Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00450/07.1BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/15/2015
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Vital Lopes
Descritores:FACTURAS FALSAS
ÓNUS DE PROVA
Sumário:1. No caso de facturas falsas, compete à AT fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação correctiva e, caso o faça, passa a recair sobre o contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do custo correspondente;
2. A AT cumpre o ónus que lhe compete se recolher elementos factuais que pela sua objectividade, solidez e consistência consubstanciem claros e convincentes indícios de que as facturas desconsideradas para efeitos de dedutibilidade em sede imposto de rendimento não titulam reais e efectivas operações.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Construções..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO
Construções ..., Lda., recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida das liquidações adicionais de IRC de 2002 e respectivos Juros Compensatórios, no montante global de 68.514,23€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo (cf. fls.211).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:

I - A Factualidade dada por assente, o teor dos documentos, a prova testemunhal, impunham uma decisão diferente, designadamente a procedência da acção de impugnação.
II - Para negar provimento ao pedido da Recorrente o Meritíssimo Juiz a quo estribou-se no incumprimento fiscal da entidade que manteve relações comerciais no período em causa, incumprimento esse, que a Recorrente alegou e provou desconhecer.
III - Assentou, também a sua decisão no acordo simulatório entre Recorrente a empresa subcontratada, considerando as facturas em causa como falsas, sem que resultassem provados pela A.F. os requisitos essenciais estipulados no artigo 240º do Código Civil.
IV - Não basta afirmar, como se diz no relatório fundamentador, que houve utilização abusiva de facturas e que o negócio foi simulado, desde logo, porque a expressão “negócio simulado” é uma conclusão, a extrair de factos alegados pela A.F., não alega, nem prova, tudo porque não é imputada à Impugnante/Recorrente no quadro de um acordo simulatório com o propósito de defraudar os interesses da A.F., dos factos concretos que permitam concluir pelo acordo simulatório.
V - A A.F. limitou-se a levantar suspeições, portanto, no caso em apreço não só não está demonstrada qualquer utilização abusiva das facturas, ou factos que integram a noção de “negócio simulado”, como está provado, nomeadamente pela prova testemunhal que “ Foram vários os trabalhadores da V... que prestaram serviço sob as ordens e direcção da referidas empresa à ora impugnante em diversas obras do país”,” A V... foi subcontratada pela ora Impugnante, para efectuar trabalhos em várias obras que lhe haviam sido adjudicadas”, Foram várias as obras onde a V... prestou serviço à impugnante, nomeadamente, em Vila Nova de Gaia, Figueira da Foz”, Por outro lado, a relação empresarial baseava-se à data, essencialmente, na confiança e os contratos não eram formalizados” tudo conforme fls. 11 da sentença recorrida.
VI - A decisão a quo decide, também, com base em fundamento errado, de que não foram prestados serviços pela empresa V..., no ano de 2002, no Algarve, tendo a Recorrente feito prova, quer documental com a factura n.°249, constante dos registos contabilísticos, quer pela prova testemunhal, de tal prestação de serviços, no ano de 2002, que o Meritíssimo quis inviabilizar, dizendo que não constava prova documental dos autos da prestação de serviços nesse ano, e que tais declarações a dizer que tinham das testemunhas da Impugnante, não poderiam ser tidas em conta, pois só existiam facturas relativas ao ano de 2001 de serviços prestados no Algarve.
VII - A decisão da qual ora se recorre assento, a sua motivação noutro facto que é incorrecto e irreal, ou seja, refere que no ano de 2002 o valor facturado pela V... é superior ao valor facturado pela Impugnante aos seus clientes, que conforme supra se demonstrou no quadro demonstrativo não corresponde à realidade.
VIII - Inexiste qualquer tipo de fundamento para a decisão tomada, que está inquinada de ilegalidade, pois, resulta claramente da douta sentença recorrido que toda a sua fundamentação assenta em pressupostos errados, preferindo o Meritíssimo Juiz a quo dar credibilidade à A.F., que nada provou, tendo apenas e tão só, esgrimido o argumento baseado em meras suposições e suspeições imputando à Impugnante uma ligação a entidades terceiras que efectivamente não conseguiu demonstrar, não alegando um único facto capaz de demonstrar a ligação da impugnante à entidade com se relacionou.
IX - Daí que se conclua que, as razões apontadas pela A.F. se baseiam em raciocínios exclusivamente subjectivos, e não provados, em face de factos concretos, tendo apenas em vista uma tributação adicional, seja a que custo for, posição que o Meritíssimo Juiz seguiu em violação do princípio da verdade material, previsto no artigo 57° da LGT.
X - Não podia o Tribunal ter deixado de concluir pela insuficiência probatória da acção inspectiva e pela incapacidade de, com os elementos emergentes do relatório, sustentar as liquidações impugnadas.
XI - Por grosseira violação do ónus probandi que incide sobre a A.F., nos termos do artigo 74° da LGT,
XII - Em face de toda a prova produzida, é de concluir que a liquidação impugnada está ferida de ilegalidade quanto aos pressupostos, o que se reflecte na quantificação da matéria colectável.
XIII - Constituindo a errónea quantificação da matéria colectável um vício do acto tributário que legitima a anulação, nos termos do artigo 99.° do CPPT, a par do vício de fundamentação, violação do principio da verdade material, e inexistência dos elementos integradores do acordo simulatório.
Nestes Termos,
Deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência deve a sentença ora recorrida ser declarada nula, com as demais consequências legais; pois só assim,
V. Exas farão a habitual Justiça».


A Recorrida não apresentou contra-alegações.

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal emitiu mui douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se na ordem jurídica a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente (artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC), a questão que importa decidir reconduz-se a saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que as facturas emitidas à impugnante pela sociedade V.... no ano em causa de 2002 não correspondem a serviços efectuados.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:
«

A. Pela ordem de serviço n.º OI200501597 foi determinada a realização de procedimento de inspecção à impugnante, com incidência em IVA e IRC para os anos de 2001 e 2002 (fls. 19 e 20 do apenso da reclamação). - - -

B. A impugnante está enquadrada no regime de periodicidade trimestral do IVA, pela actividade de construção de edifícios e em IRC no regime geral, pelo Serviço de Finanças do Marco de Canavezes (fls. 20 do apenso). - - -

C. A acção inspectiva à impugnante teve origem no facto da impugnante ter declarado em 2001 e 2002, no anexo P, aquisições à firma “V... – Construções, Ld.ª” (doravante V...), nos montantes de, respectivamente, 151.897,090 € e 191.606,00 €, tendo sido proposta a acção inspectiva com o intuito de confirmar a veracidade das facturas em causa (fls. 19 do apenso). - - -

D. A impugnante apenas possui os registos auxiliares da contabilidade informatizada, não estando elaborados de forma a permitir o apuramento de resultados por obras (fls. 21 do apenso). - - -

E. No exercício de 2001 e 2002, a impugnante tem registada na sua contabilidade as seguintes facturas da V..., sendo os valores de 2001 em escudos, mas aqui convertidos em euro (fls. 22 do apenso): - - -
Factura
Data
Valor sem IVA
IVA
Total
68
23/1/2001
19.951,92 €
3.391,83 €
23.343,74 €
87
25/3/2001
23.443,50 €
3.985,40 €
27.428,90 €
1.º Trimestre de 2001
43.395,45 €
7.377,23 €
50.772,64 €
109
25/5/2001
30.426,67 €
5.172,53 €
35.599,21 €
120
29/6/2001
26.825,35 €
4.560,31 €
31.385,66 €
2.º Trimestre de 2001
57.252,02 €
9.732,84 €
66.984,87 €
130
29/7/2001
29.179,68 €
4.960,55 €
34.140,22€
3.º Trimestre de 2001
29.179,68 €
4.960,55 €
34.140,22 €
Total
129.827,12 €
22.070,62 €
151.897,73 €
177
28/2/2002
30.643,89 €
5.209,46 €
35.853,35 €
178
29/2/2002
19.852,00 €
3.374,84 €
23.226,84 €
185
27/3/2002
13.986,14 €
2.377,64 €
16.363,78 €
186
27/3/2003
10.581,66 €
1.798,88 €
12.380,54 €
1.º Trimestre de 2002
75.063,69 €
12.760,82 €
87.824,52 €
249
31/10/2002
34.308,00 €
6.518,52 €
40.826,52 €
250
25/11/2002
25.250,00 €
4.797,50 €
30.047,50 €
251
25/11/2002
27.653,24 €
5.254,12 €
32.907,36 €
4.º Trimestre de 2002
87.211,24 €
16.570,14 €
103.781,38 €
Total
162.274,93 €
29.330,96 €
191.605,89 €
F. No registo contabilístico da impugnante foram registadas as seguintes contas (fls. 22 o apenso): - - -
Contas
Factura n.º
Data cont.
6212
243232
221017
68
31/1/2001
19.951,92 €
3.391,83 €
23.343,74 €
87
31/3/2001
23.443,50 €
3.985,40 €
27.428,90 €
109
31/5/2001
30.426,67 €
5.172,53 €
35.599,21 €
120
30/6/2001
26.825,35 €
4.560,31 €
31.385,66 €
130
31/7/2001
29.179,68 €
4.960,55 €
34.140,22€
129.827,12 €
22.070,62 €
151.897,73 €
177
31/3/2002
30.643,89 €
5.209,46 €
35.853,35 €
178
31/3/2002
19.852,00 €
3.374,84 €
23.226,84 €
185
31/3/2002
13.986,14 €
2.377,64 €
16.363,78 €
186
31/3/2002
10.581,66 €
1.798,88 €
12.380,54 €
249
30/10/2002
34.308,00 €
6.518,52 €
40.826,52 €
250
30/11/2002
25.250,00 €
4.797,50 €
30.047,50 €
251
30/11/2002
27.653,24 €
5.254,12 €
32.907,36 €
162.274,93 €
29.330,96 €
191.605,89 €
G. Há conformidade dos valores registados e declarados para efeitos de IVA e IRC (fls. 21 do apenso). - - -

H. Na conta 6212, subcontratos com IVA dedutível, foi registado a débito o total de 129.827,12 € em 2001 e 162.274,93 € em 2002 (fls. 23 do apenso). - - -

I. Na conta 243232, IVA dedutível OBS, foi registado a débito pelo total de 22.070,62 em 2001 e 29.330,96 € em 2002 (fls. 23 do apenso). - - -

J. Na conta 221017, fornecedor V..., foi registado a crédito pelo total de 151.897,73 € em 2001 e 191.605,89 € em 2002 e debitada por crédito de caixa, pelos valores das facturas, nos respectivos anos, excepto o valor relativo à factura n.º 120 (fls. 23 do apenso). - - -

K. As referidas facturas foram contabilizadas como custo dos exercícios de 2001 e 2002, influenciando o resultado apurado em IRC e tendo sido deduzido o IVA nas declarações periódicas dos 1.º, 2.º e 3.º trimestres de 2001 e 1.º e 4.º trimestres de 2002, enviadas para os serviços do IVA, diminuindo o imposto a entregar nos cofres do Estado (fls. 23 do apenso). - - -

L. Os documentos de suporte ao registo dos recebimentos são os recibos, registados por caixa, nos respectivos anos das facturas, excepto o valor da factura n.º 120, 31.385,66 €, que transitou em saldo, tendo sido registado o seu pagamento por caixa em 31/1/2004, tendo como suporte o documento interno um (fls. 23 do apenso). - - -

M. A impugnante tinha como prática contabilizar todos os pagamentos e recebimentos por contrapartida de caixa (fls. 23 do apenso). - - -

N. O sócio gerente explicou que esta prática resultava dos pagamentos serem efectuados em cheque, dinheiro e letras (fls. 23 do apenso). - - -

O. A impugnante apresentou como meios de pagamento fotocópias de quatro letras, em que a V... figura como sacador e a impugnante como aceitante, no valor global de 38.000,00 € e fotocópia da frente de dezasseis cheques no valor de 61.304,00 € (fls. 23 a 25 do apenso). - -

P. Dos cheques enviados, três tinham como data 3/7/2002, 18/9/2002 e 6/12/2002, no valor de 1.000,00 €, os dois primeiros, e 5.685,00 €, o último e estavam emitidos à ordem da V... (fls. 23 do apenso). - - -

Q. Os restantes tinham diversas datas do ano de 2003, estando onze deles emitidos à ordem da V... e dois, cheques n.ºs 3562199748 e 4462199739, à ordem de S…, ambos datados de 11/9/2003, no valor de 15.000,00 € e 400,00 €, por quem foram levantados ao balcão em 12/9/2003 (fls. 24 do apenso). - - -

R. Com excepção destes dois últimos cheques, os restantes cheques estão truncados no BCP que até à data da conclusão do relatório da inspecção tributária não tinha enviado cópia dos respectivos versos, apesar da autorização da impugnante e da solicitação dos serviços de inspecção tributária (fls. 24 do apenso). - - -

S. A administração tributária concluiu que não se encontrava comprovado o pagamento das referidas facturas, por não ser credível que o pagamento dos maiores montantes, tenha sido efectuado em dinheiro e tenham sido emitidos cheques de reduzido montante, cujo valor totaliza 45.904,00 €, valor aproximado do IVA liquidado nas facturas que se encontram contabilizadas como pagas em 2001 e 2002, de 46.841,27 € (fls. 25 do apenso). - - -

T. Os cheques n.ºs 3562199748 e 4462199739 foram emitidos à ordem de S... e não da V... (fls. 25 do apenso). - - -

U. S... é sócio gerente da V..., que também é sócio gerente das Construções Chadinha, em nome da qual foram emitidas facturas registadas na impugnante no ano de 2003 (fls. 25 do apenso). - - -

V. Nas letras no valor de 5.000,00 €, 15.000,00 €, 8.000,00 € e 10.000,00 €, não consta o motivo do seu pagamento, nem forma assumidas nos registos contabilísticos, nem é possuidora do Livro de Letras a Pagar, não se encontrando demonstrado que as mesmas de destinaram a pagar as facturas em causa (fls. 25 do apenso). - - -

W. Em todas as facturas analisadas da V... registadas na impugnante, não consta a discriminação do tipo de serviço específico, nem a sua quantificação, sendo referido serviços de uma forma genérica, sem quantificação (fls. 25 do apenso e confissão da impugnante no artigo 22.º da petição inicial). - - -

X. Os documentos entregues pela impugnante como se tratando de autos de medição da V..., são folhas emitidas pela impugnante, designadas autos de medição, de cuja descrição consta cedência de pessoal, não constando a identificação do pessoal, nem fazendo qualquer referência à V... (fls. 26 do apenso). - - -

Y. O gerente da impugnante declarou que o gerente da V... tinha sido seu funcionário e começou a trabalhar por conta própria tendo-lhe prestado serviços de forma contínua desde 2001, primeiro com a firma V... e depois com as Construções Chadinha, tendo trabalhado em diversas obras no Algarve, Lisboa e Porto, não tendo sido efectuados orçamentos nem contratos por escrito, tendo sido tudo acordado verbalmente. O trabalho era prestado à hora ou ao metro, sendo o trabalho à hora controlado pela empresa que contratava a impugnante e o trabalho a metro era controlado pelos gerentes da impugnante e da V.... Não sabe o número de trabalhadores afecto a cada obra. Os autos de medição entregues à administração tributária não estavam assinados porque o gerente da V... recusou-se a assiná-los. O preço dos serviços prestados pela emitente eram variáveis e a impugnante não tinha nenhuma margem de lucro sobre o preço pago à pela V.... O preço era pago em dinheiro, cheque e letras. Relativamente aos anos de 2001 e 2002, a impugnante não fez contratos com os seus clientes, os serviços a prestar eram contratados verbalmente. Não sabe onde se encontra a factura n.º 217, de 2002, mas tem a certeza que foi anulada (fls. 26 a 28 do apenso). - - -

Z. A impugnante não forneceu aos serviços de inspecção tributária a identificação completa dos trabalhadores da V... (fls. 27 do apenso). - - -

AA. Nem todas as facturas de serviços prestados emitidas, identificam a obra em causa, da análise efectuada pelos serviços de inspecção tributária às facturas dos anos de 2001 e 2002, apurou-se a existência de obras com carácter plurianual, como a obra de Calendário, a que se reportam as facturas n.º 137, de 19/9/2001, e n.º 226, de 18/10/2002, não estando a contabilidade organizada por forma a determinar os resultados por obra (fls. 28 do apenso). - - -

BB. A administração tributária para avaliar a relação do valor facturado aos clientes e o custo com a mão-de-obra contabilizada (subcontratos + custos com pessoal) procedeu à elaboração de mapas comparativos para os anos de 2001 e 2002 dos quais concluiu (fls. 28, 29 e 37 a 40 do apenso): - - -

BB.1) Relativamente aos valores facturados, quando comparados com o custo de mão de obra contabilizada (custos com pessoal + subcontratos), constata-se que no ano de 2001, nos meses em que se encontram contabilizados os subcontratos em causa, o custo de mão da obra é superior aos valores facturados aos clientes; - - -

BB.2) No ano de 2002, verifica-se a mesma situação, excepto nos meses de Abril e Maio, mas nesses meses os subcontratos não dizem respeito às facturas da V...; - - -

BB.3) Relativamente à comparação por obras, dos serviços prestados facturados com os subcontratos contabilizados das facturas da V..., constata-se que o valor dos subcontratos imputados pela empresa às obras de Buarcos e Complexo Multiusos da Arrábida, são de valor superior aos valores facturados, para os respectivos clientes, resultando margens negativas elevadas, e sem ter em conta o custo de mão de obra própria; - - -

BB.4) Donde se conclui que nos serviços prestados facturados, não se encontram reflectidos, os custos contabilizados com os subcontratos relativos às facturas em causa, o que se confirma pelo rácio de pessoal (volume de negócios / custos com pessoal), que nos anos de 2001 e 2002 atingiram o valor de, respectivamente, 2,01 e 2,44, valores inferiores ao menor rácio (mediana do sector da unidade orgânica), que atingiram, respectivamente o valor de 2,96 e 2,63: - - -
2001
2002
Custos com pessoal
200.192,49 €
223.781,48 €
Volume de negócios
403.669,38 €
547.992,53 €
Rácio da empresa
2,01
2,44
Rácio da mediana do sector
2,96
2,93
CC. A V... não entregou as declarações de IVA e IRC dos anos de 2001 e 2002, nem cumpriu a notificação para exibição dos registos contabilísticos e documentos (fls. 29 do apenso). - - -

DD. Os documentos da V... a que os serviços de inspecção tributária tiveram acesso foram entregues por J..., que constava das folhas da Segurança Social como funcionário da V... e a quem o gerente da V..., S..., imputa a responsabilidade dos registo contabilísticos, do preenchimento do valor das facturas e da sua entrega aos clientes (fls. 30 do apenso). - - -

EE. O gerente da V..., S..., em 17/9/2004 confrontado com os valores constantes dos anexos P, admitiu ter prestado serviços para a impugnante, mas não pelos valores constantes dos anexos, solicitando o confronto com os autos de medição e meios de pagamento (fls. 30 do apenso). - - -

FF. Em 15/2/2005, o gerente da V..., S..., declarou que não prestou serviços para a impugnante (fls. 30 do apenso). - - -

GG. Os serviços de inspecção tributária concluíram que estes factos constituem fundamento de que as facturas contabilizadas pela impugnante, em que constam como emitente a V..., titulam operações que não consubstanciam serviços efectivamente prestados pela emitente (fls. 30 do apenso). - - -

HH. Por esse motivo, foi promovida a correcção dos valores declarados em sede de IRC, pela não aceitação do custo declarado inerente à contabilização dos documentos, e IVA, pela consideração do imposto como indevidamente deduzido (fls. 30 do apenso). - - -

II. No ano de 2001 foi efectuada uma correcção em IRC no valor de 129.827,12 €, atingindo o lucro tributável o valor de 108.274,96 € (fls. 31 do apenso). - - -

JJ. No ano de 2002 foi efectuada uma correcção em IRC no valor de 162.274,93 €, atingindo o lucro tributável o valor de 217.472,87 € (fls. 32 do apenso). - - -

KK. Os valores de IVA deduzidos indevidamente por não conferirem o direito à dedução, foram registados a débito da conta 243232 – IVA dedutível OBS, totalizando os montantes de 22.070,62 €, em 2001, e 29.330,96 €, em 2002, assim discriminados (fls. 32 e 33 do apenso): - - -
Período
Valores em Euro
IVA deduzido indevidamente
1.º Trimestre de 2001
7.377,23 €
2.º Trimestre de 2001
9.732,84 €
3.º Trimestre de 2001
4.960,55 €
Total de 2001
22.070,62 €
1.º Trimestre de 2002
12.760,82 €
4.º Trimestre de 2002
16.570,14 €
Total de 2002
29.330,96 €
LL. A impugnante foi notificada do projecto de relatório e exerceu o direito de audição alegando que não concorda com o projecto de conclusões do relatório e que a empresa V... prestou-lhe serviços nos exercícios de 2001 e 2002 (fls. 35 do apenso). - - -

MM. Não tendo sido solicitados novos elementos no direito de audição procedeu-se à elaboração do relatório definitivo de acordo com o projecto de correcções (fls. 35 do apenso). - - -

NN. Em 23/6/2006 a impugnante foi notificada da demonstração de compensação da liquidação adicional de IRC de 2001 e juros compensatórios, n.º 2006 148289, no valor de 35.575,41 €, com data limite de pagamento em 17/7/2006 (fls. 42 a 46 do apenso). - - -

OO. Em 27/6/2006 a impugnante foi notificada da demonstração de compensação da liquidação adicional de IRC de 2002 e juros compensatórios, n.º 2006 742373, no valor de 68.514,23 €, com data limite de pagamento em 26/7/2006 (fls. 47 a 49 do apenso). - - -

PP. Em 31/7/2006 apresentou reclamação graciosa das liquidações de IRC de 2001 e 2002 (fls. 2 do apenso). - - -

QQ. Por decisão de 25/6/2007, notificada em 29/6/2007, a reclamação graciosa foi parcialmente deferida, tendo sido anulada a liquidação adicional de IRC de 2001 por caducidade do direito à liquidação, mantendo-se a liquidação de IRC de 2002 (fls. 49 a 77 do apenso). - - -

RR. Em 13/7/2007 a impugnante apresentou a impugnação judicial (fls. 2 e 56). - - -

SS. A V... tinha trabalhadores ao seu serviço nos anos de 2001 e 2002 (testemunhas da impugnante). - - -

TT. Foram vários os trabalhadores da V... que prestaram serviço sob as ordens e direcção da referida empresa à ora impugnante em diversas obras do país (testemunhas da impugnante). - - -

UU. A V... foi subcontratada pela ora impugnante, para efectuar trabalhos em várias obras que lhe haviam sido adjudicadas e para as quais necessitava de mão-de-obra (testemunhas da impugnante). - - -

VV. Foram várias as obras onde a V... prestou, serviço à impugnante, nomeadamente, em Vila Nova de Gaia e na Figueira da Foz (testemunhas da impugnante). - - -

WW. Por outro lado, a relação empresarial entre as empresas em questão, baseava-se, à data, essencialmente, na confiança e os contratos não eram formalizados, ou seja, não eram reduzidos a escrito (testemunhas da impugnante). - - -

XX. A impugnante emitiu vários cheques à ordem da V... (fls. 24 do apenso da reclamação graciosa). - - - ».

E mais se deixou consignado na sentença:

«Com relevância para a decisão da causa, o tribunal julga não provado: - - -

1. A única motivação que resulta da decisão de manter o imposto de IRC em questão, resume-se ao facto da empresa V..., não ter apresentado, nesse mesmo ano o anexo J da declaração anual. - - -

2. Presumindo a administração fiscal que, por esse facto, a referida empresa não teria trabalhadores ao seu serviço. - - -

3. Os trabalhos foram efectivamente realizados pela V.... - - -

4. As facturas contabilizadas e emitidas por V... consubstanciam serviços efectivamente prestados pela entidade emissora. - - -

5. As facturas em questão, ou seja, as facturas emitidas pela V... correspondem ao trabalho efectivamente realizado. - - -

6. A impugnante desconhecia que a empresa V... não tivesse os seus trabalhadores inscritos na Segurança Social e procedesse aos respectivos descontos legais. - - -

7. Foram, aliás, várias as obras onde a V... prestou, serviço à impugnante, nomeadamente, obras executadas na L…, em Vilamoura, no Algarve, obras M…, em Lisboa, obras executadas em T… em Campanha, obras executadas em Famalicão. - -

8. Essas obras adjudicadas à ora Impugnante, cujas facturas dos serviços prestados se juntam sob os n.°s 12 a 42 e se dão aqui por reproduzidos, para os devidos e legais efeitos, foram obras para as quais a V..., foi subcontratada. - - -

9. Contudo, os trabalhos foram efectivamente realizados pela V.... - - -

10. Correspondendo as facturas em causa aos serviços efectivamente prestados, não podendo, por conseguinte, serem conotadas como facturas fictícias ou falsas. - - -

11. Mas, correspondem de facto, aos serviços prestados, traduzindo os valores aí inscritos aos valores reais dos serviços realizados. - - -

12. Acresce, ainda, dizer que os serviços efectuados foram pagos, nomeadamente, através de cheques, letras e dinheiro.

3.1.1 – Motivação. - - -

O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque (art. 74.º, n.º 1, da LGT). - - -

A dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita (art. 516.º do CPC). - - -

O tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa, com base na análise conjugada e crítica dos documentos juntos aos autos e no processo administrativo que não foram impugnados e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (art. 74.º da Lei Geral Tributária (LGT)), também são corroborados pelos documentos juntos aos autos (arts. 76.º, n.º 1, da LGT e 362.º e seguintes do Código Civil (CC)) identificados em cada um dos factos, bem como pelos depoimentos das testemunhas da Fazenda Pública prestados na audiência contraditória que explicaram e corroboraram o teor do relatório e ainda na confissão da impugnante relativamente à matéria da alínea V) (arts. 38.º e 567.º do CPC e 352.º do CC). - - -

A matéria de facto provada das alíneas SS) a XX) resultaram do depoimento das testemunhas da impugnante, que apesar de serem algo vagos e imprecisos não deixam de poder convencer o tribunal desses factos. - - -

A matéria de facto não provada resultou da insuficiência, da falta de prova ou da prova do contrário. - - -

A matéria de facto não provada dos números 1) e 2), resultou da prova do contrário. - - -

Resulta à saciedade dos autos, designadamente do relatório da inspecção tributária que o motivo das correcções à matéria tributável da impugnante no ano de 2002, não foi apenas o facto da empresa V..., não ter apresentado, nesse mesmo ano o anexo J da declaração anual. Esse foi um de entre muitos outros motivos, designadamente, a falta de prova do pagamento das facturas emitidas pela V... e registadas na contabilidade da impugnante; a falta de discriminação, quantificação e identificação do preço unitário dos serviços prestados nessas facturas; a falta de credibilidade dos autos de medição apresentados pela impugnante, por não estarem assinados pelo gerente da emitente; a falta de redução a escritos dos contratos em causa; o valor facturado pela V... no ano de 2002 ser superior ao valor facturado pela impugnante aos seus clientes; nos serviços prestados facturados pela impugnante não estavam contemplados os custos contabilizados com os subcontratos; a falta de entrega das declarações de IVA e IRC da V...; a impugnante não comprovou a movimentação de fundos financeiros necessários para o pagamento do valor das facturas, etc…

Os factos não provados dos números 6) a 8) resultaram da total ausência de prova. - - -

Sendo factos alegados pela impugnante recaía sobre ela o respectivo ónus da prova (art. 74.º, n.º 1, da LGT). - - -

Em relação aos factos aí descritos e às obras aí identificadas (com excepção do Algarve e Figueira da Foz) não foi feita qualquer prova documental ou testemunhal pela impugnante. - - -

Com efeito, nenhum dos documentos juntos pela impugnante, nem nenhum dos depoimentos das testemunhas diz que a impugnante não sabia que a V... não tinha os seus trabalhadores inscritos na Segurança Social e procedesse aos respectivos descontos legais, nem se referem às obras identificadas no número 7) da matéria de facto não provada (com excepção do Algarve e Figueira da Foz). - - -

Se esses documentos e depoimentos não se referem a tais obras, jamais se poderá dizer que esses depoimentos também se refiram aos trabalhos alegadamente realizados pela V.... Isto é, se as testemunhas nunca se referiram nem identificaram tais obras, tem necessariamente de concluir-se que desses depoimentos não pode concluir-se que a V... tenha prestado qualquer serviço efectivo nessas obras. - - -

Por outro lado, da conjugação da própria prova documental e testemunhal feita pela impugnante, o tribunal concluiu que no ano de 2002, a V... não prestou efectivamente à impugnante os serviços que constam das facturas por si emitidas. - - -

Vejamos. - - -

A impugnante juntou de fls. 40 a 53 as facturas emitidas por si das obras em que a V... prestou serviços. - - -

Dessas facturas, constam no ano de 2001, as obras de Vila Nova de Gaia e Figueira da Foz e relativamente ao ano de 2002, as obras realizadas em Famalicão, Perafita, Sesimbra, Moita, Figueira da Foz, Sintra, Lisboa, Almargem do Bispo e Amares.--

Nenhuma das testemunhas inquiridas refere-se à prestação de serviços em qualquer uma destas obras de 2002, com excepção da Figueira da Foz. - - -

Logo, com excepção da eventual obra da Figueira da Foz, os depoimentos testemunhais não corroboraram a prestação de serviços da V... em qualquer uma das restantes obras. - - -

Se a esta ausência de prova testemunhal associarmos a falta de prova documental e objectiva da prestação do serviço efectivo da V... nessas obras, bem como a prova objectiva relacionada pela administração tributária, o tribunal tem de concluir que nessas obras no ano de 2002 não houve prestação de serviço efectivo pela V..., pelo que as facturas emitidas por si e registada pela impugnante na sua contabilidade, não têm subjacente a prestação efectiva de serviço. - - -

Relativamente às facturas da obra da Figueira da Foz (e às obras do Algarve de Vila Nova de Gaia, que já não relevam para estes autos, por serem do ano de 2001, ano cuja liquidação de IRC foi anulada pela administração tributária, não por razões de fundo mas de forma: por caducidade do direito à liquidação) bem como à restante matéria de facto julgada não provada, temos de fazer a ponderação da prova produzida pela impugnante e pela administração tributária. --

O depoimento da testemunha J... não merece credibilidade para a formação da convicção do tribunal, por dois motivos essenciais. Por um lado, o reconhecido desentendimento com o sócio gerente da V..., que leva o tribunal a ponderar com maior rigor a credibilidade a atribuir ao seu depoimento; por outro lado, por não se poder atribuir credibilidade ao seu depoimento, por se tratar de um depoimento indirecto. Com efeito, a testemunha declarou repetidamente que não tinha conhecimento directo dos factos. Que apenas acompanhou presencialmente a obra de Gondomar e de Vila Nova de Gaia, irrelevantes para os autos. Quanto às demais obras, nunca se referiu a nenhuma das que são identificadas pela impugnante realizadas no ano de 2002, com excepção da Figueira da Foz. Porém, quanto a esta e quanto à do Algarve declarou de forma expressa que o que sabia era o que o gerente da V... lhe contava. A testemunha não tinha conhecimento directo dos factos, não conhecia o veículo da V..., ouviu dizer que era uma carrinha vermelha, não sabia quantos trabalhadores tinham estado em obra, apenas sabia aquilo que o gerente lhe dizia e que tomava conhecimento pelos papeis que lhe eram entregues. Declarou inclusive que o gerente da V... lhe disse pelo telefone que estava com o gerente da impugnante e que ia com ele ao Algarve. Agora não presenciou os factos e as obras, nem sabe se as informações que lhe eram transmitidas verbalmente e pelos documentos que lhe eram entregues, correspondiam à realidade, nem as localizou no tempo. A única referência temporal que fez foi ter trabalhado para a V... entre 2001 e 2003. Contudo, como vimos há facturas de obras na Figueira da Foz em 2001 e 2002 e a testemunha no seu depoimento quando se refere à obra da Figueira da Foz não especificou se se referia à obra ou aos trabalhos prestados no ano de 2001 ou 2002, sendo que para estes autos apenas relevam os ocorridos em 2002. - - -

Este depoimento é manifestamente inconsistente para fundamentar a convicção do tribunal na decisão da matéria de facto. - - -

Acresce que este depoimento contraria os próprios documentos juntos pela impugnante. Com efeito, a impugnante juntou as facturas de fls. 21 a 53, para identificar as obras em que a V... tinha trabalhado para si. Porém, em nenhuma delas constam obras no Algarve. - - -

Os depoimentos das restantes testemunhas da impugnante também não se revelaram suficientemente consistentes e coerentes, para formar a convicção do tribunal. - - -

O depoimento de António… versou sobretudo sobre as obras do Algarve e Vila Nova de Gaia. Conforme decorre dos documentos juntos pela impugnante de fls. 21 a 39, as obras de Vila Nova de Gaia decorreram em 2001, exercício que não está em causa nesta impugnação. - - -

Contudo relativamente às obras do Algarve existe nova contradição. A testemunha declarou que os trabalhadores da V... trabalharam no Algarve, mas a impugnante apesar de alegar que foram, prestados serviços nessas obras, não juntou nenhuma factura para prova das obras alegadamente realizadas no Algarve. - - -

Relativamente às obras identificadas pela impugnante como tendo sido realizadas em 2002 a testemunha não identificou nenhuma. - - -

Por outro lado, o seu depoimento revelou alguma inconsistência que descredibilizou a sua verosimilhança. A instância das partes declarou que sabia que os trabalhadores da V... tinham trabalhado na obra de Vila Nova de Gaia, mas não sabia se por conta da impugnante ou da dona da obra. Porém, a instância da Meritíssima Juiz declarou que era por conta da impugnante. - -

Apesar de objectivamente tal obra não ter relevância para estes autos, esta contradição abala a credibilidade do depoimento da testemunha. - - -

Relativamente ao depoimento de José..., o seu depoimento apesar de uma forma geral não manifestar contradições ou incoerências assinaláveis, revelou alguma imprecisão na delimitação temporal dos factos, que era indispensável para a consistência e valorização do seu depoimento. - - -

Com efeito, declarou que trabalhou na obra da Figueira da Foz embora não consiga precisar o ano. Recorda-se que trabalhou de Janeiro a Agosto e depois foi trabalhar para o Algarve. No entanto não sabe o ano. - - -

Conforme resulta dos documentos juntos pela impugnante, as obras na Figueira da Foz decorreram em 2001 e 2002. - - -

Relativamente ao ano de 2001 o depoimento é irrelevante, porquanto está em causa apenas o ano de 2002. Porém, não tendo a testemunha identificado o ano em que trabalhou na Figueira da Foz, não logrou apurar-se se o alegado serviço da V... teria sido prestado em 2001 ou 2002. - - -

Assim, este depoimento é manifestamente insuficiente para o tribunal poder fundar a sua convicção que a V... prestou serviços efectivos para a impugnante no ano de 2002 nas obras da Figueira da Foz. - - -

Se conjugarmos estes factos, com a prova objectiva carreada para os autos pela administração tributária, o tribunal não pode julgar como provado que os trabalhos realizados pela V... constantes das alíneas SS) a VV) foram realizados nos anos de 2001 ou 2002, nem que esses trabalhos são os que constam das facturas emitidas pela V... em 2001 e 2002, registadas na contabilidade da impugnante. - - -

Com efeito, apesar de se ter provado que a V... prestou serviços para a impugnante, não se provou em que anos e obras foram prestados tais serviços, designadamente não se provou em que exercício é que a V... trabalhou nas obras da Figueira da Foz. - -

Esta falta de prova deve-se à falta de prova testemunhal e documental coerente e suficientemente consistente para convencer o tribunal. - - -

Com efeito, perante a prova objectiva, consistente e convincente que a administração tributária carreou para os autos para prova da inexistência das operações económicas subjacentes às facturas emitidas pela V..., a impugnante não logrou fazer prova consistente, coerente e verosímil de que as facturas emitidas pela V... tinham subjacente a efectiva prestação de serviços nelas tituladas. - - -

Por isso, os factos relativos à obra da Figueira da Foz e os restantes factos foram julgados não provados, porquanto pendia sobre a impugnante o respectivo ónus da prova. E na falta de produção de prova bastante, tais factos são julgados contra si (arts. 74.º, n.º 1, da LGT e 516.º do CPC). - - -

A restante matéria alegada pelas partes não foi julgada provada ou não provada por constituir conceito de direito, matéria conclusiva ou não relevar para a decisão da causa. - - -».

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

A Recorrente começa por invocar erro na apreciação e valoração da prova, alegando que não foi dado devido relevo ao depoimento das testemunhas por si apresentadas com conhecimento directo dos factos controvertidos, em detrimento da prova recolhida pela Administração fiscal.

Já se vê, a Recorrente pretende impugnar a decisão de facto.

À data de interposição do recurso (01/03/2010 – fls.197), dispunha o art.º685.º-B do CPC, aplicável ao processo tributário ex vi do art.º2.º alínea e), do CPPT:

«1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
3 – (…)».

Não assiste razão à Recorrente quando no ponto VII das conclusões assinala erro na decisão de facto ao referir-se que “no ano de 2002 o valor facturado pela V... é superior ao facturado pela impugnante aos seus clientes, que conforme supra se demonstrou no quadro demonstrativo não corresponde à realidade”. Analisado o quadro demonstrativo a que se faz alusão, verifica-se que do mesmo constam diversas obras que se dizem extraídas dos registos contabilísticos junto aos autos mas não especificados, quando o que verdadeiramente importava face à factualidade levada ao probatório, era demonstrar que o valor dos subcontratos imputados pela impugnante a obras concretas e, nomeadamente às obras de Buarcos e Complexo Multiusos da Arrábida, não eram afinal e contrariamente ao assumido pela Administração fiscal, de valor superior aos valores facturados e contabilizados aos respectivos clientes.

No mais, a Recorrente não indica quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida quanto a esses pontos de facto impugnados.

Ou seja, não impugna eficazmente a decisão relativa à matéria de facto, pelo que rejeita-se o recurso neste segmento.

Estabilizado o probatório, passemos à questão seguinte que importa conhecer, ou seja, indagar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que a Administração tributária cumpriu o ónus da prova que lhe competia “in casu”.

A Recorrente põe em causa a base substancial legitimadora da actuação da Administração fiscal sustentando que não foi recolhida factualidade suficiente e bastante à demonstração de que as facturas desconsideradas fiscalmente para efeitos de custos, não correspondam a operações reais.

Comecemos por ver as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis no domínio das correcções em causa.

Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, quando a Administração tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vd., entre muitos outros, os acórdãos do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.

Assim sendo, importa analisar se a Administração fiscal fez a prova que lhe competia da verificação de indícios que permitem concluir que às apontadas facturas contabilizadas pela Impugnante, ora Recorrente, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.

Tenha-se em conta, como também é aceite, que não é imperioso que a Administração fiscal efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, vd. o acórdão do TCAN, de 30/09/2014 (processo nº 00544/06.0 BEPNF).

Ou seja, a Administração tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Proc.º 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operação(ões) referida(s) na(s) factura(s) ser(em) simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade ou escrita – artigo 75º da LGT.

Como se refere no acórdão do TCAN, de 23 de Novembro de 2012 (proc. nº 1523/05.0 BEVIS-Aveiro), “no que concerne à prova que compete à Administração - na repartição do ónus da prova de que demos nota supra -, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” (expressão de Castro Mendes, citado por Saldanha Sanches), pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.

Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Não perdendo de vista o enquadramento jurídico gizado relativamente ao ónus da prova aplicável às correcções em causa e considerando os factos apurados em sede inspectiva (que outros não podem ser relevados), vejamos se resulta dos factos relatados que a Administração tributária fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir, com relação às facturas contabilizadas pela impugnante e não aceites como custo fiscal, que não tiveram subjacentes quaisquer operações económicas realizadas entre a Impugnante Construções ..., Lda. e a empresa emitente, V... Construções, Lda..

Em caso afirmativo e só nesse, importará indagar se a Impugnante logrou demonstrar em Tribunal que, não obstante os indícios colhidos, as operações reflectidas nas facturas desconsideradas são reais, ou seja, que os concretos sujeitos passivos realizaram efectivamente as operações económicas mencionadas nas questionadas facturas.

Já se intui que a sentença recorrida considerou que a Administração tributária tinha cumprido o ónus de prova que a lei lhe impõe neste caso. Vejamos o que nela se deixou relevantemente consignado a propósito:

«No caso em apreço, a administração tributária carreou para os autos prova bastante consistente, coerente e credível da inexistência das operações tituladas pelas facturas emitidas pela V... e registadas na contabilidade da impugnante, as quais foram consideradas, de forma convincente e fundada, como titulando operações simuladas. - - -

Basta atentar e conjugar na matéria de facto provada nas alíneas D) a GG), com a matéria de facto não provada, para concluir-se que a administração tributária recolheu indícios sérios da inexistência das operações tituladas pelas facturas. - - -

Em síntese, salienta-se, relativamente à emitente a sua de falta de contabilização e declaração dos serviços prestados, a declaração que prestou alguns serviços à impugnante mas de valor inferior ao declarado e relativamente à impugnante a falta de prova da movimentação de meios financeiros para o pagamento dos serviços alegadamente prestados (aqui atente-se que os cheques apresentados pela impugnante emitidos à ordem da V... além de serem de valor consideravelmente inferior ao valor em causa, não sendo verosímil que os pagamentos tenham sido realizados em dinheiro, dos cheques apresentados apenas três deles se reportam ao ano de 2002 sendo os restantes do ano de 2003, que já não está em causa nestes autos; as letras não indicam o motivo da sua emissão), a falta de prova objectiva da contratualização dos serviços prestados (inexistência de prova documental coerente e verosímil dos serviços contratados e prestados: não existem contratos escritos e os alegados autos de medição não estão assinados pelo legal representante da emitente) e a prova objectiva da desconformidade entre os serviços facturados nos anos de 2001 e 2002 aos seus clientes e o custo de mão-de-obra contabilizados nesses períodos: não se compreende como é que nos meses em que há subcontratos com a V..., a impugnante registou na sua contabilidade custos com mão-de-obra superiores aos valores facturados aos clientes; os subcontratos imputados pela impugnante às obras de Buarcos (Figueira da Foz) e Complexo Multiusos da Arrábida (independentemente do ano a que respeitem 2001 ou 2002), são de valor superior ao facturado aos respectivos clientes. - - -

Estando feita prova consistente da existência de indícios sérios que as facturas emitidas pela V..., registadas na contabilidade da impugnante não titulavam operações económicas reais, está afastada a presunção de veracidade da sua escrita (art. 75.º da LGT) e formal e materialmente fundamentada a decisão administrativa da não aceitação como custo fiscal do valor dessas facturas (art. 23.º, n.º 1, do CIRC). - - -

Competia então à impugnante fazer prova da realidade das operações económicas tituladas pelas facturas. - - -

Porém, como se foi adiantando na motivação da matéria de facto, a impugnante não logrou fazer prova consistente da existência da actividade económica subjacente às facturas desconsideradas pela administração tributária. - - -

Com efeito, para demonstrar a existência real da actividade económica subjacente às facturas que a administração tributária considerou titularem operações simuladas, a impugnante alegou que a administração tributária tinha considerado unicamente como fundamento a falta de apresentação da declaração anual Modelo J, o que já vimos, em sede de fundamentação, não corresponde à realidade, alegando ainda que os serviços facturados pela V... foram efectivamente prestados, deixando transparecer que não tinha capacidade produtiva própria, motivo pelo qual recorria a subempreiteiros. Para prova de tais factos, arrolou testemunhas e juntou as facturas emitidas relativas às obras em que a V... terá prestado serviços. - - -

Contudo e como decorre da matéria de facto não provada e da respectiva motivação, a impugnante não logrou fazer prova bastante e consistente da existência das operações económicas subjacentes às facturas emitidas pela V.... Isto é, a impugnante não fez prova bastante para convencer o tribunal que a V... e os seus funcionários prestaram os serviços constantes das facturas desconsideradas pela administração tributária. - - -

Desde logo, a testemunha J… não tinha conhecimento directo dos factos relevantes para estes autos relativos ao ano de 2002. Esta testemunha limitou-se a dizer aquilo que lhe era dito pelo gerente da V..., mas nunca verificou por si tais factos nas obras. - - -

O depoimento da testemunha A… voltado sobretudo para as obras do Algarve e Vila Nova de Gaia independentemente da sua credibilidade revelou-se inútil. Por um lado, porque a obra do Algarve não faz parte das obras identificadas pela impugnante em que a V... prestou serviços (a contradição entre os factos alegados pela impugnante e os documentos juntos por si de fls. 21 a 53 e o depoimento da testemunha abala a sua credibilidade); e a obra de Vila Nova de Gaia terá ocorrido em 2001, ano que não está em causa nesta impugnação. - - -

O depoimento de José… relativamente à obra da Figueira da Foz, não se revelando preciso quanto à sua data torna-se irrelevante, porque não permitiu apurar se a V... prestou esses serviços em 2001 ou em 2002. Esta omissão conjugada com a prova objectiva da administração tributária da falta de prova consistente e coerente da movimentação de meios financeiros para pagamento dos serviços prestados e da discrepância entre os registos dos custos de mão-de-obra com os serviços facturados aos clientes, em que os custos de mão-de-obra são superiores aos valores facturados aos clientes, abalam a credibilidade dos depoimentos, não logrando convencer o tribunal dos factos alegados pela impugnante. - - -

Por esse motivo, foi julgada não provada parte substancial dos factos alegados pela impugnante que visavam demonstrar a substancialidade das operações económicas subjacentes às facturas desconsideradas pela administração tributária. - - -

Apesar de se ter provado que a V... prestou serviços para a impugnante, não logrou apurar-se em que anos, obras e porque montantes. Ou seja, não logrou provar-se que esses serviços respeitam aos que constam das facturas que foram consideradas como integrando operações simuladas. - - -

«Estando assente que a AT demonstrou, como lhe competia, factos que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência, lhe permitem concluir que às facturas em causa não correspondem operações reais e, assim, que está formal e materialmente fundamentada a decisão administrativa de desconsiderar os custos que têm suporte naquelas facturas e de afastar a presunção de veracidade da escrita, à data consignada no art. 78.º do CPT, competia então ao Contribuinte, nos termos que ficaram expostos em I e de acordo com o disposto no art. 23.º do CIRC, demonstrar que as facturas em causa correspondem a operações realmente efectuadas pela empresa que as emitiu e pelo valor referido nas facturas e, assim, comprovar os custos que contabilizou, não lhe bastando criar dúvida a esse propósito (o art. 121.º, n.º 1, do C PT, a que corresponde hoje igual número do art. 100.º do CPPT, não logra aqui aplicação, pois não está em causa a prova sobre a existência e quantificação do facto tributário que competiria à AT, mas antes a prova dos factos em que o contribuinte funda o seu direito)». - - -

Com as devidas adaptações legais, é o caso destes autos. A administração tributária logrou fazer prova que as facturas desconsideradas pela administração tributária não correspondem a operações reais e a impugnante não logrou comprovar que essas facturas correspondem a operações realmente efectuadas pela empresa emitente, nem sequer conseguiu suscitar ao tribunal a dúvida fundada sobre essa realidade. - - -

Não existe por isso fundamento legal para considerar como custo fiscal, o valor das facturas emitidas pela V..., registadas na contabilidade da impugnante, por não ter sido feita prova que correspondem operações económicas reais e não podem ser considerados custos comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora (art. 23.º, n.º 1, do CIRC). - - -

Acresce que estando em causa obras de carácter plurianual – vejam-se as alegadas obras de Famalicão e Figueira da Foz – a impugnante tinha de ter a contabilidade organizada de forma a permitir o apuramento dos resultados por obra (arts. 19.º e 115.º do CIRC). - - -

Porém, a impugnante não tinha a contabilidade organizada dessa forma, o que inviabilizava o apuramento dos resultados por obra, a determinação dos custos de mão-de-obra e a determinação do lucro tributável. - - -

Finalmente, temos ainda a unidade da ordem jurídica. - - -

«É certo que, contrariamente ao que ocorre relativamente ao IVA (em que as exigências de carácter formal das facturas que suportam o direito à dedução não podem ser supridas pela prova, ainda que inequívoca, das operações por outro meio de prova (() No IVA exige-se, como decorrência do próprio mecanismo do imposto (método indirecto subtractivo, método do crédito de imposto ou método das facturas) e fins visados, que o documento – factura – respeite determinados requisitos, expressos no art. 35.°, n.° 5, do CIVA, «com a outorga de um carácter quase sacramental à factura», que, para efeitos de IVA, assume a natureza de um título de crédito (cfr. JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO, A Tributação do Consumo e a sua Coordenação Internacional, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.° 164, pág. 140, que impressivamente, diz: «Em regime de IVA, como se sabe, cada factura mencionando imposto constitui um cheque sobre o Tesouro, pois atribui ao destinatário que seja sujeito passivo o direito de deduzir o IVA nela contido»).)), em sede de IRC, para que se admita a relevação negativa dos custos, as exigências formais não são tão severas, sendo que no respectivo código não está concretizada a noção de «documento justificativo», expressamente adoptada no art. 98.°, n.° 3, alínea a), disposição que estipula regras a observar na execução da contabilidade, bastando «uma qualquer forma externa de representação da operação (que não uma factura, por não incluir as imperativas e específicas solenidades documentais, como a numeração ou o timbre da empresa) [...] desde que explicite, de forma clara, as principais características da operação (os sujeitos, o preço, a data e o objecto da transacção)» (() Cfr. TOMÁS CASTRO TAVARES, Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal Na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos, Ciência e Técnica Fiscal n.º 396, págs. 123.). E mesmo a ausência de documento externo de suporte ou a insuficiência do mesmo não preclude liminarmente a dedutibilidade do custo, pois admite-se a prova da existência e principais características da transacção através de qualquer meio (() Idem, págs. 125-126.).
No entanto, como é manifesto, se não há limitações quanto à admissibilidade de qualquer meio de prova (cfr. art. 115.º, n.º 1, do CPPT, que corresponde ao art. 134.º do CPT), há de exigir grande rigor na prova da materialidade e/ou da dimensão das operações referidas em facturas relativamente às quais a AT recolheu indícios sérios e credíveis de que não lhe correspondiam operações reais ou de que a dimensão das operações aí referidas (com repercussão no respectivo valor) não correspondia à realidade. Como deixámos já dito, à Impugnante não basta criar a dúvida a esse propósito, antes lhes competindo demonstrar a materialidade das operações referidas nas facturas». - - -

No caso em apreço, das facturas emitidas pela V... registadas na contabilidade da impugnante não constava a discriminação do tipo de serviço específico nem a sua quantificação: Eram referidos apenas serviços de uma forma genérica, sem que constasse a sua quantificação, pelo que não possuíam os requisitos exigidos pelo art. 35.º, n.º 5, alínea b), do CIVA. - - -

Se essas facturas não são válidas para efeito de IVA, por não respeitarem a forma legal e por indiciarem fortemente que não têm subjacentes operações económicas reais, então a exigência de prova da materialidade das operações económicas tem ainda de ser maior. - - -

E se as referidas facturas e a prova testemunhal produzida não explicitam «de forma clara, as principais características da operação (os sujeitos, o preço, a data e o objecto da transacção)» então não podem ter relevância fiscal para efeitos de IRC. - - -

A impugnação tem, por isso, de improceder.».

A Recorrente considera errado este entendimento da sentença que concluiu pela existência de indícios sérios e credíveis de que as facturas em causa não correspondem a operações reais, sufragando a posição da Administração fiscal, sustentando que não há factualidade material que apoie tal afirmação conclusiva, destacando que o tribunal “a quo” fundou a sua convicção em factos relatados que se apresentam inconsistentes face ao conjunto da prova produzida, se devidamente valorada. Vejamos se lhe assiste razão.

Para concluir que as facturas em causa não reflectem operações reais, é relatado pela Administração tributária e vem referido no probatório, designadamente, que a impugnante tinha como prática contabilizar todos os pagamentos e recebimentos por contrapartida de caixa; há cheques, apresentados pela impugnante como destinados ao pagamento de facturas emitidas pela V..., passados não à ordem do emitente mas sim à ordem de S..., sócio gerente da emitente; não foi possível conciliar meios de pagamento (letras aceites) ao pagamento das facturas; das facturas emitidas pela V... não consta a discriminação do tipo de serviços prestados e sua quantificação; os documentos entregues pela impugnante como se tratando de autos de medição da V... são folhas emitidas pela própria impugnante de cuja descrição consta a cedência de pessoal, não mencionado a identificação do mesmo pessoal, nem fazendo qualquer referência à V... e não contém qualquer validação da emitente; o gerente da impugnante declarou não ter formalizado qualquer contrato com relação aos anos de 2001 e 2002, tendo acordado verbalmente com os clientes os serviços a prestar; custos de subcontratos com a V..., de montante superior aos valores facturados a clientes com relação a obras concretas; o emitente V... não entregou declarações fiscais de IVA e IRC com relação aos anos de 2001 e 2002 e não exibiu registos contabilísticos nem a documentação solicitada pela inspecção; o gerente da V... declarou não ter prestado serviços à impugnante e, numa primeira declaração, não ter prestado os serviços facturados.

Como se vê, contrariamente ao que sustenta a impugnante, ora Recorrente, não foi unicamente o incumprimento de obrigações declarativas da empresa emitente que motivou a não aceitação dos custos reflectidos em facturas por ela emitidas à impugnante.

Foi também a circunstância de a impugnante ter por prática contabilizar todos os pagamentos e recebimentos por contrapartida de caixa; ter apresentado como meios de pagamento das facturas em causa no valor de 191.605,89 €, para além de dinheiro, cheques perfazendo o valor de 61.304,00€ e letras no valor de 38.000,00€, a que acresce a constatação de que os pagamentos efectuados ao emitente através de cheques apresentam valor aproximado ao do IVA inscrito nas facturas postas em causa e contabilizadas como pagas em 2001 e 2002; não ter sido possível associar as letras sacadas pela sociedade emitente e aceites pela impugnante naquele montante de 38.000€ ao pagamento das facturas em causa, em resultado também do facto de a impugnante não possuir “livro de letras a pagar”. Ora, se se mostra totalmente contrário a uma boa, recomendável, segura e habitual prática comercial efectuar pagamentos a fornecedores na ordem das dezenas de milhares de euros com recurso exclusivo a dinheiro, não é menos de estranhar o procedimento do pagamento de grande parte dos montantes facturados através de dinheiro, como se diz ter sido o caso. Como se sabe, o circuito dos pagamentos constitui um dos caminhos mais percorridos na detecção e investigação de facturação falsa, daí o enfoque probatório que se coloca na recolha da documentação relativa aos pagamentos e sua conexão com a liquidação dos custos titulados por documentos de compras, nomeadamente facturas. Numa segunda vertente, não podemos deixar de notar que os autos de medição apresentados são da autoria da própria impugnante, não tendo sido validados pela emitente, deles não constando qualquer referência ao emitente nem, convenientemente, a identificação dos trabalhadores alocados pelo emitente às obras da impugnante. Numa outra vertente, importa ainda salientar a relatada omissão, nas facturas da emitente, de elementos formais, nomeadamente, quanto à especificação dos serviços prestados e sua quantificação, o que obviamente entra em detrimento da recolha da prova da materialidade adequada à relacionação dos custos representados aos proveitos concretos associados e ao esclarecimento da situação subjacente, sendo uma prática de verificação reiterada nas situações em que se vem a concluir pela utilização de facturas falsas. Por fim e desde que não seja esse o único facto em que se suporta a actividade correctiva da Administração fiscal, não pode deixar de assumir relevância, como princípio de investigação de facturação falsa, o histórico da conduta fiscal do emitente, com incumprimento generalizado das suas obrigações contabilísticas e declarativas, por ser uma situação recorrente em que, interessa à fraude, fica inviabilizado o cruzamento de dados contabilísticos e fiscais entre o emitente e o utilizador.
Refere a impugnante que entregou à Administração fiscal a frente dos cheques para pagamento das facturas, todos passados à emitente, tendo concedido autorização escrita à DGCI para solicitar à entidade bancária onde foram descontados, o verso desses cheques, o que a Administração fiscal diligenciou embora sem sucesso à data da impugnação e que lhe teria permitido confirmar a emitente como beneficiária desses cheques.

No entanto, a omissão desses elementos (verso dos cheques) não se apresenta decisivamente relevante para pôr em crise o acervo indiciário relatado, uma vez que não mostram os autos que tivesse sido possível referenciar o montante desses cheques à liquidação das facturas não aceites, a que acresce a circunstância, já referida, de o montante dos cheques se aproximar do valor do IVA inscrito na facturas contabilizadas como pagas em 2001 e 2002 (cf. fls.24/25 do apenso de reclamação graciosa), a que acresce a circunstância de o valor dos cheques usados como meio de pagamento, representar uma parte pouco significativa do valor das facturas que supostamente visariam liquidar.

Concluindo, no caso vertente a Administração tributária coligiu, com origem nas sociedades emitente e utilizadora das facturas, uma série de indícios consistentes, apontando no sentido de que as prestações de serviços e fornecimentos inscritos nas mesmas não tiveram lugar, não foram efectivos, reais. Consequentemente, porque a impugnante não assumiu, suportou, os correspondentes custos, impunha-se-lhe corrigir, em conformidade, a matéria tributável por esta declarada, para o exercício em causa de 2002, operando a competente redução nos encargos contabilizados.

É certo, como deixamos expresso em considerandos anteriormente feitos, que à impugnante não restava esta inevitabilidade, podendo sempre empreender a tarefa de demonstrar, em sede impugnatória, que às facturas questionadas correspondiam operações económicas efectivamente realizadas pela sociedade emitente das mesmas, comprovando, reflexamente, os custos respectivos, inscritos na sua contabilidade.

Vejamos, então, se a impugnante alegou e provou, na impugnação judicial, factos que apontam inequivocamente para a realidade das operações descritas nas facturas reputadas fictícias.

Ressalta do probatório (cf. pontos ss) a xx)) que a impugnante logrou demonstrar, com recurso a prova testemunhal, que subcontratou a empresa V... para lhe prestar serviços em diversas obras que lhe foram adjudicadas em vários pontos do país e para as quais necessitava de mão-de-obra, e que a impugnante emitiu à V... vários cheques. Mais, que a V... tinha trabalhadores ao seu serviço e vários deles prestaram serviço sob as ordens e direcção da referida empresa à ora impugnante em diversas obras do país.

Todavia, embora a sentença tenha dado como provado que a V... prestou serviços à impugnante em diversas obras do país que lhe foram adjudicadas, não deu como provado que tivessem sido prestados os serviços facturados e não aceites. E era isto que fundamentalmente importava provar: que os serviços descritos nas facturas tinham sido efectivamente realizados.

A propósito dos factos dados como não provados é extensa a fundamentação do julgado. Destacadamente, refere-se que nenhuma testemunha refere a colaboração da V... em obras realizadas em 2002, cujas facturas a impugnante emitiu a clientes e juntou a fls.40/53 dos autos (com excepção da obra da Figueira da Foz – cf. facturas a fls.44 dos autos).

Todavia e quanto a esta última obra, que se prolongou de 2001 a 2002, não há depoimentos – por falta de razão de ciência, vaguidade do depoimento na localização temporal dos factos ou imprecisões e incongruências – que tenham convencido o tribunal da colaboração do emitente no ano em causa de 2002.

Importa não perder de vista que o mesmo sujeito passivo pode emitir facturas correspondentes a serviços prestados a par de outras que não correspondem a quaisquer serviços e é esta a situação na maioria dos casos. E sendo tal verdade, fica arredada qualquer incongruência que possa resultar da circunstância de se dar como provado que a emitente tenha prestado serviços à impugnante, mas não que tais serviços tenham sido prestados no ano em causa de 2002, no âmbito das obras identificadas pela impugnante, não tendo resultado convincente o depoimento das testemunhas arroladas quanto à intervenção do emitente na única obra em que tal colaboração poderia ter ocorrido com relação ao ano de 2002.

Quanto à designada obra do Algarve, a Recorrente refere a factura n.º249 do emitente V... para justificar a sua colaboração nessa obra no ano de 2002, mas manifestamente não colhe o apontado erro de julgamento, porque tendo a própria impugnante referenciado os serviços facturados da emitente às obras que indica como facturadas a clientes seus e que integram fls.12 a 53 dos autos, o que se afirma na sentença é que desses elementos juntos não consta que tenha sido facturada a clientes qualquer obra no Algarve a que se pudesse imputar a colaboração da emitente [“Com efeito, a impugnante juntou as facturas de fls. 21 a 53, para identificar as obras em que a V... tinha trabalhado para si. Porém, em nenhuma delas constam obras no Algarve”].

E obviamente estando em causa apurar a materialidade subjacente à factura, a prova dessa materialidade não pode fazer-se com a própria factura posta em crise.

Por último e no que concerne ao facto dado como provado em ww) a relação empresarial entre as empresas em questão, baseava-se, à data, essencialmente, na confiança e os contratos não eram formalizados, ou seja, não eram reduzidos a escrito”, tal não põe em crise a factualidade indiciária assente na ausência de outros elementos relativos à normalidade das operações de subcontratação, nomeadamente autos de medição elaborados pelo fornecedor e os meios de pagamento referenciados à liquidação das facturas.
Já se intui do sobredito que a impugnante não logrou mediante a prova produzida em sede impugnatória, comprometer a validade da prova indiciária recolhida pela Administração fiscal, como não logrou demonstrar, como era seu ónus, a efectividade das operações reflectidas nas facturas da emitente V... que contabilizou e cujo valor a Administração fiscal desconsiderou como custo do exercício de 2002.

Portanto, a prova da efectividade dos serviços facturados não foi feita e, nessa medida, o valor reflectido nessas facturas não pode ser deduzido pela impugnante como custo fiscal do exercício, posto que não corresponde a qualquer custo real.

Com efeito e como decorre do disposto no art.º23.º n.º1 do CIRC (redacção vigente ao tempo dos factos) só são dedutíveis como componente negativa do lucro tributável os custos ou perdas comprovados, não sendo suficiente a sua mera contabilização.

A sentença recorrida, que no mesmo sentido decidiu, não incorreu no erro de julgamento que lhe vem assacado, tendo feito correcta aplicação do direito aos factos, merecendo, pois, ser inteiramente confirmada.

5 - DECISÃO
Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Porto, 15 de Outubro de 2015
Ass. Vital Lopes
Ass. Cristina da Nova
Ass. Pedro Vergueiro