Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00220/10.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/12/2015
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Vital Lopes
Descritores:ALEGAÇÕES
NULIDADE PROCESSUAL
Sumário:1. Tendo havido junção ao processo de documentos com relevo probatório impunha-se a notificação das partes para alegarem – art.º 120.º do CPPT;
2. A omissão da notificação das partes para alegações, naquelas circunstâncias, porque susceptível de influir no exame e decisão da causa, constitui nulidade processual determinante da anulação dos pertinentes termos do processo (art.º 201.º do Código de Processo Civil (actual 195.º) e art.º 98.º n.º 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário).*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:P..., S.A.
Recorrido 1:EP..., S.A.
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE

1 – RELATÓRIO

P…, S.A., recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida da taxa no valor de 8.173,80€, correspondente ao aumento de seis mangueiras abastecedora, liquidada e cobrada pela EP – …, S.A., “ao abrigo do art.º15.º, n.º1 alínea l) do Decreto-Lei n.º13/71, de 23 de Janeiro, na redacção do Decreto-Lei n.º25/2004, de 24 de Janeiro.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:
a. O Tribunal a quo não notificou as partes para apresentarem alegações, nos termos e para os efeitos do Artigo 120º do CPPT, impedindo, por essa via, a Recorrente de exercer o seu direito ao contraditório quanto aos elementos constantes do processo administrativo o que configura uma nulidade processual, nos termos do Artigo 201º, nº 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 2º do CPPT;
b. A sentença recorrida reflecte a ausência de análise crítica sobre todos os elementos de prova constantes no processo administrativo, os quais são essenciais para provar a existência e os termos do pretenso facto tributário;
c. Nessa medida, a sentença recorrida é nula por não especificação dos fundamentos de facto, nos termos dos Artigos 123º, nº 2, e 125º do CPPT.
d. Com efeito, como resulta da análise dos pontos 1 a 3 da matéria dada por provada na sentença recorrida, a Entidade Impugnada verificou uma discrepância no número das alegadas mangueiras licenciadas e as existentes no Posto de Abastecimento localizado junto à EN 17, ao Km 54,700, no concelho de Tábua e notificou a Recorrente de um acto de liquidação devido pela alegada ampliação do referido posto de abastecimento.
e. A carta e o oficio referidas no ponto 2 da matéria dada como provada consubstanciam, respectivamente, a decisão definitiva de liquidação, aqui impugnada, e o projecto de decisão de liquidação remetidas à Impugnante, as quais conjuntamente com o requerimento da Impugnante constante de fls.52 a 55 dos autos constituem o procedimento tributário desencadeado pela Entidade Impugnada;
f. Nenhum destes documentos foi impugnado, pelo que não se compreende a razão pela qual apenas se deu por reproduzido, no ponto 3 da matéria dada como provada, a posição da Entidade Impugnada e não a posição da Impugnante, em violação dos Artigo 659º, nos 2 e 3 do CPC para concluir pela existência da alegada ampliação;
g. Da sentença recorrida não resulta a indicação do meio concreto de prova constante dos presentes autos, através do qual deu como provada uma alegada ampliação do Posto de Abastecimento em questão.
h. De acordo com a matéria dada como provada relatada na sentença recorrida não existe qualquer prova relativamente à existência de qualquer ampliação do posto de abastecimento de combustíveis, nem permite concluir quais as mangueiras em causa que devem ser alvo de legalização ou se as mesmas não estavam efectivamente licenciadas, nos termos e para os efeitos do 115º, nº 2 do CPPT.
i. Da análise do processo administrativo apenso aos autos não existe qualquer elemento de prova que permita chegar à conclusão de que se encontravam 13 mangueiras licenciadas, pelo que o Tribunal a quo não efectuou qualquer análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos violando os Artigos 76º, nº 1 da LGT e 362º e ss. do Código Civil.
j. O tributo em causa nos autos apenas se justifica pela verificação de dois factos, o licenciamento ex novo de um posto de abastecimento de combustíveis ou a ampliação do mesmo, conforme dispõe a alínea l), do nº 1 do Artigo 15º do Decreto-lei nº 13/71. Por outro lado, o critério de cálculo da taxa aqui impugnada respeita ao número de bombas abastecedoras de combustível e não de mangueiras.
k. Cabe à Entidade Impugnada em sede da impugnação judicial apresentada pela Recorrente, o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação, nos termos do Artigo 74º, nº 1 da LGT.
l. O Tribunal a quo não deve ater-se apenas às informações produzidas pela Entidade Impugnada e presumir uma alegada ampliação do posto de abastecimento de combustíveis em questão, sem verificar a existência dos pressupostos da liquidação, em prol da descoberta da verdade material, nos termos conjugados dos artigos 115º nº 2 do CPPT e 265º, nos 1 e 3, 266, nos 2, 3 e 4, e 519º do CPC.
m. Nessa medida, a douta sentença viola o princípio do inquisitório previsto nos artigos 99º, da LGT, e 13º, nº 1 do CPPT.
n. Por outro lado, face à fundada dúvida sobre a existência e quantificação da alegada ampliação do posto de abastecimento em causa, deveria o tribunal a quo ter declarado a presente acção procedente, ao abrigo do disposto nos Artigos 74º da LGT e 100º do CPPT.
o. A taxa de € 8.173,80 liquidada pela Entidade Impugnada carece, pois, de qualquer fundamento fáctico-legal.
p. Nessa medida, a sentença recorrida erra na apreciação da matéria de facto constante dos autos, o que constitui fundamento para o presente recurso.
q. Sobre a questão da incompetência absoluta geradora da nulidade assacada na impugnação, os diplomas legais que interessa aqui considerar e que directamente relevam para o caso são, basicamente, os identificados na sentença recorrida, na petição de impugnação e o Decreto-Lei nº 110/2009, que alterou as Bases aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 380/2007
r. Com efeito, a competência inicial para os licenciamentos e concessões de áreas de serviço e postos de abastecimento junto a estradas nacionais estavam no âmbito da JAE, nos termos dos Artigos 10º, nº 1 e 13º, nº 2, al. c), do Decreto-Lei nº 13/71.
s. Com a criação do InIR, este passou a deter a competência em causa, quer pela norma de assumpção das atribuições previstas no Artigo 3º, nº3, al. e) do Decreto-Lei nº 148/2007, de 27 de Abril, quer pela norma de transferência de atribuições do Artigo 23º, nº 2 deste diploma, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 132/2008, de 21 de Julho.
t. A EP - ..., E.P.E., foi transformada em sociedade anónima pelo Decreto-Lei nº 374/2007, de 7 de Novembro, e conservou a universalidade dos direitos e obrigações, legais e contratuais que integravam a sua esfera jurídica no momento da sua transformação, nos termos do seu Artigo 2º deste diploma.
u. A Impugnada é uma sociedade anónima, à qual é aplicável o regime jurídico do sector empresarial do Estado nos termos do Artigo 3º do Decreto-Lei nº 374/2007, pelo que quaisquer poderes e prerrogativas do Estado terão de resultar da aplicação directa de um diploma legal ou constar do contrato de concessão, como refere o Artigo 14º, nº 2 do Decreto-Lei nº 558/99, de 17 de Dezembro.
v. Actualmente, a Impugnada tem por objecto, a concepção, projecto, construção, financiamento, conservação, exploração, requalificação e alargamento das vias da rede rodoviária nacional, nos termos do Contrato de Concessão celebrado com o Estado, que consta do acima referido Decreto-Lei nº 380/2007.
w. As normas constantes dos Artigos 4º, nº1 e 10º, nº1 do Decreto-lei nº 374/2007, demonstram que a missão da Impugnada passou a estar delimitada e circunscrita às bases e ao contrato de concessão, assim se compreendendo a alteração da sua natureza jurídica.
x. Os nos 2 e 3 do Artigo 10º do Decreto-Lei nº 374/2007, estabelecem, de forma individual e taxativa, os poderes de autoridade que compete à Impugnada, relativamente às infra-estruturas rodoviárias nacionais que integrem o objecto da concessão, no sentido de zelar pela manutenção permanente de condições de infraestruturação e conservação e de salvaguarda do estatuto da estrada que permitam a livre e segura circulação.
y. Nessas normas não constam qualquer poder de licenciamento na área de de jurisdição pertencente à extinta JAE.
z. Considerando a letra e espírito das normas acima indicadas, é errada a conclusão singela constante da sentença recorrida de que as ..., SA é o último figurino que coube à então JAE e IEP, IP, com objecto e competências que haviam sido atribuídas às suas antecessoras.
aa. É a via que corresponde à EN 17 - junto à qual se localiza o posto de abastecimento dos presentes autos - que faz parte da concessão atribuída à Impugnada.
ab) O que justifica o pretendido licenciamento são as normas de salvaguarda da zona de protecção à estrada, como definido no Artigo 3º do Decreto-Lei nº 13/71.
ac) Como acima se sustenta, a EP, SA não tem quaisquer poderes e prerrogativas de autoridade - quer por via de disposição legal, quer por via do contrato de concessão celebrado com o Estado - quanto ao licenciamento de posto de abastecimento sitos nos terrenos limítrofes ao objecto da sua concessão.
ad) A admitir o raciocínio da sentença recorrida, seriam as normas que prevêem receitas provenientes de taxas - Artigo 10º, nº 2, alínea c) do Decreto-Lei nº 374/2007 - a justificar a competência da EP, SA para o pretendido licenciamento, o que é inadmissível.
ae) No momento da transformação da EP – E.P.E. em EP, S.A., as competências para o licenciamento de infra-estruturas ao longo das estradas nacionais já haviam sido assumidas pelo InIR.
af) Assim demonstra-se que as matérias relativas ao exercício de poderes que foram cometidos à extinta JAE pelo Decreto-Lei nº 13/71, de 23 de Janeiro, estão hoje atribuídos ao InIR, IP por força do Artigo 3º, nº3, al. e), e das normas de sucessão de atribuições previstas no Artigo 23º, nos 1 e 2 do Decreto-Lei nº 148/2007, de 27 de Abril alterado pelo Decreto-Lei nº 132/2008, de 21 de Julho.
ag) Em matéria de taxas e outras receitas, a regra da competência é a de que cabe ao InIR, nos termos do Artigo 3º, nº 4, al. a) do Decreto-Lei 148/2007, exercer os poderes do Estado, designadamente, para licenciar as áreas de serviço previstas na Base 33, nº 7, das Bases da Concessão da Rede Rodoviária Nacional à Impugnada.
ah) Daí que o Artigo 12º, al. d) do Decreto-Lei 148/2007, prevê como receita própria do InIR o produto das taxas de licenciamento.
ai) As taxas, emolumentos e outras receitas próprias desta entidade, nos termos do Artigo 13.º, n.º1, al. c) da Lei Orgânica da EP, S.A., aprovada pelo Decreto-Lei nº 347/2007, são apenas aquelas que se inserem no âmbito da sua actividade de concessionária. Já não, pois, aquelas que caem no âmbito ou como decorrência das atribuições do InIR.
aj) Nesta ordem de razões, o acto impugnado em 1ª instância é nulo pois padece do vício de incompetência absoluta, ou seja, a Impugnada praticou-o sem que tenha atribuições para tal, nos termos conjugados dos Artigos 1º e 2º, al. c) da LGT, com o Artigo 2º, al. d) do CPPT e os Artigos 2º, n.º 3 e 133º, n.º 2, al. b) do CPA, ao contrário do decidido na sentença recorrida.
ak) Sem prejuízo de que não resulta demonstrado nos autos qualquer ampliação de licenciamento do posto de abastecimento em causa, sempre se dirá que a taxa impugnada não tem suporte na legislação, ao se liquidar taxas pelo número de mangueiras.
al) Acresce que, o Artigo 15º, nº 1, al. k), actualmente al. l) do Decreto-Lei nº 13/71, alterado pelo Decreto-Lei nº 25/2004, integra na sua fattispecie o conceito de bomba abastecedora de combustíveis e não de mangueira de cada bomba abastecedora.
am A regra contida no Artigo 9º, nº 3 do C. Civ. e no Artigo 11º, n.º 1 da LGT mantém alguma validade e devemos entender que o legislador soube exprimir correctamente o seu pensamento, quer na produção legislativa inicial, quer na alteração resultante daquele Decreto-lei n.º 25/2004.
an) Por isso mesmo, a liquidação da taxa impugnada enferma sempre de um erro sobre os pressupostos legais, sendo anulável, nos termos dos Artigos 1º e 2º, al. c) da LGT, com o Artigo 2º al. d) do CPPT e os Artigos 2º, n.º 3 e 135º, do CPA.
ao) A mangueira é um elemento integrante da bomba abastecedora, e nessa medida, os acrescentos de elementos integrantes dos postos de abastecimento nem vêm, sequer, previstos no Artigo 15º daquele diploma e, pelo contrário, vêm excepcionados no citado Artigo 10º, n.º 2 deste Decreto-Lei n.º 13/71.
ap) A ser o sentido da norma contida no Artigo 15º, nº 1, al. l) do Decreto-Lei nº 13/71, o da liquidação por mangueiras, insiste-se que a mesma é, então, materialmente inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da justiça consagrados, no Artigo 266º, n.º 2 da CRP e com expressa referência, no plano da lei ordinária, no Artigo 55º da LGT e nos Artigos 5º e 6º do CPA., para além de ser, igualmente, organicamente inconstitucional, por violação dos Artigos 103º, nº 2 e 165º, nº 1, i) ambos da CRP, na medida em que se trata de um imposto e não de uma taxa.
aq) A liquidação da taxa questionada nos presentes autos visa exclusivamente a obtenção de receita fiscal.
ar) O acto de liquidação impugnado nos presentes autos não resulta de um sinalagma proveniente do exercício do zelo pela segurança da circulação ou do impacto nas condições de segurança da circulação imanente à construção ou existência do posto de abastecimento em causa. Esse sinalagma inexiste - a Impugnada cingiu-se a apurar o número de mangueiras existentes.
as) Sintomático desta conclusão é o facto de os autos não permitirem vislumbrar (i) a qual é a mangueira objecto do acto de liquidação, (ii) a sua posição na organização espacial do posto, (iii) o modo como afecta a visibilidade do trânsito ou a estrada (iv) como a mesma consubstancia uma ampliação de licenciamento do posto de abastecimento, ou (v) sequer o combustível que abastece
at) Acresce que, independentemente do número de mangueiras, apenas uma viatura é abastecida de cada vez, tendo as mangueiras a ver com o tipo de produto e não com a frequência ou número de viaturas a abastecer, sendo infundada e destituída de sentido a afirmação contida na sentença recorrida relativa à hipótese de se permitir um maior e mais célere aviamento dos utilizadores de tais postos com repercussões no aumento de receitas.
au) Resulta claro da caracterização sobre a natureza da taxa, que esta é uma contrapartida de utilidades concretas concedidas aos particulares beneficiários da actividade desenvolvida pelos entes públicos, redutíveis aos pressupostos que constituem os seus factos geradores, nisto residindo a equivalência jurídica entre o facto e a obrigação, a relação sinalagmática existente entre as duas prestações, que não existe no imposto que é, na essência, uma obrigação unilateral.
av) A liquidação das taxas pelo número de mangueiras que se verifica no caso impõe a conclusão de que há, no caso, violação do princípio constitucional da proporcionalidade e da justiça.
aw) Por tudo o exposto a sentença a quo violou, por errada interpretação e aplicação, entre as acima apontadas, as normas jurídicas constantes dos Artigos 1º; 2º, 3º, 10º, nº1, c), nº 2, 11º, 12º e 15º, nº1, al. l) do Decreto-Lei nº 13/71; os Artigos 3º, nº3, al. e) e 23º do Decreto-Lei 148/2007, os Artigos 4º, 8º e 10º do Decreto-Lei 374/2007 de 7 de Novembro; a Base 33, das Bases de Concessão Rodoviária aprovadas pelo Decreto-Lei nº 380/2007 de 13 de Novembro, e a Cláusula 24 da minuta do contrato de concessão geral da rede rodoviária nacional, anexa à Resolução do Conselho de Ministros nº 174-A/2007devendo como tal ser anulada, nos termos do artigo 685º-A nº2, als. b) e c) do CPC.
ax) Pelo que, neste quadro de razões, deve a douta sentença recorrida ser declarada nula ou anulada, por violação das apontadas normas e por aplicação de norma inconstitucional.
Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências que desde já se invoca, deve ser dado provimento ao recurso e anulada a douta sentença recorrida, com todas as consequências legais, com o que será feita,
Justiça.

A Recorrida apresentou contra-alegações e formulou as seguintes «Conclusões:

1. O Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, está em vigor.
2. Este diploma sofreu algumas alterações ao longo do seu já longo tempo de vigência, como se pode facilmente verificar pela consulta à Base de Dados Digesto.
3. O Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, foi, nos últimos anos, abundantes vezes citado em decisões jurisprudenciais, que nele se louvam.
4. O Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, tem normas especiais de proteção à estrada.
5. Consequentemente, os poderes conferidos à EP no domínio desta legislação visam, em primeiro lugar, garantir a segurança rodoviária em toda a sua plenitude, tanto ao nível da infra-estrutura quanto à criação de condições nesta, que propiciem a adopção de comportamentos adequados pelos condutores.
6. É que, o Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, é uma legislação especial, que estabelece o regime de protecção à estrada, cuja importância não diminuiu,
7. Inexiste uma única disposição legal que de forma expressa revogue o Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro.
8. Acresce que, este diploma foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de Janeiro.
9. Bem como, pelo Decreto-Lei n.º 83/2008, de 20 de Maio, em cujo preâmbulo se diz que “o conjunto de normas tendentes a promover a defesa das estradas nacionais da pressão que sobre elas é exercida encontra-se vertido no Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, com a redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Lei n.ºs 219/72, de 27 de Junho, 25/2004, de 24 de Janeiro, e 175/2006, de 28 de Agosto, bem como no Decreto-Lei n.º 13/94, de 15 de Janeiro.”
10. Pelo que, se dúvidas ainda houvesse quanto à vigência do Decreto-Lei n.º 13/71, estão afastadas.
11. Os poderes, fins e enquadramento jurídico da EP resultam hoje de um conjunto de diplomas legais, desde logo, o Decreto-Lei n.º 374/2009, de 7 de Novembro, que transformou a EP, E.P.E. em EP.S.A., conservando esta a totalidade dos direitos e obrigações legais e contratuais que integram a sua esfera jurídica e em anexo ao qual foram publicados os seus estatutos.
12. Assim como do contrato de concessão, hoje republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 110/2009, de 18 de Maio.
13. Importa aqui reter que a EP é um concessionário a quem, por força da lei, compete, relativamente às infra-estruturas rodoviárias nacionais que integrem o objecto da concessão, zelar pela manutenção permanente de condições de infra-estruturação e conservação e de salvaguarda do estatuto da estrada que permitam a livre e segura circulação.
14. Ademais, para o desenvolvimento da sua actividade, a EP - ..., S. A., detém os poderes, prerrogativas e obrigações conferidos ao Estado pelas disposições legais e regulamentares aplicáveis à liquidação e cobrança, voluntária ou coerciva, de taxas e rendimentos provenientes das suas actividades, bem como à execução coerciva das demais decisões de autoridade.
15. E que lhe são conferidos, nos termos da lei, os seguintes poderes de autoridade necessários a garantir a livre e segura circulação:
a) Determinar, a título preventivo e com efeitos imediatos, mediante ordem escrita devidamente fundamentada, a suspensão ou cessação de actividades ou o encerramento de instalações que ponham em risco a circulação rodoviária, causem dano ou ameacem causá-lo à estrada;
b) Identificar as pessoas ou entidades que promovam quaisquer actividades em violação das disposições legais e regulamentares de protecção à estrada, ou ao património público afecto à sua exploração, em especial à segurança rodoviária, procedendo à imediata denúncia perante as autoridades competentes, se tais actos forem susceptíveis de integrar um tipo legal de crime ou um tipo de ilícito contraordenacional;
c) Solicitar a colaboração das autoridades administrativas e policiais para impor o cumprimento de normas e determinações que, por razões de segurança ou de garantia de inviolabilidade dos bens públicos, devam ter execução imediata no âmbito dos actos de gestão pública;
d) Determinar a imediata remoção de ocupações indevidas de bens de domínio público administrados pela EP - ..., S. A., ou afectos à sua actividade, recorrendo, se necessário, à colaboração das autoridades policiais;
e) Embargar e ordenar a demolição de construções efetuadas em zonas non aedificandi ou em zonas de proteção estabelecidas por lei.
16. Acresce que, as infraestruturas rodoviárias nacionais que integram o domínio público rodoviário do Estado e que estejam em regime de afectação ao trânsito público ficam nesse regime sob administração da EP - ..., S. A.
17. Em resultado destes preceitos legais, assim como do contrato de concessão celebrado entre a EP e o Estado, as matérias relativas ao exercício de poderes que foram cometidos à JAE – Junta Autónoma das Estradas pelo Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, estão hoje atribuídas à EP – ..., S.A..
18. Pelo que, os actos relativos ao licenciamento e à exploração dos postos de abastecimento de combustíveis, devem hoje ser praticados pela impugnada EP – ..., S.A..
19. Coerentemente, as competências de fiscalização da EP estão salvaguardadas também pela parte final do artigo 25º do Decreto-Lei n.º 48/2011, de 1 de Abril.
20. O InIR - Instituto das Infra-estruturas Rodoviárias I.P., foi criado pelo Decreto-Lei n.º 148/2007, de 27 de Abril,
21. Este diploma foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 132/2008, de 21 de Julho.
22. Os Estatutos do InIR foram publicados pela Portaria n.º 546/2007, de 30 de Abril.
23. A missão do InIR consiste em “…regular e fiscalizar o sector das infra-estruturas rodoviárias e supervisionar e regulamentar a execução, conservação, gestão e exploração das referidas infra-estruturas, numa perspectiva integrada de ordenamento do território e desenvolvimento económico” (cfr. o n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 148/2007, de 27 de Abril).
24. A actividade de supervisão reconduz-se ao acompanhamento da actividade das entidades reguladas, ou seja, dos concessionários.
25. A actividade de regulação, por sua vez, atém-se aos poderes normativos atribuídos ao regulador.
26. Não compete, portanto, ao InIR a gestão e exploração directa das infra-estruturas rodoviárias, que apenas supervisiona e regulamenta.
27. É que, as atividades de gestão e exploração das infra-estruturas rodoviárias, tais como as de execução e conservação, estão a cargo dos concessionários, como a ora impugnada (cfr. a Base 2 do Contrato de Concessão publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 380/2007, de 13 de Novembro).
28. As funções em matéria de supervisão, anteriormente atribuídas à EP – ..., E.P.E., com a criação do InIR, foram excluídas daquela esfera jurídica transmitida à Impugnada e transitaram para o mesmo InIR.
29. Isto é, efectivamente, o que resulta do disposto no n.º 1, do artigo 23.º do DL 148/2007, de 27 de Abril, quando se determina que “o InIR, I. P. sucede nas atribuições da EP - ..., E. P. E., em matéria de supervisão das infra-estruturas rodoviárias.”
30. Acresce que, na alínea c) do n.º 1 do artigo 13.º do mesmo Decreto-Lei n.º 374/2007 é dito que “constitui receita da EP o produto das taxas, emolumentos e outras receitas cobradas por licenciamentos, aprovações e actos similares e por serviços prestados no âmbito da sua actividade”.
31. Sem embargo, tendo o InIR sido criado em 2007, portanto, há, cerca de seis anos, se tivesse a competência para praticar o acto impugnado certamente já o teria feito, o que não se verificou.
32. É que, os Estatutos do InIR, I.P. estabelecem as diversas unidades orgânicas que este instituto compreende.
33. Não havendo nenhum serviço do InIR a que compita praticar o ato impugnado, como resulta da Portaria n.º 546/2007, de 30 de Abril.
34. Concluindo, é à EP que cumpre praticar o acto impugnado e, em consequência, cobrar a respetiva taxa, prevista na al. l), do n.º 1, do artigo 15º, do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, ma redação dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de Janeiro.
35. Pelo licenciamento da remodelação do posto de abastecimento de combustíveis localizado na EN 17, ao km 54+700, a Delegação Regional de Coimbra, aplicou por cada mangueira a taxa fixada na alínea l), do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 13/71, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004.
36. A Recorrente entende que a taxa não deve ser aplicada por cada mangueira mas sim por cada unidade de abastecimento, na definição constante da legislação específica do sector da energia.
37. Porém, através do Diploma de Licença n.º 227/97, com o registo n.º 55, de 1980, a Recorrente liquidou a quantia de 24.000$00, respeitante, a 2 mangueiras, sem qualquer objeção.
38. Sucede que, e se por um lado a referida legislação não pode ser aplicada ao licenciamento emitido pela EP, porque não sendo lei geral extravasa o âmbito da sua atividade; por outro lado, a interpretação da Recorrente não tem a mínima correspondência legal nem tão-pouco observa o princípio plasmado no artigo 9.º do Código Civil que na fixação do sentido e alcance da lei, manda o intérprete presumir “que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
39. Neste sentido, bem decidiu a Mma. Juiz “a quo” ao entender que “… a base da incidência da taxa em causa afere-se por cada possibilidade de saída de combustível, a qual se encontra indissociavelmente ligada à componete visível, por exterior, da bomba abastecedora de combustível (a mangueira).”
40. O conceito de “bomba abastecedora de combustível” para efeitos de cobrança da taxa fixada no Decreto-Lei n.º 25/2004, pela emissão de licença para o estabelecimento e ampliação de postos de combustíveis, corresponde ao conceito de mangueira enquanto dispositivo que se destina a transferir combustível de um para outro recipiente.
41. O conceito de bomba abastecedora mantém-se inalterado na “legislação rodoviária” desde a publicação do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, data em que os postos de abastecimento de combustíveis eram constituídos por bombas monoproduto (simples), ou seja, por bombas através das quais se abastecia apenas um carburante.
42. Aquando da existência das bombas simples, o legislador impôs a cobrança da taxa por cada saída de combustível (que o mesmo é dizer por cada mangueira existente), pelo que por cada bomba abastecedora de combustível (que bombeia um só carburante), era aplicada uma determinada taxa.
43. Ao recorrer à expressão por cada bomba abastecedora, o legislador quis tributar individualizadamente cada um dos equipamentos que permitem o abastecimento de combustíveis, equipamentos esses quantificáveis através do número de mangueiras, sendo essa a base de incidência da taxa.
44. A existência de bombas duplas e bombas multiproduto não alterou a solução consagrada por via legislativa, porquanto o aparecimento de tais bombas teve como único objetivo a obtenção pelos concessionários de um dado volume de vendas equivalente a tantos números de bombas simples quantas as saídas permitidas por aquelas, mas com redução de custos em contadores e área disponível.
45. Com efeito, a cada mangueira podem estar associados subterraneamente vários depósitos que permitirão a comercialização distinta de vários produtos.
46. Deste modo, tendo o legislador mantido, expressamente desde 1971, o conceito de bomba abastecedora de combustível é porque quis taxar individualmente cada possibilidade e saída de combustível.
47. O licenciamento pela EP dos postos de abastecimento, que deve observar os aspetos resultantes do estrito cumprimento do Despacho SEOP n.º 37-XII/92, visa garantir a segurança da estrada e dos que a utilizam.
48. A base de incidência da taxa cobrada pela EP resulta da precisa verificação e prevenção das condições de segurança e circulação na estrada e dos seus utentes, verificação que considera, entre outros aspetos, a organização espacial do posto que pode interferir naquela segurança e circulação, e o número de saídas de combustível no posto existentes já que,
49. Um maior número de bombas abastecedoras/mangueiras resulta numa maior procura, atenta a capacidade de abastecimento que é aferida por aquele número de mangueiras.
50. Quanto maior for o número de mangueiras, maior será o número de entradas e saídas e o aumento do respetivo tráfego médio diário da via que procuram, e por conseguinte maior será a perigosidade própria do armazenamento e manipulação dos combustíveis para os veículos automóveis.
51. A propósito do licenciamento pela EP já o Supremo Tribunal Administrativo se pronunciou ao referir que este licenciamento “visa garantir a protecção das vias e dos que as utilizam em todos os seus aspectos, em que é preponderante a segurança do trânsito e da segurança em geral face à perigosidade própria do armazenamento e manipulação dos combustíveis peara os veículos automóveis.” (in Processo n.º 0250/04 – www.dgsi.pt).
52. O licenciamento pela EP não pode deixar de ter em conta o número de mangueiras através das quais se abastecem os veículos automóveis, sendo este o fator económico da tributação porque emergente da verificação e prevenção das condições de segurança da estrada e dos que a utilizam.
53. Assim, para efeitos de aplicação das taxas a que se refere a alínea l), do n.º 1, do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 13/71, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 25/2004, o conceito de bomba abastecedora corresponde ao conceito de mangueira, por ser aquele que mais se adequa à realidade subjacente ao licenciamento pela EP.
54. Assim já decidiu o Acórdão da 2.ª seção do Contencioso Tributário de 17/06/2009, proferido no Proc. 0263/09, seguido na integra pelo Acórdão de 16/09/2009, no Processo 0327/09, ambos já publicados em, www.dgsi.pt

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida, por ser de JUSTIÇA».

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal é de parecer que deve ser dado provimento ao recurso e em consequência anulada a sentença recorrida e ordenada a baixa dos autos à 1.ª instância a fim de serem as partes notificadas para, no prazo que vier a ser fixado, produzirem alegações, nos termos do art.º120.º, do CPPT, seguindo-se os ulteriores termos do processo.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente (cf. artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC), são as seguintes as questões que importa conhecer: (i) Indagar se se verifica a nulidade processual decorrente da falta de notificação às partes para alegarem por escrito nos termos do artigo 120.º do CPPT; (ii) Indagar se a sentença é nula por falta de especificação dos fundamentos de facto; (iii) Indagar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto e em erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis à situação dos autos e, consequentemente, ao ter concluído pela improcedência da impugnação.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

«1.Em acção de fiscalização ao Posto de Abastecimento de Combustível localizado na EN 17, km 54+700 margem E/D, realizada em 22 de Outubro de 2009, por competência atribuída pelo Desp. SEOP 37-XII/92, foram identificadas as condições de funcionamento e exploração, segurança e condições físicas existentes nesta data, onde se constatou que a zona de abastecimento é composta por 19 mangueiras de abastecimento (no total dos dois lados), o que constitui um acréscimo de 6 mangueiras de abastecimento face ao que foi objecto de licenciamento por parte deste Serviço em 1997, propondo-se o pagamento de 8.173,80 € devida pela al. l) do nº1, do art. 15º do DL 13/71 de 23 de Janeiro, com a redacção do DL 25/2004 de 24 de Janeiro (relatório do p.a. apenso à impugnação, não numerado);
2. Por carta regista com a/r as EP... notificou P..., em 24/12/2009, após o exercício do direito de audição da impugnante de fls. 52 a 55, de 21/12/2009, da manutenção da anterior decisão com base nos fundamentos expostos no ofício nº 643/2009/DRCBR, de 19 de Novembro, para que no prazo de 10 dias fazer prova do licenciamento de todas as mangueiras existentes á data da fiscalização realizada pelas EP, ou no mesmo prazo, efectuar o pagamento de € 8.173,80 correspondente ao aumento de seis mangueiras abastecedoras, de acordo com al. l, do nº1, do art. 15º do DL 13/71, de 23 de Janeiro, com a redacção do DL 25/2004, acrescido de € 3,00 de imposto de selo (…) sob pena de se emitir certidão de dívida para instauração de processo de execução fiscal (p.a junto ao processo de impugnação, não numerado e fls. 52 a 55 do processo de impugnação);
3.... por ofício nº 643/2009/DRCBR de 2/12/2009, deu conhecimento à impugnante de que “(…). Verificou-se, também, que o posto de abastecimento possui, á data da dita fiscalização, 19 mangueiras. Após consulta ao processo existente nesta Delegação Regional relativamente a este posto de abastecimento, constatou-se que apenas foram licenciadas 13 mangueiras, pelo que fica V. Exa. notificada, nos termos do art. 10º, nº1, al. c) do DL 13/71, de 23 de Janeiro, para, no prazo de 10 dias úteis, a contar da data da recepção da presente notificação, proceder à legalização da ampliação do posto no que se refere ao número de mangueiras (…), Considerando que a ampliação do PAC se encontra sujeita ao pagamento da taxa a que se refere al. l), do nº1, do art. 15º do DL 13/71, na redacção do DL 25/2004, fica igualmente notificada, nos termos do art. 60º, nº1, al. a) da LGT, para no prazo de 15 dias corridos, se pronunciar sobre o projecto de decisão da EP, ..., S.A. de aplicação de taxas no valor de €8.176,80, correspondente a: € 3,00 de imposto de selo e € 8.173,80 referente à taxa devida pela ampliação PAC, calculada nos termos da al. l), do nº1, do art. 15º do DL 13/71 com a redacção do DL 25/2004 (…)” (doc. de fls. 28 a 30 do processo);
4. A impugnante é uma sociedade anónima, com a firma P... _ P..., S.A., cujo objecto social é a refinação de petróleo bruto e seus derivados; transporte, distribuição e comercialização de petróleo bruto e seus derivados e gás natural; pesquisa e exploração de petróleo bruto e gás natural e quaisquer outras actividades industriais, comerciais, de investigação ou prestação de serviços conexos com os referidos anteriormente (doc. 4 a fls. 37 a 51 do processo)».

E mais se deixou consignado na sentença:
«Factos não provados
Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.
IV. Fundamentação.
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico dos documentos que constam dos autos, não impugnados, e do Processo Administrativo em apenso, cuja relevância foi referida a propósito de cada ponto».

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Começa a Recorrente por, logo na Conclusão a), suscitar a nulidade processual decorrente da omissão da notificação das partes para alegações, tal como o prevê o artigo 120.º do CPPT.

Compulsados os autos, constata-se que a Mma. Juíz “a quo” logo após proferir despacho a indeferir a produção da prova requerida na douta p.i., ordenou fosse aberta vista ao Ministério Público para parecer final. Subsequentemente, proferiu a sentença (cf. fls.26, 114 e 118 a 128 dos autos).

A situação dos presentes autos é, no essencial, idêntica à que já foi tratada, entre outros, no Acórdão deste TCA Norte de 10/10/2013, proferido no proc.º02206/10.5BEBRG, com as mesmas partes e em que a nulidade em causa foi também suscitada, pelo que se adere à fundamentação nele expendida, que se passa a transcrever:

«Está em causa, portanto, uma eventual nulidade secundária, anterior à sentença, e traduzida, segundo a recorrente, na violação do direito ao contraditório quanto aos elementos constantes do procedimento administrativo, por ter sido omitida pelo tribunal recorrido a notificação das partes para produção de alegações escritas nos termos e para os efeitos previstos naquela norma legal (artigo 120º do CPPT) e que configura uma nulidade processual nos termos do artigo 201º, nº 1 do CPC.

Vejamos.

As nulidades processuais “são quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder - embora não de modo expresso - uma invalidade mais ou menos extensa de actos processuais” - cf. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, pag.176.

Segundo o artigo 114º do CPPT, “não conhecendo logo do pedido, o juiz ordena as diligências de produção de prova necessárias, as quais são produzidas no respectivo tribunal”.

Por seu turno, prescreve o artigo 120º do CPPT que “finda a produção da prova, ordenar-se-á a notificação dos interessados para alegarem por escrito no prazo fixado pelo juiz, que não será superior a 30 dias”.

Apresentadas as alegações ou findo o respectivo prazo e antes de proferida a sentença, será dada vista dos autos ao Ministério Público (artigo 121º, nº 1 do CPPT).
Dos autos resulta que, após notificação à impugnante da contestação e da junção do processo administrativo, foi proferido despacho judicial a considerar desnecessária a produção de prova testemunhal. De seguida, e sem qualquer notificação prévia às partes para produção de alegações escritas, foi ordenada a remessa dos autos para parecer final do Ministério Público e, após, foi proferida a sentença recorrida.

Portanto, após prolação do despacho a dispensar a produção de prova e posterior emissão de parecer pelo Ministério Público, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga proferiu a sentença que agora se encontra sob recurso., sem que tenha notificado as partes (Impugnante e ..., S.A) para produzirem alegações escritas nos termos previstos no artigo 120º do CPPT.

E a questão que então se coloca é a de saber se ao omitir tal notificação, o tribunal recorrido praticou a nulidade processual que vem invocada pela recorrente.

Ora, a resposta a esta questão foi já dada pela nossa jurisprudência, nomeadamente no recente acórdão do STA (Pleno) de 8 de Maio de 2013, Processo 01230/12, cujo entendimento sufragamos e, por isso, nos limitamos a transcrever: “(…) tendo havido junção ao processo de documentos com relevo probatório (como é o caso dos documentos juntos pela impugnante e do PAT), os quais relevaram para a especificação da matéria de facto julgada provada, impunha-se que se concedesse às partes a possibilidade de alegarem sobre esta matéria, não só sobre a relevância factual que podem ter os elementos em questão, mas também sobre as ilações jurídicas que daí se podem retirar. É que, por um lado, e ao invés do entendimento apontado no acórdão recorrido, não vemos razões legais para limitar as alegações aos casos de produção de prova testemunhal. Mas, por outro lado e como, igualmente, se diz no acórdão fundamento, «O facto de cada uma das partes ter tido oportunidade de se pronunciar sobre os documentos apresentados pela parte contrária, não dispensa as alegações, designadamente porque, enquanto o prazo legal para as partes se pronunciarem sobre documentos apresentados pela parte contrária é o prazo geral de 10 dias [art. 153º, nº 1, do CPC, aplicável por força do disposto no art. 2º, alínea e), do CPPT], o prazo para alegações é fixado pelo juiz, podendo estender-se até 30 dias, nos termos do transcrito art. 120º».

Também nos acórdãos desta Secção do STA, de 11/3/2009 e de 28/3/2012, respectivamente, nos procs. nº 01032/08 e nº 062/12, ficou consignado que «a junção do processo administrativo impõe que, em regra, se tenha de passar à fase das alegações, não podendo haver conhecimento imediato do pedido, sob pena de violação do princípio do contraditório e da igualdade dos meios processuais ao dispor das partes (artigos 3º, nº 3, do CPC e 98º do CPPT)».

E o Cons. Jorge Lopes de Sousa igualmente salienta que «No caso de se estar perante uma situação em que deva ocorrer o conhecimento imediato, designadamente se forem juntos documentos pelas partes após a contestação, não pode dispensar-se a notificação das partes para alegações, a fim de se poderem pronunciar sobre a relevância desses documentos para a decisão da causa.

Mesmo que, na sequência da junção de documentos por cada uma das partes, a parte contrária tenha sido notificada da junção e se tenha pronunciado, não pode dispensar-se a notificação das partes para alegações …». Aliás, o mesmo autor também acrescenta que, nos casos em que o representante da Fazenda Pública contestar, sendo obrigatória a junção do processo administrativo, que deverá conter informações oficiais [arts. 111º, nº 2, alíneas a) e b), do CPPT], que são um meio de prova (art. 115º, nº 2), em regra não poderá haver conhecimento imediato do pedido, tendo de passar-se à fase de alegações, mesmo que não haja outra prova a produzir, por imperativo do princípio do contraditório (art. 3º, nº 3, do CPC), pois só assim se torna possível evitar que a administração tributária usufrua de um privilégio probatório especial na instrução do processo e se confere aos princípios do contraditório e da igualdade dos meios processuais uma verdadeira dimensão substantiva (art. 98º da LGT).”

Na esteira deste entendimento, é, pois, de concluir que no caso dos autos, ao não se notificar a recorrente para alegações escritas (cf. artigo 120º do CPPT), ocorreu uma omissão susceptível de influir no exame e na decisão da causa, a qual determina a anulação da sentença recorrida nos termos do artigo 201º do CPC, o que implica a anulação dos termos processuais subsequentes (cf. artigo 98º, nº 3, do CPPT.

Em consequência do exposto, procede o recurso nesta parte, o que acarreta a prejudicialidade do conhecimento das restantes questões nele colocadas.».

5 - DECISÃO

Assim, pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso quanto à primeira questão suscitada e, em consequência, anular a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, a fim de ser fixado prazo para alegações das partes, nos termos do artigo 120.º do CPPT, seguindo-se os ulteriores termos.

Sem custas.

Porto, 12 de Fevereiro de 2015
Ass. Vital Lopes
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro