Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00361/14.4BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/21/2017
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:OPOSIÇÃO
INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO
INSOLVÊNCIA
DEVEDOR ORIGINÁRIO
REVERSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário:I – É à administração tributária que cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais de que depende a reversão.
II - Face à insuficiência do património do originário devedor é possível fazer reverter a execução contra o responsável subsidiário.
III – Há fundada insuficiência do património do originário devedor se for possível concluir que o valor dos seus bens (quantificado) é manifestamente insuficiente para satisfação da dívida exequenda e do acrescido.
IV - Incumbe, portanto, à administração tributária, designadamente, a demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário ou, no caso de existirem, que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda.
V – Se, no despacho de reversão, apenas se invoca, como fundamento da alegada fundada insuficiência do património societário para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido, a situação líquida negativa da sociedade decorrente da última declaração fiscal e a declaração de insolvência da sociedade, esses elementos não permitem, sem mais, que se conclua pela insuficiência de património do devedor originário, uma vez que esse pressuposto de reversão não se basta com a mera afirmação da probabilidade da sua existência.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:A...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 31/05/2017, que julgou procedente a oposição deduzida por A..., NIF 1…, residente na Rua…, freguesia e concelho de Armamar, ao processo de execução fiscal n.º 2542200901002805 e apensos, que o Serviço de Finanças de Lamego lhe moveu por reversão de dívidas de IRS, retenções na fonte de Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009, IMI de 2008 e IVA de 2009, da sociedade comercial M…, Lda., NIPC 5…, com sede no Lugar…, Várzea de Abrunhais, Lamego, ascendendo o montante total revertido a €5.638,97.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A - Incide o presente recurso sobre a Douta sentença de 31/05/2017, que julgou procedente a presente oposição, declarando extinto o processo de execução fiscal relativamente ao oponente; em concreto, sobre o segmento da dita que versa sobre a ilegitimidade do oponente.
B - Para assim concluir, considerou a Meritíssima Juíza a quo que a AT não logrou demonstrar a verificação do pressuposto da reversão respeitante à fundada insuficiência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária, previsto no art. 23º/2 da LGT, o que conduziria à consideração do oponente como parte ilegítima no processo de execução fiscal.
C - Como bem faz notar a Meritíssima Juíza a quo, (a fls. 21 da sentença) não se exige a prévia excussão do património da devedora originária como condição prévia para se operar a reversão da execução contra os responsáveis subsidiários.
D - O nº 2 do artigo 23º da LGT ao estabelecer que a reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão, tem, como refere Jorge Lopes de Sousa (citação constante de fls. 21 da sentença), ínsito que se possa concluir pela fundada insuficiência e decidir pela reversão antes da excussão do património do devedor originário; embora a cobrança da dívida através dos bens do responsável subsidiário esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário.
E - No caso em apreço, a AT exige do oponente, o pagamento da quantia de € 5.638,97, mediante reversão operada ao abrigo do disposto nos nºs 2 e 7 do art. 23º da LGT e 153º, nº 2 al. b), do CPPT – note-se, contudo, que o montante das dívidas revertidas contra o oponente ascende, pelo menos, a € 184.326,48; atentos os valores das diversas oposições que correm termos no TAF Viseu, na base das quais estão reversões operadas nos mesmos termos da aqui em causa.
F - A devedora originária, M…, L.da (contra quem havia sido instaurada a execução fiscal objeto da presente oposição), foi declarada insolvente por sentença de 29/01/2014, proferida no proc.819/13.2 TBLMG, 2º juízo do Tribunal Judicial de Lamego, e foi na sequência de tal informação que foi proferido o despacho de reversão, de 03/04/2014, como se alcança da factualidade provada constante de N) e R), a fls. 10 e 11 da sentença.
G - À data da prolação da sentença de insolvência e da prolação do despacho de reversão, dispunha o artigo 23º, nº 7 da LGT que, “o dever de reversão previsto no nº 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no nº 2 do artigo 181º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis”.
H - Pode-se retirar deste preceito legal, bem como do disposto nos nºs 2 e 3 do mesmo artigo 23º, que o legislador quis, uma vez verificada a insuficiência dos bens do executado e ainda sem que tenham sido penhorados e vendidos todos os bens que lhe restem, que a AT profira obrigatoriamente o despacho de reversão.
I - E tal despacho deve ser proferido mesmo que o quantum da responsabilidade do devedor subsidiário não esteja completamente determinado e que os autos de execução devam aguardar, quanto a si, que ocorra a completa excussão dos bens do executado e devedor principal, verificados que estejam, naturalmente, os restantes requisitos legalmente previstos para que possa ocorrer a reversão – vd. Ac. do STA, de 02/07/2014, proc.º01200/13.
J - Do despacho de reversão, a fls. 12 a 14 da sentença consta, além do mais: “no que respeita à verificação da insuficiência patrimonial do principal devedor, o mesmo está em situação de insolvência decretada em 29/01/2014 e não se verificando ainda a graduação de créditos … bens apreendidos pelo Sr. Administrador de Insolvência, como resulta do exposto no ponto 5 da decisão de insolvência… os créditos da FN foram apresentados em sede de insolvência, nos termos do nº 4 do art. 129º do CIRE, bem como em face do art.146º desse diploma.”
K - Ao que acresce que, de acordo com o ofício nº 78259437, de 03/10-2016, a fls. o processo de insolvência nº 819/13.2 TBLMG se encontra a aguardar a liquidação do ativo.
L - E ainda que nos presentes autos não foi valorada positivamente qualquer prova produzida pelo oponente relativa à alegada existência de património mobiliário e vasto património imobiliário, créditos sobre clientes e garantias bancárias retidas cujo valor seria alegadamente suficiente para pagar as dívidas; quer por ausência de prova documental, quer por vagos e imprecisos depoimentos.
M - Não demonstra o oponente que à data do despacho de reversão se não verificavam os pressupostos do seu chamamento à execução, nomeadamente no que concerne à fundada insuficiência de bens do devedor principal, nos termos do disposto no nº 2 do art. 153º do CPPT.
N - E, na falta dessa prova, bem andou a AT ao promover a reversão contra si no seguimento do conhecimento oficial da declaração de insolvência do devedor principal, nos termos do disposto no nº7 do art. 23º da LGT.
O - Decidindo em contrário, incorreu a sentença ora em apreço em erro de julgamento quanto à verificação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, nomeadamente no que respeita à inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário;
Pelo deve ser revogada e substituída por outra que declare improcedente esta oposição e o oponente parte legítima na execução fiscal.”
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O recorrido contra-alegou em defesa da manutenção da sentença sob recurso, embora sem formular conclusões.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que a administração tributária não demonstrou a insuficiência dos bens penhoráveis da sociedade devedora originária.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos consideram-se provados os seguintes factos:
A) Da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lamego, referente à sociedade M…, Lda., constam, entre outras, as seguintes inscrições:
N.º 7 Ap. 04/20040423
FACTO: DESIGNAÇÃO DE GERÊNCIA
GERENTE: A...
DATA:20040331
[…]
N.º 8 Ap. 06/20050128
NATUREZA: Provisória por Natureza (alínea n) do n.º 1 do Art.º 64.º do C.R.C.
FACTO: ACÇÃO ESPECIAL DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESA.
REQUERENTE: “M…, LDA”.
PEDIDO: A adopção de medidas de recuperação.
GESTOR JUDICIAL: António….
COMISSÃO DE CREDORES: MEMBROS EFECTIVOS – Banco…S.A., presidida por Fernando…, e Banco…, S.A. MEMBRO SUPLENTE: - Metalúrgica… Ld.ª
Foi proferido despacho de prosseguimento da acção, transitado em julgado em 11/10/2004.
[…]
N.º 9 Ap. 01/20060308
NATUREZA: Provisória por Natureza (alínea n) do n.º 1 do Art.º 64.º do C.R.C.
FACTO: SENTENÇA DE DECLARAÇÃO DE FALÊNCIA.
CAUSA: Decisão judicial.
[…] – cfr. fls. 32/37 dos autos.
B) Em 18/03/2004, M… e F…, na qualidade de gerentes, em representação da sociedade comercial M…, Lda., outorgaram uma procuração a favor de A..., aqui oponente, conferindo-lhe “todos os poderes de gerência e de representação social da sociedade, integrados no âmbito da competência de gerência” – cfr. fls. 50/52 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
C) Em 27/03/2004, reuniram em Assembleia Geral Extraordinária, os sócios da sociedade M…, Lda., tendo sido lavrada a ata n.º 7, da qual consta, para além do mais, o seguinte:
“[…]
1. – Deliberar sobre a nomeação de gerente (s), em virtude da gerente Maria…, se pretender apartar da sociedade.
2. – Discussão e votação da proposta para que seja requerido um Processo Especial de Recuperação, nos termos do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e da Falência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/98, de 20.10 e do Decreto-lei n.º 316/98, de 20.10.
Tomou a presidência da assembleia o sócio M….
Seguidamente, passou-se de imediato ao ponto 1 da Ordem de trabalhos e uma vez que a gerente Maria…, se pretendeu apartar foi decidido por unanimidade, que a partir desta data fosse nomeado como único gerente o sócio M….
Passando ao ponto 2 e último, o Presidente começou por referir que existia na empresa a perfeita consciência de que esta sociedade está a atravessar graves dificuldades de tesouraria e com prejuízos nas obras em curso. Ora, os factos e circunstâncias descritos deixam antever que dentro de curtíssimo prazo esta sociedade vai entrar em situação de incumprimento generalizado perante os credores, por falta de capacidade financeira e também por falta de crédito, pois a sociedade está impossibilitada para fazer face à generalidade das obrigações que antes foram contraídas perante terceiros, nomeadamente fornecedores e instituições financeiras. Isto posto, o presidente da assembleia pôs à votação a proposta contida no segundo e último ponto da ordem de trabalhos, que foi aprovada por unanimidade. […] – cfr. fls. 21 dos autos.
D) Em 29/03/2004, deu entrada no Tribunal Judicial de Lamego, o processo especial de recuperação de empresa apresentado pela sociedade devedora originária, que aí correu seus termos no 2.º Juízo, sob o n.º 244/04.6TBLMG – cfr. fls. 22/28 dos autos.
E) Em 31/03/2004, reuniram em Assembleia Geral Extraordinária os sócios da sociedade M…, Lda., tendo sido lavrada a ata n.º 8, da qual se extrai o seguinte:
[…]
1. Deliberar sobre a renúncia de gerência do sócio gerente Senhor M…, em virtude deste ter apresentado uma carta datada de ontem, dirigida à sociedade, na qual pretende afastar-se da gerência da sociedade.
2. Deliberar sobre a nomeação de um gerente para a sociedade, nos termos do número três do artigo quarto do pacto social;
3. Deliberar sobre a remuneração a pagar ao gerente a nomear, nos termos do número dois do citado artigo e pacto;
Tomou a presidência da assembleia a sócia Maria….
Seguidamente passou-se à discussão do ponto um da ordem de trabalhos e, uma vez que o gerente M… pretende renunciar à gerência, foi decidido por unanimidade que, a partir desta data, deixa de exercer a gerência da Sociedade.
Passou-se de seguida à discussão do segundo ponto, tendo o sócio M... proposto que seja nomeado o trabalhador da Empresa Senhor A..., casado, natural da freguesia de Santa Cruz, concelho de Coimbra e residente na Rua… em Lamego, para exercer o cargo de gerente, com dispensa de caução, uma vez que o mesmo te vindo a desempenhar funções de procurador da gerência, e deliberado por unanimidade nomear para o cargo o atrás identificado A....
Por último deliberaram os sócios por unanimidade, fixar a remuneração ilíquida do gerente A..., em dois mil e quinhentos euros mensais, com direito ao uso de qualquer viatura da Empresa e respectivo combustível. […] – cfr. fls. 29 dos autos.
F) Com data de 02/04/2004, foi remetido à Conservatória do Registo Comercial de Lamego um requerimento subscrito pelo oponente, na qualidade de “gerente” da sociedade devedora originária do qual consta,
“A..., casado, solicitador com escritório em Lamego, na qualidade de gerente da sociedade comercial “M..., Lda.”, com sede no Lugar…, freguesia de Várzea de Abrunhais, Lamego, C.F. 5…, vem requerer a V. Ex.ª se digne conceder-lhe a desistência da apresentação 02, em 23/02/04, em virtude de ter sido indevidamente requerida […]”. – cfr. fls. 63 dos autos.
G) Em 28/10/2004, no âmbito do processo especial de recuperação de empresa foi proferido despacho judicial, do qual se extrai o seguinte:
“Nos termos do art.º 39º do CPEREF, o tribunal pode, em qualquer momento, a requerimento da comissão de credores, ou depois de ouvido o seu parecer, substituir o gestor judicial ou alterar os sus poderes (…).
A fls. 2540, veio o Sr. gestor nomeado, requerer a sua substituição, alegando se encontrar sobrecarregado com tarefas de formação e consultadoria que o afastariam do cabal desempenho das suas funções no âmbito do presente processo.
Ouvida comissão de credores, não foi feita qualquer oposição, não tendo igualmente sido manifestada qualquer oposição à nomeação do Sr. Dr. António… (devidamente inscrito na lista oficial).
Face a todo o exposto, e com vista a evitar maiores delongas, defiro a requerida substituição, passando doravante a exercer funções de Gestor Judicial o Sr. Dr. António…”. – cfr. fls. 30/32 dos autos.
H) Com data de 08/05/2005, foi remetido à Direção de Finanças de Viseu um requerimento subscrito pelo oponente, na qualidade de “gerente” da sociedade devedora originária do qual consta,

“Conforme combinado ontem, tenho a honra de remeter a V. Ex.ª a fotocópia do Ofício n.º 7103 do Serviço de Finanças de Lamego, do qual constam as informações sobre dívidas a pagar aos serviços de Finanças de Lamego.
Em pedido verbal e pessoal ao Sr. Chefe de Finanças de Lamego, no mês de Dezembro de 2004, comprometeu-se o mesmo a indicar as dívidas desta empresa ao Fisco até ao dia 07 de Janeiro, mas, até esta data nada recebemos.
Muito gratos ficaríamos se, no mais curto espaço de tempo, nos fosse resolvida esta situação […].” – cfr. fls. 59 dos autos.
I) Com data de 16/05/2007, foi remetido ao Serviço de Finanças de Lamego um requerimento apresentado em nome da sociedade devedora originária, dele constando a assinatura do oponente, sobre o carimbo da empresa, com a indicação “O Gerente”, e do qual consta:
“M..., Lda., sociedade comercial por quotas com sede no lugar…, freguesia da Várzea de Abrunhais, concelho de Lamego, c.f. 5…, vem requerer a V. Ex.ª se digne mandar certificar se, relativamente ao veículo pesado de mercadorias, marca DAF modelo TE 47 W335, matrícula EX, existe Imposto de Circulação em Dívida, atendendo a que não se encontra em circulação e, em caso afirmativo, se sobre a mesma viatura consta qualquer auto de notícia activo por infracção ao Regulamento dos Impostos de Circulação e de Camionagem, no âmbito do art.º 11.º do mesmo Regulamento. […]” – cfr. fls. 60 dos autos.
J) Em 13/05/2009, o Serviço de Finanças de Lamego instaurou contra a sociedade comercial M..., Lda., NIPC 5…, com sede no Lugar…– Várzea de Abrunhais, 5100 Várzea de Abrunhais, Lamego, o processo de execução fiscal n.º 2542200901002805, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRS-retenções na fonte de dezembro de 2008 e janeiro de 2009, no montante global de 1.845,00 € - cfr. fls. 1 do PEF apenso aos autos.
K) Em 25/05/2009, o Serviço de Finanças de Lamego instaurou contra a sociedade comercial M..., Lda., NIPC 5…, com sede no Lugar…– Várzea de Abrunhais, 5100 Várzea de Abrunhais, Lamego, o processo de execução fiscal n.º 2542200901008145, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IMI de 2008, no montante global de 1.966,21 € - cfr. fls. não numeradas do PEF apenso aos autos.
L) Em 19/09/2009, o Serviço de Finanças de Lamego instaurou contra a sociedade comercial M..., Lda., NIPC 5…, com sede no Lugar…– Várzea de Abrunhais, 5100 Várzea de Abrunhais, Lamego, o processo de execução fiscal n.º 2542200901014269, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA do período 2009-06, no montante global de 1.827,76 € - cfr. fls. não numeradas do PEF apenso aos autos.
M) Entre 31/03/2004 e 01/03/2010, para efeitos de pagamento de contribuições obrigatórias para a Segurança Social, o oponente esteve enquadrado como membro de órgão estatutário. – cfr. fls. 53 dos autos.
N) Por sentença de 29/01/2014, a sociedade devedora originária foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 819/13.2 TBLMG, que correu termos pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Lamego, tendo sido nomeado Administrador de Insolvência Ad…– cfr. fls. 44/45 dos autos.
O) Em 21/02/2014, o Sr. Chefe do Serviço de Lamego emitiu projeto de reversão, do qual consta, designadamente, o seguinte:
“[…]
PROJECTO DA REVERSÃO
Fundamentos de emissão central
Insuficiência de bens da devedora originária (art.º 23/2 e 3 da LGT): decorrente da situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face da insolvência declarada pelo Tribunal.
Gerência (administrador, gerente ou director) de direito (art.º 24/1/b da LGT), no terminus do prazo legal de pagamento ou entrega do imposto em questão, conforme cadastro da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT);
Gerência de facto, decorrente da remuneração da categoria A, auferida ao serviço da devedora originária no período em questão (direito constante dos artigos 255.º e/ou 399.º do Código das Sociedades Comerciais.
[…]”.
- fls. não numeradas do PEF apenso aos autos.
P) O oponente foi notificado para exercer o direito de audição prévia sobre o projeto de reversão por ofício datado de 23/02/2014. – cfr. fls. 9 verso do PEF apenso aos autos.
Q) Em resposta, o oponente apresentou o requerimento constante de fls. 8/9 do PEF apenso aos autos.
R) Em 03/04/2014, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças emitiu despacho de reversão, com o seguinte teor:
DESPACHO
1. Nos presentes autos em que é devedor originário a firma M..., Lda, NIPC 5…,993 foi emitido projecto de decisão de reversão central atendendo à determinação da insuficiência de bens da devedora originária (art.° 23/2 e 3 da LGT) decorrente de situação líquida negativa (SLN) em face de insolvência declarada pelo tribunal e exercício de gerência (administrador, gerente ou director) de direito (art.° 24/1/b da LGT) no terminus do prazo legal de pagamento ou entrega do imposto em questão, conforme cadastro da AT e gerência de facto, decorrente da remuneração da categoria A, auferida ao serviço da devedora originária no período em questão.
2. A dívida exequenda nestes autos é referente a IRS, retenções na fonte dos períodos de Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009, 1ª prestação do IMI de 2008 e IVA do período de 200906M, com prazos de pagamento voluntário a 20-01-2009, 20-02-2009, 30-04-2009 e 10-08-2009, respectivamente e ascende a € 5.638,97 (cinco mil, seiscentos e trinta e oito euros e noventa e sete cêntimos) encontrando-se melhor discriminada no quadro infra e identicamente fazendo parte integrante da citação prevista no n°3 do art. 191° do CPPT.


Nº Processo
Data Instauração
Descrição Proveniência
Quantia Exequenda
Juros de Mora
Custas
Valor Total em Dívida
254220091oo2805
2009.05-13
IRS
1.845,00
824,87
56.17
2.726,04
2542200901oo8145
2009.05-25
IMI
1.966,21
806,07
31,13
2.803,41
2542200901014269
2009-09.19
IVA
1.827,76
694,57
29,17
2.551,50

3. O eventual revertido foi notificado para exercer o direito de audição na sequência de ofício entregue no respectivo domicílio fiscal e nesse seguimento, por petição com entrada n° 2014E000952942 neste SF a 17-03-2014, considerando-se tempestiva por força do exposto no art. 60° da LGT, veio o eventual revertido referir sintecticamente os seguintes aspectos:
- Resultante da acta n° 8 de 31-03-2004, o interessado é nomeado gerente, mas sendo procurador da gerência desde 18.03.2004.
- No seguimento do processo especial de recuperação, situação de gerência aceite até nomeação de gestor judicial.
- Releva processo de inquérito participado pela Seg. Social, resultando no seu arquivamento relativo a dívidas do período 01/2008 a 07/2009.
- Alega a não verificação da insuficiência patrimonial do de vedor principal.
4. Em virtude do por ele exposto, requer a extinção do presente projecto de reversão.
5. Atendendo ao referido pelo eventual revertido, no que respeita à verificação da insuficiência patrimonial do principal devedor, o mesmo está em situação de insolvência decretada em 29-Gi-2G14e não se verificando ainda a graduação de créditos.
6. Neste prosseguimento e atendendo ao identicamente referido pelo eventual revertido quanta à existência de bens obstar à reversão (articulado 15°) e tendo em canta insolvência decretada, informa-se que a Lei 64-B/2011, de 30/12, que aprovou o QE para 2012, procedeu a alterações ao n° 7 do art. 23° da LGT, passando a prever a possibilidade de reversão nas situações de insolvência. Neste contexto e atento o disposto no ofício circulado 60091 de 27-07-2012 e estando declarada a insolvência do devedor originário, foi apreciada a possibilidade de reversão das presentes dívidas, efectivando-se o projecto de reversão indicado no ponto 1, fundamentado perante os indícios de insuficiência de bens emergentes da declaração de Insolvência do devedor originário, constituindo pressuposto da responsabilidade subsidiária, em face do exposto no n° 2 do art. 23° da LGT, cumprindo-se de igual modo a notificação de exercício do direito de audição prévia, nos termos do n°4 do art. 23° do mesmo diploma, contrariando por esta via o exposto no articulado da petição do revertido (cfr. 15°), e até porque, e em conformidade com o preceituado na aI. b) do n° 2 do art. 153° do CPPT, existe fundada insuficiência de bens.
7. Bens esses apreendidos pelo Sr. Administrador de Insolvência, como resulta do exposto no ponto 5 da decisão de insolvência decretada pelo TJ Lamego, 2° juízo.
8. Ainda neste seguimento os créditos da FN foram apresentados em sede de insolvência, nos termos do n°4 do art. 129° do CIRE, bem corno em face da art. 146° desse diploma.
9. Prosseguindo o âmbito da reversão e atenta a sua natureza, ficam sujeitos a este procedimento, entre outros, os administradores que exerçam funções de administração e gestão, e tendo em conta o facto gerador da responsabilidade em face da exposto do n° 1 do art. 24° da LGT.
10. Neste propósito importará ter em conta que o eventual revertido à data da constituição e vencimento das dívidas era gerente da sociedade, exercida rio período de 31-03-2004 a 01-03-2010, data que efectivou a renúncia a essa mesma gerência, pela Ap. 59120100131.
11. Tocante à questão do arquivamento do inquérito participado pela Seg. Social relativo a dívidas de Janeiro de 2008 a Julho de 2009, a dai resultante o seu arquivamento, não poderá este SF tomar por analogia esse mesmo arquivamento, porquanto as dívidas em questão nos presentes autos se reportarem a outros períodos de tributação, nem tão pouco ser do conhecimento deste SF dos elementos que consubstanciaram a instauração desses autos, para além do facto de estarem junto a outros autos de execução que correm demais termos neste SF, em concreto o processo de execução 2542200101002040 e apensos, elementos que concretizam uma prática de actos e procedimentos de gestão por parte do eventual revertido, elencados nos pontos subsequentes.
12. Atento o exposto e prosseguindo a tramitação processual e verificado o exercício de gerência de direito e de facto do responsável, durante o período das dívidas e analisado o termo do prazo de pagamento das mesmas ter-se-á presente a informação fáctica consubstanciada noutros autos de execução (2542200101002040 e apensos), em que também o referido SP figura como revertido, designadamente:
- Procuração outorgada no CN Lamego em 18-03-2004, em que os então gerentes aí melhor identificados nomeiam mandatário ou procurador da sociedade o já identificado SP, dando-lhe efectivos poderes de gerência e de representação social da mesma sociedade, de forma a praticar os actos elencados nas categorias numeradas de 1 a 24 da referida procuração, junto a fls. 38 a 40.
- Print informático da Segurança Social, junto a fis. 110, verificando o enquadramento como membro de órgão estatutário entre 01-03-2004 a 01-03-2010 e procedendo a contribuições por essa figura
- Fotocópia do teor da matrícula da referida sociedade da Conservatória de Registo Comercial de Lamego, junta a fls. 112 a 116, indicando a gerência a cargo do já mencionado SP A..., desde a data de 31-03-2004, com renúncia a essas funções de gerente em 01-03-2010 (Ap. 59120100331).
- Requerimento dirigido ao Sr. Gestor Judicial da sociedade datado de 01-03-2010, respeitante à rescisão do contrato de trabalho, informando da decisão de renúncia ao mandato de gerente, junto a fls. 161.
Verifica-se também que se encontram junto a fls 05 e 06 dos presentes autos avisos de recepção - citações pessoais, datados de 22-01-2010 em nome do devedor principal, encontrando-se todos eles assinados pelo agora responsável subsidiário acima identificado à data de 01-02-2010.
Igualmente e por consulta à IES, consistindo numa obrigação declarativa de natureza fiscal, contabilística e estatística comunicando informação das contas do principal devedor perante diversas entidades (Banco Portugal, AT, Conservatórias e INE), verifica-se que referente aos períodos de tributação 2004, 2005 e 2006, o representante da empresa aí identificado é o SP revertido nestes autos, comprovando-se, por esta via, o exercício de representatividade legal do devedor principal.
De igual modo e constando a informação nos anteriores autos já referidos, verifica-se que o eventual revertido praticava actos de gerência, mesmo após a nomeação do gestor judicial por despacho de 28-10-2004, contrariando o por si exposto no articulado n° 7 do exercício de audição prévia, informação concretizada em:
- Requerimento dirigido à Direcção de Finanças de Viseu de 08-05-2005 relativo a informações de dívidas da sociedade a este SF, em que o reconhecido SP assina na qualidade de gerente do devedor originário, junto a fls. 125.
- Requerimento dirigido a este SF de 16-05-2007 relativo a Informações dívidas de imposto de circulação de uma viatura em nome da sociedade, em que o supradito SP assina na qualidade de gerente do principal devedor, junto a fls. 127.
- Acta n° 8 da sociedade lavrada em 31-03-2004 em que o supradito SP é nomeado gerente, fixando-lhe uma remuneração líquida de € 2.500,00 mensais, permitindo igualmente uso de qualquer viatura da empresa e respectivo combustível, cfr. fls. 135.
13. Deste modo, verifica-se que de facto o SP sobredito, exercia de direito e de facto funções de gerência no principal devedor, dado que os elementos atrás elencados consubstanciam no exercício dessas funções.
14. Em face do apresentado e relativamente à questão da prática da gerência de direito e de facto do revertido A..., NIF 115 390 162, tendo em conta que o argumentado pelos articulados no exercício de audição prévia, não consubstanciam em algo de novo, nos sentido de alterar o projecto de decisão, dado que é inegável o exercício de administração/gerência por parte deste, afirmando o próprio no seu direito de exercício de audição (cfr. articulados 1 a 7), ressalvando que já desempenhava funções de gerente por força de procuração outorgada em 18-03-2004, aliás, anterior à nomeação como gerente.
15. Tendo presente o exposto, constatada a insuficiência de bens da originária devedora e tendo como fundamento legal o disposto no art. 153°, n.° 2, alínea b) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), ORDENO A REVERSÃO DA EXECUÇÃO, contra o subsidiário responsável A..., NIF 115.390.162, anteriormente identificado nos termos do artigo 23° e aI b) do n° 1 do art 24°, ambos da Lei Geral Tributária, pela quantia exequenda em dívida nestes autos, sendo-lhe imputada a dívida descrita no ponto 2 do presente documento, dado que a falta de pagamento é-lhe atribuível, atendendo que o prazo de pagamento ou entrega da prestação terminou em período de exercício do seu cargo de gerência.
16. A decisão funda-se na presunção legal de culpa, do gerente acima identificado, função que exerceu efectivamente, traduzindo-se esta, na prática de actos reveladores da administração da executada, e que contribuíram para o estado falimentar da responsável principal, baseada em informações oficiais que o interessado não contrariou.
17. Os períodos de vigências da legislação invocada, e que antes se expressaram, vigoram não só para o período a que respeita a dívida, como também para aquele em que decorreu o respectivo prazo legal de pagamento.
18. Atenta a fundamentação supra, proceda-se à citação do executado por reversão, nos termos do artigo 160° do CPPT, tendo em atenção o disposto no artigo 191°, n.° 3 do mesmo Código, para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (n.° 5 do artigo 23º da LGT).
Averbamentos necessários.
- cfr. fls. não numeradas do PEF apenso aos autos.
C) O oponente foi citado, na qualidade de devedor subsidiário, em 07/04/2014 – cfr. fls. não numeradas do PEF apenso aos autos.
Factos não provados
Com relevo para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos, nomeadamente os factos vertidos nos artigos 25.º, 26.º, 32.º e 41.º da petição inicial.
Motivação da matéria de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto provada teve por base a análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos, os quais não foram impugnados, tudo conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.
No que tange aos factos dados como não provados, resultam, em essência, de sobre os mesmos não ter sido produzida prova documental e testemunhal bastante, pelas razões que se passam a explicitar.
P…, contabilista da sociedade devedora originária, entre 2006 e 2009, referiu que foi contratado pelo Dr. C… e que era este quem lhe pagava os serviços de contabilidade.
Mais referiu que o Dr. C… tinha de validar todas as decisões, aprovava os encerramentos das contas e determinava o pagamento ou não pagamento das dívidas fiscais.
Mencionou ainda que a empresa tinha créditos antigos sobre clientes que se encontravam por cobrar, mas que os trabalhos correntes iam sendo pagos.
Mais declarou que a empresa tinha um vasto património imobiliário, créditos sobre clientes e garantias bancárias retidas cujo valor era suficiente para pagar as dívidas, no entanto, admitiu não saber o valor dos bens e dos mencionados créditos, nem identificar os clientes devedores, nem se foram ou não efetuadas diligências para cobrança dos créditos.
R…, funcionário da sociedade devedora entre 2007 e 2009, onde exerceu funções relacionadas com a faturação e recebimentos das obras, referiu que o Prof. P… lhe disse que só o podia contratar se o Gestor Judicial autorizasse e que era este quem tomava todas decisões.
Mencionou que o Prof. P… queria encerrar a empresa, mas que o Dr. C… dizia que a empresa tinha viabilidade.
Relativamente ao património da sociedade devedora originária, fez referência à existência de dois estaleiros, escritórios, máquinas, carros e as próprias obras, mas não soube quantificar valores.
Assunção…, engenheira civil, funcionária da sociedade devedora originária entre 2002 e novembro de 2004, referiu que o Prof. P… adotou várias medidas de contenção de custos, tais como o encerramento de instalações onde funcionavam os escritórios da empresa e transferência para o estaleiro, reformulação de orçamentos das obras, renegociação de contratos.
Acrescentou que as dificuldades económicas que a sociedade já atravessava aquando da nomeação do Prof. P… como gerente deveram-se à má gestão do Sr. M… e do seu filho.
Referiu ainda que após a nomeação do Gestor Judicial, Dr. C…, era este quem decidia, no entanto, quanto a este aspeto, importa realçar que esta nomeação ocorreu em 24/10/2004 e que a testemunha deixou de exercer funções na sociedade devedora originária em meados de novembro de 2004.
S…, engenheiro civil, funcionário da sociedade devedora originária entre 2004 e setembro de 2006, afirmou que a gestão corrente era feita pelo Prof. P…, mas que a última palavra em questões de maior responsabilidade era do Dr. C….
Disse ainda que no período em que trabalhou na sociedade devedora, o cliente, a Diocese de Lamego, pagava a pronto, o que permitia ir gerindo o dia a dia, salientando que a prioridade era pagar as contas correntes, os ordenados e os fornecedores.
J…, fornecedor da sociedade devedora originária até 2006, declarou que quem contratou o fornecimento de material foi o Prof. P…, com autorização do Dr. C….
Mencionou ainda que a sociedade, no período de exercício de funções dos antigos gerentes, ficou-lhe a dever 22.000,00 €, mas que a partir do processo de recuperação da empresa esta sempre lhe pagou os fornecimentos.
Manuel…, funcionário da sociedade devedora originária entre 1998 e 2008, afirmou que foi contratado pelo oponente, por determinação do Sr. M... e que não conheceu o Dr. C…, só ouviu falar dele.
O Tribunal não valorou positivamente o depoimento desta testemunha, porquanto apenas trabalhava nas obras, não tendo qualquer conhecimento da gestão da sociedade em concreto, como, aliás, reconheceu.
Da parte da Fazenda Pública, L…, técnico de administração tributária no Serviço de Finanças de Lamego, referiu que procederam à reversão das dívidas exequendas contra o oponente, por terem dado conta, mesmo após a nomeação do Gestor Judicial da entrada no Serviço de requerimentos apresentados pelo oponente em nome da sociedade devedora originária, por aquele constar, para efeitos de contribuições para a Segurança Social, como membro de órgão estatutário e por terem verificado que as deslocações ao Serviço de Finanças eram sempre feitas pelo oponente.
Mencionou ainda que a insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária resulta da declaração de insolvência da sociedade devedora originária, pois que tal facto significa que a empresa não dispõe de património para assumir os seus compromissos.
Os depoimentos das testemunhas arroladas pela oponente revelaram-se insuficientes para a prova dos factos dados como não provados. Com efeito, importava que tivesse sido reunida prova documental que permitisse aferir a situação patrimonial e financeira da empresa e comprovar os créditos sobre os clientes, devendo ainda ser demonstrada a realização de diligências com o propósito de obter o seu cumprimento.
As testemunhas referiram a existência de créditos sobre clientes e cauções retidas.
Todavia, nesta matéria importava que tivesse sido reunida prova documental que permitisse comprovar o valor dos créditos detidos sobre clientes e que alegadamente não foram recebidos, bem como aferir do seu impacto na situação económico-financeira da sociedade devedora originária.
Por outro lado, seria ainda relevante a demonstração das diligências encetadas com o propósito de obter o recebimento desses créditos.
De facto, o oponente não juntou aos autos comprovativo da entrada em Tribunal de quaisquer ações judiciais destinadas a obter a cobrança coerciva dos seus créditos. E ainda que não fosse exigível a demanda judicial dos seus clientes, impunha-se, no mínimo, que tivesse diligenciado no sentido de obter os seus créditos através do envio de cartas de cobrança, quer por si, quer através de apoio jurídico de advogado. Nada foi alegado neste concreto aspeto, nem tão pouco demonstrado, pois que, para além da inexistência da prova documental, os depoimentos das testemunhas revelaram-se vagos e imprecisos.
Acresce, ainda, que o mero facto de um determinado sector estar em crise, pese embora as dificuldades que as empresas possam em tais períodos sentir, não constitui justificação para o não cumprimento das suas obrigações fiscais ou para a insuficiência de bens para o seu pagamento, pois que se assim fosse nenhuma empresa sobreviveria em condições de mercado adversas. Relevante seria que se alegasse e demostrasse que, em tal período de crise, apesar de todas as medidas tomadas, não se logrou obter os meios necessários à satisfação dos credores, incluindo a Administração Tributária. E essa prova, face à inconsistência dos depoimentos das testemunhas e inexistência de elementos documentais, não foi feita nos autos.
Relativamente à factualidade constante do artigo 41.º da petição inicial, para além da absoluta ausência da pertinente prova documental, os depoimentos das testemunhas a este respeito revelaram-se vagos e imprecisos, não permitindo ao Tribunal valorá-los positivamente.”

2. O Direito

Face às conclusões de recurso, a única questão que importa apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que a administração tributária não demonstrou, como lhe competia, a fundada insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
Sobre esta questão colocada no presente recurso já este tribunal, no passado dia 07/12/2017, no âmbito do processo n.º 360/14.6BEVIS, se pronunciou, estando aí em causa outro processo de execução fiscal também revertido contra o ora Recorrido e sobre o qual, igualmente, este havia deduzido oposição.
Em função da sua semelhança em relação ao caso sub judice e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil), cabe ter presente o exposto no mencionado Acórdão deste Tribunal de 07/12/2017, Processo n.º 360/14.6BEVIS, nos termos que passamos a transcrever:
“(…) Argumenta a Fazenda Pública, em síntese, que (i) a insuficiência patrimonial da devedora originária para satisfazer a dívida exequenda resulta demonstrada no despacho de reversão, porquanto a devedora originária foi declarada insolvente e a eventual existência de património da empresa insolvente, não obsta à reversão da execução fiscal, impondo apenas o respeito dos limites da excussão prévia estabelecidos no nº 2 do art. 23º da LGT e (ii) que o Oponente não demonstrou que à data do despacho de reversão não se verificavam os pressupostos do seu chamamento à execução, nomeadamente no que concerne à fundada insuficiência dos bens do devedor principal.
Vejamos.
No que aqui importa, preceitua o art. 23º da LGT:
“1. A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
2. A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão.
3- Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei (…)”.
Por sua vez, o art. 153º, nº 2 do CPPT estabelece que “o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores; b) fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido”.
Atento o carácter subsidiário da responsabilidade tributária (cf. art. 22º, nº 3 da LGT), o órgão de execução fiscal está obrigado a exigir a prestação tributária em primeiro lugar ao devedor originário ou aos eventuais responsáveis solidários, satisfazendo o crédito somente à custa dos seus bens, e só no caso de se provar a inexistência ou insuficiência fundada de bens daqueles é que pode exigi-la aos devedores subsidiários.
É, portanto, pressuposto da reversão, accionando validamente os gerentes ou administradores por dívidas fiscais da empresa que representam, que esta não tenha bens suficientes para através deles se obter o pagamento dos débitos (benefício da excussão).
No caso, a reversão da execução contra o Oponente (responsável subsidiário) teve como fundamento a insuficiência do património societário da devedora originária, sendo que os únicos elementos em que o órgão de execução fiscal fez assentar essa conclusão se reconduziram à situação líquida negativa (SLN) decorrente última da declaração referente à Informação Empresarial Simplificada e à informação de que a sociedade havia sido declarada insolvente.
E a este propósito, na sentença recorrida a exarou-se o seguinte: “ (…) Ora, tais elementos são, a nosso ver, insuficientes para que se possa concluir, sem maiores indagações, pela insuficiência patrimonial da devedora originária.
É que uma coisa é a sociedade devedora originária não possuir quaisquer bens penhoráveis. Outra coisa, bem diferente, é tais bens existirem, mas serem insuficientes para solver a dívida exequenda e o acrescido.
Deste modo, tendo o órgão de execução fiscal enveredado pela insuficiência de bens da devedora originária, cabia-lhe demonstrar que os bens existentes, os quais não identifica, são insuficientes para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido legal.
Ou seja, para que se pudesse concluir pela insuficiência de bens da sociedade devedora originária, impunha-se, desde logo, que o órgão de execução fiscal identificasse concretamente os bens existentes e que os quantificasse.
Esse dever de proceder a averiguação sobre a existência de bens penhoráveis e obter provas da insuficiência é reconhecido pela própria Administração Tributária, como se pode constatar pelo ofício circulado n.º 60043, da Direção dos Serviços de Justiça Tributária, em que se refere que a reversão envolve os seguintes procedimentos prévios:
a) A averiguação da existência ou não de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores;
b) A comprovada insuficiência do património do devedor originário para satisfazer a dívida exequenda e acréscimos legais.
c) Só após tais diligências estarem efetuadas se deve oficiar às entidades competentes, designadamente à Conservatória do Registo Comercial da área da sede dos devedores originários, no sentido de se obter a identificação dos responsáveis subsidiários, a qual deve também constar das certidões de dívida emitidas nos termos do art. 88.º do CPPT.
Com efeito, não é o facto de ter sido declarada insolvente que permite concluir, sem mais, ser manifesta a insuficiência patrimonial da devedora originária para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
Como refere Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado, Volume III, Áreas Editora, em anotação ao citado artigo 153.º do CPPT, “em sintonia com o preceituado no n.º 1 do art. 23.º da LGT e no n.º 3 do art. 9.º do CPPT […], deverá entender-se que os responsáveis subsidiários só poderão ser chamados a uma execução fiscal que seja instaurada inicialmente contra o devedor originário ou responsáveis solidários. Na verdade, embora se pudesse aventar uma interpretação restritiva daquelas normas, restringindo o seu alcance aos casos em que não esteja ab initio comprovada a insuficiência patrimonial do devedor originário (como em regra sucederá nos casos em que foi declarada a falência ou insolvência e em que foi excutido o património do devedor originário), não se pode excluir a possibilidade de o falido vir a adquirir bens, como, aliás, se prevê expressamente no n.º 5 do art. 180.º do CPPT.
Por outro lado, embora a declaração de falência (atualmente, à face do CIRE, de insolvência) implique a dissolução das sociedades comerciais e a entrada destas em liquidação [arts 141.º, n.º1, alínea e), 146.º, n.º 1 do CSC], a sociedade em liquidação mantém a sua personalidade jurídica (art. 146.º, n.º 2 do mesmo Código) e até poderá retomar a sua atividade [como se prevê nos arts 234.º, n.º 2 e 230.º, n.º 1, alínea c) do CIRE], pelo que aquela declaração não pode ser considerada bastante para comprovar a insuficiência do património.
Por isso, mesmo nos casos em que tenha ocorrido falência ou insolvência, será necessário instaurar um processo de execução fiscal dirigido contra o falido ou insolvente, sendo nele que haverá que comprovar de forma atualizada a insuficiência do património do devedor originário[sublinhado nosso].
Ora, no caso em apreço, a Administração Tributária nem sequer identifica os bens que integram o património da sociedade devedora originária, o que só por si impossibilita a formulação de qualquer juízo fundado acerca da insuficiência desses bens para assegurar o pagamento da dívida exequenda revertida, cujo montante ascende a 1.968,72 €, tão pouco quantifica o valor desses bens.
É certo que tais bens poderão vir a revelar-se, em concreto, insuficientes para assegurar o pagamento da dívida exequenda, no entanto, cabia ao órgão de execução fiscal demonstrá-lo, o que no caso não fez. (…)”
Concordamos com o assim decidido. Na verdade, considerando que no despacho de reversão apenas se invoca, como fundamento da alegada fundada insuficiência do património societário para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido, a situação líquida negativa da sociedade decorrente da última declaração fiscal e a declaração de insolvência da sociedade, e sendo certo que é à administração tributária que cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais de que depende a reversão [incumbindo-lhe designadamente a demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário (ou, no caso de existirem, que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda)], não pode deixar de se concordar com a sentença recorrida quando afirma que esses elementos não permitem, sem mais, que se conclua pela insuficiência de património da devedora originária, uma vez que esse pressuposto de reversão não se basta com a mera afirmação da probabilidade da sua existência. cf. acórdão do STA de 24/2/2016, Processo 0700/15.
(…)”
Atenta a total transposição e validade do assim decidido para os presentes autos, impõe-se negar provimento ao recurso.

Conclusão/Sumário

I – É à administração tributária que cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais de que depende a reversão.
II - Face à insuficiência do património do originário devedor é possível fazer reverter a execução contra o responsável subsidiário.
III – Há fundada insuficiência do património do originário devedor se for possível concluir que o valor dos seus bens (quantificado) é manifestamente insuficiente para satisfação da dívida exequenda e do acrescido.
IV - Incumbe, portanto, à administração tributária, designadamente, a demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário ou, no caso de existirem, que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda.
V – Se, no despacho de reversão, apenas se invoca, como fundamento da alegada fundada insuficiência do património societário para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido, a situação líquida negativa da sociedade decorrente da última declaração fiscal e a declaração de insolvência da sociedade, esses elementos não permitem, sem mais, que se conclua pela insuficiência de património do devedor originário, uma vez que esse pressuposto de reversão não se basta com a mera afirmação da probabilidade da sua existência.

III. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 21 de Dezembro de 2017
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro