Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00363/16.6BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/26/2017
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE DEDUZIR IMPUGNAÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
Sumário:I. Decorre da conjugação do n.º 1 do art.º 125º e n.º 2 do art.º 123.º do CPPT, art.º 604º do CPC que a sentença deve conter fundamentação da matéria de facto a qual consiste na indicação dos elementos de prova utilizados para formar a convicção do juiz e a sua apreciação crítica de modo a perceber o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.
II. Resulta da interpretação da subalínea II, alínea b) do n.º 3 e n.º6 do art.º 59.º do CPPT, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, o sujeito passivo pode apresentar a declaração de substituição, para a correção de erros ou omissões a si imputáveis de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada, até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial das quais não podem resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato do tributário, que seriam aplicáveis caso tivessem sido apresentadas.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:A...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente A…, deduziu impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRS n.° 20155005573472, no valor de €16.585,00, referente ao exercício de 2014.

Alegou, em síntese, errónea qualificação e quantificação dos rendimentos e preterição de outras formalidades legais, concluindo pela anulação parcial da liquidação impugnada.

A Mm. Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra por sentença proferida em 29.11.2016, julgou procedente a questão prévia relativa à caducidade do direito de deduzir impugnação judicial uma vez que tinha sido apresentada intempestivamente e absolveu a Fazenda Pública da instância.

O Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

“(…)I
1) Há 2 liquidações, a saber: uma em face da declaração do contribuinte a que foi atribuído o n° 2015004561775, e outra em face da D.O. (declaração oficiosa, que se está a impugnar que tem o n° 20155005573472);

2) Logo, a impugnação judicial foi deduzida em tempo, e deve ser apreciado o seu mérito;

3) A Sentença recorrida não está fundamentada como exigem as normas referidas, tendo por esse facto de ser Revogada;

4) A Sentença recorrida viola o disposto nas alíneas b), e d) do artigo 615° do Código do Processo Civil, uma vez que não apreciou a totalidade das questões como o deveria ter feito, sendo por esse facto nula;

5) O Tribunal a quo não assegurou a defesa dos direitos do Alegante, ao não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar as normas legais aplicáveis ao caso em concreto.

Termos em que, nos melhores de direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a Sentença recorrida ser REVOGADA, por ser de: LEI, DIREITO, E JUSTICA. .(…)”


1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu em: (a) nulidade por omissão de pronúncia e falta de fundamentação e (b) erro de julgamento de direito ao julgar intempestiva a impugnação judicial.


3. JULGAMENTO DE FACTO

3.1 Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:


“(…)A) Em 30.05.2015, o ora Impugnante e mulher apresentaram, via Internet, declaração Modelo 3 de IRS, respeitante aos rendimentos do ano de 2014, a que foi atribuído o n.º 0850-2014-J0724-78, com os anexos A, C, F, e H;
Cfr. declaração a fls. 26 e ss. do Processo Administrativo Tributário (PAT) em apenso.

B) A qual deu origem à liquidação de IRS n.º 2015 5004561775, com imposto a pagar, no montante de 7.726,17€, tendo sido emitida a respectiva nota de cobrança n.º 201510020787, com data limite de pagamento em 31.08.2015;
Cfr. liquidação e print de aplicação informativa da ATA referente à consulta de notas de cobrança, a fls. 36 e 9 do PAT em apenso, respectivamente.

C) Tendo sido detectada centralmente uma situação irregular/divergência, por falta de declaração de rendimentos por incrementos patrimoniais e de rendimentos empresariais e profissionais, estes comparados com os declarados em declarações periódicas de IVA, foi o ora Impugnante e mulher notificados, em 28.07.2015, para, no prazo de 15 dias, procederem à correcção da declaração de rendimentos de IRS inicialmente apresentada, nomeadamente os anexos C e G, através da apresentação da declaração modelo 3 de substituição;
Cfr. factualidade presente na decisão de reclamação graciosa e documento a fls. 32 e 6, respectivamente, do PAT em apenso.

D) Não o tendo feito, em 03.12.2015 foi elaborada e processada pela Administração Tributária declaração de rendimentos oficiosa, à qual foi atribuído o n.º 0850-2014-D003- 44, de acordo com os rendimentos que constavam nas declarações modelo 13 e modelo 19;
Cfr. factualidade presente na decisão de reclamação graciosa e declaração de IRS a fls. 32 e 13 e ss., respectivamente, do PAT em apenso.

E) A qual deu origem à liquidação de IRS n.º 2015 5005573472 no valor de €16.408,04, referente aos rendimentos de 2014, e à correspondente liquidação de juros compensatórios n.º 2015 2367241, no valor de €176,96, no valor global de €16.585,00, de que resultou o valor a pagar de €8.858,83, decorrente da compensação do valor anteriormente liquidado e recebido, com data limite de pagamento em 20.01.2016;
Cfr. liquidação e print de aplicação informativa da ATA referente à consulta de notas de cobrança, a fls. 25 e 9/10 do PAT em apenso, respectivamente e demonstração da liquidação a fls. 11 dos autos.~

F) Em 18.12.2015, o ora Impugnante apresentou via internet Reclamação Graciosa da liquidação referida no ponto anterior, com o seguinte teor:
«venho reclamar o valor das tributações autónomas incluídos nesta nota de cobrança, em virtude de não condizerem com os valores declarados, venho solicitar esclarecimentos de como foi alcançado o valor das tributações autónomas na demonstração da liquidação de IRS 2015 50055734472. Pede deferimento»,
Cfr. fls. 8 do PAT em apenso.

G) Em 11.01.2016 foi elaborado projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa aludida no ponto anterior, no qual se pode ler o seguinte:
«5- ANÁLISE
As mais valias obtidas pelo reclamante resultantes de obrigações, acções ou participações resgatadas ou alienadas no território português por um residente neste território tem que ser declaradas no respectivo anexo, conforme art.º 10 nº1 alínea b) do Código do IRS.
O ganho sujeito a IRS é constituído nos termos do n.º 4 do artº 10º do código, pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimentos de capitais, sendo caso disso.
Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos, cfr. nº 3 do artº 10º do mesmo código.
São sujeitos passivos e ficam sujeitos a IRS as pessoas singulares que residam em território português e que tenham cá obtido rendimentos.
Sobre as tributações autónomas:
- Rendimentos da categoria F - Os rendimentos prediais obtidos no ano de 2014 respeitantes a imóveis arrendados ou sublocados são tributados autonomamente à taxa de 28% nos termos do nº 7 do artº 72º do Código do IRS, com opção de englobamento, que não foi accionada.
- Rendimentos da categoria G - O saldo positivo entre as mais valias e as menos valias, de acordo no nº 4 do artº 72° do código do IRS (actual alínea e) do nº 1 do mesmo artigo com a redacção dada pela Lei nº 82-E/2014 de 31/12 fica sujeita a tributação autónoma à taxa de 28%, que o sujeito passivo pode optar pelo seu englobamento, nos termos do nº 8 do artº 72º do mesmo diploma.
6 - CONCLUSÃO
Com o que vem descrito proponho despacho de "projecto de indeferimento" do presente procedimento de reclamação graciosa.
À consideração superior.»;
Cfr. fls. 37-40 do PAT em apenso.

H) Notificado que foi para exercício do direito de audição, nada veio dizer, tendo o Chefe do Serviço de Finanças de Soure proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa em 29.01.2016, com os fundamentos constantes do projecto de decisão;
Cfr. fls. 41-45 do PAT em apenso.

I) Em 01.02.2001 foi recepcionado no domicílio fiscal do ora Impugnante, pelo próprio, ofício tendente à sua notificação do despacho referido no ponto anterior;
Cfr. ofício n.º 144 de 29.01.2016, talão de aceitação de registo postal e AR respectivos, a fls. 46-48 do PAT em apenso.

J) Em 31.01.2016 o ora Impugnante e mulher entregaram via Internet declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, por referência aos rendimentos do ano de 2014;
Cfr. fls. 21 e ss. dos autos.

K) Em 26.04.2016 deu entrada no Serviço de Finanças de Soure requerimento do ora Impugnante, com o seguinte teor:
«Assunto: IRS/2014 - Gestão de Divergência,
Ex.mo Senhor:
Os meus melhores cumprimentos,
Venho por este meio solicitar a liquidação da declaração de IRS de 2014 de substituição entregue no dia 31-01-2016 identificada com o número 0850- J0865-98, por forma a ser reposta a divergência com a liquidação oficiosa cobrada coercivamente.
Mais, venho indicar que o valor das prestações de serviços do ano 2014, foi de 9.700,00€ relativo a cedências de exploração.
Sem outro assunto subscrevo-me,»;
Cfr. fls. 3 do PAT em apenso.

L) Sobre o qual recaiu em 03.05.2016 despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Soure, com o seguinte teor:
«Verificando-se que a declaração apresentada se encontra no estado de não liquidável e tendo sido reclamado o imposto respeitante ao mesmo ano, cuja reclamação foi instaurada neste Serviço de Finanças com o nº 0850201504000943 e mereceu decisão de indeferimento, determino o arquivamento do presente pedido nos termos do artº 56° nº 2 alínea a) da Lei Geral Tributária.»;
Cfr. fls. 3 do PAT em apenso.

M) O despacho referido no ponto anterior foi levado ao conhecimento do ora Impugnante por ofício do Serviço de Finanças de Soure, datado de 04.05.2016, com o n.º 544;
Cfr. ofício a fls. 4 do PAT em apenso e igualmente a fls. 12 dos autos.

N) Em 07.06.2016 deu entrada em juízo, via SITAF, a p.i. que deu origem aos presentes
autos. Cfr. registo SITAF a fls. 2 dos autos.- (…)”

3.3 Verificando-se que a alínea I) incorreu em erro material retifica-se oficiosamente o referido erro:

Em 01.02.2016 foi rececionado no domicílio fiscal do ora Impugnante, pelo próprio, ofício tendente à sua notificação do despacho referido no ponto anterior;
Cfr. ofício n.º 144 de 29.01.2016, talão de aceitação de registo postal e AR respetivos, a fls. 46-48 do PAT em apenso.

4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. As nulidades da sentença, ou ainda com mais rigor as nulidade das decisões, quer as mesmas revistam a forma de sentenças ou de despachos, resultam das disposições conjugadas dos art.ºs 615.º e art. 125.º do CPPT.
Os vícios da sentença correspondem a irregularidades que afetem formalmente a decisão e provoque dúvida sobre a sua autenticidade (falta da assinatura do juiz), a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total das razões por que se decide desta e não daquela maneira, (falta de fundamentação) ou porque a fundamentação se encontra em oposição a decisão (contradição entre os fundamentos de direito e de facto) ou por uso indevido do poder jurisdicional, na medida em que decidiu algo, que não lhe era exigido (excesso de pronúncia) ou então omitiu a decisão de algo que as partes lhe apresentaram e que o tribunal não conheceu (omissão de pronuncia).
No caso em apreço o Recorrente alega nulidade por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação.
Sem bem entendemos as alegações e as conclusões a nulidade deriva da falta de pronúncia quanto ao mérito das questões equacionadas na petição inicial.
Quanto a essa questão não existe qualquer nulidade pois, a sentença recorrida decidiu corretamente, como infra se melhor se verá, que impugnação era intempestiva, consequentemente não havia o dever legal de se pronunciar quanto aos vícios imputados à liquidação.
Quanto à falta de fundamentação, face a indefinição do objeto de recurso, importa analisar em primeiro lugar a falta de fundamentação de direito.
Como refere o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in Código do Procedimento e Processo Tributário anotado, II, 2011, fls 359 e segs. “(…) A fundamentação de direito da sentença deverá consistir na indicação, interpretação e aplicação das normas em que se baseia a decisão (art. 659.°, n.º 2, do CPC).
No entanto, como fundamentos de direito, podem ser invocados, cumulativa ou exclusivamente, princípios jurídicos (art. 3.º n.º 1, do CPTA), mesmo que não sejam expressamente enunciados em norma determinadas.

Não é necessário, para obstar à existência de nulidade, a apreciação e análise de todos os argumentos invocados e invocáveis sobre as questões de direito a apreciar, mas apenas indicar aqueles que ser servem de suporte à decisão.

Por outro lado, no que concerne à fundamentação de direito, o tribunal tem de indicar apenas a relativa às questões apreciadas em que se baseia a parte dispositiva e não a meras considerações marginais, argumentos «ex abundanti» ou de «obiter dicta», isto é, algo que não é necessário apreciar para conhecer da pretensão que é formulada, nem tem reflexos em qualquer das questões apreciadas que o tribunal tinha de resolver. (…)”

Há que realçar que só a ausência total de fundamentação fere a sentença de nulidade. Compulsada a sentença recorrida, a MMª juíza fundamentou de direito, profusamente, delineando o quadro legal em que se enquadra os meios judiciais e e respetivos prazos. A sentença recorrida fez uma interpretação e aplicação das normas em vigor aplicável à data dos factos pelo se encontra fundamentada de direito.
Quanto à falta de fundamentação de facto.
A nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto encerra tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas previsto no n.º 4 do artigo art.º 607º.
Por força do n.º 2 do art.º 123.º CPPT o juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.
Determina o n.º 4 do art.º 604º do CPC relativamente à matéria de facto que a decisão proferida declarará quais os fundamento de facto que o tribunal julgue provados e quais os que julgue não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
O n.º 5 do art.º 604.º do CPC determina que o tribunal aprecia livremente as provas decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Decorre da conjugação do n.º 1 do art.º 125º e n.º 2 do art.º 123.º do CPPT, art.º 604º do CPC que a sentença deve conter fundamentação da matéria de facto a qual consiste na indicação dos elementos de prova utilizados para formar a convicção do juiz e a sua apreciação crítica de modo a perceber o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.
Como refere Jorge Lopes de Sousa, in Código do Processo e Procedimento Tributário, Anotado, II, 2011, pp. 321 e 322 (In CPPT anotado, II, 2011, pp. 321 e 322) “(…) A fundamentação da sentença, no que concerne à fixação da matéria de facto, é exigida pelo n.° 2 do art. 123. do CPPT.
Essa fundamentação deve consistir na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro.
A fundamentação da sentença visa primacialmente impor ao juiz reflexão e apreciação crítica da coerência da decisão, permitir às partes impugnar a decisão com cabal conhecimento das razões que a motivaram e permitir ao tribunal de recurso apreciar a sua correcção ou incorrecção. Mas, à semelhança do que sucede com a fundamentação dos actos administrativos, a fundamentação da sentença tem também efeitos exteriores ao processo assegurando a transparência da actividade jurisdicional.
Assim, a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto.
Nos casos em que os elementos probatórios tenham um valor objectivo (como sucede, na maior parte dos casos, com a prova documental) a revelação das razões por que se decidiu dar como provados determinados factos poderá ser atingida com a mera indicação dos respectivos meios de prova, sem prejuízo da necessidade de fazer uma apreciação crítica, quando for questionável o valor probatório de algum ou alguns documentos ou existirem documentos que apontam em sentidos contraditórios.
Mas, quando se tratar de meios de prova susceptíveis de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal) será indispensável, para atingir tal objectivo de revelação das razões da decisão, que seja efectuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos relativamente aos quais essa apreciação seja necessária.(…)”(sublinhado nosso).
Assim, a fundamentação da matéria de facto, deve consistir na indicação dos factos provados e não provados, elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do julgador e a sua apreciação crítica, de maneira a ser possível conhecer as razões porque se decidiu num sentido e não noutro.
No que concerne exame crítico da prova, o juiz deve revelar, esclarecendo, quais foram os elementos probatórios que o levaram a decidir como decidiu e não de outra forma e caso haja elementos probatórios divergentes, explicar as razões porque se valorizou um em detrimento do outro.
Se a sentença não contiver análise crítica da prova documental e testemunhal e outras provas produzidas no processo e que foram relevantes para a decisão incorre em nulidade nos termos do n.º 1 do art.º 125.º n.º 1 do CPPT alínea b) do art.º 615.º do CPC .
Baixando ao caso dos autos, a sentença recorrida fixou minuciosamente os factos provados que se deixaram transcritos.
Nos factos provados, foram indicados os meios probatórios por referência aos documentos existentes nos autos e fez uma apreciação crítica sintética.
A sentença recorrida permite assim verificar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz sobre todos os pontos da matéria de facto e permite o controlo dos mesmos.
Nesta conformidade, sentença recorrida respeitou os art.ºs 202.º e 205.º da Constituição da República Portuguesa bem como os art.ºs 13.º e 20.º do mesmo diploma pelo que não incorreu em nulidade.


4.2. O Recorrente imputa ainda à sentença erro de julgamento - por ter decidido pela verificação dºa caducidade da impugnação judicial e que a mesma foi apresentada tempestivamente, devendo ser conhecido o seu mérito.
A sentença recorrida no essencial faz a seguinte apreciação: “Não suscitam dúvidas que o acto impugnado nos presentes autos é o acto de liquidação de IRS aludido na alínea E) dos factos provados, tal como expressamente é afirmado no intróito da p.i. que deu origem aos presentes autos.
Considerando que contra tal acto de liquidação foi apresentada reclamação graciosa, de cujo despacho de indeferimento o ora Impugnante foi notificado em 01.02.2016 (cfr. factos provados sob as alíneas F) a I)), o mesmo dispunha então de três meses para impugnar a visada liquidação, nos termos do disposto no artigo 102.º, n.º 1, al. e) do CPPT.
O referido prazo conta-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, conforme prescreve o artigo 20.º, n.º 1 do CPPT, ou seja, de forma contínua, sem suspensões, designadamente, nos períodos de férias judiciais, apenas acontecendo que se o prazo terminar durante esse período, o seu termo se transfere para o primeiro dia útil após as férias.
Assim, considerando que o ora Impugnante foi notificado da decisão que recaiu sobre a reclamação hierárquica em 01.02.2016, possuía até ao dia 02.05.2016 para interpor a presente Impugnação Judicial. Tendo apresentado a mesma, via SITAF, no dia 07.06.2016 (cfr. facto provado sob a alínea N)), ou seja, mais de um mês depois do término do prazo, é evidente a intempestividade da presente Impugnação Judicial.(…)”
Desde já se diga que a sentença recorrida não nos merece reparo. Da análise da petição inicial, consta claramente que a impugnação judicial, é intentada na sequência do indeferimento do “Despacho de arquivamento da declaração de substituição de IRS, relativa ao IRS de 2014” e se reporta à liquidação 20155005573472 (identificada na primeira linha e página, no canto esquerda na petição inicial).
Começa a Impugnante por afirmar no ponto 1.º e 2.º da PI que foi notificado através do ofício n.º 544 de 04.05.2016, do Serviço de Finanças de Soure e possui 3 meses para impugnar o ato e como tal está em tempo.
Explicando a situação factual importa atentarmos na matéria assente nas alíneas A) a E) que em 30.05.2015, o Recorrente e mulher apresentaram, via Internet, declaração Modelo 3 de IRS, respeitante aos rendimentos do ano de 2014, a que foi atribuído o n.º 0850-2014-J0724-78, com os anexos A, C, F, e H, dando origem à liquidação de IRS n.º 2015 5004561775, com imposto a pagar, no montante de 7.726,17€, tendo sido emitida a respetiva nota de cobrança n.º 201510020787, com data limite de pagamento em 31.08.2015.
A Administração Fiscal detetou divergência, por falta de declaração de rendimentos por incrementos patrimoniais e de rendimentos empresariais e profissionais, estes comparados com os declarados em declarações periódicas de IVA, notificou o Recorrente e mulher, em 28.07.2015, para, no prazo de 15 dias, procederem à correção da declaração de rendimentos de IRS inicialmente apresentada, nomeadamente os anexos C e G, através da apresentação da declaração modelo 3 de substituição. Porém nada fez pelo que, em 03.12.2015 foi elaborada e processada pela Administração Tributária declaração de rendimentos oficiosa, à qual foi atribuído o n.º 0850-2014-D003- 44, de acordo com os rendimentos que constavam nas declarações modelo 13 e modelo 19 dando origem à liquidação de IRS n.º 2015 5005573472 no valor de €16.408,04 (aqui impugnada).
Apreciada a matéria de facto [(D) a F)] não impugnada resulta que a liquidação IRS n.º 2015 5005573472 no valor de €16.408,04, é referente aos rendimentos de 2014, e juros compensatórios, no valor global de €16.585,00, de que resultou o valor a pagar de €8.858,83, decorrente da compensação do valor anteriormente liquidado e recebido, e tinha data limite de pagamento em 20.01.2016.
Em 18.12.2015, o Recorrente apresentou via internet Reclamação Graciosa da liquidação referida no ponto anterior, com o seguinte teor:
“venho reclamar o valor das tributações autónomas incluídos nesta nota de cobrança, em virtude de não condizerem com os valores declarados, venho solicitar esclarecimentos de como foi alcançado o valor das tributações autónomas na demonstração da liquidação de IRS 2015 50055734472. Pede deferimento”
Em 11.01.2016 foi elaborado projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa aludida no ponto anterior.
Notificado que foi para exercício do direito de audição, nada veio dizer, tendo o Chefe do Serviço de Finanças de Soure proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa em 29.01.2016, com os fundamentos constantes do projeto de decisão.
Em 01.02.2016 foi rececionado no domicílio fiscal do ora Impugnante, pelo próprio, ofício tendente à sua notificação do despacho referido no ponto anterior.
Aqui chegado estamos perante um ato que impunha uma atuação, e a partir dessa data o Recorrente tinha o prazo de três meses para impugnar a visada liquidação, nos termos do disposto no artigo 102.º, n.º 1, al. e) do CPPT, o qual se completaria em 02.05.2016.
A presente ação foi apresentada em 07.06.2016, logo foi apresentada fora de prazo.

Voltando à matéria de facto, [j) a N) ] em 31.01.2016 (após conhecimento do projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa) os Recorrentes, entregaram via Internet, nova declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, por referência aos rendimentos do ano de 2014.
Em 26.04.2016 deu entrada no Serviço de Finanças de Soure requerimento do ora Impugnante, com o seguinte teor:
«Assunto: IRS/2014 - Gestão de Divergência,
Ex.mo Senhor:
Os meus melhores cumprimentos,
Venho por este meio solicitar a liquidação da declaração de IRS de 2014 de substituição entregue no dia 31-01-2016 identificada com o número 0850- J0865-98, por forma a ser reposta a divergência com a liquidação oficiosa cobrada coercivamente.
Mais, venho indicar que o valor das prestações de serviços do ano 2014, foi de 9.700,00€ relativo a cedências de exploração.
Sem outro assunto subscrevo-me,»;
Sobre o qual recaiu em 03.05.2016 despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Soure, com o seguinte teor:
«Verificando-se que a declaração apresentada se encontra no estado de não liquidável e tendo sido reclamado o imposto respeitante ao mesmo ano, cuja reclamação foi instaurada neste Serviço de Finanças com o nº 0850201504000943 e mereceu decisão de indeferimento, determino o arquivamento do presente pedido nos termos do artº 56° nº 2 alínea a) da Lei Geral Tributária.»;
O despacho referido no ponto anterior foi levado ao conhecimento do ora Recorrente por ofício do Serviço de Finanças de Soure, datado de 04.05.2016, com o n.º 544.
O Recorrente vem alegar a tempestividade da impugnação judicial da liquidação n.º 20155005573472, com a contagem do prazo com base neste ofício do Serviço de Finanças de Soure, datado de 04.05.2016, com o n.º 544.
A apresentação nova declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, por referência aos rendimentos do ano de 2014, após conhecimento do indeferimento da Reclamação Graciosa, nem nova reclamação poderia reabrir ou alargar prazo de impugnação judicial da liquidação do IRS de 2014 (liquidação n.º 20155005573472).
Alega o Recorrente que a declaração de substituição tem o valor de reclamação graciosa, por força da subalínea II, alínea b) do n.º 3 do art.º 59.º do CPPT.
Determina o referido preceito que “3 - Em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, estas podem ser substituídas:
a) Seja qual for a situação da declaração a substituir, se ainda decorrer o prazo legal da respectiva entrega;
b) Sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional que ao caso couber, quando desta declaração resultar imposto superior ou reembolso inferior ao anteriormente apurado, nos seguintes prazos:
I) Nos 30 dias seguintes ao termo do prazo legal, seja qual for a situação da declaração a substituir;
II) Até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de liquidação, para a correcção de erros ou omissões imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada;
III) Até 60 dias antes do termo do prazo de caducidade, para a correcção de erros imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto superior ao anteriormente liquidado.
Determina o n.º 6 do mesmo preceito que: “ Da apresentação das declarações de substituição não pode resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do acto do tributário, que seriam aplicáveis caso tivessem sido apresentadas.”
Resulta da interpretação da subalínea II, alínea b) do n.º 3 e n.º6 do art.º 59.º do CPPT, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, o sujeito passivo pode apresentar a declaração de substituição, para a correção de erros ou omissões a si imputáveis de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada, até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial das quais não podem resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato do tributário, que seriam aplicáveis caso tivessem sido apresentadas.
Acresce ainda, salientar, que a situação em apreço não se trata de uma liquidação derivada da apresentação das declarações do contribuinte, mas sim derivada de uma liquidação oficiosa, não se aplicando o citado preceito.
Face ao exposto improcede o presente recurso, uma vez, que a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento.

4.3. E assim formulamos as seguintes conclusões/Sumário:
I. Decorre da conjugação do n.º 1 do art.º 125º e n.º 2 do art.º 123.º do CPPT, art.º 604º do CPC que a sentença deve conter fundamentação da matéria de facto a qual consiste na indicação dos elementos de prova utilizados para formar a convicção do juiz e a sua apreciação crítica de modo a perceber o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.
II. Resulta da interpretação da subalínea II, alínea b) do n.º 3 e n.º6 do art.º 59.º do CPPT, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, o sujeito passivo pode apresentar a declaração de substituição, para a correção de erros ou omissões a si imputáveis de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada, até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial das quais não podem resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato do tributário, que seriam aplicáveis caso tivessem sido apresentadas.

5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 26 de outubro de 2017
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina Travassos Bento