Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00882/16.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/29/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
ÓNUS DA PROVA
IRREGULARIDADE DA NOTIFICAÇÃO A MANDATÁRIO
Sumário:I - Deve considerar-se eficaz a notificação efectuada de acto tributário, nos termos do n.º 1 do art.º 40.º do CPPT, mesmo não tendo sido dado cumprimento ao n.º 3 do mesmo preceito, quando é feita na pessoa de mandatário constituído, no seu escritório, recusando este a sua recepção (contribui, ainda, para tal conclusão o interessado ter tomado conhecimento das decisões de fixação do rendimento tributável e ter reagido atempadamente contra elas).
II - A renúncia do mandato judicial apenas produz efeitos com a notificação da renúncia ao mandante, notificação que tem de ser pessoal – cfr. artigo 47.º, n.º 2 (anterior artigo 39.º) do Código de Processo Civil.
III - A prova produzida e os elementos juntos aos autos não se mostram, por si só, suficientemente aptos para demonstrar a relação causal prevista no artigo 89.º-A, n.º 3 da LGT, ou seja, o nexo ou ligação entre a fonte e a capacidade aquisitiva demonstrada, no caso, a prova de que os acréscimos patrimoniais e as aquisições/despesas em causa foram realizados com o recurso a rendimentos que não tinham que ser declarados ou do património do próprio contribuinte.
IV - A falta de especificação, pela Recorrente, dos concretos pontos de facto que na sentença foram dados como provados ou não provados e que considera incorrectamente julgados, bem como dos concretos meios probatórios, constantes de registo fonográfico, que impunham decisão sobre pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, impede o Tribunal “ad quem” de reapreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto. Pretendendo a Recorrente impugnar o julgamento sobre a matéria de facto efectuado pelo tribunal de 1ª instância, tem de cumprir esse ónus decorrente do disposto no artigo 640.º do CPC ex vi artigo 281.º do CPPT.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:B... e Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira e B...
Decisão:Negado provimento aos recursos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

B..., contribuinte n.º 2…, e a Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 08/03/2017, que julgou parcialmente procedente o recurso das decisões de avaliação indirecta da matéria colectável de IRS dos anos de 2011 e 2012, proferidas em 18/03/2016, pela Chefe de Divisão dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto (por subdelegação de competências), que fixaram como rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, os montantes de €161.153,97 e €351.200,00, respectivamente.

O Recorrente B... terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“1 – A Recorrente demonstrou e provou que a fonte geradora das suas manifestações de fortuna têm origem nos fundos próprios do seu pai e avô, consubstanciada na prática familiar de longa data e face aos muitos anos de desenvolvimento de atividade comercial e industrial, e que lhes permitiu acumular largas somas de numerário suficiente para garantir os depósitos em numerário ocorridos nos anos de 2011 e 2012;
2 – Não constitui nenhuma ilegalidade o facto do pai e avô do Recorrente terem mantido fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias, valores pecuniários, mesmo que elevados, que lhe permitiu proceder aos depósitos em numerário nos anos de 2011 e 2012;
3 – Tendo o Recorrente demonstrado que as suas manifestações de fortuna, são as doações do seu pai e avô, deve ficar afastado da necessidade de justificar as fontes, ou meios financeiros, por aqueles utilizados na obtenção dos mesmos, cabendo à AT, se assim o pretender, proceder aos atos e procedimentos tendentes a investigar se os valores doados ou transferidos para si foram sujeitos a tributação anterior e enquanto na posse dos mesmos, não lhe cabendo a ele provar como é que eles obtiveram aqueles meios de fortuna;
4 – O Recorrente, ao indicar a fonte geradora das suas manifestações de fortuna, cumpriu o dever que para si resulta do nº.3 do artigo 89º-A da LGT;
5 – A comprovação dos rendimentos declarados em 2011 e 2012 tem como única fonte de manifestação de fortuna, as doações de seu pai e avô, estando devidamente comprovado por documento autenticado a doação de € 230.000,00, o qual permitiu em 2012 os depósitos de € 173.500,00 e € 57.700,00;
6 – Se não fosse a doação de seu avô em 15.12.2012, no montante de € 230.000,00, o Recorrente, sem atividade laboral altamente remunerada e sem atividade comercial altamente lucrativa, agravada pela condição de estudante em Inglaterra, jamais lhe seria possível entre 13.11.2012 e 21.11.2012 obter os rendimentos de € 125.500,00 e em 20.11.2012 ter procedido a um depósito de € 99.000,00;
7 – A Recorrente, na sua qualidade de sujeito passivo, apenas tem de demonstrar e provar qual é a fonte das suas manifestações de fortuna, pelo que ao provar que são as doações de seu pai e avô, cumpre a obrigação que sobre ele pende;
8 – A Lei não identifica e, muito menos enumera um quadro tipo ou padrão de quais devem ser as fontes de manifestações de fortuna, e podendo muito bem sê-lo a doação do pai e do avô, está cumprido o objetivo exigido pelo nº.3 do artigo 89º-A da LGT;
9 – A Douta sentença recorrida incorreu assim em erro de julgamento ao não aceitar a comprovação do Recorrente de que as suas manifestações de fortuna consistem nas doações do pai e do avô;
10 – Não há assim quaisquer motivos para considerar não justificado o valor de € 76.153,90 em 2011 e de € 231.200,00 em 2012 e, em consequência, motivos para recorrer à determinação da matéria tributável por métodos indiretos;
11 – A notificação ao mandatário I..., e por este recusada, viola o princípio legal estabelecido no n.º 3 do artigo 40º do CPPT, porque esta matéria não é reservada a matéria interpretativa da Lei. É uma questão de legitimidade e não de interpretação;
12 – Se o legislador tivesse pretendido, e não pretendeu, considerar validamente eficaz a notificação aos mandatários, ainda que imperfeitamente realizadas ou com inobservância das formalidades exigidas, tê-lo-ia levado à letra da Lei, o que não acontece.
Foram assim violados, entre outros, os princípios estabelecidos nos artigos 87º, nº.1, al. b) e 89º-A da LGT, artigo 40º do CPPT e arts.21º e 34º do CRP.
Termos em que,
Deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, Considerar justificados os valores de € 76.153,90 em 2011 e €231.200,00 em 2012, e ainda nula a notificação efetuada ao mandatário I... por violação do artigo 40º, nº.3 do CPPT.
Assim se fazendo Justiça!
****
A ERFP apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
“(…)
A. Vem o Autor interpor recurso do segmento desfavorável da douta decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no entanto, tal como se demonstrará, a mesma deve, ser mantida, por não estar ferida de qualquer invalidade.
B. Em relação aos rendimentos do ano de 2011, que a douta decisão recorrida considerou e bem, não justificados é de salientar que o Recorrente não demonstrou, como lhe competia, a origem dos mesmos, ou seja a fonte do acréscimo patrimonial”.
C. As justificações trazidas à colação são vazias de conteúdo e incapazes de explicar os depósitos em numerários realizados, cuja proveniência permanece desconhecida.
D. Se o Recorrente, se coloca agora na posição de testa de ferro dos negócios familiares, de ter “18 a 20 anos, não logra com isso demonstrar a proveniência dos depósitos em numerário.
E. Considera o Recorrente que ficou demonstrado, qual foi a fonte de obtenção dos valores em numerários depositados, tendo segundo a sua alegação ficado evidenciado graças aos montantes disponibilizados pelo seu pai e avó”, no entanto esta declaração de vontade não pode constituir fundamento legal, lógico ou razoável para que se considerem justificados estes montantes.
F. Porquanto, tendo as normas jurídicas que suportam a correcção do imposto, como princípio - matriz o combate à fraude e à evasão fiscal, não se pode considerar como critério influenciador da prova, simples alegações, sem qualquer elemento probatório.
G. Seguindo a teoria do Recorrente toda e qualquer manifestação de fortuna seria justificada, desde que se invocasse a utilização de dinheiro de terceiros, nomeadamente de pais e avós, sem que fosse demonstrada a origem do fluxo financeiro inicial e a sua conexão com a sua com os factos.
H. Se é verdadeira a afirmação que “manter o dinheiro fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias não constitui nenhuma ilegalidade”, não se pode com isso ser recompensado com a possibilidade de toda e qualquer manifestação de fortuna de terceiro ser considerada, sem mais, como justificada.
I. Assim, é manifesto que não foi feita qualquer demonstração da proveniência dos depósitos em numerário, da prova apresentada não é possível identificar com certeza a sua origem, não tendo o Recorrente efectuado a prova exigida pelo n.° 3 do artigo 89°-A da LGT, e não o tendo feito estamos perante uma divergência não justificada entre os rendimentos declarados e os acréscimos patrimoniais evidenciados, legitimadora de tributação por via de avaliação indirecta.
J. Relativamente à aquisição da quota da sociedade “A...”, considera e bem a douta decisão recorrida que: “o Recorrente não logrou demonstrar a origem do rendimento que lhe permitiu a realização dessa despesa, não bastando para provar a ilegitimidade do acto de avaliação indirecta dizer que detinha meios financeiros, cabendo-lhe antes demonstrar os concretos meios financeiros que afetou à realização dessa despesa, o que efectivamente não sucedeu”.
K. Em relação aos rendimentos de 2012, que a douta decisão recorrida considerou e bem, não justificados é de salientar que o Recorrente não demonstrou a origem deste valor, “uma vez que (...) não logrou provar que tais depósitos provinham de uma doação de € 230 000,00 efetuada pelo seu avô. Sendo certo que a referida doação, só por si, não justifica os depósitos, cabendo ao contribuinte demonstrar a sua origem, afastando, assim, a possibilidade de estarem em causa rendimento de outra proveniência e passíveis de tributação”.
L. Não obstante a alusão de proveniência do dinheiro através de doação, em face da necessidade do rigoroso percurso desde a origem dos montantes depositados em numerário nas suas contas pessoais, não é efectuada a comprovação e nexo da fonte com os montantes identificados como acréscimos patrimoniais.
M. Não basta que o Recorrente alegue que recebeu, a título de doação do seu avô € 230 000,00, é necessário que se demonstre o percurso específico dos montantes depositados de modo a comprovar a fonte e que aqueles acréscimos não estavam obrigados a declaração fiscal.
N. Tanto mais que resulta dos factos da testemunha Ber..., pai e procurador do Recorrente que “a doação foi de € 230 000,00, em numerário, servindo para a aquisição de uma casa que custou € 650 000,00”, ou seja a mesma doação poderia servir, para justificar várias manifestações de fortuna, caso a lei não exigisse o nexo da fonte com os montantes identificados como acréscimos patrimoniais.
O. Com efeito, é incontornável que a mens legislatori repercutida no n.° 3 do art.° 89°-A da LGT, exigia que o Recorrente efectuasse a prova da relação directa entre a afectação de certos montantes (não sujeitos a declaração) a determinada manifestação de fortuna evidenciada, que não se basta com meras considerações e com uma narrativa dinâmica, inconclusiva, que não é suficiente para afastar a decisão de aplicação de métodos indirectos.
P. Entender o contrário, como faz o Recorrente, desvirtua radicalmente a ratio legis em termos de prova ínsita no aludido preceito, sendo manifestamente contrário à doutrina e à jurisprudência.
Q. Toda a argumentação foi construída, não afasta os pressupostos e condições legalmente exigidas e que determinaram a decisão de fixação do rendimento colectável para os anos de 2011 e 2012, porquanto à mesma e ao contrário do alegado pelo Recorrente, não pode ser imputada nenhuma ilegalidade.
R. Assim, e para efeitos da prova exigida pelo n.° 3 do art.° 89º-A da LGT, não havendo prova do fluxo de mobilização dos concretos meios financeiros para a realização dos depósitos em numerário, não podem os mesmos ser justificados, face à manifesta falta de prova produzida.
S. É notório que o Recorrente pretende subverter o sentido da lei, no entanto, não é demais sublinhar, que quem pratica a evasão e a fraude fiscal e está a infringir os princípios fundamentais da igualdade, da legalidade, da justa repartição do rendimento e da riqueza, da justiça entre os cidadãos, da solidariedade social e fiscal.
T. Não tendo provado quaisquer factos susceptíveis de intimar o juízo permitido pelo art° 89°- A da LGT, basta-se com alegações genéricas que não são sustentadas com a prova do fluxo de mobilização dos concretos meios financeiros para os depósitos efectuados.
U. Mantêm-se assim os pressupostos de facto e de direito que justificaram a decisão de avaliação da matéria colectável, toda a argumentação do Recorrente aduzida no âmbito destes autos, é salvo melhor opinião, insusceptível de abalar a legalidade do segmento decisório objecto deste recurso.
V. No que respeita à notificação do mandatário, sempre se dirá que estando este constituído a revogação e a renúncia do mandato devem ter lugar no próprio processo e são notificadas tanto ao mandatário ou ao mandante, como à parte contrária, nos termos do artigo 47.° n.° 1 do CPC.
W. Sucede que quando os serviços de inspecção notificaram o mandatário do Recorrente este ainda estava constituído no processo, não operando os efeitos da renúncia de forma oral e automática.
X. A decisão objecto de recurso considera e bem que: “o não recebimento das notificações quando ainda era mandatário do Recorrente, apenas ao advogado I... é imputável, pelo que o Recorrente não pode prevalecer-se dessa recusa de recebimento para sustentar a sua falta de notificação”.
Y. Aliás mal seria, que em todas as situações de mandatário constituído sempre que existisse uma decisão desfavorável o mandatário renunciasse ao mandato, como manobra dilatória de “ganhar” tempo.
Z. Igualmente o Estatuto da Ordem dos Advogados, no artigo 62.° n.° 1, alínea e) define o mandato forense como o exercício de qualquer mandato com representação em procedimentos administrativos, incluindo tributários, perante quaisquer pessoas colectivas públicas ou respectivos órgãos ou serviços.
AA. Sendo que nos termos do artigo 95°, n.° 2 desse mesmo Estatuto é referido que: “Ainda que exista motivo justificado para a cessação do patrocínio, o advogado não deve fazê-lo por forma a impossibilitar o cliente de obter em tempo útil, a assistência de outro advogado”.
BB. Conforme afirma o Recorrente à data da notificação o Advogado que acompanhou todo o procedimento ainda era o mandatário constituído nos autos, desta forma foi validamente notificado, nos termos legais, o Recorrente através da pessoa o seu mandatário.
CC. À cautela e sem conceder, o vício hipotético ora imputado à notificação, salvo melhor entendimento, não se coloca, porquanto o Recorrente veio exercer o meio de defesa.
DD. Desta forma ficou sanado qualquer vício que possa ser imputado, tanto mais como se afirma na douta sentença objecto de recurso, “foi atingido o fim pretendido com a notificação, uma vez que o Recorrente tomou conhecimento das decisões de fixação do rendimento tributável e reagiu atempadamente contra elas, pelo que não foi posto em causa o exercício do direito de acção”.
EE. Nos termos expostos, e nos mais de Direito que V. Ex.ª doutamente suprirão, deverão ser julgadas improcedentes, todas as conclusões de recurso, devendo manter-se o segmento decisório impugnado.”
****
No recurso interposto pela Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, foram formuladas as conclusões que se reproduzem de seguida:
“(…)
A. Vem o presente recurso interposto contra a douta sentença de 17/01/2017, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou parcialmente procedente o recurso, com a consequente anulação parcial das decisões recorridas, dos anos de 2011 e 2012.
B. Sucede que, salvo outro e melhor entendimento, a decisão ora em crise, cometeu um erro de julgamento considerando provadas as transferências efectuadas em 2011 e 2012 por J... para a conta bancária do ora Recorrido, no montante global de €195 000,00.
C. Enunciando a douta decisão objecto de recurso, que o facto Z foi considerado provado “tendo em conta o teor dos documentos mencionados nas alíneas A) e C) supra (documentos de confissão de dívida subscrito pelo devedor J... e cheque emitido por Ber...,), conjugado com o depoimento da testemunha J...”.
D. Da valoração da prova produzida, não pode, salvo o devido respeito, considerar-se como provada a existência de empréstimos, realizados em 2009, “sendo que o primeiro empréstimo se destinou a prestar uma garantia junto do “BANCO...” da Suíça, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “betume”, e o segundo empréstimo se destinou à aquisição de capital social de uma empresa situada na Nigéria, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “petróleo”.
E. Sustentou a douta sentença ora recorrida, no que respeita ao ano de 2011, que: “A transferência de € 10 000,00 foi efectuada em 10/02/2011 da conta do “BANCO...” n.º 45835933 para a conta do “Banco...” n.º 466668, ambas pertencentes ao aqui Recorrente, pelo que, como este bem refere, tal transferência não consubstancia um acréscimo patrimonial, porquanto está em causa uma mera deslocação de fundos de uma conta bancária para outra. Já em relação à transferência bancária de € 75 000,00 para a conta do “Banco...” n.° 466668, ficou provado que foi efectuada por J... com finalidade de restituir um valor que lhe havia sido mutuado pelo pai do aqui Recorrente, pelo que terá de se considerar demonstrada a fonte deste acréscimo de património.”
F. No que concerne ao ano de 2012, considerou a douta decisão que “no que tange às transferências bancárias de € 65 000,00 e € 55 000,00, para a conta do “Banco...” n.º 466668, ficou provado que estas foram efectuadas por J... com o objectivo de restituir um valor que lhe havia sido mutuado pelo pai do Recorrente, pelo que terá de se considerar demonstrada a fonte destes acréscimos de património”.
G. O entendimento propugnado na douta sentença, valorou erradamente a prova produzida, considerando como credível a existência de empréstimos, sustentados numa mera declaração de divida, sem uma relação objectiva subjacente e em prova testemunhal prestada por uma pessoa com relações de amizade com o pai do ora Recorrido, há mais de 30 anos.
H. É inegável que nenhum dos negócios que fundamentaram a existência dos empréstimos chegou a realizar-se, nem foi apresentada qualquer documentação idónea ou credível que evidenciasse ou reforçasse a mera possibilidade da sua existência ou execução.
I. É também evidente que o pai do ora Recorrido, não demonstrou capacidade financeira compatível com a realização destes empréstimos.
J. Não é razoável, nem credível que alguém que não tenha capacidade para a realização de um empréstimo seja capaz de o fazer, não se compreendendo a ponderação, salvo o devido respeito, pouco lógica e meramente subjectiva efectuada pelo Tribunal.
K. Pese embora a decisão recorrida tenha efectuado uma ponderação da prova produzida, é inatingível o modo como logrou demonstrar a existência de dois contratos de mútuo, que sustentariam as transferências efectuadas por J…, para o ora Recorrido, sem que tivesse sido cumprido qualquer dos requisitos legais e cujo fim nunca se verificou, uma vez que os negócios nunca se realizaram, ou sequer foi demonstrada a possibilidade da sua realização.
L. Considerou a douta decisão recorrida que as transferências efectuadas em 2011 e 2012 por J... para a conta bancária do Recorrente, no montante global de € 195 00,00, “correspondem à restituição de uma parte do valor que lhe foi mutuado pelo pai do Recorrente, nos anos de 2009 e 2011, para a realização de negócios”, não resultando de qualquer elemento probatório, uma segurança objectivamente verificável, que permita indiciar com uma credibilidade de facto, a existência de qualquer contrato de mútuo.
M. A conjugação de prova produzida é claramente insuficiente, para se lograr justificar um empréstimo e consequentemente permitir que e ora recorrido justifique determinadas transferências para a sua esfera pessoal.
N. Tanto mais que o cheque passado pelo pai do ora Recorrido, no valor de 70.000,00€, em 22/09/2011, não encontra qualquer conformação nas transferências efectuadas por J… a favor do seu filho.
O. Face à fragilidade da prova produzida e que a douta decisão considerou bastante, para afastar parcialmente a legal tributação por métodos indirectos, é totalmente retirado o rigor probatório deste regime, cujo propósito é o de eliminar ou atenuar a fraude e evasão fiscal.
P. A prova produzida não é susceptível de revelar a constituição de quaisquer contratos de mútuo, nem sequer a conexão entre os alegados empréstimos com as transferências, sendo objectivamente impossível de demonstrar, de forma razoável ou lógica a relação subjacente à realização dessas transferências, para a concretização de negócios não demonstrados e que em rigor só se podem considerar inexistentes.
Q. O simples depoimento, apoiado em meros documentos particulares de confissão dívida, ou em cheque sem qualquer conexão com as transferências efectuadas, não podem ser suficientes, para demonstrar a existência de contratos de mútuo, sem rigorosa comprovação do circuito financeiro subjacente.
R. Sem a prova da deslocação dos valores, supostamente mutuados, da conta do mutuante para a conta do mutuário e que deveriam corresponder, para efeitos de justificação parcial, ao abrigo do regime das manifestações de fortuna, aos valores transferidos para a conta do ora recorrido, não pode o Tribunal considerar que as transferências visavam “restituir um valor que lhe havia sido mutuado pelo pai” considerando sem mais, demonstrada a fonte deste acréscimo de património”.
S. A ponderação efectuada pela decisão recorrida é, salvo o devido respeito, absolutamente errada, constituindo um manifesto erro de julgamento, porquanto não se logra demonstrar, para efeitos de prova da manifestação de fortuna a origem dos fluxos financeiros, que não se pode bastar a assunção da existência de contratos de mútuo, destituídos de articulação com a realidade subjacente.
T. A valorização da prova produzida evidencia um manifesto erro de ponderação e de análise crítica, sendo os critérios utilizados desprovidos de razoabilidade, determinando a invalidade da decisão ora recorrida na parte que considerou parcialmente justificada a manifestação de fortuna.
U. Cabendo ao ora recorrido a comprovação de que correspondiam à verdade os rendimentos declarados e de que outra seria a fonte do acréscimo de património em causa, não pode o tribunal considerar como suficiente, a existência de contratos de mútuo celebrados entre terceiros e não cabalmente demonstrados nos autos, como suficientes para ilidir a presunção da manifestação de fortuna da fonte do rendimento, nem tão pouco cheques que não tem qualquer relação subjacente com as transferências efectuadas, ou sequer um depoimento de um amigo da família.
V. Da prova realizada, que constitui, objectivamente uma narrativa circunstancial, sem qualquer alicerce documental, não se pode afastar a aplicação de métodos indirectos, considerando justificadas transferências, como valores a restituir de contratos de mútuo que não se podem considerar como demonstrados.
W. Pelo que, deve a sentença em crise ser revogada por erro de julgamento, sendo substituída por outra, que não considere que as transferências efectuadas por J... tem subjacente contratos de mútuo, celebrados pelo pai do ora Recorrido, não se considerando, demonstrada a fonte destes acréscimos de património.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso Jurisdicional ser julgado procedente, com legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA.”

O Recorrido B... apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
“(…)
1 – Não deve ser anulada – revogada – a decisão do Tribunal que considerou justificada as transferências bancárias de € 75.000,00 em 2011 e de € 65.000,00 e € 55.000,00 em 2012, efetuadas por J... para as contas bancárias do Recorrido, pois a decisão recorrida, quanto a esta matéria não é deficiente nem errada, nem interpretou erradamente a prova produzida.
2 – Não se mostra que a Recorrente tenha pretendido a reapreciação da prova gravada, uma vez que não deu cumprimento ao disposto nas al. a) a c) do nº.1 e a) do nº.2 do art,640º do CPC, pelo que a invocação de erro na apreciação da prova gravada e de erro de julgamento não podem ser atendidas.
3 – A alegação de “erro de julgamento” e “erro na apreciação de prova”, constituem vícios da sentença e são causas da nulidade destas que, como tais deveriam ter sido arguidos junto do Tribunal a quo e, porque o não foram, não podem ser atendidas.
4 – A Lei admite que, por declaração unilateral, se possa reconhecer a existência de uma dívida para com um terceiro, ficando este dispensado de provar a relação fundamental.
5 – O Tribunal goza do direito da livre apreciação da prova segundo a prudente convicção do Juiz, cabendo à parte contra quem a mesma é produzida socorrer-se das regras estabelecidas no artigo 640º do CPC.
6 – Aquando do interrogatório da testemunha J... a Recorrente, se assim o pretendesse, poderia, nos termos dos artigos 514º e 515º do CPC impugnar a testemunha, o que não fez, sendo agora, no mínimo, deslocado levantar a questão da falsidade de depoimento.
7 – Ao Recorrente só lhe competia provar que a fonte de manifestações de fortuna relativamente aos € 195.000,00 era a devolução de empréstimos pelo J....
8 – Evidenciando as suas contas bancárias que aqueles depósitos provieram de transferências de J..., a Recorrente cumpriu o dever que sobre ele pendia de demonstrar a sua fonte de fortuna.
9 – Se a Administração Tributária e Aduaneira desconsidera a revelação daquela fonte de manifestações de fortuna, inverte-se o ónus da prova, cabendo-lhe a ela dizer e provar qual é a origem e proveniência do dinheiro.
10 – A sentença recorrida não enferma das nulidades previstas no artigo 615º, pois não julgou, relativamente às questões que a Recorrente lhe imputa, além do objeto pedido pelo Recorrido.
11 – Deve assim confirmar-se, quanto a esta matéria, a sentença recorrida.”
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento aos recursos.
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Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto dos recursos delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento da matéria de facto e, consequentemente, em erro de julgamento de direito, nomeadamente, quanto à invocada nulidade da notificação na pessoa do mandatário e no que concerne às manifestações de fortuna evidenciadas.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) J... e Ber... outorgaram um documento particular denominado “Termo de confissão de dívida”, datado de 20/11/2009, do qual resulta que o segundo emprestou ao primeiro, na referida data, a quantia de € 180 000,00, que este se compromete a devolver, sem juros, até 31/08/2010 – cfr. fls. 463 do processo físico.
B) Em 10/02/2011, foi efetuada uma transferência bancária de € 10 000,00 da conta do “BANCO...” n.º 45835933 para a conta do “Banco...” n.º 466668, ambas da titularidade do aqui Recorrente – cfr. cfr. fls. 69 e 83 do processo administrativo (PA) 2 apenso aos autos.
C) Em 22/09/2011, Ber… emitiu um cheque no valor de € 70 000,00 à ordem de J... – cfr. fls. 470 do processo físico.
D) Em 18/05/2012, foram depositados na conta bancária n.º 46666810001, titulada por B..., os cheques n.os 59789963 e 59789964, nos montantes de € 40 500,00 e € 4 500,00, emitidos pela sociedade “A…, Lda.” para distribuição de resultados ao Recorrente e a Maria…, respetivamente – cfr. fls. 45, 46, 50, 56 verso e 63 do processo físico.
E) José… e B... outorgaram um documento particular denominado “Doação”, datado de 15/11/2012, através do qual o primeiro declarou que “(…) pretende usar parte das suas poupanças, na ajuda ao seu neto B... para a compra de uma casa (…)” e que “(…) por conta da sua quota disponível doa ao segundo interveniente, seu neto, a quantia de € 230.000,00 (…), já entregues em dinheiro (…)” – cfr. fls. 41 a 44 do processo físico.
F) Em 19/11/2012, foram depositados na conta bancária n.º 45835933.10.001, titulada por B..., os cheques n.os 59789987 e 59789988, nos montantes de € 67 500,00 e € 7 500,00, emitidos pela sociedade “A…, Lda.” para distribuição de resultados ao Recorrente e a Maria…, respetivamente – cfr. fls. 47 a 49, 57 e 72 a 75 do processo físico.
G) Em cumprimento das ordens de serviço n.os OI201502893 e OI201403015, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto efetuaram ao aqui Recorrente ações inspetivas externas, de âmbito parcial (IRS), com incidência sobre os anos de 2011 e 2012 – cfr. relatórios de inspeção tributária insertos a fls. 264 a 283 do PA 1 e a fls. 1 a 17 do PA 2, apensos aos autos.
H) Em 15/06/2015, Ber…, na qualidade de procurador de B..., assinou a ordem de serviço n.º OI201403015 – cfr. fls. 267 do PA 1, apenso aos autos.
I) Em 29/09/2015, Ber..., na qualidade de procurador de B..., assinou a ordem de serviço n.º OI201502893 – cfr. fls. 4 do PA 2, apenso aos autos.
J) Em 27/10/2015, Ber..., na qualidade de procurador de B..., foi notificado, nos termos do art.º 89º-A, n.º 3, da LGT, para provar que correspondiam à realidade os rendimentos declarados em 2012 e de que era outra a fonte do acréscimo de património e despesa efetuada nesse ano – cfr. fls. 189 e 190 do PA 1, apenso aos autos.
L) Em 10/11/2015, Ber..., na qualidade de procurador de B..., foi notificado, nos termos do art.º 89º-A, n.º 3, da LGT, para provar que correspondiam à realidade os rendimentos declarados em 2011 e de que era outra a fonte do acréscimo de património e despesa efetuada nesse ano – cfr. fls. 37 e 38 do PA 2, apenso aos autos.
M) Em 16/12/2015, B..., por intermédio do advogado I..., apresentou a justificação para os acréscimos de património e despesa efetuada em 2011 e 2012 que consta de fls. 191 a 196 do PA 1 apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
N) Em 25/01/2016, B... outorgou uma procuração forense constituindo seu procurador o advogado I... e ratificando o processado que deu entrada na Direção de Finanças do Porto em 16/12/2015 – cfr. fls. 233 do PA 1 apenso aos autos.
O) As correções à matéria tributável de IRS dos anos de 2011 e 2012, que resultaram das inspeções tributárias efetuadas ao aqui Recorrente, apresentam a seguinte fundamentação (cfr. fls. 264 a 283 do PA 1 e fls. 1 a 17 do PA 2, apensos aos autos):
IRS de 2011
«(…)
CAPÍTULO IV – MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
IV.1 – Manifestações de fortuna ou acréscimo de património ou despesa efetuada
Relativamente à situação tributária de B..., NIF 2…e análise das contas bancárias fornecidas após autorização voluntária de acesso de 2015-10-14, em 2011 constatou-se:
Declaração modelo 3 de IRS, categoria A - rendimento ilíquido de € 6.970,00.
Rendimentos brutos sujeitos a taxas liberatórias na importância de € 5.475,21.
No âmbito da presente ação inspetiva, após autorização do acesso a informações e documentos bancários por parte de Ber…, constatou-se que deram entradas nas suas contas bancárias pessoais elevadas quantias num total de entradas de € 287.206.10, como se apresenta nos quadros seguintes:
- imagem omissa -
Dos elementos recolhidos no decurso da ação de inspeção à sociedade “N..., SA” NIPC 5… (em cumprimento da Ordem de serviço n.º OI201403320), sociedade de que B… é acionista e consta como trabalhador, apurou-se que a sociedade tem registado na sua contabilidade, conta 26701 Ber..., valores de empréstimos/suprimentos efetuados no ano de 2011, no montante global de € 110.000,00, que se mantiveram até final do ano.
Apurou-se ainda da consulta ao sistema informático tributário Modelo 11 da aplicação do património que, B… adquiriu em 2011-05-20, quota na sociedade A…, Lda pelo valor de € 7.481,97.
De acordo com os factos descritos nos pontos antecedentes, apura-se que o SP evidenciou no ano de 2011 divergência não justificada entre os rendimentos declarados e manifestação de fortuna ou acréscimo de património ou despesa efetuada, através dos suprimentos/empréstimos referidos, bem como dos movimentos registados a crédito nas contas bancárias ou despesa efetuada, passíveis de enquadramento nos termos dos n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, nas alíneas d) e f), nº 1 do art.º 87.º da mesma Lei.
Em consonância, pela verificação simultânea dos pressupostos de aplicação das alíneas referidas, a avaliação indireta deverá ser efetuada, tal como dispõe o n.º 2 do artigo 87.º da LGT, nos termos dos n.ºs 3 e 5 do artigo 89.º-A da LGT.
IV.2 – Notificação
(…)
Em 2015-12-16, após ultrapassado em mais de quinze dias o prazo concedido para comprovar os rendimentos subjacentes aos meios de fortuna e acréscimos verificados em 2011, B... apresentou, resposta escrita, através do seu mandatário legal, o advogado I..., designado nos termos do art.º 5 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) que acabou por abranger também justificação para situação análoga do ano de 2012.
(…)
IV.3 – Movimentos financeiros em contas pessoais - Acréscimos patrimoniais
Verificados acréscimos de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades de valor superior a € 100.000,00, com a existência no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados, nos termos da aludida f) do n.º 1 do art.º 87.º, da análise da resposta para efeitos do n.º 3 do artigo 89.º-A ambos da LGT, o notificado vem justificar:
- imagem omissa -
Da verba de € 26.606,10 (e não de € 26.706,10 como por lapso foi notificado), o valor de € 6.934,10 “(..) refere-se a vencimentos que auferiu na empresa N... e que lhe foram depositados na sua conta pela própria empresa” (por transferência bancária), considerando-se comprovada esta fonte do rendimento.
Daquela verba, € 19.672,00, “(...) são igualmente depósitos efetuados na sua conta pelo seu pai e necessários a suportar em 2011, os encargos com as propinas devidas à universidade que frequenta em Londres, e uma vez que a bolsa que tem não chega para proceder ao pagamento da estadia, propinas e outros gastos.”
Relativamente a este montante de € 19.672,00, traduzido em três verbas de (€ 18.000,00 + € 1.000,00 + € 672,00) não foi comprovada a conexão entre uma fonte específica dos rendimentos e os acréscimos de património traduzidos nos depósitos, limitando-se a fazer uma genérica alusão a depósitos efetuados pelo seu pai sem o demonstrar.
Apesar de B… não ter apresentado prova, da análise que efetuamos poderá admitir-se como justificado a transferência multibanco de € 1.000,00 efetuada em 2011-12-09 a partir da conta de Ber…, que constituirá liberalidade feita pelo seu pai, mas apenas quanto a esta importância.
Pelo exposto, cabendo ao sujeito passivo, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo patrimonial não sujeitos a declaração tributária, e não tendo o mesmo procedido a tal prova, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e acréscimos patrimoniais evidenciados de € 18.672,00 (19.672,00 - 1.000,00), legitimadora de tributação por via de avaliação indireta.
- imagem omissa -
Quanto aos movimentos financeiros nesta conta, segundo a resposta à notificação é justificado por B… que “Esta conta é titulada com a sua associada O… e, relativamente a esta verba de € 100.000,00, a mesma já apresentou a necessária justificação, na resposta que apresentou na sequência da nota de notificação.”
Quanto aos depósitos em numerário de € 25.500,00, justifica ainda que “Este valor de € 25.500,00, consta igualmente da conta que é titulada pela sua sócia O... e esta já prestou a justificação que se impunha.” Estes valores de “(...) € 100.000,00 e € 25.500,00 não são valores cumulativos em relação ao justificante e à sua associada O.... Trata-se dos mesmos valores e estes encontram-se já a sua justificação na resposta prestada pela Dª O....”
Efetivamente B… figura como segundo titular nesta conta com data de abertura em 2008-02-11 e encerramento em 2012-12-31, figurando como primeiro titular O….
Segundo justificado por O… na resposta apresentada (no ponto 16º) em idêntico procedimento em curso, “A verba de € 100.000,00 corresponde, a liquidação do depósito a prazo existente naquele banco e que foi constituído antes de 2010, conforme está refletido no extrato da conta corrente junta como doc. n.º 13”.
Nada se refere quanto à contitularidade do respetivo valor.
O “doc. 13”, em anexo à resposta, respeita a extrato bancário da conta n.º 34570375.10.001, junto do ex-BANCO..., entre 2011-01-01 e 2012-12-31, detida pelos titulares identificados, portanto sem refletir a constituição do aludido depósito a prazo, que segundo declaração ocorreu antes de 2010.
Analisado o documento anexo com o n.º 15, resulta informação disponibilizada pelo ex-BANCO... (atual B…) de que o depósito a prazo n.º 34570375.20.004, foi constituído em 2009-02-27 por € 100.000,00, pelo que não releva para o ano em causa, encontrando-se justificado o movimento financeiro.
No que concerne à justificação dos incrementos apurados no valor de € 25.500,00 na conta Banco …– Conta 34570375.10.001, conforme já referido, verifica-se coincidência de identidade de mandatário, designado nos termos do artigo 5.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, para os procedimentos inspetivos em curso credenciados pela ordem de serviço OI201502893 para B... e pela ordem de serviço OI201502892 para O….
Nestes termos, e na medida em que a justificação apresentada em nome de B… remete expressamente para a justificação apresentada em nome de O…, teremos de concluir que existe concordância e coerência relativamente aos esclarecimentos prestados.
Tal facto assume especial importância quando incide sobre a explicação de movimentos bancários conexos com uma conta conjunta, pois o facto de ser O... a trazer aos autos explicações sobre os movimentos bancários dessa conta conjunta, conjugada com a remissão genérica constante do requerimento apresentado por B..., contribui inelutavelmente para a conclusão de que a presunção de igualdade na propriedade das verbas depositadas se mostra afastada, por acordo dos contitulares.
Termos em que, a titularidade do valor de € 25.500,00 se considera atribuída por ambas as partes a O..., sendo de aceitar, nesta parte, a justificação apresentada por B....
- imagem omissa -
“Esta conta é pessoal do justificante. A verba € 135.000,00 refere-se aos seguintes depósitos:
11.02.2011, transferência de € 10.000,00
18.05.2011, depósito em numerário de € 5.000,00
19.12.2011, transferência de € 75.000,00
Total € 135.000,00
Todos estes valores resultam de transferências e de um depósito efetuado por J..., residente em Londres, e destinaram-se a liquidar um empréstimo que lhe foi efetuado por seu pai.”
Relativamente às transferências e depósito em numerário não foi demonstrado por qualquer meio a constituição do alegado mútuo particular, nem pelo seu pai, nem por B.... Não junta comprovativo do fluxo ou fluxos financeiros iniciais que alega. Não prova ainda, a data em que os diz ter constituído, nem que os valores alegadamente mutuados além de serem consentâneos com os seus rendimentos estavam na sua posse. Nem é provada a conexão entre os alegados empréstimos com os acréscimos patrimoniais em causa.
Resulta ainda em 2011-05-18 um depósito em numerário no valor de € 50.000,00, em que mais uma vez, não é apresentada prova que permita identificar com certeza a sua origem.
Não é demonstrado quer o circuito financeiro desse depósito quer a fonte do rendimento e que o mesmo não estava sujeito a declaração.
Pelo exposto, cabendo ao sujeito passivo, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo patrimonial verificado não sujeito a declaração tributária, e não tendo o mesmo procedido a tal prova, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e acréscimos patrimoniais evidenciados de € 135.000,00, legitimadora de tributação por via de avaliação indireta.
IV.4 – Manifestação de fortuna - Suprimentos
(…)
Tendo em conta o estabelecido na al. d) do n.º 5 do artigo 89º-A da LGT, consideram-se como rendimentos declarados os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos, ascendendo no caso presente ao valor de € 6.984,04:

Atento o montante da manifestação de fortuna supra evidenciada, designadamente de suprimentos no valor de € 110.000,00, verificada uma desproporção superior a 50% para menos, nomeadamente de 87,3%.
(…)
De acordo com a justificação de B..., o empréstimo/suprimentos de € 110.00,00, e não de € 116.200,00 como indicado na resposta, “(...) saiu das contas:
34570375.10.001 – BANCO...
Em 01.03.2011 € 50.000,00
Em 10.03.2011 € 50.000,00
4583593310001
Em 01.03.2011 € 10.000,00
Valores estes, que entende “(…) já anteriormente justificados.”
Quanto aos valores reais dos fluxos financeiros dos referidos “suprimentos” no montante de € 110.000.00, tiveram origem em três transferências a seguir descriminadas para a conta de depósitos à ordem de N..., SA, junto do ex-BANCO..., com origem nas seguintes contas bancárias:
- imagem omissa -
B... considera justificados os suprimentos nos termos antes indicados. Mas, com exceção do valor de € 10.000,00 proveniente da sua conta bancária junto do ex-BANCO..., n.º 45835933.10.001, que integrou rendimentos/acréscimos não justificados e já analisado no ponto IV.3 (…), os outros dois fluxos financeiros respeitam a duas transferências no valor de € 50.000,00 cada, provenientes de duas contas distintas junto do ex-BANCO...:
– uma transferência em 2011-03-01 da conta 34570375.10.001 em que B... é contitular com O...; e
– outra transferência em 2011-03-10 da conta 33163973.10.001, titulada exclusivamente por O....
Dos registos contabilísticos de N..., SA, resulta que o autor dos suprimentos é B..., ficando, a empresa beneficiária, nos termos legais, na obrigação de lhe restituir igual montante. Porém, excetuando o referido valor de € 10.000,00, as outras duas entregas efetuadas à sociedade respeitam a movimentos financeiros detidos por O... registados em nome de B....
B... não apresentou qualquer prova, documento dos suprimentos ou justificação de proveniência dos meios financeiros entregues à empresa e nesta registados em seu nome, meios que representam, legalmente, um direito pessoal de crédito sobre a sociedade. Ainda assim, analisados os elementos bancários concluímos que o valor da transferência de € 10.000,00 e registado na N..., SA como suprimento, é de admitir como justificado.
Relativamente ao remanescente no valor de € 100.000,00, ainda que não justificado pelo sujeito passivo para efeitos do n.º 3 do art.º 89.º-A, mas respeitando os dois fluxos financeiros a duas transferências de duas contas identificadas (uma titulada por ambos os contitulares e outra exclusivamente por O...) contas que, foram já objeto de análise na esfera de O..., estes meios de fortuna identificados como titulados por B... não relevam para a determinação do rendimento tributável.
IV.5 – Outros acréscimos de património ou despesa efetuada
No decurso da ação de inspeção apurou-se ainda, da consulta ao sistema informático tributário – Modelo 11 da aplicação do património que B... adquiriu em 2011-05-20 quota na sociedade A..., Lda pelo valor de € 7.481,97.
Este acréscimo de património ou despesa efetuada não foi notificado ao sujeito passivo para efeitos de comprovação nos termos do n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT. Contudo, identificado no decurso da ação de inspeção, este meio de fortuna é passível de integrar a avaliação indireta prevista na al. f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT.
Analisados os extratos bancários não se identificou valor que pudesse associar-se à importância declarada, devendo, B... comprovar, em ordem a este meio de fortuna/despesa efetuada, que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada, sendo certo que, apresentando prova adequada e necessária para efeitos do n.º 3 do art.º 89-A da LGT no prazo para o exercício do direito de audição previsto nºs art.ºs 60.º da LGT e 60.º do RCPITA, o mesmo será afastado para efeitos da determinação do rendimento tributável.
IV.6 – Conclusão
Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, a B... cabe a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados no ano de 2011 e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada, não sujeitos a declaração tributária.
Por tudo quanto foi exposto, B... não fez essa prova para a totalidade das situações. Não demonstrou, efetivamente, a origem dos fluxos financeiros, relacionando a afetação de certo rendimento (não sujeito a declaração/tributação nesse ano) a determinado acréscimo de património ou despesa evidenciados.
E não tendo demonstrado as fontes de rendimento que lhe permitiram os acréscimos patrimoniais verificados, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e incrementos patrimoniais evidenciados de valor superior a € 100.00000, legitimadora de tributação por via de avaliação indireta nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87º da LGT.
(…)
CAPÍTULO V – CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
(…)
V.1 – Critérios
Tendo em conta o estabelecido na al. a) do n.º 5 do artigo 89º-A da LGT, o rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, é a diferença entre o acréscimo de património evidenciados e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo nos mesmos períodos de tributação.
Assim e, face aos valores declarados, o rendimento líquido declarado em 2011 apura-se no montante de € 6.984,04 como se demonstra:

Os valores líquidos auferidos de rendimentos de trabalho dependente e de capital, descritos no quadro supra, foram já deduzidos nos valores identificados a crédito nas respetivas contas pelo que, o valor dos incrementos patrimoniais evidenciados e não justificados ascende no ano de 2011, segundo fundamentação do capítulo anterior, ao valor de € 161.153,97, como se discrimina:
- imagem omissa -
V.2 – Apuramento do rendimento Tributável
Por todo o exposto e de acordo com o descrito no capítulo anterior, a correção ao rendimento tributável com recurso a métodos indiretos ascende, em 2011, a € 161.153,97, apurado conforme quadro seguinte:
Determinação do Rendimento da Categoria G, Artigo 9.º n.º 1, al. d) CIRS

(…).»
IRS de 2012
«(…)
CAPÍTULO IV – MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
IV.1 – Manifestações de fortuna ou acréscimo de património ou despesa efetuada
Relativamente à situação tributária de B..., NIF 2…, em 2012 constatou-se:
– Declaração modelo 3 de IRS, categoria A - rendimento ilíquido de € 6.970,00.
– Rendimentos brutos sujeitos a taxas liberatórias na importância de € 28.532,17.
– Nesse mesmo ano verificou-se a aquisição em 2012-11-22 de prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de Foz do Douro, sob o artigo n.º U-2864-BF, pelo valor declarado de € 650.000,00.
– No âmbito da ação de inspeção em curso, após autorização do acesso a informações e documentos bancários, constatou-se que deram entradas nas contas tituladas por B... elevadas quantias num total de entradas de € 1.355.238,48, como se apresenta nos quadros seguintes:
- imagem omissa -
– Dos elementos recolhidos no decurso da ação de inspeção à sociedade “N…, SA” NIPC 5… (em cumprimento da Ordem de serviço n.º OI201403320), sociedade de que B... é acionista e consta como trabalhador, apurou-se que a sociedade tem registado na sua contabilidade, na conta 26701 – Ber..., valores de empréstimos/suprimentos efetuados no ano de 2012, no montante global de € 57.700,00, que se mantiveram até ao final do ano.
De acordo com os factos descritos nos pontos antecedentes, apura-se que o SP evidenciou no ano de 2012, divergência não justificada entre os rendimentos declarados e manifestação de fortuna ou acréscimo de património ou despesa efetuada, evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação, através da aquisição de imóvel, dos suprimentos/empréstimos referidos, bem como dos movimentos registados a crédito nas contas bancárias ou despesa efetuada, passíveis de enquadramento nos termos dos n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, nas alíneas d) e f), nº 1 do art.º 87.º da mesma Lei.
Em consonância, pela verificação simultânea dos pressupostos de aplicação das alíneas referidas, a avaliação indireta deverá ser efetuada, tal como dispõe o n.º 2 do artigo 87.º da LGT, nos termos dos n.ºs 3 e 5 do artigo 89.º-A da LGT.
IV.2 – Notificação
(…)
Em 2015-12-16, após ultrapassado o prazo concedido para comprovar os rendimentos subjacentes aos meios de fortuna e acréscimos verificados em 2012, B..., apresentou resposta escrita através do seu mandatário legal, o advogado I....
Cabendo dissecar a resposta/justificação apresentada para o ano de 2012 (que acabou por abranger também justificação em procedimento análogo ao ano de 2011), a mesma será analisada segundo a natureza das transações (…).
IV.3 – Movimentos financeiros em contas pessoais – Acréscimos patrimoniais
Verificados acréscimos de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades de valor superior a € 100.000,00, com a existência no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados, nos termos da aludida f) do n.º 1 do art.º 87.º, da análise da resposta para efeitos do n.º 3 do artigo 89.º-A ambos da LGT, o notificado vem justificar:
A – Banco BANCO... Conta N.º 45835933.10.001
As entradas a crédito nesta conta ao longo de 2012 importam em € 703.434,10 com a seguinte descriminação:

- imagem omissa -
De acordo com os pontos 6.º e 7.º da resposta à notificação, é justificado como se transcreve:
“A verba de € 703.434,10 tem a seguinte proveniência, como resulta da conta corrente que se junta como doc. n.º 1 (junta extrato de conta bancário).
a) Vários depósitos referentes a vencimentos da empresa N... de € 6.934,10;
b) Depósito de € 400.000,00 em 2012-11-21, proveniente da venda da sua residência na Rua…, Porto.
O diferencial entre € 703.434,10 e € 525.934,10, que é de € 177.500,00, tem a seguinte proveniência:
O Justificante, ao longo do ano de 2012, obteve a ajuda do seu avô para suportar os custos da sua formação em Londres, tais como pagamento de propinas, estadia, alimentação e deslocações;
Tais ajudas eram-lhe entregues em dinheiro que ele depositava no banco, como resulta dos depósitos mais significativos em:
03.01.2012 € 10.000,00
12 04.2012 € 12.000,00
13.11.2012 € 12.000,00
No final de 2012, surgiu a oportunidade de trocarem de habitação, para o que foi necessário a ajuda do seu avô que em 15.12.2012 lhe fez uma doação de € 230.000,00, nesta doação incluindo os valores que já lhe havia anteriormente entregue (Doc n.º 2). E daí,
Os depósitos de valor elevado na sua conta em:
15.11.2012 € 12.000,00
20.11.2012 € 99.000,00”
Relativamente aos montantes a que correspondem as alíneas a) e b) da nota justificativa, os valores correspondentes de € 6.934,10 e de € 400.000,00 encontram justificação e conexão com elementos disponíveis na base de dados da AT.
Apesar do sujeito passivo indicar como justificado o valor de € 525.934,10, mas não descriminado/justificado na resposta à notificação, pelos elementos e informação disponíveis é então possível identificar:
– Dois cheques da sociedade A…, Lda, com os n.ºs 5978998 / 87 no valor de € 7.500,00 e de € 67.500,00, (o primeiro emitido a favor de sua mãe Maria…) relativos a lucros distribuídos e adiantamento por conta de lucros que perfazem o valor de € 75.000,00.
– Transferência bancária no valor de € 44.000,00 com origem em conta bancária n.º 46668-10-01 titulada pelo SP no Banco....
Correspondendo o valor de mencionado de € 525.934,10 aos seguintes fluxos:
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Restando justificar o valor de € 177.500,00 (€ 703.434,20 - € 525.934,10) que, segundo a “nota de justificação” tem proveniência em “ajuda do seu avô”, para suportar custos da sua formação e trocar de habitação, através de doação de € 230.000,00 que lhe fez, doação esta, que inclui “(...) valores que já lhe havia anteriormente entregue”.
Analisados os elementos bancários foi ainda possível identificar uma transferência bancária no valor de € 4.000,00 com origem na conta 47504066.10.001, titulada por Ber..., seu pai, que se aceita justificada enquanto liberalidade. Assim, a parte remanescente por justificar que ascende a € 173.500,00 corresponde a dezanove depósitos em numerário ao longo do ano de 2012.
De acordo com a justificação apresentada, as ajudas do avô entregues em dinheiro eram depositadas no banco “(...) como resulta dos depósitos mais significativos em 3 de janeiro no valor de € 10.000,00, em 12 de abril e 13 de novembro no valor de € 12.000,00 cada; e, depósitos de valor elevado em 15 e 20 de novembro, respetivamente de € 12.000,00 e € 99.000.00”.
Foi anexado como “Doc. 2”, documento de Doação de 2012-11-15 em que intervieram o seu avô José…, na qualidade de doador e B... como segundo interveniente e donatário.
Não obstante a alusão de proveniência do dinheiro através de doação, em face da necessidade do rigoroso percurso desde a origem dos montantes depositados em numerário nas suas contas pessoais, não é efetuada a comprovação e nexo da fonte com os montantes identificados como acréscimos patrimoniais.
Alega que os acréscimos evidenciados resultam de ajudas em dinheiro do seu avó e a título documental juntam documento de doação que segundo diz são a respetiva fonte. Mas tal alusão e documento não têm a potencialidade de provar que os depósitos efetuados se reportam às alegadas importâncias entregues pelo seu avô, não permitem apurar se essas alegadas importâncias pertenciam ao avô e/ou se já lhe pertenciam, assim como não permitem apurar com rigor específico que as alegadas importâncias “entregues em dinheiro que ele depositava no banco” correspondem às que foram depositadas.
Com exceção de um dos depósitos em numerário com data de 2012-04-12 no valor de € 12.000,00, os depósitos foram realizados por familiares de B... e por terceiros não identificados.
Não é indicado em relação a cada importância depositada, concretamente e com segurança, a proveniência concreta e rigorosa, o percurso específico dos montantes depositados de modo a comprovar a fonte e que aqueles acréscimos não estavam obrigados a declaração fiscal.
Não cabendo assim discutir:
se a doação ocorreu nos termos exatos em que se refere praticada;
se José… é detentor de meios de fortuna tão elevados em razão do exíguo património e rendimentos declarados nos últimos oito anos que rondaram os cerca de € 13.000,00 anuais e de doação de € 230.000,00, por conta da quota disponível;
se teve como motivação de “pretender usar parte das suas poupanças, na ajuda ao seu neto B... para a compra de uma casa que será a sua morada de família” aquisição que veio a ser declarada em 2012-11-22, nada dizendo sobre os custos da formação ao longo do ano;
se possuía tão elevada quantia de dinheiro à sua guarda com oitenta e oito anos e porque, possuindo essas importâncias, não as fez transitar por instituição de crédito, o que deve assinalar-se é, que a doação nos termos alegados, não justifica por si só, para os efeitos legais, os incrementos patrimoniais como depósitos em numerário nas suas contas pessoais.
Pelo exposto, cabendo ao sujeito passivo, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89º-A da LGT, a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo patrimonial não sujeitos a declaração tributária, e não tendo o mesmo procedido a tal prova, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e acréscimos patrimoniais evidenciados de € 173.500,00, legitimadora de tributação por via de avaliação indireta.
B – Banco BANCO... Conta N.º 34570375.10.001
Ao longo de 2012, apuram-se as seguintes entradas a crédito nesta conta:
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Segundo a resposta à notificação, ponto 8º é justificado pelo SP nos seguintes termos:
“Esta conta é igualmente titulada pela sua associada O... e relativamente à verba de € 356.200,00, esta mesma verba consta da nota de notificação que foi efetuada à Dª O... que já prestou a necessária justificação.
Relativamente à verba de € 26.147,20, a mesma engloba a verba de 24.000,00, que se encontra na nota de notificação efetuada à sua associada Dª O..., o diferencial está refletido na conta em 29.10.2012 como “transferência” correção de depósito € 1.610,00 + € 537,20 = € 2.147,20. (Doc. n.º 1)
Somando este valor de € 2.147,20 aos € 24.000,00 referidos em supra, perfaz o valor de € 26.147,20.”
Efetivamente B... figura como segundo titular nesta conta que tem data de abertura em 2008-02-11 e encerramento em 2012-12-31, tendo como primeiro titular O....
De acordo com a resposta apresentada por O... em procedimento análogo em curso, (no ponto 19º da resposta) esta justificou:
“Esta conta não revela nenhuma liquidação de um só depósito a prazo de € 356.200,00, porque não existiu. O que existiu foi a constituição de diversos depósitos a prazo sucessivamente renováveis, que no seu conjunto poderão ter atingido, em determinado momento € 356.200,00, como é refletido no documento n.º 15.
Deste montante, o valor de € 250.000,00 é um empréstimo concedido pelo próprio banco, como está refletido no extrato da conta corrente, junta como doc. n.º 13. O restante são valores do giro da Justificante.
Liquidou-se o empréstimo de € 250.000,00 que o Banco emprestara para fazer o depósito a prazo.
€ 106.200,00 foram transferidos em 30.04.2012 para a N… para suprir insuficiências de tesouraria.”
Nada se refere quanto à contitularidade dos respetivos valores. E o aludido “doc. 13”, respeitando a extrato bancário da conta n.º 34570375.10.001, junto do BANCO..., entre 2011-01-01 e 2012-12-31, não reflete a constituição dos aludidos depósito a prazo.
Conforme apurado em ação de inspeção (ordem de serviço OI201305437), ao ano de 2010, à N…, SA, que tem O... como administradora, o valor de € 250.000,00 foi formalmente concedido à sociedade como conta corrente caucionada e registado na conta 2511122 - BANCO... – CC 3067058340002, tendo esta, na mesma altura, efetuado empréstimo no mesmo montante à administradora evidenciado na conta 2781100001 - O....
Este facto que foi analisado em sede de inspeção nesse ano de 2010 e nos anos de 2011 e 2012, viria a ser regularizado em 2012-04-13, com o reembolso à N…, SA/ex-BANCO... do valor de € 250.000,00.
Analisado o documento anexo com o n.º 15, resulta informação disponibilizada pelo ex-BANCO... (atual B…) que os montantes de € 56.200,00 e € 50.000,00 correspondentes a liquidação de depósito a prazo em 2012-04-30, conclui-se que os mesmos foram constituídos, respetivamente, em 2009-02-27 e 2011-03-01, pelo que não relevam para o ano em causa. O valor constituído em março de 2011 de € 50.000,00 foi objeto de análise em procedimento inspetivo ao ano de 2011, valor que se considerou justificado.
Encontra-se assim justificação para os movimentos financeiros no valor de € 356.200,00, relativo a liquidação de três depósitos a prazo.
No que concerne à justificação dos incrementos apurados no valor de € 24.00.00 na conta Banco…– Conta 34570375.10.001, verifica-se coincidência de identidade de mandatário, designado nos termos do artigo 5.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, para os procedimentos inspetivos em curso credenciados pela ordem de serviço OI201403015 para B... e pela ordem de serviço OI201403016 para O....
Nestes termos, e na medida em que a justificação apresentada em nome de B... remete expressamente para a justificação apresentada em nome de O..., teremos de concluir que existe concordância e coerência relativamente aos esclarecimentos prestados.
Tal facto assume especial importância quando incide sobre a explicação de movimentos bancários conexos com uma conta conjunta, pois o facto de ser O... a trazer aos autos explicações sobre os movimentos bancários dessa conta conjunta, conjugada com a remissão genérica constante do requerimento apresentado por B..., contribui inelutavelmente para a conclusão de que a presunção de igualdade na propriedade das verbas depositadas se mostra afastada, por acordo dos contitulares.
Termos em que, a titularidade do valor de € 24.000,00 se considera atribuída por ambas as partes a O..., sendo de aceitar, nesta parte, a justificação apresentada por B....
C – Banco... Conta N.º 466668-10-01
Nesta conta apuram-se as seguintes entradas a crédito:
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De acordo com o ponto 9º da resposta:
“É referido na nota de notificação, a verba de € 269.457,18, como entradas a crédito da conta. Da análise da conta corrente, o Justificante apenas verifica o seguinte:
Em 21.02.2012 - transferência de J..., no valor de € 65.000,00
Em 28.02.2012 - transferência de J..., no valor de € 55.000,00
Em 18.05.2011 - depósito de dois cheques proveniente de
distribuição de resultados da A..., Lda € 75.000,00
Verbas estas que totalizam € 165.000,00. Para além destes valores há apenas pequenos incrementos patrimoniais provenientes das aplicações financeiras. Solicita assim o necessário esclarecimento para a existência desta discrepância.”
Antes de mais e de acordo com a descriminação efetuada no quadro supra o valor das entradas a crédito ascende a € 254.958,42 em vez do valor de € 269.457,18 referido na notificação, devido a lapso de soma no montante de € 14.498.76 (6.999,36 + 7.499,38), que correspondem a valores de saída de fundos da conta em 2012-04-24 (…).
Da análise da resposta/justificação de 2015-12-16, esclarecimento que abrange o ano de 2012, mas também o de 2011 e, conciliação de elementos de ambos os períodos ao dispor, apesar de não justificados pelo SP na resposta encontra-se justificação para os seguintes fluxos financeiros:
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O cheque de A..., Lda, no valor de € 4.500,00 respeita a resultados atribuídos/pagos à sócia Maria…, mãe de B....
Assim, expurgados os montantes discriminados neste quadro aos valores evidenciados a crédito na conta 466668-10-01, carecem de justificação as duas transferências bancárias com datas de 21 e 28 de fevereiro de 2012 ordenadas por J..., no valor de € 65.000,00 e € 55.000,00. E sobre estes fluxos o SP não comprovou a respetiva fonte e que os mesmos não estão sujeitos a declaração.
Não foi demonstrado por qualquer meio a constituição do alegado mútuo particular. Não prova a data em que o diz ter constituído, nem que o valor alegadamente mutuado além de ser consentâneo com os seus rendimentos estava na sua posse juntando comprovativos dos fluxos financeiros iniciais que alega. Nem é provada a conexão entre os alegados empréstimos com os acréscimos patrimoniais evidenciados.
A simples alusão a empréstimos sem rigorosa comprovação dos valores creditados na conta, não basta para cumprir com a obrigação estabelecida na lei, quando o que está em causa, em termos essenciais, é afastar a ideia de que tais rendimentos estão sujeitos a tributação, evidenciando, que se trata de rendimentos já sujeitos a tributação em devido tempo.
O facto de as transferências terem sido feitas para a conta não quer dizer que o dinheiro antes lhe pertencia, já que não se sabe quem era o proprietário na origem e muito menos qual foi o motivo que deu origem àquelas transferências e, muito menos fica demonstrado que aquela fortuna foi obtida em anos anteriores, ou seja, não se sabe se o dinheiro aqui em apreço deveria ter sido ou não declarado, já que não se sabe qual a sua proveniência e qual o motivo que levou à realização daquelas transferências para a conta dos recorrentes, de modo que, a fortuna evidenciada não se encontra minimamente justificada.
Assinala-se que a proceder o entendimento de que não lhe compete a comprovação, seria fácil legalizar rendimentos ilícitos, bastando para tanto depositar esse dinheiro na conta de alguém e depois transferir-se para a sua conta e, automaticamente, seria considerado dinheiro justificado e legal.
Pelo exposto, cabendo ao sujeito passivo, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo patrimonial verificado não sujeito a declaração tributária, e não tendo o mesmo procedido a tal prova, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e acréscimos patrimoniais evidenciados de € 120.000,00, legitimadora de tributação por via de avaliação indireta.
IV.4 – Manifestação de fortuna - Suprimentos
(…)
Tendo em conta o estabelecido na al. d) do n.º 5 do artigo 89.º- A da LGT, consideram-se como rendimentos declarados os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos, ascendendo no caso presente ao valor de € 23.924,73:

Atentos às manifestações de fortuna evidenciadas, pela aquisição de imóvel pelo valor declarado de € 650.000,00 e por suprimentos no valor de € 57.700,00, verifica-se desproporção superior a 30% para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela, nomeadamente de 84,94%.
(…)
A – Aquisição de Imóvel U- 2864-BF
O artigo 2864-BF (…) foi adquirido em 2012-11-22, por B..., pelo valor declarado de € 650.000,00.
(…)
Dos elementos apresentados pelo SP não resulta em concreto justificação da fonte de rendimentos que permita esta manifestação de fortuna, antes a alusão genérica da ajuda de seu avô por meio de doação.
Através da sua resposta, ponto 6º, que analisamos a propósito de acréscimos patrimoniais tratados no ponto IV.3, A - Banco BANCO... Conta N.º 45835933.10.001, conta bancária a partir da qual foi mobilizado o valor da contraprestação com a emissão do cheque 59067353 no valor de € 650.000,00, concluímos por um valor não justificado de € 173.500,00.
Razão porque se considera justificado, nos termos daquela análise, o rendimento e a relação causal da fonte para a aquisição do imóvel.
B – Suprimentos/empréstimos
Estes movimentos financeiros a crédito na empresa foram concretizados através de quatro depósitos em numerário e de cheque no valor global de € 57.700,00 na conta bancária da empresa junto do BANCO... (atual B…) 30670583.10.001 e registados na conta 1201 – BANCO... por contrapartida da conta de suprimentos 26701 – Ber...:
(…)
Cabendo ao sujeito passivo a prova da origem das manifestações de fortuna evidenciadas, como é que ela se materializou, através da resposta de 2015-12-16 não chega qualquer elemento comprovativo da proveniência das verbas que destinou aos suprimentos à sociedade.
Não logrando fazer prova entre a alegada fonte de rendimento e os suprimentos realizados, prova que legalmente lhes incumbia efetuar, este meio de fortuna é passível de enquadramento na al. d) do n.º 1 art.° 87.º da LGT.
IV.5 – Conclusão
Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, a B... cabe a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados no ano de 2012 e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada, não sujeitos a declaração tributária.
Por tudo quanto foi exposto, B... não fez essa prova quanto à totalidade das situações evidenciadas. Não demonstrou, efetivamente, a origem dos fluxos financeiros, relacionando a afetação de certo rendimento (não sujeito a declaração/tributação nesse ano) a determinado acréscimo de património ou despesa evidenciados.
E não tendo demonstrado as fontes de rendimento que lhe permitiram os acréscimos patrimoniais verificados, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e incrementos patrimoniais evidenciados de valor superior a € 100.000,00, legitimadora de tributação por via de avaliação indireta nos termos da alínea d) e f) do n.º 1 do artigo 87º da LGT.
(…)
CAPÍTULO V – CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
(…)
V.1 – Critérios
Tendo em conta o estabelecido na al. a) do n.º 5 do artigo 89º-A da LGT, o rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, é a diferença entre o acréscimo de património ou despesa efetuada, e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação. Assim e, face aos valores declarados, o rendimento líquido declarado em 2012 apura-se no montante de € 23.924,73 como se demonstra:

Os valores líquidos auferidos de rendimentos de trabalho dependente e de capital, descritos no quadro supra, foram já deduzidos nos valores identificados a crédito nas respetivas contas pelo que, o valor dos incrementos patrimoniais evidenciados e não justificados ascende no ano de 2012, segundo fundamentação do capítulo anterior, ao valor de € 351.200,00, como se discrimina:
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V.2 – Apuramento do rendimento Tributável
Por todo o exposto e de acordo com o descrito no capítulo anterior, a correção ao rendimento tributável com recurso a métodos indiretos em 2012 ascende a € 351.200,00, apurado conforme quadro seguinte:
Determinação do Rendimento da Categoria G, Artigo 9º n.º 1, al. d) CIRS

(…).»
P) Em 22/03/2016, o Diretor de Finanças do Porto fixou ao Recorrente, nos termos dos art.s 87º, n.º 1, alínea f) e 89º-A da LGT, com referência aos anos de 2011 e 2012, um rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, no montante de € 161 153,97 e € 351 200,00, fixando um rendimento líquido total de € 163 839,97 e € 353 886,00, respetivamente, tendo por base a fundamentação constante dos relatórios de inspeção mencionados na alínea antecedente – cfr. fls. 245 e 246 do PA 1 e fls. 33 e 34 do PA 2, apensos aos autos.
Q) Em 23/03/2016, foram lavrados dois “Termo de entrega de notificação pessoal”, nos quais o inspetor tributário C… dá conta da recusa do mandatário I... em receber, no seu domicílio profissional, as notificações dos relatórios de inspeção e das notas de fixação do IRS de 2011 e 2012 respeitantes a B..., e de que tais notificações ficaram depositadas na caixa postal daquele – cfr. fls. 247 e 248 do PA 1 e fls. 18 e 19 do PA 2, apensos aos autos.
R) Em 24/03/2016, deu entrada na Direção de Finanças do Porto uma carta com registo postal efetivado em 23/03/2016, enviada pelo advogado I..., com o seguinte teor (cfr. fls. 249 a 251 do PA 1 e fls. 20 a 22 do PA 2, apensos aos autos):
“O signatário vem devolver a V. Exa. 4 envelopes, fechados a fita cola, e por mim não abertos, deixados na minha caixa de correio, destinados a
B...
OS. OI201403015
B...
OS. OI201589302
(…)
Aproveito a oportunidade para informar que por razões pessoais, renunciei hoje ao mandato forense daqueles sujeitos passivos, nos termos da carta que lhes enviei sob registo c/AR, conforme comprovativo que junto.”
S) Por carta datada de 23/03/2016, o advogado I... comunicou a B... o seguinte (cfr. fls. 253 e 254 do PA 1 e fls. 24 e 25 do PA 2, apensos aos autos):
“Venho informar que hoje, cerca das 10h30, compareceu no meu escritório o Sr. Inspetor Tributário C…, que pretendia notificar-me das conclusões do Relatório Inspetivo ordenado ao abrigo das OS supra referidas.
Porque não consegui obter da parte do Sr. Inspetor a sua anuência para só me vir notificar no próximo dia 28.03.2016, por forma a não queimar o prazo de recurso, dado estar ausente neste período pascal e, consequentemente só iria dispor de cinco dias para apresentar o recurso, o que manifestamente seria insuficiente, e, não estando obrigado a assumir tal responsabilidade, agravado pelo facto de V. Exa., não ter providenciado pelo pagamento por mim solicitado para provisão de honorários, renuncio ao mandato.
Dei conhecimento deste mesmo ato à Direção de Finanças, a quem caberá promover a vossa notificação, dado que, como sujeito passivo diretamente visada tem obrigatoriamente de ser notificado.”
T) Por cartas com registo postal datado de 28/03/2016, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto deram conhecimento a Ber..., na qualidade de procurador de B..., de que no dia 23/03/2016 foram notificados ao mandatário I... os relatórios de inspeção respeitantes às ordens de serviço n.ºs OI201502893 e OI201403015 e as notas de fixação de IRS dos anos de 2011 e 2012 – cfr. fls. 259 e 260 do PA 1 e fls. 29 e 30 do PA 2, apensos aos autos.
U) Em 30/03/2016, foram lavrados termos de entrega a Ber..., na qualidade de procurador de B..., de cópia dos relatórios de inspeção elaborados a coberto das ordens de serviço n.ºs OI201502893 e OI201403015, tendo o referido procurador sido advertido de que a mencionada entrega não determinava o início de um novo prazo para interposição de recurso, uma vez que a Autoridade Tributária considerava o sujeito passivo B... validamente notificado dos relatórios na pessoa do seu mandatário I..., advogado com mandato tributário vigente em 23/03/2016 – cfr. fls. 261 do PA 1 e fls. 31 do PA 2, apensos aos autos.
V) O presente recurso foi interposto em 04/04/2016 – cfr. fls. 1 e 2 do processo físico.
W) Dá-se por reproduzido o teor dos documentos de fls. 458 a 461 frente do processo físico.
X) Dá-se por reproduzido o teor de fls. 68 a 83 do PA 2 e de fls. 91 a 114 do PA 1, apensos aos autos, que correspondem aos extratos bancários de 2011 e 2012 das contas do “BANCO...” n.ºs 45835933.10.001 e 34570375.10.001 e do “Banco...” n.º 466668-10-001, tituladas por B... (a segunda em conjunto com O...).
Y) Dá-se por reproduzido o teor de fls. 149 a 167 e 173 a 175 do PA 1 apenso aos autos, que correspondem a documentos de depósito em numerário efetuados, durante o ano de 2012, na conta do “BANCO...” n.º 45835933.10.001, titulada por B....
Mais se provou que,
Z) As transferências efetuadas em 2011 e 2012 por J... para a conta bancária do Recorrente, no montante global de € 195 000,00, correspondem à restituição de uma parte do valor que lhe foi mutuado pelo pai do Recorrente, nos anos de 2009 e 2011, para a realização de negócios – facto dado como provado tendo em conta o teor dos documentos mencionados nas alíneas A) e C) supra (documento de confissão de dívida subscrito pelo devedor J... e cheque emitido por Ber...), conjugados com o depoimento da testemunha J....
2. FACTOS NÃO PROVADOS
Com relevância para a decisão da causa, não se provou que:
1) Os depósitos bancários em numerário realizados durante o ano de 2012, no valor global de €173 500,00, foram viabilizados pela doação em numerário de €230.000,00, efetuada pelo avô do Recorrente em 15/11/2012 (facto alegado nos art.ºs 59º, 62º e 63º da petição inicial).
2) No ano de 2011, os depósitos bancários na conta do “BANCO...” n.º 45835933 totalizam apenas € 8 000,00 e não € 18 000,00, uma vez que o depósito de € 10 000,00, de 01/03/2011, foi de imediato anulado por transferência para a conta de O... (facto alegado nos art.ºs 65º e 66º da petição inicial).
3) O depósito de € 50 000,00 no “Banco...”, em 18/05/2011, foi efetuado para possibilitar aplicação financeira (facto alegado no art.º 67º da petição inicial).
4) Os depósitos em numerário de € 8 000,00, efetuados em 2011, enquadram-se como a concessão do pai ao filho (Recorrente) dos meios suficientes para este suportar as suas despesas pessoais (facto alegado no art.º 67º da petição inicial).
MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal a respeito da factualidade provada e não provada assentou na prova documental e testemunhal produzida nos autos.
A decisão quanto aos factos provados baseou-se na análise dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados, assim como no depoimento da testemunha J... (quanto ao facto mencionado na alínea Z)).
No que concerne aos factos não provados, a prova produzida pelo Recorrente, quer documental, quer testemunhal, não logrou convencer o Tribunal da verificação dos mesmos.
O depoimento da testemunha Jorge..., técnico oficial de contas da sociedade “A..., Lda.” (de que o Recorrente é sócio), na essência revestiu a natureza de um depoimento indireto, já que confessadamente se estribou no que lhe foi dito por terceiros. Com efeito, esta testemunha soube que Ber… Rosalino (pai do Recorrente) emprestou quantias elevadas a J... e que estas já foram devolvidas, por intermédio destas duas pessoas (de quem é amigo), não tendo presenciado tais empréstimos e devoluções e desconhecendo a data em que tiveram lugar. E esta testemunha também soube que o avô do Recorrente o ajudou na aquisição da casa, através da doação de uma quantia elevada, por intermédio do doador e de Ber... (sendo que, nesta parte, entra mesmo em contradição, ao dizer que não fala com o avô do Recorrente há 20 anos, pelo que não podia ter sido aquele a informá-lo dessa alegada doação). Disse, ainda, presumir que os rendimentos auferidos pelo aqui Recorrente provinham da ajuda do seu pai e avô, sem explicar donde extraiu tal presunção, tanto mais que também referiu que o Recorrente auferia um ordenado na sociedade “N…” e havia beneficiado da distribuição de lucros de € 120 000,00 da sociedade “A...”.
Em suma, este depoimento não logrou convencer o Tribunal quanto à origem do acréscimo de património e da despesa efetuada pelo Recorrente.
Foi igualmente inquirido Ber..., pai e procurador do aqui Recorrente, cujo depoimento se mostrou pouco consistente e esclarecedor, na medida em que foi demasiado vago e genérico, não convencendo o Tribunal quanto à fonte do acréscimo de património evidenciado e despesa efetuada pelo seu filho.
Esta testemunha referiu que os depósitos na conta do BANCO... eram efetuados para o filho viver em Londres (onde estudava) e que este era ajudado por si e pelos avós. Contudo, não logrou concretizar em que se traduziu essa ajuda, não tendo quantificado os respetivos montantes, as datas em que ocorreram os depósitos e o porquê de serem, sistematicamente, efetuados em numerário, inviabilizando o conhecimento da sua origem e dos fluxos financeiros que lhe estão associados.
Disse, ainda, que o seu filho não pagou o valor da quota adquirida em 2011 na sociedade “A..., Lda.” (representativa de 90% do capital social).
Relativamente à doação efetuada pelo avô do Recorrente, a testemunha também foi parca em esclarecimentos, referindo apenas que a doação foi de € 230 000,00, em numerário, servindo para a aquisição de uma casa que custou € 650 000,00, não adiantando quaisquer outros pormenores, designadamente a data e a periodicidade da entrega desse numerário.
Também foi inquirida a testemunha José João…, funcionário do “Banco…” e gestor da conta do Recorrente, que, em larga medida, não demonstrou um conhecimento direto dos factos, relatando o que o pai do Recorrente lhe transmitiu quanto à proveniência dos depósitos de € 75 000,00, € 65 000,00 e € 55 000,00, ou seja, que se tratavam de restituições de empréstimos efetuados a um amigo (J...).
Além disso, esta testemunha não demonstrou conhecimento bastante da proveniência do dinheiro que serviu para efetuar o depósito em numerário de €50.000,00.
Desta forma, este depoimento também não logrou demonstrar a origem do acréscimo de património e da despesa efetuada pelo Recorrente e que está na génese da avaliação indireta.
Foi igualmente ouvido J..., que demonstrou conhecimento pessoal e direto dos factos relacionados com as transferências que efetuou em 2011 e 2012 para a conta bancária do Recorrente, depondo, quanto a esta matéria, de forma que o Tribunal julgou convincente, descrevendo pormenores que tornam sustentado o seu depoimento.
Referiu que beneficiou de empréstimos efetuados pelo pai do Recorrente, de quem é amigo há mais de 30 anos, no valor de € 180 000,00 em 2009 (com documento particular de confissão de dívida) e no montante de € 75 000,00 em 2011, sendo que o primeiro empréstimo se destinou a prestar uma garantia junto do “BANCO...” da Suíça, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “betume”, e o segundo empréstimo se destinou à aquisição de capital social de uma empresa situada na Nigéria, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “petróleo” (negócios esses que não se chegaram a concretizar). Afiançou que dos referidos empréstimos restituiu ao pai do aqui Recorrente € 195 000,00 (€ 75 000,00 + € 120 000,00) em finais de 2011, princípios de 2012, através de transferências bancárias efetuadas para a conta do Recorrente, por indicação do seu pai, tendo, posteriormente, restituído mais € 44.000,00 (para o pagamento do IMT devido pela aquisição da casa efetuada pelo Recorrente).
Para além destes factos, em que teve intervenção direta, referiu ainda que “do que sabe” (sem indicar a sua razão de ciência) o avô e o pai do Recorrente suportam as suas despesas em Londres, o avô é uma pessoa com possibilidades e “ouviu falar” (sem indicar de quem) de uma doação do avô ao Recorrente.
Em suma, esta testemunha apenas demonstrou conhecimento pessoal e direto da matéria de facto relacionada com as transferências bancárias de € 195 000,00 para a conta do Recorrente. Quanto ao mais - despesas do Recorrente em Londres suportadas pelo pai e pelo avô e doação efetuada por este último - demonstrou apenas um conhecimento indireto desses factos e não indicou a razão de ciência que suportou esse conhecimento, pelo que não logrou convencer o Tribunal da verificação destes factos.
Finalmente, foi inquirida a testemunha C…, inspetor tributário que elaborou os relatórios de inspeção que estão na génese das decisões de avaliação indireta da matéria coletável, que se limitou, em suma, a reproduzir o que consta dos referidos relatórios, nada mais de relevante tendo acrescentado.
Relativamente à doação mencionada na alínea 1) dos factos não provados, importa ainda salientar que a mera apresentação de um documento particular de doação, sem a demonstração dos fluxos financeiros que lhe estão associados, sem a enunciação das razões que subjazem à doação de um valor elevado (€ 230 000,00) em numerário e sem a existência de prova testemunhal consistente da sua efetiva concretização, designadamente do doador (cuja impossibilidade de depor não foi sequer aventada na petição inicial), obsta a que se dê como provado que a referida doação existiu e constituiu a fonte do acréscimo de património patenteado nos depósitos em numerário efetuados na conta bancária do Recorrente. E ainda que se provasse que a doação existiu de facto, sempre teria também de se provar, o que não sucedeu, que os depósitos em numerário (€ 173 500,00) foram efetuados com os valores doados, afastando, assim, a possibilidade de estarem em causa rendimentos de outra proveniência.”
*
2. O Direito

Nas conclusões – 11.ª e 12.ª – das suas alegações de recurso, o Recorrente B... imputa à sentença recorrida erro de julgamento ao decidir pela improcedência da invocada nulidade da notificação, tendo-se julgado que, nas condições em que a mesma foi efectuada, é eficaz e juridicamente válida.
Alerta o Recorrente que nada na Lei leva a concluir que o mandatário seja obrigado a receber, no seu escritório, um funcionário da Administração Tributária que, à força, lhe imponha uma qualquer notificação. O escritório do mandatário é um local privado, reservado às pessoas que ele pretende e objectivamente quer receber. Não é um local público que possa ser usado, frequentado e muito menos imposto, por pessoas sem o seu consentimento. Daí que o n.º 3 do artigo 40.º refira expressamente que os mandatários serão notificados por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório e, excepcionalmente, pessoalmente quando encontrados no edifício do serviço ou tribunal.
Argumenta o Recorrente que se o legislador pretendesse abranger o âmbito do local em que o funcionário da AT tinha legitimidade para notificar pessoalmente o mandatário, tinha-o feito e não fez. Não é assim uma questão de interpretação da Lei que o legislador deixou pendente para que o julgador pudesse interpretar segundo as regras estabelecidas no artigo 9.º do Código Civil. Na situação sob recurso, a decisão que resulta da sentença recorrida não encontra, na letra do artigo 40.º do CPPT, um mínimo de correspondência verbal, mesmo que imperfeitamente expressa, com a decisão recorrida. Não é assim uma questão de interpretação, mas sim uma questão de legitimidade. O funcionário da AT não tinha legitimidade para proceder à notificação do mandatário, pessoalmente, no seu escritório e, muito menos, forçá-lo a ser notificado. Violando a sua determinação e privacidade. É uma ilegalidade não admitida nem consentida por Lei. Não tendo o funcionário da AT legitimidade para forçar a notificação pessoal do mandatário, no seu escritório, a sentença recorrida não pode decidir como decidiu, julgando eficaz a notificação que se fez com violação dos princípios de reserva e de inviolabilidade de domicílio que estão conferidos ao mandatário, inclusive com tutela constitucional – cfr. artigos 21.º ao 34.º da CRP.
Concluiu, assim, o Recorrente que, ao contrário do que foi decidido na sentença recorrida, a notificação supostamente feita ao mandatário é nula e, como tal, deve ser juridicamente anulada.
De todo o modo, o Recorrente não deixou, por último, de alertar que a notificação nem sequer chegou a ser feita ao mandatário, porque foi recusada; por este ter devolvido os envelopes que, supostamente, continham os actos a notificar, à Direcção de Finanças do Porto.
Vejamos os termos em que decidiu a sentença recorrida: “(…) a) Da nulidade da notificação, na pessoa do mandatário, das decisões recorridas
No entendimento do Recorrente, a notificação das decisões de avaliação indireta da matéria coletável efetuada na pessoa do mandatário é nula, quer porque não foi concretizada por carta registada dirigida ao seu escritório (tal como prevê o art.º 40º, n.º 3, do CPPT), quer porque uma vez confirmada a recusa do mandatário em receber a notificação, a Autoridade Tributária não promoveu a notificação do Recorrente, apesar de ter tomado conhecimento da devolução da notificação.
Vejamos se lhe assiste razão.
De acordo com o disposto no art.º 40º, n.º 1, do CPPT, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas na pessoa deste e no seu escritório. Prevendo o n.º 3 do citado preceito que a notificação será feita por carta ou aviso registado, dirigido para o escritório do notificando, podendo este ser notificado pelo funcionário competente quando encontrado no edifício do serviço ou tribunal.
Com interesse para a decisão desta questão, resultou provado o seguinte:
- o Recorrente constituiu seu mandatário, no âmbito do procedimento inspetivo de que foi alvo, o advogado I...;
- o referido advogado recusou ser pessoalmente notificado, no seu escritório, dos relatórios de inspeção e das notas de fixação emitidas na sequência das inspeções;
- face à recusa em receber as notificações, estas foram depositadas na caixa de correio do advogado, que as devolveu à Direção de Finanças do Porto, dando conta de que renunciava ao mandato forense que lhe havia sido conferido pelo aqui Recorrente;
- os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto deram conhecimento a Ber..., procurador do aqui Recorrente, de que a notificação dos relatórios de inspeção e das notas de fixação de IRS tinha sido efetuada em 23/03/2016, na pessoa do mandatário I...;
- em 30/03/2016 foi entregue a Ber..., na qualidade de procurador do aqui Recorrente, cópia dos relatórios de inspeção;
- o presente recurso foi interposto dentro do prazo de 10 dias contados da notificação das decisões de avaliação indireta da matéria coletável.
Ora, considerando que a recusa de recebimento das notificações pelo advogado I... ocorreu quando este ainda era mandatário do aqui Recorrente, uma vez que a renúncia ao mandato só teve lugar em momento posterior, é de considerar o Recorrente validamente notificado das decisões de avaliação indireta da matéria coletável em 23/03/2016, data em que ocorreu a referida recusa de recebimento e em que as notificações foram depositadas na caixa de correio do escritório do mandatário, que, de seguida, as devolveu à Direção de Finanças do Porto.
Com efeito, o não recebimento das notificações quando ainda era mandatário do Recorrente, apenas ao advogado I... é imputável, pelo que o Recorrente não pode prevalecer-se dessa recusa de recebimento para sustentar a sua falta de notificação.
E mesmo que se entendesse que as notificações teriam de ser efetuadas por carta registada dirigida ao escritório do mandatário, ainda assim sempre se dirá que as formalidades procedimentais previstas na lei podem degradar-se em formalidades não essenciais se, apesar delas, for atingido o fim que a lei visava alcançar com a sua imposição. Ora, no caso vertente, foi atingido o fim pretendido com a notificação, uma vez que o Recorrente tomou conhecimento das decisões de fixação do rendimento tributável e reagiu atempadamente contra elas, pelo que não foi posto em causa o exercício do direito de ação.
Improcede, assim, a invocada nulidade da notificação. (…)”
Embora o n.º 3 do art.º 40.º do CPPT refira que “as notificações serão feitas por carta ou aviso registados, dirigidos para o domicílio ou escritório dos notificandos, podendo estes ser notificados pelo funcionário competente quando encontrados no edifício do serviço ou tribunal”; O facto de o mandatário ter sido pessoalmente notificado no seu escritório não afecta o valor da notificação.
Efectivamente, a existência de uma irregularidade na forma como foi efectuada a notificação (pessoalmente e não por carta registada), não permite extrair quaisquer consequências invalidantes, até porque o meio seguido no caso concreto – a notificação pessoal – assegura as mesmas (ou mais) garantias de recebimento do acto notificando do que a via postal registada preconizada pelo legislador.
“A não observância da forma de notificação exigida constituirá uma irregularidade que não afectará o valor da notificação, desde que se comprove que ela foi efectivamente efectuada, pois as formalidades processuais são meios de garantir objectivos e não finalidades em si mesmas.
Por isso, sempre que seja atingido o objectivo, serão irrelevantes as irregularidades, considerando-se sanada a deficiência. (…)” - cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Código do Processo e Procedimento Tributário, Anotado, volume I, 2011, pp. 375.
Foi neste sentido a decisão recorrida, considerando eficaz a notificação efectuada do acto tributário, nos termos do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT, mesmo não tendo sido dado cumprimento ao n.º 3 do mesmo preceito.
Na sentença recorrida afirma-se, ainda, correctamente, que a recusa de recebimento das notificações ocorreu quando ainda era mandatário do Recorrente. Mesmo que se quisesse ver na recusa de recepção das notificações a própria intenção de renúncia ao mandato, como consta do artigo 47.º, n.º 2 (anterior artigo 39.º) do Código de Processo Civil, a renúncia do mandato judicial apenas produz efeitos com a notificação da renúncia ao mandante, notificação que tem de ser pessoal.
Tal significa que enquanto não for ou não poder ser realizada essa notificação ao mandante, o mandato judicial permanece válido, devendo o mandatário assegurar o mesmo.
Nesta conformidade, como se refere na sentença recorrida, o não recebimento das notificações quando ainda era mandatário do Recorrente, apenas ao advogado I... é imputável, pelo que o Recorrente não pode prevalecer-se dessa recusa de recebimento para sustentar a sua falta de notificação.
Por último, não vislumbramos como possam ter sido violados os artigos 21.º ao 34.º da CRP, com infracção aos princípios de reserva e de inviolabilidade de domicílio que estão conferidos ao mandatário, muito menos que tenha sido forçado a receber a notificação, se o próprio Recorrente reconhece que a notificação pessoal foi recusada pelo mandatário, colocada na caixa de correio deste e pelo advogado devolvida. Simplesmente, como esta recusa lhe foi totalmente imputável, seria equiparável a venire contra factum próprio tentar prevalecer-se de tal facto para concluir pela inexistência da notificação, podendo configurar-se violação do princípio da boa-fé.
Por tudo o exposto, não merece provimento o recurso nesta parte, devendo permanecer na ordem jurídica o decidido a este propósito em primeira instância.

Relativamente à parte da sentença recorrida que lhe foi desfavorável, o Recorrente B... alegou incorrer a mesma em erro de julgamento ao não aceitar a comprovação do Recorrente de que as suas manifestações de fortuna consistem nas doações do pai e do avô. Defendeu não existirem quaisquer motivos para considerar não justificado o valor de € 76.153,90 em 2011 e de € 231.200,00 em 2012 e, em consequência, motivos para recorrer à determinação da matéria tributável por métodos indirectos.
Sustenta o Recorrente ter demonstrado e provado que a fonte geradora das suas manifestações de fortuna têm origem nos fundos próprios do seu pai e avô, consubstanciada na prática familiar de longa data e face aos muitos anos de desenvolvimento de actividade comercial e industrial, e que lhes permitiu acumular largas somas de numerário suficiente para garantir os depósitos em numerário ocorridos nos anos de 2011 e 2012.
Acrescentou não constituir nenhuma ilegalidade o facto do pai e avô do Recorrente terem mantido fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias, valores pecuniários, mesmo que elevados, que lhe permitiu proceder aos depósitos em numerário nos anos de 2011 e 2012.
Concluiu, assim, ter demonstrado que as suas manifestações de fortuna são as doações do seu pai e avô, devendo ficar afastada a necessidade de justificar as fontes, ou meios financeiros, por aqueles utilizados na obtenção dos mesmos.
Em relação ao ano de 2011, decidiu-se no Tribunal recorrido que o montante de €76.153,90, considerado não justificado, tem origem nos seguintes depósitos:
a)- Depósitos em numerário na conta BANCO... n.º 45835933 € 18.000,00
b)- Depósitos em numerário na conta Invest n.º 466668 € 50.000,00
c)- Depósitos de valores na conta BANCO... n.º 45835933 € 672,00
d)- Aquisição de quota na sociedade A... € 7.481,97.
Já em relação ao ano de 2012, entendeu o Tribunal a quo que faltou ao Recorrente justificar qual a fonte de manifestação de fortuna que lhe permitiu evidenciar o acréscimo de património de € 173.500,00 (depósito em numerário e que teria sido utilizado quando se revelou necessário colocar o dinheiro em instituição bancária para concretizar a compra de habitação) e € 57.700,00 (realização de suprimentos à sociedade N..., S.A.), ou seja num total de € 231.200,00. Não aceitou, assim, o Tribunal recorrido que a fonte de manifestação de fortuna teve origem na doação de € 230.000,00 que o seu avô lhe fez em 15.11.2012.
Na verdade, além da prova da fonte do acréscimo patrimonial (sobre que se debruçou essencialmente a sentença recorrida), quando o sujeito passivo se proponha demonstrar que correspondem à realidade os rendimentos declarados, provando que tinha outros meios financeiros para efectuar a aquisição ou realizar a despesa, deve fazê-lo demonstrando também que mobilizou esses proventos para a realização da operação em causa.
É o que decorre do teor literal da última parte do artigo 89.º-A, n.º 3 da LGT: não basta demonstrar que se tem outros meios de realizar a operação, importando também que se demonstre que foram esses meios que constituíram «a fonte» da manifestação concreta de fortuna em causa, do acréscimo patrimonial ou da despesa efectuada.
É o que decorre também da finalidade da norma. Sendo esta instituída como um importante instrumento de combate à fraude e à evasão fiscais, mal se compreenderia que tivessem maiores possibilidades de iludir a sua eficácia quem tivesse mais meios para justificar a operação. No limite, isso implicaria que as pessoas mais abastadas pudessem manter-se a coberto da sua aplicação conservando rendimentos ou outros meios financeiros susceptíveis de justificar aquisições ou despesas e assim omitir os rendimentos que poderiam servir para justificar outras aquisições ou outras despesas em anos vindouros.
Neste sentido se tem, de resto, pronunciado regularmente a jurisprudência, em acórdãos deste tribunal, de 16/12/2012, no âmbito dos processos n.º 00049/11.8BEMDL e n.º 00026/12.1BEMDL e do Supremo Tribunal Administrativo (STA), nos acórdãos de 15/02/2012 (Recurso n.º 50/12), de 12/04/2012 (Recurso n.º 298/12), de 08/05/2013 (Recurso n.º 0567/13), de 29/01/2014 (Recurso n.º 35/14) e de 06/03/2014 (Recurso n.º 0189/14). Na doutrina, cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, 4.ª edição 2012, pág. 783.
O problema é que, ao contrário do sustentado pelo Recorrente, a prova produzida e os elementos juntos aos autos não se mostram, por si só, suficientemente aptos para demonstrar a relação causal prevista no artigo 89.º-A, n.º 3 da LGT, ou seja, o nexo ou ligação entre a fonte e a capacidade aquisitiva demonstrada, no caso, a prova de que os acréscimos patrimoniais e as aquisições/despesas em causa foram realizados com o recurso a rendimentos que não tinham que ser declarados ou do património do próprio contribuinte. Realmente, nenhuma ilegalidade poderá existir no facto do pai e avô do Recorrente terem mantido fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias, valores pecuniários, mesmo que elevados, que lhe permitiu proceder aos depósitos em numerário nos anos de 2011 e 2012. Todavia, o facto de estarem em causa valores em numerário dificulta muitíssimo a prova que se impõe ao Recorrente efectuar.
Além do mais, não basta escolher, de entre as disponibilidades financeiras, uma que se adeqúe à realização de determinada despesa, não sendo esta a prova exigida pela lei. Há que indicar e provar a fonte concreta, o nexo entre a fonte da disponibilidade financeira e a manifestação de fortuna e, ainda, provar que tal disponibilidade financeira, não estava sujeita a tributação.
Ora, como consta da sentença recorrida, nada disso foi provado:
“(…) Com relevância para a decisão da causa, não se provou que:
1) Os depósitos bancários em numerário realizados durante o ano de 2012, no valor global de € 173 500,00, foram viabilizados pela doação em numerário de € 230 000,00, efetuada pelo avô do Recorrente em 15/11/2012 (facto alegado nos art.ºs 59º, 62º e 63º da petição inicial).
2) No ano de 2011, os depósitos bancários na conta do “BANCO...” n.º 45835933 totalizam apenas € 8 000,00 e não € 18 000,00, uma vez que o depósito de € 10 000,00, de 01/03/2011, foi de imediato anulado por transferência para a conta de O... (facto alegado nos art.ºs 65º e 66º da petição inicial).
3) O depósito de € 50 000,00 no “Banco...”, em 18/05/2011, foi efetuado para possibilitar aplicação financeira (facto alegado no art.º 67º da petição inicial).
4) Os depósitos em numerário de € 8 000,00, efetuados em 2011, enquadram-se como a concessão do pai ao filho (Recorrente) dos meios suficientes para este suportar as suas despesas pessoais (facto alegado no art.º 67º da petição inicial). (…)
No que concerne aos factos não provados, a prova produzida pelo Recorrente, quer documental, quer testemunhal, não logrou convencer o Tribunal da verificação dos mesmos.
O depoimento da testemunha Jorge..., técnico oficial de contas da sociedade “A..., Lda.” (de que o Recorrente é sócio), na essência revestiu a natureza de um depoimento indireto, já que confessadamente se estribou no que lhe foi dito por terceiros. Com efeito, esta testemunha soube que Ber... (pai do Recorrente) emprestou quantias elevadas a J... e que estas já foram devolvidas, por intermédio destas duas pessoas (de quem é amigo), não tendo presenciado tais empréstimos e devoluções e desconhecendo a data em que tiveram lugar. E esta testemunha também soube que o avô do Recorrente o ajudou na aquisição da casa, através da doação de uma quantia elevada, por intermédio do doador e de Ber... (sendo que, nesta parte, entra mesmo em contradição, ao dizer que não fala com o avô do Recorrente há 20 anos, pelo que não podia ter sido aquele a informá-lo dessa alegada doação). Disse, ainda, presumir que os rendimentos auferidos pelo aqui Recorrente provinham da ajuda do seu pai e avô, sem explicar donde extraiu tal presunção, tanto mais que também referiu que o Recorrente auferia um ordenado na sociedade “N...” e havia beneficiado da distribuição de lucros de € 120 000,00 da sociedade “A...”.
Em suma, este depoimento não logrou convencer o Tribunal quanto à origem do acréscimo de património e da despesa efetuada pelo Recorrente.
Foi igualmente inquirido Ber..., pai e procurador do aqui Recorrente, cujo depoimento se mostrou pouco consistente e esclarecedor, na medida em que foi demasiado vago e genérico, não convencendo o Tribunal quanto à fonte do acréscimo de património evidenciado e despesa efetuada pelo seu filho.
Esta testemunha referiu que os depósitos na conta do BANCO... eram efetuados para o filho viver em Londres (onde estudava) e que este era ajudado por si e pelos avós. Contudo, não logrou concretizar em que se traduziu essa ajuda, não tendo quantificado os respetivos montantes, as datas em que ocorreram os depósitos e o porquê de serem, sistematicamente, efetuados em numerário, inviabilizando o conhecimento da sua origem e dos fluxos financeiros que lhe estão associados.
Disse, ainda, que o seu filho não pagou o valor da quota adquirida em 2011 na sociedade “A..., Lda.” (representativa de 90% do capital social).
Relativamente à doação efetuada pelo avô do Recorrente, a testemunha também foi parca em esclarecimentos, referindo apenas que a doação foi de € 230 000,00, em numerário, servindo para a aquisição de uma casa que custou € 650 000,00, não adiantando quaisquer outros pormenores, designadamente a data e a periodicidade da entrega desse numerário.
Também foi inquirida a testemunha José João…, funcionário do “Banco…” e gestor da conta do Recorrente, que, em larga medida, não demonstrou um conhecimento direto dos factos, relatando o que o pai do Recorrente lhe transmitiu quanto à proveniência dos depósitos de € 75 000,00, € 65 000,00 e € 55 000,00, ou seja, que se tratavam de restituições de empréstimos efetuados a um amigo (J...).
Além disso, esta testemunha não demonstrou conhecimento bastante da proveniência do dinheiro que serviu para efetuar o depósito em numerário de € 50.000,00.
Desta forma, este depoimento também não logrou demonstrar a origem do acréscimo de património e da despesa efetuada pelo Recorrente e que está na génese da avaliação indireta.
Foi igualmente ouvido J..., (…)
Para além destes factos, em que teve intervenção direta, referiu ainda que “do que sabe” (sem indicar a sua razão de ciência) o avô e o pai do Recorrente suportam as suas despesas em Londres, o avô é uma pessoa com possibilidades e “ouviu falar” (sem indicar de quem) de uma doação do avô ao Recorrente.
Em suma, esta testemunha apenas demonstrou conhecimento pessoal e direto da matéria de facto relacionada com as transferências bancárias de € 195 000,00 para a conta do Recorrente. Quanto ao mais - despesas do Recorrente em Londres suportadas pelo pai e pelo avô e doação efetuada por este último - demonstrou apenas um conhecimento indireto desses factos e não indicou a razão de ciência que suportou esse conhecimento, pelo que não logrou convencer o Tribunal da verificação destes factos.
(…)
Relativamente à doação mencionada na alínea 1) dos factos não provados, importa ainda salientar que a mera apresentação de um documento particular de doação, sem a demonstração dos fluxos financeiros que lhe estão associados, sem a enunciação das razões que subjazem à doação de um valor elevado (€ 230 000,00) em numerário e sem a existência de prova testemunhal consistente da sua efetiva concretização, designadamente do doador (cuja impossibilidade de depor não foi sequer aventada na petição inicial), obsta a que se dê como provado que a referida doação existiu e constituiu a fonte do acréscimo de património patenteado nos depósitos em numerário efetuados na conta bancária do Recorrente. E ainda que se provasse que a doação existiu de facto, sempre teria também de se provar, o que não sucedeu, que os depósitos em numerário (€ 173 500,00) foram efetuados com os valores doados, afastando, assim, a possibilidade de estarem em causa rendimentos de outra proveniência. (…)”
O Recorrente não colocou em causa esta análise crítica que foi efectuada dos meios probatórios, cuja fundamentação se apresenta isenta de qualquer erro grosseiro ou palmar.
Consequentemente, não vislumbramos o erro de julgamento assacado pelo Recorrente, tanto mais que este se limita a afirmar que as suas manifestações de fortuna consistem nas doações do pai e do avô. Impondo-se, por isso, confirmar o julgado nos seguintes termos:
“(…) Em relação ao ano de 2011, dos montantes depositados nas contas bancárias do Recorrente a Autoridade Tributária não considerou justificados, para efeitos de afastamento da avaliação indireta, os depósitos em numerário de € 18 000,00, de € 672,00 e de € 50 000,00, bem como as transferências bancárias de € 10 000,00 e de € 75 000,00. Além disso, também não considerou justificado o montante de € 7 481,97, despendido na aquisição da quota da sociedade “A..., Lda.”.
Ora, no que concerne aos referidos depósitos em numerário, é de concluir que o Recorrente não demonstrou, como lhe competia, a origem dos mesmos, ou seja, a fonte do acréscimo de património.
E também não colhe o alegado pelo impetrante no sentido de que o depósito em numerário na conta do “BANCO...” totalizou apenas € 8 000,00 e não € 18 000,00, por ter sido anulado de imediato e transferido para a conta de O... o depósito de € 10 000,00. É que estes € 10 000,00 deram efetivamente entrada na conta bancária do Recorrente (em 01/03/2011), pelo que este nunca estaria dispensado de demonstrar a proveniência desse depósito em numerário, independentemente de ter ocorrido uma posterior transferência dessa verba para a conta de um terceiro.
Por outro lado, o facto de o depósito em numerário de € 50 000,00 no “Banco...” se destinar a uma aplicação financeira, também não comprova a origem deste acréscimo de património. (…)
Relativamente à aquisição da quota da sociedade “A...”, no valor de € 7 481,97, o Recorrente não logrou demonstrar a origem do rendimento que lhe permitiu a realização dessa despesa, não bastando para provar a ilegitimidade do ato de avaliação indireta dizer que detinha meios financeiros suficientes, cabendo-lhe antes demonstrar os concretos meios financeiros que afetou à realização dessa despesa, o que efetivamente não sucedeu. (…)
No que concerne ao ano de 2012, dos montantes depositados nas contas bancárias do Recorrente a Autoridade Tributária não considerou justificados, para efeitos de afastamento da avaliação indireta, os depósitos em numerário de € 173 500,00 e as transferências bancárias de € 65 000,00 e € 55 000,00. Além disso, também não considerou justificado o montante de € 57 700,00, despendido com a realização de um suprimento na sociedade “N...”.
Ora, em relação aos depósitos em numerário no valor de € 173 500,00, pelas razões expostas na motivação da matéria de facto não provada, que aqui se dão por reproduzidas, não ficou demonstrada a origem deste valor, uma vez que o Recorrente não logrou provar que tais depósitos provinham de uma doação de € 230 000,00 efetuada pelo seu avô. Sendo certo que a referida doação, só por si, não justifica os depósitos, cabendo ao contribuinte demonstrar a sua origem, afastando, assim, a possibilidade de estarem em causa rendimentos de outra proveniência e passíveis de tributação. (…)
Finalmente, em relação ao suprimento no valor de € 57 700,00, o Recorrente não logrou demonstrar, como lhe competia nos termos do disposto no art.º 89º-A, n.º 3, da LGT, os concretos meios financeiros que afetou à realização desta despesa, ou seja, a relação causal de afetação de um determinado rendimento (não sujeito a tributação) a esta manifestação de fortuna. (…)”
Nesta conformidade, é forçoso negar provimento ao recurso interposto pelo Recorrente B....

Vejamos, agora, o recurso interposto pela Fazenda Pública, que assenta somente no alegado erro de valoração da prova produzida.
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Acórdão do T.C.A. Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr. artigo 685.º-B, n.º 1, do Código de Processo Civil, “ex vi” do artigo 281.º, do CPPT; Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181).
Tal ónus rigoroso deve-se considerar mais vincado no actual artigo 640, n.º 1, do Código de Processo Civil, na redacção resultante da Lei n.º 41/2013, de 26/6 (cfr. Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; Acórdão do T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; Acórdão do T.C.A. Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14).
Esta prerrogativa não foi integralmente cumprida pela Fazenda Pública, uma vez que, apesar de ter identificado o ponto de facto que considera incorrectamente julgado [alínea Z) da decisão da matéria de facto: “as transferências efectuadas em 2011 e 2012 por J... para a conta bancária do Recorrente, no montante global de € 195 00,00, correspondem à restituição de uma parte do valor que lhe foi mutuado pelo pai do Recorrente, nos anos de 2009 e 2011, para a realização de negócios”], não especificou os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão, sobre este ponto da matéria de facto impugnado, diversa da adoptada pela decisão recorrida.
Efectivamente, a Fazenda Pública limitou-se a uma impugnação genérica da decisão da matéria de facto, referindo que a conjugação da prova produzida é claramente insuficiente, para se lograr justificar um empréstimo e consequentemente permitir que o ora recorrido justifique determinadas transferências para a sua esfera pessoal. Reporta-se à fragilidade da prova produzida que o tribunal recorrido considerou bastante, sem nunca indicar qualquer meio probatório que pudesse infirmar a convicção formada no Meritíssimo Juiz “a quo”.
Salientamos que o reexame da decisão em matéria de facto em sede de recurso não se confunde com um segundo julgamento, impossível pela inexistência de oralidade e imediação. Corresponde a um remédio jurídico para eventuais erros de procedimento ou de julgamento, mas que passa pela apreciação efectiva de cada uma das questões concretamente colocadas.
Assim, “o princípio da imediação limita a tarefa de reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, que só pode ser modificada se ocorrer erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi anteriormente considerado (…)” - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15/05/2014, proferido no âmbito do processo n.º 07623/14.
O erro de julgamento de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto. Não vislumbramos que tal tenha ocorrido in casu.
Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
O Meritíssimo Juiz a quo exarou a motivação a propósito de cada ponto assente e também quanto à decisão da matéria de facto não provada – cfr. decisão da matéria de facto.
Ora, como o nosso sistema processual consagra o princípio da livre apreciação das provas no artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, tal significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.
Como já referimos, o tribunal recorrido efectuou uma análise crítica da prova, tendo considerado convincente o depoimento prestado pela testemunha J... e fundamentado a factualidade vertida no ponto Z) tendo em conta o teor dos documentos mencionados nas alíneas A) e C) da decisão da matéria de facto (documento de confissão de dívida subscrito pelo devedor J... e cheque emitido por Ber...), conjugados precisamente com o depoimento dessa testemunha J....
Vejamos a motivação da decisão que subjaz a este propósito:
“(…) Foi igualmente ouvido J..., que demonstrou conhecimento pessoal e direto dos factos relacionados com as transferências que efetuou em 2011 e 2012 para a conta bancária do Recorrente, depondo, quanto a esta matéria, de forma que o Tribunal julgou convincente, descrevendo pormenores que tornam sustentado o seu depoimento.
Referiu que beneficiou de empréstimos efetuados pelo pai do Recorrente, de quem é amigo há mais de 30 anos, no valor de € 180 000,00 em 2009 (com documento particular de confissão de dívida) e no montante de € 75 000,00 em 2011, sendo que o primeiro empréstimo se destinou a prestar uma garantia junto do “BANCO...” da Suíça, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “betume”, e o segundo empréstimo se destinou à aquisição de capital social de uma empresa situada na Nigéria, tendo em vista a realização de um negócio ligado ao “petróleo” (negócios esses que não se chegaram a concretizar). Afiançou que dos referidos empréstimos restituiu ao pai do aqui Recorrente € 195 000,00 (€ 75 000,00 + € 120 000,00) em finais de 2011, princípios de 2012, através de transferências bancárias efetuadas para a conta do Recorrente, por indicação do seu pai, tendo, posteriormente, restituído mais € 44.000,00 (para o pagamento do IMT devido pela aquisição da casa efetuada pelo Recorrente). (…)
Em suma, esta testemunha apenas demonstrou conhecimento pessoal e direto da matéria de facto relacionada com as transferências bancárias de € 195 000,00 para a conta do Recorrente. Quanto ao mais - despesas do Recorrente em Londres suportadas pelo pai e pelo avô e doação efetuada por este último - demonstrou apenas um conhecimento indireto desses factos e não indicou a razão de ciência que suportou esse conhecimento, pelo que não logrou convencer o Tribunal da verificação destes factos. (…)”
Em face da convicção formada pelo Meritíssimo Juiz “a quo”, que se apresenta devidamente fundamentada, sendo uma das soluções plausíveis, mostrando-se, igualmente, ter sido proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção, impunha-se que a Fazenda Pública cumprisse o seu ónus, especificando, por exemplo, os meios probatórios de onde poderia decorrer que o pai do ora Recorrido não tinha capacidade financeira compatível com a realização destes empréstimos. Na verdade, logrando-se provar tal facto, dificilmente seria credível que tivesse, efectivamente, efectuado tais mútuos.
Reiteramos que a fundamentação da decisão da matéria de facto se apresenta isenta de qualquer erro grosseiro ou palmar. Pelo que, tendo a Recorrente Fazenda Pública incumprido o ónus rigoroso que sobre si recaía, tal implica a imediata rejeição do seu recurso, dado que o seu único fundamento era precisamente o erro de julgamento da decisão da matéria de facto.
Estabilizada a factualidade assente, impõe-se, mais uma vez, confirmar o julgamento efectuado nos seguintes termos:
“(…) Em relação ao ano de 2011 (…)
Atentemos, agora, nas transferências bancárias. A transferência de € 10 000,00 foi efetuada em 10/02/2011 da conta do “BANCO...” n.º 45835933 para a conta do “Banco...” n.º 466668, ambas pertencentes ao aqui Recorrente, pelo que, como este bem refere, tal transferência não consubstancia um acréscimo patrimonial, porquanto está em causa uma mera deslocação de fundos de uma conta bancária para outra.
Já em relação à transferência bancária de € 75 000,00 para a conta do “Banco...” n.º 466668, ficou provado que foi efetuada por J... com a finalidade de restituir um valor que lhe havia sido mutuado pelo pai do aqui Recorrente, pelo que terá de se considerar demonstrada a fonte deste acréscimo de património. (…)
Aqui chegados, podemos então concluir que do acréscimo de património e despesa que a Autoridade Tributária não considerou justificado, no valor de € 161 153,97, face à prova produzida, apenas fica por justificar a origem do montante de € 76 153,97 (€ 161 153,97 - [€ 10 000 + € 75 000]).
No que concerne ao ano de 2012 (…)
No que tange às transferências bancárias de € 65 000,00 e € 55 000,00 para a conta do “Banco...” n.º 466668, ficou provado que estas foram efetuadas por J... com o objetivo de restituir um valor que lhe havia sido mutuado pelo pai do Recorrente, pelo que terá de se considerar demonstrada a fonte destes acréscimos de património. (…)
Dito isto, podemos concluir que do acréscimo de património e despesa que a Autoridade Tributária não considerou justificado, no valor de € 351 200,00, face à prova produzida, apenas fica por justificar a origem do montante de € 231 200,00 (€ 351 200,00 - [€ 65 000 + € 55 000]). (…)”
Nesta conformidade, é forçoso também negar provimento ao recurso interposto pela Recorrente Fazenda Pública.

Conclusões/Sumário

I - Deve considerar-se eficaz a notificação efectuada de acto tributário, nos termos do n.º 1 do art.º 40.º do CPPT, mesmo não tendo sido dado cumprimento ao n.º 3 do mesmo preceito, quando é feita na pessoa de mandatário constituído, no seu escritório, recusando este a sua recepção (contribui, ainda, para tal conclusão o interessado ter tomado conhecimento das decisões de fixação do rendimento tributável e ter reagido atempadamente contra elas).
II - A renúncia do mandato judicial apenas produz efeitos com a notificação da renúncia ao mandante, notificação que tem de ser pessoal – cfr. artigo 47.º, n.º 2 (anterior artigo 39.º) do Código de Processo Civil.
III - A prova produzida e os elementos juntos aos autos não se mostram, por si só, suficientemente aptos para demonstrar a relação causal prevista no artigo 89.º-A, n.º 3 da LGT, ou seja, o nexo ou ligação entre a fonte e a capacidade aquisitiva demonstrada, no caso, a prova de que os acréscimos patrimoniais e as aquisições/despesas em causa foram realizados com o recurso a rendimentos que não tinham que ser declarados ou do património do próprio contribuinte.
IV - A falta de especificação, pela Recorrente, dos concretos pontos de facto que na sentença foram dados como provados ou não provados e que considera incorrectamente julgados, bem como dos concretos meios probatórios, constantes de registo fonográfico, que impunham decisão sobre pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, impede o Tribunal “ad quem” de reapreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto. Pretendendo a Recorrente impugnar o julgamento sobre a matéria de facto efectuado pelo tribunal de 1ª instância, tem de cumprir esse ónus decorrente do disposto no artigo 640.º do CPC ex vi artigo 281.º do CPPT.

IV. Decisão
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento a ambos os recursos.
Custas a cargo de ambos os Recorrentes, B... e Fazenda Pública, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 29 de Junho de 2017
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Mário Rebelo