Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01988/16.5BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/31/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:ORDEM DOS ADVOGADOS; RECURSO HIERÁRQUICO; LAUDO DE HONORÁRIOS
Sumário:1 – Os artigos 6º e 44º do Estatuto da Ordem dos Advogados preveem expressa e incontornavelmente a existência de recurso hierárquico, para o plenário do Conselho Superior, designadamente, dos laudos de honorários emitidos pelas respectivas secções.

2 – Assim, não poderá prevalecer o estabelecido no n.º 2 do artigo 19.º do Regulamento dos Laudos de Honorários, aprovado pelo Regulamento n.º 40/2005 OA (2.ª série), de 29 de Abril de 2005 (RLH), quando refere que "Não há recurso das deliberações das secções proferidas nos processos de laudos", uma vez que contradiz expressamente normativo habilitante, superior na hierarquia normativa.
Se é certo que nada obsta a que a OA tenha regulamentos, como resulta, aliás, do Artº 17.º da Lei 2/2013, de 10 de Janeiro, tal não poderá servir, no entanto, para contrariar as normas habilitantes com as quais se terá de conformar, sob pena de tal se consubstanciar, designadamente, numa violação do princípio legalidade.
Perante a evidente e ostensiva contradição entre o n.º 2 do artigo 19.º do RLH, e o Estatuto da Ordem dos Advogados, tal deverá ser ultrapassado pela prevalência deste último, pois que mal se compreenderia que a norma regulamentar prevalecesse relativamente à norma habilitante.

3 - Independentemente do facto de estarmos potencialmente perante um ato de natureza tendencialmente opinativo, esse facto não permite afastar o normativo expresso constante do Artº 44º do EOA quando tipifica a possibilidade de recurso hierárquico relativamente aos laudos de honorários.
A natureza técnica, de "verdadeiro juízo pericial", do laudo de honorários não implica que esteja vedado ao plenário do Conselho Superior o controlo do raciocínio que conduziu ao valor indicado por uma secção e de não o sufragar se o reputar de errado.
Se é certo que estamos em presença de um Laudo que não têm valor vinculativo, constituindo, aliás, meio de prova a apreciar livremente pelo Tribunal, mostra-se compreensível que o Conselho Superior da Ordem dos Advogados, se for caso disso, possa ser chamado em sede de Recurso Hierárquico a pronunciar-se face ao mesmo, no que concerne, designadamente, ao raciocínio subjacente ao mesmo.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Ordem dos Advogados
Recorrido 1:D.e A., Sociedade de Advogados RL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
A Ordem dos Advogados, com os demais sinais nos autos, no âmbito de Ação Administrativa apresentada por D.e A., Sociedade de Advogados RL, tendente, designadamente, à declaração de nulidade ou a anulação dos atos praticados pela OA em 23/02/2016 e 29/04/2016, através dos quais, foi recusada a admissão do recurso hierárquico interposto da decisão proferida pelo Conselho Superior em 15/01/2016 e indeferiu a reclamação apresentada quanto à decisão proferida em 23/02/2016, mais peticionando a admissão do recurso hierárquico e a reclamação interpostas, inconformada com a decisão proferida no TAF do Porto, em 21 de setembro de 2018, que julgou a presente ação totalmente procedente, anulando os referidos atos proferidos pela OA, mais a tendo condenado a proceder à apreciação do recurso hierárquico interposto em 05/02/2016, veio recorrer da decisão proferida, apresentando as seguintes conclusões:
“I – O presente recurso jurisdicional vem interposto da decisão proferida pelo tribunal a quo, através da qual se decidiu anular os despachos impugnados e condenar a R. na apreciação do recurso objeto da discussão do litígio.
II – Ora, como se procurou demonstrar à saciedade, entende a ora Recorrente que, salvo o devido respeito – que é muito – a douta sentença ora posta em crise incorreu em erro de julgamento de direito, por incorreta interpretação das normas do art. 44º/nº1/a) do Estatuto da Ordem dos Advogados, conjugado com o art. 19º/nº2 do Regulamento de Laudo de Honorários.
III – Com efeito, e procedendo à interpretação do art. 19º/nº2 do Regulamento do Laudo de Honorários, quando conjugado com as supras referidas normas, no sentido de proibir a interposição de recurso hierárquico, nas situações em que não estejam em causa factos novos suscetíveis de reapreciação, conclui-se, salvo melhor entendimento, pela inexistência de vício de violação de lei, em concreto por violação de norma de hierarquia superior, que seja suscetível de inquinar os atos que foram praticados.
IV – Com efeito, importa salientar a natureza do laudo de honorários, o qual, consubstanciando um verdadeiro parecer técnico, de cariz opinativo, se reputa como um verdadeiro juízo pericial.
V – Face à sua natureza técnica, e configurando-se, porquanto, como um parecer não vinculativo, assente em juízos técnicos, e não se consubstanciando como ato administrativo definitivo e executório, suscetível de recurso contencioso, entende-se que a ratio legis compreendida no art. 44º do EOA foi, justamente, reservar a possibilidade de recurso a situações em que em causa estivesse a reapreciação de novos factos e não aquelas em que estejamos perante um parecer consultivo.
VI - O art. 44º do EOA configura-se como uma norma atributiva de competências no que tange à apreciação de recursos interpostos das deliberações sobre laudos de honorários, definindo, por seu turno, o 19º do Regulamento de Laudo de Honorários, nos seus nº1 e 2, enquanto norma de execução, as situações em concreto em que há a possibilidade de recorrer, atendendo à natureza técnica/pericial do laudo de honorários.
VII – Conclui-se, assim, pelas considerações supra expendidas, que, salvo o devido respeito, mal andou o tribunal a quo ao proferir a decisão ora posta em crise pela ora Recorrente.
VIII – Nesses termos, e incorrendo a douta sentença recorrida de erro de julgamento de direito, por incorreta interpretação das normas em apreço no caso concreto, deve a mesma ser substituída por outra que mantenha em vigor no ordenamento jurídico vigente quer os atos praticados pela R., fazendo-se assim, JUSTIÇA!
Pelo exposto, deve o presente recurso jurisdicional ser considerado procedente, por provado, com as devidas consequências legais, devendo a sentença recorrida ser revogada.”

A Recorrida/D.e A., veio a apresentar as suas Contra-alegações de recurso em 4 de dezembro de 2018, apresentando as seguintes conclusões:
“A. A interpretação que a Ré, ora Recorrente, faz do n.º 2 do artigo 19.º do RLH viola o disposto nos artigos 3.º do Código de Procedimento Administrativo e 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como a hierarquia normativa fixada no artigo 112.º da CRP;
B. O EOA, nos seus artigos 6º e 44º, prevê inequivocamente a existência de recurso hierárquico para o plenário do Conselho Superior dos laudos de honorários emitidos pelas respectivas secções.
C. As decisões do Conselho Superior impugnadas, ao negarem à Recorrida o direito ao recurso com base naquela disposição regulamentar, aplicaram uma norma manifestamente ilegal, por esta desrespeitar a hierarquia das normas jurídicas e, de um modo especial, o princípio da prevalência dos atos legislativos sobre as normas regulamentares, previstos nos artigos já citados do CPA e da CRP.
D. A norma constante do n.º 2 do artigo 19.º, pelo menos com a interpretação a que procedeu a Recorrente, é, não apenas ilegal, como também inconstitucional, por contrariar e modificar a lei habilitante e hierarquicamente superior, bem como por implicar o estabelecimento de uma disciplina com força de lei através de uma fonte secundária (regulamento), violando, dessa forma, os princípios da preeminência da lei e do congelamento do grau hierárquico.
E. Apesar de considerar que aquela disposição regulamentar padece de ilegalidade e inconstitucionalidade, a Recorrente admite, ainda assim, que lhe possa ser atribuído um sentido útil, que não justifique a sua desaplicação.
F. Assim será, tão-só, se o fito daquela norma for, como defende o Tribunal a quo, o de "qualificar a natureza do recurso hierárquico interposto em matéria de laudo de honorários} afastando o caráter obrigatório do mesmo em antecâmara de uma possível reação contencioso das decisões prolatadas pelas secções do Conselho Superior" .
G. A disposição regulamentar terá, dessa forma, o único propósito de atribuir ao recurso hierárquico uma natureza facultativa, "abrindo ao destinatário do laudo de honorários emitido pelas secções do Conselho Superior a possibilidade de sindicar tal laudo em competente ação administrativa no Tribunal Administrativo".
H. Caso se entenda, porém, que nem esta interpretação é compatível com a letra da lei, não restará outra alternativa que não seja julgar ilegal e inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 19.º do RLH.
I. A questão da natureza técnica do laudo de honorários não releva para efeitos de determinação da sua recorribilidade, sendo certo que, atendendo aos seus efeitos, o mesmo configura um verdadeiro ato administrativo.
J. O argumentário aduzido pela Recorrente no sentido de o laudo não configurar um ato administrativo é de todo em todo irrelevante, já que foi o próprio legislador que decidiu dotar os laudos de honorários da característica da recorribilidade.
K. Com o teor do artigo 44.º do EOA, não pretendeu o legislador restringir o âmbito e aplicabilidade do recurso à reapreciação de "factos novos".
L A natureza técnica, de "verdadeiro juízo pericial", do laudo de honorários não implica - longe disso - que esteja vedado ao plenário do Conselho Superior o controlo do raciocínio que conduziu ao valor indicado por uma secção e de não o sufragar se o reputar de errado.
M. De resto, entre nós, a regra é a da admissibilidade de realização de uma segunda perícia - cfr. artigo 487.º do Código de Processo Civil -, a qual diz sempre respeito aos mesmos factos da primeira, não a factos novos!
N. De todo o modo, os laudos de honorários configuram verdadeiros atos administrativos, já que produzem efeitos jurídicos na esfera jurídica do respetivo destinatário.
O. De facto, e como lapidarmente se escreveu na sentença recorrida, "inevitavelmente, o laudo de honorários emitido pela R. produz efeitos jurídicos na esfera jurídica do respetivo destinatário, o que significa que está em causa um verdadeiro ato jurídico, potencialmente definidor da esfera jurídica do destinatário".
TERMOS EM QUE deve o recurso improceder, mantendo-se integralmente a decisão recorrida.

Em 18 de janeiro de 2019 foi proferido Despacho de Admissão do Recurso.

O Ministério Público junto deste tribunal, notificado em 7 de fevereiro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, nas quais se suscitou, nomeadamente, que a sentença proferida em 1ª instância terá incorrido em erro de julgamento de direito, por incorreta interpretação das normas do art. 44º/nº1/a) do Estatuto da Ordem dos Advogados, conjugado com o art. 19º/nº2 do Regulamento de Laudo de Honorários.
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte matéria de facto relevante para a apreciação da questão controvertida, cujo teor infra se reproduz:
“1) Por ofício datado de 20/03/2014, o 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca do Porto oficiou o Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, solicitando a remessa de Laudo sobre os honorários, matéria esta em discussão e julgamento na ação declarativa com o n.º de processo 1082/13.0TJPRT, proposta pela agora A. (cfr. fls. 4 a 60 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
2) Após múltiplas vicissitudes, em 02/10/2015, a Relatora do processo de Laudo emitiu parecer, nos termos do qual, e além de tudo o mais, concluiu o seguinte:
“(…)
22- Face ao exposto, atenta a importância e a dificuldade dos assuntos, o tempo despendido e o resultado obtido somos de parecer que não deve ser concedido laudo favorável à Nota de Honorários Final apresentada no valor de 13.450,00 € (…) mas já o seriam pelo montante de € 7.451,00, os quais aliás já se encontram pagos.
(…)” (cfr. fls. 405 a 410 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
3) Em 16/10/2015, a 3.ª secção do Conselho Superior da Ordem dos Advogados deliberou aprovar o parecer descrito no ponto anterior (cfr. fls. 411 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
4) Por ofício n.º 3.064, datado de 16/10/2015, o Conselho Superior notificou a agora A. da deliberação descrita no ponto anterior, juntando cópia da mesma e do parecer descrito no ponto 2 deste probatório (cfr. fls. 413 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
5) Em 05/11/2015, a A. apresentou exposição dirigida ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados, na qual arguiu a nulidade da deliberação proferida em 16/10/2015, argumentando, além do mais, que a mesma padece de “contradição entre os fundamentos e a decisão, e até entre os próprios fundamentos, e ainda por falta de fundamentação”, bem como que “conhece de uma questão de que não podia tomar conhecimento”, uma vez que, “se se aplica ou não o “success fee”, é algo que, sendo objeto de uma acordo prévio (e escrito), sob a forma de majoração dos honorários em função do resultado, não é matéria que caiba no âmbito do presente pedido de laudo” (cfr. fls. 417 a 427 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
6) Em 11/01/2016, a Relatora do processo de Laudo emitiu parecer, nos termos do qual, e além de tudo o mais, concluiu o seguinte:
“(…)
Ao abrigo do disposto no art.º 2.º do RLH “O laudo sobre3 honorários constitui parecer técnico e juízo sobre a qualificação e valorização dos serviços prestados pelos advogados, tendo em atenção as normas do Estatuto da Ordem dos Advogados, a demais legislação aplicável e o presente regulamento”. Sendo que, o laudo de honorários emitido pela Ordem dos Advogados, nos termos do respetivo Estatuto bem como do Regulamento dos Laudos, não é mais do que um parecer técnico, um juízo pericial respeitante à adequação dos honorários fixados e aos serviços efetivamente prestados (Ac. Relação de Coimbra n.º 897/07.3TBCTB).
(…)
Nestes termos pelo exposto e considerando que as nulidades invocadas pela Sociedade arguente carecem de total e absoluto fundamento, sendo que, o Parecer de Laudo proferido e sufragado pela 3.ª Secção deste C. Superior não coloca em dúvida a justiça da deliberação proferida, somos de parecer que a arguição das nulidades da decisão não merece provimento, devendo confirmar-se a referida decisão sufragada pelo Acórdão da 3.ª secção deste C. Superior de 16 de Outubro de 2015.”
(…)” (cfr. fls. 442 a 445 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
7) Em 15/01/2016, a 3.ª secção do Conselho Superior da Ordem dos Advogados deliberou aprovar o parecer descrito no ponto anterior (cfr. fls. 446 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
8) Por ofício n.º 0147, datado de 18/01/2016, o Conselho Superior notificou a agora A. da deliberação descrita no ponto anterior, juntando cópia da mesma e do parecer descrito no ponto 6 deste probatório (cfr. fls. 449 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
9) Em 05/02/2016, a A. interpôs recurso hierárquico para o Plenário do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, no qual impugnou a deliberação proferida em 16/10/2015, bem como a deliberação emitida em 15/01/2016- ambas emanadas pela 3.ª Secção do Conselho Superior e respeitantes à deliberação que aprova o lado de honorários e à deliberação que indefere as nulidades arguidas quanto àquela, respetivamente (cfr. fls. 450 a 463 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
10) Em 23/02/2016, a Relatora designada, em representação da 3.ª Secção do Conselho Superior, não admitiu o recurso hierárquico descrito no ponto anterior (cfr. fls. 466 e 467 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
11) Por ofício n.º 0700, datado de 03/03/2016, o Conselho Superior notificou a agora A. do despacho descrito no ponto anterior, juntando cópia do mesmo (cfr. fls. 469 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido);
12) Em 18/03/2016, a A. apresentou reclamação da decisão de não admissão do recurso hierárquico, descrita no ponto 10 deste probatório, ao Plenário do Conselho Superior, nos termos que constam de fls. 470 a 474 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido;
13) Em 29/04/2016, o Presidente do Conselho Superior, indeferiu a reclamação descrita no ponto anterior, nos termos que constam de fls. 480 e 481 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido;
14) Por ofício n.º 1362, datado de 05/05/2016, o Conselho Superior notificou a agora A. do despacho descrito no ponto anterior, juntando cópia do mesmo (cfr. fls. 484 do processo administrativo apenso aos presentes autos, e cujo teor se considera aqui como integralmente vertido).”

IV - Do Direito
A Ordem dos Advogados vem com o presente Recurso suscitar predominantemente a verificação de erro de julgamento de direito relativamente à decisão proferida em 1ª instância.

Com efeito, refere a Recorrente que a previsão do n.º 2 do artigo 19.º do Regulamento dos Laudos de Honorários (RLH) não constitui uma violação de uma norma de hierarquia superior que seja suscetível de inquinar os atos que foram praticados.

Mais entende a Ordem dos Advogados que o laudo de honorários consubstancia um parecer técnico, de cariz opinativo, não se consubstanciando assim num ato administrativo e executório, suscetível de ser recorrível contenciosamente.

Entende finalmente a Recorrente que a ratio do artigo 44.º do Estatuto da Ordem dos Advogados reserva a possibilidade de recurso às situações em que esteja em causa a reapreciação de novos factos e não aquelas em que se esteja perante um parecer consultivo.
No que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se na Sentença de 1ª instância:
“(...)
Realmente, assoma cristalinamente que o dissídio que opõe as ora partes se resume em saber se do laudo de honorários emitido por uma secção do Conselho Superior cabe - ou não - recurso hierárquico para o Pleno do Conselho Superior.
Para deslindar a problemática enunciada, importa enunciar os normativos relevantes, consagrados no EOA (aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro).
Assim, dispõe o art.º 6.º, n.º 1 que, “os atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados no exercício das suas atribuições admitem os recursos hierárquicos previstos no presente Estatuto”. E o n.º 3 que, “dos atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados cabe, ainda, recurso contencioso para os tribunais administrativos, nos termos gerais de direito”.
Decorre também do EOA, que o Conselho Superior funciona em Pleno e em secções, reunindo “em sessão plenária e por secções, cada uma delas constituída por sete membros” (art.º 43.º)
Por sua vez, o art.º 44.º do EOA estipula, na parte que releva para o caso agora em discussão, o seguinte: “1- Compete ao conselho superior, reunido em sessão plenária: a) Julgar os recursos interpostos das decisões das secções referidas nas alíneas b) e e) do n.º 3; (…) 2 - (…) 3 - Compete às secções do conselho superior: a) (…); b) (…); c) (…); d) (…); e) Dar laudo sobre honorários, quando solicitado pelos tribunais, pelos outros conselhos ou, em relação às respetivas contas, por qualquer advogado ou seu representante ou qualquer consulente ou constituinte.”
Examinando os preceitos transcritos e conjugando os mesmos, é inevitável concluir que o EOA, nos seus art.ºs 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e), prevê, de modo inequívoco, a possibilidade de haver recurso hierárquico, dirigido e apreciado pelo Conselho Superior em sessão plenária, das decisões emitidas em matéria de laudo de honorários pelas secções do mesmo Conselho Superior. Na verdade, não se descortina ou alcança qualquer outra interpretação diversa dos aludidos preceitos, tendo em conta a respetiva clareza. Realmente, na medida em que o art.º 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e) do EOA consagra, expressamente, a competência do Conselho Superior, em plenário, para julgar os recursos interpostos das decisões das secções emitidas em matéria de laudo sobre honorários, quando solicitado pelos tribunais, não subsiste outra alternativa que não a de entender a estipulação dessa competência como estipulação da existência de recurso hierárquico quanto aos laudos de honorários emitidos pelas secções do mesmo Conselho Superior.
Aliás, tal conclusão é firmemente cimentada pela previsão do n.º 1 do art.º 6.º do EOA, que consagra que “os atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados no exercício das suas atribuições admitem os recursos hierárquicos previstos no presente Estatuto”.
Assente que fica a existência de recurso hierárquico na matéria agora em apreço, por expressa e inequívoca previsão no EOA, impõe-se apurar qual o conteúdo útil a conferir ao disposto no art.º 19.º, n.º 2 do Regulamento dos Laudos de Honorários, publicado como Regulamento n.º 40/2005 da Ordem dos Advogados no Diário da República, 2.ª série, n.º 98, de 20 de maio de 2005 (doravante, RLH). Realmente, conforme alega a R. o sobredito art.º 19.º, n.º 2 do RLH estabelece que “não há recurso das deliberações das secções proferidas nos processos de laudo”. Todavia, por diversas razões, a interpretação deste normativo não pode quedar-se pela mera consideração da letra, antes devendo explorar-se outros elementos hermenêuticos, como o teleológico e o sistemático. Sendo assim, e em primeiro lugar, importa apontar para o consagrado no art.º 112.º da Constituição da República Portuguesa, preceito este que constrói e define a hierarquia normativa. Ora, deste preceito deriva, para além doutros, o princípio segundo o qual as normas de valor hierarquicamente inferior devem compatibilizar-se e respeitar as normas de valor hierarquicamente superior.
Ora, sabendo-se que, quer o EOA, quer o Regulamento n.º 40/2005, configuram atos normativos, é igualmente consabido que o EOA constitui um ato emitido por órgão legislativo e assume valor reforçado- de resto, emanado pela Assembleia da República-, enquanto o Regulamento em causa traduz um ato normativo produzido no exercício da função executiva. Neste conspecto, é de assinalar que a R. configura uma pessoa coletiva de direito público, sob forma de associação pública, submetida, portanto, a todo o manancial legislativo, especialmente, o de natureza constitucional, bem como e ainda o de direito administrativo. Do que vem de se dizer decorre, portanto, que os atos normativos emitidos pela R. ao abrigo do seu poder regulamentar não podem dispor contra legem. E a circunstância do art.º 1.º, n.º 2 e dos art.ºs 44.º, n.º 1, al. i) e 46.º, n.º 1, al.s g), h) e i) do EOA atribuírem poder regulamentar à R. e preverem a elaboração de regulamentos por banda de órgãos da R. em nada belisca o facto de à R. estar vedado, no exercício do respetivo poder regulamentar, criar disposições normativas que, ao invés de se compaginarem, densificarem e concretizarem os princípios e regras insertos no EOA, antes criam regras e princípios diametralmente opostos à da Lei orgânico-estatutária por que se rege toda a existência e atuação da R.. E não colhe em contrário do que vem de expor-se o disposto no art.º 17.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, uma vez que, em momento algum, se rejeita a existência de poder regulamentar por banda da R.. O que se afirma, simplesmente, é que tal poder regulamentar não pode servir qualquer intento que implique a violação dos princípios e regras contidas no EOA.
Em suma, a interpretação que a R. realiza do previsto no art.º 19.º, n.º 2 do RLH viola frontalmente não só o disposto nos art.ºs 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e) do EOA, como desrespeita claramente a hierarquia normativa fixada no art.º 112.º da Constituição da República Portuguesa. A questão que subsequentemente importa responder é, então, a de saber qual a interpretação a conferir ao dito n.º 2 do art.º 19.º do RLH. Ora, nesta matéria tem sido proposta uma leitura diversa do preceito em exame, concretamente, que a significância do mesmo se prende com a possibilidade de impugnação contenciosa direta das decisões emitidas pelas secções do Conselho Superior da R. em matéria de laudo de honorários. Efetivamente, a existência de recurso hierárquico em matéria de laudos de honorários é aceite por FERNANDO SOUSA MAGALHÃES (in Estatuto da Ordem dos Advogados, Anotado e Comentado, Almedina, 8.ª edição, janeiro de 2014, pp. 55 e 56), sendo certo que a interpretação que se expôs antecedentemente é proposta também por ORLANDO GUEDES DA COSTA (Direito Profissional do Advogado, Almedina, 7.ª edição, março de 2010, p. 268). Referencie-se, de resto, que tal interpretação é, em nosso entendimento, a que melhor se coaduna com o preceituado no art.º 6.º, n.º 3 do EOA. Quer isto significar, então, que o art.º 19.º, n.º 2 do RLH não pretende dispor no sentido da impossibilidade da impugnação administrativa, mas sim no sentido da possibilidade da impugnação contenciosa direta. Por outras palavras, não proibindo o n.º 2 do art.º 19.º a existência de recurso hierárquico, tal preceito tem o fito de conferir a tal recurso hierárquico natureza meramente facultativa e não obrigatória, abrindo ao destinatário do laudo de honorários emitido pelas secções do Conselho Superior a possibilidade de sindicar tal laudo em competente ação administrativa no Tribunal Administrativo, se esta for a Jurisdição que no caso concreto assumir a competência. Atentando em todo o expendido, é forçoso concluir, então, que o EOA, nos art.ºs 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e), prevê, inequivocamente, a existência de recurso hierárquico facultativo das decisões emitidas pelas secções do Conselho Superior em matéria de laudo de honorários, recurso este a ser dirigido e apreciado em plenário do Conselho Superior. Igualmente do supra expendido emerge claramente que o disposto no art.º 19.º, n.º 2 do RLH tem o fito, somente, de qualificar a natureza do recurso hierárquico interposto em matéria de laudo de honorários, afastando o caráter obrigatório do mesmo em antecâmera de uma possível reação contenciosa das decisões prolatadas pelas secções do Conselho Superior. Sendo assim, impera concluir que, efetivamente, a decisão proferida pela R. em 23/02/2016 é ilegal, na medida em que, como claramente foi demonstrado antecedentemente, a A. tem o direito de recorrer hierarquicamente das decisões produzidas pela secção do Conselho Superior da R. em 16/10/2015 e 15/01/2016. E, por contágio, uma vez que as razões são as mesmas, é também ilegal a decisões proferida pelo Conselho Superior em 29/04/2016. Tendo em conta que, como se viu, a ilegalidade das decisões impugnadas deriva da interpretação contra legem realizada pela R. no que concerne à conjugação e compatibilização do art.º 19.º, n.º RLH com os art.ºs 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e) do EOA, não se descortina qualquer necessidade de afastar a aplicação do preceituado no aludido art.º 19.º, n.º 2, dado que, como explicamos, o conteúdo útil a atribuir a tal normativo é muito diverso daquele que a R. lhe confere. Por conseguinte, a tutela da pretensão da A. basta-se com a anulação das decisões impugnadas, sendo certo que as ilegalidades que se recortaram e identificaram justificam um juízo de mera anulação, pois que não ocorre, no caso versado, nenhuma das situações descritas no art.º 161.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Procedimento Administrativo.
Por último, releva enfrentar a argumentação esgrimida pela R. no que concerne à natureza do laudo de honorários e inerentes implicações jurídicas. É que a R. sustenta que o laudo configura um mero juízo opinativo, técnico e discricionário, não assumindo por essa razão natureza de ato administrativo.
Ora, examinando este argumentório da R. e cotejando-o com os normativos aplicáveis, desde já se diga que esta argumentação - independentemente do respetivo acerto jurídico - revela-se despiciente. É que, olvida a R. que o legislador optou por estabelecer expressamente a existência de recurso hierárquico em matéria de laudo de honorários. Pelo que, sendo assim, em nada interessa a natureza que a R. atribui ao laudo.
Seja como for, também não nos parece que a R. tenha razão no que tange à qualificação do laudo como mero juízo pericial/opinativo. É que, inevitavelmente, o laudo de honorários emitido pela R. produz efeitos jurídicos na esfera jurídica do respetivo destinatário, o que significa que está em causa um verdadeiro ato jurídico, potencialmente definidor da esfera jurídica do destinatário. De resto, tanto assim é que o destinatário do laudo de honorários pode desafiar o dito laudo perante a Jurisdição competente, clamando pela sindicância do acerto do mesmo perante um Tribunal.
Deste modo, a consideração do direito, por banda do destinatário, a sindicar contenciosamente basta - para nós- como demonstração do desacerto da visão da R. no tocante à natureza do laudo de honorários, dado que este, como se apontou, consubstancia um verdadeiro ato jurídico.
Ponderando e sopesando todo o expendido, não resta outra alternativa, então, que não a de anular os atos emitidos pela R. em 23/02/2016 e 29/04/2016, dado que os mesmos violam frontalmente o preceituado nos art.ºs 112.º, n.º 7 da Constituição da República Portuguesa, os art.ºs 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, al. a) e 3, al. e) do EOA e o9 art.º 19.º, n.º 2 do RLH.
Tendo em atenção a anulação dos atos impugnados, bem como a fundamentação em que se estriba a decisão anulatória, resulta forçosa a conclusão de que a pretensão condenatória merece também a procedência, uma vez que a A. tem direito a recorrer hierarquicamente da decisão proferida pela R. em 23/02/2016.”

Refira-se, desde logo, que se não se vislumbram razões para divergir do decidido em 1ª instância.

Com efeito, a interpretação que a Ordem dos Advogados atribui ao n.º 2 do artigo 19.º do RLH não se coaduna com o estatuído nos artigos 3.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), assim como como a hierarquia normativa constante do artigo 112.º da CRP.

Na realidade, são os próprios artigos 6º e 44º do Estatuto da Ordem dos Advogados que preveem incontornavelmente a existência de recurso hierárquico, para o plenário do Conselho Superior, dos laudos de honorários emitidos pelas respectivas secções, o que desde logo, e sem necessidade de acrescida argumentação, compromete o entendimento adotado pela OA.

Da ilegalidade e inconstitucionalidade do artigo 19.º, n.º 2 do Regulamento dos Laudos de Honorários
Desde logo, refere-se nos controvertidos normativos:
Artº 6º, o Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei 145/2015:
"Os atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados no exercício das suas atribuições admitem os recursos hierárquicos previstos no presente estatuto".

Já a aI. e) do n.º 3 do artigo 44.º do EOA, com a epígrafe «Competência», refere o seguinte:
"Dar laudo sobre honorários, quando solicitado pelos tribunais, pelos outros conselhos ou, em relação às respetivas contas, por qualquer advogado ou seu representante ou qualquer consulente ou constituinte".

Por outro lado, a alínea a) do n.º 1, do mesmo normativo do EOA atribui competência ao conselho superior, reunido em sessão plenária, para "julgar os recursos interpostos das decisões das secções referidas nas alíneas b) e e) do nº 3", onde, como se viu, se inserem os Laudos sobre honorários.

Incontornavelmente, resulta da conjugação dos transcritos normativos, que os laudos de honorários proferidos pelas secções do Conselho Superior admitem recurso, a ser julgado em sessão plenária.

Em face do que precede, não merece censura a sentença proferida em 1ª instância ao ter entendido que "é inevitável concluir que o EOA, nos seus artigos 6.º, n.º 1 e 44.º, n.ºs 1, aI. a) e 3. aI. e), prevê, de modo inequívoco, a possibilidade de haver recurso hierárquico, dirigido e apreciado pelo Conselho Superior em sessão plenária, das decisões emitidas em matéria de laudo de honorários pelas secções do mesmo Conselho Superior.
Na verdade, não se descortina ou alcança qualquer outra interpretação diversa dos aludidos preceitos, tendo em conta a respetiva clareza"

Mais se refere na decisão recorrida que, "não subsiste outra alternativa que não a de entender a estipulação dessa competência como estipulação da existência de recurso hierárquico quanto aos laudos de honorários emitidos pelas secções do mesmo Conselho Superior"

Em face do que precede e tal como decidido pelo tribunal a quo, não poderá prevalecer o estabelecido no n.º 2 do artigo 19.º do Regulamento dos Laudos de Honorários, aprovado pelo Regulamento n.º 40/2005 OA (2.ª série), de 29 de Abril de 2005 (RLH), quando refere que "Não há recurso das deliberações das secções proferidas nos processos de laudos", uma vez que contradiz expressamente normativo habilitante, superior na hierarquia normativa.

Se é certo que nada obsta a que a OA tenha regulamentos, como resulta, aliás, do Artº 17.º da Lei 2/2013, de 10 de Janeiro, tal não poderá servir, no entanto, para contrariar as normas habilitantes com as quais se terá de conformar, sob pena de tal se consubstanciar, designadamente, numa violação do princípio legalidade.
Perante a evidente e ostensiva contradição entre o n.º 2 do artigo 19.º do RLH, e o Estatuto da Ordem dos Advogados, tal deverá ser ultrapassado pela prevalência deste último, tal como preconizado pelo tribunal de 1ª instância, pois que mal se compreenderia que a norma regulamentar prevalecesse relativamente à norma habilitante.

Com efeito, como afirmado, designadamente, por Vieira de Andrade, "Os regulamentos são inválidos de forem desconformes com a constituição e com a lei" (Lições de Direito Administrativo, 5ª edição, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2017, p. 155).

Assim, e tal como já intuído do afirmado, não merece censura o entendimento adotado em 1ª instância, de acordo com o qual, "A interpretação que a R. realiza do previsto no Artº 19. º, n. º 2 do RLH viola frontalmente não só o disposto nos Artºs 6º, n.º 1 e 44.º, n.º 1, al. a) e 3, al. e) do EOA, como desrespeita claramente a hierarquia normativa fixada no artº 112.º da Constituição da República Portuguesa".

Com alguma criatividade, entende ainda o tribunal de 1ª instância que o controvertido normativo regulamentar do RHL visa apenas abrir "ao destinatário do laudo de honorários emitido pelas secções do Conselho Superior a possibilidade de sindicar tal laudo em competente ação administrativa no Tribunal Administrativo".

Independentemente do entendimento que se tenha face ao afirmado no precedente parágrafo, o que é facto é que não merece censura o entendimento adotado face ao item analisado, na decisão recorrida.
Da natureza técnica do laudo de honorários
Insiste, no entanto, a Ordem dos Advogados, enquanto aqui Recorrente, que o laudo de honorários configura um parecer não vinculativo, não se consubstanciando como ato administrativo definitivo executório, mais afirmando que a ratio legis da norma do artigo 44.º do EOA é a de reservar a possibilidade de recurso a situações em que esteja em causa a reapreciação de novos factos e não aquelas em que estejamos perante um parecer consultivo.
Independentemente do facto de estarmos potencialmente perante um ato de natureza tendencialmente opinativo, esse facto não permite afastar o normativo expresso constante do Artº 44º do EOA quando tipifica a possibilidade de recurso hierárquico relativamente aos laudos de honorários.

Tal como afirmado em jurisprudência trazida pelo próprio Recorrido (Ac. RP, de 29/02/1993, BMJ, 425.º, p. 627) a natureza técnica, de "verdadeiro juízo pericial", do laudo de honorários não implica que esteja vedado ao plenário do Conselho Superior o controlo do raciocínio que conduziu ao valor indicado por uma secção e de não o sufragar se o reputar de errado.

Com efeito, se é certo que estamos em presença de um Laudo que não têm valor vinculativo, constituindo, aliás, meio de prova a apreciar livremente pelo Tribunal, mostra-se compreensível que o Conselho Superior da Ordem dos Advogados, se for caso disso, possa ser chamado em sede de Recurso Hierárquico a pronunciar-se face ao mesmo, no que concerne, designadamente, ao raciocínio subjacente ao mesmo.

Finalmente, e como se afirmou na decisão aqui recorrida, "inevitavelmente, o laudo de honorários emitido pela R. produz efeitos jurídicos na esfera jurídica do respetivo destinatário, o que significa que está em causa um verdadeiro ato jurídico, potencialmente definidor da esfera jurídica do destinatário. De resto, tanto assim é que o destinatário do laudo de honorários pode desafiar o dito laudo perante a jurisdição competente, clamando pela sindicância do acerto do mesmo perante um Tribunal".

Em face de tudo quanto precede, igualmente face à matéria precedentemente analisada, não se vislumbra que a decisão recorrida se mostre censurável.

V - DECISÃO
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.
Custas pela Recorrente

Porto, 31 de outubro de 2019

Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa