Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02821/17.6BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/30/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR: PROVIDÊNCIA CAUTELAR; DEMISSÃO DE AGENTE POLICIAL;
Sumário:
1 – A aplicação de pena expulsiva, designadamente de membros de forças policiais, só deverá ter lugar quando a conduta do arguido atinja de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição que integra, que a sua não aplicação degradaria a imagem dessa entidade, pela imagem de impunidade permissiva que transmitiria.
A aplicação de uma pena expulsiva pressuporá pois a prática de “infrações disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional” (artigo 47º do RD/PSP).
2 – Tendo as próprias Juntas Médicas realizadas, confirmado as incapacidades declaradas do Recorrente, decorrentes de acidente de serviço, mais reconhecendo “os clínicos que acompanharam o Requerente, assim como o Instituto de Medicina Legal (...) que o Requerente podia desenvolver prática desportiva de futsal como forma de recuperação, apesar de se encontrar incapaz para o trabalho no período em causa”, mal se compreende como se enveredou pela aplicação de pena expulsiva.
3 - Tendo-se verificado na aplicação da pena expulsiva, a violação designadamente dos princípios da justiça e da proporcionalidade, naturalmente que a intervenção dos tribunais se mostra legitima, e não violadora do princípio da separação de poderes (artigos 7º e 8º do CPA). *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Ministério da Administração Interna
Recorrido 1:MMA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no qual, a final, se pronuncia "no sentido da procedência do presente recurso jurisdicional".
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Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
O Ministério da Administração Interna, no âmbito de Providência Cautelar apresentada por MMA, Agente da PSP, em 06/12/2017, tendente, em síntese, à suspensão de eficácia da decisão que determinou a sua demissão, inconformado com a Sentença proferida 26 de janeiro de 2018 que deferiu a requerida providência e suspendeu o ato de aplicação da pena de demissão, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
Formula o aqui Recorrente/MAI nas suas alegações de recurso, apresentadas em 16 de fevereiro de 2018, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 154v a 158 Procº físico):
I. A Douta Sentença Recorrida, salvo o devido respeito, padece de erro na interpretação e aplicação do direito, na medida em que, contrariamente ao que ali se decidiu, a decisão punitiva está devidamente fundamentada;
II. A Douta sentença, limitando-se a aludir ao artigo 49.º do RDPSP, não considera o estabelecido no artigo 47.º, n.º 2, do RDPSP, onde se indica de forma exemplificativa, os comportamentos que impossibilitam a relação de confiança indispensável à manutenção do vínculo funcional, no qual se inclui as situações infracionais em que a conduta do infrator é manifestamente desadequada e contrastante com o que lhe é exigido;
III. O despacho, de 17 de outubro de 2017, da Senhora Ministra da Administração Interna, que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão, foi praticado em plena conformidade à lei e não enferma de qualquer vício ou violação de lei que ponha em causa a sua validade;
IV. Nos termos do 47.º, n.ºs 1 e 2 do RD/PSP, estabelece-se que as penas de aposentação compulsiva e de demissão são aplicáveis, em geral, por infrações disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional;
V. Na presente situação a entidade competente para o efeito, a Senhora Ministra da Administração Interna, concluiu que o comportamento prosseguido pelo ora recorrido constitui infração disciplinar inviabilizadora da manutenção da relação funcional;
VI. Nessa conformidade, a pena de Demissão prevista nos artigos 25.º, n.º 1, alínea g), 43.º, 47.º, n.º 1 e 49.º, todos do RD/PSP, aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro, revela-se adequada e proporcional à gravidade das infrações disciplinares, cometidas com elevado grau de culpa, pondo em causa o prestígio e o bom nome da instituição, inviabilizando a manutenção da relação funcional;
VII. Em sede das penas disciplinares, o princípio da proporcionalidade postula a adequação da pena imposta à gravidade dos factos apurados;
VIII. O poder administrativo disciplinar encerra alguma discricionariedade administrativa;
IX. Trata-se de um poder-dever conferido pela lei a um órgão administrativo para que este escolha, de entre uma série limitada ou ilimitada de comportamentos possíveis, aquele que lhe pareça em concreto mais adequado à satisfação da necessidade pública específica prevista na lei;
X. É pacífico que a fiscalização jurisdicional da discricionariedade administrativa exerce-se quanto ao cumprimento dos princípios constitucionais e gerais da atividade administrativa e contra o erro grosseiro de facto ou de direito;
XI. Ora, in casu, não resultaram ofendidos aqueles princípios e não existe erro grosseiro;
XII. Quando as condutas infraccionárias atingem uma gravidade tal que das mesmas resulta não ter sido o funcionário capaz de se adaptar ao serviço e interiorizar, responsavelmente, as suas funções, prevê a lei a pena de demissão ou aposentação compulsiva com o afastamento do funcionário que se revelou inadaptado às funções e, por isso, não merecedor da confiança que os cidadãos e a Administração nele depositaram (cfr. o Acórdão da 1 Subsecção do CA do STA, de 05-05-2011, Processo 0934/10);
XIII. A valoração das infrações disciplinares como inviabilizadoras da manutenção da relação funcional tem de assentar na gravidade objetiva dos factos cometidos e no reflexo dos seus efeitos no desenvolvimento da função exercida e no reconhecimento, através da natureza do ato e das circunstâncias em que foi cometido, de que o seu autor revela uma personalidade inadequada ao exercício dessas funções (cfr. Ac. da 2.ª Subsecção do STA, de 01-04-2003, Proc.º 1228/02);
XIV. O artigo 47.º, n.º 2, do RD/PSP, indica de forma exemplificativa os comportamentos que impossibilitam a relação de confiança indispensável à manutenção do vínculo funcional e inclui as situações infracionais em que a conduta do infrator é manifestamente desadequada e contrastante com o que lhe é exigido;
XV. E no caso em apreço, as infrações cometidas pelo arguido, ora recorrido, revelam um acentuado desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais e falta de idoneidade moral para o exercício das suas funções, devendo a culpa ser graduada a um nível integrador de especial censurabilidade;
XVI. O ato aqui posto em crise foi proferido no âmbito de um procedimento disciplinar que decorreu de forma regular, tendo sido concedidas ao Autor, ora recorrido, todas as garantias de defesa, não se verificando vícios suscetíveis de constituírem nulidades insanáveis, nos termos dos artigos 80.º e 84.º a 86.º do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP), aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro;
XVII. Quanto à matéria de facto verifica-se que os factos encontram-se inequivocamente provados, sendo manifesto que o arguido, ora recorrido, praticou os factos constantes da acusação;
XVIII. O ora recorrido bem sabia que a sua conduta era proibida por lei e disciplinarmente censurável, sabia que a conduta lhe estava vedada e que por ela poderia vir a ser disciplinarmente punido, tendo-se conformado com essa conduta, revelando um claro e grave desrespeito por normas de serviço e um evidente e acentuado desinteresse pelo cumprimento de deveres profissionais, pondo em causa o interesse do Estado, violando o seu estatuto profissional;
XIX. O arguido, ora recorrido, constituiu-se como um péssimo exemplo, seja perante a sociedade, seja perante a Corporação, inviabilizando a manutenção da relação funcional, pelo que as exigências de prevenção implicam que seja punido com pena expulsiva, em concreto, a pena de demissão;
XX. Quanto à alegada prescrição do procedimento disciplinar, cumpre referir que a mesma não se verificou;
XXI. O n.º 1 do art.º 1.º do RDPSP define que a legislação aplicável, no âmbito disciplinar, ao “pessoal com funções policiais nos quadros da Polícia de Segurança Pública (PSP), independentemente da natureza do respetivo vínculo, ainda que se encontre a prestar serviço permanente em outros organismos, em regime de requisição, destacamento, comissão de serviço ou qualquer outro” é aquele Regulamento, que é, para todos o efeitos, a lei especial aplicável ao procedimento disciplinar em apreço;
XXII. Há um princípio vigente no ordenamento jurídico português – fixado no Código Penal (cfr. artigo 121.º, n.º 3, no próprio Estatuto Disciplinar de 2008 (cfr. artigo 6.º, n.ºs 1 e 6) e, depois, na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, de 2014 (cfr. artigo 178.º, n.ºs 1 e 5) e no atual Regulamento de Disciplina da GNR, alterado pela Lei n.º 66/2014 (cfr. artigo 46.º, n.ºs 11 e 7) acerca da prescrição dos procedimentos: a prescrição do procedimento disciplinar terá sempre lugar quando desde o seu início, e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade;
XXIII O artigo 55.º do RDPSP, datado de 1990, apresenta uma lacuna em matéria de prescritibilidade do procedimento administrativo;
XXIV. O artigo 66.º do RDPSP indica – agora – como “direito subsidiário” o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (EDTEFP), aprovado pela Lei 58/2008, de 9 de Setembro e, a partir de 2014, a Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei 35/2014, de 20 de Junho;
XXV. O estatuto disciplinar subsidiário tem uma norma sobre prescritibilidade do procedimento: a norma do artigo 6.º, n.º 6, do Estatuto Disciplinar de 2008 e a norma do artigo 178.º, n.º 5, da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas;
XXVI A integração da lacuna do artigo 55.º do RDPSP não se cumpre mediante uma operação de copiar/colar a norma do artigo 6.º, n.º 6 (e artigo 178.º, n.º 5) do estatuto disciplinar subsidiário;
XXVII. A norma do artigo 6.º, n.º 6 (e artigo 178.º, n.º 5) do estatuto disciplinar subsidiário está corretíssima quando inserida no seu próprio contexto: estabelece com a norma do artigo 6.º, n.º 1 (e 178.º, n.º 1) o princípio vigente no ordenamento jurídico português, acima referido;
XXVIII. Mas a mesma norma já não estabelece o referido princípio quando conjugada com a norma do artigo 55.º, n.º 1 do RDPSP - na qual se estabelece que o direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve passados três anos sobre a data em que a infração tiver sido cometida, sendo que o prazo de prescrição do próprio procedimento disciplinar corresponde a este prazo, acrescido de metade – 4 anos e meio;
XXIX. Significa que não é essa norma aquela que, nos termos do artigo 10.º do Código Civil se mostra adequada a integrar a lacuna detetada no artigo 55.º, do RDPSP. E qual é ela, então?
XXX. É a norma que estabeleça com a norma do 55.º, n.º 1, do RDPSP o princípio atrás enunciado. Concretizando;
XXXI. É uma norma idêntica à que é prevista no artigo 46.º, n.º 7 do Regulamento de Disciplina da Guarda Nacional Republicana, aprovado pela Lei n.º 145/99, de 1 de setembro, alterado pela Lei n.º 66/2014;
XXXII. Significa que o prazo de prescrição do procedimento disciplinar na PSP é de quatro anos e meio;
XXXIII. Atento o descrito, e contrariamente ao alegado pelo ora recorrido, verificamos que não ocorreu a prescrição do presente processo disciplinar;
XXXIV. A atuação do ora recorrido é inaceitável no seio de uma força de segurança cujo desiderato é cumprir e fiscalizar o cumprimento da Lei e quando tal não sucede a imagem da força de segurança que o recorrido integra sofre danos e prejuízos de enorme amplitude decorrentes da manifesta falta de idoneidade moral que o recorrido demonstrou para o exercício das suas funções;
XXXV. Desta forma encontra-se fundamentada a proposta de aplicação da pena disciplinar de Demissão, conforme prova recolhida nos autos, devidamente analisada no Relatório Final, revelando-se a citada pena disciplinar como proporcional e adequada face à gravidade do comportamento do ora recorrido;
XXXVI. Existe um interesse público específico, qualificado e concreto que consiste na manutenção da imagem de correção e legalidade na atuação dos agentes da PSP que não é compatível com a manutenção em funções do Autor, ora recorrido, – e tal circunstância determina a inviabilização da manutenção da relação funcional, fundamentando a aplicação de uma pena expulsiva, neste caso a Demissão;
XXXVII. Ora, ao decidir como decidiu a Douta sentença, o Tribunal incorreu em manifesto erro de interpretação de facto e direito, pois, encontra-se suficientemente demonstrado que a conduta do ora recorrido encerra um grau de desvalor tal que quebra irremediavelmente a confiança que deve existir entre a Corporação e os seus agentes, tornando-se por isso inviabilizadora da sua manutenção no exercício da função policial, ou com hipótese de o vir a fazer.
Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de vossas excelências, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deverá ser revogado o, aliás, douto acórdão, de 26 de janeiro de 2018, ora recorrido, que padece de erro na interpretação e aplicação de direito.
*
O aqui Recorrido/MMA veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 5 de março de 2018, nas quais concluiu (Cfr. fls. 205v a 209 Procº físico):
A. A douta sentença recorrida não padece de qualquer erro de interpretação e de aplicação do direito, pois considerou e concluir, e bem, estarem verificados todos os pressupostos para a concessão da providência cautelar requerida, nos presentes autos, nomeadamente,
i) O fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Recorrido visa assegurar no processo principal (periculum in mora)
ii) A elevada probabilidade da pretensão formulada no processo principal vir a ser julgada procedente (fumus boni juris)
iii) E da ponderação dos interesses públicos e privados em presença decorre que o recorrente nunca concluiu durante a pendencia do processo disciplinar, mais de três anos, pela inconveniência para o serviço ou para o apuramento da verdade a manutenção em funções do Recorrido (proporcionalidade e adequação da providência).
B. O Tribunal a quo deferiu a providência por reputar, e bem, estarem demonstrados os respetivos pressupostos.
C. Da leitura da douta sentença, a mesma mostra-se extremamente assertiva tanto no quadro factual exposto, como na apreciação jurídica.
D. A aplicação de uma media expulsiva só poderá ter lugar quando a conduta do infrator atinge de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição de que faz parte que a sua não aplicação não só iria contribuir para degradar a imagem de seriedade e de isenção dessa instituição como também poderia ser considerada pela opinião pública como chocante ou escandalosa
E. Por ser assim é que a aplicação daquela pena ao Recorrido depende da prática de “infrações disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional” (art.º 47.º/1 do RD/PSP), isto é, de comportamentos capazes de minar de forma inapagável não só a imagem de prestígio e de credibilidade daquela Corporação como também a confiança que nelas depositam os cidadãos e que, por isso, impossibilitem a relação de confiança indispensável à manutenção do vínculo funcional.
F. Todavia, a aplicação deste tipo de medida não é arbitrária visto o RD/PSP estabelecer que a pena de demissão está reservada - é especialmente aplicável - àqueles que tiverem cometido crimes dolosos puníveis com pena de prisão superior a três anos, aos que abusem dos poderes de autoridade conferidos por lei ou que pratiquem crimes contra o Estado.
G. O que no caso em concreto, tal não aconteceu, como ficou demonstrado.
H. O Recorrente pretende aplicar a pena de demissão recorrido por um facto que reputa como falso, quando sucessivamente confirmou através dos seus serviços a incapacidade temporário do Recorrido para prestar serviço.
I. Nunca o Recorrido faltou injustificadamente ao serviço, nem apresentou atestados médicos falsos, ao invés os mesmos foram confirmados pelas Juntas Médicas e Junta Superior de saúde da PSP.
J. O Recorrente não demonstrou a inconveniência para o serviço ou para o apuramento da verdade a manutenção em funções do Recorrido, como lhe competia.
K. Não existem dano para o interesse público que se mostrem superiores aos prejuízos que o Recorrido teria caso a providência fosse recusada.
L. O Recorrido demonstrou e provou que a aplicabilidade da pena de Demissão, causaria prejuízos irreparáveis ao ver a perda total de rendimentos que aufere para fazer face às suas necessidades básicas de sobrevivência.
M. A Administração/Recorrente não goza do poder de escolha arbitrária da pena de demissão, estando antes vinculada à verificação dos seus pressupostos, o que não foi demonstrado pelo Recorrente nos presentes autos.
N. A douta sentença recorrida fez uma correta leitura do instituto jurídico invocado e dos critérios legalmente consagrados no artigo 120º do CPTA, subsumindo com acerto os factos aos preceitos invocados. Sem prejuízo,
O. Integrando o arguido no processo disciplinar os quadros do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública (PSP), o quadro normativo que rege o processo disciplinar de que foi alvo é o que consta do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP), aprovado pela Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro (com as alterações entretanto introduzidas pela Lei nº 5/99, de 27 de Janeiro, e pelo DL. nº 255/95, de 30 de Setembro), o que resulta do disposto no seu artigo 1º nº 1 (de acordo com o qual este Regulamento “…aplica-se ao pessoal com funções policiais dos quadros da Polícia de Segurança Pública (PSP), independentemente da natureza do respetivo vínculo, ainda que se encontre a prestar serviço permanente em outros organismos, em regime de requisição, destacamento, comissão de serviço ou qualquer outro”) e igualmente resulta do expressamente disposto no artigo 1º nº 3 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro (de acordo com o qual o mesmo não é aplicável aos “…os trabalhadores que possuam estatuto disciplinar especial”) e do artigo 2º nº 2 da atual Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de Junho (que, sob a epígrafe “exclusão do âmbito de aplicação”, estatuí não ser a mesma aplicável, entre outros, “…ao pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública, cujos regimes constam de lei especial”).
P. O regime disciplinar (geral) a que se encontra submetida a generalidade dos trabalhadores da Administração Pública apenas é aplicável ao pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública (PSP) enquanto direito subsidiário, em conformidade com o artigo 66º do EDPSP (Lei nº 7/90), nos termos do qual “o processo disciplinar rege-se pelas normas constantes do presente Regulamento e, na sua falta ou omissão, pelas regras aplicáveis do estatuto disciplinar vigente para os funcionários e agentes da administração central e da legislação de processo penal”.
Q. A questão em torno da interpretação do artigo 55º nº 3 do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RDPSP), aprovado pela Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro, que sob a epígrafe “Prescrição do procedimento disciplinar”, dispõe que o direito de instaurar procedimento disciplinar prescreve “…se, conhecida a falta pela entidade com competência disciplinar, não for instaurado procedimento no prazo de três meses”, passa pela resolução de duas questões, que são, i) a de saber qual a «entidade com competência disciplinar» para efeitos daquele normativo, e ii) a de saber quando deve ter-se por ela «conhecida a falta».
R. Os prazos de prescrição de procedimentos disciplinares têm intuitos garantísticos; e se assim é, o conhecimento da falta disciplinar como início do prazo de prescrição para instauração do processo disciplinar não pode reconduzir-se a um elemento subjetivo totalmente indeterminado ou indeterminável (o que possibilitaria que o início da sua contagem estivesse dependente do arbítrio da Administração), tem antes que alicerçar-se em elementos objetivos, suscetíveis de demonstração.
S. O Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, dispôs inovatoriamente no seu artigo 6º nº 6, face ao anterior Estatuto Disciplinar dos Funcionário e Agentes da Administração Central, Regional e Local (DL. nº 24/84), que não previa norma idêntica ou equivalente, que “o procedimento disciplinar prescreve decorridos 18 meses contados da data em que foi instaurado quando, nesse prazo, o arguido não tenha sido notificado da decisão final”.
T. Se o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Lei nº 58/2008) introduziu uma nova causa de prescrição – a prescrição do procedimento disciplinar – estabelecendo inovatoriamente um prazo máximo para a sua duração (que não existia no anterior regime disciplinar do DL. nº 24/84), prazo com finalidades garantísticas, e se o regime disciplinar próprio do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública (PSP) constante da Lei nº 7/90, não afasta (nem afastou, após a aprovação e entrada em vigor da Lei nº 58/2008) tal causa de prescrição, nem prevê prazo específico distinto daquele, tem que proceder-se à aplicação supletiva daquele normativo, em consonância com o disposto no artigo 66º do RDPSP (Lei nº 7/90).
U. O processo disciplinar dos presentes autos encontra-se prescrito, atenta a disposição legal , art 178º nº 5 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei nº 35/2014, de 20 de junho, e o artigo 66º do RD/PSP.
V. Assim, mantendo a decisão recorrida, farão V. Exª a inteira Justiça.
Termos em que, e nos melhores de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exªs deverá o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, e em consequência manter-se a douta decisão recorrida, fazendo assim a inteira e sã Justiça!”
*
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 12 de abril de 2018, veio a emitir Parecer em 17 de abril de 2018, no qual, a final, se pronuncia “no sentido da procedência do presente recurso jurisdicional” (Cfr. fls. 218 a 220 Procº físico).
*
Ambas as partes vieram a pronunciar-se relativamente ao Parecer emitido pelo Ministério Público, aí reiterando s suas posições.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscitou, designadamente, a verificação de erro na interpretação e aplicação do direito.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade provada:
1. O Requerente exerce funções de Agente da Polícia de Segurança Pública desde o ano de 2003 (por acordo);
2. Por despacho, de 30.06.2014, do Comandante do Comando Metropolitano de Polícia do Porto foi ordenada a instauração de processo disciplinar ao Requerente, que deu origem ao processo n.º 2014PRT00128DIS (Cfr. cópia de despacho, a fls. 3 do processo administrativo);
3. O procedimento disciplinar foi instaurado por factos ocorridos nos anos de 2013 e 2014;
4. A instauração do procedimento disciplinar foi notificada ao Requerente em 2.10.2014 (cfr. declaração de notificação, a fls. 43 do processo administrativo);
5. Em 12.04.2016 foi proferida acusação no processo disciplinar, que foi notificada ao Requerente em 20.04.2016 (cfr. cópia da acusação e certidão de notificação, a fls. 155 e 159 do processo administrativo, respetivamente);
6. No âmbito do processo de disciplinar, em 12.08.2016, foi elaborado relatório, no qual consta, entre o mais, o seguinte:
V CONCLUSÃO
A. FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem.
B. FACTOS PROVADOS
O arguido sofreu uma queda quando se deslocava para um serviço remunerado, no dia 3-10-2012, de que lhe resultou uma entorse no joelho direito, acidente que foi qualificado como acidente de trabalho por despacho de 30-11-2012, sob o processo de sanidade com o NUP: 2012PRT00218SAN.
Em consequência do acidente, o arguido foi operado ao joelho direito (uma ligamento plastia ao LCA), no dia 22-10-2012.
Face ao exposto o arguido manteve-se de baixa médica, com incapacidade temporária absoluta desde 3-10-2012 até 7-10-2014, o que perfez 735 (setecentos e trinta e cinco) dias.
Durante o citado período o arguido foi abonado das remunerações e suplementos mensais, como se estivesse efetivamente a trabalhar, tal como decorre do disposto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, diploma que rege os acidentes de trabalho na Administração Pública.
O arguido, em 22-09-2012, antes de ter sofrido o acidente, foi considerado APTO, no Exame Médico Desportivo da AFP, para a época desportiva de 2012/2013.
O arguido, atleta federado, sénior, com a licença n.º 3…0, da equipa C.D.C B..., na modalidade de Futsal, para o Campeonato Distrital da 1ª. Divisão, Série 1, da AFP, não comunicou, nem pediu qualquer autorização superior para a prática desta modalidade desportiva e federada.
O arguido, no dia 11-05-2013, ainda de baixa médica, ao abrigo do processo de sanidade com o NUP: 2012PRT00218SAN, constou na relação de atletas que participaram no jogo de futsal a contar para o Campeonato Distrital da 1ª. Divisão, Sénior, Série 1, da AFP, entre a sua equipa e a equipa do SCS.
O arguido, no âmbito do processo n.º 1610/14.4T9PRT, que decorreu na 5ª Secção dos Serviços do Ministério Público, do Departamento de Investigação e Ação Penal do Porto, foi sujeito a exame médico-legal no INML, e aos quesitos formulados, e perante os elementos documentais clínicos, afigurou-se que à data de 26-04-2013, era adequada para a consolidação médico-legal da operação a que o arguido foi sujeito, e indicada no artigo 2.º, podendo ter uma atividade desportiva profissional de desportos com bola, após a data da consolidação médico-legal.
O arguido, em 22-09-2013, e ainda na situação de incapacidade temporária ao abrigo do processo de acidente de trabalho com o NUP: 2012PRT00218SAN, foi considerado APTO, no Exame Médico Desportivo da AFP, para a época desportiva de 2013/2014.
O arguido, atleta federado, sénior, com a licença n.º 6…2, da equipa C.D.C B…, na modalidade de Futsal, no Campeonato Distrital da 2ª Divisão, Série 1, da AFP, não comunicou nem pediu qualquer autorização superior, para a prática modalidade desportiva e federada.
Na época desportiva 2013/2014, a que se refere a modalidade e campeonato indicados no artigo anterior, o arguido participou em 35 (trinta e cinco) jogos de futsal, nomeadamente:
1 Em 02-10-2013, pelas 20H00, no Pavilhão Municipal de Arcozelo — V.N. de Gaia, contra o SCA.
2 Em 12-10-2013, pelas 21H30, no Pavilhão da B... - Matosinhos, contra o FPRT.
3 Em 19-10-2013, pelas 21H00, no Pavilhão Municipal de Lousada, contra o GACER.
4 Em 26-10-2013, pelas 21H30, no Pavilhão da B... -- Matosinhos, contra o A .C.D. M….
5 Em 03-11-2013, pelas 16H00, no P. Esc. D. Afonso Henriques, contra o C.D.S. SC.
6 Em 09-11-2013, pelas 21H30 no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o BFC.
7 Em 16-11-2013, pelas 20H00, no P. Esc. EB2/3 S. Romão do Coronado, contra o - GDC.
8 Em 23-11-2013, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o BSC.
9 Em 30-11-2013, pelas 21H00, no Pavilhão G.D. Viso/Porto, contra o GDV.
10 Em 14-12-2013, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o DBSR.
11 Em 21-12-2013, pelas 19H00, no Pavilhão Municipal Canidelo, contra o - U. C. RF.
12 Em 28-12-2013, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o G. JP.
13 Em 04-01-2014, pelas 21H00, no Pavilhão. C Complexo Desportivo de Labruge, contra o A. D. L….
14 Em 11-01-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o A. D. C….
15 Em 25-01-2014, peias 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o RD A. D.
16 Em 01-02-2014, pelas 21H00, no Pavilhão Escola Secundária de Canelas - Vila Nova de Gaia, contra o A. D. C. SI.
17 Em 08-02-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos; contra o AJFC.
18 Em 13-02-2014, pelas 21H00, no Pavilhão Municipal de Guifões - Matosinhos, contra o G. D. MA.
19 Em 15-02-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... – Matosinhos contra o SPG. CA.
20 Em 22-02-2014, pelas 20H00, no Pavilhão Municipal Foz do Sousa — Gondomar, contra o FPRT.
21 Em 04-03-2014, pelas 19H30, no Pavilhão Escola EB2/3 Mindelo, contra o A.C.D. M.
22 Em 08-03-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... Matosinhos, contra o C. D. S. SC.
23 Em 15-03-2014, pelas 21H00, no Pavilhão Municipal de Leça do Balio, contra o BFC.
24 Em 22-03-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... – Matosinhos, contra o GC.
25 Em 25-03-2014, pelas 21H00, no Pavilhão A. R. Freixieiro — Perafita, contra o GACER.
26 Em 28-03-2014 pelas 21H30, no Pavilhão Municipal Senhora da Hora, contra o BSC.
27 Em 05-04-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... – Matosinhos, contra o Grupo DV.
28 Em 19-04-2014, pelas 19H00, no Pavilhão Escola Nicolau Nasoni, contra o IDBSR.
29. Em 26-04-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... - Matosinhos, contra o U C. RF.
30 Em 01-05-2014, pelas 19H00, no Pavilhão Desportivo Rebordões, contra o GJP.
31 Em 10-05-2014, pelas 17H00, no Pavilhão Municipal Foz do Sousa - Gondomar, contra o A. D. C.
32 Em 17-05-2014, pelas 21H30, no Pavilhão B... – Matosinhos, contra o G.D. MA.
33 Em 24-05-2014, pelas 18H30, no Pavilhão Municipal Rio de Moinhos, contra o RD A. D.
34 Em 31-05-2014, pelas 19H00, no Pavilhão B... — Matosinhos, contra o A. D. C. SI.
35 Em 07-06-2014, pelas 19H00, no Pavilhão Municipal Santa Cruz do Bispo, contra o ARCD J F. C.
No jogo realizado no dia 01-05-2014, entre a sua equipa e a equipa denominada GJP, foi punido com um cartão vermelho, por rasteirar um adversário que corria para a baliza adversária.
O arguido no processo por acidente de trabalho NUP: 2012PRT00218SAN, foi considerado curado, e teve alta em 02-03-2015, com uma proposta de IPP (incapacidade Permanente Parcial; e 15,4%.
Face ao exposto o arguido recebeu indevidamente durante o período em que esteve incapaz para o serviço, desde 26-04-2013 até 07-10-2014, vencimentos e suplementos no valor de €6.033,26, e a PSP suportou as despesas de saúde de €1,438,92, perfazendo a quantia total de € 7.472,18 (sete mil e quatrocentos e setenta e dois euros e dezoito cêntimos), que deve restituir à PSP.
Constata-se assim, que o arguido, muito embora apto para a prática da modalidade desportiva Futsal, federada, desporto que carece de capacidades físicas bastante apuradas, persistiu em não se disponibilizar para o serviço policial, sendo este bem menos exigente fisicamente que a modalidade desportiva que praticava.
C. APRECIAÇÃO JURÍDICO-DISCIPLINAR DOS FACTOS PROVADOS Com a conduta descrita nos articulados anteriores, o arguido face ao disposto no artigo 4.º do RD/PSP, praticou infrações disciplinares, por violação do Princípio Fundamental, previsto no artigo 6.º do RD/PSP, conjugado com o disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, e infringiu o Dever de Aprumo previsto no artigo 16.º, n.º s 1 e 2, alínea f), do RD/PSP.
As infrações praticadas pelo arguido inviabilizam a manutenção da relação funcional e revelaram acentuado desinteresse peio cumprimento dos deveres profissionais, de modo ofender de forma muito grave a dignidade e o seu prestígio pessoal.
D. MEDIDA E GRADUAÇÃO DA PENA
Uma pena deve ser adequada e justa.
Como se verifica pelo conteúdo da acusação trata-se de factos de extrema gravidade, os imputados ao arguido. Totalmente contrários ao prestígio e à dignidade das forças de segurança.
O arguido não goza de nenhuma das circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar previstas no artigo 51.º do RD/PSP.
Beneficia da circunstância atenuante da responsabilidade disciplinar regulada na alínea h) - (a boa informação de serviço do superior de que depende) - do n.º 1, do artigo 52.º, do RD/PSP.
Tem como circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar as previstas nas alíneas b) - (a premeditação), f) - (ser a infração comprometedora da honra, do brio e do decoro profissional), e i) - (a acumulação de infrações) , todas do n.º1 do artigo 53.º do RD/PSP.
VI PROPOSTA DA PENA
Assim, considerando que:
1. Com a sua conduta, tal como ficou provada nos presentes autos de processo disciplinar, o arguido violou o Princípio Fundamental, previsto no artigo 6.º do RD/PSP, conjugado com o disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, e infringiu o Dever de Aprumo previsto no artigo 16.º, n.ºs 1 e 2, alínea f), do RD/PSP, a que corresponde as penas disciplinares de Aposentação Compulsiva ou de Demissão, previstas no artigo 25.º, n.º 1 alíneas f) e g), conjugado com os artigos 43.º e 47.º, n.ºs 1, todos do RD/PSP;
2. Contra o arguido militam as circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar previstas nas alíneas b) - a premeditação, f) - ser a infração comprometedora da honra, do brio e do decoro profissional, e i) - acumulação de infrações) todas do n.º 1, do artigo 53.º do RD/PSP.
3. A infração praticada pelo arguido inviabiliza a manutenção da relação funcional impossibilitando a conservação da sua condição enquanto agente policial, por ofender de forma muito grave a dignidade e o prestígio da função que exerce, quebrando a confiança que deve existir entre a Corporação e os seus elementos.
Perante todo o exposto, atendendo à descrição fáctica ocorrida e às provas alcançadas, verifica-se que as infrações cometidas inviabilizam a manutenção da relação funcional pelo que proponho que a conduta do arguido seja aplicada a pena disciplinar de aposentação compulsiva ou de demissão, previstas no artigo 25.º n.º 1 alíneas f) e g) conjugado com os artigos 43.º, n.º 1, todos do RD/PSP
Por conseguinte proponho a Vª. Exa. que o presente processo seja remetido ao GDD DN/PSP para os competentes efeitos.
Porto, 12 de agosto de 2016
O Instrutor

(Cfr. relatório, a fls. 242 a 248/verso do processo administrativo)
7. Em reunião do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública, de 14.12.2016, foi deliberado, por maioria de seis votos a favor da pena disciplinar de demissão, três votos a favor de pena disciplinar não expulsiva e três votos a favor de pena disciplinar de aposentação compulsiva: “emitir parecer de que deverá ser aplicada ao Agente M/1…03, MMA, a pena disciplinar de DEMISSÃO, prevista nos artigos 25.°, n." 1, alínea g), 43.º e 47.°, n. l, todos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RD/PSP), aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de fevereiro, (…) A infração disciplinar praticada pelo arguido inviabiliza a manutenção da relação funcional, porque como elemento policial tem o dever acrescido de garantir o cumprimento da legalidade, porém é o próprio a desrespeitar a lei, sendo, por isso o seu comportamento indigno, lesivo e ofensivo da imagem da PSP” (Cfr. ata de reunião, a fls. 251 a 254 do Processo Administrativo);
8. Em 30.12.2016, por despacho do Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública foi ordenado o seguinte: “submeta-se o Processo Disciplinar n.º 2014PRT00128DIS, em que é arguido o Agente M/1…03, MMA (…), à apreciação e decisão de Sua Excelência a Ministra da Administração Interna, com a proposta de aplicação da pena disciplinar de demissão” (Cfr. despacho, a fls. 255 do processo administrativo);
9. Em 9.08.2017, a Direção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contenciosa e Política Legislativa da Secretaria Geral do Ministério de Administração Interna elaborou parecer n.º 387-PM/2017, no qual consta, entre o mais, o seguinte:
“(…) com a sua atuação o arguido colocou em causa o prestígio da corporação (PSP) e do Estado Português, em nome de quem atuou, mostrando-se indigno do cargo que desempenha, levando a uma perda da confiança necessária ao exercício das funções policiais que lhe estão atribuídas (…) Perante todos os elementos disponíveis nos autos, a pena de demissão considera-se adequada e proporcional às infrações praticadas pelo arguido, que são inviabilizadoras da manutenção da relação funcional. Assim, caso Vossa Excelência se digne concordar com o exposto, com o relatório final e com o Parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública poderá aplicar ao arguido, Agente M/1…03, MMA (…) a pena disciplinar de Demissão (…)” (cfr. parecer, a fls. 259 a 270 do processo administrativo);
10. Em 17.10.2017 foi proferido despacho pela Ministra da Administração Interna, no qual consta, entre o mais, o seguinte: “Nos termos e com os fundamentos constantes do relatório do Senhor Instrutor, do parecer do Conselho de Deontologia e Disciplina da Polícia de Segurança Pública, do Despacho do Senhor Diretor Nacional e do referido parecer da Direção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa da Secretaria Geral da Administração Interna, aplico ao arguido, Agente da Polícia de Segurança Pública M/1…03, MMA, do efetivo do Núcleo de Apoio Geral do Comando Metropolitano do Porto da PSP, a pena disciplinar de demissão” (cfr. despacho, a fls. 257 e 258 do processo administrativo);
11. O Requerente foi notificado do despacho referido no ponto anterior em 27.11.2017 (Cfr. cópia de certidão de notificação, a fls. 271 do processo administrativo);
Mais se provou que:
12. O valor da prestação mensal relativa ao empréstimo bancário contraído pelo Requerente é de € 219,74, e o correspondente valor pago para o condomínio de € 41,14 (cfr. cópia de extrato bancário, documento n.º 2, junto com a petição inicial);
13. As despesas mensais com eletricidade, gás, água, televisão e internet, seguros e impostos de circulação de automóvel e moto, ascendem a € 159,67 (cfr. cópias de faturas/recibos, documentos n.ºs 2 a 10, juntos com a petição inicial);
14. O Requerente aufere, pelo Requerido, um vencimento mensal líquido de € 1.051,27, que corresponde ao único rendimento declarado em sede de IRS no ano de 2016 (cfr. cópia de recibo de vencimento de declaração modelo 3 de IRS, documento n.º 12, junto com a petição inicial);
Provou-se, ainda, que:
15. No dia 3.10.2012, o Requerente sofreu uma entorse no joelho direito (por acordo);
16. Na sequência da entorse referida no ponto anterior, ao Requerente foi diagnosticado uma rotura do ligamento cruzado anterior (LCA) e lesão no menisco interno, com uma incapacidade temporária absoluta (cfr. boletim de acompanhamento médico, a fls. 89 do processo administrativo);
17. Em consequência da entorse referida no ponto anterior, em 22.10.2012, o Requerente foi operado ao joelho direito – legamentoplastia ao ligamento cruzado anterior (por acordo);
18. Por despacho de 30.11.2012, proferido no processo de sanidade NUP2012PRT00218SAN, a entorse no joelho direito foi considerada como sendo acidente em serviço (cfr. cópia de nota de assentos, a fls. 21/verso do processo administrativo);
19. Ao Requerente foi reconhecida incapacidade temporária absoluta, em consultas médicas realizadas em 8.10.2012, 30.10.2012, 27.11.2012, 27.12.2012, 26.02.2013, 23.04.2013, 28.05.2013, 02.07.2013, 08.09.2013, 14.10.2013, 22.10.2013, 19.11.2013, 07.01.2014, 25.03.2014, 27.05.2014, 01.07.2014, 02.09.2014 (cfr. cópia do boletim de acompanhamento médico, a fls. 89 a 91 do processo administrativo);
20. Por deliberações da Junta da Saúde do Requerido, de 12.11.2012, 19.11.2012, 10.12.2012, 28.01.2013, 25.03.2013, foi concedido ao Requerente licença para tratamento pelo período compreendido entre 3.10.2012 a 21.04.2013 (cfr. cópia de nota de assentos, e boletim de acompanhamento médico, a fls. 21/verso e 89 a 91 do processo administrativo, respetivamente);
21. Por deliberações da Junta Superior da Saúde, de 13.12.2013 e 20.05.2014, foi concedida ao Requerente licença para tratamento pelo período compreendido entre o dia 22.04.2013 a 22.10.2014 (cfr. cópia de nota de assentos, a fls. 21/verso do processo administrativo);
22. No processo de sanidade NUP2012PRT00218SAN, o Requerente foi considerado curado e teve alta em 02.03.2015, com uma proposta de Incapacidade Permanente Parcial de 15,4% (por acordo);
23. Durante o período concedido de licença para tratamento, o Requerente foi abonado nas remunerações e suplementos mensais, como se estivesse efetivamente a trabalhar (por acordo);
24. Na época desportiva de 2012/2013, o Requerente esteve inscrito como atleta federado, sénior, com a licença n.º 3…0, da equipa C.D.C B..., na modalidade de futsal, para o Campeonato Distrital da 1ª Divisão, Série 1, da Associação de Futebol do Porto (por acordo);
25. O Requerente não comunicou, nem pediu autorização à Requerida para a prática desportiva relativa à inscrição referida no ponto anterior (por acordo);
26. O Requerente consta no rol dos jogadores que participaram no jogo de futsal, a contar para o Campeonato Distrital da 1ª Divisão, Sénior, da AFP, entre a equipa do C.D.C. B... e o SCS, ocorrido em 1.05.2013 (cfr. relação a fls. 96 e 136 do processo físico);
27. Em exame médico desportivo realizado em 22.09.2013, o Requerente foi avaliado como apto (cfr. cópia de relação de atletas, a fls. 32/verso do processo administrativo);
28. Na época desportiva de 2013/2014, o Requerente esteve inscrito como atleta federado, sénior, com a licença n.º 610512, da equipa C.D.C B..., na modalidade de futsal, para o Campeonato Distrital da 1ª Divisão, Série 1, da AFP (por acordo);
29. O Requerente não comunicou, nem pediu autorização à Requerida para a prática desportiva relativa à inscrição referida no ponto anterior (por acordo)
30. O Requerente consta no rol dos jogadores que participaram em trinta e cinco jogos de futsal, a contar para o Campeonato Distrital da 1ª Divisão, Sénior, da AFP, pela equipa do C.D.C. B..., ocorridos no período compreendido entre 5.10.2013 e 7.06.2014 (cfr. relação a fls. 97 do processo físico);
31. No jogo realizado em 1.05.2014, entre a equipa do C.D.C. B... e a equipa GJP, o Requerente foi punido com um cartão vermelho, por rasteirar um adversário que corria para a baliza adversária (cfr. cópia de relatório de jogo, a fls. 33 do processo administrativo);
32. Após exame médico-legal realizado no âmbito do processo de inquérito, n.º 1610/14.4T9PRT, que, por participação do Requerido, correu termos na 5ª Secção dos Serviços do Ministério Público, do Departamento de Investigação e Ação Penal do Porto, em que o Requerente consta como denunciado da prática de um crime de atestado falso e correspondente uso, p. e p. pelo art. 260º, n.º 1 e 5 do Código Penal, foi emitido relatório no qual se concluiu que “A consolidação médico-legal das lesões é fixável em 23.04.2013, tendo em conta: o tipo de lesões resultantes e o tipo de tratamentos efetuados” (cfr. cópia de ofício e despacho judicial, a fls. 46 e 117 a 124 do processo administrativo, respetivamente);
33. Por decisão de 30.10.2015, foi determinado o arquivamento do processo de inquérito referido no ponto anterior, de cuja fundamentação, se extrai, entre o mais, o seguinte: “Como resulta à saciedade das diligências efetuadas não foi possível recolher quaisquer indícios da prática do crime denunciado ou de qualquer outro que nos compita conhecer. Com efeito, quer os clínicos que acompanharam o denunciado, quer o INML, nas respostas aos quesitos formulados, consideram que o denunciado podia desenvolver prática desportiva em causa como forma de recuperação, apesar de se encontrar incapaz para o trabalho no período a que se reportam os factos da denúncia” (cfr. cópia de despacho judicial, a fls. 117 a 124 do processo administrativo);
34. O processo disciplinar referido no ponto 2) foi o único instaurado em nome do Requerente (por acordo);
35. Durante a pendência do processo disciplinar o Requerente não foi suspenso preventivamente (por acordo).
*
IV – Do Direito
Foi peticionado no presente Processo a suspensão de eficácia do ato que aplicou ao aqui Recorrido pena disciplinar de demissão, mais tendo sido declarados ineficazes os atos de execução do ato de aplicação da pena de demissão.
Correspondentemente, decidiu-se no Tribunal a quo, julgar verificados os pressupostos de que a lei faz depender a concessão de providências cautelares, deferindo-se a requerida providência, suspendendo-se o ato de aplicação da pena de demissão.
Refira-se desde já que a decisão proferida em 1ª instância, será para manter.
Vejamos:
Veio o Ministério da Administração Interna recorrer da sentença que deferiu a requerida providência cautelar de suspensão da eficácia do despacho que suspendeu a aplicação da pena de demissão aplicada ao aqui Recorrido, invocando que a mesma padecerá de erro de interpretação e de aplicação de direito.
As providências cautelares serão deferidas desde que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
i) Fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora)
ii) Que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (fumus boni juris);
iii) Que da ponderação de interesses dos interesses públicos e privados em presença resulta que os danos decorrentes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam sere evitados ou atenuados pela adoção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência).
A decisão proferida pelo tribunal a quo é lapidar, designadamente no que concerne à verificação do periculum in mora, cujo conteúdo aqui se ratifica, pelas consequências imediatas para o aqui Recorrido em virtude da aplicação da pena de demissão que lhe foi aplicada, pela rutura da sua economia pessoal que a mesma determinaria, pela ausência de quaisquer outros rendimentos suscetíveis de fazer face às suas necessidades básicas de sobrevivência.
Atentos os elementos disponíveis, é sem surpresa que o Tribunal a quo concluiu que igualmente se mostrará preenchido o pressuposto do fumus boni juris, ao entender, perfunctoriamente, ser provável em sede de ação principal que a pretensão do Recorrido venha a ser julgada procedente.
Acompanhamos, também neste aspeto, o raciocínio adotado pelo tribunal a quo.
A aplicação de pena expulsiva só deverá ter lugar quando a conduta do arguido atinja de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição que integra, que a sua não aplicação degradaria a imagem dessa entidade, pela imagem de impunidade permissiva que transmitiria.
Assim, a aplicação de uma pena expulsiva pressuporá a prática de “infrações disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional” (artigo 47º do RD/PSP).
Para permitir uma mais eficaz visualização daquilo que normativamente está em causa, veja-se o teor do referido art. 49º do RD/PSP, ao estatuir as situações a que deverá ser aplicada a pena de demissão.
a) Tiver praticado qualquer crime qualquer crime doloso punível com pena de prisão superior a três anos, com flagrante e grave abuso da função que exerce ou com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são inerentes;
b) Tiver praticado, embora fora do exercício das funções, crime doloso punível com pena de prisão superior a três anos que revele ser o agente incapaz ou indigno da confiança necessária ao exercício da função;
c) Cometer algumas das infrações previstas na alínea a) do n.º 2 do artigo 47.º;
d) Praticar ou tentar praticar qualquer ato previsto nas alíneas b),f) e g) do n.º 2 do artigo 47.º.”
Perante a referida enunciação das situações suscetíveis de determinar a aplicação da pena de demissão, mal se compreende a razão pela qual foi a mesma aplicada ao aqui Recorrido, cujas infrações se cingiram, em síntese, à participação em 35 jogos de futsal, sem prévia comunicação ou autorização superior, o que não constitui crime doloso.
Não se está com a precedente afirmação a isentar de responsabilidade o facto do agente da PSP, não ter comunicado superiormente o exercício daquela atividade desportiva, mormente em período de baixa clinica, mas antes a antecipar que a referida pena se mostrará manifestamente desproporcionada.
Objetivemos:
Nos termos do artigo 43º do Estatuto Disciplinar da Policia de Segurança Pública aprovado pela Lei n.º 7/90, de 20 de Fevereiro, “Na aplicação das penas atender-se-á aos critérios enunciados nos artigos seguintes, à natureza e gravidade da infração, à categoria do funcionário ou agente, ao grau de culpa, à sua personalidade, ao seu nível cultural, ao tempo de serviço e a todas as circunstâncias que militem contra ou a favor do arguido”.
Refere-se, sintomática e acertadamente na decisão recorrida a este respeito, o seguinte:
“Em termos factuais, o Requerido fundamenta a aplicação da pena de demissão com a circunstância de, embora em gozo de licença para tratamento, por virtude de um acidente de serviço, o Requerente dedicou-se, nesse período, à prática da modalidade de futsal, como jogador federado, concluindo que, se o mesmo estava apto a jogar futsal, por maioria de razão deveria disponibilizar-se a prestar serviço policial, ainda que em serviços internos, concluindo pela violação dos preceitos acima referidos, inviabilizadora da manutenção da relação funcional.
Embora não de forma expressa, extrai-se da argumentação aduzida no relatório elaborado no âmbito do processo disciplinar em questão, que a tese fundamentadora da aplicação da pena de demissão ao Requerente assenta no pressuposto da falsidade dos atestados médicos que declaram o Requerente incapacitado absoluta e temporariamente para o serviço durante o período em questão. Pois, só no pressuposto de que a incapacidade declarada não corresponde à realidade é que tem cabimento a alegação da violação do art. 44º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.09, que estabelece o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração Pública – de que o Requerente beneficiou fraudulentamente dos abonos auferidos enquanto esteve ausente do serviço, por via da invocada incapacidade. E é, também, no pressuposto de que a incapacidade declarada não corresponde à realidade que pode estar em causa o acatamento das leis a que se refere o art. 6º do RDPSP, assim como, os comportamentos não dignificantes da função ou da deontologia funcional de polícia, a que alude o art. 16º do mesmo diploma.
Ora, o que resulta da matéria de facto provada é que os factos aqui em questão – a participação do Requerente em jogos de futsal no período em que estava declarado incapacitado para prestar serviço policial – não indiciaram a prática de crime de atestado falso, pelo qual o Requerente foi denunciado, por iniciativa do Requerido, e que deu origem ao processo de inquérito n.º 1610/14.4T9PRT (DIAP do Porto, 5ª Secção).
Está expresso na decisão de arquivamento do referido processo que os clínicos que acompanharam o Requerente, assim como o Instituto de Medicina Legal, nas respostas aos quesitos formulados, consideraram que o Requerente podia desenvolver prática desportiva de futsal como forma de recuperação, apesar de se encontrar incapaz para o trabalho no período em causa.
Por outro lado, e não menos relevante, atente-se à circunstância de, ao longo do período em causa, as sucessivas incapacidades declaradas do Recorrente terem sido sucessivamente confirmadas quer pela Junta da Saúde, quer pela Junta Superior da Saúde.
Daqui decorre que o Requerido pretende aplicar a pena de demissão ao Requerente por um facto que reputa de falso, mas sucessivamente confirmada pelos seus próprios serviços – a situação de incapacidade absoluta temporária do Requerente para prestar serviço.
Certamente que se alguma dessas Juntas de Saúde concluísse que o Requerente já não estava incapacitado para o serviço, não lhe restaria outra hipótese senão retomar o exercício de funções, ainda que em serviço interno. Mas não; ao invés, o que as sucessivas Juntas de Saúde confirmaram foi a incapacidade do Requerente durante o período em questão.
Por outro lado, ainda no âmbito de um conhecimento perfunctório do caso sub judice, importa ter presente que a pena de demissão é a mais gravosa das penas disciplinares previstas no art. 25º do RDPSP, razão pela qual, o art. 49º prevê a sua aplicação, em especial, aquando da prática de infrações por abuso de poder ou de atos de insubordinação, atos perigosos ou que constituam crime.
Ora, na decisão de aplicação da pena de demissão não são imputados ao Requerente nenhum desses factos.”
Efetivamente, e desde logo, o MAI não demonstrou que as infrações imputadas ao aqui Recorrido, se mostrariam inviabilizadoras da manutenção da sua relação funcional.
Não foram, designadamente, evidenciados os comportamentos suscetíveis de constituírem um grau de desvalor, determinantes da quebra, definitiva e irreversível, da confiança que deverá existir entre o serviço e o agente.
Não estando, como se disse já, demonstrada a inviabilização da relação funcional determinante da aplicação da pena de Demissão, no mínimo, a pena aplicada mostrar-se-á desproporcionada.
Não se ignora que a Administração gozará de algum poder discricionário na aplicação de penas em função das infrações imputadas a um qualquer arguido, sendo que, em qualquer caso, tal não poderá extravasar ou contrariar as balizas legalmente estabelecidas para o efeito.
Quando são as próprias Juntas Médicas da Entidade aqui Recorrida a confirmar as incapacidades declaradas do Recorrente, decorrentes de acidente de serviço, mais reconhecendo “os clínicos que acompanharam o Requerente, assim como o Instituto de Medicina Legal (...) que o Requerente podia desenvolver prática desportiva de futsal como forma de recuperação, apesar de se encontrar incapaz para o trabalho no período em causa”, mal se compreende como se enveredou pela aplicação de pena expulsiva.
Em qualquer caso, a Entidade aqui Recorrente limitou-se a fazer afirmações meramente conclusivas, de onde se destaca aquela em que afirma que o aqui Recorrido “embora estivesse apto para a prática da modalidade desportiva federada de Futsal persistiu em não se disponibilizar para o serviço policial, sendo este menos exigente fisicamente do que a modalidade que praticava.”
O que é certo e patente é que o Recorrido se encontrava de baixa, em resultado de acidente em Serviço, situação que foi sucessivamente confirmada pelos serviços médicos da própria Instituição, circunstância não imputável ao agente.
É incontornável que o Agente esteve ausente do serviço de 03/10/2012 (data de acidente de serviço) até 02/03/2015, data em que lhe foi concedida alta médica, ainda assim, com atribuição de uma incapacidade permanente parcial de 15,4%, tendo sido sucessivamente submetido a Juntas Médicas em, 19/11/2012, 11/12/2012, 28/01/2013, 26/03/2013 e 02/03/2015.
Tendo-se verificado na aplicação da pena expulsiva, a violação designadamente dos princípios da justiça e da proporcionalidade, naturalmente que a intervenção dos tribunais se mostra legitima, e não violadora do princípio da separação de poderes (artigos 7º e 8º do CPA), tanto mais que ao Recorrido não foram imputados quaisquer factos suscetíveis de determinar a aplicação de pena disciplinar expulsiva, em face do que não merece censura o entendimento de que será provável que, em sede de ação principal, a pretensão venha a ser julgada procedente.

Quanto ao requisito da ponderação de interesses,
Importa agora, nos termos do nº 2 do Artº 120º CPTA, verificar se os danos que resultam da concessão da requerida providência cautelar para o interesse público, são superiores aos que poderiam resultar da sua recusa, para o aqui Recorrido.
A decisão sobre o decretamento da providência cautelar impõe a formulação de um juízo de valor, fundado na comparação da situação da aqui Recorrido com o interesse público.
Em qualquer caso, como refere Viera de Andrade, in A Justiça Administrativa (Lições), pág. 303, “[...] não se trata aqui de ponderar o interesse público com o interesse privado, mesmo que muitas vezes o interesse do requerido seja o interesse público e o interesse do requerente seja o interesse privado: o que está aqui em conflito são os resultados ou os prejuízos que podem resultar para os interesses, da concessão ou a recusa da concessão, para todos os interesses envolvidos, sejam públicos, sejam privados. [...] o que está em causa não é ponderar valores ou interesses entre si, mas danos ou prejuízos e, portanto, os prejuízos reais, que numa prognose relativa ao tempo previsível de duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam da recusa ou da concessão (plena ou limitada) da providência cautelar.”
Até prova em contrário, está aqui em causa um agente da PSP que durante um período de Baixa em resultado de acidente em Serviço, exerceu atividades desportivas, relativamente às quais, os elementos clínicos disponíveis, consideraram até suscetíveis de poderem ser desenvolvidos “como forma de recuperação”.
Com relevância para a solução a dar à presente questão retoma-se o referido no acórdão deste TCAN nº 0290/09BEPNF-A, em cujo sumário se pode ler, designadamente, que:
“A apreciação do requisito negativo enunciado no n.º 2 do art. 120.º não se traduz num juízo de ponderação entre o interesse público e o interesse privado, visto que o que releva são os resultados ou os prejuízos que podem resultar para os interesses, da concessão ou a recusa da concessão, para todos os interesses envolvidos sejam eles públicos ou privados.
Os índices dos interesses públicos que impõem a eficácia ou execução imediata do ato e danos daí derivados decorrentes da concessão da providência suspendenda têm que se encontrar no circunstancialismo que rodeou a sua prática, especialmente nos fundamentos e nas razões invocadas.
(…)
Só quando as circunstâncias do caso concreto revelarem de todo em todo a existência de lesão do interesse público que justifique a qualificação de grave e se considere que essa qualificação, mercê dos prejuízos e danos que gera, deve prevalecer sobre os prováveis prejuízos causados ao requerente é que se impõe a execução imediata do ato, indeferindo-se, por esse facto, o pedido cautelar de suspensão.”
Aqui chegados, e uma vez que os fundamentos adotados pelo Recorrente, não revelam qualquer prejuízo para o interesse público, sendo certo que nunca chegou sequer o arguido a ser suspenso preventivamente durante a instrução do processo, tal denota acrescidamente que a integração do arguido ao serviço não constitui qualquer prejuízo para interesse público, sendo que o processo teve uma duração superior a 3 anos.
Tal como decidido pelo tribunal a quo, não se reconhece que a ponderação de interesses, possa pender no sentido da não concessão da providência requerida.
Finalmente, e em função da decisão que se proferirá, e tal como foi igualmente entendido em 1ª instância, dá-se por prejudicado o conhecimento perfunctório do vício da prescrição do procedimento disciplinar imputado ao ato cuja suspensão vem requerida.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso, confirmando a Sentença Recorrida.
Custas pelo Recorrente
Porto, 30 de maio de 2018
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Migueis Garcia (Vota decisão)