Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00192/13.9BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/08/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Joaquim Cruzeiro
Descritores:COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS; JOGOS DE FORTUNA OU AZAR
Sumário:I- A competência em razão da matéria do tribunal afere-se pela natureza da relação jurídica tal como é apresentada pelo autor na petição inicial, isto é, no confronto entre o respectivo pedido e a correspondente causa de pedir.
II- A questão da competência ou da incompetência do tribunal em razão da matéria para conhecer de determinado litígio é, naturalmente, independente do mérito ou demérito da pretensão deduzida pelas partes.
III- Como a Autora configura a acção, é da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais a apreciação do litígio em causa nos autos e referente ao pedido de reposição do reequilíbrio económico-financeiro do contrato de concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar na zona de jogo permanente da Póvoa de Varzim.
Recorrente:VS – Turismo, Jogos e Animação, SA
Recorrido 1:Estado Português
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO
VS – Turismo, Jogos e Animação SA vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 15 de Dezembro de 2014, que julgou aquele Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer dos presentes autos, relativamente à acção administrativa comum interposta contra o Estado Português, e onde solicitado que devia:
“…ser reposto o reequilíbrio económico-financeiro da concessão, nos termos acima indicados, ou, quando assim não se entenda, através de outras medidas, nomeadamente de reembolso de contrapartidas pagas e compensação directa em dinheiro, que assegurem resultado equivalente.”

Em alegações o recorrente concluiu assim:
1) A Autora é a concessionária da exploração de jogos de fortuna ou azar na zona de jogo permanente da Póvoa de Varzim, cujo contrato de concessão foi celebrado em 29 de Dezembro de 1988 (publicado no Diário da República, 3.ª Série, n.º 37, de 14 de Fevereiro de 1989) e objecto de revisão e integral substituição em 14 de Dezembro de 2001 (Diário da República, 3.ª Série, n.º 27, de 1 de Fevereiro de 2002);
2) A concessão de jogos de fortuna ou azar constitui uma modalidade típica de contrato administrativo, expressamente previsto no art.º 178.º, n.ºs 1 e 2, alínea f), do CPA, e no art.º 9.º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02.12 (“Lei do Jogo”);
3) No plano substantivo, os contratos de concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar regem-se, para além do disposto nas suas cláusulas, pela demais legislação administrativa aplicável, nomeadamente, a Constituição (art.º 266.º) e, no plano da lei ordinária, o CPA (maxime, os princípios gerais e os art.ºs 178.º e seguintes do CPA) e, especialmente, a Lei do Jogo;
4) No plano adjectivo, a qualificação administrativa implica a atribuição de competência aos tribunais administrativos para conhecer os litígios a eles respeitantes (art.º 212.º, n.º 3, da Constituição, art.º 4.º, n.º 1, alínea f), parte final, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais – ETAF, e art.º 2.º, alínea g), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – CPTA);
5) O contrato de concessão dos presentes autos é um contrato administrativo, submetido ao regime substantivo de direito público acima mencionado, competindo a apreciação dos litígios respeitantes à sua interpretação, validade e execução – como é o caso do presente litígio – à jurisdição administrativa, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f), parte final, do ETAF, e art.º 2.º, alínea g), do CPTA;
6) O tribunal hierárquica e territorialmente competente, para julgar o presente litígio, é o tribunal administrativo e fiscal (art.ºs 9.º, n.º 2, e 44.º, do ETAF) da sede da Autora concessionária (art.º 16.º do CPTA), ou seja, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto;
7) O Decreto-Lei n.º 275/2001 de 17.10, que autorizou a prorrogação dos prazos dos actuais contratos de concessão das zonas de jogo, inclusive da Póvoa do Varzim, estabeleceu um conjunto de condições para o efeito;
8) O teor do art.º 8.º do referido diploma – que liga indefectivelmente a disposição legal às normas contratuais que se lhe seguirão – demonstra a natureza materialmente administrativa e contratual daquelas condições;
9) Estando em causa a prorrogação do contrato inicialmente celebrado – que se concretizou numa revisão ao mesmo – o Decreto-Lei n.º 275/2001 incorporou disposições que, noutro contexto, teriam sido fixadas no âmbito de um procedimento concursal e que assumiriam, por isso, inequivocamente natureza convencional pela integração no contrato;
10) A forma legal que assumiram as condições que enformaram a revisão do contrato de concessão celebrado, fruto das circunstâncias subjacentes à presente prorrogação, não pode, porém, impedir o funcionamento de princípios jurídicos essenciais no âmbito administrativo, como o princípio rebus sic stantibus ou da reposição do equilíbrio contratual;
11) Princípios estes que, independentemente de previsão legal ou contratual, são concretizações essenciais do princípio da justiça e que, por isso, não podem ser postergados ou esvaziados de conteúdo;
12) Aceitar-se a perspectiva da sentença recorrida, de que a pretensão da Autora não pode sequer ser apreciada, equivale a negar qualquer relevância e efeito ao instituto da alteração de circunstâncias, transformando o contrato de concessão num contrato puramente de adesão, que contrariaria a adaptabilidade que se reconhece a qualquer contrato, em especial aos contratos administrativos, e colocaria em causa a proibição de previsão de cláusulas que excluam a possibilidade de invocação da cláusula rebus sic stantibus, que se configura como uma das dimensões essenciais do princípio da justiça, que tem inequívoca dignidade constitucional (cfr. o artigo 266.º da CRP);
13) Tal contradição não pode senão significar – ao quebrar as exigências substantivas essenciais que resultam do princípio da justiça, em especial nas suas máximas da boa fé e da proporcionalidade, inviabilizando a tomada de consideração da alteração superveniente de circunstâncias – que as normas constantes do artigo 2.º, n.º 4 e do Quadro Anexo do Decreto-Lei n.º 275/2001, são materialmente inconstitucionais;
14) A lesão deste princípio – pelo não reconhecimento da possibilidade de ocorrência de alteração superveniente de circunstâncias – coloca em causa as exigências de reciprocidade e equivalência mais elementares a um Estado de Direito, e ferindo, por isso, de forma grave a Lei Fundamental;
15) Ao que acresce que a previsão de valores fixos e imutáveis relativos às prestações a cargo da Autora, sem atenção a alterações supervenientes relevantes – seja decorrentes de decisão do contraente público, seja por força da intervenção dos poderes públicos, seja pela ocorrência de factos imprevistos (motivos estes identificados na doutrina administrativista como justificativos da modificação objectiva do contrato) – que se repercutam gravemente no equilíbrio negocial, converterá aquelas prestações em verdadeiros Tributos;
16) Assumindo essa natureza jurídica e dada a circunstância de a sua previsão resultar de Decreto-Lei (cfr. artigo 2.º, n.º 4 e Quadro Anexo do Decreto-Lei n.º 275/2001), não autorizado (desde logo, o artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, concedido no uso de autorização legislativa, apenas menciona o estabelecimento de condições à prorrogação, sem incluir nelas a possibilidade do estabelecimento de novos tributos), há que concluir que aquelas disposições são, para além de materialmente, também organicamente inconstitucionais, por violação do disposto no art.º 103.º, n.ºs 2 e 3, e 165.º, alínea i), da CRP;
17) A Autora não só formulou um pedido de modificação do contrato de concessão (indicando os termos em que a mesma adequadamente poderia ser realizada, cfr. artigos 185.º a 187.º da Petição Inicial) como acrescentou que, quando assim não se entenda, deverá o Tribunal ordenar a adopção de outras medidas (nomeadamente, o reeembolso de contrapartidas pagas e contrapartidas directas em dinheiro), que reponham efectivamente o equilíbrio contratual que, de outra forma, será irremediavelmente afectado;
18) O Decreto-Lei n.º 275/2001 limitou-se a definir os parâmetros a que deveria obedecer a prorrogação dos contratos de concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar, esgotando a sua força normativa no momento em que, em 2001, foram celebrados os contratos de concessão modificados, em conformidade com tais parâmetros, como é o caso do contrato de concessão dos autos;
19) Tal diploma não constitui um critério de validade de quaisquer alterações posteriores a estes contratos, que as partes, no exercício da sua autonomia contratual, sempre poderiam livremente conformar;
20) Face ao disposto no art.º 13.º da Lei do Jogo, o legislador incute a ideia de que os decretos-lei do tipo do Decreto-Lei n.º 275/2001 não são actos legislativos directamente conformadores da realidade social, mas sim leis que regulam o modo de produção dos acordos de prorrogação e estabelecem os respectivos parâmetros materiais condicionantes, e que, portanto, carecem sempre desta posterior interpositio contratual para se tornarem plenamenteb operativos e produzirem os seus efeitos conformativos das relações jurídicas administrativas em causa;
21) A referência ao “regime contratual”, no art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 275/2001, e a circunstância de se fazer depender a entrada em vigor das alterações visadas da celebração dos acordos de prorrogação dos contratos de concessão traduzem, necessariamente, o reconhecimento legal da virtualidade juridicamente criadora desses acordos;
22) Verificando-se que só com esse ulterior e diferente instrumento jurídico que concretizou o acordo das partes quanto às orientações definidas no Decreto-Lei n.º 275/2001 é que o novo regime verdadeiramente se constituiu – adquirindo, a partir daí, relevância como fonte autónoma de juridicidade -, verifica-se igualmente a possibilidade de alterar esse quadro contratual regulador das relações jurídicas concessórias, por via negocial ou judicial, sem que isso envolva a necessidade de alterar previamente o mencionado diploma legal, e sem que tal alteração se traduza num acto jurídico necessariamente inválido por introduzir uma disciplina que se diferencia daquele diploma legal;
23) Se em matéria de concessões de exploração de jogos de fortuna ou azar ocorrer alguma circunstância imprevista que perturbe gravemente o equilíbrio financeiro estabelecido, a Administração deve partilhar dos prejuízos verificados e rever o contrato por forma a respeitar o princípio geral do direito dos contratos administrativos (cfr. art.º 189.º do CPA) da “honesta equivalência das prestações”, segundo o qual a lógica comutativa imprimida ao contrato, aquando da sua celebração, deve ser mantida até ao fim;
24) E se, nesse quadro, a Administração se recusa a modificar o contrato de concessão em ordem à reposição do seu equilíbrio económico-financeiro, – como sucedeu no contrato dos presentes autos – ao concedente não pode ser negado o direito de submeter o litígio daí emergente ao tribunal competente – no caso, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto -, para que sejam aplicadas as medidas adequadas à reposição desse equlíbrio;
25) A sentença recorrida interpretou e aplicou erradamente o art.º 4.º, n.º 2, alínea a) do ETAF;
26) A sentença recorrida deveria ter aplicado, ao caso dos autos, o disposto no art.º 4.º, n.º 1, alínea f), parte final, do ETAF, e art.º 2.º, alínea g), do CPTA, de modo a julgar o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto como materialmente competente para apreciar e decidir a presente acção, pelo que violou as referidas normas legais;
Mas, se assim não se entender,
27) A norma da alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º do ETAF é inconstitucional, por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 268.º/ 4 e 5 da CRP, na interpretação, que lhe foi dada pelo Tribunal recorrido, segundo a qual está subtraída da competência material da jurisdição administrativa a apreciação dos litígios respeitantes à interpretação, validade e execução de relações jurídicas materialmente administrativas praticados sob a forma de acto legislativo, in casu, do contrato de concessão sub judice, termos em que a mesma deverá ser desaplicada, aplicando-se, como tal, ao invés, a norma da alínea f) do nº 1, do artigo 4º do ETAF;
28) A norma da alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º do ETAF é inconstitucional por violação do princípio do acesso ao Direito e aos tribunais previsto no artigo 20.º da CRP, na interpretação, que lhe foi dada pelo Tribunal recorrido, segundo a qual está subtraída da competência material da jurisdição administrativa a apreciação dos litígios respeitantes à interpretação, validade e execução de relações jurídicas materialmente administrativas praticados sob a forma de acto legislativo, in casu, do contrato de concessão sub judice, termos em que a mesma deverá ser desaplicada, aplicando-se, como tal, ao invés, a norma da alínea f) do nº 1, do artigo 4º do ETAF;
29) A norma da alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º do ETAF é ainda inconstitucional por violação do princípio da separação e interdependência de poderes previsto no artigo 111.º, nº 1, da CRP, na interpretação, que lhe foi dada pelo Tribunal recorrido, por via da qual se admite que a simples previsão por acto legislativo do conteúdo de uma relação jurídico-administrativa impede o conhecimento das questões dela emergentes pelos Tribunais Administrativos e Fiscais, termos em que a mesma deverá ser desaplicada, aplicando-se, como tal, ao invés, a norma da alínea f) do nº 1, do artigo 4º do ETAF.

O Recorrido contra-alegou, tendo concluído:
1) Os fundamentos da petição inicial radicam numa pretensa omissão legislativa por parte do Estado, sendo o pedido a final complexo, único e incindível, comportando, no seu essencial, um pedido de reequilíbrio financeiro do contrato, por alteração das respetivas cláusulas, com fundamento na não atribuição do jogo online à concessionária da zona de jogo da Póvoa de Varzim.

2) Os fundamentos do recurso revelam que a Recorrente tresleu a sentença e tenta agora dar-lhe um alcance que a mesma claramente não tem. Afirmando que ali se proíbe a modificação os contratos administrativos e que através desta decisão de incompetência se veda o acesso ao direito e aos tribunais.

3) Na alegação de recurso resulta manifesto que a Recorrente qualifica a contrapartida contratual como um tributo.

4) O Tribunal a quo julgou-se incompetente porque, considerando os termos em que Recorrente configurou o seu direito, não requereu a declaração de invalidade ou a declaração de inconstitucionalidade das normas regulamentares e legais que imperativamente enformam o contrato e cuja modificação pedia a final.

5) O Tribunal a quo compreendeu que a génese do pedido radicava em opções políticas e legislativas que escampam aos tribunais, não lhes cabendo emitir pronúncia quanto à adopção de actos legislativos, próprios da Assembleia da República e do Governo, nos termos constantes da alínea do n°. 2 do mesmo artº 4º do ETAF, e,

6) Consequentemente, este Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto é materialmente incompetente para dela conhecer, tal como doutamente se decidiu, tendo por consequência a absolvição do Réu Estado Português da instância.

As questões suscitadas e a decidir resumem-se em determinar:

— se ocorre erro de julgamento, pelo Tribunal a quo, ao decidir pela verificação da excepção da incompetência territorial do TAF do Porto

Para a presente decisão consideram-se relevantes os seguintes factos que se dão como provados:
1. A VS – Turismo, Jogo e Animação SA é a concessionária da exploração de jogos de fortuna ou azar na zona de jogo permanente da Póvoa de Varzim, cujo contrato de concessão foi celebrado em 29 de Dezembro de 1998, e objecto de revisão em 14 de Dezembro de 2001;

2. Foi adjudicado à Autora, ora recorrente, por escritura pública lavrada em 29 de Dezembro de 1988 a concessão do exclusivo da exploração de jogos de fortuna ou azar na zona de jogo da Póvoa de Varzim, como início em 1 de Janeiro de 1989 e termo em 31 de Dezembro de 2008 (doc. n.º 4 junto à pi);

3. Por escritura lavrada em 14 de Dezembro de 2001 procedeu-se à revisão do contrato de concessão (doc. n.º 5 junto à pi – publicado no DR, III série de 1 de Fevereiro de 2002).


Cumpre apreciar as questões suscitadas pela ora Recorrente, o que deverá ser efectuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redacção conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.
A decisão recorrida veio sustentar que os Tribunais Administrativos não são competentes para dirimir o presente conflito, referindo:
A Autora conclui pedindo que o Tribunal decrete a modificação dos n.ºs 2 e 3 da cláusula 4.ª e o n.º 1 da cláusula 5.ª do contrato celebrado entre as partes, nos termos que descreve na respectiva p.i. e que acima se transcreveu parcialmente (e que, por isso, ora nos pouparemos de o fazer).
Ora bem:
O conteúdo do contrato ora em apreço foi integralmente determinado por diploma regulamentar e por diploma legal – o Decreto Regulamentar n.º 29/88, de 3 de Agosto, o Decreto-Lei n.º274/88, de 3 de Agosto, e o Decreto-Lei nº275/2001, de 17 de Outubro.
O artigo 15.º do Decreto-Lei nº48 912, de 18 de Março de 1969, determinava que o período de duração das concessões de jogos de fortuna ou azar e as obrigações mínimas a assumir pelas empresas concessionárias seriam estabelecidas em decreto regulamentar, o que, relativamente à concessão da zona de jogo da Póvoa do Varzim, veio a suceder pelo citado Decreto Regulamentar n.º 29/88.
Por seu turno, o artigo 13.º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro (posteriormente alterado pelo Decreto-Lei nº10/95, de 19 de Janeiro), veio permitir que, tendo em conta o interesse público, o prazo das concessões de jogo fosse prorrogado «por iniciativa do Governo ou a pedido fundamentado das concessionárias», «estabelecendo-se as condições da prorrogação em decreto-lei».
Conforme resulta dos autos, a Associação Portuguesa de Casinos, ao abrigo do disposto nesse artigo 13.º, em representação e mandato das suas associadas, entre as quais a ora Autora, requereu a prorrogação das concessões, tendo, na sequência dos contatos então estabelecidos entre o Governo e a dita Associação Portuguesa de Casinos, sido aprovado e publicado o Decreto-Lei nº275/2001, que, conforme se impunha na lei, estabeleceu todas as condições que deveriam constar dos contratos que formalizaram as prorrogações dos contratos de concessão das zonas de jogo do Algarve, Espinho, Estoril, Figueira da Foz e Póvoa do Varzim.
Portanto:
Para além de terem sido as próprias concessionárias a pedir ao Governo que prorrogasse os contratos de concessão nos termos que vieram a ficar definidos, é manifesto que o contrato de concessão não pode ser modificado sem que previamente se proceda à alteração do diploma legal que definiu o respetivo conteúdo.
Ora:
A alteração de diplomas legais, no caso Decretos-Lei e Decretos Regulamentares, é competência dos órgãos de soberania com competência legislativa, a saber, a Assembleia da República e o Governo, pelo que não poderá o Tribunal modificar um contrato administrativo sem que o diploma legal que o aprovou seja previamente alterado, ou as normas deste constante sejam declaradas inválidas [em respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes (legislativo e judicial)].
Não poderá, pois, este Tribunal alterar o teor do Decreto-Lei nº275/2001, de 17 de Outubro (não foi pedida a declaração de inconstitucionalidade das normas em causa).
Verifica-se, assim que o escopo da pretensão da Autora consubstanciado na “ (...) reposição do equilíbrio financeiro do contrato de concessão (…) e de condenação em indemnização (…) ”, radica na tomada de uma decisão política e legislativa e que, atento o princípio da separação de poderes previsto no artº 111º da CRP, existe uma efectiva “separação das funções do Estado e da sua ordenação e distribuição por vários órgãos de soberania”.
Ora, a função política escapa ao escrutínio e controlo dos tribunais administrativos (cfr Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo nº 0390/09, de 2009.11.12; Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Sul, Processo nº 10495/13, de 2013.11.21; Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Norte, Processo nº 0639/06.0, de 2008.02.21; Acórdão do Tribunal Constitucional, Processo nº 337/2006, de 2006.05.18, in www.dgsi.pt).
O critério de atribuição da competência à jurisdição administrativa e fiscal assenta em estarem em causa litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
O que se pede no domínio da presente causa traduz-se na pronúncia e fiscalização judicial concreta da adopção de actos legislativos, matéria que extravasa o âmbito de competência desta jurisdição, nos termos constantes da alínea a) do nº 2 do artº 4º do ETAF, o vale por dizer que o Tribunal é totalmente incompetente, tendo por consequência e absolvição dos Réus da instância (cfr nº 1 do artº 99º do Código de Processo Civil, ex vi artº 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).
A competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria – vide artº 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pelo que se torna despicienda a apreciação da restante matéria de excepção invocada pelos Réus, cumprindo julgar tribunal incompetente, em razão da matéria, para conhecer da presente acção, absolvendo-se os Réus da instância.
Ou seja, a decisão recorrida vem sustentar que o pedido do Autor apenas pode ser satisfeito com a alteração do Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro e Decreto Regulamentar n.º29/88, de 3 de Agosto. Assim sendo, e como estamos perante uma decisão politica e legislativa esta escapa à competência da jurisdição administrativa e fiscal, pelo que não serão os tribunais administrativos os competentes para apreciar tal matéria.
O recorrente não concorda com tal decisão referindo nomeadamente que o contrato de concessão dos presentes autos é um contrato administrativo, submetido ao regime substantivo de direito público acima mencionado, competindo a apreciação dos litígios respeitantes à sua interpretação, validade e execução – como é o caso do presente litígio – à jurisdição administrativa, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f), parte final, do ETAF, e art.º 2.º, alínea g), do CPTA;

Nos termos dos artºs 211º, nº 1, da CRP, 40°, n° 1, da Lei nº 62/2013, de 26 de Agosto (LOSJ) e 64º do CPC são da competência dos Tribunais Judiciais todas as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

O ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais), aprovado pela Lei 13/2002, de 19 de Fevereiro, na redacção dada pela Lei n° 107-D/2003, de 31 de Dezembro (alterada recentemente pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro) vem elencar, genericamente, no seu artigo 4º a competência dos tribunais administrativos, referindo no seu n.º 1 os tipos de litígios cujo objecto os insere na esfera de competência da justiça administrativa, e nos nºs 2 e 3 os litígios que estarão excluídos.
Vejamos agora o caso dos autos.
Através da presente acção a recorrente pretende que seja reposto o reequilíbrio económico-financeiro da concessão que usufrui como concessionária da exploração dos jogos de fortuna ou azar na zona de jogo permanente da Póvoa de Varzim.
O contrato concessão de exploração dos jogos de fortuna e ou azar é um contrato administrativo, e neste âmbito não se levantam dúvidas.
É um contrato administrativo, considerando-se este, como se refere no artigo 1º n.º 6 do CCP “ sem prejuízo do disposto em lei especial, reveste a natureza de contrato administrativo o acordo de vontades, independentemente da sua forma ou designação, celebrado entre contraentes públicos e co-contratantes ou somente entre contraentes públicos, que se integre em qualquer uma das seguintes categorias:…” .
Ou seja, são considerados contratos administrativos, o acordo de vontades entre contraentes públicos e co-contratantes ou somente entre contraentes públicos, e que se integrem numa das alíneas referida no n.º 6 do artigo 1º.
Estes contratos são administrativos, uma vez que é a própria lei que o refere. De acordo com o artigo 9º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, “ o direito de explorar jogos de fortuna ou azar é reservado ao Estado e só pode ser exercido por empresas constituídas sob a forma de sociedades anónimas a quem o Governo adjudicar a respectiva concessão mediante contrato administrativo…”
Por seu lado, refere José Carlos Vieira de Andrade, in, Lições de Direito Administrativo, 2ª edição, pág. 212-213, quanto à classificação dos Contratos Administrativos, que estes podem ser de três tipos fundamentais, quanto ao seu conteúdo ou objecto:
a) Contratos com objecto passível de acto administrativo;
b) Contratos com objecto passível de contrato de direito privado e
c) Contratos com objecto próprio (ou exclusivo),
Indicando, como exemplo deste último tipo de contratos, a concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar.

Estes contratos segundo este autor, obra citada pág. 213, são também classificados como contratos de concessão constitutiva ou de atribuição de direitos.
Ou seja, não há dúvidas que a doutrina classifica este tipo de contratos como administrativos, assim como a jurisprudência.
Ver, neste sentido, Acórdão STA proc. n.º 01249, de 18-06-1985, quando refere: I - O contrato de concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar e, segundo um critério material ou substantivo, um contrato administrativo quer por conter clausulas exorbitantes do direito civil quer pela sua submissão ao regime de direito publico administrativo.
E ainda do mesmo Tribunal proc. 012948 de 24-06-1986:
II - O contrato de concessão de exploração de jogo de fortuna ou azar e, segundo um critério material e substantivo, um contrato administrativo.
III - Com a entrada em vigor do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) passou a pertencer aos tribunais administrativos a competência para conhecer das questões emergentes de tais contratos, sob a forma de acção ou recurso, ainda que a data desse diploma a causa já tivesse sido proposta.
Não havendo dúvidas que os contratos de concessão dos jogos de fortuna ou azar são contratos administrativos, nos termos do artigo 4º n.º 1 alínea f) do ETAF, compete aos tribunais administrativos apreciarem os litígios surgidos com a aplicação dos mesmos.
Vem, no entanto, a decisão recorrida sustentar que as alterações que pretende introduzir o recorrente ao contrato, as cláusulas 4º e 5º, têm a ver com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 275/2001, de 17 de Outubro. Estando nós perante a alteração de um acto político legislativo não estará a apreciação da matéria em causa no âmbito da competência dos Tribunais Administrativos, como resulta da alínea a) do n.º 2 do artigo 4º do ETAF.

De notar que a competência em razão da matéria do tribunal se afere pela natureza da relação jurídica tal como é apresentada pelo autor na petição inicial, isto é, no confronto entre o respectivo pedido e a correspondente causa de pedir.

Por seu lado, a questão da competência ou da incompetência do tribunal em razão da matéria para conhecer de determinado litígio é, naturalmente, independente do mérito ou demérito da pretensão deduzida pelas partes.

Assim sendo, e como configura a presente acção, a Autora vem solicitar que seja reposto o reequilíbrio económico-financeiro da concessão que detém relativamente à concessão do jogo na Póvoa de Varzim. Ora, resolver a questão colocada da necessidade de proceder ao reequilíbrio financeiro de um contrato administrativo é matéria que está liminarmente dentro da competência dos Tribunais Administrativos. A questão de saber se a Autora tem direito ou não a essa alteração, já é uma questão do mérito da acção e não da competência sobre quem pode apreciar tal matéria. Dito de outro modo. Saber se a Autora pode ver alterado o seu contrato de concessão, uma vez que as cláusulas que pretende ver modificas estarão dependentes de um Decreto-Lei ou de um Decreto Regulamentar é uma questão a apreciar quanto ao mérito da acção, mas não é uma questão de competência para apreciar tal matéria.

De acrescentar que a Autora vem solicitar a modificação dos n.ºs 2 e 3 da cláusula 4.ª e o n.º 1 da cláusula 5.ª do contrato do contrato de concessão. Refere que estas cláusulas devem passar a mencionar o seguinte:
Cláusula 4ª
1. (mantém-se)
2. Para além da contrapartida referida no número anterior, prestar, em cada ano, contrapartida no valor de 25% do EBTIDA gerado pela Concessionária, calculado nos termos seguintes:
EBITDA = [(Vendas – conta 71 - + Prestações de Serviços – conta 72 - + Outros Rendimentos e Ganhos – conta 78 -) – (Comparticipação para Investimentos – conta 7883 - + Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas – conta 61 - +Fornecimentos e Serviços Externos – conta 62 - +Gastos com Pessoal – conta 63 - + Outros Gastos e Perdas - conta 68)]
Em que:
A Prestação de Serviços (conta 72) inclui a prestação de serviços de jogo (conta 721), a Prestação de Serviços de Alimentação e Bebidas (conta 722), a Prestação de Serviços de Espetáculos (conta 724) e a Prestação de Serviços Secundários (conta 725), deduzindo-se Descontos e Abatimentos (conta 728);
Os Outros Rendimentos e Ganhos (conta 78) excluem a comparticipação para investimentos (conta 7883) e incluem as Comparticipações do Estado para animação, promoção turística, desporto e cultura e para exploração do Conjunto das Piscinas (conta 7886);
3. A contrapartida anual devida pela Concessionária nos termos do número anterior realiza-se pelas seguintes formas:
a. Através do pagamento do imposto especial sobre o jogo, nos termos da legislação em vigor;
b. Através do pagamento das importâncias que nos termos da lei e regulamentos aplicáveis couberem às concessionárias para compensação do Estado pelos encargos com o funcionamento da inspeção-Geral de Jogos;
c. Através da dedução de 50% dos custos incorridos pela Concessionária com projetos e execução de obras de modernização do Casino da Povoa, bem como dos custos incorridos com a manutenção preventiva e corretiva das respetivas instalações;
d. Através da dedução ao valor da contrapartida anual de 50% dos investimentos realizados pela Concessionária em ativos fixos tangíveis que respeitem o Equipamento Básico e Equipamento Administrativo;
e. Através da dedução ao valor da contrapartida anual, de até 3% das receitas brutas dos jogos do ano em causa, dos custos incorridos com a realização de programas de animação artística, bem como promoção e organização de manifestações turísticas, culturais e desportivas (com eliminação da obrigação de afetar uma verba mínima à realização destas atividades);
f. Através da dedução ao valor da contrapartida anual de 50% dos encargos coma aquisição, renovação, substituição e exploração e encargos decorrentes dos respetivos contratos de manutenção e aquisição de peças;
g. Através da dedução ao valor da contrapartida anual do valor constante de 12.220.000$00, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que as receitas respeitam será feita pelo processo constante do art. 4º do Decreto- Regulamentar n.º29/88, a título de comparticipação em eventuais prejuízos com a exploração do conjunto de piscinas afeto à concessão, independentemente dos resultados reais que venham a ser registados;
h. Através da dedução de 100% dos encargos, aprovados pela Inspeção-geral de Jogos, com a autorização do sistema de emissão de cartões de acesso às salas de jogos e de controlo das respetivas receitas, bem como com a instalação de circuitos internos de televisão e de outros dispositivos de vigilância, de acordo com programas a definir pela mesma entidade, sob proposta da concessionária, ou, na falta desta, após audição da concessionária;
i. Através da dedução ao valor da contrapartida anual do montante de 45.000.000$00, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que respeita será feita pelo processo constante do art. 4.º do Decreto-Regulamentar n.º29/88, importância destinada ao Instituto de Formação Turística;
j. Através da dedução ao valor da contrapartida anual do montante de 30.000.000$00, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que respeita será feita pelo processo constante do art. 4º do Decreto-Regulamentar nº 29/88, para subsídios a conceder pelo Ministro da Economia, ouvida a respetiva Câmara Municipal, a entidades com relevância social que desenvolvam a sua atividade na área do município da Póvoa de Varzim;
k. Através do pagamento da diferença entre o total da contrapartida anual devida e os valores apurados nos termos das alíneas a) a j) deste número.
4. (anterior número 3)
(…)
Cláusula 5ª
1. No caso de a soma dos valores das importâncias indicadas nas alíneas a) e b) do número 3 da cláusula 4ª, exceder a contrapartida anual devida nos termos do número 2 da mesma cláusula, o excesso será creditado à concessionária como antecipação do pagamento da contrapartida anual nos anos seguintes.

As cláusulas 4 e 5º do contrato de concessão em vigor referem:
CLÁUSULA QUARTA
A concessionária obriga-se, nos termos dos citados Decreto-Lei nº 275/2001 e Decreto Regulamentar nº 29/88, a:
Cláusula 4º …
2. Para além da contrapartida referida no número anterior, prestar, em cada ano, contrapartida do valor de 50% das receitas brutas declaradas dos jogos explorados no casino; todavia, em caso algum a contrapartida prestada nos termos deste número poderá ser inferior aos valores indicados no anexo ao Decreto-Lei nº 275/2001, de 17 de Outubro, depois de serem previamente convertidos em euros correntes do ano a que respeitam, nos termos do nº 3 do artº 2º do mesmo diploma legal.
A contrapartida referida neste número realiza-se pelas seguintes formas:
a. Através do pagamento do imposto especial sobre o jogo, nos termos da legislação em vigor;
b. Através do pagamento das importâncias que à concessionária couberem para compensação do Estado pelos encargos com o funcionamento da Inspecção-Geral de Jogos, nos termos legalmente estabelecidos;
c. Através da dedução do valor constante de 12 220 000$, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que as receitas respeitam será feita pelo processo constante do artigo 4º do Decreto Regulamentar nº 29/88, a título de comparticipação em eventuais prejuízos com a exploração do conjunto de piscinas afecto à concessão, independentemente dos resultados reais que venham a ser registados;
d. Através da dedução, até 50%, em termos a aprovar pelo Ministro da Economia, ouvida a Inspecção-Geral de Jogos, dos encargos com a aquisição, renovação ou substituição do equipamento de jogo, designadamente da aquisição, no mercado nacional ou estrangeiro, de máquinas electrónicas, bem como com os projectos e execução de obras de modernização e ampliação do actual casino;
e. Através da dedução dos encargos, aprovados pela InspecçãoGeral de Jogos, com a automatização do sistema de emissão de cartões de acesso às salas de jogos e de controlo das respectivas receitas, bem como com a instalação de circuitos internos de televisão e outros dispositivos de vigilância, de acordo com programa a definir pela mesma entidade, sob proposta da concessionária, ou, na falta desta, após audição da concessionária;
f. Através da dedução, até 1% das receitas brutas dos jogos, dos encargos relativos ao cumprimento das obrigações previstas nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro, encargos que não poderão ser inferiores a 3% das receitas brutas dos jogos. Caso estes encargos, adicionados aos custos líquidos com animação e restauração e aos encargos com publicidade e marketing, ultrapassem um valor correspondente a 3% das receitas brutas dos jogos, a concessionária tem, adicional e complementarmente, direito a deduzir 50% dos encargos em excesso do referido mínimo exigível, não podendo esta dedução suplementar exceder 3% das receitas brutas dos jogos. Esta última dedução só será exequível na medida e dentro dos limites de 25% do acréscimo de receitas brutas dos jogos de cada exercício, relativamente ao exercício anterior.
g. Através da dedução anual de 45 000 000$, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que respeitam será feita pelo processo constante do artigo 4º do citado Decreto Regulamentar nº 29/88, importância destinada ao Instituto de Formação Turística;
h. Através da dedução anual de 30 000 000$, a preços de 1987, cuja conversão em euros correntes do ano a que respeitam será feita pelo processo constante do artigo 4º do citado Decreto Regulamentar nº 29/88, para subsídios a conceder pelo Ministro da Economia, ouvida a respectiva Câmara Municipal, a entidades com relevância social que desenvolvam a sua actividade na área do Município da Póvoa de Varzim;
i. Através do pagamento da diferença entre o total da contrapartida anual referida na alínea b) do nº 1 do artigo 3º do Decreto Regulamentar nº 29/88 e os valores apurados nos termos das alíneas a) a h) deste número;
3. Garantir a conservação, em bom estado de utilização, das instalações afectas à concessão, indicadas na alínea b) do nº 1 do artigo 2º do Decreto Regulamentar nº 29/88, bem como do respectivo equipamento, mobiliário e utensilagem, nos termos das instruções dimanadas da Inspecção-Geral de Jogos.
CLÁUSULA QUINTA
1. No caso de a soma dos valores das importâncias indicadas nas alíneas a) a h) do nº 2 da cláusula 4ª exceder a contrapartida anual referida no nº 2 da mesma cláusula, o excesso será creditado à concessionária como antecipação e compensado por força das verbas referidas na alínea i) também do mesmo nº 2, nos anos seguintes, após conversão em euros correntes do ano em que tiver lugar a compensação por aplicação da fórmula prevista no artigo 4º do Decreto Regulamentar nº 29/88.
2. As importâncias mencionadas nas alíneas a) a i) do nº 2 da cláusula 4ª vencem-se:
a. As referidas nas alíneas a) e b), nos termos previstos na legislação aplicável;
b. As referidas nas alíneas d) a f) e h), à medida que se tornar necessário satisfazer os respectivos encargos;
c. As referidas na alínea g), em prestações trimestrais, a entregar no primeiro dia útil de cada trimestre;
d. As referidas nas alíneas c) e i), até 31 de Janeiro do ano seguinte àquele a que as receitas respeitarem.
3. As importâncias a pagar nos termos da alínea i) do nº 2 da cláusula 4ª serão depositadas no Instituto de Financiamento e Apoio ao Turismo, mediante guias a emitir pela Inspecção-Geral de Jogos e deverão ser afectas a finalidades de interesse turístico, nos termos da legislação aplicável.
Verifica-se, grosso modo, e quanto à cláusula 4º n.º 2 que a recorrente, entre outras questões, pretende que as contrapartidas a prestar em cada ano passem de 50% para 25%, com as condicionantes aí referidas. Ora, esta contrapartida encontra-se fixada no Decreto Regulamentar n.º 29/88, de 3 de Agosto (artigo 3º), onde também se encontra a fórmula como elas se realizam (artigo 6º). Ou seja, pelo menos nesta parte está em causa a aplicação de um Decreto Regulamentar e não de um Decreto-Lei.
Os Decretos Regulamentares fazem parte da actividade regulamentar da Administração, sendo classificados como regulamentos Administrativos. Se poderia haver dúvidas nesta classificação estas ficaram dissipadas pelo actual artigo 138º do Código de Procedimento Administrativo, que no seu n.º 3 estabeleceu a ordem de prevalência entre os regulamentos governamentais, constando o Decreto Regulamentar no lugar cimeiro desta hierarquia. Ou seja, os Decretos Regulamentares são assim normas jurídicas gerais e abstractas decorrentes do exercício do poder administrativo (artigo 135º do CPA).
Como regulamentos Administrativos que são, a fiscalização da legalidade da sua aplicação encontra-se atribuída aos Tribunais Administrativos e Fiscais nos termos do artigo 4º, n.º 1, alínea b,) do ETAF, pelo que também, por esta razão, pertence aos Tribunais Administrativos a competência para a apreciação da matéria em causa nos autos.

Ou seja, como a Autora configura a acção, é da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais a apreciação do presente litígio e referente ao pedido de reposição do reequilíbrio económico-financeiro do contrato de concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar na zona de jogo permanente da Póvoa de Varzim.
Assim sendo, tem de proceder o presente recurso, devendo-se revogar a decisão recorrida e consequentemente os autos baixarem à primeira instância para aí prosseguirem se entretanto nada mais obstar.

DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, em julgar procedente o Recurso, revogar a decisão recorrida, declarando-se a competência dos Tribunais Administrativos para julgar a presente acção, determinando-se a baixa dos autos à 1ª instância, onde devem continuar a sua tramitação, se nada mais a tal obstar.

Custas pelo recorrido.
Notifique

Porto, 8 de Abril de 2016
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco