Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00933/14.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/30/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina da Nova
Descritores:DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA
AUDIÇÃO PRÉVIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
PRESSUPOSTOS PARA A DISPENSA E ÓNUS DA PROVA
Sumário:1.A decisão sobre o pedido de dispensa de prestação garantia não está sujeito a audição prévia;
2.Não está fundamentado o ato de indeferimento do pedido de isenção da garantia que não externa a analise critica dos documentos apresentados pela executada de forma a compreender-se o que neles não relevou e/ou em que medida se mostraram insuficientes para aquele desiderato;*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:L..., Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Maioria
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
L...- Gestão de Projetos, Lda., recorre da sentença proferida pelo TAF do Porto que julgou improcedente a reclamação interposta nos termos do art. 276º do CPPT, do ato do órgão de execução fiscal, no p.e.f. 3190 2014 01028375,que lhe indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia.
Formula nas respetivas alegações (cfr. fls. 155-189), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(...)
1ª A decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, porquanto, ao decidir como decidiu o Tribunal a quo desconsiderou a prova efetuada pela recorrente e entra em contradição com a matéria de facto constante e da base probatória dada assente;
2ª A recorrente não pode aceitar como correta a fundamentação da decisão de direito, com a qual não pode concordar por entender que promovem incorreta aplicação do direito quanto à apreciação dos vícios alegados e, ainda, porque a mesma entra em contradição com a matéria de facto dada como assente nos autos, quando ao apreciar a verificação dos pressupostos da dispensa de prestação de garantia considera, sem mais e em clara contradição com a matéria de facto dada como assente, que a reclamante não demonstrou a impossibilidade de prestação de garantia nem as razões da inexistência de bens suficientes para a prestação;
3ª Tal conclusão afigura-se inaceitável, tanto mais que esta matéria, por se tratar de factos negativos cuja prova é manifestamente difícil senão mesmo impossível, deve ser facilitada por qualquer meio à parte que está obrigada a fazer a prova desses factos de acordo com a máxima “iisquaedifficiliorissuntprobationislevioresprobationesadmittuntur”. Assim, se o Tribunal a quo considerou desnecessária a produção de prova testemunhal indicada pela reclamante para reforço da prova documental apresentada e se bastou com a prova documental junta aos autos não pode posteriormente vir considerar que esta não fez prova cabal do que lhe cabia, quando a impediu de promover por todos os meios de prova ao seu alcance para o fazer;
4ª A recorrente não pode aceitar como correta a fundamentação da decisão de direito, com a qual não pode concordar, por entender que promove uma incorreta aplicação do direito quanto à apreciação dos vícios alegados, o que traduz erro de julgamento;
5ª A decisão recorrida não decidiu bem ao conhecer do vício de forma por violação do dever de participação, por violação do direito de audição do sujeito passivo, no âmbito do procedimento de prestação de garantia ou pedido de dispensa, porquanto, mesmo que se entenda estarmos no âmbito de um ato administrativo praticado no âmbito do processo de execução fiscal, sempre teria de se notificar o sujeito passivo para completar o processo com os elementos de prova em falta. Quer se entenda como imposição do direito de participação ou por imposição dos princípios do inquisitório e da verdade material, certo é que, não pode um procedimento desta natureza concluir-se com fundamento num ofício Circulado sem dar o prévio conhecimento ao interessado das exigências nele contidas e dos documentos de prova eventualmente em falta. Pelo que, andou mal a sentença recorrida ao sufragar o despacho reclamado e a conduta do Serviço de Finanças, pois mesmo admitindo que esta entidade tem competências próprias, como refere o Tribunal a quo, para decidir o pedido de dispensa não pode eximir-se à obrigação de solicitar ao contribuinte todos os documentos que considere estar em falta, à luz das exigências contidas no dito Ofício Circulado, e fixar prazo para os apresentar para a demonstração dos pressupostos da dispensa, se for caso disso;
6ª Outro entendimento, como pretende o Tribunal a quo, consiste em conferir ao ente administrativo um poder discricionário em matéria de garantias fundamentais dos contribuintes que se afigura inconstitucional, por violação do princípio contido no art. 103º, n.º 2, da CRP, bem assim como do princípio do acesso ao direito contido no artigo 20º da CRP;
7ª A decisão recorrida afigura-se, igualmente, incorreta ao considerar improcedente o vício de falta de fundamentação, porquanto é evidente que o despacho reclamado não contém os fundamentos concretos, nem de facto nem de direito dos quais se extraia a decisão de indeferimento, em clara violação do disposto no artigo 77º da LGT; a decisão de indeferimento apenas se sustenta em conclusões extraídas da citação direta do teor do ofício Circulado transcrito integralmente como fundamentação da decisão de indeferimento, sem concretização das razões que aplicadas ao caso concreto justificaram o indeferimento;
8ª Não se aceita que possa servir de fundamento ao ato de indeferimento um Ofício Circulado, exposto em matriz, sem qualquer imputação concreta ao caso do sujeito passivo, por via da qual se percebam as razões concretas do indeferimento. Pela mesma ordem de razões, não se aceita que o Tribunal considere o ato como fundamentado porque é “bem de ver que a sua fundamentação está contida no ponto E do despacho”. Porquê no ponto E e porque não em todos os outros pontos da matriz correspondente ao dito Ofício Circulado do qual o despacho de indeferimento é mero e simples decalque?
9ª É inaceitável à luz dos princípios jurídicos constitucionalmente consagrados que um ato administrativo ou tributário, com caráter tão lesivo quanto o proferido nos autos, possa considerar-se devidamente fundamentado por apresentação de mera cópia integral do Ofício Circulado invocado. Um ato de indeferimento qualquer que seja a sua natureza, administrativa ou tributária, não pode considerar-se como devidamente fundamentado se dele não constar a concretização das razões de facto e de direito que no caso se verificam e que justificam o indeferimento. Tais exigências de fundamentação decorrem da obrigação legal de fundamentação contida no artigo 77º da LGT r constitui um pressuposto fundamental para o direito de defesa do destinatário da decisão;
10ª Acresce, assim, a violação dos princípios consagrados nos preceitos Constitucionais contidos nos artigos 20º, 103º, n.º2, e 268º, n.º3 e 4 da CRP;
11ª Como se pode verificar pela análise dos documentos anexos à presente reclamação, com o requerimento de dispensa de prestação de garantia apresentado pela reclamante, foram juntos documentos de prova suficientes para a demonstração da impossibilidade de demonstração da impossibilidade da prestação de garantia bancária ou de outra natureza, em valor suficiente para obter o efeito legalmente previsto para a suspensão do processo. Isso mesmo foi reconhecido na base factual dada como assente pelo Tribunal a quo;
12ª Porém, na decisão de direito, em manifesta contradição com a matéria de facto dada como provada o Tribunal veio a considerar que a reclamante não demonstrou o facto negativo referente á impossibilidade de prestação da garantia, acompanhando o argumento da AT. Sucede que cometeu o mesmo vício de apreciação que o próprio ato reclamado, porquanto este ao decidir como decidiu esqueceu-se de apreciar os documentos juntos pela reclamante, sobre os quais nada diz ou aprecia. Nenhuma referência é efetuada aos elementos contabilísticos juntos ou ao parecer elaborado pela Técnica Oficial de Contas responsável pela contabilidade da empresa, justificativo das razões da impossibilidade de apresentação de garantia. Também o pedido alternativo, formulado pela ora recorrente para a eventual prestação de garantia com bens existentes na titularidade da empresa, indicados para eventual prestação de garantia apelando à eventual revogação do ato de indeferimento, não teve qualquer resposta ou apreciação. Ainda assim, a decisão recorrida entendeu que o despacho reclamado se encontra devidamente fundamentado, apesar da ausência de qualquer resposta;
13ª Os bens constantes do património da empresa da reclamante e ora recorrente encontram-se evidenciados na declaração de IES e no mapa de Amortizações que foram juntos aos autos, aceites pela Autoridade Tributária e pelo Tribunal como documentos de prova bastantes, e aliás, suficientes para todos os efeitos contabilísticos e legais. Acresce que a própria AT aceita como verdadeira, porquanto não contradiz nem refuta, a afirmação da reclamante quanto á inexistência de outros bens na titularidade da empresa ao longo da sua existência, bem assim como a inexistência de quaisquer alienações de bens da titularidade da empresa o que, se tivesse existido, teria reflexo na contabilidade da empresa e resultaria demonstrado nos supra referidos documentos contabilísticos juntos pela recorrente aos autos;
14ª O despacho reclamado, além do supra exposto, alude a circunstâncias que nem sequer têm conexão concreta com o caso em apreço, como sucede com a alusão à alegada “dissipação” de bens (mais uma vez mero decalque do Ofício Circulado) quando nada indicia tal circunstancialismo, dado que os bens do património da reclamante são os mesmos desde sempre, sendo que cabia à AT o ónus da prova de tal facto por si invocado, nos termos do art. 74º, n.º 1, da LGT e 342º do Cód. Civil. A não se entender assim, sempre se dirá que, a alusão à alegada “dissipação de bens” (mais uma vez mero decalque do Ofício Circulado), quando nada indicia tal circunstancialismo, dado que os bens do património da reclamante são os mesmos desde sempre, sendo que cabia à AT o ónus da prova de tal facto invocado, nos termos do art. 74º, n.º1, da LGT e artigo 342º do Cód. Civil. A não se entender assim, sempre se dirá que, a alusão à alegada “dissipação de bens” assenta em manifesto e grosseiro erro sobre os pressupostos de facto subjacentes à decisão de indeferimento. Também neste ponto a decisão recorrida decidiu mal ao indeferir o alegado vício de violação de lei;
15ª O Tribunal a quo considerou como provados e demonstrados todos os factos relevantes para a decisão da causa, conforme supra descrito, o que manifestamente condiciona a decisão de direito, com a qual não podemos concordar por entender que a promove uma incorreta aplicação do direito, quanto à apreciação dos vícios alegados e entra em contradição com a matéria de facto dada como assente. De resto, ao longo da decisão recorrida, subsiste a dúvida: como se demonstra a impossibilidade de prestar garantia? O Tribunal a quo não esclarece.
Na ótica da AT é sabido que, qualquer que seja a prova apresentada pelo s.p., na prática, a decisão é sempre de indeferimento e tem sempre o mesmo Quadro e do mesmo tipo de texto. O que não se pode aceitar é que este procedimento possa ter cobertura judicial. Ou seja, que tal tipo de “decisão administrativa em matéria de execução fiscal”possa colher a aprovação de uma decisão judicial que deixa o s.p., desta forma, no livre arbítrio do poder discricionário da administração tributária o que é manifestamente inconstitucional à luz do disposto no art. 103º, n.2 e 20º da CRP;
16ª A ora recorrente conclui, tal como na reclamação, que o despacho reclamado devia ter sido anulado por padecer dos invocados vícios de forma e de violação de lei, por padecer de falta de fundamentação legalmente exigida, bem assim como de vício de violação de lei, por erro manifesto sobre os pressupostos de facto e de direito, subjacentes à decisão proferida, pelo que, a decisão proferida ao decidir pela improcedência da reclamação quanto aos alegados vícios decidiu com erro manifesto de julgamento, pelo que deve ser revogada, anulando-se a decisão reclamada.
Termos em que, sempre com o douto suprimento de V/ Exas., se requer que o presente recurso seja considerado procedente, revogando-se a decisão recorrida e anulando-se o ato reclamado com as legais consequências.
A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do presente recurso, com base no seguinte:
«É jurisprudência consolidada que: “ Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.arts.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redação da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.arts. 123, nº.2, do C.P.P.Tributário).” (Ac. do TCA Sul de 30/4/2014 no processo 04758/11 in www.dgsi.pt.). Em matéria de direito, o tribunal não está sujeito à alegação das partes, nem sequer no que respeita à qualificação jurídica dos factos por elas efetuada, e goza de liberdade na indagação, interpretação e aplicação do Direito (art. 664.º do CPC). Ac. do STA de 5/6/2013 no processo 043/13 in www.dgs.pt. " ... 0 tribunal não tem de apreciar todos os argumentos, considerações, raciocínios ou razões invocadas pela recorrentes, mas tão-somente apreciar as questões essenciais para a resolução da causa." ( Ac.do TCA Sul de 19/8/2014 no processo 07887/14, ainda não publicitado ).
Basta a leitura da decisão para se constata que o julgador conheceu e pronunciou-se sobre a questão a decidir, não se verificando o alegado vício.
O Tribunal conheceu e pronunciou-se relativamente aos alegados vícios de forma por violação do dever de participação, por violação do direito de audição e do vício da falta de fundamentação. O recorrente é que discorda das razões que conduziram à decisão.
A fundamentação consiste no conjunto de razões de facto/ou de direito em que assenta a decisão, os motivos pelos quais se decide de determinada forma.
*
No processo tributário estamos presente um contencioso pleno, o que significa que “ o contribuinte pode, em, geral, defender as suas posições jurídicas em todas as situações em todas as situações em que a esfera jurídica se encontre afetada, seja nas situações em que existe uma atuação administrativa seja nas situações em que essa atuação, devendo existir não existe.
Contencioso pleno significa, assim e em primeira linha, contencioso completo ou tutela jurisdicional efetiva." (Lições de Procedimento e Processo Tributário de Joaquim Freitas Rocha p. 234).
Nos termos do artigo 203º da CRP. “ Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei." As orientações internas da AT, vulgo Ofícios Circulados, não são lei, pelo que não vinculam os tribunais. Acresce que o processo tributário é um contencioso de legalidade no qual se vai discutir a legalidade de um ato praticado pela atuação administrativa, não sendo a função do juiz a de esclarecer as partes, como parece pretender a recorrente no articulado 15º das conclusões.
Invoca a violação de preceitos constitucionais mas não demonstra em que se traduz essa violação.
*
A decisão, em relação à matéria de facto apurada, ao enquadramento jurídico efetuado e fundamentação expendida, não merece censura, pelo que se deve negar provimento ao recurso.» (sic)

Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, foi o processo à Conferência para julgamento.
Por motivo de vencimento do seu relator coube ao Juiz adjunto relatar o presente acórdão.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sendo que as questões suscitadas se prendem com a análise de vícios de forma: violação do direito de participação, de audição do sujeito passivo, porque a AT sempre teria de notificar o s.p. para completar o processo com os elementos/documentos de prova em falta (quer por imposição dos princípios do inquisitório e da verdade material),falta de fundamentação com referência ao despacho reclamado que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, uma vez que não concretizou as razões que, aplicadas ao caso concreto, justificaram aquele desiderato.
Discorda, ainda, da interpretação quanto ao poder discricionário do órgão de execução (considerando-a inconstitucional, violação do art. 103º, n.º2, da CRP) quer ao julgar a improcedência do vício de falta de fundamentação porque o despacho reclamado não contém os fundamentos concretos, nem de facto nem de direito e baseia-se num Ofício Circulado, exposto em matriz, sem qualquer imputação concreta ao caso do s.p. e por via do qual se percebam as razões do indeferimento; como também quanto aos demais vícios de forma, de participação e audição prévia, porquanto ainda que se entenda estarmos no âmbito de um ato administrativo praticado no âmbito do p.e.f., sempre teria de notificar o s.p. para completar o processo com os elementos de prova em falta.
Por outro lado, discorda da sentença na parte em que considera o ato fundamentado quando refere, “é bem de ver que a sua fundamentação está contida no ponto E do despacho”.
Defende, ainda, que a sentença, pese embora os documentos que instruíram o pedido de dispensa de garantia e a matéria de facto dada como assente, conclui, de forma errada, não estar demonstrado o facto negativo referente à impossibilidade da prestação da garantia e não considerou ter havido violação de lei na ponderação dos pressupostos de facto e de direito com relevância para a dispensa da garantia, pois que não atendeu aos documentos instrutórios nem ao pedido alternativo de apresentação de garantia com os bens existentes na titularidade da empresa(fls. 29 dos autos), caso o órgão de execução optasse pela revogação do ato reclamado.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DOS FACTOS
Neste domínio não foram impugnados os factos provados, sendo que, também, não necessitam de qualquer alteração, face aos fundamentos do recurso (art. 663º,n-º6 do CPC “ex vi” do art. 2º, al.e) do CPPT). Constam da decisão recorrida os seguintes factos provados:
« A) Dos Factos
1. Corre no Serviço de Finanças do Porto 5 o Processo de Execução Fiscal nº 3190201401028375 em que é executada a sociedade aqui Reclamante L... GESTÃO DE PROJECTOS, LDA., NIPC 5…, por dívidas de IVA no montante total de 46.916,12 € e acrescido. (cfr. fls. 50 dos autos e Informação de fls. 65 ss.)
2. Citada para a execução fiscal a sociedade executada, aqui Reclamante (através da Nota de Citação junta a fls. 50 dos autos), requereu em 07/03/2014 a dispensa de prestação de garantia (através do requerimento que junta sob Doc. nº 2 com a Petição Inicial, a fls. 40 ss. dos autos), dizendo estarem reunidos os pressupostos para a dispensa da prestação de garantia para suspensão da execução fiscal nos termos dos artigos 52º nº 4 da LGT e 170º do CPPT, invocando:
- que exerce a atividade empresarial na área de comércio e serviços de tecnologias da informação, prestação de serviços conexos à informática e gestão de conteúdos, e que o desenvolvimento da sua atividade assenta essencialmente numa atividade de natureza intelectual, imaterial, de prestação de serviços;
- que o seu património é exíguo e se reduz a alguns bens móveis, equipamentos informáticos e pouco mais;
- que a sociedade não tem uma movimentação de valores financeiros (cash flow) regular que lhe permita ter disponibilidades financeiras avultadas como as que se encontram em sede de execução fiscal, constituindo únicos ativos que poderá apresentar como garantia os equipamentos informáticos que são a única ferramenta de trabalho da empresa, que se encontram registados nas contas dos ativos tangíveis que se encontram descritos nos documentos contabilísticos e mapa de amortizações;
- que não tem condições económicas para poder pagar condicionalmente o valor da dívida ou efetuar depósito caução ou prestar garantia bancária em face dos termos e condições que a atual conjuntura de mercado impõe, por a obtenção de garantia bancária junto de qualquer banco comercial ou sociedade financeira exigir a existência de depósitos poupança ou produtos financeiros em valor que garanta o valor da garantia a prestar às Finanças, tornando impossível à sociedade a obtenção de garantia bancária e por as próprias instituições bancárias e financeiras, fruto da crise económica instalada desde 2008, se encontrarem fortemente condicionadas e em dificuldades de liquidez, o que determina em regra o indeferimento de pedidos de garantia bancária a favor do fisco ou entidades estatuais;
- que a suspensão do processo de execução fiscal é imprescindível ao prosseguimento da atividade empresarial da sociedade executada, por a sua capacidade de prosseguir atividade depender da credibilidade que conquistou no mercado e da sua capacidade para acompanhar os seus clientes na apresentação e desenvolvimento de projetos junto de organismos diversos, públicos e privados, implicando a execução fiscal em curso, com as penhoras e compensações de créditos junto dos seus principais clientes e outras medidas vulgarmente utilizadas pela Administração Tributária em sede de execução fiscal a perda de credibilidade da sociedade, podendo fazer colapsar de imediato a sua atividade, causando um prejuízo irreparável;
- que ao longo dos anos o património da sociedade tem sido o mesmo, estável, atualizado e renovado por força das exigentes condições de trabalho da área da informática, não se tendo verificado a alienação de quaisquer bens móveis ou imóveis, que a empresa nunca possuiu, não sendo assim a insuficiência de bens penhoráveis imputável à sociedade executada;
(cfr. fls. 50 dos autos, Doc. nº 2 junto com a Petição Inicial, a fls. 40 ss., e Informação de fls. 65 ss.)
3.A sociedade executada instruiu aquele pedido de dispensa de garantia com os seguintes documentos:
- Declaração Anual IES (Informação Empresarial Simplificada) referente ao ano de 2012 (constante de fls. 53 ss. dos autos);
- Declaração datada de 20/11/2013, subscrita pelo TOC responsável pela contabilidade da sociedade executada (constante de fls. 57 dos autos);
(cfr. Docs. nº 2 e nº 3 juntos com a Petição Inicial e fls. 53 ss. e 57 dos autos )
4.Aquele pedido de dispensa de garantia foi indeferido por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças do Porto 5, assente na Informação sobre a qual foi aposto (constante de fls. 35 ss. dos autos), sendo o seguinte o teor do despacho de indeferimento:
«Por não estarem reunidas as condições necessárias para que possa ser concedida a isenção da garantia, para efeitos de suspensão do processo executivo indefiro o pedido»
(cfr. Doc. nº 1 junto com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos e Informação de fls. 65 ss.)
5.A Informação em que assentou aquela decisão de indeferimento verte o seguinte no seu Ponto C. a respeito dos «normativos legais aplicáveis» e respetivo enquadramento legal:


(cfr. Doc. nº 1 junto com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos)
6.Aquela Informação (em que assentou aquela decisão de indeferimento) verte também no mesmo Ponto C., a respeito dos «pressupostos da concessão da dispensa de garantia (artº 52º nº 4 da LGT)» o seguinte:

(cfr. Doc. nº 1 junto com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos)
7.O Ponto D. daquela Informação, atinente às «Informações Administrativas Aplicáveis», verte o seguinte:









(cfr. Doc. nº 1 junto com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos)
8.Por fim no Ponto E. daquela Informação (em que assentou aquela decisão de indeferimento), sob a epígrafe «apreciação do pedido», é vertido o seguinte:




(cfr. Doc. nº 1 junto com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos)
9. A decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia foi notificada à mandatária da sociedade executada, através do ofício n.° 3624/3190-30 datado de 27/03/2014 (junto sob Doc. nº 1 com a Petição Inicial, a fls. 34 ss. dos autos).
10. A Petição Inicial da presente Reclamação foi apresentada no Serviço de Finanças do Porto 5 em 10/04/2014. (cfr. fls. 63 dos autos e Informação de fls. 65 ss.)
11. A sociedade executada deduziu em 28/03/2014 Impugnação Judicial das liquidações de IVA subjacentes às dívidas em cobrança no Processo de Execução Fiscal. (cfr. Doc. nº 4 junto cm a Petição Inicial, a fls. 60 dos autos)».
E mais se deixou consignado na sentença que:
«Não existem outros factos provados nem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.
**

A matéria de facto dada como provada nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados teve por base os documentos integrantes do processo, supra referenciados.
3.2. Do Direito.»
Em matéria de direito a sentença, transcrevendo o quadro legal aplicável, de seguida, expôs as razões de ordem jurídico-fiscal, no que respeita aos vícios de violação das normas constitucionais e vícios formais:
«(…)
Do vício de violação de lei por violação do princípio de legalidade fiscal (art. 103º, n.º1 da CRP), dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da equidade e da tutela jurisdicional
A sociedade Reclamante começa por invocar que o despacho de indeferimento é ilegal por se fundar no ofício circulado n.º 60076 de 29/07/2010 da DSGCT e não nos normativos legais aplicáveis, que invoca ser os dos artigos 52° n" 4 da LGT e 170° do CPPT, sustentando (pelo que expõe nos artigos 23° a 29 ° da Petição Inicial) que assim o despacho reclamado padece de vício de violação de lei por violação do princípio de legalidade fiscal (artigo 103° n? 2 da CRP), dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da equidade e da tutela jurisdicional efetiva.
É certo que a Informação em que assentou o despacho de indeferimento (constante de fls. 35 ss. dos autos), aqui reclamado, verte no seu Ponto E (a respeito da «apreciação do pedido») a seguinte menção:
- Assim, no caso em análise conclui-se não terem sido observadas as instruções emanadas pelo ofício circulado atrás referido.
Porém, como é bom de ver, em face desde logo do demais que se mostra inserto naquele mesmo Ponto E da Informação fundamentadora da decisão, mas igualmente do que é também externado nos restantes pontos daquela mesma Informação (vertidos na factualidade apurada supra, de que aqui nos abstemos de reproduzir de novo), a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia com vista à suspensão da execução fiscal assentou na consideração de que não se mostravam verificados (demonstrados) os pressupostos legais para o efeito. Mormente em face da circunstância de não se mostrar comprovado pela sociedade executada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução, como lhe competia, como foi ali entendido (vide Pontos. C; D. e E. da Informação fundamentadora da decisão)
Não se podendo dizer que apenas foram seguidas, na decisão reclamada, as instruções veiculadas no ofício circulado n" 60076 de 29-07-2010 da DSGCT, com desdém pelos normativos legais aplicáveis, mormente os dos artigos 52° n" 4 da LGT e 170° do CPPT, referidos pela sociedade executada, aqui Reclamante. Não se mostrando, no caso, de algum modo ferido o princípio de legalidade fiscal consagrado no artigo 103° n" 2 da CRP e acolhido no artigo 8° da LGT. Como não se mostram inobservados em qualquer aspeto, dimensão ou medida os princípios da justiça, da proporcionalidade, da equidade e da tutela jurisdicional efetiva invocados pela sociedade Reclamante.
Improcedendo, por conseguinte, neste aspeto, a invocação da sociedade Reclamante.
Do vício de violação do princípio da participação/falta de audiência prévia
A sociedade Reclamante invoca também ter ocorrido violação do direito de audição prévia(pelo que expõe nos artigos 30º a 41º da Petição Inicial)
A sociedade executada, aqui reclamante, não foi com efeito ouvida previamente à decisão de indeferimento que recaiu sobre o seu pedido de dispensa de prestação da garantia.A questão é, então, saber se o deveria ter sido, como propugna a Reclamante, ou se pelo contrário, não cumpria no caso ouvir previamente a sociedade executada, aqui reclamante.
O que se passa por determinar se os atos praticados na execução fiscal são ou não aplicáveis as normas do procedimento tributário, incluindo, no que aqui revelam a do art. 60º da LGT que estabelece o direito de participação dos contribuintes, na modalidade de audição prévia, na formação das decisões que lhes digam respeito.
Quanto a tal matéria já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça em vários acórdãos sempre no sentido de que o ato praticado pelo órgão de execução fiscal atinente quer ao pedido de isenção de prestação de garantia para a suspensão da execução fiscal, quer ao pedido de apreciação da idoneidade da garantia oferecida para o mesmo efeito, não se encontra sujeito à audiência prévia prevista no art. 60º da LGT, ainda que, por vezes, com fundamentos não totalmente coincidentes (vide,…).
Seja qual for a tese que se adote em torno da qualificação da natureza do ato praticado pelo órgão de execução fiscal quanto à apreciação da garantia oferecida à suspensão da execução fiscal (ato materialmente administrativo ou ato processual), o certo é que é indeclinável, que se trata de ato praticado no processo de execução fiscal e não de ato praticado no procedimento tributário.
Ora, como é sabido, o processo de execução fiscal constitui um processo judicial no qual o órgão de execução fiscal é quem instaura, conduz e tramita a execução fiscal, constituindo “um sujeito processual (…) auxiliar ou colaborador operacional do Juiz.” (cfr. ac. STA de 23/02/2012, Proc. Nº 59/12).
Com efeito, de harmonia com o disposto no art. 103º da LGT, “o processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos atos que não tenham natureza judicial (…)” (cfr. ac. do STA de 8/08/2012, no Proc. 803/12)
Pelo que a inexistência de audição prévia radicará desde logo na circunstância de o ato em causa constituir um ato praticado num processo de execução fiscal e não de um ato praticado num procedimento tributário.
Sendo certo que a natureza judicial do processo de execução fiscal não prejudica a participação dos órgãos da administração tributária nos atos sem natureza materialmente jurisdicional (…).
Ora o artigo 60º da LGT que estabelece o direito de participação dos contribuintes, na modalidade de audição prévia, na formação das decisões que lhes digam respeito, e que a reclamante sustenta ter sido violado, no caso, por não ter sido ouvida previamente à prolação do despacho de indeferimento de que aqui se reclama, está inserido no Título III-Do procedimento tributário. Não é assim de aplicar aos atos praticados no processo de execução fiscal tendente á cobrança das obrigações tributárias (..), atenta a natureza judicial da execução fiscal. (cfr. art. 103º da LGT), como já vimos.
Acrescendo dizer que “em processos de natureza judicial as decisões não têm que ser projetadas, devendo a um requerimento seguir-se uma decisão, passível, como decorre da lei do respetivo recurso (no caso, reclamação) para o tribunal competente” (cfr. ac. do STA de 30/11/2011, Proc. 0983/11)
Pelo que à luz do entendimento já supra explanado não se pode dizer que ao to que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia estivesse sujeito à sua audiência prévia a que alude o art. 60º da LGT, por tal norma não ser de aplicar no caso.
Não se podendo, por conseguinte, concluir que previamente a decisão devesse ter sido ouvida a sociedade executada.
Improcede, consequentemente, o invocado vício.
Do vício de falta de fundamentação
A sociedade Reclamante invoca também ter ocorrido vício de falta de fundamentação (pelo que expõe nos artigos 42º a 69º da Petição Inicial)
(…)
Sendo que em matéria tributária o dever de fundamentação dos atos decisórios de procedimento tributários e dos atos tributários é concretizado no artigo 77º da LGT (…).
E como o Supremo Tribunal Administrativo vem entendendo a exigência legal e constitucional de fundamentação visa também permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato e a sua impugnação contenciosa. E para ser atingido tal objetivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do ato a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que o praticou, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.
Exige-se da fundamentação que ela seja expressa, isto é, que revele externamente os pressupostos e a motivação do ato com exposição clara, suficiente e unívoca das razões de facto e de direito da decisão (…) Sendo que haverá obscuridade “quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu” ocorrerá contradição “quando da fundamentação as razões invocadas para decidir justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão em sentido oposto (…) [cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa in Lei Geral Tributária (…)]
Importando ater que a falta de fundamentação legalmente exigida é vício gerador de anulabilidade do ato, à luz dos critérios acolhidos nos artigos 133º e 135º do CPA. (…)
Importando ainda ter presente a conhecida distinção entre fundamentação formal e a fundamentação substancial, esta que tem a ver com o mérito e a primeira com a forma, que é a que aqui, nesta sede, nos importa. Sendo que a suficiência ou coerência da fundamentação tem de ser analisada em função do que está declarado no despacho decisório e bem assim nos pareceres ou informações em que o mesmo se tenha suportado e a que tenha aderido (art. 77º, n.º1, da LGT)
Visto isto, em face do teor da Informação em que assentou o despacho pelo qual foi indeferido o requerimento de prestação de garantia (…) é manifesto mostrarem-se nele externado os motivos pelos quais (bem ou mal, o que para o efeito é irrelevante)entendeu o órgão de execução fiscal indeferir o requerido pela sociedade executada, aqui reclamante. O que decorre do que é externado ao longo da Informação e que vai desembocar nas conclusões finais, vertidas no ponto e da Informação. Do que manifestamente se extrai que o indeferimento se fundou na circunstância de a sociedade executada não ter demonstrado, como lhe competia, a impossibilidade de constituir garantia bancária, caução ou seguro-caução.
Tendo que ter-se por fundamentada, do ponto de vista formal, a reclamada decisão de indeferimento. Sendo percetível para um destinatário normal os motivos pelos quais foi indeferida a requerida dispensa de prestação da garantia. Mostrando-se concomitantemente assegurada a função do dever legal de fundamentação a que se encontra sujeito tal ato. Não podendo considerar-se verificado o invocado vício de falta de fundamentação.
Não assistindo, neste aspeto, razão á sociedade Reclamante.»
«»
4. Apreciação jurídica do Recurso.
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise dos vícios invocados pela recorrente à sentença, tendo presente os factos provados e a sua apreciação jurídica.
As questões suscitadas nas conclusões de recurso prendem-se com a discordância com a sentença relativamente à análise dos seguintes vícios: de forma, por violação do direito de participação, de audição do sujeito passivo, porque a AT sempre teria de notificar o s.p. para completar o processo com os elementos/documentos de prova em falta (quer por imposição dos princípios do inquisitório e da verdade material),falta de fundamentação com referência ao despacho reclamado que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, uma vez que não concretizou as razões que aplicadas ao caso concreto justificaram aquele desiderato.
Com efeito, a recorrente discorda da sentença quer pela interpretação que fez quanto ao poder discricionário do órgão de execução (considerando-a inconstitucional, violação do art. 103º, n.º2, da CRP) quer ao julgar a improcedência do vício de falta de fundamentação porque o despacho reclamado não contém os fundamentos concretos, nem de facto nem de direito, e baseia-se num ofício Circulado, exposto em matriz, sem qualquer imputação concreta ao caso do s.p. e por via do qual se percebam as razões do indeferimento; como também quanto aos demais vícios de forma, de participação e audição prévia, porquanto ainda que se entenda estarmos no âmbito de um ato administrativo praticado no âmbito do p.e.f., sempre teria de notificar o s.p. para completar o processo com os elementos de prova em falta.
Quanto aos vícios de cariz substancial, a recorrente defende que a sentença, pese embora os documentos que instruíram o pedido de dispensa de garantia e a matéria de facto dada como assente, conclui não estar demonstrado o facto negativo referente à impossibilidade da prestação da garantia e não considerou ter havido violação de lei na ponderação dos pressupostos de facto e de direito com relevância para a dispensa da garantia, pois que não atendeu aos documentos instrutórios nem ao pedido alternativo de apresentação de garantia com os bens existentes na titularidade da empresa(fls. 29 dos autos), caso o órgão de execução optasse pela revogação do ato reclamado.

1.Vejamos, então, os vícios de violação de lei, por a decisão reclamada ter assentado em ofício circulado e não nos normativos legais aplicáveis.
Aqui a sentença recorrida não merece qualquer reparo na medida em que, pese embora o despacho reclamado estruturar a sua fundamentação no ofício circulado, ele próprio, também, reproduz o normativo legal aplicável pelo que de forma inelutável as normas legais convocadas para o caso foram também aplicadas.
2.A recorrente entende que a sentença não fez a interpretação correta no que respeita aos vícios imputados à decisão reclamada, de violação do princípio da participação e da falta de audiência prévia.
Como foi explanado na sentença o direito de audição visa dar a conhecer ao destinatário de um determinado ato administrativo o sentido provisório da decisão, dando-lhe assim oportunidade para se pronunciar (artigo 100º do CPA).
O desiderato deste direito é permitir aos interessados, sobretudo àqueles em relação aos quais a Administração pretende proferir uma decisão total ou parcialmente desfavorável, o exercício do contraditório e do direito de participação (artigos 267º, nº 5 da CRP, 8º do CPA, 60º da LGT e 45º do CPPT).
Deste modo, o interessado tem a oportunidade de contradizer a argumentação elencada pela Administração quer em termos das normas jurídicas aplicáveis ao caso quer em termos dos pressupostos de facto relevantes.
O direito de audição permite também obstar a que a decisão final constitua uma decisão-surpresa, pelo que o particular deverá ser informado não só do sentido provável da decisão, mas também de todos os elementos relevantes apurados pela Administração quer em termos de matéria de facto quer em termos de direito (artigos 100º, nº 1, 101º, nº 2 e 102º, nº 2 do CPA e 60º, nº5 da LGT).
Só assim poderá o particular participar na formação da decisão que lhe diz respeito de uma forma consciente e eficaz.
Todavia, como ficou exposto na sentença recorrida, com convocação de jurisprudência pertinente para o caso, no âmbito do p.e.f., por não se tratar de procedimento administrativo, não têm aplicação as normas da audiência prévia ou da participação na formação das decisões.
Ou seja, aos atos praticados na execução fiscal não são aplicáveis as normas do procedimento tributário, nomeadamente a do artigo 60º da LGT que estabelece o direito de participação dos contribuintes, na modalidade de audição prévia, na formação das decisões que lhes digam respeito.
A solução desta questão, que ainda não obteve resposta suficientemente consolidada na jurisprudência tributária, tem por ponto de partida a determinação do sentido e alcance do artigo 103º da LGT, em cujo nº 1 se diz que «o processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos atos que não tenham natureza jurisdicional»; e no nº 2 se prescreve que «é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos atos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária, nos termos do número anterior».
O enunciado normativo «o processo de execução fiscal tem natureza judicial», exprime literalmente o sentido de que a execução fiscal se realiza através de um «processo» e não de um «procedimento administrativo», no pressuposto hoje indiscutível que estamos perante realidades com natureza distinta.
Neste conspecto, relata o Ac. do STA de 7/3/12, no processo 0185/12o seguinte:
O sentido da norma do artigo 103º da LGT é o de que a execução fiscal atua através da forma de processo, entendido como um conceito moldado a partir do modelo que fornece o processo judicial, e não através da forma de procedimento administrativo, entendido como modo de realização do direito administrativo. E por isso mesmo, a atestar a natureza processual da execução fiscal, a alínea h) do nº 1 do artigo 54º da LGT a contrario exclui do procedimento tributário a cobrança das obrigações tributárias «na parte que tiver natureza judicial». Daí que, tendo todo o processo de execução fiscal natureza judicial, os atos nele praticados não possam ser qualificados como atos procedimentais, mas antes como atos processuais.(sublinhado nosso)
O legislador do CPPT não se afastou do princípio vetor consagrado no nº 1 do artigo 103º e na alínea h) do nº 1 do artigo 54º da LGT.(…) Com esta fisionomia, a execução fiscal é um exemplo da atividade administrativa sujeita as formas processuais, atuando através de um verdadeiro processo, como tal designado na lei, fora da função jurisdicional do Estado, e não através do modo específico do exercício da função administrativa.(…). Na execução fiscal, há unidade e não diversidade de natureza, sendo exclusiva e integralmente de natureza processual, quer na parte jurisdicional, quer na parte não jurisdicional.
Ora, se execução fiscal deve ser qualificada como um processo, então o conjunto de atos por ele formado são atos processuais e não atos procedimentais. São atos processuais porque fazem parte do complexo de atos que formam a sequência processual e/ou porque têm relevância no desenvolvimento da relação processual. Não são atos procedimentais, porque não estão enquadrados num procedimento tributário que funcione como instrumento de concretização da relação jurídica tributária material que se estabeleceu entre o contribuinte e a administração tributária. (sublinhado nosso)
Em consonância com essa norma, o artigo 276º do CPPT estabelece que são suscetíveis de reclamação, as decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal e outras autoridades da administração tributária «que no processo afetem os direitos e interesses legítimos do executado». Portanto, os atos materialmente administrativos objeto de reclamação são apenas aqueles que forem produzidos «no processo», ou seja, os atos processuais, ainda que simultaneamente aplicam normas de direito material.
Posto isto, e determinada a natureza processual dos atos praticados pelo órgão de execução fiscal, conclui-se pela inaplicabilidade das normas próprias do procedimento tributário, como é o caso do artigo 60º relativo ao direito de audição prévia, ao ato que indeferiu o pedido de isenção de garantia.
Pelos efeitos produzidos, o ato de indeferimento do pedido de isenção da prestação de garantia é um ato predominantemente processual: faz cessar o efeito suspensivo da execução iniciado com o pedido de isenção, procedendo-se de imediato à penhora ou à compensação de dívidas (cfr. nº 2 do art. 169º nº 1 do art. 89º do CPPT). (…)
Na execução fiscal a proteção jurídica dos direitos processuais do executado é assegurada através do controlo a posteriori dos atos executivos, sobre os quais cabe sempre ao juiz a última palavra.(…)(sublinhado nosso)
A execução fiscal está estruturada para fornecer ao executado todas as garantias de defesa contra atos processuais ilegais, pelo que, se o legislador não teve necessidade de criar mais uma fase procedimental precedente à prática dos atos executivos, não se vislumbra que direitos fundamentais do executado possam justificar e exigir a introdução de uma nova “fase procedimental”, com o prejuízo que isso acarreta para realização célere do interesse público na cobrança dos tributos.»
Posteriormente, em face da divergência jurisprudencial, veio a uniformizar jurisprudência, o Acórdão do STA n.º 5/2012, publicado na 1ª série, do D.R., n.º 204 de 22/10/12, no sentido de que «(…)independentemente do entendimento que se subscreva relativamente à natureza jurídica do ato aqui em causa (indeferimento do pedido de isenção de garantia)-ato materialmente processual ou ato materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal- é de concluir que não há, neste caso, lugar a exercício do direito de audiência (art. 60º da LGT)»
Tanto basta para que a orientação jurisprudencial, que aqui também se acolhe, embora com os fundamentos do supracitado do Ac. do STA de 7/3/12, no proc. 0185/12, sirva de fundamentação.
No âmbito do direito de participação e de audição prévia, a recorrente coloca a questão da necessidade de o órgão de execução dever diligenciar para que o pedido de isenção fosse completado com os elementos de prova em falta.
A questão assim colocada sugere outro vício que não cai nesta alçada, mas antes do défice instrutório por parte do órgão de execução, não tendo sido autonomizado na reclamação e, por isso, não foi objeto de análise na sentença.
Improcedem, assim, as alegações de recurso no que respeita à violação do princípio da participação e da falta de audição prévia.

3.A recorrente invoca falta de fundamentação da decisão reclamada, discorda da apreciação feita na sentença por entender que o despacho não contém os fundamentos concretos, nem facto nem de direito, nem qualquer imputação concreta ao caso do sujeito passivo e, por via da qual, se percebam as razões do indeferimento.
Neste domínio, tal como está expressado na sentença,é sabido que o direito à fundamentação do ato tributário, ou em matéria tributária, constitui uma garantia específica dos contribuintes e, como tal, visa responder às necessidades do seu esclarecimento, procurando-se informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do ato por forma a permitir-lhe conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e porque motivo se decidiu num sentido e não noutro.
Diga-se ainda que a questão da fundamentação, consagrada no art. 77º da LGT, corresponde ao cumprimento duma diretiva constitucional decorrente do atual art. 268º, n.º 3 da C.R.P. no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjetivo do administrado à fundamentação, sendo que com a consagração de tal dever se visa harmonizar o direito fundamental dos cidadãos a conhecerem os fundamentos factuais e as razões legais que permitem a uma autoridade administrativa conformar-lhes negativamente a esfera jurídica com as exigências que a lei impõe à administração de atuar, na realização do interesse público, com presteza, eficácia e racionalidade.
A sentença fazendo apelo ao quadro legal que impõe o dever de fundamentar as decisões, conclui que a decisão de indeferimento do pedido de isenção está fundamentada, concluindo que:«Visto isto, em face do teor da Informação em que assentou o despacho pelo qual foi indeferido o requerimento de prestação de garantia (…) é manifesto mostrarem-se nele externado os motivos pelos quais (bem ou mal, o que para o efeito é irrelevante)entendeu o órgão de execução fiscal indeferir o requerido pela sociedade executada, aqui reclamante. O que decorre do que é externado ao longo da Informação e que vai desembocar nas conclusões finais, vertidas no ponto E da Informação. Do que manifestamente se extrai que o indeferimento se fundou na circunstância de a sociedade executada não ter demonstrado, como lhe competia, a impossibilidade de constituir garantia bancária, caução ou seguro-caução.
Tendo que ter-se por fundamentada, do ponto de vista formal, a reclamada decisão de indeferimento. Sendo percetível para um destinatário normal os motivos pelos quais foi indeferida a requerida dispensa de prestação da garantia. Mostrando-se concomitantemente assegurada a função do dever legal de fundamentação a que se encontra sujeito tal ato. Não podendo considerar-se verificado o invocado vício de falta de fundamentação».
A decisão reclamada proclama-se, assim: «apreciação do pedido




Afigura-se, assim, não estarem reunidas as condições necessárias para que possa ser concedida a dispensa de garantia, para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal, pelo que proponho o indeferimento do pedido. À consideração superior.»
O despacho, debruçando-se sobre o pedido e os meio de prova apresentados, consigna que foram juntos “cópia da declaração anual IES, que inclui o balanço a 31/12/2012 e mapa das depreciações e amortizações, onde se verifica a amortização dos ativos fixos tangíveis.
Declaração do TOC da indisponibilidade financeira da empresa para a prestação da garantia.”
A decisão reclamada limitou-se, de forma genérica e lapidar, a afirmar que o ónus da prova cabe à pessoa que invoca os factos constitutivos do direito e que à executada caberia apresentar todas as provas necessárias de forma a comprovar a absoluta impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro caução, bem como o prejuízo irreparável, sem dizer como ponderou e analisou criticamente os documentos apresentados pela executada de forma a compreender-se o que naqueles elementos documentais não relevou e em que medida se mostraram insuficientes para o desiderato pretendido, a isenção da garantia.
Nos documentos apresentados estão espelhados vários factos que importa sobre eles tomar posição concreta, tal como a demonstração de resultados da executada no exercício de 2012; o capital próprio e o passivo, bem como o parecer do Toc.
Sobre esta realidade concreta a decisão reclamada apenas dela faz menção, sem se debruçar sobre o seu teor e o alcance dos mesmos para a questão do pedido de isenção.
Fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado ato; este que deverá conter expressamente os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão sem que a exposição dos fundamentos de facto tenha de ser prolixa já que o que importa é que, de forma sucinta, se conheçam as premissas do ato e que se refiram todos os motivos determinantes do conteúdo resolutório, sendo que na menção ou citação das regras jurídicas aplicáveis não devem aceitar-se como válidas as referências de tal modo genéricas que não habilitem o particular a entender e aperceber-se das razões de direito que terão motivado o ato em questão, pelo que importa e se impõe que a decisão contenha os preceitos legais aplicados e que conduziram a tal decisão.
A fundamentação consiste, portanto, em deduzir de forma expressa a decisão administrativa com as premissas fácticas e jurídicas em que assenta, visando impor à Administração que pondere antes de decidir, contribuindo para uma mais esclarecida formação de vontade por parte de quem tem a responsabilidade da decisão além de permitir ao administrado seguir o processo intelectual que a ela conduziu.Cfr. Vieira de Andrade in “O dever de fundamentação expressa dos atos administrativos”, pag. 73/80.
Conforme é jurisprudência uniforme e constante a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo concreto de cada ato e das circunstâncias concretas em que é praticado, cabendo ao tribunal em face do caso concreto ajuizar da sua suficiência, mediante a adoção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante dos atos em causa fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro.
Com tal dever de fundamentação visa-se "captar com transparência a atividade administrativa", sendo que tal dever, nos casos em que é exigido, é um importante sustentáculo da legalidade administrativa e constitui um instrumento fundamental da respetiva garantia contenciosa, para além de um elemento fulcral na interpretação do ato administrativo.Ac. do TCA Sul no processo 06130/12 de 4/4/12, não disponível no site do ITIJ.
Para se atingir aquele objetivo basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, congruente e que se mostre contextual.
Note-se que a fundamentação do ato administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado, e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.
Em sede de fundamentação de direito, dada a funcionalidade do instituto da fundamentação dos atos administrativos, ou seja, o fim meramente instrumental que o mesmo prossegue, se aceita um conteúdo mínimo traduzido na adução de fundamentos que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, possibilitem a referência da decisão a um quadro legal perfeitamente determinadoAc. do S.T.A. Pleno de 25/05/93, Rec. nº 27387, de 27-02-97, Rec. nº 36197.
Verifica-se assim que o ato reclamado e a informação que o precede não se mostram devidamente contextualizados, porquanto não rebatem a factualidade alegada pela reclamante e argumentos invocados, não relevam que a mesma tenha sido tida em consideração e que tenha sido devidamente ponderada na tomada da decisão jurídica, consequentemente, qualquer pessoa colocada na posição do destinatário do ato, fica sem perceber quais as concretas razões de facto, que conduziram ao indeferimento do pedido.

Da informação prestada não decorre qualquer raciocínio, de facto, quanto ao eventual preenchimento, ou não, dos pressupostos conducentes ao deferimento ou indeferimento da dispensa, ou seja, nada se refere quanto aos factos cuja falta de demonstração determinaram o indeferimento da pretensão de dispensa de prestação de garantia, nem se relaciona os mesmos com os pressupostos de que depende a isenção, de modo a ser percetível e compreensível quais os pressupostos que não se acham demonstrados, e porque razões os mesmos não se mostram demonstrados, em ordem à realização do escrutínio do ato.

Em suma, a mera conclusão de que não se encontram apresentadas todas as provas necessárias de forma a comprovar a absoluta impossibilidade da constituição de garantia bancária (…), sem os relacionar com as provas apresentadas, não é suficiente para cumprir as exigências da fundamentação.

Cumpre ter presente que em matéria tributária, o dever de fundamentação dos atos decisórios de procedimentos e dos atos é concretizado, de forma genérica, no art. 77.º da LGT.
Por outro lado, como já ficou dito, a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato e a sua impugnação contenciosa.
Para ser atingido tal objetivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do ato a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o ato, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.
A partir daqui, considerando os elementos presentes nos autos, tem de entender-se que a fundamentação externada pela AT não satisfaz o requisito de fundamentação exigível, do ponto de vista formal, sendo insuficiente porque não permite a reconstituição do iter cognoscitivo que determinou a decisão da Administração.
Neste domínio, é sabido que o procedimento de isenção de prestação de garantia está previsto no art. 52º, n.º 4, da LGT, norma em que se consagra a possibilidade da Administração Tributária, a requerimento do executado, poder isentá-lo da prestação de garantia nos casos de sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou existindo manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que, em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.
A lei admite a dispensa da prestação de garantia por parte do órgão de execução fiscal, em caso de manifesta falta de meios económicos do executado ou, mesmo quando este disponha de meios económicos suficientes, a prestação de garantia lhe cause ou possa causar prejuízo irreparável, circunstância que obviamente lhe cabe provar.
Pois bem, no presente caso, perante o que ficou exposto e em função da leitura da informação que sustenta o despacho reclamado, tem de entender-se que há falta de fundamentação do despacho de indeferimento, pois que este não contém a respetiva motivação, não permitindo a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo seu autor, dando a conhecer as razões por que se decidiu como se decidiu e não deforma diferente, possibilitando, assim, à parte reagir contra essa decisão.
A mundividência processual torna claro que o dever de fundamentação foi manifestamente postergado, limitando-se o órgão fiscal, após uma sumária enunciação dos requisitos legais de que está dependente essa concessão ou dispensa, a assinalar que a requerente não demonstrou a verificação dos pressupostos previstos no n.º 4 do art. 52.º da LGT e não fez prova da absoluta impossibilidade de constituição da garantia, bem como do prejuízo irreparável causado pela prestação da mesma conjugado com as instruções emanadas do Ofício-Circulado n.º 60077, de 29/07/2010. Bem se pode dizer que a fundamentação empreendida pelo órgão de execução tanto vale para este processo e relativamente a esta reclamante como para tantos outros reclamantes ou processos, desde que haja similitude de casos, tal é a abstração factual que o mesmo corporiza.
Na verdade, a informação em apreço exibe as características de uma informação - tipo, que poderia ser utilizada para qualquer pedido de dispensa de prestação de garantia, não se reconhecendo qualquer traço que relacione a decisão em apreço com a questão suscitada em concreto.
Aliás, a nota distintiva em relação à situação em apreço prende-se com a alusão ao facto de se ter dito que da cópia da declaração anual de IES se vê a “amortização total dos ativos fixos tangíveis”, fora isso, a fundamentação é de tal forma genérica que, como se disse, é passível de ser utilizada noutro caso.
Deste modo, com os dados dos autos, não vemos como pôde a sentença considerar fundamentado o ato sob reclamação, que nem sequer está contextualizado, não acolhe, nem de forma sucinta, qualquer factualidade que haja sido tida em consideração e que tenha determinado a decisão jurídica, e por isso não é claro, ficando por perceber as razões porque se tomou aquela decisão, para além de ser o aí plasmado manifestamente insuficiente para que o destinatário do ato, a reclamante, compreenda o que conduziu àquela decisão que surge, perante si como ilógica e incompreensível.
A sentença aqui sindicada que assim não entendeu não pode ser confirmada.
Daí que na procedência das conclusões das alegações da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, revogar a decisão, anulando-se o ato reclamado por falta de fundamentação.
A procedência do vício de falta de fundamentação prejudica o conhecimento dos restantes vícios invocados pela recorrente.


5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, revogando-se a decisão judicial recorrida e anulando-se o despacho reclamado, nos termos acima exarados.

Custas a cargo da Fazenda Pública.

Notifique-se.
Porto, 30 de Outubro de 2014

Ass. Cristina da Nova (Relatora por vencimento)
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Vital Lopes (“Tendo ficado vencido enquanto relator inicial, deixo expressas as razões da minha discordância com a decisão que fez vencimento:
«Quanto ao dever de fundamentação dos actos administrativos, diremos, reforçando a linha argumentativa da sentença recorrida, que constitui um imperativo constitucional, expressamente previsto no art.°268.° n.°3 da CRP e deve obedecer aos requisitos previstos no art.°125.°, do Código do Procedimento Administrativo.
Dispõe o n.°2 do art.°125.°, do CPA que “equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição, ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto”.
Os fundamentos do acto devem, pois, ser enunciados de forma clara - no sentido de que se deve indicar precisamente os factos e o direito com base nos quais se decide; se o órgão se manifesta em termos tais que não permitam conhecer as razões por que se decidiu, a fundamentação não serve o fim da lei, qual é o de esclarecer o particular da motivação do acto; suficiente, dando a conhecer cabalmente a decisão tomada; e, congruente, isto é, que não seja contraditória, tendo-se aqui em vista a aptidão lógica das premissas aduzidas para delas retirar a decisão tomada, pelo que, se, formalmente, as razões invocadas são capazes de justificar a decisão tomada, a fundamentação diz-se congruente - seguimos no essencial, a exposição conceptual de Mário Esteves de Oliveira, “Direito Administrativo I”, Almedina, 1980, a pág.473.
Na esteira das lições de Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, Almedina, 2002, Vol. II, a pág.351, “O objectivo essencial e imediato da fundamentação é, portanto, esclarecer concretamente a motivação do acto, permitir a reconstituição do iter cognoscitivo que determinou a adopção de um acto com determinado conteúdo º conforme se depreende da parte final do n.°2 do art.° 125.º do CPA”.
Na jurisprudência do STA, tem-se entendido que “... a fundamentação deve ser entendida como a obrigação de enunciar (de modo directo ou por remissão) os motivos de facto e de direito que determinaram o órgão decisor, esclarecendo o respectivo destinatário das razões que o motivaram e do porquê do sentido decisório, visando proporcionar ao administrado o conhecimento do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto. Deste modo, o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o art.° 487º, nº 2, do Código Civil - possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, por aceitar, ou não, o acto.
Contudo, não deve confundir-se a suficiência da fundamentação com a exactidão ou a validade substancial dos fundamentos invocados. Com efeito, o discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do acto, para o que há-de ser um discurso claro e racional: mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correcção formal do acto, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão” - cf. o recente Acórdão do STA (secção do CT), de 10/09/2014, proferido no proc.°01226/13.
Descendo aos autos e como se diz na sentença recorrida, a Recorrente fica a conhecer que o indeferimento do requerido se alicerçou na circunstância de a sociedade executada não ter demonstrado (comprovado), como era seu ónus, a impossibilidade de constituir garantia bancária, caução ou seguro-caução, conforme ponto E) da informação que sustenta o acto reclamado (cf. matéria vertida no ponto 8 do probatório). E no anterior ponto D) da informação para que remete o despacho decisório reclamado, e cuja leitura conjugada não pode deixar de ser feita, alude-se aos pressupostos legais da dispensa de prestação de garantia e em que se devem traduzir tais pressupostos na interpretação uniformizadora constante do oficio-circulado n.°60.077 de 29/07/2010, da Direcção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários (cf. matéria vertida no ponto 7 do probatório, n.°s 1, 2 e 3 do oficio-circulado, in fine).
Note-se que a fundamentação não é redundante, limitando-se unicamente a reproduzir o que consta do oficio-circulado, como sustenta a Recorrente. Com efeito, nela se concretiza em que falhou a prova oferecida pelo requerente com o pedido: na comprovação da absoluta impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução.
Ora, perante tal fundamentação formal - que nada tem a ver com a correcção dos fundamentos ou fundamentação substantiva - a Recorrente fica habilitada a tomar uma decisão esclarecida de aceitação ou impugnação do acto, que neste último caso, se traduziria em pedir ao tribunal que sindique a suficiência da prova oferecida com o pedido (e julgada insuficiente pela Administração tributária) no preenchimento dos pressupostos legais de que depende o deferimento do pedido de dispensa de garantia». Porto, 30 de Outubro de 2014”