Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03015/15.0BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR; PERICULUM IN MORA
Sumário:I-No presente recurso, tal como sucedeu anteriormente no requerimento inicial, os Recorrentes não invocam factos concretos que demonstrem os danos e privações que concretamente afectarão gravemente o direito à saúde dos utentes;

I.1-antes se limitam a renovar, por outras palavras, as considerações e observações vagas e genéricas anteriormente expressas, sem especificadamente concretizarem os prejuízos que decorrem para os Recorrentes, utentes e trabalhadores com o fecho da Unidade de Saúde de Seguros, quando aqueles continuarão a ter acesso a cuidados de saúde noutras unidades de saúde e os trabalhadores serão reafectados a outras unidades de saúde;

I.2-tal equivale a dizer que o senhor Juiz fundamentou, de forma clara e suficiente, o seu entendimento jurídico, de modo a concluir pela não verificação do requisito do periculum in mora, o que implica a não adopção das medidas cautelares peticionadas, porquanto os requisitos para o seu decretamento são de verificação cumulativa.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:MJSR, ASS, AAFS, ECT, FMST, HMPM, JASL e Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros
Recorrido 1:Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. e Ministério da Saúde
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar para Adopção duma Conduta (CPTA) - Rec. Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
MJSR, ASS, AAFS, ECT, FMST, HMPM, JASL e Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins, todos melhor identificados nos autos, vieram intentar processo cautelar contra a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. e Ministério da Saúde, pedindo a intimação destes à abstenção da prática de quaisquer actos materiais ou jurídicos com vista ao encerramento da Unidade de Saúde de Seguros, sita na Rua …, se necessário com a imposição de sanção pecuniária compulsória.
Por sentença proferida em 08/04/2016 o TAF do Porto indeferiu o processo cautelar, não adoptou as providências requeridas e absolveu dos pedidos os Requeridos.
Desta decisão vem interposto recurso.
Alegando, os Requerentes concluíram o seguinte:
1. O fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado – o encerramento da Unidade de Saúde dos Seguros - encontra-se verificado.
2. Que desse encerramento de Unidade de prestação de serviços de Saúde, ainda que temporário, e por pouco tempo que seja – resulta a produção de prejuízos que podem ser irreparáveis ou mesmo irremediáveis, resulta da própria natureza dos problemas em questão, os da Saúde!
3. Os danos causados à saúde no corpo dos cidadãos, colocam-se acima dos danos causados pela violação do direito a uma adequada Justiça para um Povo!
4. Enunciar prejuízos ou danos concretos no que à Saúde diz respeito, é sempre redutor.
5. As consequências da falta de cuidados imediatos e adequados de saúde podem resultar em danos irreparáveis para a Vida, de consequências evidentemente desastrosas e sem preço.
6. Não está ainda estudada de forma estruturada e organizada a Rede de serviços de saúde, no Norte.
7. Nem se sabe qual o papel da Unidade de Saúde dos Seguros dentro dessa Rede,
8. Nunca foram ouvidos a dar o seu contributo quer os profissionais de saúde, médicos e enfermeiros, utentes ou especialistas em matéria de saúde,
9. Colocados que estão acima dos interesses áridos da administração.
10. Os interesses individuais no que à saúde dos cidadãos diz respeito, constrangidos que sejam, são adequados a causar dano bem superior ao que pode resultar, se é que resulta, do deferimento da pedida providência.
11. Ainda que a solução final pudesse vir a ser a do encerramento – no que não se concede - desta unidade de seguros, nunca a comunidade de utentes e de profissionais poderia ficar afastada e desintegrada da procura e encontro da solução mais adequada aos interesses humanos e sociais em presença.
12. E é sobretudo disto que se trata.
13. Em última análise, deve ser deferida a providência sob condição de até à decisão a tomar pelos serviços de administração de Saúde do Norte ser elaborado e publicitado o cardápio de medidas definidoras do iter da solução, cardápio esse a ser elaborado e definido com a participação dos profissionais de saúde e utentes a quem os serviços se destinam, em conjugação de esforços, solução essa harmoniosa com os princípios e disposições legais e constitucionais enunciadas sob os artigos 56 a final da petição inicial, em que os utentes se REVEJAM.

Termos em que deve a decisão proferida que indeferiu a Providência Cautelar requerida ser revogada e substituída por outra que, no cumprimento estrito das normas ínsitas nos números 1 e 2 do artigo 120 do CPTA, defira a providência pedida por verificação simultânea dos seus pressupostos, a saber:
Fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado pelo encerramento esperado da Unidade de saúde de seguros
Produção inevitável de prejuízos qualificados decorrentes do encerramento da unidade de prestação e serviços médicos de saúde naquela Unidade por danos causados à saúde dos utentes, que, por natureza, podem ser irreparáveis ou irremediáveis;
Do deferimento da providência não decorrem quaisquer prejuízos para os Requeridos e sempre os prejuízos decorrentes do falado encerramento serão insuportáveis para os utentes daquela Unidade de serviços médicos.
Subsidiariamente e se de outra forma for entendido, que seja a decisão eventualmente a proferir sujeita à condição prévia da elaboração de um cardápio, a elaborar com a participação dos profissionais de saúde, médicos, enfermeiros e utentes dos cuidados médicos a prestar, que indique aos utentes de uma forma clara quais as alterações que vão ser introduzidas no modo de prestação dos serviços médicos, de forma a ter em conta a idade do utente, a sua ligação aos profissionais dos serviços, com tempo e atenção, criando relações de proximidade, por forma a eliminar tanto quanto possível as consequências danosas de qualquer quebra de continuidade no fornecimento dos serviços que leve os utentes a aceitar a solução encontrada como boa para todos, também na sua execução, porque mais humana e socialmente aceite, assim se cumprindo os princípios norteadores da boa administração invocados na petição inicial, como corolários dos princípios constitucionais invocados,
E TUDO ISTO COMO
ÚNICA FORMA DE FAZER JUSTIÇA,
Que para o ser haverá de mostrar-se Humana e Socialmente atenta.

O Ministério da Saúde juntou contra-alegações, concluindo nestes termos:
a) A Sentença recorrida não merece qualquer reparo ou censura;
b) Com efeito, ao contrário do que alegam os Recorrentes, a Sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação da lei aos factos e não padece de qualquer vício ou ilegalidade;
c) A Sentença recorrida decidiu corretamente que não se mostra preenchido o requisito do periculum in mora;
d) Porquanto, os Requerentes ora Recorrentes não invocaram factos concretos que demonstrassem os danos e privações que concretamente afetarão gravemente o direito à saúde dos utentes;
e) Por isso, o Aresto julgou corretamente que no caso em apreço não se verificava o requisito ou critério do periculum in mora previsto no nº 1 do art.º 120º do CPTA.
Nestes termos e nos mais de Direito, deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se, em consequência, a Sentença recorrida.

O MP, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º/1 do CPTA, não emitiu qualquer parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1. Em 15.01.2014, foi assinado um protocolo entre a Câmara Municipal do Porto e a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P., no sentido de estabelecerem uma pareceria com vista à elaboração da Carta de Equipamentos de Cuidados de Saúde Primários da Cidade do Porto (cfr. carta de equipamentos a fls. 28 e ss. dos presentes autos físicos);
2. Da Carta de Equipamentos de Cuidados de Saúde Primários da Cidade do Porto, elaborada no âmbito do referido em 1.º supra, consta, entre outros, o seguinte:
“(…)
No ACeS Porto Ocidental existem ainda 2 estruturas de prestação de cuidados (Seguros e EDP) que não correspondem à organização das unidades consagradas na legislação portuguesa e encontram-se estruturadas de uma forma que não possibilitam as melhores práticas em medicina geral e familiar. Estas unidades, criadas no passado em diferentes contextos históricos cobrem uma população reduzida e com um quadro de recursos humanos limitado, não possuindo as condições adequadas para uma evolução favorável em termos de cuidados primários de saúde, sugerindo-se desta forma uma avaliação sobre a sua eventual descontinuidade, desde que se assegure uma efectiva cobertura dos utentes pelas unidades de saúde mais próximas de preferência em contexto de USF.
(…)
CENTRO DE SAÚDE DA CARVALHOSA UNIDADE SEGUROS
a) Avaliação: unidade arrendada, com mais de 35 anos, fracção de um edifício sem layout, organização ou dimensões adequadas aos utentes que serve e não adaptada de forma correcta à prestação de cuidados de saúde
b) Recomendações:
- necessidade de substituição.
- Sugestões:
1 Em função do tipo de edifício em causa, seriam necessárias obras profundas para o adaptar adequadamente à prestação de cuidados de saúde. No entanto, em função do número de utentes que serve, e do número de profissionais em causa, seria um investimento sem o devido retorno em termos de custo-benefício clínico-económico, sugerindo-se a sua eventual descontinuidade, assegurando-se uma efectiva cobertura dos utentes pelas unidades de saúde mais próximas, em contexto de USF.” (cfr. carta de equipamentos, fls. 57, verso, e 120, verso, dos presentes autos físicos).
DE DIREITO
É objecto de recurso a sentença proferida pelo TAF do Porto que indeferiu a providência cautelar.
Na óptica dos Recorrentes a decisão deve ser revogada e substituída por outra que, no cumprimento estrito das normas ínsitas nos nºs 1 e 2 do artigo 120º do CPTA, defira a providência pedida por verificação simultânea dos seus pressupostos, a saber:
-fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado pelo encerramento esperado da Unidade de saúde de seguros;
-produção inevitável de prejuízos qualificados decorrentes do encerramento da unidade de prestação e serviços médicos de saúde naquela Unidade por danos causados à saúde dos utentes, que, por natureza, podem ser irreparáveis ou irremediáveis.
Cremos que não lhes assiste razão.
Antes, porém, deixa-se aqui parcialmente transcrito o discurso jurídico fundamentador da decisão em crise:
“(…..)
A este respeito, sustentam os Requerentes que a Unidade de Saúde em causa nestes autos tem 2.609 utentes e que, na Unidade da Carvalhosa, que é onde está englobada a Unidade de Seguros, existem 1.699 utentes sem médico de família.
Alegam ainda o fundado receio de que o encerramento daquela Unidade prive os profissionais de seguros de equipamentos que lhes garantam a continuidade dos serviços de saúde, sem que haja um plano que lhes dê a conhecer as condições de integração imediata noutro quadro de prestação de cuidados de saúde.
Das alegações das Requerentes retira-se que o perigo que vem invocado para efeitos de tutela cautelar é, sobretudo, o receio dos utentes da Unidade de Seguros poderem ficar sem médico de família.
Sucede, porém, que estas preocupações, ainda que legítimas, apresentam-se alegadas de uma forma genérica e conclusiva, sem que se perceba, no concreto e no campo material da realidade, que factos precisos ocorrerão ou que prejuízos se podem verificar, de tal forma grave, que a tutela do seu direito à saúde, se estiver em crise, não possa aguardar pela decisão final a tomar no processo principal. Isto é, não transparece do requerimento inicial o que se perderá ou o que ficará irremediavelmente consumado de forma negativa, que a procedência da acção principal não possa, ulterior e utilitariamente, garantir.
É que os Requerentes e os associados do Sindicato Impetrante, enquanto cidadãos residentes em território nacional, não perderão o acesso generalizado aos cuidados de saúde que são prestados no âmbito do SNS, atribuídos em condições de igualdade com os demais cidadãos abrangidos pelos Centros de Saúde do ACES local, nem deixarão de poder recorrer aos serviços hospitalares do mesmo SNS, incluindo aos serviços de urgência.
Para que este Tribunal pudesse concluir pela existência de um complexo de danos assim tão gravosos, seria necessário que tivessem sido invocados e devidamente concretizados pelos Requerentes factos concretos que demonstrassem uma iminente privação de cuidados de saúde, de tal forma que a única unidade capaz de territorialmente as prestar fosse aquela que os Requeridos pretendem encerrar. Mas não é nada disso que se passa. Uma vez encerrada a unidade em causa, os Requerentes e associados do Sindicato Requerente continuarão a ter acesso aos cuidados de saúde primários, prestados, todavia, noutras unidades de saúde do concelho do Porto, incluindo os de natureza hospitalar.
Aliás, veja-se que a Carta dos Equipamentos de Cuidados de Saúde Primários da Cidade do Porto, junta aos autos pelos próprios Requerentes, diz que a proposta de encerramento da Unidade de Saúde em causa resulta da falta de condições da mesma, e pressupõe “que se assegure uma efectiva cobertura dos utentes pelas unidades de saúde mais próximas de preferência em contexto de USF” (cfr. pontos 1.º e 2.º do probatório).
Como se vê, tal documento não desprotege os Requerentes, visto que, pretende assegurar-lhes a cobertura de cuidados de saúde “pelas unidades de saúde mais próximas”, sendo certo, também, que o encerramento da Unidade de Saúde em causa nestes autos levará à reafectação do pessoal ali existente para outras unidade de saúde próximas, com a inerente melhoria nos rácios actuais de utente/médico de família.
Ademais, a tutela cautelar não serve para os particulares obterem, através dos Tribunais, a tutela normal dos seus direitos, porquanto, para tal desiderato, dispõem da acção administrativa principal. Trata-se antes de uma tutela excepcional, que envolve menos garantias processuais para as partes e um esforço acrescido de celeridade para o Tribunal, importando apenas impedir a verificação de prejuízos qualificados, como decorre do art.º 120.º do CPTA.
Em conclusão, não se mostra preenchido o requisito do “periculum in mora, o que implica a não adopção das medidas cautelares pedidas, porquanto, como vimos, os requisitos para o seu decretamento são de verificação cumulativa.”
Vejamos:
X
Dispõe o artigo 112º/1 do CPTA, que “Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.
A redacção deste artigo, na sua parte final, expressa o propósito essencial da tutela cautelar, que se reconduz a assegurar a utilidade da lide principal, ou seja, salvaguardar o efeito útil de uma sentença a proferir em sede de acção principal, que pela sua cognição plena poderá comportar um período mais longo até ser definitivamente decidida.
Tal equivale a dizer que a providência cautelar está intimamente ligada aos autos principais, sendo nestes que a pretensão dos Requerentes irá ser analisada e decidida com a profundidade necessária, tratando-se, em sede cautelar, apenas de assegurar a utilidade da sentença que aí venha a ser proferida mediante a adopção de medidas urgentes baseadas necessariamente numa apreciação sumária e perfunctória do caso.
Daí que ao julgador de um processo cautelar em que é solicitada uma providência cautelar se imponha que proceda a uma apreciação sucinta e sumária das ilegalidades apontadas pelo requerente ao acto impugnado ou a impugnar com o objectivo de constatar se ocorre a sua manifesta ilegalidade, não lhe competindo analisar e apurar com exaustão se as ilegalidades imputadas ao acto impugnado ocorrem ou não.

Deste modo, o julgador, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de procedência da acção principal, terá de indagar e ajuizar se existem ou não razões para temer que tal decisão venha a tornar-se inútil, sem qualquer alcance prático, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos dificilmente reparáveis para quem dela pretende beneficiar, que obstem à reconstituição natural ou à reintegração da esfera jurídica do beneficiado com a sentença.
Voltando ao caso em concreto temos que a sentença recorrida decidiu, a final, que:
Ante o exposto por não provado indefiro o presente processo cautelar não adoptando as providências cautelares requeridas, mais absolvendo os Requeridos dos pedidos.
Para tal considerou “Em conclusão não se mostra preenchido o requisito do periculum in mora o que implica a não adopção das medidas cautelares pedidas porquanto como vimos os requisitos para o seu decretamento são de verificação cumulativa.”
Os Requerentes, ora Recorrentes não se conformam com o decidido no aresto, acima parcialmente transcrito.
Porém, não têm razão, porquanto, a sentença, ao contrário do que alegam, fez correcta interpretação e aplicação do direito aos factos e por isso não enferma de qualquer vício ou ilegalidade.
Aliás, os Recorrentes não imputam expressa, concreta e especificadamente, qualquer vício ou ilegalidade à sentença, limitando-se, mais uma vez, nas alegações do recurso em apreço, a tecer uma série de considerações e observações vagas e genéricas que não põem em causa os fundamentos da sentença e o seu segmento decisório.
Repete-se que o Tribunal a quo indeferiu a providência cautelar porque não se mostrava preenchido o requisito do periculum in mora.
Com efeito, a sentença recorrida, a propósito deste pressuposto, refere o seguinte:
“Sucede porém que estas preocupações ainda que legítimas apresentam-se alegadas de uma forma genérica e conclusiva sem que se perceba no concreto e no campo material da realidade que factos precisos ocorrerão ou que prejuízos se podem verificar de tal forma grave que a tutela do seu direito à saúde se estiver em crise não possa aguardar pela decisão final a tomar no processo principal. Isto é, não transparece do requerimento inicial o que se perdera ou o que ficara irremediavelmente consumado de forma negativa que a procedência da acção principal não possa, ulterior e utilitariamente, garantir.” E continua:
“Para que este Tribunal pudesse concluir pela existência de um complexo de danos assim tão gravosos seria necessário que tivessem sido invocados e devidamente concretizados pelos Requerentes factos concretos que demonstrassem uma iminente privação de cuidados de saúde de tal forma que a única unidade capaz de territorialmente os prestar fosse aquela que os Requeridos pretendem encerrar. Mas não é nada disso que se passa. Uma vez encerrada a unidade em causa os Requerentes e associados do Sindicato Requerente continuarão a ter acesso aos cuidados de saúde primários prestados todavia noutras unidades de saúde do concelho do Porto incluindo os de natureza hospitalar.”
Ora, do acima exposto e transcrito resulta à saciedade que a decisão recorrida não merece censura, pois correctamente concluiu que os Requerentes/Recorrentes, não lograram demonstrar a verificação do requisito periculum in mora.
Por outro lado, como bem observa o Recorrido, nesta sede, não imputam qualquer vício ou ilegalidade concretos e nominados que justifiquem ou sejam a razão de ser do presente recurso. Dito de outro modo, agora, no presente recurso, tal como sucedeu anteriormente no requerimento inicial, os Recorrentes não invocam factos concretos que demonstrem os danos e privações que concretamente afectarão gravemente o direito à saúde dos utentes. Antes se limitam a renovar, por outras palavras, as considerações e observações vagas e genéricas anteriormente expressas, sem especificadamente concretizarem os prejuízos que decorrem para os Recorrentes, utentes e trabalhadores com o fecho da Unidade de Saúde de Seguros, quando aqueles continuarão a ter acesso a cuidados de saúde noutras unidades de saúde e os trabalhadores serão reafectados a outras unidades de saúde.
Tal equivale a dizer que o senhor Juiz fundamentou, de forma clara e suficiente, o seu entendimento jurídico, de modo a concluir pela não verificação do requisito do periculum in mora, o que implica a não adopção das medidas cautelares peticionadas, porquanto os requisitos para o seu decretamento são de verificação cumulativa.
Em suma:
-os requisitos para o decretamento de uma providência cautelar são, em termos muito simplistas, os seguintes: que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); que não seja manifesta a falta de fundamentação da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito (fumus boni juris); que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença decorra que os danos resultantes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência);
-a verificação destes requisitos tem que ser cumulativa;
-na redacção actual, introduzida pelo DL214-G/2015, de 2/10, o fumus boni iuris apresenta-se sempre sob a formulação positiva (condizente com a formulação que na redacção anterior se encontrava plasmada na al. c) do n° 1 do artº 120° do CPTA);
-ponderada a tutela cautelar em função dos critérios agora estatuídos no artº 120°/1, a análise da verificação da aparência do bom direito assume particular relevância nos presentes autos, na medida em que é necessário que se verifique uma forte probabilidade de procedência da pretensão principal;
-a “formulação positiva do fumus boni iuris é-nos dada pela introdução na redacção do n ° 1 do artigo 120 ° do CPTA do substantivo "provável", que imprime uma maior rigidez ao conceito;
-assim, do direito convocável para subsumir os factos descritos, tem de ser possível chegar-se à probabilidade do êxito da acção; tem de se verificar uma aparência de que o requerente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela actuação administrativa;
-a apreciação judicial sobre a probabilidade da procedência da pretensão formulada no processo principal deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, que permita ao Tribunal acreditar na probabilidade do êxito da pretensão principal;
-designadamente, verificar-se-á o critério referenciado quando a ilegalidade do acto a suspender resulte de forma clara dos autos, sem necessidade de mais provas, ou, por outras palavras, quando se esteja perante uma ilegalidade evidente;
-o tribunal a quo analisou os requisitos da figura jurídica pretendida pelos aqui Recorrentes, tendo concluído, fundada e acertadamente, pela não verificação do periculum in mora;
-conforme bem assinalou, a tutela cautelar não serve para os particulares obterem, através dos Tribunais, a tutela normal dos seus direitos, porquanto, para tal desiderato, dispõem da acção administrativa principal; trata-se antes de uma tutela excepcional, que envolve menos garantias processuais para as partes e um esforço acrescido de celeridade para o Tribunal, importando apenas impedir a verificação de prejuízos qualificados, como decorre do artº 120º do CPTA;
-deste modo, a sentença recorrida decidiu pelo indeferimento do pedido cautelar deduzido;
-e, face ao juízo a adoptar nesta sede (cautelar), que terá sempre de ser um juízo indiciário, de verosimilhança e de probabilidade, sob pena de se estar a entrar no domínio da apreciação de mérito, ele mostra-se assertivo, face aos elementos insertos nos autos.
Improcedem, assim, as conclusões dos Recorrentes.
DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Sem custas, atenta a isenção contida no artº 4º/1/b) do RCP.
Notifique e D.N.
Porto, 15/07/2016
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro