Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00447/11.7BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/24/2023
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário:1.A alteração da matéria de facto só deve ser efetuada pelo Tribunal de 2.ª Instância quando, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância.

2.De acordo com o princípio da utilidade, previsto no artigo 130.º do CPC, o exercício dos poderes de controlo da 2.ª Instância sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa.
(Sumário elaborado pela relatora – art.º 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo:

I. RELATÓRIO
1.1. A ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS DO ... (AM...), pessoa coletiva n.º ..., com sede na rua ..., ..., ... ..., moveu a presente ação administrativa comum contra V..., sociedade de direito francês com sede em 1, cours ..., 92851 ..., em França e M..., S.A., sociedade anónima com sede na ..., Largo ..., ... ..., ..., pedindo a condenação solidária das Rés no pagamento de uma indemnização, parte da qual liquidada em € 8.894.671,71 e, em parte, a liquidar em execução de sentença, acrescida dos respetivos juros à taxa legal, a contar desde a citação, quanto ao montante indemnizatório já liquidado, e a contar da liquidação, quanto à indemnização liquidanda, em ambos casos, até integral pagamento.
Para tanto, alega, em síntese, que :
-em 30 de junho de 1988, adjudicou ao “CONSÓRCIO M.../V.../OTDV/S...” a “Empreitada de Conceção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ...”, infraestrutura esta que adiante se designará por ETRSU.
-tal empreitada era constituída por três partes, sendo a parte 1 (um) designada de “Melhoramentos”, a parte 2 (dois) denominada “Ampliação da capacidade de tratamento” e a parte 3 (três) intitulada “Outras Infra-Estruturas”.
-no dia 22 de julho de 2002 foram consignados ao consórcio os trabalhos referentes à “Ampliação da capacidade de tratamento” da ETRSU.
-as RR. são as atuais responsáveis pelo cumprimento de todas as obrigações assumidas perante a A. em virtude da empreitada em causa e do contrato, designado “Protocolo”, que veio a ser celebrado no dia 25/10/2005.
-estão intimamente relacionadas entre si a parte referente a “Melhoramentos” e a respeitante à “Ampliação da capacidade de tratamento”.
-no essencial tratava-se, quanto a tais partes, da dotação da ETRSU de um terceiro cilindro de fermentação, da ampliação do edifício de afinação primária, da criação de uma nave fechada para maturação do composto e da instalação de sistema ou método de desodorização dos gases resultantes do processo.
-acontece que, em virtude de anomalias várias, não se alcançaram, com os trabalhos levados a cabo quer pela R. V..., quer pelo Consórcio, os resultados e valores previstos no caderno de encargos do concurso em causa.
-quanto ao BRS#3, desde o início se notou que ocorriam frequentes falhas no seu funcionamento, que lhe afetavam substancialmente o rendimento, com as inerentes consequências nas operações subsequentes.
-porque o Consórcio não se mostrou capaz de eliminar tais falhas e, nomeadamente, recusava aceitar que resultassem elas de defeito de conceção ou instalação, antes as imputando à concessionária do sistema de tratamento dos resíduos, foi solicitado à Universidade do Minho que efetuasse vistoria ao BRS#3 e elaborasse relatório respeitante ao seu funcionamento e causas de eventual deficiência dele.
-a vistoria foi efetuada e elaborado o respetivo relatório, do qual resultaram como conclusões que, o BRS#3 não funcionava devidamente, no essencial devido aos seguintes factos: a) anormalmente rápida e acentuada degradação dos rolamentos da componente que o suporta b) menor operabilidade do equipamento e c) deficientes condições de lubrificação do seu sistema de acionamento.
-os problemas consistem, por um lado, na elevada e variável excentricidade do cilindro, conjugada com a carga dos resíduos, e na excessiva rugosidade na superfície de contacto entre os roletes radiais e o cilindro, a qual é causa, da frequente “gripagem” dos rolamentos que integram o sistema de suporte e rotação dos cilindros.
-outra causa das anomalias verificadas é a contaminação, com massa consistente, da caixa redutora de acionamento do BRS#3, nomeadamente o cárter, assim como no rolamento duplo de rolos existente no lado oposto ao cárter, contaminação essa advinda de dois anéis metálicos de vedação, que não cumprem a sua função.

-a isto acresce a contaminação do próprio material lubrificante com elevado teor de partículas metálicas, relativamente ao tempo de funcionamento da caixa redutora, o que é consequência da excessiva rugosidade acima referida, havendo,ainda, a considerar a existência de massa grafitada no lubrificante.
-face ao exposto, a caixa redutora igualmente sofre desgaste anormalmente rápido, o que obriga a efetuar-lhe frequentes intervenções, para mantê-la em funcionamento e, consequente, para manter em funcionamento o próprio BRS#3, com paralisação dele por número de vezes e por tempo superiores ao normal, nomeadamente muito superior ao que ocorre com os outros dois BRS de que a ETRSU está dotada.
-entretanto, outras anomalias foram sendo detetadas, nomeadamente quanto ao funcionamento da Ponte Formadora da Pilha e da Revolvedora Automática de Composto, e, ainda, no tocante à percentagem de humidade a à temperatura do composto.
-estas, e mais especialmente a humidade, encontram-se intimamente ligadas às fases de dilaceração e arejamento no BRS e, na nave de maturação, às dimensões (especialmente altura) da pilha de composto, ao sistema de arejamento forçado dele através do pavimento e ao seu revolvimento.
-a situação descrita obrigou a frequentes intervenções tendentes a manter os equipamentos em funcionamento; afetou negativamente as propriedades do composto final e o rendimento pretendido com a ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ..., o que levou à outorga, em 25/10/2005, de um protocolo que repartiu obrigações e encargos para se alcançar o normal e esperado funcionamento dos maquinismos em discussão nos presentes autos.
-esse protocolo, constitui um contrato pelo qual são assumidas as seguintes obrigações: a) para a A., a de custear a reparação da Ponte, mediante promoção e supervisão da R. V...; b) ainda para a A., a de custear e supervisionar a reparação do sistema de extração de ar das pilhas de composto; c) para a R. V..., a de dirigir e custear a reparação da Revolvedora; d) para o Consórcio, ou seja, ambas as RR., solidariamente, a de, caso não fossem positivos os ensaios subsequentes às obras aludidas nas alíneas anteriores, a de “efetuar e custear tudo o que necessário seja até que se alcancem os valores constantes do Caderno de Encargos”.
-a A. cumpriu integralmente a sua parte no contrato, mas outro tanto não aconteceu com A... e com o Consórcio, que faltaram culposamente ao cumprimento das obrigações resultantes do contrato celebrado, seja na conceção, seja na instalação ou construção do aí previsto para a pretendida ampliação da ETRSU, que implicava (i) colocação de um terceiro cilindro de fermentação, (ii) ampliação do edifício de afinação primária, (iii) criação de uma nave fechada para maturação do composto e (iv) instalação de sistema/método de desodorização dos gases resultantes do processo.
-desse incumprimento resultaram danos, prejuízos alegadamente suportados pela Autora, com referência ao BRS#3, custos relativos a intervenções e manutenções extraordinárias, que ascenderam a € 1.251.286,05, sem prejuízo da necessidade de intervenção futura do BRS#3 para lhe devolver a plena funcionalidade, relegando-se para execução de sentença a determinação do custo dessa intervenção.
-suportou, com referência à nave de maturação, custos com reparações e manutenções, assim como com o recurso a trabalho manual para realização de trabalhos que o equipamento fornecido pelas Rés não executou, como deveria, automaticamente.
Juntou dois Relatórios Técnicos da Universidade do Minho e demais documentos.
1.2. Citada, a Ré “M..., S.A.”, apresentou contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Excecionou a caducidade do direito de ação, alegando, em S..., que na data em que a ação foi proposta (22/02/2011), há muito tinha terminado o prazo (132 dias úteis), previsto no artigo 226.º do RJEOP (Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de Dezembro) para a ação ser proposta, e, bem assim, a inexistência da obrigação, porquanto o putativo direito a que a Autora se arroga na presente lide já nem sequer existia à data da propositura da ação, à luz do disposto no n.º 2 do artigo 208.º do RJEOP.
Defendeu-se ainda por impugnação, começando por impugnar os documentos juntos com a p.i. por se tratar de documentos particulares cuja autoria, assinatura e ou reprodução mecânicas a Ré desconhece, tudo nos termos e para os efeitos previstos no art.º 544.º do CPC e n.º2 do art.º 374.º do C.C.
Aceitou parte dos factos alegados pela Autora nos artigos 1.º,2.º,4.º , 7.º, 8.º a 23.º da p.i., impugnando todos os demais.
Contrapõe que do ponto de vista técnico, os trabalhos da Parte I e da Parte II da empreitada em referência, não estão relacionados entre si.
Quanto à Parte II, relativa à instalação do BRS#3, a consignação dos trabalhos deu-se em 22/07/2002, a receção provisória em 08/11/2004, tendo o prazo de garantia respetivo de dois anos, terminado em 08/11/2006.
Em 25/11/2009 o Consórcio solicitou a receção definitiva a Parte II.
Deduziu pedido reconvencional, em ordem ao cancelamento de duas garantias bancárias, bem como ao pagamento dos juros/encargos financeiros que tem vindo a assumir com a manutenção das garantias bancárias, e respetivos juros de mora, calculados à taxa legal (em vigor) até efetivo e integral reembolso.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
1.3. Citada, a Ré “V...”, apresentou contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Excecionou a caducidade do direito de ação, a caducidade do prazo de garantia, e o cumprimento integral das obrigações contratuais assumidas pela Ré V....
Invocou ainda a impossibilidade de debitar os custos com a reparação dos equipamentos por inobservância do disposto nos artigos 199.º, n.º 4, e 209.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de dezembro.
Defendeu-se por impugnação, alegando, em termos sumários, que não se verificam os pressupostos de que depende a responsabilidade contratual ou cumprimento defeituoso do Contrato de Empreitada e/ou do Protocolo adicional de 25/10/2005.
Aduz que os prejuízos invocados resultaram de uma má utilização, gestão e exploração dos equipamentos, não sendo possível estabelecer qualquer nexo de causalidade entre as obrigações decorrentes do contrato/protocolo e as quantias desembolsadas pela Autora para pagamento das faturas compreendidas nos autos.;
Mais alega a falta de interpelação das Rés para suprir/corrigir/reparar os defeitos invocados.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
1.4.A Autora apresentou réplica – cf. de fls. 608 e ss. dos autos, na qual se pronunciou sobre a matéria de exceção vertida nas contestações, solicitou a retificação de erro material verificado na petição inicial e reduziu o pedido formulado para a quantia de € 5.952.273,75.
Esclareceu que «O protocolo é corolário de intensas, demoradas e laboriosas negociações, sendo, com ele, objetivo da Ré V... que fosse elaborado auto de receção definitiva relativamente à parte da empreitada diretamente visada, a Parte I, e emitida declaração para libertação das garantias por ele prestadas».
Mais referiu que na mesma data em que foi celebrado o protocolo, « foi entregue o auto de receção definitiva, que tem data anterior porque havia necessidade de o ter pronto à data em fosse outorgado o protocolo…» ( ponto 19 da réplica).
Contestou a reconvenção deduzida pela da Ré M....
1.5.Por instrumento de fls. 627 e ss. dos autos, veio a Ré M..., S.A., arguir a nulidade parcial da intitulada réplica/contestação à reconvenção, sustentando que esse articulado foi usado para fim diverso do legalmente previsto.
1.6.A Ré V..., apresentou tréplica – cf. de fls. 646 e ss. dos autos.
1.7.Por instrumento de fls. 667 e ss. dos autos, a Autora veio aclarar a redução do pedido, referindo que a sua réplica não procedeu a qualquer alteração da causa de pedir quanto à Ré “V...”, nem ampliou o pedido, antes o reduziu, precisamente no tocante ao valor liquidado, que passou a ser inferior, deixando inalterado tudo o mais.
Suscitou questão relativa à inadmissibilidade da tréplica apresentada pela Ré “V...” à luz da lei processual.
1.8.Por instrumento de fls. 671 e ss. dos autos, a Ré M... pronunciou-se sobre o instrumento de fls. 667 e ss. dos autos, através do qual a Autora veio aclarar a redução do pedido.
1.9.Foi realizada uma tentativa de conciliação, que não logrou êxito, mantendo as partes as posições que assumiram nos respetivos articulados – cf. acta de fls. 698 e ss. dos autos.
1.10. Realizou-se audiência prévia – cf. actas de fls. 736 e ss., 782 e ss., 810 e ss. e de 823 e ss. dos autos, fixou-se o valor da ação em € 8.894.671,71, o pedido foi reduzido para € 5.952.273,75, determinou-se o desentranhamento de parte dos documentos juntos com a petição inicial, considerando-se não escrito o vertido no instrumento de fls. 627 apresentado pela Ré M..., identificou-se o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.
1.11.Realizada audiência final, foi proferida sentença julgando a ação improcedente, constando da sentença recorrida a seguinte parte decisória:
«Pelo exposto,
I) julga-se a ação totalmente improcedente, absolvendo-se as Rés do pedido.
II) julga-se o pedido reconvencional procedente, condenando-se a AM... a entregar à M... os originais das garantias:
– GB n.º 04/037/12190 de 06/02/2004, no montante de € 131.118,98,
– GB n.º 4/065/12955, de 05/03/2004, no montante de € 3.143,50,
e a indemnizar a Reconvinte por todas as despesas que comprovadamente suportou: € 1.294,54, valor acrescido de juros vincendos até efetivo e integral reembolso
Custas a cargo da Autora – cf. artigo 527.º do CPC e artigo 7.º do RCP.
Registe e notifique.
1.12. Inconformada com a sentença proferida, a Autora interpôs o presente recurso de apelação formulando as seguintes Conclusões:
«1. O Tribunal de Primeira Instância julgou erroneamente improcedente a ação, absolvendo as Rec.das do pedido.
2. A decisão resulta de uma incorreta aplicação e interpretação da matéria factual carreada para os autos, tornando, assim, a sentença materialmente injusta.
3. Na sequência da adjudicação da “Empreitada de Concepção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ... “, as Rec.das obrigaram-se a instalar um bioreator, designado de BRS#3.
4. Desde o início existiram numerosas anomalias no BRS#3, nomeadamente falhas no funcionamento daquele bioreator, que perturbavam o seu rendimento, impedindo-o de alcançar os resultados e valores constantes no caderno de encargos do concurso.
5. Apesar da existência de vários defeitos, as Rec.das não só se mostravam incapazes de eliminar tais defeitos, como se recusavam a aceitar que os mesmos resultassem de defeito de conceção ou instalação.
6. Face à existência de anomalias no BRS#3 foi elaborado um “Protocolo de acordo “, o qual veio a ser outorgado aos 25 de outubro de 2005 entre a Rec.te e as Rec.das.
7. Com a outorga do Protocolo, as Rec.das reconhecem a existência de problemas na Empreitada, tendo, para o efeito, assumido obrigações e como contrapartida seriam libertadas as garantias bancárias que se encontravam na posse da Rec.te.
8. O Protocolo surge como uma forma de ultrapassar obstáculos no cumprimento da “Empreitada de Concepção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ... “ e, consequentemente, teve o intuito de proceder à correção das anomalias e defeitos existentes no BRS#3.
9. O Protocolo consistia num contrato ex novo no qual as partes assumiam um conjunto de obrigações.
10. O presente litígio resume-se a aferir se houve incumprimento das obrigações protocolares por parte das Rec.das.
11. Perante os elementos constantes nos autos e produzidos em julgamento, não pode o Tribunal ad quem alcançar outra conclusão se não a de que a Rec.te observou e cumpriu na íntegra as obrigações que sobre ela impendiam e resultantes do Protocolo, enquanto as Rec.das incumpriram as obrigações a que estavam adstritas, originando avultados prejuízos à aqui Rec.te.
12. Tanto assim é que de acordo com o conteúdo das atas juntas aos autos, nomeadamente da ata n.º 7, como na ata n.º ...0, é feita expressa menção à verificação in loco das condições necessárias ao arranque das obras e início das intervenções por parte das Recorridas.
13. Pelo que daí só se pode concluir que de facto a Rec.te cumpriu as obrigações protocolares e que o incumprimento a que as Rec.das se acometeram nada tem a ver com o aventado incumprimento pela Rec.te.
14. Segundo o teor da ata n.º 7: “O cronograma de todos os trabalhos a realizar, com discriminação das actividades diárias, bem como as fichas técnicas dos materiais a aplicar, solicitados ao consórcio, ainda não foram entregues. Foram verificados, in loco, as condições indicadas como necessárias pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação. O Eng.º AA, afirmou estarem reunidas as referidas condições, nomeadamente, as limpezas dos Quadros Eléctricos e restantes equipamentos, podendo portanto dar-se início às intervenções. “
15. Por sua vez, a ata n.º ...0 alude que, Foram verificadas, in loco, as condições indicadas como necessárias pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação. O Eng.º AA, afirmou estarem reunidas as referidas condições, podendo portanto dar-se início às intervenções. “
16. Destarte, resulta das mencionadas atas que se encontravam cumpridas todas as condições necessárias para que se desse início aos trabalhos, o que redunda, nitidamente, no incumprimento das obrigações protocolares pelas Rec.das e que a Rec.te diligenciou prontamente pelo cumprimento das obrigações que sobre si impendiam.
17. A atas n.º 8 refere que: “A... reafirmou a sua firme intenção de efectuar o restabelecimento operacional da Nova Unidade nos melhores prazos a confirmar com a entrega a breve trecho do Cronograma dos Trabalhos, solicitado pela AM... na Acta nº 6 de 8/3/2006. “
18. A ata nº 9 refere que: A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de Setembro, mesmo na ausência dos programas de trabalhos da parte eléctrica. A documentação referente à parte eléctrica em falta será entregue no decorrer da reparação. “
19. “A S... alertou os presente que o plano de trabalhos já por diversas vezes solicitado ainda não foi entregue.“
20. A ata n.º ...1 refere que: “Contrariando também o que tinha ficado acordado anteriormente, A... informou os presentes que LX..., dará início aos trabalhos apenas no dia 26 de Setembro de 2006 pelas 9h00m.“
“A AM... informa A... que ainda não existe cronograma de trabalhos de LX... (mecânica da RAC), bem como da TCPI (eletricidade e controlo). “
“A AM... informa A... que os sucessivos atrasos, claramente da responsabilidade pela V..., causam transtornos tanto ao normal funcionamento da ETRSU como à AM..., facto que A... concorda, acrescentando que a remoção do composto poderia ter sido efectuada mais tarde. “ (...)
“A S... disponibilizou-se a inventariar o tipo e quantidade de material necessário para a execução da obra de reparação da ponte formadora de pilha, de modo a tornar mais célere o inicio a obra, oferta esta que A... agradece mas informa não necessitar. “
21. Assim, resulta, inequivocamente, do teor das atas, o incumprimento das obrigações das Rec.das, cuja responsabilidade é de imputar exclusivamente àquelas e não à Rec.te.
22. Alegar o contrário seria agir em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, porquanto as mencionadas atas obtiveram a aceitação expressa do Consórcio e mereceram o aval do representante da entidade adjudicatória V... – Eng.º AA.
23. Mais resulta do teor das atas que, o cumprimento por parte da aqui Rec.te do clausulado no n.º 2 da Cláusula Única do Protocolo, que consistia na AM... proceder, a expensas suas e sob sua direção, à reparação do Sistema de Extração de Ar das Pilhas de Composto – o que de facto o fez e foi confirmado pelas Rec.das.
24. Logo, só se pode concluir que a Rec.te cumpriu com tal obrigação.
25. Concomitantemente, a ata n.º 7 menciona estarem verificadas e reunidas, in loco, as condições indicadas como necessárias pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação, tendo tal informação sido comprovada e atestada pelo Eng. AA.
26. Ante o exposto, a Rec.te assegurou o cumprimento das suas obrigações protocolares, esmorecendo o argumento de que incumprimento das obrigações pelas Rec.das decorreu do incumprimento protocolar da Rec.te.
27. Com efeito, muito mal andou o Tribunal recorrido em julgar a ação improcedente, pois não só resulta das atas assinadas pelas Rec.das que, a Rec.te cumpriu as obrigações que sobre si recaiam e, consequentemente, se encontravam verificadas in loco as condições necessárias ao prosseguimento dos trabalhos, como deriva, igualmente das respetivas contestações o não cumprimento das obrigações pelas Rec.das.
28. Na formação da sua convicção o Tribunal a quo desvirtuou prova documental de elevado relevo para a boa composição do litígio, nomeadamente as referidas Atas.
29. O Tribunal a quo deu como erradamente provada matéria factual constantes das atas, pois não releva toda a informação vertida em tais elementos probatórios, apenas se limitando a considerar metade da informação nelas veiculada.
30. Atendendo ao conteúdo vertido na ata n.º 7, o Tribunal recorrido dá como facto provado no ponto TT que, “Em Março de 2006, os quadros eléctricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos. “.
31. Assim sendo, o Tribunal recorrido deveria ter dado como provado que: - “Em Março de 2006, os quadros eléctricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos, tendo sido verificados, in loco, as condições indicadas como necessárias pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação. “
32. O Tribunal a quo deu como erroneamente provada a factualidade vertida no ponto VV, uma vez que tal facto não se reporta à totalidade da informação contida na ata n.º 9 (28/08/2006), porquanto desconsiderou o seguinte excerto: “A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de Setembro, mesmo na ausência dos programas de trabalhos da parte eléctrica. “
33. Considerando a integralidade do conteúdo da ata n.º 9, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que: “Em Agosto de 2006, não obstante a ausência dos programas de trabalhos da parte elétrica, A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de setembro. “
34. Também foi insuficientemente dado como provado a matéria factual resultante da ata n.º ...0, pois o Tribunal a quo limitou-se a dar como provado no ponto XX que, “Foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação. “.
35. Todavia deveria ter sido dado como provado que, “Em Setembro de 2006, foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação, encontrando-se reunidas as condições necessárias para que o Consórcio desse início às intervenções. “
36. Acresce, ainda, que, o Tribunal recorrido deu como inadequadamente provada informação resultante da ata n.º ...1, porquanto somente considerou provado no ponto BBB., uma vez que desconsiderou que na ata é mencionado que os atrasos dos trabalhos eram da responsabilidade da V....
37. Ante o exposto sempre o Tribunal a quo deveria ter sido dado como provado que: “Em Setembro de 2006, verificava-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TPCI (electricidade e controlo), quer a cargo da V..., sendo que os sucessivos atrasos dos trabalhos a cargo da V... eram da sua responsabilidade e causaram transtornos tanto ao normal funcionamento da ETRSU como à AM... “.
38. Além dos factos erroneamente dados como provados, sempre o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que “A AM... cumpriu as obrigações constantes do protocolo “ e que “O incumprimento das obrigações constantes do protocolo resultou da responsabilidade exclusiva da V... e do Consórcio “, pelo que tal factualidade deverá ser acrescentada à matéria dada como provada.
39. No mais, o Tribunal recorrido considerou inadequadamente como não provados os seguintes factos:
«1. Quanto ao BRS#3, a Autora suportou despesas para diminuir a excentricidade do cilindro 3 ou pela reparação da caixa redutora 445H, ou despesas com a substituição de componentes decorrentes de solicitações mecânicas superiores às previstas no projecto, custos esses que ascenderam a € 1.251.286,05.
2. O BRS#3 continua a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.
3. No respeitante à nave de maturação, a Autora suportou custos com reparações ou manutenções extraordinárias e com a substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efectuado automaticamente, custos esses na ordem dos € 5.952.273,75.».
40. No bom dos rigores e atenta os elementos probatórios carreados para os autos, o Tribunal deveria ter dado tais factos como provados.
41. Resulta do depoimento prestado pela testemunha Engenheira BB a existência de excentricidades no bioreator.
42. Resulta do relatório junto aos autos e elaborado pela Universidade do Minho, cujo teor aqui se dá por reproduzido, a existência de excentricidade no cilindro 3.
43. A Recorrente teve de encetar diligências para fazer face a tal situação, o que comportou os custos que se encontram vertidos nas faturas também juntas oportunamente aos autos no montante de €1.251.286,05.
44. O Tribunal recorrido deu incorretamente como facto não provado que, “O incumprimento contratual originou prejuízos para a Autora no montante de €5.952.273,75, referentes aos custos com intervenções e manutenções extraordinárias decorrentes das anomalias do BRS#3.”.
45. Deveria, ao invés, ter dado tal facto como provado.
46. Estes danos, para além das facturas existentes nos autos, encontram fundamento no depoimento prestado pela Testemunha Engenheiro CC, uma vez que no seu depoimento é abordada as despesas e prejuízos que a AM... teve de suportar e dele resulta conhecimento direto sobre as faturas e prejuízos causados.
47. Deverá também ser atendido o depoimento da testemunha DD quanto à definição de custos incorridos.
48. Parece-nos claro do depoimento das testemunhas a existência de prejuízos suportados pela Autora inerentes aos custos com intervenções e manutenções extraordinárias decorrentes das anomalias do BRS#3.
49. O Tribunal a quo deu como erroneamente não provado que “Em virtude do incumprimento contratual pela V... e pelo Consórcio, o BRS#3 continua a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.”.
50. Tal facto deveria ser dado, ao invés, como provado.
51. O protocolo é um contrato celebrado entre Rec.te e Rec.das, ao abrigo da sua liberdade contratual (artigo 405º do Código Civil).
52. Os contratos devem ser integral e pontualmente cumpridos (artigo 406º do CC).
53. O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor (artigo 798º do C. Civil).
54. In casu, esse prejuízo reflecte-se nas facturas juntas aos autos e que correspondem a todos os custos tidos pela Rec.te e acima descritos.
55. Ao não atender à responsabilização das Rés nos termos indicados, violou o Tribunal de que se recorre as disposições legais acima indicadas.
TERMOS EM QUE
pelo exposto, pelo mérito dos autos e pelo que doutamente será suprido deve ao presente recurso ser dado provimento, revogando-se a douta decisão recorrida, julgando-se procedente a ação e, consequentemente, condenando-se as Recorridas no pedido e absolvendo a Recorrente do pedido reconvencional, assim se fazendo
J U S T I Ç A !»
1.13. A Recorrida V..., SAS, contra-alegou, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
«A. Através do presente recurso, a Recorrente procura proceder à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, identificando i) factos erroneamente dados como provados, ii) factos que deveriam ter sido dados como provados e iii) os factos erroneamente dados como não provados, pese embora se limite a proceder a meros aditamentos aos factos provados, sem especificar todos os factos contrários que considera que não deveriam constar da matéria de facto dada como provada.
B. A Recorrente não indica, de forma completa, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, porquanto não extrai das suas alegações quaisquer consequências para a restante matéria de facto fixada na sentença, incumprindo manifestamente a exigência constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
C. Pretende a Recorrente ver dado como provado que “Em Setembro de 2006, verificava-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TPCI (eletricidade e controlo), quer a cargo da V..., sendo que os sucessivos atrasos dos trabalhos a cargo da V... eram da sua responsabilidade e causaram transtornos tanto ao normal funcionamento da ETRSU como à AM...” (cf. pág. 10 das alegações de recurso); todavia, não impugna factos constantes da matéria de facto provada que entram em contradição com os factos que pretende aditar ao probatório, designadamente, que “em 6/3/2007, a AM... ainda não tinha adjudicado os trabalhos de electricidade e controle para proceder às reparações das duas Pontes simultaneamente” (cf. pág. 33 da sentença, facto provado MMM) ou que “realizados os trabalhos que não se encontravam dependentes de trabalhos a executar pela Autora, a V... deixou de ter condições – a partir de finais de 2007 – para continuar a proceder ao trabalho de reparação mecânica dos equipamentos” (cf. pág. 36 da sentença, facto provado SSS).
D. Da leitura das alegações da Recorrente resulta ainda que esta nem sempre justifica a impugnação da matéria de facto com recurso aos concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, incumprindo manifestamente a exigência constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
E. Considera a Recorrente que “no respeitante à nave de maturação, a Autora suportou custos com reparações ou manutenções extraordinárias e com a substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efectuado automaticamente, custos esses na ordem dos € 5.952.273,75” (cf. pág. 15 das alegações de recurso) sem, contudo, apresentar qualquer justificação ou meio probatório que determinasse que este facto deveria ter sido dado como provado.
F. O incumprimento deste ónus de impugnação especificada deve dar lugar à rejeição da impugnação da matéria de facto (cf., por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de fevereiro de 2022, Processo n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1).
G. A Recorrente não distingue as obrigações a que as Recorridas se encontravam adstritas por força do Protocolo celebrado no dia 25 de outubro de 2005 e as obrigações relacionadas com o BRS#3, decorrentes da Parte 2 da empreitada. O BRS#3 não foi coberto pelo âmbito do Protocolo e, para além disso, não foi alegada e comprovada qualquer violação de obrigações assumidas no âmbito do período de garantia da Parte 2 da empreitada.
H. Tal como é configurado o objeto do recurso pela Recorrente, está em causa apenas o incumprimento das obrigações do Protocolo, o que determina, necessariamente, que a Recorrente não tenha impugnado a matéria de facto da sentença recorrida que se reconduz à Parte 2 da empreitada (BRS#3) e, por efeito consequente, tenha reduzido o pedido e a causa de pedir, sendo que o recurso aparece agora circunscrito e delimitado ao alegado incumprimento pela Recorrida e pelo Consórcio das obrigações emergentes do Protocolo.
I. As atas juntas ao processo pela Recorrente tratam-se de documentos reportados a um momento anterior àquele a que diziam respeito muitos dos documentos juntos pela Recorrida na sua contestação – como, a título de exemplo, as comunicações enviadas pela Recorrida à Recorrente que foram consideradas na sentença recorrida (cf., págs. 22 e 36 da sentença, factos provados N.2.g) e RRR) – para além de constituírem um dos diversos meios de prova trazidos a este processo devendo, portanto, ser interpretados dentro do contexto em que as mesmos se inserem, conforme acertadamente fez o tribunal a quo.
J. As condições para que a Recorrida pudesse executar os trabalhos que lhe cabiam não se encontravam verificadas apenas e tão só na medida em que Recorrente não levou executou os trabalhos antecedentes que se encontravam a seu cargo e, como tal, a Recorrida cumpriu com todas as obrigações a que estava vinculada nos termos do Protocolo, na medida das suas possibilidades concretas em face da conduta omissiva adotada pela Recorrente (cf., a título de exemplo, págs. 33, 34 e 36 da sentença, factos provados LLL, MMM e SSS).
K. Se a adjudicação de trabalhos a cargo da Recorrente se encontrava pendente – conforme resulta, também, de todas as comunicações, posteriores às atas, enviadas pela Recorrida à Recorrente e, nomeadamente, da carta enviada no dia 22 de outubro de 2007 –, então resulta claro que o tribunal a quo não poderia ter dado como provado o facto de que se encontravam reunidas todas as condições indicadas como necessárias para arranque das obras de restabelecimento de operação (cf. a título de exemplo, págs. 29 e 36 da sentença, factos provados VV e RRR).
L. Não se compreende sequer qual a relevância probatória pretendida pela Recorrente em dar como provado que “A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de setembro” na medida em que, conforme resulta da matéria de facto provado, a Recorrida efetivamente procedeu a trabalhos de reparação da Revolvedora Automática de Composto (cf., a título de exemplo, págs. 36 e 37 da sentença, factos provados RRR, SSS e TTT).
M. Não tendo a Recorrente logrado demonstrar, através de outros meios de prova, o cumprimento das suas obrigações protocolares – entre as quais, a adjudicação e execução dos trabalhos que lhe cabiam, condição essencial para que a Recorrida pudesse proceder à execução dos trabalhos a seu cargo – andou bem o tribunal a quo a não dar como provado que os atrasos em causa eram imputáveis à Recorrida.
N. A Recorrente inviabilizou pela sua conduta que a Recorrida desse integral cumprimento às obrigações que para a mesma decorriam do Protocolo, porquanto em tudo o que desta última dependia exclusivamente, o dito Protocolo foi escrupulosamente respeitado e observado (cf., a título de exemplo, págs. 29 e 36 da sentença, factos provados NN, OO, PP, VV, RRR e SSS), pelo que os depoimentos transcritos se revelam manifestamente insuficientes para demonstrar o alegado incumprimento da Recorrida.
O. Não reveste qualquer utilidade a demonstração da existência de uma excentricidade no cilindro, porquanto as faturas juntas aos autos pela Recorrente não comprovam, de modo algum, que os custos em que a Recorrente alegadamente incorreu com o BRS#3 estivessem relacionados com a reparação deste bioreator e, menos ainda, com a reparação dessa excentricidade.
P. As faturas e elementos justificativos juntos aos autos nem sequer fizeram alusão a quaisquer custos emergentes de reparações ou operações de manutenção levadas a cabo em virtude de deficiências inerentes ao equipamento instalado pela Recorrida e pelo Consórcio, não tendo sido sequer carreada para o processo qualquer prova documental e testemunhal quanto à existência de danos e prejuízos incorridos pela Autora (cf. pág. 43 da sentença).
Q. A sentença recorrida considerou provado que as faturas constantes dos autos não seriam imputáveis ou decorrentes de incumprimentos das Recorridas, sendo que os depoimentos das testemunhas nos autos corroboraram que as faturas apresentadas nunca foram sequer informadas à V... e ao Consórcio (cf., a título de exemplo, págs. 81 e 82 da sentença), matéria de facto que nem sequer foi objeto de impugnação por parte da Recorrente.
R. Em face do exposto, não resta senão considerar que muito bem andou a sentença recorrida, que, com elevado rigor técnico-jurídico, fez uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos que foram dados por provados, ao inequivocamente julgar a ação totalmente improcedente.
SUBSIDIARIAMENTE:
S. Caso o tribunal ad quem venha, por qualquer motivo, revogar a decisão recorrida (o que não se concede e apenas se admite por mero dever de patrocínio), desde já se requer, ao abrigo do disposto no n.º 2 do disposto no artigo 149.º do CPTA, que sejam apreciadas todas as demais questões suscitadas em 1.ª instância pela Recorrida e cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução dada ao acórdão recorrido.
NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE DOUTAMENTE SERÃO SUPRIDOS, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER REJEITADO E, SE ASSIM NÃO FOR, DEVERÁ SER JULGADO TOTALMENTE IMPROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA,
SUBSIDIARIAMENTE, AO ABRIGO DO DISPOSTO NO N.º 2 DO ARTIGO 149.º DO CPTA, DEVE O PRESENTE TRIBUNAL CONHECER DAS QUESTÕES QUE O TRIBUNAL RECORRIDO NÃO APRECIOU, ATINENTES AO MÉRITO DA CAUSA.»
1.14. A Recorrida M..., contra-alegou formulando as seguintes Conclusões:
«A.) a forma, algo caótica e sem cuidar da necessária individualização dos diferentes aspetos a considerar, como se encontram elaboradas as alegações em resposta, dificulta sobremaneira a tomada de posição circunstanciada acerca do que ali se pretende sustentar não dando sequer cumprimento ao ditame processual atinente – art.º 640.º do CPC.
B.) o objeto do recurso (in casu de apelação) é identificado e circunscrito pelo teor das respetivas conclusões, sendo que, como facilmente se alcança, nenhuma razão assiste à recorrente na pretensão que ora pretende sustentar.
C.) no que diz respeito ao vertido nas conclusões 32.º a 37.º (sempre inclusive) a recorrente pretende, genericamente o mesmo, a saber: que na sentença recorrida deveria ter sido dado, complementarmente, como provado, por constar do teor das atas n.ºs 7, 9, 10 e 11, que “se encontravam reunidas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação.”
D.) Sucede que, por um lado e ainda que tal afirmação só pudesse reportar-se à V... (e não ao consórcio), ao contrário do que pretende a recorrente não se trata de matéria que o tribunal a quo não tenha atentado devidamente (apurando a valorizando um vasto conjunto de factos a respeito, como se verá), tendo, todavia, concluído – e bem-de forma diversa,
E.) desde logo porque, como bem se alcança, não está em causa que os trabalhos e o cumprimento das obrigações assumidas, no dito “Protocolo”, pela AM... e pela V... se tenham iniciado mas sim que não se tenham concluído e que, em qualquer caso e no que se refere às obrigações da V..., tal conclusão se tenha tornado impossível por causa imputável à AM....
F.) O que vale por dizer que, bem ao inverso do pretendido pela recorrente, a pretendida alteração da matéria de facto (complementando-a com a solicitada referência às “condições para iniciar o arranque dos trabalhos” da V...) revelar-se-ia, para além de desnecessária (a sentença recorrida deu como provado que tais trabalhos se iniciaram), redundante (não estando tal circunstancia em causa nunca a sua menção expressa alteraria o que quer que seja no sentido da decisão tomada.
G.) O que se demonstra totalmente inaceitável por absoluta falta de fundamento racional e fáctico, é a conclusão que, de forma totalmente abusiva e infundada, daí pretende extrair a recorrente no que se refere a um putativo cumprimento, por parte da AM... de “...todas as condições necessárias para que se desse início aos trabalhos, o que redunda, nitidamente, no incumprimento das obrigações protocolares pelas Rec.das e que a Rec.te diligenciou prontamente pelo cumprimento das obrigações que sobre si impediam.”.
H.) Apetece perguntar de onde retirou a A. tal conclusão, quando são abundantes os factos dados como provados – que a mesma não impugna no presente recurso – que atestam precisamente o inverso (cfr. pontos WW., XX., YY., ZZ., BBB.,) CCC.), DDD), EEE.), FFF), GGG.), HHH.), III), JJJ.), KKK.), LLL.), MMM.), PPP.), QQQ.), RRR.), SSS.), TTT.), VVV.), WWW.), XXX.) e MMMM.).
I.) Perante tão clara e detalhada facticidade dada como provada – repete-se, não impugnada pela A.– não valerá a pena glosar mais a falta de fundamento, relevância e, até, de sentido lógico dedutiva das alterações (“complementos”...), requeridas pela recorrente em sede de impugnação da matéria de facto.
J.) O mesmo, aliás, pode dizer-se do pretendido nas conclusões 39.º a 50.º (inclusive) das alegações em resposta, a propósito da matéria da (não) comprovação dos putativos prejuízos reclamados pela A..
L.) É que, para além do “naufrágio” total da prova a produzir pela A. (mesmo atenta a “segunda oportunidade” concedida pelo Digníssimo Tribunal a quo em relação às inenarráveis faturas invocadas pela recorrente), a AM... insiste em reportar para putativos encargos e prejuízos (presentes e futuros, no caso do BRS3) que por nenhuma forma suportou nos autos (nem poderia suportar atendendo a que se trata de uma infraestrutura que, confessadamente, lhe não lhe pertence desde 2009 (!) – cfr. ponto GGGG) dos factos provados.
M.) Nem se apercebendo sequer da contradição patente em que incorre ao pretender, agora, sustentar, em simultâneo, que está em causa “apenas” o cumprimento do Protocolo sem se coibir de invocar alegados prejuízos que não estão (não podem estar) em causa se assim for, (como é), como é o caso dos que se referem ao BRS3....
N.) sem se coibir sequer de reportar para depoimentos de testemunhas que nenhum conhecimento tiveram do vertido no dito Protocolo... (como é o caso da Eng. BB), ou que expressamente se referiram em exclusivo ao que terão ouvido dizer, por não lidarem diretamente com tais matérias (como é caso da testemunha DD),
O.) passando pelo depoimento da testemunha Eng. CC que, para além do mais, pura e simplesmente não disse o que a A. lhe pretende imputar (mesmo nas transcrições constantes das alegações de apelação).
P.) É que, conforme o refere a douta sentença apelada, “Do depoimento Secretário-Geral da AM... resultou para o Tribunal que o BRS#3 não se encontrava integrado na concessão da exploração entregue à S..., Lda. Concatenado o depoimento desta Testemunha com a descrição das faturas de fls. 38 e ss. dos autos resulta que os valores faturados respeitavam a custos incorridos mensalmente com a mão-de-obra, energia, seguros, tratamento de lixiviados – que foram sendo custeados pela S... para a exploração do BRS#3 – cf. documentos de fls. 38 a 111 dos autos. Na PEN USB junta aos autos constam os documentos comprovativos de despesas, nomeadamente, com cedência de mão de obra, equipamento (camião, empilhador, pá carregadora), energia, seguros, tratamento lixiviados, manutenção – lubrificantes, faturados pela S.../S... à AM... pela “gestão provisória da Nova Unidade” e/ou pela “exploração do BRS3”. Destaca-se que desses documentos comprovativos de despesas não se deteta diferença significativa no número de horas de funcionamento da linha 1, linha 2 e linha 3. Resultam – isso sim – custos com aluguer de pá carregadora para substituição da RAC durante as imobilizações desta, mas não se consegue distinguir, com segurança, essa despesa e outras referentes à Pá Carregadora 962G e Volvo L110F, matéria sobre a qual a prova testemunhal nada acrescentou.” – destacado a bold da lavra da alegante.
Q.) Resulta de tudo quanto se deixou exposto supra, a respeito da impugnação da matéria de facto e do subsequente pedido de alteração do juízo probatório formulado na Douta sentença recorrida, formulado pela A. recorrente, que o mesmo se encontra votado à improcedência, o que se requer e confia ver decidido.
Em qualquer caso, e sempre sem prescindir, também por um conjunto de outras razões e fundamentos, de facto e de direito, deva o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, a saber:
R.) De acordo com o exarado nos pontos N.1c) a pag.14 da sentença recorrida, ponto N.2.c) a pag.16, ponto N.2.g) a pag.s 22 e ponto HHHH) a pag. 38, pontos N.2.h) e N.2.i)a pag.s 22 e ponto N.2.j) a pag.s 23, todos os factos provados da sentença recorrida, foi automaticamente desencadeado o mecanismo legal previsto nos art.º 208.º e, ex vi este, no n.º 5 do art.º 198.º, ambos do supra identificado RJEOP aqui aplicável e que se traduz no facto de a obra se considerar recebida, para todos os devidos efeitos, no termo do prazo de 22 (vinte e dois) dias úteis subsequentes ao pedido que o empreiteiro formulou no sentido da realização da vistoria com vista à Recepção Definitiva.
S.) O que Vale Por dizer que de há muito teve lugar a Recepção Definitiva e sem quaisquer reservas da totalidade dos trabalhos que constituíram quer a Parte 1 quer Parte 2 da empreitada dos autos, pelo que, fosse como fosse, só por esta circunstância sempre seria de concluir que o putativo direito a que a Autora se arroga já nem sequer existia à data da propositura da ação, à luz do disposto no n.º 2 do art.º 208.º do RJEOP.
T.) Isso mesmo o atestou e decidiu – neste segmento sem qualquer tipo de impugnação ou reparo por parte da recorrente – a douta sentença apelada – a pag.s 72 e ss da mesma – da qual se destacam, pela sua clareza e relevância as seguintes passagens:
“O artigo 208.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de dezembro, ditava que, findo o prazo de garantia e por iniciativa do dono da obra ou a pedido do empreiteiro, se procedesse a nova vistoria de todos os trabalhos de empreitada para efeito de receção definitiva.
A AM... não cumpriu com esta obrigação a que correspondia um direito do Consórcio.
(...)
O caso que nos ocupa apresenta a seguinte singularidade: veio uma Entidade Pública solicitar a intervenção do Tribunal com vista a condenar o empreiteiro por eventuais deficiências que, por omissão dessa mesma Entidade Pública, não foram especificadas no momento próprio, anterior à via judicial, por quem tinha obrigação de possuir conhecimentos técnicos para o efeito ou assessorado por especialistas na matéria.
Esta omissão violadora do artigo 208.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de Dezembro, exclusivamente imputável à AM..., que não dirigiu o procedimento segundo a legalidade, não só violou o direito de pronuncia do empreiteiro sobre o tema existência de deficiências, como conduziu à falta de notificação do empreiteiro para as reparações ou modificações necessárias, com fixação de um prazo para esse efeito, impede hoje o Tribunal de avançar com qualquer pronúncia sobre responsabilidade contratual por deficiências de execução, na medida em que desconhece se as deficiências ou vícios apontados nos Relatórios Técnicos, elaborados e subscritos por docentes da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, são imputáveis ao empreiteiro e/ou se não constituem depreciação normal consequente de uso (ou mau uso) dos maquinismos por quem geria e explorava. – destaque a bold da lavra da ora alegante.
U.) Perante isto, e para além de tudo mais que se deixou já expresso a este respeito (em particular o facto de a A. ter deixado, 2009, de ser concessionaria da estação de tratamento em causa, passando a mesma – juntamente com o BRS3– a ser detida pela “R...” – cfr. ponto GGGG) dos factos provados), torna-se incompreensível que a recorrente continue a brandir pretensões que se prendem com o peticionado e reclamado a propósito do dito BRS3, passando, concomitantemente, a sustentar que estaria agora unicamente em causa o cumprimento do “Protocolo” como contrato ex novo,
V.) Sendo certo que, como bem anota a sentença recorrida, “...o Protocolo não impôs qualquer obrigação à V... relacionada com o BRS3 – cfr. pag. 47 da decisão apelada.
Ainda sem prescindir, sempre se dirá, por dever de ofício, o seguinte:
W.) Por mera conveniência processual a A. retomou nas suas alegações em resposta uma tese (que constitui uma entorse ao por si vertido na p.i.) no sentido de o “Protocolo” outorgado em 25.10.2005 deter “autonomia jurídica e independência” “devendo ser interpretado e executado de forma separada do aludido contrato” de empreitada.
X.) ora, para além de se revelar impossível – e inclusivamente violador das regras de boa-fé processual – vir, em 2011, reclamar a realização (ou responsabilização indemnizatória) por uma intervenção futura num equipamento – BRS3 – que a A. já não detém... desde 2009, por ter deixado de ser a Concessionária da estação de tratamento de resíduos em causa nos autos,
Z.) revela-se inusitado que a recorrente desenvolva, nas suas alegações, toda uma tese de responsabilização das rés (em concreto da ré V...), por força do “Protocolo”, “..por não procederem ao arranque das obras de restabelecimento do BRS3, o que causou avultados prejuízos à Autora”.
AA.) Sucede que, como pode confirmar-se da mera leitura atenta do teor do dito Protocolo, no mesmo pura a simplesmente não estão em causa quaisquer intervenções no BRS3 (!)
BB.) Na ânsia de “disparar em todas as direções” a AM... vem, nas suas alegações, confundir o que se não confunde, pretendendo agora que o dito “Protocolo” visou também corrigir defeitos existentes no “BRS3”, que integrava a Parte 2 da empreitada.
CC.) Todavia, o Protocolo em causa apenas teve por objeto a Parte 1 da empreitada, conforme expressamente previsto no Considerando 5.º o mesmo documento.
DD.) de forma, uma vez mais, a raiar o incompreensível, a recorrente vem lançar a confusão ao pretender alegar que o “Protocolo” (referente à parte Parte 1 da empreitada, de há muito recebida definitivamente) vincularia a ré V... a cumprir as obrigações inerentes à execução do “BRS3” (que integra a parte Parte 2 da obra, também ela, como se viu já, de há muito recebida definitivamente), em clara contradição com os próprios termos do sobredito Protocolo. Só que o BRS3 não foi, assim e nesta tese, coberto pelo âmbito das obrigações fixadas no “Protocolo”!
EE.) Acresce que, com idêntica ligeireza pretende a A. estabelecer qualquer tipo de “nexo de causalidade” entre os prejuízos por si invocados (desde logo sem qualquer preocupação de descrição ou caracterização minimamente concretas) e um “descritivo geral” feito constar de algumas das faturas juntas aos autos, em nada explicitado (talvez pelo contrário) pelos supostos “documentos de suporte” daquelas faturas, posteriormente juntos aos autos por solicitação do tribunal a quo.
FF.) É dizer: para além de se reportar a putativos direitos cujo exercício sempre se encontraria caducado, a A. não prova a existência da obrigação cuja violação alega; nem o facto concreto em que tal violação de consubstanciaria; nem, por fim, a verificação e, menos ainda, a comprovação de quaisquer prejuízos dai decorrentes.
GG.) Por outro lado, e sem prejuízo de a co-ré entender que a A. não fez, de todo, prova, também em relação à co-Ré V..., da verificação dos legais requisitos e pressupostos dos direitos indemnizatórios reclamados, (juízo integralmente confirmado pela douta sentença apelada – cfr., por exemplo, o vertido nos pontos K), L), Z), AA), BB), DD), EE), SSS), TTT) e UUU) da matéria dada por provada na douta sentença recorrida, todos eles aceites e não impugnados pela recorrente),
HH.) uma coisa, fosse como fosse, é certa: mesma na fantasiosa tese da A. nunca a M... poderia ser responsabilizada por qualquer um dos alegados prejuízos reclamados nos autos por força do, também alegado, incumprimento do prevista no “Protocolo” de 25.10.2005, designadamente nos seus pontos “4.” e “5.”.
II.) Se, como agora pretende a recorrente, a fonte de tal responsabilização forem as supostas obrigações que resultariam assumidas pelo consórcio nos termos vertidos nos pontos “4.” e “5.” do “Protocolo”, nunca se encontraram reunidas as condições para ser imputada – ainda que indiretamente e a título de responsabilização solidária – qualquer responsabilidade à M... (como, aliás e significativamente, nunca o foi),
JJ.) seja por os trabalhos prévios a realizar pela AM... não terem sido terminados (impossibilitando que A... pudesse continuar o trabalho que lhe competia – cfr. ponto SSS) da matéria de facto dada como provada na sentença apelada – a pag.s 36 da mesma), seja, fosse como fosse, por, em momento anterior à entrada da petição inicial em juízo, a AM... ter retirado a “revolvedora automática da nave” – cfr. ponto MMMM) da matéria de facto dada como provada na sentença apelada – a pag.s 42 da mesma),
LL.) seja, por fim e naturalmente, por a AM... não ser, já desde 2009, a concessionária da estação de tratamento de resíduos em causa nos autos, não podendo, por isso, exigir que sejam feitas intervenções (nem testes ou ensaios!) numa infraestrutura que de há muito não lhe pertence – cfr. ponto GGGG) da matéria de facto dada como provada na sentença apelada – a pag.s 38 da mesma),
MM.) Por último, por se encontrarem comprovados nos autos os pressupostos legais do direito invocado, pela M..., em sede de reconvenção (cfr. pontos IIII), JJJJ), KKKK) e NNNN) da relação de factos provados constante da douta sentença recorrida a pag.s e 38 e ss da mesma), foi tal pedido julgado totalmente procedente, condenando-se, em sequência, a “...AM... a entregar à M... os originais das garantias: – GB n.º 04/037/12190 de 06/02/2004, no montante de € 131.118,98, – GB n.º 4/065/12955, de 05/03/2004, no montante de € 3.143,50, e a indemnizar a Reconvinte por todas as despesas que comprovadamente suportou: € 1.294,54, valor acrescido de juros vincendos até efetivo e integral reembolso”.
NN.) Sobre este segmento da decisão recorrida e sobre a facticidade e fundamentos de Direito em que a mesma se baseou, a A. recorrente nada refere (seja a título de impugnação da matéria de facto seja a respeito da aplicação do Direito),
OO.) razão pela qual – e não sendo sequer condição da sua procedência o destino do presente recurso – só pode considerar-se como transitado em julgado esse segmento da decisão recorrida, relativo ao pedido reconvencional, que se encontra, por isso, consolidado na ordem jurídica,
PP.) o que se requer e confia ver decidido conjuntamente, bem se alcança, com a confirmação integral da douta sentença recorrida, que nenhuma censura merece, julgando-se, assim, totalmente improcedente, por não provado, o presente recurso de apelação interposto pela A..
*****
Termos em que,
e nos melhores de Direito doutamente supridos por V. Ex.ªs:
deve o presente recurso de apelação ser julgado totalmente improcedente, por não provado, pelas razões de facto e de direito vindas de expender supra, confirmando-se integralmente a Douta Sentença recorrida, com todas as legais consequências.
Assim se fazendo,
Justiça.»
1.15.O Ministério Público junto deste TCA Norte, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º1 do CPTA, não se pronunciou sobre o mérito do recurso.
1.16. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1.Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
Muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635º, nº 3, do C.P.C. de 2013), esse objeto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 4 do mesmo art.º 635º).
Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.
Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.
Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, nº 3, do C.P.C. de 2013) – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras (art. 608º, nº 2, do C.P.C. de 2013, ex vi do art. 663º, nº 2, do mesmo diploma).
No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pela Autora, ora Apelante, que o objeto da presente apelação está circunscrito às seguintes questões:
b.1.saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto julgada provada nas alíneas TT, VV, XX e BBB do elenco dos factos assentes;
b.2.saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento por não levado aos factos assentes que: (i) “A AM... cumpriu as obrigações constantes do protocolo “; (ii) “O incumprimento das obrigações constantes do protocolo resultou da responsabilidade exclusiva da V... e do Consórcio “, e se, na positiva, essa factualidade deverá ser acrescentada à matéria dada como provada.
b.3. saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por dado como não provada a matéria que consta dos pontos 1, 2 e 3 dos factos não provados;
b.4.- saber se, em caso de procedência da impugnação do julgamento da matéria de facto operado pela Autora, a sentença recorrida padece de erro de direito ao ter julgado improcedente a ação e procedente a reconvenção.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. A 1.ª Instância deu como assentes os seguintes factos:
A. No início dos anos 90, entrou em funcionamento a Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos Urbanos [ETRSU] do ... com uma capacidade de 240 toneladas/dia – por acordo.
B. Em 30/6/1998, e na sequência de um concurso público internacional, a Autora adjudicou ao “C.../V.../OTDV/S...” a “Empreitada de Concepção/ Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ...”, infraestrutura esta que adiante se designará por ETRSU – por acordo; cf. de fls. 437 a 529; de fls. 366 e ss. dos autos.
C. O concurso público visava:
– tratamento de odores: resolver o problema dos odores existentes nas redondezas da estação e devidos à exploração da mesma;
– melhorar a qualidade do composto orgânico;
– aumentar a capacidade de tratamento em 50% – ou seja, em 120 ton/dia – da ETRSU.
– cf. documento de fls. 498 e ss. dos autos.
D. A aludida ETRSU foi projectada para separar lixo doméstico tal como é recolhido; os sacos plásticos são dilacerados, após, a matéria orgânica é separada da inorgânica, por sua vez, a matéria orgânica é tratada para a reutilização na agricultura como “adubo”; já os materiais recicláveis seguem para a reciclagem e os não recicláveis para aterro sanitário – cf. depoimento das Testemunhas CC e BB.
E. O contrato celebrado entre as partes era regulado pelo Programa de Concurso e pelo Caderno de Encargos – cf. documento de fls. 309 a 333; 339 a 358/449 a 468 e de 469 a 531 dos autos.
F. Resulta do disposto no Programa do Concurso, mais especificamente do ponto 31, bem como da Cláusula 1.1.1, alínea c), do Caderno de Encargos, que à empreitada é de aplicar o disposto no Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de Dezembro – cf. programa do concurso de fls. 342 e ss. dos autos/caderno de encargos de fls. 309 e ss. dos autos.
G. Resulta do Caderno de Encargos – Cláusulas Gerais – o seguinte:
«7.6 Ensaios
7.6.1. Os ensaios a realizar na obra ou em partes da obra para verificação das suas características e comportamentos são especificados neste Caderno de Encargos e os previsto nos regulamentos em vigor e constituem encargo do Empreiteiro, aplicando-se o disposto nos artigos 153.º e 154.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de Dezembro.
7.6.2 Quando o Dono da Obra tiver dúvidas quanto à qualidade dos trabalhos, pode tornar obrigatória a realização de quaisquer outros ensaios além dos previstos, acordando previamente, se necessário, com o Empreiteiro, sobre as regras de decisão a adoptar.
7.6.3 Se os resultados dos ensaios referidos na cláusula 7.6.2 não se mostrarem satisfatórios e as deficiências encontradas forem da responsabilidade do Empreiteiro, as despesas com os mesmos ensaios ficarão a seu cargo, sendo, no caso contrário, de conta do Dono da Obra.»
11.3 Modalidade da Recepção Provisória
11.3.1 Assim que tenha sido cumprido o determinado nas cláusulas técnicas deste Caderno de Encargos relativo à afinação e ensaios das várias partes da obra e ao arranque das instalações, o Empreiteiro pode requerer, em carta registada com aviso de recepção, a vistoria para efeitos de recepção provisória.
11.3.2 A vistoria para efeitos da recepção provisória pelo Dono da Obra, assim como a marcação da respectiva data, deverá ser comunicada ao Empreiteiro com antecedência mínima de cinco dias, aplicando-se o disposto no artigo 198.º do Decreto-Lei n 405/93.
11.3.3 O prazo para a recepção provisória da obra poderá ser prorrogado. Caso exista qualquer impedimento pelo período que ele durar.
11.3.4 O Dono da Obra pode aceitar a recepção provisória da obra, condicionada à entrega de certos elementos ou à fiscalização de determinados trabalhos, em casos nos quais os condicionamentos postos não sejam de molde a causar impedimentos ao normal funcionamento da obra.
11.3.5 A recepção provisória considera-se efectuada, para todos os efeitos legais, caso o Dono da Obra não tenha dado qualquer resposta, vinte e dois dias após a data da recepção da carta contendo o requerimento referido na cláusula 11.3.1.
11.3.6 Com a recepção provisória entra em vigor o prazo de garantia ao qual se refere a c³áusula 11.4.1.
11.4 Prazo de Garantia
Salvo se outro se encontrar estabelecido neste Caderno de Encargos, o prazo de garantia é de cinco anos para a construção civil e dois anos para o equipamento, contados a partir da recepção provisória.
11.5 Obrigações do Empreiteiro Durante o Prazo de Garantia
11.5.1 Durante o prazo de garantia, o Empreiteiro é obrigado a fazer, imediatamente e à sua custa as substituições de materiais ou equipamentos e a executar todos os trabalhos de reparação que sejam indispensáveis para assegurar a perfeição e o uso normal da obra nas condições previstas nas Cláusulas Técnicas.
11.6 Restituição dos Depósitos e Quantias Retidas e Extinção da Caução
11.6.1 A Restituição dos depósitos e quantias retidas e extinção da caução serão feitas de acordo com o estipulado no artigo 210.º e seguintes do Decreto-Lei nº 405/93 de 10 de Dezembro.»
– cfr. documentos de fls. 332 e ss. 469 e ss. dos autos.
H. Resulta do Caderno de Encargos – Cláusula Técnicas – o seguinte:
«8.3.2 Exploração
8.3.2.1 A partir da data estabelecida como fim do arranque começa o período de exploração.
8.3.2.2 Durante os 6 primeiros meses de exploração efectuar-se-ão os ensaios descritos em local próprio.
8.3.2.3 Se estes se revelarem concludentes em termos de garantia, considerar-se-á a obra recepcionada provisoriamente.
8.3.2.4 Os custos relativos ao período de exploração, até a recepção provisória, correm a cargo do empreiteiro.
8.4 Ensaios, Garantias e Penalidades
8.4.1 Introdução
8.4.1.1O Adjudicatário devera garantir as performances da sua instalação em termos de capacidade de tratamento, qualidade do composto e tratamento de odores.
8,4.1.2 Para além dos ensaios referidos nos pontos seguintes, que correm a expensas dos concorrentes, a entidade adjudicante poderá realizar outros tipos de ensaios por forma a verificar a conformidade dos equipamentos instalados e das obras realizadas.
8.4.2 Ensaios de Capacidade
8.4.2.1 O dimensionamento do reactor de fermentação e da afinação primária serão feitos de modo a poder tratar 120 ton/dia de resíduos urbanos, com uma reserva de funcionamento de 10% (dez por cento).
8.4.2.2 Os ensaios de capacidade serão efectuados por um período de 7 horas consecutivas incluindo as paragens normais previstas no processo de laboração, durante os 30 dias de exploração.
8.4.2.3 Serão analisadas, entre outros, neste domínio as seguintes características:
– capacidade de tratamento de 120 ton/dia, acrescido de 10 %;
– capacidade para transporte da mistura composto e refugos;
– controlo dos parâmetros do processo;
– capacidade de separação da afinação primária;
– capacidade de insuflação de ar em sentido de contracorrente.
8.4.2.4 Considerar-se-ão cumpridas as características da respectiva empreitada onde se inclui a obra de construção civil e o equipamento – no que se refere à capacidade, se no decorrer do período de ensaio, a par do período de arranque, não forem detectadas anomalias, ou tendo sido tenham sido corrigidas.
8.4.2.5 A falta de cumprimento da capacidade estabelecida anteriormente sujeitará o Adjudicatário à aplicação das seguintes sanções pecuniárias: (...).
8.4.2.7 A recepção provisória a instalação poderá ser definitivamente recusada se a capacidade real for interior a 90%.
8.4.3 Ensaios Sobre a Qualidade Final do Composto Obtido
8.4.3.1 Os ensaios sobre a qualidade final do composto obtido serão realizados à saída da afinação primária.
8.4.3.2 A taxa de recuperação de matéria orgânica deverá ser indicada pelo Concorrente.
8.4.3.2 Os ensaios da qualidade final do composto serão efectuados por um período de 7 horas consecutivas incluindo as paragens normais previstas no processo de laboração. durante os primeiros 30 dias de exploração.
8.4.3.3 Serão analisadas neste domínio as seguintes caracteristicas:
– Taxa de matéria orgânica (em seco)
– Relação MO/N
– Granolumetria (malha quadrada em mm)
– Teor em impurezas (em % da matéria seca)
– filmes plásticos e poliestireno expandido de dimensão superior à malha circular de 5 mm
– materiais pesados de dimensão superior à malha circular de 5 mm
– inertes totais
– Humidade (em percentagem)
8.4.3.4 Os ensaios sobre a qualidade do composto realizar-se-ão sobre um conjunto mínimo de 10 amostras, cuja recolha obedecerá à seguinte metodologia:
– Recolher cerca de 1000 kg de composto em quatro etapas.
três vezes 250 kg de manhã,
uma vez 250 kg de tarde;
– Empilhar os 1000 kg de composto por forma a constituir um paralelepipedo o mais regular possível;
– Dividir o paralelepípedo em 4 partes iguais
– Retirar uma parte (cerca de 250 kg);
– Com o auxilio da caixa de separação, retirar uma amostra com 6 kg;
– Dividir essa amostra em duas partes, retirar uma das partes com 3 kg –, a fim de ser enviada para um laboratório de análises nomeado pelo Dono da Obra.
8.4.3.5 A afinação complementar deverá ter uma eficácia suficiente para garantir um composto a com a qualidade definida pela proposta do concorrente, mas a sua qualidade mínima nunca – deve ser inferior a definida num dos pontos seguintes:
8.4.3.6 A taxa de recuperação de matéria orgânica deverá ser indicada pelo Concorrente. Mas nunca poderá ser inferior a 50 %.
8.4.3.7 À saída da afinaçao primaria, o composto afinado deverá ter. no mínimo, as seguintes características:
Taxa de matéria orgânica (em seco) >50%
Relação MO/N <60
Granolumetria (malha quadrada em mm)
Teor em impurezas (em % da matéria seca):
– filmes plásticos e poliestireno expandido de dimensão superior à malha circular de 5 mm <0,5
– materiais pesados de dimensão superior á malha circular de 5 mm <6
– inertes totais <22
– Humidade (em percentagem) <65
8.4.3.8 Considerar-se-á cumprida a parte respeitante ás caracteristicas físico-químicas do composto, se a série 10 amostras, sem excepção, a realizar apresentarem valores que se enquadrem com os indicados no ponto anterior e satisfaçam requisitos superiores apresentados pelos concorrentes.
8.4.3.9 Será dada uma segunda possibilidade de refazer os ensaios com o composto que deverão ser realizadas do modo como o indicado anteriormente.
8.4.5.10 Será aplicada uma multa de 10% do valor da empreitada relativa ao respectivo lote Construção civil e fornecimento de equipamentos se o composto final produzido for de qualidade inferior à definida anteriormente.
8.4.3.11A recepcão provisória da instalacão poderá ser definitivamente recusada se a variação de cada um dos parâmetros for superior a 10 %.
(...)»cf. documento de fls. 498 e ss. dos autos.
I. A execução deste contrato foi coberta pela garantia bancária n.º ...49, emitida pelo Banco 1..., em 24/04/1998, no valor de 502.271.376$00, bem como pela garantia bancária n.º ..., emitida pelo Banco 2..., em 27/04/1998, no valor de 121.350.000$00 – cf. documento de fls. 446 e ss. dos autos.
J. Atualmente, o Consórcio encontra-se reduzido apenas às duas Sociedades Rés, em virtude de fusões ocorridas entre elas e as demais sociedades inicialmente integrantes do Consórcio – por acordo.
K. Com referência à empreitada, as Consorciadas repartiram as tarefas conforme segue:
– “Participação da E...: estudos e construção dos edifícios, redes de águas e esgotos e arranjos exteriores”;
– “Participação das SGE-Environnement, S... e O...: concepção e engenharia de processo, fornecimento dos equipamentos mecânicos, electromecânicos, eléctricos e automáticos de processo, supervisão da entrada em funcionamento das instalações de processo, supervisão da operação durante o período exigido no Contrato.”
– cf. documento de fls. 438 e ss. dos autos.
L. Em cumprimento do previsto na Cláusula 1.11 do Caderno de Encargos, a M... prestou, designadamente, junto do Banco 3... e a favor da Autora, no âmbito dos trabalhos da empreitada, duas garantias bancárias:
– GB n.º 04/037/12190 de 06/02/2004, no montante de € 131.118,98,
– GB n.º 4/065/12955, de 05/03/2004, no montante de € 3.143,50;
– cf. documento de fls. 370 a 372 dos autos.
M. A empreitada objecto de concurso foi dividida em 3 Partes que só poderiam ser adjudicadas, de acordo com os critérios de adjudicação, a um concorrente, sendo que essa divisão tinha como objectivo adaptar a execução dos trabalhos às capacidades financeiras e de financiamento da Entidade Adjudicante, podendo a respectiva execução ser diferida no tempo. – cf. de fls. 454 e ss. dos autos – Ponto 4 do Programa de Concurso (objecto do concurso).
N. A empreitada em causa era constituída, assim, por três partes, a saber:
Parte 1 – “Melhoramentos”
N.1 Parte 1 (um): designada de “Melhoramentos”, compreendia:
cobertura e isolamento completo do
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento de fls. 298 e ss. dos autos.
E com referência à Parte 1:
N.1.a) Em 17/02/1999, foi lavrado Auto de Consignação dos trabalhos de toda a área objecto da Parte 1, composta pelos lotes 1.1, 1.2, 1.3 e 1.4 – cf. teor do documento de fls. 298 e ss. dos autos e teor do documento de fls. 530 e ss. dos autos.
N.1.b) Em Maio de 2002, foram dados por concluídos os trabalhos, tendo-se realizado a vistoria, em 19/07/2002, para efeitos de recepção provisória, de cujo auto lavrado resulta que os trabalhos se encontram bem executados e de acordo com o caderno de encargos, tendo alguns dos resultados dos ensaios satisfeito os limites pré-estabelecidos, registando-se, porém, três reservas relativas (i) à percentagem de humidade; (ii) à temperatura de higienização do composto e (iii) à capacidade de revolvimento no hall de maturação. – cf. ponto 4 do Protocolo de fls. 37 dos autos.
N.1.c) Em 25/10/2005, a obra correspondente aos trabalhos efectuados no âmbito da Parte 1 foi recebida definitivamente na sua globalidade – cf. Auto de Recepção Definitiva de fls. 530 e 531 os autos e depoimento de EE.
N.1.d) Resulta do Auto de Recepção Definitiva, assinado por representantes da AM..., do GAT do ... e do Consórcio, o seguinte: “No período que mediou entre a data de conclusão dos trabalhos e a vistoria para recepção definitiva foram realizados todos os ensaios previstos no Caderno de Encargos, que incidiram fundamentalmente sobre a capacidade de tratamento instalada, a qualidade do produto final obtido e o nível de odores gerados no funcionamento, ensaios esses presenciados pela fiscalização e cujos resultados, registados em relatórios próprios, reúnem as condições necessárias para aceitação do presente auto.
Face ao atrás exposto, considera-se que a obra poderá ser recebida definitivamente na sua globalidade.”
– cf. documento de fls. 530 e ss. dos autos.
N.1.e) Todas as garantias referente à 1.ª Fase foram libertadas em 25/10/2005 – cf. documento de fls. 532 dos autos e depoimento das Testemunhas EE, DD.
Parte 2 – “Ampliação da Capacidade de Tratamento”
N.2. Parte 2 (dois), denominada “Ampliação da capacidade de tratamento”, compreendia o «sistema de compostagem acelerada, através de reactor, para tratamento de 120 toneladas/dia (com uma variação de 10%) e o fecho, aspiração e desodorização dos gases saídos do equipamento proposto.”
E com referência à Parte 2:
N.2.a) Em 2/5/2000, as partes consignaram parte dos trabalhos referentes à Parte 2, a saber:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento de fls. 302 a 306 dos autos.
N.2.b) Em 22/7/2002, as partes consignaram o remanescente dos trabalhos referentes à Parte 2 “Ampliação da capacidade de tratamento da ETRSU”, mais propriamente a instalação de um terceiro bioreactor – “BRS#3” e respectivos trabalhos de apoio de construção civil – destinando-se a montar uma terceira linha de tratamento a acrescentar às duas já existentes, aumentando, assim, a capacidade instalada de tratamento de resíduos para a prevista no Caderno de Encargos – cf. teor do documento de fls. 334 e 335 dos autos.
N.2.c) No dia 8/11/2004, a AM... e o Consórcio lavraram o Auto de Recepção Provisória relativamente a todos os trabalhos consignados da Parte 2, tendo-se aí declarado:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento de fls. 334 e 335 dos autos.
N.2.d) Este Auto de Recepção Provisória não foi homologado pelo Presidente da AM... – por acordo; cf. documento de fls. 569 dos autos.
N.2.e) Por ofício datado de 20/11/2006, a AM... comunicou ao Representante do Consórcio E.../V... o seguinte: “tendo em consideração as anomalias que, constantemente, têm ocorrido, e, oportunamente, comunicadas ao Consórcio que V. Exa. representa, junto da AM..., no que respeita ao processo acima referenciado, e de acordo com uma Peritagem Técnica que, para o efeito, mandámos elaborar, não estão reunidas as condições necessárias para se poder proceder, como seria desejável, à recepção definitiva da obra (...).
Neste contexto, torna-se necessário que o Consórcio E.../V... proceda às obras necessárias, de acordo com o resultado da Peritagem.” – cf. documento de fls. 555 dos autos.
N.2.f) Esta posição da AM... sustentou-se em dois Relatórios Técnicos, elaborados e subscritos por docentes da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, a saber:
“Análise Técnica das Condições de Funcionamento da Estação de Compostagem do ...” – Maio de 2006, da qual resultou:
(i) Amplitude médias do movimento radial excêntrico dos cilindros, conforme quadro que se reproduz de seguida,
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(ii) O valor medido, através de um rugosímetro, para a rugosidade máxima na amostra de resina retirada da superfície de contacto rolete-cilindro é da ordem dos 2.3 mm.
A partir dos resultados obtidos (i) e (ii), a Escola de Engenharia da Universidade do Minho concluiu:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
“Inspecção Técnica das Condições de Lubrificação do Sistema de Accionamento BRS#3 – Caixa Redutora 445H da Estação de Compostagem do ...” – Setembro de 2006, da qual resultou:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(...)
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Verificou-se contaminação de massa lubrificante tanto no ... andar da caixa de redução, bem como no respectivo carter;
Verificou-se contaminação do rolamento duplo de rolos (4) situado no lado oposto do carter;
A contaminação de massa provinha de dois anéis metálicos e vedação (5) situados entre a roda (7) e os rolamentos duplos de rolo (4), uma vez que as outras possíveis origens foram descartadas;
O lubrificante continha um elevado teor de partículas metálicas, face ao número de horas de funcionamento da caixa redutora;
Verificou-se existência de massa grafitada no seio do lubrificante do analisado.
O Relatório indicou como origem e solução dos problemas detectados no equipamento:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. de fls. 27 a 36 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e ss., 561 dos autos, cf. depoimento da Testemunha FF.
N.2.g) Em 25/11/2009, o Consórcio requereu a realização de vistoria para efeitos de Recepção Definitiva da Empreitada que havia sido provisoriamente recebida em 2004 – cf. documentos de fls. 336 a 338 dos autos.
N.2.h) Em 26/11/2009, Autora recebeu a carta com o pedido de realização de vistoria para efeitos de Recepção Definitiva da Empreitada – cf. documentos de fls. 338 dos autos.
N.2.i) A Autora que recebeu a carta em 26/11/2009 não deu qualquer resposta à solicitação – cf. documento de fls. 338 dos autos.
N.2.j) Também não promoveu a realização da vistoria destinada à elaboração do Auto de Recepção Definitiva da Obra.
N.2.k) Foram libertadas as garantias prestadas pela V... referentes à Parte 2 – cf. depoimento das Testemunhas DD; GG.
Parte 3
N.3. Parte 3 (três) intitulada “Outras Infra-Estruturas”, compreendendo «o espaço para recepção de visitantes» – destinava-se a receber visitantes, obra que nunca chegou a ser concretizada por decisão da Autora – por acordo.
MAIS SE PROVOU:
O. Pretendia-se com a instalação do BRS#3 alcançar um aumento de capacidade de tratamento de resíduos em 50%, já que o funcionamento daquele iria acrescer ao de dois bioreactores, pré-existentes (BRS#1 e BRS#2), o primeiro tecnologicamente mais avançado – cf. Programa do Concurso e Caderno de Encargos de fls. 449 e ss. dos autos e depoimento das Testemunhas HH e AA.
P. Cada cilindro de fermentação – BRS#1, BRS#2 e BRS#3 – podia receber 120 toneladas/dia (com uma reserva de funcionamento de 10%), durante 7 horas – cf. 7.4.2 Ensaio de Capacidade/Caderno de Encargos/Cláusulas Técnicas – de fls. 517 dos autos; cf. depoimento das Testemunhas HH, CC, II, AA.
Q. Os BRS têm uma forma cilíndrica e, em funcionamento, realizam uma acção rotativa em torno do seu eixo, com vista à dilaceração dos resíduos, que passam a sofrer um processo de arejamento através de ventiladores – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
R. Não se pode alimentar os “BRS” com mais lixo do que a capacidade prevista, sob pena de a matéria orgânica apodrecer – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
S. Lixo de origem hospitalar e/ou industrial está interdito na ETRSU – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
T. No fim do ciclo de rotação, o produto resultante da dilaceração é evacuado para uma estrutura com fundo em rede, espécie de peneira, que separa a matéria orgânica da inorgânica – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
U. A matéria é conduzida para uma nave de maturação, onde é amontoada e estendida em pilha longitudinal, através de um maquinismo denominado “Ponte Formadora de Pilha” (doravante apenas Ponte ou PFP) – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
V. Na nave de maturação ocorre o processo de fermentação ou maturação da matéria orgânica, no termo do qual se obtém o composto ou adubo – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
W. Para que no local onde a pilha é formada possa formar-se outra, com o material entretanto processado nos BRS, deve ela ser deslocada por um outro maquinismo, denominado “Revolvedora Automática de Composto” (a partir de agora apenas Revolvedora/RAC), que a faz avançar, na nave de maturação, a distância suficiente para que a nova pilha de material orgânico possa ser depositada – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
X. E, assim, sucessivamente, na sequência de cada nova quantidade de resíduos que entra no BRS e dele é evacuada, reiniciando-se o processo nos termos que antecede – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
Y. Assim, este processo depende do funcionamento de três maquinismos – BRS, PFP e RAC –, bem como da sincronia que tem de haver entre eles – cf. depoimento das Testemunhas CC, BB, II, JJ, AA.
MAIS SE PROVOU:
Z. A Ré M..., S.A, liderou o Consórcio na parte dos trabalhos de construção civil que estavam a seu cargo – cf. depoimento das Testemunhas II, AA e GG.
AA. Únicos trabalhos que executou e em relação aos quais teve intervenção – cf. depoimento das Testemunhas II, AA e GG.
BB. Por sua vez, à V... coube a tarefa de liderar a restante parte dos trabalhos de obra mecânica e de controle, que executou em exclusividade – cf. depoimento das Testemunhas II, AA e GG.
MAIS SE PROVOU:
CC Em Outubro de 2005, foi assinado o seguinte “Protocolo”:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento de fls. 37 e 37-verso dos autos.
DD. No dia da celebração do Protocolo, a AM... declarou que «considera as Entidades Bancárias prestadoras das garantias, libertas delas, obrigando-se a devolver, imediatamente, por correio expresso, os documentos titulares de tais garantias bancárias aos que as prestaram.
Mais declara que se reconhece a existência de lapso de escrita nas garantias bancárias à 2.ª Fase da dita empreitada, porquanto a vigência delas conta-se a partir da data da recepção provisória e não da definitiva como delas consta» cf. de fls. 532 e ss. dos autos.
EE. A Outorga do Protocolo teve como pressuposto a libertação das garantias referentes à 1.ª Fase – cf. documento de fls. 532 dos autos.
MAIS SE PROVOU:
FF. A coberto da garantia contratual, a Ré V... atendeu às reclamações da Autora no que concerne à substituição dos rolos-motor dos tapetes transportadores de saída do BRS#3 e do Crivo#3 – cf. de fls. 360 dos autos, carta datada de 17/10/2005.
II. Diferentemente, a Ré V... não atendeu à reclamação da Autora no que concerne à roda de encosto associada aos roletes de apoio da entrada do BRS#3, com base no entendimento de que a situação apontada não estava coberta pela garantia contratual, invocando:
1) As peças em causa são peças de desgaste;
2) Por essa razão foram fornecidas na Proposta peças suplentes;
3) As peças originais gastaram-se e as suplentes também;
4) Compete ao utilizador repor este stock de peças suplentes,
posição reiterada em Novembro de 2006.
– cf. de fls. 360 e 361 dos autos, carta datada de 17/10/2005.
MAIS SE PROVOU:
JJ. Após assinatura do Protocolo, A... mobilizou especialista em Pontes Rolantes do Hall de Maturação, que compareceu no local da obra em menos de um mês após a assinatura do Protocolo do Acordo, para fazer o diagnóstico das avarias – cf. documento de fls. 533 dos autos; cf. Acta n.º ... (9/11/2005).
KK. Após assinatura do Protocolo, A... aguardou 4 meses para que os equipamentos fossem limpos, para que os especialistas pudessem fazer os diagnósticos dos problemas dos equipamentos – cf. documento de fls. 536 e ss. dos autos.
LL. Detectou-se composto empedernido no interior da tremonha (PFP) – cf. Acta n.º ... (18/11/2005).
MM. Detectou-se que o sistema de alimentação eléctrico se encontrava destruído – cf. Acta n.º ... (18/11/2005).
NN. Para A... iniciar a reparação do revolvedor automático de composto era necessário energizar primeiro os motores eléctricos e hidráulicos que elevavam a máquina do pavimento – cf. documento de fls. 533 dos autos.
OO. A... aguardou que a AM... adjudicasse e mobilizasse o seu empreiteiro de electricidade e controle para proceder às reparações das duas Pontes simultaneamente – cf. documento de fls. 533, 536 dos autos e depoimento da Testemunhas II e AA.
PP. Igualmente aguardou pela realização de outros trabalhos, a saber: lavagem de alta pressão da Ponte Formadora de Pilha, estufagem e controle dos motores eléctricos, alinhamento e soldadura dos rails e reparação das cames de controle – cf. documento de fls. 536 dos autos; Acta n.º ... (9/11/2005).
QQ. Ficaram parcialmente concluídos os trabalhos relacionados com PFP – cf. Acta n.º ... (12/12/2005).
RR. Em Fevereiro de 2006, as partes discutiam distribuição de trabalhos relacionados com a limpeza de quadros eléctricos – cf. Acta n.º ... (15/2/2006).
SS. PP. Em 8/2/2006, a AM... comunicou ao Consórcio que o BRS#3 se encontrava imobilizado devido a uma avaria na roda de encosto/rolete radial da porta de entrada, por falta de substituição do rolete – cf. documento de fls. 548 dos autos.
TT. Em Março de 2006, os quadros eléctricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos – cf. Acta n.º ... (14/03/2006).
UU. Em Março de 2006, A... não tinha apresentado Cronograma de Trabalhos – cf. Acta ... (21/03/2006).
VV. Em Agosto de 2006, e relativamente à Ponte Formadora de Pilha, continuava pendente a adjudicação dos trabalhos a cargo da AM... e as reparações eléctricas a cargo da TCPI (electricidade e controlo) estavam atrasados – cf. Acta n.º ... (28/8/2006).
XX. Foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação – cf. Acta n.º ...0 (18/9/2006).
ZZ. Em 21/09/2006, a AM... comunicou ao Consórcio que o sistema de lubrificação do BRS#3 se encontrava em funcionamento manual, acrescentando: “A avaria deve-se, ao que tudo indica, à colmatação do filtro de ar comprimido e ao rompimento da membrana da electroválvula associada ao doseador de lubrificante.
O funcionamento do equipamento nas condições actuais, pode provocar a paragem absoluta do equipamento por falta de lubrificação no período em que se encontra a operar em pequena velocidade”cf. documento de fls. 550 dos autos.
AAA. Em 26 de Setembro de 2006, reiniciou-se o arranque da reparação da PFP – cf. Actas 11 e 12 (22/09/2006 e 27/09/2006, respectivamente).
BBB. Em Setembro de 2006, verificava-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TCPI (electricidade e controlo), quer a cargo da V... –cf. Acta n.º ...1 (22/09/2006).
BBB. Por carta datada de 27/09/2006, A... levou ao conhecimento da Autora que:
– aceitava reclamação relativa a pinturas na linha do “BRS#3” por a anomalia se encontrar abrangida pela garantia;
– declinava responsabilidade relativamente à avaria no sistema de lubrificação dessa mesma linha, com a seguinte justificação: “a mesma deve-se à colmatação do filtro de ar comprimido e ao rompimento da membrana da electroválvula associada ao doseador de lubrificante, pois descolmatar filtros, substituir membranas e mudar lubrificantes são operações normais de funcionamento e manutenção não abrangidas pela garantia contratual”cf. documento de fls. 362, 550, 551, 552 dos autos.
CCC. Em Setembro de 2006, as partes diligenciavam pela formação do pessoal que iria operar a RAC – cf. Acta n.º ...2 (27/09/2006).
DDD. A AM... adjudicou a parte mecânica da reparação da PFP à empresa J..., que previa a conclusão da obra para a semana de 6 a 10 de Novembro – cf. Acta n.º ...3 (4/10/2006).
EEE. A... apresentou o cronograma de trabalhos da LX... – cf. Acta n.º ...4 (25/10/2006).
FFF. Por carta de 2/11/2006, A... levou ao conhecimento da Autora que declinava a responsabilidade relativamente à situação reportada quanto ao estado da roda de encosto associada aos roletes de apoio da entrada do BRS#3 pelas seguintes razões:
– as peças em causa eram peças de desgaste;
– por essa razão foram fornecidas na Proposta peças suplentes;
– as peças originais gastaram-se e as suplentes também;
– compete ao utilizador repor este stock de peças suplentes.
– cf. documentos de fls. 361, 553 e 554 dos autos.
GGG. Por carta de 20/11/2006, a AM... comunicou ao Representante do Consórcio E.../V... o seguinte:
«Venho comunicar que, tendo em consideração as anomalias que, constantemente, têm ocorrido, e oportunamente, comunicadas ao CONSÓRCIO que V.Ex.ª representa, junto da AM..., no que respeita ao processo acima referenciado, e de acordo com uma Peritagem Técnica que, para o efeito, mandámos elaborar, não estão reunidas as condições necessárias para se poder proceder, como seria desejável, à recepção definitiva da obra a que se refere a Empreitada mencionada em epígrafe.
Neste contexto, torna-se necessário que o CONSÓRCIO E.../WINCI proceda às obras necessárias, de acordo com o resultado da Peritagem.
Entretanto, poderão analisar o Processo Junto dos nossos Serviços Técnicos, que, se assim o entender, deverá contactar.»
– cf. documento de fls. 555 dos autos.
HHH. Em resposta do dia seguinte, o Consórcio informou que se propunha a «verificar a peritagem técnica mandada elaborar por V. Exas. na sede da AM... na quinta 23/11/2006 pelas 10.00, tal como acabamos de acordar com os vossos serviços técnicos, na pessoa do Eng.º KK»cf. documento de fls, 556 dos autos.
III. Em 18 de Dezembro de 2006, A... informou a AM... que mobilizou a subcontratada P... para proceder à afinação e ajustamentos dos mecanismos de fecho da porta e de entrada do BRS#3, mas que tal não teria sido possível por falta de autorização da AM..., que a veio a conceder no dia 27 de Dezembro – cf. documento de fls. 557 dos autos.
JJJ. Na sequência dessa comunicação, A... mobilizou a sua subcontratada P..., cujos técnicos:
1. confirmaram que os valores da excentricidade na zona da flange de entrada estavam dentro dos valores de projecto;
2. procederam a um reajuste da posição relativa da porta e da flange, no sentido de diminuir a carga sobre os roletes de apoio radial, que era relativamente elevada, recomendando que esta operação deveria ser encarada como de manutenção anual ou adoptada quando se verificasse uma nova deterioração do comportamento;
a. salientaram, quanto ao valor da rugosidade referida no relatório técnico, que o mesmo não teria influência no conjunto, por tratar-se de superfície de contacto com os roletes e não directamente dos rolamentos.
– cf. documentos de fls. 557 a 560 dos autos
LLL. Em Março de 2007, A... encontrava-se a efectuar o restabelecimento operacional do Hall de Maturação, solicitando a colaboração da AM... para agilizar o procedimento tendente à adjudicação de dois contratos referentes a trabalhos prévios e indispensáveis às reparações a cargo da V... – cf. documento de fls. 533 e ss., 535, 538 dos autos.
MMM. Em 6/3/2007, a AM... ainda não tinha adjudicado os trabalhos de electricidade e controle para proceder às reparações das duas Pontes simultaneamente – cf. documento de fls. 533 e 534 dos autos.
NNN. A AM... procedeu a trabalhos de reparação da Ponte Formadora de Pilha sem a supervisão da V..., sem simultaneidade com a reparação da Ponte de Revolvimento do Composto (RAC) e sem qualquer intervenção do Consórcio – cf. documento de fls. 536 dos autos.
OOO. Em Abril de 2007, a AM... dirigiu uma comunicação ao Consórcio M.../V... que, em parte, se transcreve:
«No seguimento das comunicações 280/2006/GAT e 281/2006/GAT de 30 de Outubro de 2006, da AM... ao Consórcio C..., relativamente à necessidade de reparação, ao abrigo da garantia contratual, da porta de entrada do BRS#3 que se encontrava avariada, o Consórcio fez deslocar ao local, no passado dia 8 de Janeiro, a empresa P..., para reparação da mesma.
Posteriormente, foi solicitado pela AM... à Universidade do Minho, um estudo sobre o BRS#3. Da vistoria ao local, e relativamente à porta de entrada do BRS#3, foi elaborado um relatório de ande se retiram os seguintes resultados:
A afinação efectuada aos tirantes da porta de entrada alterou a posição relativa entre a porta e o cilindro de compostagem provocando deste modo um contacto permanente entre a virola da porta de entrada e os calços situados na parte inferior do cilindro de compostagem, facto este que & comprovado pelo desgaste acentuado que se verificou existir tanto na virola da porta da entrada como nos calços do cilindro de compostagem.
Atendendo às reais condições de funcionamento da porta de entrada do BRS#3, pode concluir-se que o tempo de vida útil será menor do que o expectável.
Assim, podem retirar-se as seguintes conclusões:
A intervenção técnica que foi efectuada à porta de entrada no sentido de minorar/colmatar o problema do desgaste acentuado dos seus roletes de encosto introduziu outro problema, porventura mais grave, que foi o desgaste acentuado da virola e dos calços, já que a sua substituição não se apresenta fácil e será seguramente, dispendiosa.
Com este tipo de afinação dos tirantes da porta de entrada, o desgaste da virola e dos calços é tão acelerado que terão necessariamente de serem substituídos frequentemente para que o BRSK3 funcione adequadamente.
A única solução de carácter definitivo no sentido de colmatar a deficiência de funcionamento do BRS#3, nomeadamente da porta da entrada, passa pela re-montagem do cilindro de compostagem, desde a porta de entrada até, pelo menos, ao primeiro apoio.
Dado o exposto, solicitamos e V. Exas. a resolução urgente do problema ao abrigo da garantia contratual.
Mais se informa que o relatório encontra-se disponível na sede da AM... para consulta, caso seja necessário.»
– cf. documento de fls. 561 dos autos.
PPP. Em 31/05/2007, a V... dirigiu à AM... uma comunicação, da qual, em parte, resultava:
“BRS#3 – Trommel
Inspeccionamos este equipamento com os nossos especialistas da V... e o Eng.º LL da S... e confirmamos as verificações feitas pela Universidade do Minho. Não estamos de acordo com as conclusões quando se afirma que há uma deficiência de montagem do Trommel. No nosso entender trata-se de uma operação de manutenção corrente que deverá ser executada pelo concessionário. Nesse sentido solicitamos o favor de consultarem o desenho BC 06 02 EQ 704 A (patente no dossier n.º 4 dos documentos transmitidos, poderemos fornecer uma nova cópia mediante a V. solicitação escrita) e procederem à reparação. Lembramos que este equipamento funciona a 2 turnos de há quase 4 anos a esta parte (15.000 horas de trabalho) pelo que é natural ter de se proceder à manutenção do mesmo nomeadamente à substituição de rolamentos mais solicitados.
BRS#3 – Porta de Entrada
Estudamos atentamente o relatório da Universidade do Minho e inspeccionamos este equipamento com os nossos especialistas da V... e o Eng. LL da S.... Estamos completamente em desacordo com as considerações e conclusões da Universidade do Minho e vamos proceder a uma afinação complementar dos tirantes da Porta de Entrada por forma a suavizar o funcionamento do BRS#3. Será fundamental a presença da S... durante esta operação por forma a serem assimiladas as diferentes regulações possíveis da Porta da Entrada do BRS#3.
Mais informamos do seguinte quanto ao BRS#3 – Porta de Entrada
1) A excentricidade medida pela Universidade do Minho de 17 a 18 mm está dentro dos valores de projecto de Concepção do Equipamento.
2) A virola de encosto na Porta de Entrada é de aço anti-desgaste ao manganês x120Mm12 que tem a característica de endurecer ao choque e atrito, evitando o desgaste da mesma.
3) Os calços montados na parte interior do cilindro de compostagem são vergalhões quadrados de desgaste e como tal deverão ser substituídos com o uso.
4) A situação actual é normal e aceitável, raspar ligeiramente não é problema porque os materiais de desgaste e protecção estão lá com essa função.
5) A vedação da Porta de Entrada do BRS#3 não está em causa nem o desgaste da virola de encosto da Porta da Entrada. Segurança de operação garantida.
A... – Reparação Elétrica da Ponte Formadora de Pilha
Infelizmente não foi possível reunir na ETRSU os nossos especialistas da V... com a A... no passado dia 18/05/2007. Da inspecção feita ao local não nos foi possível definir os trabalhos já efectuados. Assim solicitamos o favor de a A... nos informar do levantamento efectuado no local e da listagem dos trabalhos de reparação já efectuados e dos que pretendem efectuar. Em data a acordar nas semanas 25 e 26 (18 a 29/6/2007) vamos deslocar à ETRSU o nosso especialista LX... para reunir com a A... e definir claramente os trabalhos de reparação a efectuar na Ponte Formadora de Pilha de composto.
(...)” – cf. documento de fls. 363 e ss. e de fls. 560, 565 e ss. dos autos.
QQQ. O equipamento Trommel funcionou a 2 turnos entre 2003 e 2007, contando 15.000 horas de trabalho, não tendo a Autora procedido à manutenção do mesmo, nomeadamente, à substituição de rolamentos mais solicitados – cf. documentos de fls. 363, 365 dos autos; cf. depoimento das Testemunhas II e AA.
RRR. Em 22/10/2007, a Ré V... dirigiu à Autora uma comunicação, dando conta que foram realizados trabalhos de reparação das duas Pontes do Hall de Maturação:
– com desmontagem pela Tufama dos motores do RAC;
– com montagem pela Tufama dos motores do RAC depois de terem sido levados à estufa e controlados; verificação pela V... dos trabalhos de reparação mecânica da Ponte de Formação de Pilha, reiterando em Novembro de 2007 a necessidade de a AM... adjudicar a reparação da electricidade e controle da Ponte de Formação de Pilha;
– os técnicos da LX... e LX... e da Tufama procederam a lubrificações, substituição de peças usadas, sem que a AM..., apesar de previamente informada por email de 14/07/2007, diligenciasse pelo acompanhamento, designadamente, através da S... ou de qualquer empresa subcontratadas por estas (AM.../S...), bem como sem acompanhamento de quem iria, após restabelecimento do funcionamento, operar esta Ponte de Revolvimento Automático de Composto da ETRSU do ... e, ainda, sem ser possível reunir com a A..., Lda.) que tinha sido mobilizada pela AM... para efectuar a reparação da electricidade e controlo da Ponte de Formação de Pilha – cf. documento de fls. 296, 297, 539 e ss. dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
SSS. Realizados os trabalhos que não se encontravam dependentes de trabalhos a executar pela Autora, A... deixou de ter condições – a partir de finais de 2007 – para continuar a proceder ao trabalho de reparação mecânica dos equipamentos – cf. depoimento das Testemunhas MM e AA.
TTT. Pese embora o acima exposto, os equipamentos foram colocados a funcionar sem realização dos trabalhos de electricidade e controlo, a cargo da Autora, e sem finalização dos trabalhos de reparação mecânica, a cargo da V... – cf. depoimento das Testemunhas CC, II e AA.
UUU. Nunca chegaram a ser realizados os ensaios previstos no Protocolo – cf. depoimento das Testemunhas II e AA.
Quanto à exploração, MAIS SE PROVOU:
VVV. A Concessionária da Exploração (S.../S...) contratou pessoal indiferenciado, sem formação, que operou durante anos a tecnologia existente na Estação de Tratamento – cf. documento de fls. 359 e ss., 517 dos autos; depoimento das Testemunhas BB, II, AA.
XXX. Designadamente o BRS#3, sendo que este maquinismo nunca foi integrado na concessão da exploração e gestão da Estação de Tratamento – cf. depoimento das Testemunhas CC e DD.
ZZZ. O Operador não limpava correctamente as grelhas de arejamento para optimizar a ventilação das pilhas de composto – cf. de fls. 536 e 537 dos autos e cf. depoimento das Testemunhas BB, II e AA.
AAAA. Estavam a ser tratadas mais de 120 toneladas/por dia/por cilindro – cf. depoimento das Testemunhas HH, II e AA.
BBBB. Em fase de exploração, a lubrificação é uma operação de manutenção corrente que se encontrava a cargo da AM... ou da concessionária da exploração
– cf. Programa de Concurso/Caderno de Encargos, cf. depoimento das Testemunhas II e AA.
CCCC. A falta de manutenção nos termos estabelecidos no Manual de Manutenção do Equipamento provoca problemas de funcionamento no sistema de lubrificação do “BRS” – cf. depoimento das Testemunhas FF, II e JJ.
DDDD. A... alertou para a existência de peças de desgaste, em particular, a roda de encosto e respectivos roletes de apoio da entrada do “BRS3”, cujas peças suplentes foram disponibilizadas de acordo com o previsto na proposta – cf. documento de fls. 548 e ss. dos autos.
EEEE. Competindo à Autora assegurar a reposição desse stock de peças suplentes – cf. depoimento das Testemunhas II e AA.
FFFF. Descolmatar filtros, substituir membranas e mudar lubrificantes são operações normais de funcionamento e manutenção – cf. depoimento das Testemunhas II e JJ.
GGGG. A partir de 2009, a concessão foi entregue à empresa R..., S.A., incluindo o BRS#3 – cf. depoimento da Testemunha DD.
MAIS SE PROVOU, relativamente à PARTE 2,
HHHH. Em Novembro de 2009, decorridos 5 anos sobre a data de recepção provisória, o Representante do Consórcio E.../V... solicitou à Autora realização de vistoria para efeitos de Recepção Definitiva da Empreitada – cf. documento de fls. 336 e ss., 373 e ss. e 567 e ss. dos autos.
IIII. Libertadas as garantias bancárias prestadas pela V... referentes aos trabalhos da Parte 2 para o equipamento, a M... solicitou, em 6/7/2010, libertação das garantias bancárias que se encontravam em poder da AM... no valor de € 131.118,98 e de € 3.143,5 – cf. de fls.372 e ss. e 568 dos autos; cf. depoimento da Testemunha CC.
JJJJ. Em 20/07/2010, a AM... dirigiu ao Representante Legal do Consórcio (M.../V...) a comunicação que segue:
«Assunto: Contrato de empreitada de concepção/construção de melhoramentos e ampliação da estação de tratamento de resíduos sólidos urbanos do ...– Parte 2
Relativamente ao assunto acima mencionado, e considerando:
1. Que o referido contralo, celebrado a 30.Jun.1998, prevê um prazo de execução da obra de 600 (seiscentos) dias, a contar do auto de consignmação;
2. Que o auto de consignação da Parle 2 ocorreu em 2.Jul.2002;
3. Que o prazo de execução se encontra injustificadamente ultrapassado e, por isso, sujeito ao pagamento das multas contratuais aplicáveis;
4. Que a obra, de um modo geral, não se encontra em concordância com o caderno de encargos e demais compromissos assumidos (aspectos comprováveis através das diversas reuniões entre as partes envolvidas; informações técnicas produzidas, relatórios de peritagem realizados; actas de obra; comunicações efectuadas presencialmente e/ou através de ofício, fax, e-mail, telefone, etc).
5. Que o Consórcio, notificado, por carta de 21.Fev.2003, para efeitos de vistoria e recepção da obra, ainda não ultrapassou as condições contratuais e legalmente exigíveis;
6. Que o auto de recepção provisória da Parte 2, de 8.Nov.2004, não mereceu a necessária homologação do órgão-executivo da AM..., a qual é concretizada através da correspondente menção e assinatura do presidente, sobre o respectivo documento, tornando-se, só então, plenamente válida e eficaz.
7. Que a não homologação se deve, em grande medida, ao facto de, até à presente data, a Parte 2 da obra ainda apresentar diversos defeitos/vícios, decorrentes de má-concepção e/ou execução do consórcio;
8. Serve a presente para reafirmar a V. Exas, na qualidade de representante legal do consórcio, que é imprescindível que fique demonstrado que a Parte 2 da obra se encontra em conformidade com o estipulado contratualmente, assim como para juntar parte da documentação que comprova a existência de falhas graves na obra (faxes de AA, de Abril a Maio de 2007; fax da AM... de 27.11.2006; ofício da AM... de l1.Fev.2003)
Assim sendo, e para os efeitos indicados, deverá proceder-se, em ambiente de exploração plena, à vistoria, já anteriormente determinada, só que agora com o acompanhamento da R..., SA, na qualidade de detentora da concessão do sistema e seu património.
Certos de que existe plena concordância quanto à necessidade da vistora, para efeitos de conclusão da obra, aguarda-se uma resposta do Legal Representante do Consórcio E.../V..., pelo período de 5 dias, quanto à sua realização no dia l7.Ag.2010, pelas 9 horas, no local da obra.
(...)»
– cf. documento de fls. 569 dos autos.
KKKK. Em resposta, o Consórcio assumiu a posição que resulta da comunicação, datada de 29/7/2010,
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
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[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– cf. documento de fls. 570 e ss. dos autos.
LLLL. A AM... dirigiu nova comunicação, datada de 9/8/2010, ao Representante Legal do Consórcio que, em parte, se transcreve:
“Relativamente ao V. Ofício em referência, reiteramos o já anteriormente afirmado, nomeadamente, no fax a que o dito ofício responde, em particular, quanto às inúmeras comunicações referidas no n.º 4 do dito fax, pelas quais são formalizadas reclamações várias no tocante à falta de cumprimento das obrigações de V. Exa.
Assim, fazendo a integração de todas as comunicações trocadas e o seu “enquadramento e contextualização”, como V. Exas. Dizem, dúvidas não restam de que não houve recepção tácita definitiva, dados os inúmeros e inequívocos elementos que a contradizem.
Tudo isto não esquecendo que não poderá dizer-se que a alegada interpelação desta Associação para a vistoria antecedente à recepção definitiva, tenha sido eficazmente efectuada.
Ao reiterarmos o conteúdo do nosso referido fax, de 20.07.2010, reiterada fica, para os legais efeitos, a designação do dia 17 do corrente, às 09,00 para a vistoria.
– cf. documento de fls. 575 dos autos.
MMMM. Em momento anterior à entrada da petição inicial em juízo (22/02/2011), a Revolvedora Automática de Composto foi retirada da nave – por acordo.
NNNN. Até à presente data, a Autora não procedeu ao cancelamento das garantias bancárias – GB n.º 04/037/12190 de 06/02/2004, no montante de € 131.118,98, e GB n.º 4/065/12955, de 05/03/2004, no montante de € 3.143,50, tendo a Ré M... suportado, desde 30/12/2009, despesas a título de comissões, no valor de € 1.090,17, e juros sobre as comissões, no valor de € 204,37 – cf. documento de fls. 370 a 372 dos autos.
FACTOS NÃO PROVADOS
1. Quanto ao BRS#3, a Autora suportou despesas para diminuir a excentricidade do cilindro 3 ou pela reparação da caixa redutora 445H, ou despesas com a substituição de componentes decorrentes de solicitações mecânicas superiores às previstas no projecto, custos esses que ascenderam a € 1.251.286,05.
2. O BRS#3 continua a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.
3. No respeitante à nave de maturação, a Autora suportou custos com reparações ou manutenções extraordinárias e com a substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efectuado automaticamente, custos esses na ordem dos € 5.952.273,75.»
*
3.2. A senhora juiz a quo adiantou a seguinte motivação para justificar o julgamento da matéria de facto:
«Relativamente aos factos provados, a convicção deste Tribunal alicerçou-se nos documentos – muitos que relatam factos concernentes ao desenvolvimento da relação jurídica contratual entre as partes –, bem como na convicção advinda da análise global e pormenorizada de toda a prova produzida em juízo, que obrigou à concatenação da prova documental com os depoimentos das Testemunhas, conforme se enunciou em cada uma das alíneas do probatório, convicção essa apreciada à luz da repartição do ónus da prova, dos parâmetros da lógica e das regras da experiência.
O Tribunal ouviu as Testemunhas que se indicam:
HH, Engenheiro Civil, exercia funções de Chefe de Divisão dos Resíduos Urbanos (à data dos factos em discussão) na Câmara Municipal ....
Esta Testemunha não acompanhou a fase de concurso público para concepção/construção de melhoramentos e ampliação da ETRSU. Igualmente não acompanhou a fase de execução da empreitada.
Afirmou ter integrado comissão técnica constituída, designadamente, por representantes de cada um dos Municípios que formavam a AM..., com vista à recepção provisória da obra. A Testemunha demonstrou conhecimento genérico dos objectivos definidos pela AM... para lançamento do concurso público, bem como do funcionamento da estação de tratamento (ETRSU); mas do seu depoimento resultou claro que a Testemunha não possuía conhecimentos técnicos específicos para analisar com rigor as condições de funcionamento do BRS#3. O discurso alicerçou-se em opiniões de terceiros, pessoas não identificadas, que apontavam conclusivamente as causas de um efeito sonoro – “plim” – identificado no BRS#3 quando este bioreactor se encontrava em funcionamento. A Testemunha admitiu em juízo que desconhecia qual a causa desse efeito sonoro. Formou-se a convicção neste Tribunal de que as considerações tecidas pela Testemunha em audiência final sustentaram-se no teor do Relatório elaborado pela Universidade do Minho e/ou na opinião de terceiros não identificados – cf. fls. 27 e ss. dos autos. Razões pelas quais o depoimento, quanto a este tema da prova, não mereceu qualquer força probatória.
Confrontada com o documento de fls. 334 dos autos, por alegadamente ter tido intervenção directa em acto destinado à recepção provisória da obra, a Testemunha não esclareceu o Tribunal por que razão a ressalva por si apontada não se encontrava mencionada no Auto de Recepção Provisória que foi assinado. A Testemunha sequer circunstanciou as diligências que realizou, participou ou interveio na qualidade de Membro da Comissão Técnica (provavelmente num contexto de vistoria), assim como as conclusões do trabalho desenvolvido nesse âmbito.
Ficou o Tribunal convencido que a intervenção da Testemunha nos factos em discussão não ocorreu no contexto refletido no Auto de Recepção Provisória (de fls. 334), mas em momento anterior, sobre o qual a própria Testemunha não foi capaz de identificar.
Da análise global do depoimento prestado, o Tribunal ficou convencido que a Testemunha procedia, no exercício das suas funções, à conferência de valores relacionados com a relação estabelecida entre o Município e a AM..., designadamente: (i) quantidade de resíduos originários do Município ... entrados na Estação de Tratamento; (ii) quantidades referentes à recolha selectiva e (iii) custos/despesas com a Estação de Tratamento assumidos pelo Conselho de Administração da AM... e anualmente reflectidos na relação com os Municípios.
Pelas razões expostas, temos que o depoimento da Testemunha nada acrescentou à prova documental junta aos autos ou contribuiu para julgamento dos factos controvertidos relacionados com a empreitada propriamente dita e/ou existência de defeitos e/ou não cumprimento do Protocolo pelas Rés/Autora e/ou matéria de recepções provisórias e/ou definitivas da obra.
Mas mereceu credibilidade a afirmação da Testemunha segundo a qual a exploração da Estação de Tratamento alcançava as 400 toneladas/mês. Afirmou esse facto convictamente em juízo, alicerçado no conhecimento directo dos factos, já que conferia valores e tratava de informação da qual resultava (i) quantidade de resíduos que entrava quotidianamente na Estação de Tratamento e (ii) os custos de exploração da ETRSU.
CC, Engenheiro do Ambiente, Secretário-Geral da AM... desde 2014. Acompanhou a área dos resíduos, como estagiário, de 2001 a 2003. Regressa quatro anos mais tarde à área dos resíduos, tendo assumido em 2014 o cargo de Secretário-Geral da AM....
Identificou os objectivos e as partes que constituíam a Empreitada, bem como o processo de dilaceração do lixo, maturação do composto até que o material orgânico alcançasse o estado de adubo.
Apresentou um discurso coerente, encadeado, porém, conclusivo, entrando em total contradição com a prova documental, designadamente, no que respeita aos factos referentes ao Protocolo de fls. 37 dos autos. Com o seu discurso, tentou convencer o Tribunal que a AM... reparou prontamente a Ponte Formadora da Pilha de Composto, bem como o Sistema de Extracção de Ar das Pilhas de Composto, ao contrário da V..., que assumiu uma atitude omissa quanto ao cumprimento das suas obrigações, não procedendo à reparação da Revolvedora Automática de Composto. Ora, esta ideia entra em total contradição com o vertido nas comunicações vertidas no probatório e que relatam cronologicamente as mobilizações e os trabalhos desenvolvidos pela V..., bem como as solicitações reiteradas para a presença da AM.../S... durante as operações. Com efeito, quer das 14 Actas juntas aos autos, quer das comunicações vertidas no probatório não resulta que A... tenha deixado de adoptar diligências com vista ao restabelecimento operacional da Nova Unidade.
O depoimento afigurou-se pouco objectivo e muito conclusivo e um tanto parcial, muitas vezes auxiliado pelos esclarecimentos prestados às questões cuja resposta se aguardava. Importa recordar que esta Testemunha participou nas primeiras 8 reuniões realizadas na sequência do Protocolo, que visou restabelecer a plena operatividade da ETRSU. O Tribunal esperava mais do depoimento do actual Secretário-Geral, visto que sempre assumiu funções de destaque, acompanhou e interveio amiúde ao longo da relação contratual. Esperava-se um conhecimento mais aturado, mais conhecedor dos factos concretos em discussão, uma sinopse de como se desenvolveu a relação contratual entre as partes, circunstanciando interpelações dirigidas a cada uma, pormenorizando estudos, ensaios, reuniões que tão-só afirmava ter presenciado (e que efectivamente presenciou – cf. Actas 1 a 6). Não conseguiu contextualizar, por exemplo, a comunicação de fls. 296 dos autos, não sustentou as suas afirmações em dados concretos, por exemplo, sobre o momento em que ocorreram as falhas em cada um dos maquinismos, comunicações dirigidas aos Réus em virtude dessas mesmas falhas; não identificou as concretas peças que foram substituídas, as razões que levaram à substituição de tais peças.
Mais, não explicou por que razão assinou o Auto de Recepção Definitiva de fls. 307 dos autos, e por que razão o teor desse documento se afasta do por si exposto em juízo.
Disse que pouco ou nada sabia em matéria de garantias, pese embora ter confirmado que foram libertadas todas as garantias prestadas pela V....
Do depoimento desta Testemunhal foi possível ao Tribunal retirar alguns factos instrumentais e/ou complementares com importância para o bom julgamento da matéria de facto:
i) o BRS#3 nunca chegou a integrar o objecto do contrato de concessão de exploração (entregue à S..., Lda.);
ii) o BRS#3 continuou, assim, na esfera da AM...;
iii) na prática, era a S... que assegurava a conservação e manutenção do BRS#3, facturando à AM... todos os custos incorridos – cf. descrição dos documentos de fls. 38 a 111 dos autos.
iv) eram os mesmos funcionários a laborar no BRS#1, BRS#2 e BRS#3.
Ponto é que destes dois depoimentos (Testemunhas HH e CC) resultaram contradições insanáveis:
Por um lado, pretenderam as Testemunhas convencer o Tribunal que o BRS#3 padeceu desde o início da exploração de deficiências estruturais que impediam o normal funcionamento, porém, a Estação de Tratamento ultrapassava o valor máximo de tratamento de lixo (400 toneladas/dia). Por sua vez, o Protocolo não impôs qualquer obrigação à V... relacionada com o BRS#3. Quanto a avarias, apenas encontramos no processo: um ofício dando conta de uma “imobilização devido a uma avaria na roda de encosto/rolete radial da porta de entrada” – cf. documento de fls. 548 dos autos, e um outro ofício levando ao conhecimento Consórcio que o sistema de lubrificação se encontrava em funcionamento manual. Manteve-se a dúvida sobre as causas dessas concretas avarias, o tempo que as mesmas demoraram a ser corrigidas e os prejuízos daí resultantes.
Aliás, segundo o Secretário-Geral da AM..., apenas se manteria pendente a obrigação da V... reparar a Revolvedora Automática de Composto.
Do depoimento Secretário-Geral da AM... resultou para o Tribunal que o BRS#3 não se encontrava integrado na concessão da exploração entregue à S..., Lda. Concatenado o depoimento desta Testemunha com a descrição das facturas de fls. 38 e ss. dos autos resulta que os valores facturados respeitavam a custos incorridos mensalmente com a mão-de-obra, energia, seguros, tratamento de lixiviados – que foram sendo custeados pela S... para a exploração do BRS#3 – cf. documentos de fls. 38 a 111 dos autos. Na PEN USB junta aos autos constam os documentos comprovativos de despesas, nomeadamente, com cedência de mão de obra, equipamento (camião, empilhador, pá carregadora), energia, seguros, tratamento lixiviados, manutenção – lubrificantes, facturados pela S.../S... à AM... pela “gestão provisória da Nova Unidade” e/ou pela “exploração do BRS#3”. Destaca-se que desses documentos comprovativos de despesas não se detecta diferença significativa no número de horas de funcionamento da linha 1, linha 2 e linha 3. Resultam – isso sim – custos com aluguer de pá carregadora para substituição da RAC durante as imobilizações desta, mas não se consegue distinguir, com segurança, essa despesa e outras referentes à Pá Carregadora 962G e Volvo L110F, matéria sobre a qual a prova testemunhal nada acrescentou.
BB, Engenheira Civil, actualmente a exercer funções no Serviço de Assessoria na Câmara Municipal ....
Na qualidade de Técnica ao serviço da Câmara Municipal ..., e em representação desse concelho na AM..., integrou uma comissão que acompanhou, até ao ano 2000, realização da empreitada, conheceu ensaios aos maquinismos, testes ao produto final.
Esta Testemunha mereceu credibilidade pela forma sincera, espontânea e desinteressada como prestou o depoimento.
Demonstrou conhecer, com pormenor, o funcionamento da Estação de Tratamento. A partir do depoimento desta Testemunha ficou o Tribunal convencido de que as obras foram acompanhadas pelo Gabinete de Apoio Técnico, gabinete que acompanhou a Fiscalização da Obra. Foram realizadas várias reuniões durante a Empreitada, nas quais se apontavam problemas de funcionamento do BRS#3 e da Revolvedora do Composto. Porém, não foi junto um único documento do qual resultasse falta de observância do projecto e/ou das normas técnicas durante a execução dos trabalhos, deficiências encontradas na obra. Com efeito, nada se conhece sobre a acção fiscalizadora que o Dono da Obra exerceu ao longo da execução dos trabalhos.
Esta Testemunha contribuiu para que o Tribunal ficasse convencido de que o parque de maturação era gerido e explorado pela S.../S... e que no início da exploração o produto final não alcançava a qualidade pretendida e esperada. Ponto é que o depoimento per se – desacompanhado dos estudos, ensaios, testes, relatórios da Equipa de Fiscalização da Obra ou do Gabinete de Apoio Técnico – não alcançou um grau de convencimento satisfatório para o Tribunal julgar factos concretos que o levassem a concluir pela realização de uma obra com vícios. Também não é suficiente para o Tribunal ficar convencido de os problemas detectados no funcionamento do BRS#3 – excentricidade e existência de partículas no lubrificante – se deveram a uma má execução do projecto. Acrescenta-se que a Autora nunca identificou problemas de projecto.
Resultou claro do depoimento que a Testemunha, pese embora demonstrar conhecimento directo sobre o funcionamento da Estação, não possuía conhecimentos técnicos, específicos, para responder objectivamente aos problemas detectados no funcionamento da Estação de Tratamento.
As respostas dadas às questões suscitadas em audiência final alicerçaram-se em Relatórios Técnicos que não foram juntos aos autos, desconhecendo o Tribunal a sua autoria, o respectivo objecto e, principalmente, se os resultados foram levados ao conhecimento do Consórcio. Alicerçaram-se ainda nos Relatórios Técnicos elaborados pela Universidade do Minho, quando afirmou ser seguro que em 2006 já não integrava qualquer Comissão (que o Tribunal interpretou ser de Vistoria).
Recordava-se da existência de relatórios de resíduos recolhidos e de se ter suscitado a questão da sobrecarga do BRS#3, mas também não foi capaz de responder com objectividade e rigor as quantidades que estavam a ser tratadas mensalmente pela Estação.
Ficou o Tribunal esclarecido de que alguns dos circuitos de recolha colectiva apresentavam, por regra, resíduos cuja entrada se encontrava interdita na Estação de Tratamento, existindo uma orientação no sentido de reencaminhar essas recolhas para o aterro. Sucede que, de toda a prova produzida, o Tribunal não ficou seguro sobre o cumprimento dessa orientação.
Destaca-se: a Testemunha acompanhou factos em discussão até ao ano 2000, não tendo intervindo em qualquer acto de gestão e de exploração da Estação de Tratamento a partir da celebração do protocolo assinado em 2005, desconhecendo inclusivamente o teor do documento de fls. 37 dos autos.
Do depoimento resultou que, em 2000, a Testemunha recusou-se a assinar uma proposta de auto de recepção provisória por entender que o conteúdo do auto proposto não correspondia à realidade da obra, no que respeitava ao BRE#3 e à Revolvedora Automática de Composto. E bem assim por entender que o produto final não atingia a qualidade pretendida e necessária para ser considerado adubo.
A Recepção Provisória verificou-se quatro anos mais tarde – cf. documento de fls. 334 e ss. dos autos – tendo merecido a assinatura do então Administrador da AM... e do Director do GAT do ..., por um lado, bem como pelo Representante do Consórcio E.../V... e pelo Representante da V..., por outro lado.
O Tribunal retirou do depoimento da Testemunha que era o Engenheiro NN o Técnico que acompanhava a operação, gestão e exploração da Estação de Tratamento. E, bem assim, que muitos estragos aos maquinismos foram causados pela operação – em total sintonia com o que se retira do email de fls. 359 dos autos. Por causas que a própria Testemunha não conseguia identificar com precisão, a RAC não revolvia automaticamente o lixo, prejudicando o arejamento do composto, pelo que a AM... terá começado a usar pás revolvedoras que não só estragavam as grelhas, como não ajudava à qualidade do produto final.
Não foram juntos pela AM... relatórios que segundo esta Testemunha existem, elaborados ora pelo Gabinete de Acompanhamento Técnico, ora pela Equipa de Fiscalização, na sequência dos ensaios realizados aos maquinismos e dos testes efectuados ao composto.
A Testemunha não tem conhecimento dos factos ocorridos – aproximadamente – nos quatro anos que mediaram entre o acto de recusa por parte da Comissão de Vistoria da qual fez parte e a assinatura do Autor de Recepção Provisória. Igualmente desconhecia a celebração e teor do Protocolo.
OO, Arquitecto, actualmente a exercer funções na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte. Foi entre 1996 e 2008 Director de Gabinete de Apoio Técnico do .... Acompanhou o concurso público e a realização da obra até à fase da Recepção Definitiva da 1.ª Fase, momento em que a AM... decidiu criar uma Comissão de Acompanhamento, constituída por Técnicos dos Municípios.
Apresentou um discurso muito vago, hesitante, pouco rigoroso, desde logo, quanto ao funcionamento dos maquinismos que constituíam a Estação de Tratamento e da própria Estação do Tratamento.
Esclareceu, no entanto, que actividade da concessionária (S.../S...) era paga com base na quantidade de resíduos recebida na Estação de Tratamento.
Afirmou várias vezes que não acompanhou a Parte 2 da Empreitada. Não soube ou não quis explicar as contradições insanáveis entre o que havia dito ao longo do seu depoimento e o que subscreveu quando assinou o Auto de Recepção Provisória, abalando irremediavelmente a credibilidade do seu depoimento e, por conseguinte, obrigando o julgador a afastar o depoimento desta Testemunha do julgamento da matéria de facto que se mantinha controvertida.
FF, Professor Catedrático do Ensino Superior na área de Engenharia Mecânica que participou na elaboração dos Relatórios Técnicos de fls. 27 e ss. e de fls. 31 e ss. dos autos, juntamente com mais dois docentes do Departamento de Engenharia da Universidade do Minho, a saber: PP e QQ, na sequência de solicitações da S... e ou da AM....
Três especialistas na área da engenharia mecânica de grande reputação científica elaboraram:
– o Relatório Técnico datado de Maio de 2006 que identificou o estado dos rolamentos SKF21309E e respectiva operabilidade;
– o Relatório Técnico datado de Setembro de 2006 que identificou o estado da caixa redutora 445H e a contaminação de lubrificantes.
A Testemunha prestou um depoimento isento, rigoroso e totalmente desinteressado do desfecho da causa. Reconheceu o Relatório, fez um esforço para convocar a memória quanto a aspectos do caso concreto.
Mereceu elevada credibilidade e foi decisivo para a boa compreensão do vertido nos Relatórios juntos aos autos, tendo o Tribunal ficado convencido do seguinte: o sentido e o alcance das considerações vertidas nos Relatórios são bem diferentes dos alegados pela Autora.
Primus, os Relatórios de fls. 27 e ss. e 31 e ss. dos autos visaram identificar problemas – cf. Ponto 2 “Objectivos” – a detectar no funcionamento do BRS#3, relacionados, concretamente, com a degradação rápida e acentuada dos rolamentos SKF21309E, que eram os responsáveis pelo posicionamento radial do cilindro/porta de entrada; assim como com o funcionamento da caixa redutora 445 H, que acusava lubrificantes contaminados.
Secundus, os Relatórios de fls. 27 e ss. e 31 e ss. dos autos visaram apontar soluções a partir dos resultados obtidos, o que ficou vertido no Ponto “Comentários e sugestões finais”, tendo sempre como foco aqueles concretos problemas de engenharia mecânica.
Para os autores dos Relatórios, o BRS#3, em Maio de 2006, apresentava um funcionamento defeituoso, atentos os dados objectivos contidos na Figura 4, que mostra, para os vários pontos, os resultados relativos à amplitude média do movimento radial/oscilação devido à excentricidade dos cilindros (BRS#3 e BRS#1).
O BRS#3 apresenta valores de amplitude radial superiores ao BRS#1 e a zona considerada crítica localiza-se entre os pontos A e D. A partir da análise da degradação dos rolamentos e dos conceitos de excentricidade, de eixo do rolamento e do cilindro concêntricos, foi detectado um desvio de funcionamento em relação aos eixos mecânicos.
Porém, a Testemunha desconhecia o nível de excentricidade admitido em projecto, não soube responder se teve acesso ao projecto, ou relatório de montagem, para verificação formal da montagem, o que fragilizou o segmento do Relatório de acordo com o qual: a montagem do BRS#3 foi realizada sem ter em consideração todos os requisitos e especificações técnicos do projecto, nomeadamente no que diz respeito ao seu alinhamento.
A Testemunha confirmou a degradação rápida e acentuada dos rolamentos SKF 21309, e o Tribunal ficou convencido do relatado nos Comentários e Sugestões Finais de fls. 36 dos autos. Com efeito, existem pontos mecânicos com diferentes fontes de alimentação, no caso, lubrificantes. Existem duas zonas de lubrificação, que são independentes, uma líquida e outra sólida. A fuga e fusão de lubrificantes levou à contaminação de massa. Esta constatação aliada ao número de horas de funcionamento da caixa redutora levou a um desgaste maior do que o esperado dos elementos que constituem a caixa redutora, uma vez que existem partículas metálicas em teor bastante elevado.
Estando o lubrificante contaminado, o funcionamento da caixa redutora leva a um desgaste superior ao esperado da caixa redutora, já que o objectivo de lubrificação não é alcançado.
A Testemunha não identificou, porém, a causa dessa contaminação, ficando o Tribunal sem saber se o problema se prendia com a concepção, construção, montagem ou manutenção do maquinismo.
O profundo conhecimento da Testemunha sobre este tema, a espontaneidade e assertividade do depoimento, convenceu o Tribunal que:
– como qualquer sistema mecânico, se a máquina for alimentada com uma quantidade superior à programada (sobrecarga de resíduos tratados), vai ocorrer uma sobrecarga dos órgãos que constituem o maquinismo, designadamente, daqueles que dão apoio e, por conseguinte, um maior desgaste;
– como qualquer sistema mecânico, a falta de manutenção leva a um maior desgaste dos órgãos que constituem o maquinismo;
– como qualquer sistema mecânico, quanto mais horas funcionar um maquinismo em condições anómalas, maior é o seu desgaste.
Assim, pese embora ter merecido elevada credibilidade, o depoimento desta Testemunha não contribuiu para o convencimento do Tribunal quanto à causa da excentricidade e/ou da contaminação dos lubrificantes, que tanto pode estar relacionada com a montagem como com o funcionamento.
II, Director da V..., Engenheiro, que acompanha desde 1992 empresas voltadas para o tratamento de resíduos, designadamente a V... desde 1997. Acompanhou, na qualidade de Responsável pela Operação, a execução do contrato celebrado em 1999, em discussão nos presentes, até 2007.
Ao longo do seu depoimento, a Testemunha demonstrou conhecimento dos factos em discussão nos presentes autos, não só respondeu com rigor e precisão às questões que foram sendo colocadas, como circunstanciou todos os factos, de forma espontânea, designadamente no tempo, a merecer elevada credibilidade por parte do Tribunal face à ausência de contradições do depoimento prestado com o teor das comunicações juntas aos autos e que resultam do probatório.
Prestou um depoimento seguro, lógico, sucinto mas completo.
A descrição inicial que a Testemunha apresentou em juízo demonstrou conhecimento pleno do contrato em discussão, enunciou as partes do contrato de empreitada, os objectivos definidos e respectivos equipamentos.
Não se detectou qualquer incongruência entre as declarações prestadas em juízo e o teor dos documentos, em particular, com o do Protocolo assinado em 2005, referindo com rigor as obrigações daí decorrentes quer para a AM..., quer para A.... Participou na reunião realizada a 18/11/2005 – cf. Acta n.º ....
Convenceu o Tribunal que cumpria à V..., num primeiro momento, realizar os trabalhos de correcção da revolvedora automática de composto, tendo sido solicitado à AM... o avanço dos trabalhos a seu cargo, o que não se verificou, pelo que parte dos trabalhos relacionados com a correcção da revolvedora automática de composto ficaram comprometidos, exactamente por falta de cumprimento das obrigações da AM....
Ficou o Tribunal esclarecido de que a Ponte Formadora da Pilha de Composto e a Revolvedora Automática de Composto são dois maquinismos, mas não funcionam em moldes independentes, complementam-se em termos de desempenho, pelo que, em parte, a reparação da segunda dependia da reparação da primeira.
Identificou trabalhos que não foram realizados pela AM...: reparação do sistema de ventilação das pilhas, reparação da Ponte Formadora de Composto e trabalhos eléctricos importantes, indispensáveis para a conclusão dos trabalhos pela V....
Relativamente ao BRS#3, demonstrou ter conhecimento do teor dos Relatórios Técnicos elaborados pela Universidade do Minho, datados de 2006. Demonstrou igualmente possuir conhecimentos técnicos específicos de engenharia, tendo explicado, com espontaneidade e naturalidade, as razões que levaram A... discordar, em 2007, com as conclusões do Relatório da Universidade do Minho quanto à apontada excentricidade BRS#3.
A Testemunha manifestou discordância com a metodologia utilizada – escolha de pontos/locais onde foram efectuadas as medições de excentricidade – defendendo que as medições deveriam ter sido realizadas numa perspetiva de concentricidade a nível dos rolamentos. A Testemunha reiterou a posição assumida pela V... quando atribuiu a causa da gripagem dos rolamentos à falta de manutenção por ausência de lubrificante do equipamento, informação retirada a partir do histórico do próprio maquinismo.
Explicou com muita clareza que a caixa redutora 445H do BRS#3 é como o motor de uma viatura que reclama substituição de lubrificante a cada seis meses ou 5000 horas de funcionamento.
O BRS#3 começou a funcionar em 2003 e o estudo realizado pela Universidade do Minho verificou-se em 2006. A Testemunha destacou e reiterou ao longo do seu depoimento a importância de serem respeitadas as indicações de manutenção do construtor para evitar prejuízos sérios que podem comprometer o funcionamento do bioreactor (principalmente na caixa redutora que é o motor do equipamento), destacando a mudança atempada dos lubrificantes, que não chegou a ocorrer entre 2003 e 2006.
A partir da conjugação do depoimento desta Testemunha com os depoimentos das Testemunhas HH e BB, o Tribunal ficou convencido que o bioreactor recebeu, por dia, uma quantidade superior à prevista tendo em conta o seu dimensionamento.
Esta Testemunha acompanhou os trabalhos que estavam a ser realizados pela AM..., tendo constatado uma carga excessiva no BRS#3 tendo em conta o seu dimensionamento, sendo certo que, apesar do exposto, o maquinismo continua a funcionar.
A Testemunha confirmou que A... ficou surpreendida com as facturas emitidas, tendo-as reconduzido a dois grupos: um relacionado com o BRS#3 (facturas que rondam os 14.000 e 15.000 euros/mês) e outro com o aumento da exploração (facturas que rondam os 60.000 e 75.000 euros/mês), a incluir custos de exploração normais (electricidade, gasóleo).
A Testemunha confirmou que do Protocolo não resultava qualquer obrigação para a M..., tendo relatado com precisão e rigor o papel da M..., S.A., no Consórcio e no contrato de empreitada.
Da conjugação do depoimento desta Testemunha com o de BB, o Tribunal começou a formar uma firme convicção sobre a falta de competência do pessoal contratado pela S..., em especial, quanto ao BRS#3, equipamento que não se encontrava compreendido no objecto de concessão de exploração, bem quanto à RAC, o que veio a ser reiterado pela Testemunha AA, em total consonância com o teor dos documentos de fls. 359 e ss., 517 e ss., 536 e ss., tanto assim que as partes diligenciaram pela formação de pessoal para operar a RAC no contexto do Protocolo assinado em 2005.
O depoimento desta Testemunha também foi esclarecedor quanto aos diferendos que foram surgindo entre Dono da Obra, Consórcio Empreiteiro e Concessionária S.... Na exploração, a Concessionária S... não demonstrou a competência e experiência esperadas pela AM... e pela V....
O Protocolo de 2005, na verdade, teve por objectivo recolocar a Estação de Tratamento, no que concernia à ampliação, em condições de pleno funcionamento.
Quem detinha a exploração deveria manter atualizado um livro contendo os dados e informações sobre as manutenções efectuadas aos maquinismos.
Com efeito, as comunicações que resultam do probatório acompanham o depoimento da Testemunha quando afirmou que A... chamou várias vezes a atenção da AM... sobre as más condições de exploração por parte S.../S....
Temos que da prova produzida resultou i) falta de profissionais especializados a operar os maquinismos, (ii) falta de manutenção adequada do BRS#3, que terá contribuído para a poluição do óleo do motor e para a existência de massa e partículas metálicas.
Alicerçado no conhecimento directo, afirmou, convencendo o Tribunal, que a Estação de Tratamento nunca deixou de funcionar com três bioreactores e, bem assim, que o BRS#3 nunca deixou de cumprir o seu desiderato.
E, da prova global produzida em juízo, resultou que os esforços empreendidos pelos Outorgantes do Protocolo foram no sentido de restabelecer integralmente a funcionalidade de todos os maquinismos existentes na Estação de Tratamento concernente à ampliação decorrente do contrato de empreitada. Sucede que não chegaram a ser realizados os ensaios previstos no ponto 4 do Protocolo uma vez que os trabalhos não foram concluídos.
JJ, Engenheiro, com experiência em matéria de tratamento resíduos e de água. Profissional independente. Não demonstrou ter conhecimento directo dos factos em discussão nos autos. A... solicitou uma opinião técnica, para o que consultou o plano de execução e leu o Relatório Técnico elaborado pela Universidade do Minho. Fez uma resenha rigorosa do processo de tratamento do lixo indo ao encontro das descrições anteriores, não se tendo detectado qualquer contradição, designadamente quando enumerou as condições de utilização e manutenção indispensáveis para o bom funcionamento dos biorecatores, conservação dos maquinismos, assim como para obtenção de um produto final com qualidade.
Em matéria de conservação dos bioractores, a Testemunha destacou a necessidade de se respeitar as quantidades e o tipo de lixo a tratar pelo biorector, devendo-se evitar alimentar o bioractor com uma quantidade de resíduos superior à prevista e/ou com resíduos interditos, como é o caso de pedras, películas/plásticos, que podem bloquear o funcionamento do maquinismo.
Quanto ao mais, apesar dos conhecimentos demonstrados na matéria, o Tribunal não deu relevância ao depoimento desta Testemunha uma vez que não demonstrava ter conhecimento directo dos factos em discussão.
EE, Engenheiro Civil, funcionário da AM... desde Julho de 2003 até Dezembro de 2020, exercendo actualmente funções na Comunidade Intermunicipal por força da mobilidade.
Ao longo do seu depoimento, a Testemunha foi sincera, espontânea, demonstrou um discurso desinteressado do desfecho da causa e voltado para colaborar com o Tribunal na descoberta da verdade material, referindo sempre – com exactidão – a razão de ciência do seu conhecimento dos factos.
Por conseguinte, cabe ao Tribunal analisar o depoimento tendo em conta a razão de ciência invocada para cada segmento, evocando-se o que sustenta a convicção do Tribunal.
A Testemunha acompanhou exclusivamente a fase de construção civil da empreitada em discussão nos presentes autos, relativamente à qual nada havia a apontar, tal como resulta de todos os documentos juntos aos autos.
Já era indirecto o conhecimento dos factos relacionados com o BRS#3, bem como dos factos referentes a qualquer outro dos maquinismos, uma vez que nunca teve contacto com os equipamentos e tendo em conta que não tinha conhecimentos técnicos para apreciar questões de pura engenharia mecânica.
Todas as Testemunhas aludiram, directa ou indirectamente, à existência de divergências entre a AM..., V... e S.../S... relacionadas com a emissão de autos de recepção, libertação de garantias bancárias e outros assuntos discutidos em paralelo, impasses que as partes esperavam ultrapassar com a assinatura do Protocolo de fls. 37 e ss. dos autos.
Da conjugação de toda a prova produzida, em particular desta Testemunha, apesar das hesitações, o Tribunal ficou convencido de que o Auto de Recepção Definitiva de fls. 530 e ss. dos autos foi assinado na data da assinatura do Protocolo. Com efeito, a Testemunha assinou pela AM..., interveio no acto formal de assinatura do Protocolo e até se referiu ao Autor de Recepção Definitiva como sendo um anexo ao Protocolo, exactamente por ter sido assinado na mesma ocasião. Também nesse acto foi assinada a declaração de fls. 532 dos autos.
Por esta razão, o Tribunal afastou a data constante do documento – 19 de Setembro de 2004 – e julga provado o facto de o Auto de Recepção Definitiva ter sido assinado em 25 de Outubro de 2005.
Esta Testemunha confirmou a existência de um cronograma de trabalhos.
Pese embora ter participado nas reuniões realizadas em 14/13/2006, 21/03/2006, 28/08/2006, 27/9/2006 e 4/10/2006, nada acrescentou, com rigor, ao vertido nas respectivas actas.
Mas a Testemunha esclareceu que, em finais de 2008, inicia-se o processo de transição para a R....
DD, Jurista, Técnico Superior da Associação de Municípios desde 1998.
Sem ter conhecimento directo dos factos, a Testemunha apresentou um relato genérico da relação estabelecida entre a AM... e o Consórcio na sequência do Concurso Público para concepção e construção de melhoramentos e ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ....
A Testemunha não participou na elaboração do Protocolo nem esteve presente no acto formal de assinatura.
A única intervenção da Testemunha reconduziu-se à entrega do Auto de Recepção Definitiva e das garantias bancárias – cf. documento de fls. 530 e ss. dos autos, na sequência da assinatura do Protocolo. Este segmento do depoimento deu credibilidade ao depoimento da Testemunha EE.
Quanto ao mais, este depoimento nada acrescentou à descoberta da verdade material, porquanto, apesar da coerência, o depoimento assenta na opinião que a própria Testemunha foi formando a partir de informações e conversas ocorridas entre profissionais e funcionários com ligações à AM....
No entanto, foi esta Testemunha que explicou o sentido da expressão “custos incorridos” utilizada em todas as facturas que sustentam o pedido. Da conjugação de toda a prova testemunhal, resultou para o Tribunal que o BRS#3 nunca chegou a ser incorporado na concessão. Por conseguinte, os custos com a gestão e exploração do BRS#3 respeitantes à mão-de-obra, energia, manutenção, seguros, tratamento de lixiviados, entre outras operações não discriminadas, reclamavam um enquadramento. Todos os custos que não podiam ser absorvidos como custos da concessão, foram facturados à AM.... A Testemunha demonstrou conhecer a existência desses custos, participou e acompanhou o processo de enquadramento das despesas que nesta acção sustentam parte do valor da indemnização peticionada, na ordem dos € 5.952.273,75.
Da concatenação das facturas juntas aos autos com o depoimento prestado por II resulta inequívoco que o BRS#3 funcionou e a exploração dessa nova unidade ocorreu ininterruptamente, pelo menos, desde Outubro de 2005 a Janeiro de 2010 – cf. documento de fls. 577 e ss. dos autos.
Esta Testemunha confirmou que as garantias bancárias prestadas pela M... relativamente aos trabalhos de construção civil – Parte 2 – continuam em poder da AM..., pese embora a R... ter assumido a posição da Associação nesta concreta Estação de Tratamento.
AA, Engenheiro Mecânico, prestou serviços à V... desde 1993 até 2008, mantendo alguma colaboração com essa empresa até à actualidade.
Acompanhou a relação contratual, interveio várias vezes em nome e por conta da V... – cf. comunicação de fls. 296 e ss., 359 e ss., 360 e ss., 533 a 541 dos autos, 549 a 566 dos autos. Participou activamente na elaboração do Protocolo de fls. 37 e ss. dos autos, bem como em todas as reuniões realizadas entre 14/11/2005 e 25/10/2006. Este depoimento veio dar força à convicção que o Tribunal foi formando a partir do depoimentos das restantes Testemunhas, conforme resulta do exposto ao longo desta fundamentação. Sublinhou que A... tinha interesses comerciais em ver esta unidade de tratamento de resíduos a laborar em pleno, já que o BRS#3 era um maquinismo avançado, de elevado custo, assente em tecnologia muito desenvolvida e voltada para o tratamento dos resíduos orgânicos.
Confirmou que o bioreactor sempre funcionou, pese embora ter sido mal operado, quer por ter sido sobrealimentado, com quantidades de lixo superior a 120 toneladas/dia e/ou com introdução de lixo industrial, interdito. Igualmente mal operado pela falta de qualificação dos trabalhadores, que não tinham formação no que respeita à programação, quer pela falta de manutenção do maquinismo, dando como exemplo a falta de substituição do óleo de acordo com a indicação do fabricante.
Negou alguma vez ter tido conhecimento das facturas que sustentam o pedido.
Confirmou que os maquinismos se complementam em termos de desempenho e que a Revolvedora chegou a ser objecto de reparação logo após a AM... ter concluído os trabalhos de limpeza, tendo acrescentado que o sistema nunca chegou a funcionar em pleno, pelo que a reparação levada a cabo pela V... reportou-se à parte dos trabalhos possíveis nas condições que a AM... proporcionou. Destaca-se o que esta Testemunha escreveu no email de 24/3/2006, que muito contribuiu para o Tribunal estar seguro sobre a falta de mão de obra qualificada a operar os equipamentos – cf. documento de fls. 359 dos autos.
GG, Engenheiro Civil, trabalha desde 1988 para a E.../M....
Esta Testemunha prestou um depoimento sincero, com conhecimento directo no que respeitava aos trabalhos de construção já que os acompanhou quase diariamente. Confirmou a convicção já formada do Tribunal de acordo com a qual cabia à E... a realização dos trabalhos de construção do edifício e infraestruturas próprias, como era o caso dos esgotos. Por sua vez, cabia à V... os trabalhos que implicavam tecnologia, inovação, parte eléctrica.
Não só conhecia as garantias bancárias prestadas, como foi a pessoa que solicitou a libertação das mesmas por comunicação de fls. 372 dos autos.
Relativamente ao tema dos prejuízos, cumpre relembrar a posição que a Autora foi assumindo nos articulados e na audiência prévia realizada: desconsideração das facturas emitidas com data anterior à assinatura do Protocolo – 25/10/2005, posição que, aliás, originou decisão de desentranhamento de documentos.
Destaca-se: à luz do princípio do inquisitório o Tribunal determinou – oficiosamente – a junção dos documentos que constituíam anexo às facturas que sustentavam o pedido de indemnização.
Temos que o princípio da verdade material adquire uma especial relevância nas relações jurídico-administrativas, porquanto, a natureza administrativa da relação obriga tanto o ente público como o entre privado a agir segundo o bloco de legalidade, que defende equilibradamente quer o interesse público, quer o interesse privado, a reclamar do Tribunal, na fase de controlo judicial, uma instrução voltada para a defesa desse mesmo princípio, alcançado quando o empreiteiro realiza a obra em conformidade com o convencionado (e sem vícios), por um lado, e o dono da obra procede ao pagamento do preço e liberta as garantias bancária, por outro lado. Sinalagmaticidade desejada pelas partes quando celebram o contrato.
Por isso, entende este Tribunal que o “ónus da prova” (entendido num sentido objectivo: quem invoca um direito tem o ónus da prova dos respectivos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos), com aplicação privilegiada nas relações contratuais, não pode significar que – em momento prévio – as partes, o Ministério Público (quando intervém), e o juiz não tenham realizado todos os esforços instrutórios para o correcto julgamento dos factos relevantes para a decisão final.
O Tribunal cumpriu essa obrigação instrutória quando determinou: “Com referência a factos de que é licito conhecer (...), por alegados na petição inicial (cf. artigos 59.º e ss. e impugnados pelos Réus), o Tribunal, investido nos poderes probatórios conferidos pelo artigo 411.º do CPC e na sequência do depoimento acabado de prestar pela Testemunha CC, do qual resultou que as facturas de fls. 38 e seguintes eram remetidas à AM... sempre acompanhadas de outros elementos que não se detectaram nos autos, ordena-se – em prol do apuramento da verdade material e da justa composição do litígio – junção (...) dos aludidos documentos/elementos a detalhar/especificar os custos mencionados na descrição das facturas juntas aos autos e/ou que instruíam essas mesmas facturas, para o que a Autora fica desde já notificada.”, e bem assim apreciou todos os documentos compreendidos na PEN-USB apresentada pela AM... em cumprimento desse despacho.
Cumprido que foi esse esforço instrutório, temos que não se fez prova em juízo de custos extraordinários suportados ou a suportar pelo Dono da Obra directamente conexionados com defeitos apontados nos equipamentos, que se desconhece, inclusivamente, se são imputáveis ao Empreiteiro. Não se retira dos documentos se foram realizadas intervenções tendentes a manter os equipamentos em funcionamento ou prestados serviços para realização de trabalhos que os equipamentos deveriam ter efectuado automaticamente. Face à prova produzida e à ausência de prova quanto ao mais, ficou o Tribunal convencido que as despesas suportadas resultaram da gestão provisória da Nova Unidade e/ou da exploração do BRS#3, tal como foram sendo sucessivamente identificadas pela S..., e ainda da depreciação consequente do uso normal ou irregular por parte da Entidade (S.../S...) que operava a Estação de Tratamento, razões pelas quais se julgaram não provados os factos acima enunciados.
*
3.3. DE DIREITO
3.3.1. Enquadramento das pretensões formuladas pela Apelante
A autora, ora Apelante, na p.i., pediu a condenação do Consórcio no pagamento de uma indemnização de € 8.894.671,71, bem como da quantia a liquidar em execução de sentença nos termos do alegado no artigo 61.º da p.i., quantias estas acrescidas dos respetivos juros de mora. Na sequência da contestação apresentada pela V..., a Autora reduziu o valor da sua ação para a quantia de € 5.952.273,75. Por outro lado, de acordo com o alegado nos artigos 60.º e 61.º da p.i., os custos relativos às intervenções e manutenções extraordinárias no BRS#3 ascenderam a € 1.251.286,05, sendo que tal BRS#3 careceria ainda de uma profunda intervenção para que lhe fosse devolvida a plena funcionalidade, intervenção essa que não seria inferior a € 1.500.000,00.
O Tribunal a quo julgou a ação improcedente e absolveu as Rés, ora Apeladas, dos pedidos.
Na sentença recorrida, a 1.ª Instância, depois de referir que no caso sob julgamento são diversas e complexas as causas de pedir, a saber, (i) o contrato de empreitada sujeito ao RJEOP (artigo 1.º do Decreto-Lei 405/93, de 10 de dezembro) e o (ii) Protocolo de 25/10/2005, e de indicar que as mesmas têm de comum «alegados incumprimentos, pela Rés, de obrigações contratuais assumidas perante a Autora no âmbito da execução do contrato de empreitada», começou por assinalar que resulta do auto de receção definitiva relativo à Parte I da empreitada, «a contrario sensu» que essa Parte I «não apresentava deficiências, deteriorações, indícios de ruína ou falta de solidez, pelos quais devesse o Consórcio responder na qualidade de empreiteiro. É o que se retira dos termos vertidos no auto de receção definitiva, lavrado nos termos do artigo 209.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de Dezembro.». Como tal, entendeu a Senhora juiz a quo que a Autora, a partir daí não podia « invocar contra o Consórcio existência de vícios aparentes, que se revelam por sinais visíveis, detetáveis quer pela equipa de fiscalização, quer pela comissão de vistoria se tivessem usado de diligência normal, expectável para o exercício dessas funções, bem sabendo que no Auto de Receção Provisória constava três reservas relativas (i) à percentagem de humidade, (ii) à temperatura de higienização do composto e (iii) à capacidade de revolvimento no hall de maturação.»
Quanto à parte 2 da empreitada, a Senhora juiz a quo depois de sublinhar que os trabalhos objeto desta fase, foram objeto de vistoria em 08/11/2004, em cujo auto não foi feita qualquer reserva, nem assinaladas ou especificadas quaisquer anomalias, concluiu que nessa data se verificou a receção provisória da Parte 2, nos termos do artigo 198.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de dezembro, passando a contar-se a partir daí o prazo de garantia previsto no contrato – cláusula 11 do Caderno de Encargos – de dois anos para o equipamento e cinco anos para a construção civil.
Seguidamente, a Senhora juiz a quo invocou o regime do artigo 208.º do DL 405/93, de 12/11, para precisar que nos termos desse preceito, findo o prazo de garantia e por iniciativa do dono da obra ou a pedido do empreiteiro, era mandatório que se procedesse a nova vistoria de todos os trabalhos de empreitada para efeito de receção definitiva, concluindo que a AM... não cumpriu com esta obrigação a que correspondia um direito do Consórcio.
Lê-se na sentença que: «A AM... não fez cumprir este procedimento especial previsto no Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de dezembro, e sem realizar vistoria para efeitos de receção definitiva comunicou, por ofício datado de 20/11/2006, ao Representante do Consórcio E.../V..., o seguinte: “tendo em consideração as anomalias que, constantemente, têm ocorrido, e, oportunamente, comunicadas ao Consórcio que V. Exa. representa, junto da AM..., no que respeita ao processo acima referenciado, e de acordo com uma Peritagem Técnica que, para o efeito, mandámos elaborar, não estão reunidas as condições necessárias para se poder proceder, como seria desejável, à recepção definitiva da obra (...).
Neste contexto, torna-se necessário que o Consórcio E.../V... proceda às obras necessárias, de acordo com o resultado da Peritagem.”
Refere-se na sentença recorrida que esta posição da AM... sustentou-se em dois Relatórios Técnicos, elaborados e subscritos por docentes da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, cujas conclusões não foram aceites pelas Apeladas, as quais requereram « após longas conversações sobre eventuais causas de anomalias detetadas no BRS#3, mais propriamente em 25/11/2009 a realização de vistoria para efeitos de receção definitiva da empreitada que havia sido provisoriamente recebida em 2004, tendo-se provado que a comunicação foi recebida em 26/11/2009, não tendo merecido qualquer resposta por parte da AM..., que nunca chegou a promover a realização da vistoria destinada à elaboração do Auto de Receção Definitiva da Obra, referente à Parte 2.».
Partindo deste enquadramento, o Tribunal a quo, depois de apelar ao disposto no artigo 198.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de dezembro, aplicável ex vi artigo 208.º, n.º 3, desse mesmo diploma legal, de acordo com o qual resulta que “se o dono da obra não proceder à vistoria nos 22 dias [úteis] subsequentes ao pedido do empreiteiro e não for impedido de a fazer por causa de força maior ou em virtude da própria natureza e extensão da obra, considerar-se-á esta, para todos os efeitos, recebida no termo desse prazo”, concluiu, tendo em consideração que se mostrava esgotado o prazo de garantia de cinco anos, que a Parte 2 tinha sido recebida, para todos os efeitos, no termo desse prazo, ou seja, em 30 de dezembro de 2009.
De seguida, o Tribunal a quo fez a seguinte observação: «O caso que nos ocupa apresenta a seguinte singularidade: veio uma Entidade Pública solicitar a intervenção do Tribunal com vista a condenar o empreiteiro por eventuais deficiências que, por omissão dessa mesma Entidade Pública, não foram especificadas no momento próprio, anterior à via judicial, por quem tinha obrigação de possuir conhecimentos técnicos para o efeito ou assessorado por especialistas na matéria.».
Lê-se na sentença recorrida que: «Esta omissão violadora do artigo 208.º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de Dezembro, exclusivamente imputável à AM..., que não dirigiu o procedimento segundo a legalidade, não só violou o direito de pronuncia do empreiteiro sobre o tema: existência de deficiências, como conduziu à falta de notificação do empreiteiro para as reparações ou modificações necessárias, com fixação de um prazo para esse efeito, impede hoje o Tribunal de avançar com qualquer pronúncia sobre responsabilidade contratual por deficiências de execução, na medida em que desconhece se as deficiências ou vícios apontados nos Relatórios Técnicos, elaborados e subscritos por docentes da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, são imputáveis ao empreiteiro e/ou se não constituem depreciação normal consequente de uso (ou mau uso) dos maquinismos por quem geria e explorava.»- sublinhado nosso.
Quanto ás obrigações resultantes do Protocolo outorgado pela AM..., V... e C.../V.../O.../S..., o Tribunal a quo decidiu o seguinte:
«Extrai-se dos pontos 1 a 3 que o objecto do Protocolo é exclusivamente reconduzível à Parte 1 da Empreitada (Lotes 1.1, 1.2, 1.3 e 1.4), que foi integralmente recebida.
Por sua vez, os Outorgantes reconhecem que, pese embora o vertido no auto de recepção definitiva, não se encontrava completamente ultrapassada a situação que motivou as três reservas mencionadas no auto de recepção provisória, quanto: (i) à percentagem de humidade, (ii) à temperatura de higienização do composto e (iii) à capacidade de revolvimento no hall de maturação, acrescentando – no domínio da liberdade contratual – “sem embargo de nem uma nem outra se sentirem responsáveis pela subsistência da dita situação”.
Ora, estes considerandos afastam a aplicação do Decreto-Lei n.º 405/93, de 12 de Dezembro, ao Protocolo de 2005, apesar desta nova relação contratual, substancialmente administrativa, se encontrar umbilicalmente ligada ao contrato de empreitada de concepção/construção de melhoramentos e ampliação da ETRSU.
E por se tratar de uma relação contratual administrativa reclama do Tribunal a apreciação do pedido de indemnização sustentado no incumprimento/cumprimento defeituoso do Protocolo.
A AM... assumiu os custos de reparação da Ponte Formadora da Pilha de Composto, estimados em € 75.000,00, com inclusão de IVA, reparação a ser levada a cabo pelo fabricante daquele maquinismo, mediante promoção e supervisão da V...,
À AM... cabia proceder, a expensas suas e sob sua direcção, à reparação do Sistema de Extracção de Ar das Pilhas de Composto.
À V... cabia proceder, a expensas suas e sob sua direcção, à reparação da Revolvedora Automático do Composto.
Pertinentemente, resultou provado que, após assinatura do Protocolo, A... mobilizou especialista em Pontes Rolantes do Hall de Maturação, que compareceu no local da obra em menos de um mês após a assinatura do Protocolo, para fazer o diagnóstico das avarias, tendo aguardado quatro meses para que os equipamentos fossem limpos, trabalho necessário para que os especialistas pudessem fazer os diagnósticos dos problemas dos equipamentos.
Após, detectou-se composto empedernido no interior da tremonha (PFP) e que o sistema de alimentação eléctrico se encontrava destruído.
Para a V... iniciar a reparação da RAC era necessário energizar primeiro os motores eléctricos e hidráulicos para se elevar a máquina do pavimento e efectuar as reparações. Ficou A... a aguardar que a AM... adjudicasse e mobilizasse o seu empreiteiro de Electricidade e Controle para proceder às reparações das duas Pontes simultaneamente. Igualmente aguardou por outros trabalhos a cargo da AM..., a saber: lavagem de alta pressão da Ponte Formadora de Pilha, estufagem e controle dos motores eléctricos, alinhamento e soldadura dos rails e reparação das cames de controle, tudo no contexto da Ponte Formadora de Pilha.
Foram parcialmente concluídos os trabalhos relacionados com PFP.
Em Fevereiro de 2006, as partes discutiam distribuição de trabalhos relacionados com a limpeza de quadros eléctricos. Em Março de 2006, os quadros eléctricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos.
Em Agosto de 2006, e relativamente à Ponte Formadora de Pilha, continuava pendente a adjudicação dos trabalhos a cargo da AM... e as reparações eléctricas a cargo da TCPI (electricidade e controlo) estavam atrasados.
Foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação.
Em 26 de Setembro de 2006, iniciou-se o arranque da reparação da PFP, verificando-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TCPI (electricidade e controlo), quer a cargo da V....
Em Setembro de 2006, as partes diligenciavam pela formação do pessoal que iria operar a RAC.
A AM... adjudicou a parte mecânica da reparação da PFP à empresa J..., que previa a conclusão da obra para a semana de 6 a 10 de Novembro de 2006.
Apenas em finais de Outubro de 2006 é que A... apresentou o cronograma de trabalhos da LX....
Em Março de 2007, A... encontrava-se a efectuar o restabelecimento operacional do Hall de Maturação, solicitando a colaboração da AM... para adjudicação dos dois contratos: trabalhos de electricidade e controle para proceder às reparações das duas Pontes simultaneamente.
A AM... procedeu a trabalhos de reparação da Ponte Formadora de Pilha sem a supervisão da V..., sem simultaneidade com a reparação da Ponte de Revolvimento do Composto (RAC) e sem qualquer intervenção do Consórcio.
Em 22/10/2007, a Ré V... dirigiu à Autora uma comunicação, dando conta que foram realizados trabalhos de reparação das duas Pontes do Hall de Maturação:
– com desmontagem pela Tufama dos motores do RAC;
– com montagem pela Tufama dos motores do RAC depois de terem sido levados à estufa e controlados; verificação pela V... dos trabalhos de reparação mecânica da Ponte de Formação de Pilha, reiterando em Novembro de 2007 a necessidade de a AM... adjudicar a reparação da electricidade e controle da Ponte de Formação de Pilha;
– os técnicos da LX... e LX... e da Tufama procederam a lubrificações, substituição de peças usadas, sem que a AM..., apesar de previamente informada por email de 14/07/2007, diligenciasse pelo acompanhamento, designadamente, através da S... ou de qualquer empresa subcontratadas por estas (AM.../S...), bem como sem acompanhamento de quem iria, após restabelecimento do funcionamento, operar esta ... e, ainda, sem ser possível reunir com a A..., Lda.) que tinha sido mobilizada pela AM... para efectuar a reparação da electricidade e controlo da Ponte de Formação de Pilha.
Realizados os trabalhos que não se encontravam dependentes de trabalhos a executar pela Autora, A... deixou de ter condições – a partir de finais de 2007 – para continuar a proceder ao trabalho de reparação mecânica dos equipamentos.
Pese embora o acima exposto, os equipamentos foram colocados a funcionar sem realização dos trabalhos de electricidade e controlo, a cargo da Autora, e sem finalização dos trabalhos de reparação mecânica, a cargo da V....
Nunca chegaram a ser realizados os ensaios previstos no Protocolo.
Em momento anterior à entrada da petição inicial em juízo (22/02/2011), a Revolvedora Automática de Composto foi retirada da nave.
A partir de 2009, a concessão foi entregue à empresa R..., S.A.
É a partir destes factos provados que importa apreciar o alegado na petição inicial tendente à procedência do pedido, sendo certo que:
– não resultou que “a Autora cumpriu integralmente a sua parte no contrato”, uma vez que nunca chegaram a ser realizados os trabalhos de electricidade e controlo que se encontravam a seu cargo;
– não resultou que “outro tanto não aconteceu com A... e com o Consórcio”,
– antes resulta da factualidade provada que foram realizados os trabalhos que não se encontravam dependentes de trabalhos a executar pela Autora, deixando A... de ter condições – a partir de finais de 2007 – para continuar a proceder ao trabalho de reparação mecânica dos equipamentos.
Ainda assim os equipamentos foram colocados a funcionar, pese embora sem realização dos aludidos trabalhos de electricidade e controlo e, por conseguinte, sem finalização dos trabalhos de reparação mecânica.
A Autora alega cumprimento defeituoso que se integra no instituto do não cumprimento e corresponde a uma forma de violação dos deveres contratuais, sejam os mesmos principais, secundários ou meramente acessórios. No domínio do incumprimento, por força do disposto no nº 1 do artigo 799º do Código Civil, a culpa do devedor presume-se e este torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, face ao comando normativo inscrito no artigo 798º do mesmo diploma.
No caso em apreço, verificou-se a impossibilidade do cumprimento não imputável ao devedor/V... e Consórcio – cf. artigo 790.º, n.º 1, do CC, mas ao credor/AM....
A mera impossibilidade relativa da prestação (a difficultas praestandi) não extingue a obrigação, apenas a impossibilidade absoluta o consegue, que no caso se verificou a partir do momento em que a posição jurídica da AM... passou a ser assumida pela R....
Ponto é que a Autora nunca solicitou a condenação das Rés na execução de trabalhos que permitissem ultrapassar as questões relacionadas com (i) percentagem de humidade, (ii) temperatura de higienização do composto e (iii) capacidade de revolvimento no hall de maturação, mas a condenação no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos resultantes do alegado cumprimento defeituoso.
Ora, não só as Rés lograram afastar a presunção, fazendo prova uma mera impossibilidade relativa da prestação resultante do Protocolo, como o credor/AM... fracassou na prova dos factos tendentes à demonstração quer dos prejuízos que suportou, quer do nexo causalidade entre a falta de cumprimento integral do Protocolo e os danos, pois a responsabilidade do devedor pelo não cumprimento depende da verificação destes pressupostos, além do pressuposto atinente à culpa concreta ou presumida.
Não se provaram os alegados custos suportados pela Autora, por exemplo, pela substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efectuado autonomamente. Do mesmo passo, não se provaram prejuízos suportados pela Autora directamente relacionados com disfuncionalidade dos equipamentos, inclusivamente da RAC, cuja reparação cabia exclusivamente à V..., ou à falta de qualidade do composto devido à percentagem de humidade ou temperatura de higienização do composto ou falta de revolvimento no hall de maturação.
Mais, a AM... nunca levou ao conhecimento do Consórcio, ou das Empresas que o constituem, quaisquer custos ou prejuízos decorrentes da falta de cumprimento do Protocolo. Antes resultou provado que a Estrutura no seu todo aumentou o tratamento de resíduos sólidos para além da prevista, sem qualquer interrupção, nomeadamente, desde a celebração do Protocolo até à entrega da concessão à R..., S.A.
Por todo o exposto, o pedido formulado pela Autora será jugado totalmente improcedente.»
A Apelante não se conforma com a decisão assim proferida que julgou improcedente a ação movida pela autora, por via da qual pretendia obter a condenação das Rés a pagar-lhe uma indemnização pelos prejuízos alegadamente sofridos em consequência da má execução da “Empreitada de Concepção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ...”.
A Apelante assaca à sentença recorrida erro de julgamento sobre a matéria de facto, o que na tese por si perfilhada, tais erros levaram a que o Tribunal de 1.ª Instância julgasse erroneamente improcedente a ação, absolvendo as Apeladas do pedido.
Como enquadramento prévio aos erros de julgamento que imputa à sentença recorrida, a Apelante refere, nas respetivas conclusões de recurso, que na sequência da adjudicação da “Empreitada de Conceção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ... “, as Apeladas obrigaram-se a instalar um bioreator, designado de BRS#3.
Acontece, que desde o início existiram numerosas anomalias no BRS#3, nomeadamente, falhas no seu funcionamento, que perturbavam o seu rendimento, impedindo-o de alcançar os resultados e valores constantes no caderno de encargos do concurso.
Mais refere que, apesar da existência de vários defeitos, as Apeladas não só se mostravam incapazes de eliminar tais defeitos, como se recusavam a aceitar que os mesmos resultassem de defeito de conceção ou instalação. Daí que, face à existência de anomalias no BRS#3 tivesse sido elaborado um “Protocolo de acordo “, o qual veio a ser outorgado no dia 25 de outubro de 2005 entre a Apelante e as Apeladas, no qual as últimas reconheceram a existência de problemas na Empreitada, tendo, para o efeito, assumido obrigações e como contrapartida, sido estipulado que seriam libertadas as garantias bancárias que se encontravam na posse da Apelante.
A Apelante também afirma que o dito “Protocolo” surgiu como uma forma de ultrapassar obstáculos no cumprimento da “Empreitada de Concepção / Construção de Melhoramentos e Ampliação da Estação de Resíduos Sólidos do ... “ e, consequentemente, teve o intuito de proceder à correção das anomalias e defeitos existentes no bioreator BRS#3.
Adianta que esse “Protocolo” consistia num contrato ex novo no qual as partes assumiam um conjunto de obrigações.
Quanto ao objeto do presente recurso, a Apelante refere expressamente que o presente litígio resume- se a aferir se houve incumprimento das obrigações protocolares por parte das Apeladas- ver conclusão X.
E vaticina que perante os elementos constantes nos autos e produzidos em julgamento, este Tribunal ad quem não poderá alcançar outra conclusão se não a de que a Apelante observou e cumpriu na íntegra as obrigações que sobre ela impendiam e resultantes do Protocolo, enquanto as Apeladas incumpriram as obrigações a que estavam adstritas, originando avultados prejuízos à aqui Apelante.
As Apeladas, por sua vez, refutam qualquer responsabilidade nos alegados prejuízos que a Apelante alega ter sofrido. Ademais, a terem existido prejuízos decorrentes do funcionamento do bioreator BRS#3, os mesmos não lhes são assacáveis.
Ambas enfatizam que o protocolo celebrado em 25/10/2005 apenas respeitava a trabalhos incluídos na Parte I da empreitada em referência, não abrangendo o “Protocolo” nenhuma prestação relativa à Parte II dessa mesma empreitada.
Logo, nenhuma obrigação foi assumida pelas Apeladas, em relação ao bioreator BRS#3, por força desse “Protocolo”.
Sendo assim, antes de nos debruçarmos sobre os concretos erros de julgamento sobre a matéria de facto assacados à decisão recorrida, designadamente, para aferir sobre a utilidade do conhecimento desses erros, é primordial aferir qual é a abrangência das obrigações assumidas por via do protocolo celebrado em 25/10/2005, uma vez que, essa questão resulta de alguma forma confusa na sentença recorrida. Isto é, importa saber se o “Protocolo” celebrado no dia 25/10/2005 apenas incluía aspetos relativos à Parte I da empreitada ou se também abrangia obrigações decorrentes de trabalhos objeto da Parte 2 como preconiza a Apelante, e bem assim, se por via dele, o Consórcio, designadamente, a Apelada V... também assumiu obrigações relativamente ao bioreator BRS#3, trabalho incluído claramente na Parte 2 da empreitada, não obstante estarem ainda em curso os prazos contratuais de garantia, quer dos equipamentos, quer da obra relativos a esta fase.
Na sentença recorrida, em sede de direito, afirma-se expressamente que: «Extrai-se dos pontos 1 a 3 que o objeto do Protocolo é exclusivamente reconduzível à Parte 1 da Empreitada (Lotes 1.1, 1.2, 1.3 e 1.4), que foi integralmente recebida.» Porém, na motivação da decisão sobre a matéria de facto escreveu-se que : «O Protocolo de 2005, na verdade, teve por objetivo recolocar a Estação de Tratamento, no que concernia à ampliação, em condições de pleno funcionamento». E concluiu-se que:« da prova global produzida em juízo, resultou que os esforços empreendidos pelos Outorgantes do Protocolo foram no sentido de restabelecer integralmente a funcionalidade de todos os maquinismos existentes na Estação de Tratamento concernente à ampliação decorrente do contrato de empreitada. Sucede que não chegaram a ser realizados os ensaios previstos no ponto 4 do Protocolo uma vez que os trabalhos não foram concluídos.».
Nesse desiderato, importa começar por considerar o que se estabeleceu nesse “Protocolo” , cujo teor é o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Ora, a Apelante, como já se disse, pretende que este Protocolo visou também corrigir defeitos existentes no BRS#3, que integrava a Parte 2 da Empreitada, mas essa ilação não resulta, desde logo, do teor literal do protocolo. Mas vejamos.
Não é despiciendo começar por assinalar que na réplica apresentada pela Autora, aqui Apelante, de que se dá nota supra no relatório deste acórdão, a própria escreveu nessa peça, preto no branco, que:
(i) «O protocolo é corolário de intensas, demoradas e laboriosas negociações, sendo, com ele, objetivo da Ré V... que fosse elaborado auto de receção definitiva relativamente à parte da empreitada diretamente visada, a Parte I, e emitida declaração para libertação das garantias por ele prestadas».
(ii) na mesma data em que foi celebrado o “Protocolo” «foi entregue o auto de receção definitiva, que tem data anterior porque havia necessidade de o ter pronto à data em que fosse outorgado o protocolo…» ( ponto 19 da réplica).
Atentando nestas afirmações da Apelante, resulta assumido pela mesma que o referido Protocolo visava diretamente as obras relativas à Parte 1 da empreitada. Porém, somos em crer que daí não resulta que a mesma tenha admitido que o referido protocolo não incluísse nenhuma obrigação decorrente de problemas com trabalhos que pudessem estar incluídos na Parte 2 da empreitada. Aliás, segundo a Autora, ora Apelante, as obrigações assumidas no protocolo têm na sua génese a vontade das partes em superar problemas decorrentes de ambas as fases da empreitada.
Coligida a matéria de facto, provou-se que - alínea M dos factos assentes- a empreitada objeto de concurso foi dividida em 3 Partes que só poderiam ser adjudicadas, de acordo com os critérios de adjudicação, a um concorrente, sendo que essa divisão tinha como objetivo adaptar a execução dos trabalhos às capacidades financeiras e de financiamento da Entidade Adjudicante, podendo a respetiva execução ser diferida no tempo.
A empreitada em causa era constituída, assim, por três partes, sendo que para o objeto dos autos apenas relevam as partes que foram efetivamente executadas: (i) Parte 1-Melhoramentos; e (ii) Parte II- “Ampliação da capacidade de tratamento”.
Quanto aos trabalhos abrangidos pela Parte I desta empreitada provou-se - vide alínea N.1. dos factos assentes-, que os mesmos foram dados por concluídos em maio de 2002, tendo-se realizado a vistoria para efeitos de receção provisória em 19/07/2002, de cujo auto resulta que os trabalhos se encontram bem executados e de acordo com o caderno de encargos, tendo alguns dos resultados dos ensaios satisfeito os limites pré-estabelecidos, registando-se, porém, três reservas relativas (i) à percentagem de humidade; (ii) à temperatura de higienização do composto e (iii) à capacidade de revolvimento no hall de maturação. – vide alínea N.1.b do elenco dos factos provados.(sublinhado nosso)
Entretanto, em 25/10/2005, a obra correspondente aos trabalhos efetuados no âmbito da Parte 1 , que tinha já sido provisoriamente recebida com reservas em 19/07/2002, foi recebida definitivamente na sua globalidade – .vide alínea N.1.c) do elenco dos factos assente- constando do auto de receção definitiva, assinado por representantes da AM..., do GAT do ... e do Consórcio, o seguinte: “No período que mediou entre a data de conclusão dos trabalhos e a vistoria para receção definitiva foram realizados todos os ensaios previstos no Caderno de Encargos, que incidiram fundamentalmente sobre a capacidade de tratamento instalada, a qualidade do produto final obtido e o nível de odores gerados no funcionamento, ensaios esses presenciados pela fiscalização e cujos resultados, registados em relatórios próprios, reúnem as condições necessárias para aceitação do presente auto.
Face ao atrás exposto, considera-se que a obra poderá ser recebida definitivamente na sua globalidade.” – cfr. alínea N.1.d) dos factos assentes
Mais se provou- cfr. alínea N.1.e) do elenco dos factos provados- que todas as garantias referente à Parte 1 da empreitada foram libertadas em 25/10/2005 .
Ou seja, provou-se que quer a receção definitiva da obra, quer a celebração do “Protocolo”, quer a libertação das garantias relativas à Parte 1 da empreitada em referência, ocorreram no dia 25/10/2005.
É inquestionável que se atentarmos apenas no Considerando 5 desse protocolo, resulta do mesmo que aquele visou diretamente os trabalhos objeto a Parte 1 da Empreitada: «Apesar de recebida a obra, não se encontra completamente ultrapassada a situação que motivou as aludidas reservas, mas estando ambas as partes interessadas na sua rápida ultrapassagem, sem embargo de nem uma nem outra se sentirem responsáveis pela subsistência da situação».
Também é incontornável que na data da celebração do protocolo em questão, os únicos trabalhos/obra que tinham sido recebidos definitivamente, eram os que foram objeto da Parte 1 da empreitada e que apenas houve reservas em relação a estes, no respetivo auto de receção provisória. Logo, estamos perante facos que também apontam no sentido de que o Protocolo em causa se reportava diretamente à Parte I da empreitada. Mas repetimos, tal não exclui que algumas dessas obrigações não possam resultar de trabalhos incluídos na Parte II
De acordo com os factos provados, a Parte II da empreitada relativa a “ Ampliação da Capacidade de Tratamento”, compreendia o «sistema de compostagem acelerada, através de reator, para tratamento de 120 toneladas/dia (com uma variação de 10%) e o fecho, aspiração e desodorização dos gases saídos do equipamento proposto», tendo os trabalhos relativos à instalação de um terceiro bioreactor – “BRS#3” e respetivos trabalhos de apoio de construção civil – destinando-se a montar uma terceira linha de tratamento a acrescentar às duas já existentes, aumentando, assim, a capacidade instalada de tratamento de resíduos para a prevista no Caderno de Encargos-, sido objeto de consignação em 22/07/2002- vide alínea N.2.b) do elenco dos factos assentes.
Também se provou que todos os trabalhos relativos à Parte II foram objeto de receção provisória, no dia 08/11/2004, tendo sido lavrado o competente auto- vide alínea N.2.c) do elenco dos factos provados- no qual se declarou que:
« (…)Percorreu-se então toda a área objeto da PARTE 2 dessa Empreitada tendo-se vistoriado todos os trabalhos que faziam parte do Auto de Consignação. Recorde-se esta parte da Empreitada foi consignada em vinte e dois de julho de dois mil e dois e que os respetivos trabalhos são dados por concluídos na presente data deste Auto de Receção Provisória.
Como resultado desta Vistoria verificou-se que os trabalhos se encontram bem executados e de acordo com o Projeto de Conceção/Construção do Consórcio Adjudicatário.
No período que mediou entre a data de início da Fase de Exploração e a Vistoria para a Receção Provisória foram realizados todos os Ensaios previstos no Caderno de Encargos, que incidiram fundamentalmente sobre a capacidade de tratamento instalada e sobre a qualidade final do composto obtido, ensaios esses presenciados pela Comissão de Acompanhamento dos Ensaios e cujos resultados registados no Relatório Final da Fase de Exploração, datado de vinte e novo de outubro de 2004, reúnem as condições necessárias para a aceitação do presente Auto.
Em face do exposto considera-se que a Empreitada…-PARTE 2 poderá ser provisoriamente na sua globalidade.
(…)».
Ora, conforme resulta deste auto de vistoria de receção provisória subscrito por ambas as partes, nele não foi incluída qualquer reserva, ao invés do que sucedeu em relação ao auto de receção provisória das obras relativas à Parte 1 da empreitada, pelo que, as reservas a que se refere o Considerando 5 do protocolo não são relativas a esta Parte II. Porém, daí não decorre que os problemas cuja ultrapassagem se procurou garantir com a celebração daquele protocolo não pudessem decorrer de aspetos relativos aos trabalhos realizados no âmbito da Parte II da empreitada.
Em relação ao equipamentos, de acordo com o Caderno de Encargos o prazo de garantia era de dois anos, pelo que, quanto aos equipamentos incluídos nesta Parte 2 da empreitada, o mesmo terminava em 08/11/2006. Em relação à obra em si, o prazo de garantia era de cinco anos, pelo que o mesmo terminaria em 08/11/2009.
Logo, não pode senão concluir-se que quando foi celebrado o “Protocolo” de 25/10/2005, ainda estavam em curso os prazos de garantia dos trabalhos incluídos na Parte 2 da empreitada, quer quanto aos equipamentos, quer quanto á obra.
Porém, daí não pode concluir-se que o alcance desse “Protocolo”, não permitia integrar nele eventuais obrigações das Apeladas que fossem resultado de questões relativas aos trabalhos da Parte 2 da empreitada, dada a interligação entre ambas as fases.
O que é, quanto a nós, evidente, é que não estavam incluídos no protocolo problemas relativos a questões de eventuais erros na conceção/ instalação relativos ao equipamento “bioreator BRS#3”.
Neste sentido, veja-se o ofício datado de 20/11/2006, relativo ao bioreator BRS#3, que a AM... enviou ao Representante do Consórcio E.../V..., cujo teor é o seguinte: “tendo em consideração as anomalias que, constantemente, têm ocorrido, e, oportunamente, comunicadas ao Consórcio que V. Exa. representa, junto da AM..., no que respeita ao processo acima referenciado, e de acordo com uma Peritagem Técnica que, para o efeito, mandámos elaborar, não estão reunidas as condições necessárias para se poder proceder, como seria desejável, à receção definitiva da obra (...).
Neste contexto, torna-se necessário que o Consórcio E.../V... proceda às obras necessárias, de acordo com o resultado da Peritagem.” – cfr. alínea N.2.e) do elenco dos factos provados.
Esta posição da AM... sustentou-se em dois Relatórios Técnicos, elaborados e subscritos por docentes da Escola de Engenharia da Universidade do Minho, a saber: (i) “Análise Técnica das Condições de Funcionamento da Estação de Compostagem do ...” – Maio de 2006; (ii) “Inspecção Técnica das Condições de Lubrificação do Sistema de Accionamento BRS#3 – Caixa Redutora 445H da Estação de Compostagem do ...”- cfr. alínea N.2.f) do elenco dos factos assentes.
Ora, esta peritagem foi realizada já depois de celebrado o protocolo, tratando-se, por conseguinte, de uma realidade posterior ao momento em que foi celebrado o referido protocolo.
Ademais, a peritagem técnica aludida no ofício supra transcrito, foi realizada quando ainda estava em curso o prazo de garantia dos equipamentos da Parte 2 da empreitada, tendo em consideração que a receção provisória ocorreu no dia 08/11/2006, pelo que, tais anomalias, a verificarem-se, estavam a coberto do prazo de garantia contratual e não do protocolo.
Note-se, que logo no dia seguinte ao envio desse ofício, e em resposta, o Consórcio informou a Apelante que se propunha «verificar a peritagem técnica mandada elaborar por V. Exas. na sede da AM... na quinta 23/11/2006 pelas 10.00, tal como acabamos de acordar com os vossos serviços técnicos, na pessoa do Eng.º KK» – cfr. alínea HHH do elenco dos factos assentes.
Entretanto, em 18 de dezembro de 2006, A... informou a AM... que mobilizou a subcontratada P... para proceder à afinação e ajustamentos dos mecanismos de fecho da porta e de entrada do BRS#3, mas que tal não teria sido possível por falta de autorização da AM..., que a veio a conceder no dia 27 de dezembro – cfr. alínea III do elenco dos factos assentes.
Na sequência dessa comunicação, A... mobilizou a sua subcontratada P..., cujos técnicos: 1.confirmaram que os valores da excentricidade na zona da flange de entrada estavam dentro dos valores de projeto; 2. procederam a um reajuste da posição relativa da porta e da flange, no sentido de diminuir a carga sobre os roletes de apoio radial, que era relativamente elevada, recomendando que esta operação deveria ser encarada como de manutenção anual ou adotada quando se verificasse uma nova deterioração do comportamento; 3.salientaram, quanto ao valor da rugosidade referida no relatório técnico, que o mesmo não teria influência no conjunto, por tratar-se de superfície de contacto com os roletes e não diretamente dos rolamentos- cfr. alínea JJJ do elenco dos factos assentes.
Da conjugação destes factos, concluiu-se que as questões relativas a problemas técnicos com o referido equipamento – BRS#3- foram colocadas no âmbito da garantia contratual e não ao abrigo do protocolo de 25/10/2005.
Nesse sentido, aponta também a comunicação de abril de 2007, que a AM... dirigiu ao C.../V..., na qual se lê que: «No seguimento das comunicações 280/2006/GAT e 281/2006/GAT de 30 de Outubro de 2006, da AM... ao C..., relativamente à necessidade de reparação, ao abrigo da garantia contratual, da porta de entrada do BRS#3 que se encontrava avariada, o Consórcio fez deslocar ao local, no passado dia 8 de Janeiro, a empresa P..., para reparação da mesma.
Posteriormente, foi solicitado pela AM... à Universidade do Minho, um estudo sobre o BRS#3. Da vistoria ao local, e relativamente à porta de entrada do BRS#3, foi elaborado um relatório de onde se retiram os seguintes resultados:
A afinação efectuada aos tirantes da porta de entrada alterou a posição relativa entre a porta e o cilindro de compostagem provocando deste modo um contacto permanente entre a virola da porta de entrada e os calços situados na parte inferior do cilindro de compostagem, facto este que & comprovado pelo desgaste acentuado que se verificou existir tanto na virola da porta da entrada como nos calços do cilindro de compostagem.
Atendendo às reais condições de funcionamento da porta de entrada do BRS#3, pode concluir-se que o tempo de vida útil será menor do que o expectável.
Assim, podem retirar-se as seguintes conclusões:
A intervenção técnica que foi efectuada à porta de entrada no sentido de minorar/colmatar o problema do desgaste acentuado dos seus roletes de encosto introduziu outro problema, porventura mais grave, que foi o desgaste acentuado da virola e dos calços, já que a sua substituição não se apresenta fácil e será seguramente, dispendiosa.
Com este tipo de afinação dos tirantes da porta de entrada, o desgaste da virola e dos calços é tão acelerado que terão necessariamente de serem substituídos frequentemente para que o BRSK3 funcione adequadamente.
A única solução de carácter definitivo no sentido de colmatar a deficiência de funcionamento do BRS#3, nomeadamente da porta da entrada, passa pela re-montagem do cilindro de compostagem, desde a porta de entrada até, pelo menos, ao primeiro apoio.
Dado o exposto, solicitamos e V. Exas. a resolução urgente do problema ao abrigo da garantia contratual.
Mais se informa que o relatório encontra- se disponível na sede da AM... para consulta, caso seja necessário.»– cfr. alínea OOO. do elenco dos factos assentes.
Ademais, veja-se que na nessa sequência, em 31/05/2007, A... dirigiu à AM... uma comunicação, da qual, em parte, resultava:
“BRS#3 – Trommel
Inspeccionamos este equipamento com os nossos especialistas da V... e o Eng.º LL da S... e confirmamos as verificações feitas pela Universidade do Minho. Não estamos de acordo com as conclusões quando se afirma que há uma deficiência de montagem do Trommel. No nosso entender trata-se de uma operação de manutenção corrente que deverá ser executada pelo concessionário. Nesse sentido solicitamos o favor de consultarem o desenho BC 06 02 EQ 704 A (patente no dossier n.º 4 dos documentos transmitidos, poderemos fornecer uma nova cópia mediante a V. solicitação escrita) e procederem à reparação. Lembramos que este equipamento funciona a 2 turnos de há quase 4 anos a esta parte (15.000 horas de trabalho) pelo que é natural ter de se proceder à manutenção do mesmo nomeadamente à substituição de rolamentos mais solicitados.
BRS#3 – Porta de Entrada
Estudamos atentamente o relatório da Universidade do Minho e inspeccionamos este equipamento com os nossos especialistas da V... e o Eng. LL da S.... Estamos completamente em desacordo com as considerações e conclusões da Universidade do Minho e vamos proceder a uma afinação complementar dos tirantes da Porta de Entrada por forma a suavizar o funcionamento do BRS#3. Será fundamental a presença da S... durante esta operação por forma a serem assimiladas as diferentes regulações possíveis da Porta da Entrada do BRS#3.
Mais informamos do seguinte quanto ao BRS#3 – Porta de Entrada
1) A excentricidade medida pela Universidade do Minho de 17 a 18 mm está dentro dos valores de projecto de Concepção do Equipamento.
2) A virola de encosto na Porta de Entrada é de aço anti-desgaste ao manganês x120Mm12 que tem a característica de endurecer ao choque e atrito, evitando o desgaste da mesma.
3) Os calços montados na parte interior do cilindro de compostagem são vergalhões quadrados de desgaste e como tal deverão ser substituídos com o uso.
4) A situação actual é normal e aceitável, raspar ligeiramente não é problema porque os materiais de desgaste e protecção estão lá com essa função.
5) A vedação da Porta de Entrada do BRS#3 não está em causa nem o desgaste da virola de encosto da Porta da Entrada. Segurança de operação garantida.
A... – Reparação Elétrica da Ponte Formadora de Pilha
Infelizmente não foi possível reunir na ETRSU os nossos especialistas da V... com a A... no passado dia 18/05/2007. Da inspecção feita ao local não nos foi possível definir os trabalhos já efectuados. Assim solicitamos o favor de a A... nos informar do levantamento efectuado no local e da listagem dos trabalhos de reparação já efectuados e dos que pretendem efectuar. Em data a acordar nas semanas 25 e 26 (18 a 29/6/2007) vamos deslocar à ETRSU o nosso especialista LX... para reunir com a A... e definir claramente os trabalhos de reparação a efectuar na Ponte Formadora de Pilha de composto- cfr alínea PPP. do elenco dos factos assentes.
Da concatenação dos factos apurados e não impugnados, o que se extrai é que as Apeladas, ao longo do período em causa, foram realizando trabalhos no âmbito da empreitada em referência, uns decorrentes das obrigações assumidas por via do protocolo celebrado no dia 25/10/2005, outros por força das garantias contratuais ainda vigentes, por ainda estarem em curso os prazos de garantia da Parte 2 da empreitada.
De seguro, também se apurou que a Apelante, pese embora tenha realizado a receção provisória da obra referente à Parte 2 em 08/11/2004, não requereu, posteriormente, a realização de nenhuma vistoria para efeitos de receção definitiva, apesar de acusar a verificação de anomalias no bioreator BRS#3 que entendia serem imputáveis ao Consórcio,. Ao invés, decidiu solicitar a terceiros, a realização de uma peritagem técnica, com base na qual interpelou as Apeladas para que corrigissem as anomalias apontadas nesse documento. E ainda assim, a Apelada V... resolveu os problemas verificados com o bioreator BRS#3 que considerou serem-lhe imputáveis, não aqueles que teve o cuidado de sinalizar serem a consequência de problemas atinentes ao modo como a Apelante operou com os equipamentos em causa.
É sugestivo que em nenhuma das referidas comunicações estabelecidas entre as partes, a propósito dos problemas com o bioreator BRS#3, se invoca o “protocolo”, antes, numa das comunicações enviadas pela Apelante à Apelada V... , o que se surpreende é uma alusão à “garantia contratual” como fonte de obrigação para o Consórcio.
Ora, em boa verdade, o que se extrai da matéria de facto, é que as questões relativas ao bioreator BRS#3 estavam a ser tratadas a coberto da garantia contratual, sem prejuízo dos trabalhos que estavam em curso ao abrigo das obrigações assumidas com a celebração do “Protocolo” de 25/10/2005.
Provou-se ainda, que em 25/11/2009, o Consórcio requereu a realização de vistoria para efeitos de Receção Definitiva da Empreitada, Parte 2, que havia sido provisoriamente recebida em 08/11/ 2004, mas a Apelante, não obstante ter recebido essa carta em 26/11/2009, não deu nenhuma resposta a essa solicitação, não tendo promovido a realização da vistoria destinada à receção definitiva da obra- cfr. alíneas N.2.g), N.2.h),N.2.i), N.2.j) do elenco dos factos assentes.
Aqui chegados, conjugada toda a factualidade provada, a mesma força a que se conclua que aquele Protocolo foi celebrado por causa da necessidade de acautelar problemas relativos ao funcionamento da estação de tratamento, referindo-se diretamente a problemas ligados à obra incluída a Parte 1 da empreitada, que foi rececionada definitivamente nessa mesma data ( do protocolo). Quanto à Parte II, na data em que foi outorgado o dito “Protocolo” ainda estava a decorrer o prazo de garantia de dois anos para os equipamentos incluídos nesta fase e de cinco anos para as obras, pelo que, qualquer anomalia da responsabilidade das Apeladas estaria a coberto da garantia. Daí que, a Apelante, tenha enviado às Apeladas o ofício datado de 20/11/2006, onde na sequência das alegadas anomalias no funcionamento do BRS#3, e dos resultados da peritagem técnica que mandou efetuar informou aquelas que «.. não estão reunidas as condições necessárias para se poder proceder, como seria desejável, à recepção definitiva da obra (...).», interpelando-as a que procedessem às obras necessárias. Ora, esta atuação não é consentânea com a existência de um “Protocolo” outorgado entre Apelante e Apeladas, que incluísse todas as responsabilidades das Apeladas em relação à Parte II da Empreitada, uma vez que se assim fosse, não haveria necessidade de advertir as Apeladas para a impossibilidade da receção definitiva dessa Parte II da empreitada, sequer de tais anomalias terem determinado a realização de uma peritagem técnica, conquanto estas anomalias já teriam sido sinalizadas no referido protocolo como obrigação das Apeladas. Porém, é inegável, tal como também foi o entendimento do Tribunal a quo, expresso na motivação da decisão sobre a matéria de facto que « O Protocolo de 2005, na verdade, teve por objetivo recolocar a Estação de Tratamento, no que concernia à ampliação, em condições de pleno funcionamento.», resultando da prova global produzida em juízo que « que os esforços empreendidos pelos Outorgantes do Protocolo foram no sentido de restabelecer integralmente a funcionalidade de todos os maquinismos existentes na Estação de Tratamento concernente à ampliação decorrente do contrato de empreitada. Sucede que não chegaram a ser realizados os ensaios previstos no ponto 4 do Protocolo uma vez que os trabalhos não foram concluídos.»
Ou seja, não se pode excluir que algumas das obrigações assumidas pelos outorgantes com a celebração desse protocolo tenham na sua génese problemas também eles decorrentes dos trabalhos objeto da Parte 2 da empreitada.
Posto isto, vejamos se assiste razão à Apelante nos erros de julgamento que impetra à decisão recorrida.
b.1. dos critérios impostos à Apelante recorrente em sede de impugnação da matéria de facto.
Com a reforma introduzida pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, ao CPC, o legislador introduziu o registo da audiência de discussão e julgamento, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes o duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, de modo que a alteração da matéria de facto, que no anterior regime processual era excecional, passou a ser uma função normal da 2.ª Instância. Foi propósito do legislador que o tribunal de segunda instância realize um novo julgamento em relação à matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta expressamente do disposto no art.º 662º, n.º 1 do CPC, quando nele se expressa que a “Relação” deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento supervenientes impuserem decisão diversa.
Como vem sendo repetidamente afirmado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, quer do Supremo Tribunal de Justiça, na sequência daquelas alterações, são de rejeitar todas as interpretações minimalistas do enunciado art.º 662º que, refugiando-se nas dificuldades relacionadas com a audição dos depoimentos testemunhais captados sem registo de imagem, com prejuízo do princípio da imediação (prejuízo esse que, aliás, é uma realidade), se limitam a fazer um controlo meramente formal da fundamentação vertida pelo tribunal a quo, assim como aquelas que se limitam a fundamentar, de forma genérica, sem referência aos concretos meios de prova e a conectá-los entre si e com as regras da experiência comum, isto é, sem fazer um novo julgamento, por forma a demonstrar o acerto ou desacerto da decisão proferida pelo tribunal a quo em relação à matéria impugnada em sede recursória. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI..
Perante as regras positivas enunciadas na atual lei processual civil, tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, o Tribunal de 2.ª Instância deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo, nessa tarefa, considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, tudo da mesma forma como o faz o juiz da primeira instância.
Como verdadeiro tribunal de substituição, a 2.ª Instância aprecia livremente as provas produzidas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).
Nessa sua livre apreciação, a 2.ª Instância não está condicionada pela apreciação e fundamentação do tribunal recorrido uma vez que o objeto da apreciação em 2ª instância é a prova produzida, tal como na 1ª instância, e não a apreciação que a 1ª instância fez dessa mesma prova, podendo e devendo na formação dessa sua convicção autónoma, recorrer a presunções judiciais ou naturais nos mesmos termos em que o faz o juiz da primeira instância Ac. RG. de 01/06/2017, Proc. 1227/15.6T8BGC.C1, in base de dados da DGSI..
Contudo, importa não perder de vista que não foi propósito do legislador que o julgamento a realizar pela 2.ª Instância em sede de matéria de facto se transforme na repetição do julgamento realizado em 1.ª Instância, sequer admitir recursos genéricos, e daí que tenha imposto ao recorrente, em sede de impugnação da matéria de facto, o cumprimento dos ónus que enuncia no art.º 640º do CPC, pelo que se mantém o entendimento que o tribunal de 2ª instância deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto António Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 4ª ed., 2017, pág. 153., estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Acresce que tal como se impõe ao juiz a obrigação de fundamentar as suas decisões, também ao recorrente é imposto, como correlativo do princípio da auto -responsabilidade e dos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o seu recurso, demonstrando o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desses ónus, indicar não só a matéria que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, se impunha que tivesse sido proferida e os concretos meios de prova que reclamam essa solução diversa.
Deste modo é que o art. 640º, n.º 1 do CPC, estabelece que “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Depois, caso os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (al. a), do n.º 2 do art. 662º).
Note-se que cumprindo a exigência de conclusões nas alegações a missão essencial da delimitação do objeto do recurso, fixando o âmbito de cognição do tribunal ad quem, é entendimento jurisprudencial uniforme que, nas conclusões, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados.
Já quanto aos demais ónus, os mesmos, porque não têm aquela função delimitadora do âmbito do recurso, mas se destinam a fundamentar o recurso, não têm de constar das conclusões, mas sim das motivações.
Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes ob. cit., pág. 155., sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente:
a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos.
O cumprimento dos referidos ónus tem, como alerta Abrantes Geraldes, a justificá-la a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da 2.ª Instância, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações. É que só na medida em que se conhece especificamente o que se impugna e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a parte contrária a poder contrariá-lo em sede de contra-alegações.
A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação da matéria de facto deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de auto- responsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo” Abrantes Geraldes, in ob. cit., pág. 159.
No mesmo sentido vide Acs. S.T.J. de 18/11/2008, Proc. 08A3406; 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P.S1; 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1.S2; 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, todos in base de dados da DGSI..

Por último, precise-se que porque se mantêm em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, o uso pela 2.ª Instância dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
A alteração da matéria de facto só deve, assim, ser efetuada pelo Tribunal de 2.ª Instância quando, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância. O que se acaba de dizer encontra sustentação na expressão “imporem decisão diversa” enunciada no n.º 1 do art. 662º, bem como na ratio e no elemento teleológico desta norma.
Deste modo, “em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e Reapreciação Sobre a Matéria de Facto”, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, vol. IV, pág. 609..
Ademais, dir-se-á ainda que, de acordo com uma orientação jurisprudencial que tem vindo a sedimentar-se na jurisprudência dos tribunais superiores e que também perfilhamos, “Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objeto da impugnação não for suscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24/04/2012 (proferido no Proc. nº 219/10.6T2VGS.C1; acessível in base de dados da dgsi.
É que “A reapreciação da decisão da matéria de facto visa obter um sustentáculo fáctico para uma certa solução para uma dada questão de direito, pelo que se a matéria de facto cuja reapreciação se requer é inócua à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, deve o tribunal ad quem indeferir essa pretensão, por força da proibição da prática no processo de atos inúteis” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19/05/2014,proferido no Proc. nº 2344/12.TBVNG-A.P1, acessível in base de dados da dgsi.
Também no sentido de que «De harmonia com o princípio da utilidade a que estão submetidos todos os atos processuais, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa», veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/3/2014, processo nº 1157/10.8TJCBR.C1, acessível in base de dados da dgsi.
Igualmente no sentido de que, «Se da base instrutória constarem factos que não deviam, à luz duma seleção bem feita, ter sido nela incluídos, não deverão os mesmos, embora “respondidos” na decisão de facto da 1.ª Instância, ser alvo da reapreciação da Relação; num processo, tudo é comandado pelo direito, e por conseguinte e em termos factuais só deve ser apreciável e/ou reapreciável o que possa ter algum relevo jurídico», veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 21/1/2014, processo nº 1117/09.1T2AVR.C1, acessível in base de dados da dgsi.
Também o Supremo Tribunal de Justiça aderiu a esta orientação das Relações, ao entender – no Acórdão de 17/05/2017, processo nº 4111/13.4TBBRG.G1.S1- que “Nada impede que o princípio da limitação dos atos, consagrado, no artigo 130.º do CPC, para os atos processuais em geral – que proíbe, enquanto manifestação do princípio da economia processual, a prática de atos no processo (pelo juiz, pela secretaria e pelas partes) – que não se revelem úteis para alcançar o seu termo - seja igualmente observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto, se a análise da situação concreta evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projete na decisão de mérito a proferir”.
Note-se que na vigência do CPC de 1961 (após a revisão operada em 1995/1996), também já se entendia que “Não sendo os factos relevantes para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, não se justifica a sua alteração, havendo motivo, nos termos do art. 712º, nº 1 do C.P.C.” – cfr. Acórdão do STJ de 27/01/2005, processo nº 04B3832, acessível in base de dados da dgsi.
Vejamos, antes de mais, se ocorrem ou não os erros de julgamento sobre a matéria de facto que são apontados pela Apelante à sentença recorrida.
b.1. do erro de julgamento quanto à matéria das alíneas TT,VV,XX e BBB do elenco dos factos provados.
Nos conclusões 30.º a 37.º das alegações de recurso apresentadas, a Apelante impetra à sentença recorrida erro de julgamento quanto á matéria dada como assente nas alíneas TT,VV,XX e BBB da respetiva fundamentação de facto da sentença.
Para tanto, sustenta que atendendo ao teor das atas números 7,9, 10 e 11, juntas com a p.i., a sua consideração deveria ter conduzido o Tribunal a quo a dar como provada a facticidade que pretende ver aditada, por também esta se encontrar vertida nesses documentos. Porém, o que se verifica é que o Tribunal a quo deu como provado menos do que aquilo que se extrai desses documentos.
Assim, a Apelante começa por se insurgir contra o julgamento efetuado quanto à alínea TT, na qual o Tribunal a quo deu como assente que:
«Em Março de 2006, os quadros elétricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos.» - cfr. conclusão 30.ª.
A Apelante entende que de acordo com o teor da ata n.º 7, documento no qual o Tribunal a quo se baseou para dar aquela matéria como provada, devia antes ter julgado provado que:
«Em Março de 2006, os quadros elétricos e restantes equipamentos já se encontravam limpos, tendo sido verificados, in loco, as condições indicadas como necessárias pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação.»- cfr. conclusão 31.ª.
Quanto à matéria da alínea VV, em que o Tribunal a quo deu como provada que « Em Agosto de 2006, e relativamente à Ponte Formadora de Pilha, continuava pendente a adjudicação dos trabalhos a cargo da AM... e as reparações elétricas a cargo da TCPI (eletricidade e controlo) estavam atrasados – cf. Acta n.º ... (28/8/2006).», a Apelante entende essa factualidade aí vertida foi erroneamente dada como provada. E isso, porque tal facto não se reporta à totalidade da informação contida na ata n.º 9 (28/08/2006), porquanto desconsiderou o seguinte excerto: “A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de Setembro, mesmo na ausência dos programas de trabalhos da parte elétrica.” - cfr. conclusão 32.ª.
Como tal, nessa alínea, antes deve ser dado como provado que: «Em Agosto de 2006, não obstante a ausência dos programas de trabalhos da parte elétrica, A... comprometeu-se a iniciar os trabalhos de reparação da RAC no dia 4 de setembro.»- cfr. conclusão 33.ª.
Pretende, ainda, que também foi insuficientemente dado como provado a matéria factual resultante da ata n.º ...0, pois o Tribunal a quo limitou-se a dar como provado no ponto XX que:
«Foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação.» - cfr. conclusão 34.ª. Contudo, em face da ata n.º...0, deveria ter dado como provado que: «Em Setembro de 2006, foram verificadas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação, encontrando-se reunidas as condições necessárias para que o Consórcio desse início às intervenções.»- cfr. conclusão 35.ª.
Ademais, sustenta que tribunal a quo deu como inadequadamente provada informação resultante da ata n.º ...1, porquanto somente considerou provado no ponto BBB. que: « Em Setembro de 2006, verificava-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TCPI (electricidade e controlo), quer a cargo da V... », e desconsiderou que na ata é mencionado que os atrasos dos trabalhos eram da responsabilidade da V...- cfr. conclusão 36.ª.
Ante o exposto, sustenta que sempre o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que:
«Em setembro de 2006, verificava-se atraso dos trabalhos quer a cargo da TPCI (eletricidade e controlo), quer a cargo da V..., sendo que os sucessivos atrasos dos trabalhos a cargo da V... eram da sua responsabilidade e causaram transtornos tanto ao normal funcionamento da ETRSU como à AM...”- cfr. conclusão 37.ª.

O que dizer?
Analisado o teor das referidas atas, confirma-se que o respetivo conteúdo incorpora a matéria que a Apelante pretende ver aditada em cada um dos pontos do probatório.
Acontece que, analisando a facticidade que a Apelante pretende ver aditada em cada uma das sobreditas alíneas do probatório, que tem respaldo no teor das referidas atas, o que se extrai é que o objetivo da Apelante com o aditamento dessa facticidade é que este Tribunal ad quem dê como provado que, tendo por referência as obrigações assumidas através do protocolo outorgado pelas partes em 25/10/2005, em setembro de 2006, « se encontravam reunidas, in loco, as condições indicadas pelo Consórcio para arranque das obras de restabelecimento de operação.».
A questão que se deve desde já colocar, na linha dos considerandos que acima efetuamos, é a de saber se o aditamento dessa matéria se afigura relevante para o conhecimento do mérito da causa, segundo as várias soluções possíveis de direito.
Ora, a resposta a essa pergunta é claramente negativa, conquanto, a demonstração de que em setembro de 2006 estavam reunidas as condições para que o Consórcio arrancasse com as obras de restabelecimento da operação, nos termos que resultam assumidos pela outorga do protocolo de 25/10/2005, não é a questão que está em discussão nos presentes autos e da qual depende a procedência ou improcedência da ação.
Na verdade, não está em causa, saber se os trabalhos e o cumprimento das obrigações assumidas, no dito “Protocolo”, quer pela AM..., quer pela V... se iniciaram ou não em determinada data, ou seja se iniciaram ou não em setembro de 2006, mas antes a questão de tais trabalhos não se terem concluído.
Como tal, como bem contra-alega a Apelada M..., bem ao inverso do almejado pela Apelante, a pretendida alteração da matéria de facto, complementando-a com a solicitada referência às “condições para iniciar o arranque dos trabalhos” da V..., revelar-se-ia, para além de desnecessária, uma vez que a sentença recorrida deu como provado que tais trabalhos se iniciaram, redundante, uma vez que, não estando tal circunstância em causa, nunca a sua menção expressa alteraria o que quer que seja no sentido da decisão tomada.
Ademais, as referidas atas referem-se a questões atinentes ás obrigações assumidas pelas Apeladas no âmbito do protocolo celebrado em 25/10/2005 e este, como se viu, embora não abrange as questões relativas a eventuais erros de conceção/instalação do BRS#3.
Nestes termos, torna-se desnecessário conhecer do mérito da Apelação, quanto a esta questão do putativo erro na apreciação das provas alegadamente cometido pelo tribunal “a quo” (art. 608º, nº 2, do actual CPC de 2013, aplicável às decisões dos tribunais superiores em matéria de recursos, ex vi do art. 663º, nº 2, do mesmo diploma), quanto à matéria das referidas alíneas.
b.2. do erro de julgamento decorrente de não constar dos factos assentes a matéria do ponto 38.º das conclusões de recurso.
A Apelante alega ainda que para além dos factos erroneamente dados como provados, sempre o Tribunal a quo deveria ter dado como provada a seguinte matéria, aditando aos factos assentes mais duas alíneas, a saber:
(i)«A AM... cumpriu as obrigações constantes do protocolo»; (ii) «O incumprimento das obrigações constantes do protocolo resultou da responsabilidade exclusiva da V... e do Consórcio».
Quanto a este pretendido aditamento de matéria aos factos assentes, dir-se-á, prima facie, que da seleção da matéria de facto não devem constar juízos conclusivos, mas factos ou acontecimentos concretos, i.é., acontecimentos da vida real.
Isso mesmo se extrai de forma lapidar do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/04/2019, proferido no processo n.º 306/12.6TTCVL.C1.S1, no qual se escreveu que:
«II – A seleção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos.
Caso contrário, as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante.
A bondade dessa operação de expurgação, quando realizada pela Relação, é suscetível de apreciação pelo Supremo Tribunal de Justiça, por constituir matéria de direito.»
Ora, no caso, a matéria em causa não encerra nenhum facto, nenhum acontecimento da vida real que como tal possa ser considerado, mas comporta antes juízos jurídico-conclusivos e como tal, por esta razão, nunca poderia essa matéria ser aditada ao elenco dos factos provados.
Não obstante, sempre se dirá, para que dúvidas não restem, que mesmo que tivéssemos procedido às alterações da matéria de facto reclamadas pela Apelante às alíneas TT,VV,XX e BBB do elenco dos factos provados, nunca se poderia concluir, como é a real pretensão da Apelante, que a AM... cumpriu as suas obrigações protocolares mas que o Consórcio, em especifico, A..., incumpriu as obrigações assumidas com a outorga desse protocolo.
Para assim concluímos, bastaria atentar nos factos que se quedaram como provados nas alíneas WW., XX., YY., ZZ., BBB. CCC., DDD., EEE., FFF, GGG., HHH., III., JJJ., KKK., LLL., MMM., PPP., QQQ., RRR., SSS., TTT., VVV., WWW., XXX. e MMMM.
Termos em que indefere o pretendido aditamento, soçobrando o invocado fundamento de recurso.
b.3. do erro de julgamento decorrente de não prova dos factos que constam dos ponto 1, 2 e 3 dos factos não provados.
A Apelante impetra ainda erro de julgamento à sentença recorrida quanto à matéria de facto, sustentando que o Tribunal a quo devia ter dado como provada a matéria vertida nos pontos 1,2 e 3 dos factos não provados.
Essa matéria é a seguinte:
«1. Quanto ao BRS#3, a Autora suportou despesas para diminuir a excentricidade do cilindro 3 ou pela reparação da caixa redutora 445H, ou despesas com a substituição de componentes decorrentes de solicitações mecânicas superiores às previstas no projeto, custos esses que ascenderam a € 1.251.286,05.
2. O BRS#3 continua a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.
3. No respeitante à nave de maturação, a Autora suportou custos com reparações ou manutenções extraordinárias e com a substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efetuado automaticamente, custos esses na ordem dos € 5.952.273,75.»
A Apelante considera que «No bom dos rigores e atenta os elementos probatórios carreados para os autos, o Tribunal deveria ter dado tais factos como provados. “- cfr. conclusão 40.ª.
Antes de mais, analisada a impugnação da matéria de facto operada pela recorrente, impõe-se reconhecer que a mesma cumpriu, em relação aos pontos 1 e 3 dos factos não provados, suficientemente com os ónus que sobre si impendiam e que acima se elencaram em sede de impugnação da matéria de facto, na medida que indica qual a concreta matéria de facto que, na sua perspetiva, devia ter sido dada como provada pelo tribunal a quo e que este deu como não provada, quais os concretos elementos de prova que suportam essa matéria de facto que devia ter sido considerada e dada como provada, e no que respeita à prova gravada, indica os concretos pontos do depoimento prestado pelas testemunhas que igualmente suportam, na sua perspetiva, a prova dessa matéria, transcrevendo, inclusivamente, os concretos excertos desses depoimentos que suportam essa matéria, pelo que, deste ponto de vista, nenhum obstáculo processual se levanta a que se conheça dessa impugnação.

Prima facie, a Autora pretende que se dê como provada, quanto ao bioreator BRS#3 que suportou despesas para diminuir a excentricidade do cilindro 3 ou pela reparação da caixa mecânicas superiores às previstas no projeto, custos esses que ascenderam a € 1.251.286,05.
Como fundamento probatório para a prova desta matéria invoca o depoimento prestado pela testemunha Engenheira BB, que comprovou a existência de excentricidades no bioreator e o relatório junto aos autos, elaborado pela Universidade do Minho, que confirma a existência de excentricidade no cilindro 3. Quanto ao custos de € 1.251.286,05 que teve de suportar com as diligências que teve de encetar perante esses problemas do reator, entende que os mesmos se encontram vertidos nas faturas que juntou aos autos.
Ora, considerando os elementos probatórios indicados pela Apelante, os mesmos não impõem julgamento diverso do que foi realizado pela 1.ª Instância, uma vez que, quer dos relatórios de inspeção técnica, quer de toda a prova testemunhal que foi produzida em sede de audiência de julgamento, não se logrou apurar a invocada excentricidade do cilindro 3, e as faturas juntas aos autos, como resulta das mesmas, não demonstram de forma alguma que os custos em que a Apelante alegadamente incorreu com o BRS#3 estivessem relacionados com a reparação do bioreator BRS#3, e menos ainda com a reparação dessa excentricidade.
Nesse sentido, veja-se que do próprio depoimento da testemunha FF, Professor Catedrático do Ensino Superior na área de Engenharia Mecânica que participou na elaboração dos Relatórios Técnicos de fls. 27 e ss. e de fls. 31 e ss. dos autos, ( outros dois elementos), extrai-se que: (i) o BRS#3, em Maio de 2006, apresentava um funcionamento defeituoso, atentos os dados objetivos contidos na Figura 4, que mostra, para os vários pontos, os resultados relativos à amplitude média do movimento radial/oscilação devido à excentricidade dos cilindros (BRS#3 e BRS#1);(ii) o BRS#3 apresenta valores de amplitude radial superiores ao BRS#1 e a zona considerada crítica localiza-se entre os pontos A e D. A partir da análise da degradação dos rolamentos e dos conceitos de excentricidade, de eixo do rolamento e do cilindro concêntricos, foi detetado um desvio de funcionamento em relação aos eixos mecânicos.
Porém, ouvindo o depoimento da referida testemunha, como bem concluiu a Senhora juiz a quo na fundamentação de facto da sentença recorrida, a mesma « desconhecia o nível de excentricidade admitido em projeto, não soube responder se teve acesso ao projeto, ou relatório de montagem, para verificação formal da montagem, o que fragilizou o segmento do Relatório de acordo com o qual: a montagem do BRS#3 foi realizada sem ter em consideração todos os requisitos e especificações técnicos do projecto, nomeadamente no que diz respeito ao seu alinhamento.»
Como desconhecia também a causa da contaminação da massa, de modo que se pudesse associar essa consequência com a com a conceção, construção, montagem ou manutenção do maquinismo.
Relevante foi também o depoimento da testemunha II, Director da V..., Engenheiro, que acompanha desde 1992 empresas voltadas para o tratamento de resíduos, designadamente A... desde 1997 e que, acompanhou, na qualidade de Responsável pela Operação, a execução do contrato celebrado em 1999, em discussão nos presentes, até 2007.
Em relação ao BRS#3, esta testemunha , que conhecia bem o teor dos Relatórios Técnicos elaborados pela Universidade do Minho, datados de 2006, e que tinha conhecimento de ciência sobre a matéria, não só discordou da metodologia utilizada nos mesmos, máxime, quanto á escolha de pontos/locais onde foram efetuadas as medições de excentricidade, sustentando que as medições deveriam ter sido realizadas numa perspetiva de concentricidade a nível dos rolamentos, como confirmou que o BRS#3 começou a funcionar em 2003, sendo que estudo realizado pela Universidade do Minho apenas ocorreu em 2006. Ademais, segundo esta testemunha, o modo de funcionamento do equipamento em causa tem de observar indicações de manutenção do construtor para evitar prejuízos sérios que podem comprometer o funcionamento do bioreactor (principalmente na caixa redutora que é o motor do equipamento), destacando a mudança atempada dos lubrificantes, que não chegou a ocorrer entre 2003 e 2006.
Ora, como bem expressou a Senhora juiz na motivação, com a qual aquiescemos, depois de ouvir a prova, « a partir da conjugação do depoimento desta Testemunha com os depoimentos das Testemunhas HH e BB, o Tribunal ficou convencido que o bioreator recebeu, por dia, uma quantidade superior à prevista tendo em conta o seu dimensionamento.
Esta Testemunha acompanhou os trabalhos que estavam a ser realizados pela AM..., tendo constatado uma carga excessiva no BRS#3 tendo em conta o seu dimensionamento, sendo certo que, apesar do exposto, o maquinismo continua a funcionar.
A Testemunha confirmou que A... ficou surpreendida com as facturas emitidas, tendo-as reconduzido a dois grupos: um relacionado com o BRS#3 (facturas que rondam os 14.000 e 15.000 euros/mês) e outro com o aumento da exploração (facturas que rondam os 60.000 e 75.000 euros/mês), a incluir custos de exploração normais (electricidade, gasóleo).
(…)
Da conjugação do depoimento desta Testemunha com o de BB, o Tribunal começou a formar uma firme convicção sobre a falta de competência do pessoal contratado pela S..., em especial, quanto ao BRS#3, equipamento que não se encontrava compreendido no objecto de concessão de exploração, bem quanto à RAC, o que veio a ser reiterado pela Testemunha AA, em total consonância com o teor dos documentos de fls. 359 e ss., 517 e ss., 536 e ss., tanto assim que as partes diligenciaram pela formação de pessoal para operar a RAC no contexto do Protocolo assinado em 2005.»
Em face do exposto, analisada a prova documental e a prova testemunhal produzida, nada impõe que seja alterado o julgamento de facto efetuado pelo Tribunal a quo, pelo que, forçoso é concluir pela não prova quanto à da invocada excentricidade do bioreator BRS#3.
Ademais, no que concerne às faturas juntas aos autos, nem as mesmas nem sequer os elementos justificativos juntos aos autos, fazem referência a quaisquer custos emergentes de reparações ou operações de manutenção levadas a cabo em virtude de deficiências inerentes ao equipamento instalado pela V... a e pelo Consórcio, não tendo sido sequer carreada para o processo qualquer prova documental e testemunhal quanto à existência de danos e prejuízos incorridos pela Autora.
Termos em que improcede este fundamento de recurso.
Quanto á matéria do ponto 2 dos factos não provados, a saber, “Em virtude do incumprimento contratual pela V... e pelo Consórcio, o BRS#3 continua a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.”, a Apelante não cumpriu os ónus impugnatórios uma vez que não cuidou de indicar quais os concretos meios prova a considerar que conduziriam à demonstração dessa facticidade.
Sempre se dirá, que da análise que efetuamos aos meios de prova que foram produzidos, inexiste qualquer suporte probatório que aponte no sentido de que o BRS#3 continue a necessitar de uma intervenção para lhe devolver a plena funcionalidade, a implicar uma despesa nunca inferior a € 1.500.000,00.
Improcede, assim, o invocado fundamento de recurso.
Por fim, quanto á matéria do ponto 3, o Tribunal a quo deu como não provado que: “O incumprimento contratual originou prejuízos para a Autora no montante de €5.952.273,75, referentes aos custos com intervenções e manutenções extraordinárias decorrentes das anomalias do BRS#3.”.
A Apelante discorda deste julgamento, e alega que estes danos, para além das faturas existentes nos autos, encontram fundamento no depoimento prestado pela testemunha Engenheiro CC, uma vez que no seu depoimento são abordadas as despesas e prejuízos que a AM... teve de suportar e dele resulta conhecimento direto sobre as faturas e prejuízos causados, devendo também, em abono desta tese, ser considerado o depoimento da testemunha DD quanto à definição de custos incorridos.
Prima facie, no que concerne às faturas, das mesmas não se retira qualquer elemento de prova quanto a custos assacáveis ao Consórcio, no caso, em particular, à V....
Coligidas essas faturas, as mesmas revelam as seguintes especificidades, como bem observa uma das Apeladas:
« a. Foram emitidas por uma terceira entidade – a concessionária da operação/exploração e manutenção dos equipamentos integrados na obra pública executada pela V... e pelo Consórcio;
b. Não foram dirigidas, endereçadas ou endossadas à V... e ao Consórcio, que supostamente seriam os seus devedores finais;
c. Reportam-se a serviços de operação/exploração e manutenção dos equipamentos;
d. Foram emitidas mensalmente ao longo de um período de faturação de 2005 a 2010;
e. Não se sabe se foram pagas, quando foram pagas, quem suportou o seu custo (os Municípios que fazem parte da AM...?) e em que proporção;
f. Não se sabe porque é que foram pagas e os fundamentos concretos para o respetivo pagamento;
g. Não se sabe se foram contabilizadas no balanço da AM... e, em caso afirmativo, de que forma foram contabilizadas.
4. Os descritivos que foram posteriormente juntos às faturas, na sequência da solicitação feita pelo tribunal na audiência do dia 3 de julho de 2019, vieram apenas comprovar aquilo que já havia sido dito à saciedade pela Ré na sua contestação. Está em causa o pagamento de montantes que literalmente são qualificados como «Custos Incorridos com a Exploração do BRS#3» (cf. descritivo das faturas constantes dos documentos n.ºs ...2 a ...5 da p.i.), ou como «Custos incorridos com cedência de mão-de-obra, energia, equipamentos, seguros, tratamento de lixiviados e operações diversas para a exploração da Nova Unidade» (cf. descritivo das faturas constantes dos documentos n.ºs ...05 a ...49 da p.i.).
5. Em nenhum passo destes descritivos ou dos justificativos inventariados nos autos se faz menção à reparação de eventuais defeitos subsistentes nos equipamentos ou nos componentes dos mesmos, decorrendo do respetivo texto que se trata de meros custos correntes de exploração e manutenção dos equipamentos, que são por isso inerentes à funcionalidade desses mesmos equipamentos em condições normais de exploração.
6. Do mero confronto com o teor de todos esses documentos resulta que as faturas e elementos justificativos juntos aos autos nem sequer fazem alusão, minimamente que seja, a quaisquer custos emergentes de reparações ou operações de manutenção levadas a cabo em virtude de deficiências inerentes aos equipamentos instalados pela V.... »
Em relação aos referidos custos, a verdade é que não existe prova documental que os suporte. Ademais, ouvida e analisada a prova testemunhal que foi produzida em audiência de julgamento, dela não resulta a confirmação desses danos. Aliás, as testemunhas ouvidas corroboraram antes que nenhumas das faturas juntas aos autos foram sequer apresentadas à V... e ao Consórcio.
Nesse sentido aponta-se o depoimento da testemunha Eng.º AA, na sessão da audiência e julgamento de dia 26 de junho de 2021:
Mandatário da Autora: Dr. RR [00:21:53] «Só outra coisa: tem ideia, fazia essa, no fundo…, a interface entre A... e a AM.... Tem ideia de faturas debitadas pela AM... à V...?» Testemunha: AA [00:22:08] «Nunca.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:22:09] «Nunca?» Testemunha: AA [00:22:10] «Nunca vi. Da AM... à V..., nunca vi.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:22:13] «Não?» Testemunha: AA [00:22:13] «Não…talvez tenham enviado uma altura, umas faturas que…eles falaram-me nisso, porque nós para fazer os testes precisávamos de composto. E, portanto, a AM... achou que nos podia vender esse composto. Ele estava lá, não é? E era a produção normal e não tinham quem lhe pegasse.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:22:41] «Escoamento, sim, no fundo…» Testemunha: AA [00:22:42] «Não, não tem escoamento.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:22:44] «Mas de faturas diretamente relacionadas com obras ou com intervenções de reparação e de…» Testemunha: AA [00:22:49] «Não, isso não, porque nós sempre que levamos a cabo, íamos fazendo as reparações, não é…também era por isso que eu lá estava, era uma assistência pós-venda. E aquilo que podíamos fazer e nos interessava fazer, porque a nós interessava-nos muito ter aquela unidade a funcionar.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:23:08] «Então ficou surpreendido quando surgiu esta ação, a pedir esta indemnização por…obras. Chegou ainda a contactar com isso, a ver essas faturas que serviram de base?» Testemunha: AA [00:23:19] «Mas isso são faturas normal da operação da fábrica, não tem nada a ver connosco, não é…Isso é a operação normal da S..., do dia a dia.» Mandatário da Autora: Dr. RR [00:23:29] «No fundo, entende, agora é a sua opinião, que a AM... tentou, no fundo, debitar à V..., é isso?» Testemunha: AA [00:23:35] «Eu o que entendi é que a AM... pegou na operação toda e agora vamos debitar à V.... Mas a operação não tem nada a ver com a fase de conceção, construção e formação e arranque, não é…que foi o que nós fizemos.»
Elucidativo é também o depoimento da testemunha SS, segundo o qual, a designação “custos incorridos” mencionada nas faturas é« já à longos anos utilizada pela estrutura interna da Autora para se referirem a custos que não estejam inseridos no âmbito da concessão, por outras palavras, tal designação reporta-se a prejuízos e despesas que extravasam a concessão, propriamente dita».
A testemunha indicada pela Autora, jurista dos seus quadros, apenas teve um conhecimento indireto dos factos, e nem sequer referiu que tais “custos incorridos” se devem ter por imputáveis à V... e ao Consórcio, pois o significado de tais dizeres será simplesmente o de que tais montantes não fazem parte do âmbito da concessão.
O facto desses “custos incorridos” não fazerem parte da concessão, não têm que ser suportados pela V... e o Consórcio.
Termos em que improcede o invocado fundamento de recurso.
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b.4. do mérito da decisão.
O que resulta dos factos provados, como se escreve na sentença recorrida, é que foram realizados os trabalhos que não se encontravam dependentes de trabalhos a executar pela Apelante, deixando a V... de ter condições, a partir de finais de 2007, para continuar a proceder ao trabalho de reparação mecânica dos equipamentos, tendo-se verificado, a impossibilidade do cumprimento não imputável ao devedor/V... e Consórcio – cf. artigo 790.º, n.º 1, do CC, mas ao credor/AM....
É certo que, como se refere na sentença recorrida: «A mera impossibilidade relativa da prestação (a difficultas praestandi) não extingue a obrigação, apenas a impossibilidade absoluta o consegue, que no caso se verificou a partir do momento em que a posição jurídica da AM... passou a ser assumida pela R....
Ponto é que a Autora nunca solicitou a condenação das Rés na execução de trabalhos que permitissem ultrapassar as questões relacionadas com (i) percentagem de humidade, (ii) temperatura de higienização do composto e (iii) capacidade de revolvimento no hall de maturação, mas a condenação no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos resultantes do alegado cumprimento defeituoso.
Ora, não só as Rés lograram afastar a presunção, fazendo prova uma mera impossibilidade relativa da prestação resultante do Protocolo, como o credor/AM... fracassou na prova dos factos tendentes à demonstração quer dos prejuízos que suportou, quer do nexo causalidade entre a falta de cumprimento integral do Protocolo e os danos, pois a responsabilidade do devedor pelo não cumprimento depende da verificação destes pressupostos, além do pressuposto atinente à culpa concreta ou presumida.
Não se provaram os alegados custos suportados pela Autora, por exemplo, pela substituição de trabalho que o equipamento deveria ter efectuado autonomamente. Do mesmo passo, não se provaram prejuízos suportados pela Autora directamente relacionados com disfuncionalidade dos equipamentos, inclusivamente da RAC, cuja reparação cabia exclusivamente à V..., ou à falta de qualidade do composto devido à percentagem de humidade ou temperatura de higienização do composto ou falta de revolvimento no hall de maturação.
Mais, a AM... nunca levou ao conhecimento do Consórcio, ou das Empresas que o constituem, quaisquer custos ou prejuízos decorrentes da falta de cumprimento do Protocolo. Antes resultou provado que a Estrutura no seu todo aumentou o tratamento de resíduos sólidos para além da prevista, sem qualquer interrupção, nomeadamente, desde a celebração do Protocolo até à entrega da concessão à R..., S.A.
Por todo o exposto, o pedido formulado pela Autora será jugado totalmente improcedente.»
Tendo em consideração a improcedência dos erros de julgamento que a Apelante impetra à sentença recorrida, e considerando que a Apelante não conseguiu demonstrar nenhum dos factos que invocou como fundamento para a procedência dos pedidos que formulou, impõe-se confirmar a decisão recorrida.
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IV-DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal Central Administrativo do Norte em negar provimento ao recurso interposto e, em consequência, confirma a sentença recorrida.
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Custas pela Apelante (art.º 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Porto, 24 de fevereiro de 2023

Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa