles são, claramente, um instrumento de que a lei se serve para atribuir discricionariedade à Administração”.
Assim, por um lado, temos os conceitos descritivos ou conceitos-classificatórios, como “período nocturno”, “funcionário público” ou “casamento”, conceitos indeterminados “cuja concretização envolve apenas operações de interpretação da lei e de subsunção”. Nestes casos é “viável ao tribunal refazer posteriormente a decisão administrativa, ainda que apenas para a anular no caso de não se identificar com aquela que o tribunal tomaria se dispusesse de competência para praticar ou ordenar a prática do acto”.
Por outro, “temos a situação daqueles conceitos indeterminados cuja concretização apela já para ’preenchimentos valorativos’ por parte do órgão administrativo aplicador do direito”. Freitas do Amaral distingue aqui duas hipóteses: os casos em que em que é exigido ao órgão administrativo uma valoração objectiva (ex: saber se os combates de boxe em recintos ao ar livre são compatíveis com os “bons costumes”) e os casos “em que claramente o legislador remete para a Administração ‘a competência de fazer um juízo baseado na sua experiência e nas suas convicções, que não é determinado, mas apenas enquadrado por critérios jurídicos” – “a Administração tem de, considerando as circunstâncias de interesse público, descobrir, segundo o seu critério, a solução mais adequada”.
No primeiro caso é admissível a fiscalização judicial, no segundo já não.
Cfr. ibidem, pp. 108-111.
Ou seja, nos conceitos indeterminados pode existir, ou não, a chamada margem de livre apreciação ou discricionariedade técnica
Para se determinar a que tipo se reconduzem os conceitos indeterminados em análise, há que interpretar a lei.
Por regra, “os proveitos e os custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios” - artigo 18.º do CIRC.
Contudo, em alguns casos é possível a dedução de prejuízos fiscais apurados em determinado exercício - artigo 47.º - aos lucros tributáveis de um ou mais dos seis exercícios posteriores.
E, nas circunstâncias do predito artigo 69.º, é mesmo possível transmitir estes prejuízos fiscais.
Ali, o legislador pretendeu contribuir para a saúde financeira do sujeito passivo, abatendo à matéria colectável os prejuízos obtidos há menos de seis exercícios, de maneira a permitir a consolidação da empresa (fenómeno micro-económico.
E aqui, a intenção do legislador foi a mesma: para potenciar a manutenção da estrutura produtiva de uma empresa que, nos últimos exercícios, obteve prejuízos, permite a transmissibilidade dos seus prejuízos fiscais em caso de fusão, desde que verificados os pressupostos respectivos.
Estes pressupostos – que a fusão tenha ocorrido por razões económicas válidas e se insira numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva – visam garantir que este regime excepcional de transmissibilidade de prejuízos fiscais só seja possível quando os interesses sacrificados sejam proporcionais aos salvaguardados, isto é, que a perda de receita fiscal, resultante da subtracção dos prejuízos da empresa fundida ao lucro tributável da sociedade incorporante, seja equivalente aos ganhos obtidos com a fusão (que se aferem pelas razões económicas e pela estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial).
Ponto é, portanto, que se trate de ganhos macro-económicos pois ao sacrificio de um interesse público tem que corresponder a salvaguarda de outro interesse público, que não meramente particular (micro-económico).
Ora, este ganho macro-económico é aferido pelo preenchimento daqueles conceitos indeterminados que, como afirma Engisch, citado por Freitas do Amaral (ibidem, p. 113), “autorizam o órgão aplicador do Direito a considerar como vinculante e “justa” a valoração por ele tida como justa. Nestes termos, cientemente se conformam com uma pluralidade de sentidos. Eles esperam uma tomada de posição individual, confiando em que seguir honestamente uma linha de orientação pessoal [do Ministro das Finanças] é de molde a assegurar melhores decisões do que o tactear inseguro na procura de pontos de vista “’objectivos’”.
Tanto a questão de saber se houve “razões económicas válidas” ou se a fusão “se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie: uma fusão pode fundar-se numa razão económica válida para um interesse público de vitalidade da economia nacional, mas tal pode já não ocorrer em face dum interesse público de vitalidade de uma economia sectorial.
Como escreve Freitas do Amaral: “Porque não se lhe pede um trabalho de subsunção, uma tarefa declarativa de coincidência com um esquema dado, mas se exige uma tensão criadora do direito no caso concreto, deve naturalmente entender-se que esta actividade que, por desejo do legislador, sofre um influxo autónomo da vontade do agente administrativo, deve escapar ao controlo do juiz, embora este tenha o dever de verificar se a solução encontrada obedeceu às exigências externas postas pela ordem jurídica”.
Casalta Nabais – cfr. Direito Fiscal, 3.ª edição, pp. 143-144 -, considera, até, que, no caso do dito artigo 69.º do CIRC, se verifica a “concessão de uma margem de livre decisão à administração fiscal (…) através da concessão de verdadeiras faculdades discricionárias” por razões de “praticabilidade das soluções legais”, com as respectivas consequências a nível de impugnação contenciosa, nos preditos termos.
O acto do SEAF fundamentou-se na inexistência dos requisitos exigidos pela lei para a concessão da autorização para deduzir os prejuízos fiscais acumulados pela sociedade fundida e o seu juízo discricionário não pode ser fiscalizado pelos tribunais, salvo, no ponto, erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal.
(…)”.
(No mesmo sentido citam-se ainda os Acs. do STA de 12.JUL.06 e de 03.FEV.10, in Recs. nºs 01003/05 e 08844/09, respectivamente, e do TCAS de 28.OUT.08, 15.JUL.08 e de 03.FEV.09, in Recs. nºs 00464/05, 01775/07 e 02087/07, respectivamente.).
Deste modo, e sufragando-se a jurisprudência citada, não se vislumbra que o despacho impugnado padeça das ilegalidades que lhe são imputadas, antes se configurando o acto de deferimento tácito ilegal e, por isso revogável dentro do respectivo prazo.
E sendo o acto de deferimento tácito inválido, o despacho que o revoga configura-se como legal, devendo a acção improceder.
IV-CONCLUSÃO
Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCAN em julgar improcedente a AAE e, em consequência, absolver o R. do pedido.
Custas pela A., fixando-se a Taxa de Justiça em 15 UC.
Porto, 08 de Junho de 2011
José Luís Paulo Escudeiro
Francisco António Pedrosa de Areal Rothes
Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro