Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00274/15.2BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/06/2019
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Ana Paula Santos
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO, NULIDADE, ANULABILIDADE
Sumário:
I- Os vícios do ato impugnado constituem, em regra, fundamento da sua anulabilidade, só implicando a sua nulidade quando se verifique a falta de qualquer dos elementos essenciais do ato ou quando houver lei que expressamente preveja essa forma de invalidade, nos termos do disposto nos artigos 133º e 135º do CPA;
lI – O acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou sub delegação de competências , da qualidade em que decidiu , do seu sentido e da sua data.
III - Deste modo, a impugnação judicial do referido ato tributário poderá ser deduzida a todo o tempo, nos termos do artigo 102º nº3 do CPPT. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:GEHDS, LDA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a sentença resorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
GEHDS, LDA., NIPC 50xxx26, com sede em A....., 5160-259 Torre de Moncorvo, nestes autos (ao deante Impugnante ou Recorrente), inconformada, recorre para este Tribunal Central Administrativo Norte da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que, considerando verificada a excepção da caducidade do direito de acção, absolveu a Fazenda Pública do pedido.
O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, tendo o Recorrente formulado nas respectivas alegações de recurso, as seguintes conclusões que se reproduzem ipsis verbis:
a) A Recorrente apresentou, em 14.05.2015, impugnação judicial contra a liquidação de IMT, do valor de € 35.445,95, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela.
b) Entre outros fundamentos, invocou que o conhecimento da existência da liquidação supra referida lhe adveio em 24.03.2015, após pedido de certidão requerido ao Serviço de Finanças de Torre de Moncorvo.
c) Face ao referido em b), entendeu que a petição inicial, apresentada em 14.05.2015, seria tempestiva, para o que invocou o disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT.
d) A Fazenda Pública, na contestação que apresentou, pugnou pela verificação da exceção perentória da caducidade do direito à ação, por considerar que a segunda notificação efetuada à aqui Recorrente, em 20.01.2014, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT, fazia presumir a notificação, por aplicação do n.º 6 da referida norma.
e) Foi esse mesmo o entendimento vertido na sentença ora em recurso.
Isto é,
f) A sentença julgou verificada a exceção de caducidade, por considerar que a ora Recorrente foi notificada, através de uma segunda notificação, a 23.01.2014, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT.
g) Para além de ser totalmente omissa relativamente aos elementos constantes do n.º 1 do artigo 123º do CPPT, designadamente por não identificar nenhum dos interessados, nem sintetizar as pretensões da Impugnante, da Fazenda Pública e do Ministério Público,
h) Sustenta-se, a decisão em análise, no facto de as notificações terem sido devolvidas ao remetente pelos CTT, com a indicação de “endereço insuficiente”, conforme consta dos factos provados 1. e 2.
i) Mas por aí se basta. No entanto,
j) Não evidencia, nem se sustenta em qualquer registo dos CTT onde a Recorrente se tenha recusado a receber a correspondência ou não a tivesse levantado naqueles serviços postais, mediante aviso deixado na sua sede.
k) Ora, não se tendo dado como provado quer a recusa do recebimento, quer o não levantamento, após o prazo concedido para o efeito pelos serviços postais, imperioso seria concluir que a notificação à Recorrente não sendo válida, foi igualmente ineficaz.
l) Nessa conformidade, não poderia ter-se dado como provado que, sendo o registo na segunda notificação/carta, de 20.01.2014, a mesma se presumiu efetuada a 23.01.2014.
m) A bem da descoberta da verdade material, deveriam, pois, ser acrescentados à matéria assente os seguintes factos que a Recorrente considera igualmente provados:
I - Nos avisos de recepção não foi aposta a menção de recusado e/ou não reclamado, após o decurso do prazo concedido para o levantamento da correspondência, nos serviços dos CTT;
II - Consta das duas notificações, que “a notificação se considera efectuada na data da assinatura do aviso de recepção, conforme n.º 3 do artigo 39º do CPPT”.
III - Na segunda notificação, ocorrida em 20/1/2014, não consta que esta tenha sido efetuada ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT.
n) Factos que se retiram dos documentos n.º 1 e 2 juntos com a petição inicial, mas também constantes do PA.
o) Pese embora não estar assente que a Recorrente se tivesse recusado a receber a correspondência ou não tivesse procedido ao seu levantamento no prazo que os serviços postais disponibilizam para o efeito, o Tribunal a quo, na decisão que proferiu, considerou (erradamente) aplicável ao caso concreto, o disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT, muito embora do teor da segunda notificação (datada de 20.01.2014) não se descortine que esse normativo tivesse sido invocado.
p) Por ser prática comum da Administração Tributária, quando procede a segundas notificações, a referência “2ª notificação para efeitos no n.º 5 do artigo 39º do CPPT”, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo fez presumir a notificação da aqui Recorrente ao dia 23.01.2014 (3º dia posterior ao do registo), por aplicação do disposto no n.º 6 do artigo 39º do CPPT. Porém, como se referiu na conclusão anterior, esse normativo não é aplicável, na medida em que não se encontra demonstrada quer a recusa, quer o não levantamento da correspondência.
q) Assim, com base na factualidade que se pretende seja dada como provada, referida na conclusão l), aliada à já assente na decisão em apreciação, constata-se que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo fez errada apreciação dos factos e consequente errada aplicação da lei.
r) A Recorrente entende, pois, que a impugnação judicial que apresentou em 14.05.2015 é tempestiva, em face do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, ou seja, data em que teve conhecimento dos atos lesivos dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
s) Direitos que a decisão recorrida, ilegalmente, coarcta, com total omissão de fundamentação sustentatória.
t) Assim, tendo o Tribunal a quo, decidido que a Recorrente foi notificada em 20.01.2014, julgando verificada a excepção peremptória da caducidade do direito de impugnar, a sentença recorrida procedeu a uma errada e incompleta apreciação dos factos, bem como a errada aplicação da lei, designadamente pela violação do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, nos n.º 5 e 6 do artigo 39º do CPPT e n.º 4 do artigo 268º da CRP, pelo que, deverá ser anulada e substituída por decisão que considere a Impugnação judicial tempestiva, e nessa conformidade, seja ordenado o prosseguimento dos trâmites legais e processuais até decisão de apreciação de mérito.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso, e, nessa conformidade, seja ordenada a anulação da sentença em apreço, por ilegal, substituída por decisão que julgue improcedente a invocada exceção de caducidade do direito de impugnar da aqui Recorrente, devendo a impugnação judicial seguir prosseguir a sua tramitação até decisão final (de mérito) do pleito.
Acordando nos termos ora propugnados, farão Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, a costumada JUSTIÇA.
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A recorrida apresentou contra-alegações que rematou nos seguintes termos:
A) Andou bem a douta sentença quando apreciou em primeira linha a invocada exceção da intempestividade da impugnação judicial, ficando prejudicada a apreciação das restantes questões, já que, a invocada excepção, conduziu à absolvição da AT no pedido.
B) Não se verificou qualquer erro na aplicação da lei, uma vez que, a situação "in casu" quanto ao prazo de interposição da impugnação judicial tem o seu enquadramento legal na al. a) do n°. 1 do art°. 102 do CPPT e não na alínea f) da referida disposição legal, invocada pela impugnante.
C) Está precludido a possibilidade, por intempestiva, a interposição da impugnação judicial.
D) Verificando-se nos autos a presunção da notificação da liquidação do IMT, com os fundamentos e razoes invocadas na contestação, e não tendo a impugnante vindo invocar, nem provar justo impedimento no recebimento da mesma, considera-se a mesma, eficazmente notificada, com as legais consequências.
Nestes termos e nos melhores de Direito, acompanhamos integralmente os fundamentos da douta sentença, nos precisos termos em que foi proferida, não se nos oferecendo qualquer reparo sobre a mesma, pelo que, deve o presente recurso ser julgado improcedente e em consequência deve manter-se nos precisos termos mantida a decisão proferida na douta sentença, objeto do presente recurso.
Como sempre, Vas. Exas. Doutamente farão a esperada Justiça.
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Recebidos neste Tribunal Central Administrativo Norte, foram os autos com vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto que se emitiu o douto parecer inserto a fls 186 e 187 no sentido de ser negado provimento ao recurso, no entendimento, em suma, de que a Recorrente “(…)não alegou nem demonstrou o justo impedimento , nos termos do artigo 39º nº5 do CPPT, nem que tenha mudado a sua sede(…)”.
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Colhidos os vistos legais junto dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos vem o processo à Conferência para julgamento.
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OBJECTO DO RECURSO - Questões a apreciar e decidir:
A questão suscitada pela Recorrente nas alegações de recurso e delimitada pelas respectivas conclusões, artigos 608º, nº 2, 635, todos do Código de Processo Civil (CPC), “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) consiste em saber se o Mmº Juiz do Tribunal a quo fez errado julgamento ao considerar caducado o direito de impugnar a liquidação de IMT e, consequentemente, ao absolver a Fazenda Pública do pedido.
Para tal, impõe-se indagar se aquele acto tributário foi, ou pode considerar-se como tendo sido notificado à ora Recorrente, o que exige, designadamente, que se averigue se pode considerar-se efectuada a notificação nos termos do n.º 5 do art. 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) quando as cartas remetidas ao contribuinte para esse efeito vêm devolvidas com as anotações “endereço insuficiente” apostas pelos serviços postais.
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FUNDAMENTAÇÃO
DE FACTO
O Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:
“(…) Da tempestividade da impugnação
Factos provados:
1. A impugnante foi notificada da liquidação adicional em sede de IMT através de dois ofícios, registados com aviso de recepção, com os n.ºs 40 e 42, respectivamente, em 15 e 20 de Janeiro de 2015, tendo ambas as notificações sido devolvidos, com indicação de "endereço insuficiente". Cf. folhas 1 a 13 do PA;
2. Tendo a primeira notificação sido devolvida com indicação dos CTT - "endereço insuficiente", e não tendo o contribuinte comunicado alteração do seu domicílio fiscal, foi efectuada segunda notificação à impugnante dentro dos quinze dias seguidos à devolução, por nova carta registada com aviso de recepção - Cf. folhas 1 a 13 do PA;
3. Os avisos de recepção relativos às 1ª e 2ª notificações foram devolvidos sem assinatura do Impugnante – Fls. 6 e 11 do PA;
4. O registo da 2ª notificação/carta é de 20/1/2014 – fls. 10 do PA;
5. A data limite de pagamento ocorreu em 4/11/2014 – fls. 18 do PA
6. Na data de entrada da PI e na data de contestação (respectivamente em 4/5/2015 e 9/11/2015) a Impugnante mantém o mesmo endereço para o qual foram efectuadas ambas as notificações: A....., 5160-259 Torre de Moncorvo. Cf. PI e folhas 14 do PA;
Para uma melhor compreensão da situação fáctica e respectivo enquadramento jurídico e ao abrigo dos poderes concedidos pelo art. 662º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), entendemos deixar registadas diversas circunstâncias, o que passamos a fazer, aditando a seguinte factualidade considerada pertinente:
7. No âmbito do procedimento Inspectivo que está na génese da liquidação impugnada, pelo Exmo. Chefe de Divisão da Inspecção Tributária foi elaborado o “Mandado” nos seguintes termos:
“AFV, Chefe da Divisão da Inspecção Tributária da Direção de Finanças de Bragança, mando, CJMD, funcionário(s) portador(es) do cartão profissional nº 16xxx, que visto este(s)por mim assinado, proceda(m) à notificação pessoal do sujeito passivo:
NIF/NIPC507 825 926
S PASSIVOGEHDS, LDA
RESID./SEDEA.....
5160-259 TORRE DE MONCORVO
do teor do Ofício nº 3.195 de 18/12/2013, referente ao Relatório de Inspeção, da ação de inspecção externa efetuada aos exercícios de 2009 e 2010, de âmbito geral , correspondente à Ordem de Serviço nº OI201100189.
CUMPRA-SE
Bragança, 18 de dezembro de 2013
O CHEFE DE DIVISÃO
(assinatura ilegível)
(cfr. fls. 121 do PA Apenso)
8. Em cumprimento do ordenado pelo “Mandado” a que se reporta o ponto anterior, foi emitida a “CERTIDÃO DE DILIGÊNCIAS”, com o seguinte teor:
“Certifico que, hoje pelas 09 horas e 30 minutos, tendo-me deslocado à morada a seguir indicada, a fim de notificar pessoalmente o sujeito passivo GEHDS, LDA., CONTRIBUINTE FISCAL 50xxx26, com sede fiscal declarada em A..... , 5260-259, nos termos dos nºs 5 e 6 do art.º38º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPTT), do conteúdo do Mandado, relativo ao Ofício Notificação nº3.195 de 2013.12.18, da Direcção de Finanças de Bragança, relativo ao Relatório de Inspeção Tributária resultante da ação de inspeção aos exercícios de 2009 e 2010, de âmbito geral, correspondente à Ordem de Serviço nº OI201100189, verifiquei não poder cumprir essa diligência, em virtude do prédio em causa se encontrar devoluto e de se encontrar ausente na referida morada pessoa competente para levar a cabo a notificação que me propunha efectuar.
Assim, irá ser efetuada a respetiva notificação na pessoa de um dos seus gerentes nos termos do artigo 40º do CPPT e 40º do RCPIT.
Para constar, lavrei a presente Certidão, que irá ser assinada por todos os que presenciaram os fatos atrás relatados.
Torre de Moncorvo, 23 de dezembro de 2013
O(S) FUNCIONÁRIO(S)
CJMD Nº Prof. 16xxx assinatura ilegível
JATSL Nº Prof. 15xxx) assinatura ilegível
(cfr. fls. 122 do PA Apenso)
9. Em 23.12.2013, foi emitida a CERTIDÃO DE NOTIFICAÇÃO nos seguintes termos:
“Certifico que me desloquei hoje pelas 10:35 horas, ao Bairro S…, S/N, 5360-170 Santa Comba Vilariça, para notificar o sujeito passivo GEHDS, LDA., NIF 50xxx26, de todo o conteúdo do Mandado, relativo Ofício n.º 3.195 de 18/12/2013, referente ao Relatório Inspeção Tributária da ação de inspeção externa aos exercícios de 2009 e 2010, de âmbito geral, correspondente à Ordem de Serviço n.ºOI201100189.
Assim, verifiquei a Notificação na pessoa de FASB com o C.C. n.º 6xxx08, incumbindo-a de transmitir o presente ato ao sujeito passivo GEHDS, LDA., NIF 50xxx26, nos termos do artigo 40º do RCPIT.
De como ficou ciente tendo recebido o Mandado, Ofício /Notificação n.º3.195 de 18/12/2013 e respectiva fundamentação (53 folhas) bem como o duplicado da presente Certidão , vai comigo assinar o(a)
Sr. FASB
Sta. Comba da Vilariça, 23 de dezembro de 2013
O(s) Funcionário(s)
CJMD Nº Profissional 16xxx
A(s) Testemunha(s)
JATSL Nº Profissional 15xxx
(cfr. fls. 123 e 124 do PA Apenso)
10. FASB, com o C.C. n.º 6xxx08, é sócio gerente da Impugnante GEHDS, LDA.,
(cfr. fls. 124 e Certidão da CRComercial a fls. 127 a 131 do PA Apenso)
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DE DIREITO
Está em causa a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que, considerando verificada a excepção peremptória consubstanciada na caducidade do direito de deduzir Impugnação contra a liquidação de IMT no montante de 35.445,95 €, absolveu a Fazenda Pública, ora Recorrida, do pedido, por considerar que à data em que a petição inicial foi apresentada, há muito que se encontrava ultrapassado o prazo de 90 dias para o efeito, contado do termo do prazo legal para o pagamento voluntário.
Para assim decidir, o Tribunal a quo ancorou-se, em suma, na seguinte fundamentação:(«(…)Discute-se nos autos a liquidação em sede de IMT, no montante de 35.445,95 € .
Nos termos do art°. 31 n.º. 4 do CIMT, a notificação da liquidação adicional deve ser efectuada ao contribuinte nos termos previstos no CPPT, com vista a efectuar o pagamento ou poder utilizar os meios de defesa aí previstos.
Nos termos do art.º 39.º, n.º 5 do CPPT em caso do aviso de recepção ser devolvido ou não vier assinado a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada. Uma vez que a Impugnante não comunicou a alteração do deu domicilio, que, aliás, mantém, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo – art.º 39.º, n.º 6 do CPPT.
Ou seja a Impugnante foi notificada em 23/1/2014. Assim, na data de entrada da PI o seu direito de acção de três meses, contados desde a data limite de pagamento, já tinha caducado - art.º 102.º, n.º 1, al. a).
Caducidade é uma excepção peremptória (material) porque, consistindo na invocação de factos que extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo A, importam a absolvição total ou parcial do pedido – Art.º 576º, n.ºs 1e 3 do CPC e Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 306 e 306, em posição que se acompanha.(…)»
Ora, é contra este entendimento que a Recorrente se insurge, sustentando que não pode considerar-se validamente notificada da liquidação que está na génese dos presentes autos, constituindo o cerne da sua alegação, em síntese, que apresentou, em 14.05.2015, impugnação judicial contra a liquidação de IMT em apreço, tendo invocado que o conhecimento da existência da liquidação supra referida lhe adveio em 24.03.2015, após pedido de certidão requerido ao Serviço de Finanças de Torre de Moncorvo, pelo que tendo invocado o disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, sempre a petição inicial, apresentada em 14.05.2015, seria tempestiva.
Mais brande contra a decisão a quo a alegação de que o Tribunal recorrido julgou verificada a excepção de caducidade, por considerar que a ora Recorrente foi notificada, através de uma segunda notificação, a 23.01.2014, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT, sustentando-se aquela no facto de as notificações terem sido devolvidas ao remetente pelos CTT, com a indicação de “endereço insuficiente”, sem evidenciar ou se sustentar em qualquer menção dos CTT que revele ter a Recorrente recusado receber a tal correspondência ou a não tivesse levantado nos serviços postais, mediante aviso deixado na sua sede. Pelo que, não tendo resultado provado quer a recusa do recebimento, quer o não levantamento, após o prazo concedido para o efeito pelos serviços postais, imperioso seria concluir que a notificação à Recorrente não sendo válida, foi igualmente ineficaz, e nessa conformidade, não poderia ter-se dado como provado que, sendo o registo na segunda notificação/carta, de 20.01.2014, a mesma se presumiu efetuada a 23.01.2014, razão pela qual entende que deveriam ser aditados ao probatório os seguintes factos:
I - Nos avisos de recepção não foi aposta a menção de recusado e/ou não reclamado, após o decurso do prazo concedido para o levantamento da correspondência, nos serviços dos CTT;
II - Consta das duas notificações, que “a notificação se considera efectuada na data da assinatura do aviso de recepção, conforme n.º 3 do artigo 39º do CPPT”.
III - Na segunda notificação, ocorrida em 20/1/2014, não consta que esta tenha sido efetuada ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT.
Por último, esgrime em defesa da sua posição que, pese embora não estar assente que a Recorrente se tivesse recusado a receber a correspondência ou não tivesse procedido ao seu levantamento no prazo que os serviços postais disponibilizam para o efeito, o Tribunal a quo, na decisão que proferiu, errou ao considerar aplicável ao caso concreto, o disposto no n.º 5 do artigo 39º do CPPT, muito embora do teor da segunda notificação (datada de 20.01.2014) não se descortine que esse normativo tivesse sido invocado. Por ser prática comum da Administração Tributária, quando procede a segundas notificações, a referência “2ª notificação para efeitos no n.º 5 do artigo 39º do CPPT”, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo fez presumir a notificação da aqui Recorrente no dia 23.01.2014 (3º dia posterior ao do registo), por aplicação do disposto no n.º 6 do artigo 39º do CPPT. Porém, esse normativo não é aplicável, na medida em que não se encontra demonstrada quer a recusa, quer o não levantamento da correspondência vindo a concluir que o Tribunal a quo, ao decidir que a Recorrente foi notificada em 20.01.2014 e, consequentemente, ao julgar verificada a excepção peremptória da caducidade do direito de impugnar, procedeu a uma errada e incompleta apreciação dos factos, bem como a errada aplicação do direito, em violação do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, nos n.º 5 e 6 do artigo 39º do CPPT e n.º 4 do artigo 268º da CRP.
Assaca, assim, a Recorrente à sentença a quo o erro de julgamento da matéria de facto, e consequentemente, na aplicação do direito, pelo que pretende, antes de mais, que sejam aditados, à matéria de facto dada como provada, os factos supra transcritos.
Como é sabido, a alteração pelo TCA da decisão da matéria de facto pressupõe que, para além da indicação dos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, sejam indicados os concretos meios de prova constantes do processo (ou de gravação realizada) que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (arte. 662º nº1 do CPC).
Com efeito, só se esses meios de prova determinarem e forçarem decisão diversa da proferida se pode concluir ter a 1ª instância incorrido em erro de apreciação das provas legitimador da respectiva correcção pelo Tribunal Superior.
Ora, na decisão sobre a matéria de facto o juiz a quo aprecia livremente as provas, analisa-as de forma crítica e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, especificando os fundamentos que foram decisivos para a formação de tal convicção, excepto quando a lei exija formalidades especiais para a prova dos factos controvertidos, caso em que tal prova não pode ser dispensada.
É, pois, pela fundamentação invocada para a decisão que normalmente se afere a correcção do juízo crítico sobre as provas produzidas.
Assim, assentando a decisão da matéria de facto na convicção criada no espírito do juiz e baseada na livre apreciação das provas testemunhal e documental que lhe foram apresentadas, a sindicância de tal decisão não pode deixar de respeitar a liberdade da 1ª instância na respectiva apreciação.
Como se aponta no acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 05/05/11 (processo 334/07.3 TBASL.E1), “O erro na apreciação das provas consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios e leis científicas, nomeadamente, das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório e evidente), seja também quando a valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas, note-se, excluindo este.
Não basta, pois, que as provas permitam dentro da liberdade de apreciação das mesmas, uma conclusão diferente, a decisão diversa a que aludem os artºs 690-A nº 1 al. b) e 712º nº 1 al. a) e b), terá que ser única ou, no mínimo, com elevada probabilidade e não apenas uma das possíveis dentro da liberdade de julgamento.”
Assim, posta em causa a matéria de facto controvertida, a 2ª instância pode alterá-la, desde que os elementos de prova produzidos e indicados pelo Recorrente como mal ou incorrectamente apreciados, imponham forçosamente, isto é, num juízo de certeza, outra decisão.
Conforme ensina António Santos Abrantes Geraldes[ In Recursos no Novo CPC, 2ª edição, página 133-135.]: «Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos e facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.
Quando a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados por escrito [documentos ou confissões reduzidas a escrito, depoimentos antecipados] e, por fim, os que foram oralmente produzidos perante o tribunal ou por carta e que ficaram gravados em sistema áudio ou vídeo.
Relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;(…)
Exigências que, segundo o autor citado, “devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, próprio de um instrumento processual que visa pôr em causa o julgamento da matéria de facto efectuado por outro tribunal em circunstâncias que não podem ser inteiramente reproduzidas na 2ª instância”.
No caso concreto, ainda que a Recorrente tenha procedido processualmente em conformidade com o que lhe é imposto, lido os parágrafos cujo aditamento à matéria de facto pretende (cfr. conclusão m)), resulta manifesto que o ali vertido não só não assume, para os efeitos pretendidos, qualquer relevância no sentido da tese propugnada pela impetrante, como nada de útil e cabal dele se retira para a decisão a proferir, atento o teor da sentença a quo, como ao deante melhor se precisará.
In casu, a modificação quanto à valoração da prova, tal como foi captada e apreendida pela 1ª instância, só se justificaria se, feita a reapreciação por este tribunal, fosse evidente a grosseira análise e valoração que foi efectuada na instância recorrida, o que efectivamente não sucede no caso vertente.
Face ao exposto improcede o alegado erro de julgamento de facto ora apreciado.
Estabilizada a factualidade pertinente, importa, agora, apreciar da bondade da subsunção dos factos ao direito efectuada pelo tribunal a quo.
Atento o enunciado como questão a apreciar e dirimir, importa saber se pode considerar-se que a sociedade, ora Recorrente, foi notificada da liquidação de IMT que ora impugna, o que impõe indagar se e em que circunstâncias pode considerar-se efectuada a notificação quando a carta remetida ao contribuinte, para esse efeito, vem devolvida.
Ora, somente dilucidada esta questão poderemos aferir se o Mmº Juiz do Tribunal a quo fez errado julgamento ao considerar caducado o direito de impugnar aquele acto de liquidação, decisão que tem como pressuposto que a ora Recorrente foi notificada das liquidações, sabido que é que o prazo de 90 dias para deduzir impugnação judicial se conta, em regra, do termo do prazo para o pagamento voluntário.
Dispõe o art. 102.ºdo CPPT que :«1. A impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes: a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte; e que este, por sua vez é de 30 dias após a notificação para o efeito [cfr. art. 85.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT), salvo se se encontrar regulado expressamente pelas leis tributárias, o que ocorre no caso vertente, conforme regime plasmado no nº1 do artigo 38 do CIMT, que determina que “1-Se o imposto não for pago antes do ato ou fato translativo , ou a sua liquidação não for pedida , devendo-o ser , dentro dos prazos fixados para pagamento no artigo 36º , o chefe de finanças promove a sua liquidação oficiosa e notifica o sujeito passivo para pagar no prazo de 30 dias , sem prejuízo dos juros compensatórios e da sanção que ao caso couber. de pagamento voluntário dos tributos são regulados nas leis tributárias.(…)”.
Antes do mais, afigura-se-nos relevante para a decisão a proferir fazer uma breve incursão no regime legal respeitante ao domicílio fiscal dos contribuintes.
Como decorre do disposto no art. 19.º, n.º 1 da LGT, os sujeitos passivos, tais como os define o n.º 3 do art. 18.º do mesmo normativo, têm um domicílio fiscal que, para as pessoas colectivas, e na ausência de disposição em contrário, é «o local da sede ou direcção efectiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal» [alínea b)].
Assim, para a obtenção do número de identificação fiscal (Que foi instituído pelo Decreto-Lei n.º 463/79, de 30 de Novembro, em ordem a «dotar a administração fiscal de um meio indispensável à consecução de qualquer política fiscal que passe pelo combate frontal à evasão fiscal» e a possibilitar «uma rápida e correcta identificação do contribuinte, um controle eficaz do cumprimento dos respectivos deveres tributários, uma maior eficiência administrativa permissiva de um mais fácil e melhor contacto com aquele», tudo como consta do respectivo preâmbulo.), uma das obrigações fixadas pelo Decreto-Lei n.º 463/79, de 30 de Novembro (Alterado pelos Decreto-Lei n.º 266/91, de 6 de Agosto, Decreto-Lei n.º 19/97, de 21 de Janeiro, e Decreto-Lei 81/2003, de 23 de Abril. Regulamentado pelas Portarias n.º 386/98, de 3 de Julho, n.º 271/99, de 13 de Abril, n.º 862/99, de 8 de Outubro, n.º 377/2003, de 10 de Maio e n.º 594/2003, de 21 de Julho.), é a indicação do domicílio fiscal, devendo qualquer alteração do mesmo (art. 3.º, n.º 1) ser comunicada dentro do prazo de trinta dias (art. 8.º, n.º 2).
A LGT, diploma de enquadramento de todo o direito tributário, não define domicílio fiscal, mas no referido art. 19.º estipula a obrigatoriedade da comunicação do domicílio fiscal do sujeito passivo à administração tributária e a ineficácia, para efeitos fiscais, da mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração [n.ºs 3 e 4 (Na redacção dada àquele preceito pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2012). Antes, correspondiam-lhe os n.ºs 2 e 3 do mesmo artigo.), respectivamente].
Ou seja, ainda que o sujeito passivo tenha mudado de domicílio fiscal, enquanto essa mudança não for comunicada à administração tributária, esta pode continuar a considerar como domicílio do sujeito passivo, para efeitos fiscais, o domicílio que aquele abandonou; isto, sem prejuízo de, oficiosamente e desde que disponha de elementos que lhe permitam concluir ser outro o domicilio fiscal do sujeito passivo, proceder à rectificação, de acordo com a possibilidade que lhe concede o n.º 8 (Na redacção dada àquele preceito pela referida Lei n.º 64-B/2011. Antes, correspondia-lhe o n.º 6 do mesmo artigo.) do mesmo art. 19.º da LGT (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 5 ao art. 19.º, pág. 199.).
A obrigação de comunicar o domicílio fiscal e suas alterações resulta também do n.º 1 do art. 43.º do CPPT, que fixa em 15 dias o prazo para comunicar alteração ao domicílio ou sede.
No n.º 2 do mesmo artigo, em sintonia com o n.º 3 do art. 19.º da LGT, prevê-se que a falta de recebimento de «qualquer aviso ou comunicação» expedidos de acordo com os termos da lei, se devida ao não cumprimento da obrigação de comunicar a alteração do domicílio, «não é oponível à administração tributária, sem prejuízo do que a lei dispõe quanto à obrigatoriedade da citação e da notificação e dos termos em que devem ser efectuadas».
Quanto a esta ressalva que a lei consagra no art. 43.º, n.º 2, in fine, JORGE LOPES DE SOUSA salienta que «[e]sta norma, porém, tem de ser confrontada com a exigência constitucional de notificação aos administrados de todos os actos administrativos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, feita no n.º 3 do art. 268.º da CRP e com o direito de impugnação contenciosa de tais actos, assegurado pelo n.º 4 do mesmo artigo, cuja concretização prática pode depender da existência de uma comunicação ao interessado da prática do acto.
Este preceito constitucional é compatível com presunções de notificações ilidíveis mediante prova em contrário, mas parece não o ser com presunções inilidíveis com dispensa de notificações, isto é, não permite que se considere feita uma notificação quando, comprovadamente, ela não foi efectuada e a não efectivação não é imputável ao notificando.
Assim, tratando-se de actos que afectem a esfera patrimonial dos contribuintes, não poderá considerar-se efectuada uma notificação quando se demonstre que ela não foi efectivamente efectuada, como sucede nos casos em que a carta enviada para notificação seja devolvida.
Estas exigências constitucionais ficarão satisfeitas se este n.º 2 for interpretado em consonância com o preceituado no n.º 5 do art. 39.º do CPPT» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume I, anotação 3 ao art. 43.º, pág. 408.).
Para aferir da bondade da decisão a quo e considerando a respectiva fundamentação, haverá que conjugar as regras relativas à obrigação de participação do domicílio com as regras legais que disciplinam a perfeição das notificações.
No que tange à apreciação da validade das notificações efectuadas à Recorrente em ordem a comunicar-lhe a liquidação adicional de IMT que teve a sua origem numa acção inspectiva e que é objecto de impugnação judicial nos presentes autos , importa que nos debrucemos sobre a presunção legal vertida no nº5 do art. 39º do CPPT
Nos termos do n.º 6 do art. 77.º da LGT e do n.º 1 do art. 36.º do CPPT, os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados, ou seja, a sua eficácia depende da notificação.
In casu, a Recorrente sustenta que não pode considerar-se validamente notificada porquanto as cartas que lhe foram remetidas pela AT com vista a notificá-la da liquidação adicional de IMT foram devolvidas ao remetente (lembre-se, AT), com a menção “endereço insuficiente”, pelo que atenta a notação aposta pelos serviços postais na correspondência, e a data em que foi emitida a certidão pela Recorrente dos elementos relativos à liquidação e respectiva notificação, era imperioso que o Tribunal a quo, considerasse que a Impugnação foi apresentada em tempo, em conformidade com o preceituado no nº1, alínea f ) do artigo 102º do CPPT, que dispõe:” 1- a impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes: (…) f) Conhecimento dos atos lesivos dos interesses legalmente protegidos não abrangidos nas alíneas anteriores. (…)”.
Vejamos se assiste razão à Recorrente.
Desde logo importa notar que não se discute que a AT utilizou a forma legalmente prescrita – carta registada com aviso de recepção – para notificar a liquidação em apreço à Contribuinte.
O cerne do dissídio que cumpre dirimir é saber se essas notificações ( a primeira e a segunda ) podem ou não considerar-se validamente efectuadas, atenta a devolução das cartas que foram remetidas à Recorrente para o efeito, e o teor das notações que foram apostas nos respectivos sobrescritos pelo funcionário postal ( lembre-se, “endereço insuficiente “).
Desde logo, urge ter presente o disposto no art. 39.º, n.º 5, do CPPT, e que determina: «Em caso de o aviso de recepção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de recepção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal».
Ou seja, em face da devolução da carta para notificação e se não se comprovar que entretanto foi comunicada a alteração do domicílio fiscal, deve a AT enviar nova carta, dentro do prazo da 15 dias, e, ainda que esta última seja devolvida, presume-se feita a notificação, a menos que o notificando prove o justo impedimento ou a impossibilidade de comunicar a alteração do domicílio no prazo legal.
Todavia, para que funcione a presunção da recepção da segunda carta, exige-se, sob pena de incompatibilidade com o direito constitucional, que (fora dos casos de recusa de recepção da carta pelo destinatário e de que por ora não cumpre cuidar), (i) tenha sido deixado um aviso no domicílio fiscal do destinatário de que a carta com a notificação podia ser levantada e que (ii) não se comprove que, entretanto, o contribuinte comunicara à AT a alteração da sua residência (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume I, anotação 8 ao art. 39.º, págs. 386 e 387.).
“Fazendo uso do quadro sinóptico elaborado por JORGE LOPES DE SOUSA, diremos que a presunção da notificação deixa de valer, designadamente, quando se demonstrar «que não foi deixado aviso para levantamento da carta» e, correlativamente, que a presunção só valerá «quando tiver sido deixado aviso e não houver qualquer justo impedimento ao levantamento da carta» (Idem.).
Citando o mesmo Autor, diremos, em conclusão, que «Ficarão, assim, como situações em que opera a presunção, considerando-se feita a notificação apesar de se comprovar que o destinatário não recebeu a carta, os casos em que, não havendo qualquer justo impedimento ao seu levantamento, o contribuinte não tenha alterado a sua residência ou a tenha alterado há mais de 20 dias, mas não tenha comunicado à administração tributária a alteração e não tenha estado impossibilitado de a comunicar.
Porém, é de notar que, nestas situações em que se comprovar que o destinatário efectivamente não recebeu as cartas (por terem sido devolvidas), o essencial para considerar feita a notificação, sem ofensa do direito constitucional à notificação dos actos lesivos, é que não haja um «justo impedimento», entendido como uma razão aceitável para que o destinatário não tivesse diligenciado no sentido de receber alguma das cartas cujo aviso de envio foi deixado na sua caixa de correio» (sublinhado nosso).” (cfr Acórdão do STA de 16. 01.2013, lavrado in Rec 0141/11)
Volvendo ao caso sub judice e tendo presente o que vimos de dizer, logo verificamos que a factualidade apurada obsta ao funcionamento da presunção de notificação, porquanto a única menção aposta pelo funcionário postal em ambas as cartas (lembre-se, “endereço insuficiente”) aponta no sentido de se saber que não foi deixado no domicílio fiscal da ora Recorrente o aviso postal para o seu levantamento, na estação dos correios.
De facto, se o funcionário dos serviços postais não logrou identificar o endereço postal da notificanda, obviamente, nele não deixou qualquer aviso para levantamento das cartas, o que se apresenta verosímil, uma vez que a morada fiscal daquela, constante quer dos registos da AT, quer da certidão da Conservatória do Registo Comercial e indicada na própria petição inicial, é sempre a mesma, ou seja, “A....., 5160-259 Torre de Moncorvo”, não tendo qualquer “número de polícia” passível de facilitar a identificação do imóvel, onde se situa a sede da Recorrente.
Não podemos deixar de notar que a própria AT, em sede inspectiva, ou seja em momento anterior, apenas logrou notificar a Impugnante do teor do Relatório Inspectivo que está na génese da liquidação de IMT impugnada, mediante contacto pessoal e na pessoa de um seu gerente, cujo domicilio fiscal se situa noutro local/Lugar (quiçá para obviar a dificuldade na notificação via postal), esforço que não fez mesmo perante a notação feita pelo funcionário dos serviços postais.
Assim, no que respeita à notificação da liquidação, não pode fazer-se funcionar a presunção de notificação (Neste sentido, vide o acórdão de 8 de Julho de 2009 proferido no processo com o n.º 460/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Novembro de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32230.pdf), págs. 1169 a 1172, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/aca1e2e17080a15a802575f5003ef985?OpenDocument.).
Comprovada, assim, a devolução da carta com a notificação da liquidação e não podendo operar a presunção do n.º 5 do art. 39.º do CPPT, somos conduzidos, inexoravelmente, à conclusão de que a sentença recorrida errou ao julgar caducado o direito de impugnar judicialmente a liquidação em causa.
Na verdade, não se demonstrando, ainda que por presunção, a notificação, também não pode considerar-se precludido o direito de impugnar o acto notificando, pois, nos termos já referidos, o início do prazo para o exercício desse direito exigiria a notificação válida daquele acto.
Destarte, a sentença recorrida, que decidiu em sentido contrário, não pode manter-se na ordem jurídica, pelo que o recurso logra provimento, quedando prejudicadas as demais questões suscitadas.
***
DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, ordenar a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, a fim de que ali, se a tal nada mais obstar, prossigam os seus demais termos.
Custas pela Recorrida ( uma vez que contra alegou).
Porto, 6 de Junho de 2019
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Celeste Oliveira
Ass. Maria Cardoso