Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01646/04.3BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/24/2019
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:CORRECÇÕES ARITMÉTICAS, ÓNUS DA PROVA, FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO, IRS, RENDIMENTOS DE CATEGORIA B, DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário:I - A reforma processual civil de 2013 concretizou, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto, tendo sido alargados os poderes de cognição do tribunal de segunda instância. Porém, como resulta do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, esse poder deve ser exercido com prudência, não bastando a mera discordância das partes ou a divergência do tribunal de recurso com o decidido na primeira instância para que a matéria de facto seja alterada.

II - A modificação das respostas do tribunal de 1.ª instância à matéria de facto só deve ser efectuada quando for irrefutável o erro na decisão da matéria de facto praticado pelo tribunal a quo.

III - A modificação não deve atingir uma amplitude tal que implique todo um novo julgamento de facto, com a reapreciação de toda a prova produzida, a alteração da convicção do julgador a quo e a postergação dos princípios da livre apreciação das provas e da imediação.

IV - O princípio da livre apreciação das provas contido no artigo 607.º, n.º 5, do CPC, significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.

V - O princípio da imediação limita a tarefa de reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, que só pode ser modificada se ocorrer erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi anteriormente considerado.

VI - A mera discordância sobre a valoração da prova testemunhal e sobre a convicção do julgador, sem identificação ou concretização do vício lógico em que este incorreu, não autoriza uma alteração da matéria de facto.

VII - O juiz só pode pronunciar-se sobre factos alegados pelas partes, a menos que a lei preveja o seu conhecimento oficioso – cfr. artigos 264.º do Código de Processo Civil, 99.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e 13.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

VIII – O ónus da prova do direito de liquidar adicionalmente IRS, com base em correcções aritméticas à matéria tributável, cabe a quem invoca o facto constitutivo do direito – cfr. artigo 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária.

IX - Para efeitos de IRS (Categoria B), na redacção do artigo 3.º, n.º 6 do Código de IRS anterior à redacção introduzida pelo n.º 2 do artigo 26.º do Orçamento de Estado para 2003 – Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro - “Os rendimentos referidos neste artigo ficam sujeitos a tributação desde que pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 18.º do Código de IRC para os rendimentos determinados com base na contabilidade”, o momento a atender para determinar a obtenção do rendimento e a consequente sujeição a imposto, corresponde ao do recebimento do valor respectivo, relativamente aos sujeitos passivos enquadrados no regime simplificado de tributação.

X – Estando em causa omissões nas declarações anuais de rendimentos de 2001 e 2002, não basta a AT afirmar que os rendimentos foram pagos ao Recorrente até 31/12/2002. Falta fundamentação ao acto tributário para operar as referidas correcções aritméticas e sustentar as liquidações adicionais de IRS, por se desconhecer quais os proveitos que foram pagos concretamente em 2001 e especificamente em 2002.
Recorrente:J.L.F.G
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

J.L.F.G, residente na Av.ª (…), contribuinte n.º (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 01/03/2019, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IRS, referentes aos anos de 2001 e 2002.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“1 – A sentença recorrida viola as normas constantes dos artigos 115.º e 116.º do CIRS, artigo 50.º do CIVA, pelo que deve ser julgado provado e aditado à matéria da Alínea B) dos factos provados que
a)O impugnante não estava sujeito à obrigação de emissão de recibo de modelo oficial por via da previsão da alínea a) do n.º 1 do art.º 115º do CIRS nos rendimentos empresariais da antiga categoria C ou D do CIRS (agora englobados nas regras da incidência da Categoria B do CIRS)
b)O impugnante usava livros unigráficos para cumprimento do disposto no art. 50º do CIVA inexistindo qualquer obrigação de registo de quaisquer quantias recebidas dos seus clientes (donos de obra) para pagamento directo a terceiros (subempreiteiros) por conta dos primeiros que não tinham de constar fiscal ou comercialmente em documento do recorrente, nem na respetiva escrituração”.
2 – Concluindo-se que o recorrente não tinha obrigação de relevar contabilisticamente os dinheiros que por depósito era mero detentor, decidindo que o recorrente não violou qualquer princípio de cooperação e que a não existência desses registos não impedia a Administração Fiscal de procurar a verdade material dos factos.
3- Reapreciando os meios de prova junto aos autos, em concreto o RIT, bem como os depoimentos prestados pelas testemunhas Filipe Rodrigues e Manuel Mendes [depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas na sessão de 2 de Novembro de 2009, cuja acta se encontra a fls., em concreto o depoimento de M. S. M. (CD 00:37:28 até 00:45:22) e depoimento de F. A. M. R. (CD 00:54:32 até 01:42:06] deve ser julgada provada e aditada a seguinte factualidade à matéria julgada provada, uma nova alínea G1 a G4:
Aquando da Inspecção referida em A). o Inspector da AT soube pelo menos pelo dono-de-obra M. S. M. que este havia entregue ao impugnante quantias para este pagar, directamente, aos subempreiteiros, os valores dos trabalhos que estes iam realizar na sua moradia.
As 10 facturas emitidas pela J.L.F.G, Unipessoal, Lda juntas aos autos na audiência de julgamento foram recolhidas pela fiscalização da AT, durante a mesma.
Essas facturas, todas de 2003, correspondem aos valores apurados no relatório descritos como “nota importante” relativamente a A. M. P.R., A. J. S. M. L. e M. S. M.,
Da conjugação do RIT e do testemunho do Agente Inspector resulta que essas facturas estavam a ser processadas incorretamente em 2003, mas dizem respeito aos mesmos valores tidos por omitidos em 2001 e 2002.
4 - A análise crítica do RIT e documentos juntos aos autos, mormente, documentos 4 e 5 juntos com a impugnação, exige que seja aditada à matéria julgada provada [depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas na sessão de 2 de Novembro de 2009, cuja acta se encontra a fls., em concreto depoimento de E. B. M. L. (CD 00:05:00 até 00:16:15), depoimento de J. C. C. (CD 00:16:20 até 00:27:21), depoimento de A. J. S. M. L. (CD 00:27:25 até 00:37:45), depoimento de M. S. M. (CD 00:37:28 até 00:45:22), depoimento de J. F. S. (CD 00:45:30 até 00:54:26), depoimento de F. A. M. R. (CD 00:54:32 até 01:42:06)] o seguinte:
J1
Atentas as relações privilegiadas de confiança que tinha com os donos de obra, recebeu destes quantias, que se destinaram ao pagamento de subempreitadas realizadas por outros agentes económicos, nomeadamente, serviços de electricidade, canalizações, alumínios, que os subempreiteiros vieram a facturar aos donos de obra;
d) Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por A. M. P.R., a quantia global de 4.750,96€ correspondentes às facturas constantes de fls. 1, 2, 3 e 4, do Doc. 4 Anexo à PI;
e) Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por M. S. M., a quantia global de 13.843,04€ correspondentes às facturas constantes de fls. 5, 6, 7 e 8-9, do Doc. 4 Anexo à PI;
f) Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por A. J. S. M. L., a quantia global de 14.676,52€ correspondentes às facturas constantes de fls. 10, 11-14, 15, 16 e 17, do Doc. 4 Anexo à PI;
J2
Essas quantias foram sendo entregues ao recorrente durante os anos de 2001, 2002 e 2003, não sendo possível quantificar os montantes relativos a cada ano, e embora as subempreitadas tenham sido facturadas no ano de 2003, ficou demonstrado, pelas testemunhas arroladas pelo recorrente, que os pagamentos das mesmas, e os pagamentos ao recorrente, não acompanhavam directamente a execução da obra.
J3
Os valores entregues constantes do RIT, anexo n.º 3, pelos clientes, donos das obras, ao recorrente, por cheque e transferências bancárias, em parte, tiveram por destino os subempreiteiros, que facturaram diretamente aos clientes donos das obras;
4.1 - Julgando como provados os factos descritos em 7º, 11º, 13º, 14º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 21º, 22º, 23º e 28º da PI, para além do que já foi descrito na al. I) dos factos provados;
Sem prescindir:
5 - A sentença padece ainda de vício de fundamentação, violando o art.º 77º da LGT, pois, com a mera remissão para a fundamentação ínsita do Relatório – Quadros 1 e 2 de fls 11 e 12 da sentença – viola o art.º 35º do CIVA (à data) e nº 6 do artigo 3.º do CIRS (à data) que não permitia a imputação proporcional das diferenças entre o facturado e o dinheiro que foi entregue ao recorrente,
6 – Há ainda falta de fundamentação para a decisão porque em momento algum ou a AT ou o Tribunal refere ou apura, em que data - dia/mês - deviam as facturas e as competentes liquidações serem emitidas, face aos pagamentos respectivos.
7 - A douta sentença padece ainda de vício de fundamentação por admitir a fundamentação sucessiva do acto de liquidação impugnado, não sancionando a manifesta desconformidade entre os pressupostos dos actos de liquidação impugnados – fundamentados no Relatório de Fiscalização – e os reais, pois afinal as facturas de 2003 descritas em “nota importante” no Relatório e transcritas na sentença – não são do recorrente, mas da Unipessoal.
7.1-Misturando pagamentos ao impugnante com pagamentos/prestação de serviços de outra entidade, para o que,
7.2 - Utiliza documentos contabilísticos de uma entidade que não estava sujeita a fiscalização, o que fere de ilegalidade – violando o art.º 3º do CIRS – esse acto de liquidação.
8 - Existe errónea quantificação e manifesto excesso da capacidade contributiva (ou duplicação de colecta), pois as facturas que foram emitidas em 2003, pela sociedade unipessoal, reportavam-se a dinheiros recebidos pelo impugnante até final de 2002, foram fiscalmente tratadas na esfera da Unipessoal no ano de 2003 e estão a ser tributadas na esfera do recorrente nos anos de 2001 e 2002 (art.º 3º e art.º 13º, ambos do CIRS).
9 - Existe errónea quantificação e manifesto excesso da capacidade contributiva (ou duplicação de colecta) pois parte das supostas faltas de facturação resultam de faturas emitidas directamente pelos subempreiteiros aos donos das obras,
10 - Estando, em ambas as situações, a Administração Tributária e o Tribunal, a exigir a tributação pelos mesmos factos ao recorrente, violando os art.º 3º e art.º 13º, ambos do CIRS – e o art.º 104º, n.º 1 e 2, da CRP.
Por último,
11 - Existe vício de violação da lei na interpretação do art.º 59º da LGT, nomeadamente do seu nº 4., pois jamais foi solicitado ao recorrente pela Administração Tributária para prestar esclarecimentos ou apresentar documentos, inexistindo qualquer obrigação legal de esgotar os seus meios de defesa durante o acto de procedimento tributário.
12 – Podendo fazê-lo em impugnação judicial.
NESTES TERMOS,
Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, anulando-se as liquidações de IRS e Juros Compensatórios, referentes aos anos de 2001 e 2002,
Para que assim se faça JUSTIÇA.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, quanto à correcção da matéria colectável em sede de IRS, com referência aos anos de 2001 e 2002, por se verificar a sua errónea quantificação e falta de fundamentação do relatório de inspecção tributária para serem efectuadas essas correcções aritméticas.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Compulsados os autos, com relevância para a decisão a proferir, dão-se como provados os seguintes factos:
A) Em cumprimento da “Ordem de Serviço n.° 33 344, emitida em 2003/07/08, e da Ordem de Serviço n.° 33 568, emitida em 2003/08/21, com o código PNAIT 321.41, procedeu-se à acção de inspecção, para aferir o grau de cumprimento das obrigações fiscais por parte do sujeito passivo e se as operações económicas realizadas foram correctamente relevadas nos seus livros de registo e declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS e Declarações Periódicas de IVA. A acção inspectiva teve início em 2003/07/08 e foi concluída em 2003/10/08.”, cfr. pag. 2 do Relatório de Inspecção, folhas 7 do Processo Administrativo, que aqui se dá por reproduzido, o mesmo se dizendo dos demais elementos infra referidos. No Relatório de Inspecção, porque anexos dele ou nele referidos, devem entender-se os documentos constantes da certidão cuja junção se ordenou no despacho imediatamente antecedente desta sentença;
B) O Impugnante J.L.F.G foi enquadrado da forma seguinte:
Enquadramento Tributário
Serviço de Finanças do domicílio fiscal do sujeito passivo: C. D.-C6digo:2526.
Actividade exercida: CONSTRUCAO EDIFICIOS (CAE 45.211).
Data de Início de actividade: 1994-04-13.
Data de Cessação de actividade: 2002-12-27.
Enquadramento para efeitos IRS: Regime Simplificado de Tributação.
Enquadramento em sede de IVA: Regime Normal de Periodicidade Trimestral.”, idem anterior;
C) No ano de 2003 o Impugnante deixou de exercer a actividade em nome individual passando a exercê-la através de sociedade unipessoal “J.L.F.G, Unipessoal, Lda.”, cfr. depoimento das 5º e 6º testemunha e documentos de fls. 113 a 117;
D) Ao nível da Análise contabilístico-fiscal verificou a Inspecção o seguinte:
“As declarações de rendimentos modelo 3 de IRS para os anos de 2001 e 2002 foram entregues pelo sujeito passivo obrigação declarativa imposta pelo artigo 57° do CIRS.
Após consultas do Sistema Informático Tributário DGCl/SIT - Sistema de Cobrança de IR pode confirmar-se que não existe informação de Notas de Cobrança de IRS em Divida ou em Fase de Pagamento.
Pode constatar-se, também, no Sistema Informático Tributário DGCI/SIVA que não há Liquidações de IVA Por Regularizar.”, idem A);
E) No relatório da Inspecção referido em A) elencaram-se como “FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁRIAo seguinte:
Informe-se que no decorrer do presente procedimento externo de inspecção foram consultados os processos de autorização de licenças para obras e/ou alvarás de licenças de construção disponibilizados pelos serviços da Câmara Municipal de C. D. (Vide Relação de Processos de Obras / Licenças de Construção Anexo 1) cujos trabalhos de construção foram da responsabilidade do sujeito passivo.
Com o objectivo de obter conhecimento de entidades externas sobre os trabalhos executados e/ou a executar pelo sujeito passivo em cada obra, a data de início e data de conclusão daqueles trabalhos (reais ou estimativas), bem assim como confirmar e comparar o valor total correspondente aos trabalhos adjudicados / executados (montantes reais ou orçamentados) com as informações / processos registados na câmara municipal (estimativas de custo) e valores declarados pelo sujeito passivo, foram circularizados os proprietários / donos de obra:
1) A. M. P.R., NIF (…), Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 162/01 / Alvará de Lic. de Construção n.° 425/01;
2) A. J. S. M. L., NIF:209.978.457, - Alvará de Licença de Construção n.° 165/00 da Câmara Municipal de C. D.;
3) M. S. M., NIF: (…), - Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 405/00 / Alvará de Licença de Construção n.° 235/01;
4) R. P. A., NIF: (…), - Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 253/99 / Alvará de Licença de Construção n.° 484/99.
Em resultado dos elementos / documentação analisados por este Serviço de Prevenção e Inspecção Tributaria (SPIT) pode apurar-se que J. L. F. G. ocultou nos anos de 2001 e 2002, de forma ilegítima, proveitos e ganhos de €34.329,34 + IVA e de €21.947,84 + IVA, respectivamente, decorrentes da sua actividade de construtor civil. Podemos comprovar que estes valores foram efectivamente recebidos pelo sujeito passivo naqueles períodos e que não se encontram referenciados e relevados nos livros de escrituração e nas correspondentes declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS e Declarações Periódicas de IVA.
III. 1.1. Em Sede de IRS - Exercícios de 2001 e 2002
PROPRIETARIO DA OBRA: Sr. A. M. P.R. - NIF: (…) Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 162/01
Alvará de Licença de Construção n.° 425/01
1.1.1. Podemos comprovar através do Processo de Obras n.º 162/01 / Alvará de Licença de Construção n.° 425/01 registado na Câmara Municipal de C. D. e emitido em nome de A. M. P.R., NIF: 137.138.695, que foi aprovada a construção de uma Casa de Habitação (Área total de construção: 374 m2), que incide no terreno /prédio rústico "…." situado em K, freguesia de M., concelho de C. D.. Saliente-se que o prazo de validade da referida licença e de 2001/10/16 ate 2004/10/16.
1.1.2. Importa referir que, através do n/ oficio n.° 12819 de 2003/08/07 foram solicitados ao proprietário da obra alguns esclarecimentos / elementos referentes a construção supra referida (Vide fotocópia daquele oficio em anexo ao processo).
1.1.3. Com base nos elementos / documentação enviados a este SPIT pelo proprietário da obra Sr. A. M. P.R. pode verificar-se que:
a) J.L.F.G foi o construtor responsável pela obra;
b) Existe orçamento entre aqueles contratantes, referente a fornecimento de materiais e serviços prestados para a realização do projecto de construção de moradia unifamiliar, no montante de €62.349,74 + IVA (Vide Anexo 2 e fotocópia de Orçamento junto ao processo);
c) Foram efectuados pagamentos aquele empresário nos anos de 2001, 2002 e 2003, através de diversos cheques e de transferência bancária, por contrapartida dos trabalhos realizados e/ou fornecimento de materiais de construção no valor de €16.460,33, €43.896,50 e €6.415,00, respectivamente (Vide Relação de Documentos Comprovativos de Pagamento — Anexo 3) — e fotocópias dos extractos bancários do Banco Espírito Santo que comprovam aqueles movimentos / pagamentos, em anexo ao processo);
d) Data de Inicio dos Trabalhos: Outubro de 2001;
e) Data de Conclusão dos Trabalhos: Julho de 2003.
1.1.4. Em auto de declarações, datado de 2003/07/14, o Sr. J.L.F.G confirmou ser o responsável pela execução dos trabalhos de construção e fornecimento de material conforme referenciado no Orçamento n.° 2/2000 (documento elaborado em programa de processamento de texto WORD ou equivalente - fotocópia em anexo ao processo).
1.1.5. Podemos constatar da análise dos elementos de escrita do sujeito passivo haver evidência de registo de proveitos no montante de €17.535,01 (IVA Não Inc.) no ano de 2001 e de € 20.573,82 (IVA Não Inc.) em 2002. Contudo, por se ter apurado que o montante total de pagamentos efectuados naqueles períodos é superior aos montantes declarados / referenciados nos elementos de escrita e nas declarações fiscais entregues pelo sujeito passivo - para efeitos de IRS / IVA - resulta que há ocultação de proveitos, em 2002, pelo menos de €12.847,65 [€ 12.847,65 = (€56.347,23 - €38.108,82)]. O resultado tributável da Categoria B do Ano de 2002 deve, então, ser acrescido no valor de €12.847,65.(1)
(1) Nota Importante: Deve anotar-se que o sujeito passivo emitiu em Junho a Julho de 2003 diversas facturas em nome do proprietário A. M. P.R. — facturas n.° 14, n.° 15, n.° 16, n.° 19, n.° 20 a n.° 21 - no montante total de €13.253,52. Aqueles montantes respeitam em parte (€ 6.838,52) a pagamentos efectuados até 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados pare efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes. De facto, atendendo ao disposto no n.° 6 do artigo 3° do CIRS os rendimentos empresariais e profissionais (Categoria B) dos sujeitos passivos enquadrados no regime simplificado foram sujeitos a tributação, em sede de IRS, desde que pagos ou colocados a disposição dos respectivos titulares. Por outro lado, nos termos previstos no n.° 1 do artigo 35º do CIVA em caso de pagamentos relativos a prestações de serviços ainda não efectuados, a data da emissão de factura ou documento equivalente coincidirá sempre com a percepção de tal montante.
PROPRIETARIO DA OBRA: Sr. A. J. S. M. L. - NIF: (…) Alvará de Licença de Construção n.° 165/00
1.1.6. Através dos elementos / documentação enviados pelo Sr. A. J. S. M. L. relativamente a Construção de Habitação Unifamiliar (Cave, R/C e 1° Andar, Tipo T4, Área total de construção: 423 m2), que incide no terreno situado em… - M., freguesia de M., concelho de Castro D., construção licenciada por Alvará de Licença de Construção n.° 165/00 podemos aferir que:
a) O empresário responsável pela execução do projecto de construção foi o Sr. J. L. F. G.;
b)Nos termos estabelecidos no Orçamento datado de 2000/02/14 elaborado pelo citado empresário foram contratados os trabalhos a efectuar na referida obra no montante de €49.879,79 + IVA (Vide Anexo 2 e fotocopia de Orçamento junto ao processo);
c) Podemos confirmar que este proprietário efectuou pagamentos, a título de contrapartida pelos trabalhos de construção realizados pelo sujeito passivo, em 2001 no valor de €45.394,89 e cm 2002 no valor de €34.445,91 (Vide Relação de Documentos Comprovativos de Pagamento — Anexo 3 — e fotocopias de extractos bancários enviados pelo proprietário da obra junto ao processo);
d) Data de Inicio dos Trabalhos: 2000/07/30;
e) Data de Conclusão dos Trabalhos: Julho de 2003.
1.1.7. Após análise dos livros de registo e dos documentos fiscalmente relevantes do sujeito passivo, com referência aos anos de 2000, 2001 e 2002 (Vide Relação de Facturas e/ou Vendas a Dinheiro Anexo 4), pode verificar-se não haver registo de parte dos montantes pagos pelo proprietário da obra o que configura situações anómalas de ocultação de proveitos no montante de € 18.227,12 com referência ao ano de 2001 [€18.227,12=(€38.799,05 - 20.571,93)] e no montante de €6.740,12 no que respeita ao ano de 2002 [€ 6.740,12 = (€ 29.440,95 - € 22.700,83)]. Deste modo, devem acrescer-se estes rendimentos omitidos ao rendimento líquido da Categoria B dos períodos de imposto correspondentes (Vide Relação de Documentos Comprovativos de Pagamento Anexo 3 - e fotocópias de extractos bancários enviados pelo proprietário da obra, documentação anexa ao processo). (2)
(2) Nota Importante: Anote-se que o sujeito passivo emitiu em Junho de 2003, em nome do proprietário A. J. S. M. L., as facturas n.° 12 e n.° 13 no montante total de €20.330,12. Contudo, aqueles montantes respeitam a pagamentos efectuados até 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados para efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes, conforme estabelece o n.° 6 do artigo 3° do CIRS e o n.° 1 do artigo 35° do CIVA.
PROPRIETARIO DA OBRA: Sr. M. S. M. - NIF: (…)
Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. 405/00
Alvará de Licença de Construção n.º 235/01
1.1.8. Pode comprovar-se também que o empresário responsável por executar / realizar grande parte dos trabalhos de construção de uma Casa de Habitação (Área total de construção: 370 m2), que incide no terreno situado no …, freguesia de M., concelho de C. D. pertencente ao proprietário supra referido foi o empresário J. L. F. G.. A construção desta moradia foi licenciada através do Alvará de Licença de Construção n.° 235/01 da Câmara Municipal de C. D..
1.1.9. Com base nos esclarecimentos / documentos remetidos por este cliente (Vide resposta do Sr. M. S. M., datada de 2003/08/15, ao n/ oficio n.° 12 818, documentação junta ao processo) e nos elementos recolhidos durante o procedimento inspectivo junto do sujeito passivo podemos comprovar que:
a) Em 2000/04/30, terá sido estabelecido entre o proprietário da obra e o sujeito passivo o Orçamento n.° 3/2000 que refere os materiais de construção e os trabalhos a realizar no montante de €49.780,03 + IVA (Vide Anexo 2 e fotocopia de Orçamento junto ao processo);
b) Existem documentos comprovativos dos pagamentos efectuados pelo proprietário da obra, a título de contrapartida pelos serviços prestados por J. L. F. G., em 2001 no montante de €29.927,87 e em 2002 de €22.475,00 (Vide Relação de Documentos Comprovativos de Pagamento — Anexo 3 — e fotocópias de extractos bancários enviados pelo proprietário da obra, documentação anexa ao processo);
c) Data de Inicio dos Trabalhos: Abril de 2001;
d) Data de Conclusão dos Trabalhos: Informação Não Disponível.
1.1.10. Pode deduzir-se da análise dos livros de registo e dos documentos fiscalmente relevantes do sujeito passivo que, relativamente a obra do Sr. M. S. M., há registos de proveitos obtidos em 2001 no montante de €9.477,16 (IVA não Inc.) e em 2002 de €16.669,77 (IVA não Inc.). Verifica-se, assim, haver ocultação de proveitos no ano de 2001 no valor de €16.102,22 [€ 16.102,22 = (€ 25.579,38 - € 9.477,16)] e em 2002 no valor de €2.360,07 [€2.360,07 = (€19.029,84 - €16.669,77)]. (3)
(3) Nota Importante: Informe-se que o sujeito passivo emitiu em Junho de 2003, em nome do proprietário M. S. M., as facturas n.° 17 e n.° 18 no montante total de € 2.666,64. Porem, aqueles montantes respeitam a pagamentos efectuados ate 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados pare efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes, conforme prevê o n.° 6 do artigo 3° do CIRS e o n.° 1 do artigo 35° do CIVA.
PROPRIETARIO DA OBRA: Sr. R. P. A. - NIF: (...) Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 253/99
Alvará de Licença de Construção n.° 484/99
1.1.11. Tendo por base os elementos / documentação enviados pelo Sr. R. P. A. relativamente a Construção de Habitação Unifamiliar (Área total de construção: 357 m2), que incide no terreno situado em P. - M., freguesia de M., concelho de C. D., construção licenciada por Alvará de Licença de Construção n.° 484/99 podemos confirmar que:
a) J. L. F. G. foi o empresário responsável por este projecto de construção;
b) Nos termos estabelecidos no Orçamento n.º 2/1999 elaborado pelo citado empresário foram contratados os trabalhos a efectuar na referida obra no montante de e €46.388,20 + IVA (Vide Anexo 2 e fotocópia de Orçamento junto ao processo);
c) Em auto de declarações de 2003/08/06 o proprietário da obra afirmou ter efectuado pagamentos, a título de contrapartida pelos trabalhos de construção realizados pelo sujeito passivo, no montante total de €33.068,62 nos anos de 1999 a 2002 (Vide Auto de Declarações em anexo ao processo);
Data de Inicio dos Trabalhos: Junho de 1999;
d) Data de Conclusão (Prevista) dos Trabalhos: Dezembro de 2003.
1.1.12. Após análise dos livros de registo e dos documentos fiscalmente relevantes do sujeito passivo, com referencia aos anos de 1999, 2000, 2001 e 2002, pode verificar-se haver evidência de registo dos montantes pagos pelo proprietário da obra no montante total de €33.068,62 (Vide Relação de Facturas e Vendas a Dinheiro — Anexo 4).
Em Sede de IRS - Exercício de 2001
1.1.13. Após análise de detalhe da declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS do ano de 2001 do sujeito passivo e consulta / validação dos dados constantes no Sistema Informático Tributário (DGC1/SIT), podemos constatar que os rendimentos empresariais, decorrentes do exercício de C. E., C.A.E. n.º 45 211, auferidos naquele ano, foram declarados como vendas de mercadorias e produtos no montante de €41.499,25 e como outras prestações de serviços e outros rendimentos no montante de €40.579,54 [Vide Anexo B - Rendimentos da Categoria B (Regime Simplificado) campos 12 e 16 do Quadro 4-A - Apuramento do Rendimento]. Por aplicação dos coeficientes previstos no n.º 2 do artigo 31° do CIRS o rendimento líquido daquela categoria foi de €34.676,55 [ (€ 41.499,25 X 0,20) + (€ 40.579,54 X 0,65) = €34.676,55].
1.1.14. Contudo, no decorrer do procedimento inspectivo, pode concluir-se que a actividade efectivamente desenvolvida pelo sujeito passivo é prestação de serviços e não transmissão de bens e/ou produtos (Vide Relação de Detalhe de Facturas / Ano de 2001 - Anexo 5), pelo que as receitas obtidas deveriam ter sido inscritas no campo 16 do referido Quadro 4-A - Outras prestações de serviços e outros rendimentos à excepção das Vendas a Dinheiro n.° 58, n.° 59 e n.° 66 em que o material aplicado se encontra devidamente especificado e quantificado. Deve salientar-se que os documentos / vendas a dinheiro emitidos pelo sujeito passivo em 2001 no valor total de €69.442,17 + IVA - Vendas a Dinheiro n.° 57, n.° 60, n.° 61, n.° 62, n.° 63, n.° 64, n.° 65, n.° 67, n.° 68, n.° 69 e n.° 70 - não contêm indicação da quantidade e/ou a designação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados.
1.1.15. De facto, detectaram-se inúmeras situações irregulares de falta de especificação dos serviços prestados e falta de indicação da quantidade exacta de horas/homem trabalhadas (Vide fotocópias das Vendas a Dinheiro n.° 57, n.° 61, n.° 62, n.° 63, n.° 64, n.° 65, n.° 66, n.° 67, n.° 68, n.° 69 e n.° 70, em anexo ao processo), assim como situações de incorrecta especificação e referenciação de material de construção aplicado / utilizado nos trabalhos executados (Vide fotocopias das Vendas a Dinheiro n.° 60, n.° 62, n.° 63, n.° 65, n.° 67, n.° 68, n.° 69 e n.° 70, em anexo ao processo).
1.1.16. Assim, por força do disposto nos artigos 28° e 31° n.°s 2 e 3 do CIRS, o rendimento líquido/colectável, objecto de englobamento e tributado nos termos gerais, é calculado aplicando o coeficiente de 0,65 ao valor dos serviços prestados – após correcções supra referidas de €34.329,34 - no total de €109.994,34 [€109.994,34 = €75.665,00 + €34.329,34] e através da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor do material aplicado, que se encontra devidamente especificado e quantificado, de €6.413,79 .
Acréscimo ao Rendimento Tributável da Categoria B/Exercício de 2001
Resultado Tributável Corrigido - Resultado Tributável Declarado =
= €72.779,08 - €34.676,55 = €38.102,53
Determinação do Rendimento Liquido / Tributável da Categoria B (Regime Simplificado) - Exercício de 2001
REGIME SIMPLIFICADO Rendimentos da Categoria B Receitas ,, Coeficiente Rendimento Líquido
1 - Vendas de mercadorias e produtos € 6.413,79 X 0,20 €1.282,76
2 - Prestações de serviços de actividades hoteleiras, restauração e bebidas Não Aplicável X 0,20 Não Aplicável
3 - Outras prestações de serviços e outros rendimentos € 109.994,34 X 0,65 € 71.496,32
4 - Subsídios à exploração relacionados com as vendas Não Aplicável X 0,20 Não Aplicável
5 - Propriedade intelectual Não Aplicável X 0,65 Não Aplicável
Resultado Tributável corrigido€ 72.779,08

Em Sede de IRS - Exercício de 2002
1.1.17. Analisada a declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS do ano de 2002 do sujeito passivo e após consulta / validação dos dados constantes no Sistema Informático Tributário (DGCVSIT), pode apurar-se que as rendimentos empresariais, decorrentes do exercício de C. E., C.A.E. n.° 45 211, auferidos naquele ano, foram declarados como vendas de mercadorias e produtos no montante total de €83.676,45 e como outras prestações de serviços e outros rendimentos no montante de €16.851,28 [Vide Anexo B — Rendimentos da Categoria B (Regime Simplificado) campos 12 e 16 do Quadro 4-A — Apuramento do Rendimento]. Resulta, por aplicação dos coeficientes previstos no n.° 2 do artigo 31° do CIRS o rendimento líquido daquela categoria de € 27.688,62 [(€83.676,45 X 0,20) + (€ 16.851,28 X 0,65) = € 27.688,62].
1.1.18. Podemos confirmar, também com referencia ao ano de 2002, que o sujeito passivo efectua prestação de serviços e não transmissão de bens e/ou produtos (Vide Relação de Detalhe de Facturas / Ano de 2002 — Anexo 6), pelo que as receitas obtidas deveriam ter sido inscritas no campo 16 do referido Quadro 4-A — Outras prestações de serviços e outros rendimentos. Deve salientar-se que todos os documentos / vendas a dinheiro emitidos pelo sujeito passivo em 2002 no valor total de E 100.527,73 + IVA — Vendas a Dinheiro n.° 101 a n.° 110 — não contêm indicação da quantidade e/ou a designação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados. (Vide fotocópias das Vendas a Dinheiro n.° 101 a n.° 110, em anexo ao processo).
1.1.19, Assim, por forca do disposto nos artigos 28° e 31° n.°s 2 e 3 do CIRS, o rendimento líquido/colectável, objecto de englobamento e tributado nos termos gerais, é calculado aplicando o coeficiente de 0,65 ao valor dos serviços prestados - após correcções meramente aritméticas referidas nos pontos anteriores de €21.947,84 - no total de €122.475,57 [€ 122.475,57 = € 100.527,73 + € 21.947,84].
Acréscimo ao Rendimento Tributável da Categoria B/Exercício de 2002
= Resultado Tributável Corrigido - Resultado Tributável Declarado =
= €79.609,12 -€27.688,62 =€ 51.920,50
Determinação do Rendimento Líquido / Tributável da Categoria B (Regime Simplificado) - Exercício de 2002 –
REGIME SIMPLIFICADO Rendimentos da Categoria B .Receitas Coeficiente Rendimento Liquido
1 - Vendas de mercadorias e produtos Não Aplicável X 0,20 Não Aplicável
2 - Prestações de serviços de actividades hoteleiras, restauração e bebidas Não Aplicável X 0,20 Não Aplicável
3 - Outras prestações de serviços e outros rendimentos €122.475,57 X 0,65 € 79.609,12
4 - Subsídios à exploração relacionados com as vendas Não Aplicável X 0,20 Não Aplicável
5 - Propriedade intelectual Não Aplicável X 0,65 Não Aplicável
RESULTADO TRIBUTÁVEL CORRIGIDO ----------------- --------------- €79.609,12
1.1.20. Importa salientar que as situações de ocultação de proveitos e ganhos, descritas nos pontos anteriores, de € 34.329,34 em 2001 e de €21.947,84 em 2002, que deveriam constar dos livros de escrituração e das declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS dos períodos em que aqueles valores foram recebidos tiveram como objectivo a não liquidação e pagamento de IRS e possibilitaram a obtenção indevida de vantagens patrimoniais que causaram diminuição das receitas tributárias. Estas condutas ilegítimas praticadas pelo sujeito passivo constituem fraude fiscal, conforme determina o n.° 1 e a alínea a) do n.° 2 do artigo 23° do RTIFNA e a alínea a) do n.° 1 do artigo 103° do RGIT.
111.2. Imposto em Falta - Em Sede de IVA / Exercícios de 2001 e 2002
2.1.1. Conforme decorre do disposto no n.° 1 do artigo 26° do CIVA, os sujeitos passivos são obrigados a entregar o montante do imposto exigível, apurado nos termos dos artigos 19° a 25° e 71°, na Direcção de Serviços de Cobrança do Imposto sobre o Valor Acrescentado, simultaneamente com as declarações a que se refere o artigo 40°, ou noutros locais de cobrança legalmente autorizados.
2.1.2. Nos termos previstos no artigo 28° do CIVA, os sujeitos passivos referidos na alínea a) do n.° 1 do artigo 2° são obrigados, designadamente, a: emitir uma factura ou documento equivalente por cada transmissão de bens ou prestação de serviços bem come pelos pagamentos que lhes sejam efectuadas antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços; enviar trimestralmente uma declaração relativa às operações efectuadas no exercício da sua actividade; entregar mapa(s) recapitulativo(s) com a identificação dos sujeitos passivos seus clientes e/ou fornecedores, donde conste o montante total das operações internas realizadas com cada um deles no ano anterior, quando sejam superiores a €49.879,79 e dispor de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto. Deve salientar-se que, a obrigação de entrega de declaração periódica subsiste mesmo que não haja, no período correspondente, operações tributáveis.
2.1.3. Estabelece o n.° 1 do artigo 40° do CIVA, que os prazos de entrega das declarações, são para os sujeitos passivos de periodicidade trimestral, até ao dia 15 do 2° mês seguinte ao trimestre do ano civil a que respeitam as operações.
2.1.4. Estes prazos consideram-se cumpridos se a declaração for remetida ao serviço de administração do IVA, por via postal, com uma antecedência mínima de três dias úteis em relação ao Ultimo dia do prazo (artigo 40° n.° 2 do CIVA).
2.1.5. Tendo por base os elementos / documentos enviados pelos serviços da Câmara Municipal de C. D., pelos proprietários da obra A. M. P.R., A. J. S. M. L. e M. S. M. e a análise / validação dos elementos contabilísticos e documentos fiscalmente relevantes apresentados pelo sujeito passivo — vide ponto 1 do Capitulo III — podemos apurar que há evidência substantiva de ocultação de proveitos em 2001 e 2002 nos montantes de €34.329,34 e €21.947,84, respectivamente.
2.1.6. De facto, o sujeito passivo encontra-se em situação de incumprimento na liquidação de IVA e correspondente entrega de imposto nos períodos de 0106T, 0109T, 0112T, 0203T, 0206T e 0212T, conforme ao que se encontra estipulado nos artigos 26° a 28° e 40° do CIVA, no montante total de €9.871,27 conforme cálculos abaixo indicados. Assim sendo, deve proceder-se à correspondente liquidação adicional de imposto nos termos estabelecidos no artigo 82° do CIVA.
Quadro 1 - Liquidação Adicional de IVA - períodos 0106T, 0109T e 0112T
IVA Períodos de Imposto Ocultação de Proveitos
Prest. Serviços
Taxa Normal
17%
1 %
IVA
Em Falta
(1) (2) (3) = (1) X (2)
0106T 6.715,18 17% 1.141,58
0109T 16.956,08 17% 2.882,53
0112T 10.658,08 17% 1.811,87
Totais 34.329,34 ------- 5.835,99
(Valores em euros)

Quadro 2 - Liquidação Adicional de IVA - períodos 0206T, 0209T e 0212T
IVA Períodos de Imposto Ocultação de Proveitos
Prest. Serviços
Taxa Normal
17%
IVA
Em Falta
(1) (2) (3) = (1) X (2)
0206T 6.740,12 17% 1.145,82
0209T 2.360,07 19% 448,41
0212T 12.847,65 19% 2.441,05
Totais21.947,844.035,28
(Valores em euros)
2.1.7. Através da ocultação daqueles proveitos que não se encontram referenciados e relevados nos livros de escrituração e nas declarações periódicas de IVA referentes aos períodos de 0106T, 0109T, 0112T, 0203T, 0206T e 0212T o sujeito passivo teve como objectivo a não liquidação e entrega a administração tributária de IVA no valor de 9.871,27, o que constitui crime de fraude previsto e punível de acordo com o artigo 23° do RJIFNA e artigo 103° do RGIT.”; vide fls. 3 a 10 do relatório de Inspeção, seus anexos, constantes de fls. 10 e segs. do PA e depoimento do autor do relatório, a última testemunha ouvida. Nos seus pontos essências o relatório não foi questionado pelos depoimentos que as demais testemunhas prestaram.
F) O Impugnante foi notificado através do ofício nº 16062, de 2003/10/9, para querendo exercer o direito de audição, nos termos do artigo 60º da Lei Geral Tributária sobre o projecto de conclusões do Relatório de Inspecção parcialmente transcrito em al. E), mas nada disse ou requereu, cfr. doc. de fls. 29, 40 e 42 do Processo Administrativo. Documentos que o Impugnante nunca questionou pois o que ele pôs em causa foi tão só o de não ter sido notificado antes da liquidação para poder atacar os valores das liquidações impugnadas; documentos constantes da certidão cuja junção se ordenou no despacho imediatamente antecedente desta sentença;
G) Por isso, o relatório e suas conclusões foram superiormente confirmadas e alicerçaram, por via de correcções meramente aritméticas, as liquidações adicionais nestes autos impugnadas, vide fls. 6 a 8 do Processo Administrativo;
H) Liquidações que também lhe foram comunicadas em 16-01-2004, cfr. docs. de fls. 32 a 35 do Processo Administrativo;
I) Só em sede de Impugnação judicial é que o Impugnante, para fundamentar estarem viciados e errados os pressupostos em que a Administração Fiscal actuou para proceder às liquidações nestes autos questionadas, afirmou que nas obras realizadas pelo Impugnante “houve trabalhos executados directamente pelo Impugnante e ainda outros trabalhos executados por terceiros, mas por conta e em nome dos donos das obras. Os subempreiteiros que trabalharam nas obras facturaram directamente os trabalhos realizados aos donos das obras, contudo nos pagamentos efectuados pelos donos das obras, para terceiros, os meios de pagamento passaram pelo Impugnante. Isto porque como os donos das obras como estavam ausentes, confiavam no impugnante os pagamentos aos subempreiteiros, pelo que quem teve de pagar aos subempreiteiros os trabalhos realizados nas obras foi o Impugnante, ou endossando cheques emitidos pelos donos das obras ou ainda procedendo ao seu depósito e pagando depois em dinheiro”. O que se veio de referir não estava relevado contabilisticamente. A facturação dos referidos trabalhos ocorreu maioritariamente no ano de 2003 e a restante em 2002, vide docs. de fls. 23 a 43 e depoimentos das testemunhas;
J) Os subempreiteiros e outros terceiros que trabalharam nas obras iam recebendo pagamentos à medida que iam realizando os trabalhos, os quais, na maioria dos casos se prolongavam por toda duração da obra, podendo no final, realizar-se acerto de preços, cfr. depoimentos das testemunhas, mormente das duas primeiras que foram ouvidas e ainda tendo em atenção as regras de experiência comum: Aqueles, como o empreiteiro, realizando a construção ao longo de dois, três e por vezes mais anos, à medida que iam realizando o trabalho iam recebendo pagamentos podendo no final, fazer-se ajustamentos;
K) As liquidações referidas em G), liquidações com os nºs 2004 5000680591 e 2004 5000691917, todas elas tinham, como data limite de pagamento, 27 de Setembro de 2004, cfr. docs. de fls. 18 a 21 destes autos e informação de fls. 4 do Processo Administrativo ;
K) A PI que deu origem aos presentes autos foi apresentada em 16 de Dezembro de 2004, vide carimbo aposto na primeira página daquela PI, folha 1 destes autos.

II FACTOS NÃO PROVADOS
Os descritos em 7º, 11º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 21º, 22º, 23º e 28º da PI, para além do que já foi descrito na al I) dos fatos provados.
*
A convicção do Tribunal formou-se com base nos elementos documentais e outros indicados em cada alínea dos factos provados.
No que respeita à alínea I) pode dizer-se que se considerou o depoimento de todas as testemunhas, quer as arroladas pelo Impugnante quer a indicada pela FP. Umas e outras demonstrando as razões de ciência pela participação direta nas situações sobre que depuseram. Sopesou-se a prontidão demonstrada pelas primeiras contrastante com o silêncio do Impugnante em sede de inspeção e na fase final desta, não explicando ou esclarecendo a Entidade Inspetora da sua realidade económica, das especificidades da sua concreta atividade, mencionando haver trabalhos executados por 3ºs mas por conta e em nome dos donos das obras, cujo pagamento era assegurado pelo Impugnante que funcionava como pessoa de confiança dos donos. A este propósito a testemunha arrolada pela FP referiu que apenas M. S. M. mencionou que parte dos valores eram para os subempreiteiros mas que eram valores de 2003 e a inspeção respeitou aos exercícios de 2001 e 2002. Sobre esta temática salienta-se a vivacidade de perguntas e respostas entre a última testemunha e a Exma. Mandatária do Impugnante, referindo aquele que não havia qualquer documentação que, relativamente aos anos de 2001 e 2002, salientasse que, nos pagamentos que o Impugnante recebeu se incluíssem quantias usadas para este pagar aos subempreiteiros. Mais esclareceu que os pagamentos considerados nos anos de 2001 e 2002 referem-se ao que está orçamentado e o que está orçamentado respeita apenas a uma parte da obra não se incluindo os subempreiteiros ao nível da instalação elétrica, canalizações, serralharia, etc. Por esta razão a referida testemunha negou, com veemência, a alusão a uma eventual dupla tributação. Mais referiu, contrariando o depoimento da 5ª testemunha, a contabilista, a obrigação legal de emitir recibos das quantias recebidas dos seus clientes, obrigação decorrente do artigo 115ºdo CIRS. Neste pormenor a 5ª testemunha confirmou que os dinheiros que o Impugnante recebia não eram objeto de registo contabilístico. Ora, se estava obrigado a emitir recibo teria que haver registo, pelo menos o duplicado dos recibos desses recebimentos.
Na ponderação do depoimento das testemunhas e sua conjugação com os documentos deve ter-se presente o fato de estes terem uma data próxima do início da inspeção e conterem uma descrição respeitadora da lei em contraposição com as emitidas em datas anteriores. A comparação pode realizar-se considerando as faturas constantes da parte final do PA: Faturas emitidas em 2000 a 2002 e faturas de 2003 sendo que as primeiras apenas continham descrição genérica “Serviços Prestados”, “Material” ou “Venda mercadorias”.
Como nota final a testemunha arrolada pela FP esclareceu “ que as faturas estavam a ser processadas incorretamente prejudicando até o cliente.”
Sobre os fatos não provados, a referência genérica compreende-se pela sua articulação com a alínea I) dos fatos provados.
No que respeita à obra do Sr. A. M. P. R. a última testemunha explicou a imprecisão constante do ponto 1.1.5 e referiu que, quanto a tal obra se considerou em conjunto os anos de 2001 e 2002, única situação em que isso se verificou, com o intuito de beneficiar o contribuinte pois se assim não fosse a diferença apurada ainda seria maior. Instado pela Exma. Mandatária do Impugnante, aquela testemunha chegou a referir que, acaso houvesse oposição do Impugnante a este tratamento o poderia especificamente questionar.
Na parte atinente à faturação verificada em 2003 foi explicado, de forma clara, que se consideraram esses valores no ano de 2002 por se ter verificado que os pagamentos ocorreram nesse ano. Sobre esta situação aludiu o Agente inspetor a uma constante verificada no setor da construção que era o de, no início da inspeção, com a circularização realizada com os donos das obras, se emitirem muitas faturas que respeitavam a pagamentos anteriormente realizados e por isso, usando de bom senso a inspeção considerava os referidos valores nas datas em que ocorreu o recebimento. Esta realidade foi descrita ao longo do relatório de inspeção, nas “notas importantes”, e, por isso, não se perspetiva compreensível a alegação pelo impugnante da dupla tributação.
A factualidade descrita em 13º a 23º e 28º da PI. Para além das notas de fundamentação da alínea I) dos fatos provados importa referir o seguinte: A realidade aí descrita, é uma realidade que não foi dada a conhecer à inspeção e esta não tinha forma de a considerar pois o Impugnante não a informou e a sua contabilidade não a refletia. Por outro lado atente-se na precisão e insistência do Agente de inspeção que, questionado sobre a hipótese de se tributarem rendimentos inexistentes pois o Impugnante, quanto aos subempreiteiros estava apenas a ser intermediário, ter referido que os valores recebidos por este se destinavam a valores atinentes ao que estava orçamentado e este não incluía os subempreiteiros. Reagiu até com alguma veemência dizendo que o Impugnante se recebeu algumas quantias para com elas pagar aos subempreiteiros foi em dinheiro vivo pois as transferências bancárias e cheques respeitaram aos valores dos orçamentos apresentados pelo Impugnante, orçamentos constantes do PA e indicados como Anexos do relatório de inspeção.”

2. O Direito

Inconformado com a sentença recorrida que julgou improcedente a presente impugnação judicial contra as liquidações adicionais de IRS, referentes aos anos de 2001 e 2002, dela vem recorrer o Recorrente, alegando, desde logo, erro de julgamento da matéria de facto.
Na sua primeira conclusão das alegações de recurso afirma que “a sentença recorrida viola as normas constantes dos artigos 115.º e 116.º do CIRS e do artigo 50.º do CIVA, pelo que deve ser julgado provado e aditado à matéria da Alínea B) dos factos provados que
a)O impugnante não estava sujeito à obrigação de emissão de recibo de modelo oficial por via da previsão da alínea a) do n.º 1 do art.º 115º do CIRS nos rendimentos empresariais da antiga categoria C ou D do CIRS (agora englobados nas regras da incidência da Categoria B do CIRS)
b)O impugnante usava livros unigráficos para cumprimento do disposto no art. 50º do CIVA inexistindo qualquer obrigação de registo de quaisquer quantias recebidas dos seus clientes (donos de obra) para pagamento directo a terceiros (subempreiteiros) por conta dos primeiros que não tinham de constar fiscal ou comercialmente em documento do recorrente, nem na respetiva escrituração”.
Desde logo ressalta a impossibilidade de atender a este pedido de aditamento à decisão da matéria de facto, na medida em que a matéria transcrita não integra factos simples, sendo, antes, matéria de direito.
Salientamos que da alínea B) do probatório já se mostra indicado o enquadramento do impugnante, ora Recorrente, para efeitos de IRS, especificando-se que a respectiva tributação será efectuada segundo o regime simplificado de tributação. Tanto basta, como veremos infra, para que o tribunal efectue o devido enquadramento jurídico, chamando à colação as obrigações fiscais do contribuinte, principais ou acessórias, previstas legalmente, consoante as questões colocadas no recurso eventualmente o exijam.
Não pode, assim, o tribunal condicionar o julgamento e inviabilizar a subsunção dos factos ao direito alinhando no probatório matéria de direito; pelo que se desatende ao vertido na primeira conclusão do recurso.

O exposto na segunda conclusão das alegações de recurso está dependente da identificação das questões aqui objecto de apreciação, da repartição do ónus da prova quando estão em causa correcções aritméticas levadas a cabo pela AT, da fundamentação do acto que dá à AT o direito de liquidar adicionalmente, da factualidade invocada pelo contribuinte, da valoração da prova produzida acerca desses factos e das ilações que seja legítimo ao tribunal retirar.
Neste contexto e como ponto de partida, impõe-se citar J. L. Saldanha Sanches, in “O Ónus da Prova no Processo Fiscal”, publicado em “Ciência e Técnica Fiscal”, n.º 340/342, Centro de Estudos Fiscais, Lisboa:
O processo contencioso fiscal, enquanto forma de tutela dos direitos subjectivos e dos interesses legítimos dos contribuintes, tem como objectivo a obtenção da verdade material.
A obtenção da verdade material como fim do processo fiscal impõe a estruturação do contencioso fiscal sob a predominância do princípio do inquisitório, ou, numa formulação corporizada em diferentes soluções legais, do princípio da investigação, o que se vai reflectir imediatamente nos poderes de cognição do juiz na delimitação fáctica do processo, na natureza e limites do objecto do processo.
O juiz fiscal não está, assim, limitado pelas alegações fácticas das partes nem pelos vícios do acto por estas alegados.
A existência de um ónus da prova subjectivo é incompatível com a existência dos poderes-deveres do juiz e da Administração. A situação processual desta vai ter efeitos decisivos na determinação dos factos de que o tribunal deve tomar conhecimento, favoráveis ou desfavoráveis para o contribuinte, devido ao princípio da aquisição processual.
A admissão do princípio da verdade material como objectivo do procedimento da Administração para atingir o acto tributário não pode ser mantida isolada do problema do ónus da prova no processo contencioso.
O escrutínio judicial deverá, pois, centrar-se na questão de verificar se a Administração fez prova plena dos pressupostos da pretensão processual e se existe correspondência entre os factos que logrou provar e o facto tipo contido na previsão legal.
A lei fiscal prevê em numerosos casos a possibilidade de a Administração proceder à tributação segundo avaliações que têm necessariamente de ser reconduzidas, não à certeza para além de toda a dúvida razoável da sentença judicial, mas a uma actuação segundo juízos de probabilidade que terá necessariamente de ser elevada. A legitimação deste comportamento administrativo resulta da violação pelo contribuinte de alguns dos seus deveres legais.
Este afloramento entronca com o aditamento pretendido pelo Recorrente à decisão da matéria de facto - uma nova alínea G1 a G4:
Aquando da Inspecção referida em A) o Inspector da AT soube pelo menos pelo dono-de-obra M. S. M. que este havia entregue ao impugnante quantias para este pagar, directamente, aos subempreiteiros, os valores dos trabalhos que estes iam realizar na sua moradia.
As 10 facturas emitidas pela J.L.F.G, Unipessoal, Lda juntas aos autos na audiência de julgamento foram recolhidas pela fiscalização da AT, durante a mesma.
Essas facturas, todas de 2003, correspondem aos valores apurados no relatório descritos como “nota importante” relativamente a A. M. P.R., A. J. S. M. L. e M. S. M.,
Da conjugação do RIT e do testemunho do Agente Inspector resulta que essas facturas estavam a ser processadas incorretamente em 2003, mas dizem respeito aos mesmos valores tidos por omitidos em 2001 e 2002.
O Meritíssimo Juiz “a quo” para desmontar a tese do Recorrente aludiu a alguns deveres legais que o contribuinte teria violado e que, na óptica da sentença recorrida, legitimaria a actuação da AT. A convicção formada pelo tribunal recorrido aponta, em suma, para uma tese construída pelo Recorrente após o resultado da inspecção tributária. No fundo, o tribunal “a quo” não se convenceu da argumentação carreada para os autos, por a mesma somente agora, em sede contenciosa, surgir, tendo o sujeito passivo inspeccionado silenciado no procedimento administrativo, onde foi ouvido previamente à tomada da decisão final.
Por força da motivação constante da sentença recorrida, contra a qual se insurge o Recorrente, surge um conjunto de questões que não se mostravam suscitadas na petição inicial, mas que incita o ora Recorrente a desmontar a construção jurídica vertida na decisão sob recurso, designadamente, por via deste aditamento à decisão da matéria de facto (cfr. G1 a G4).
Na alínea G) do probatório está somente vertido que as liquidações adicionais em crise se alicerçaram na fundamentação das correcções aritméticas à matéria tributável que consta das conclusões do relatório inspectivo que foram superiormente confirmadas.
Efectivamente, como veremos, será partindo dessa fundamentação formulada pela AT que analisaremos o comportamento desta. Lembramos que a AT corrigiu a matéria tributável declarada pelo Recorrente em sede de IRS, por isso a ela lhe cabe demonstrar o direito de liquidar adicionalmente o imposto: cabe a quem invoca o facto constitutivo do direito – cfr. artigo 74.º, n.º 1 da LGT.
Esta matéria já integra o probatório nas alíneas D), E) e G) e será essencial para apreciar o vício de falta de fundamentação invocado na petição inicial e reafirmado neste recurso.
Grande parte do pretendido aditamento são ilações de facto decorrentes da valoração da prova realizada pelo aqui Recorrente e factualidade que não se mostra alegada na petição inicial.
Reiteramos que importa não perder de vista a disciplina de adquisição processual e que os factos invocados no respectivo articulado se encontram vertidos na decisão recorrida, essencialmente na matéria de facto não provada.
Ora, antes de nos debruçarmos especificamente sobre estes pontos da matéria de facto impugnados e sobre a valoração que foi efectuada da prova produzida, documental e testemunhal, (cfr. quarta conclusão), ressalta que esta matéria que se pretende ver aditada não foi alegada pelas partes, nem é de conhecimento oficioso.
Relembramos que o juiz só se pode pronunciar sobre os factos alegados pelas partes ou daqueles que a lei manda conhecer oficiosamente – cfr. artigos 660.º, n.º 2, e 264.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC).
O certo é que o tribunal só deve realizar ou ordenar oficiosamente diligências tendentes à descoberta da verdade material relativamente a factos que tenham sido alegados (ou que sejam de conhecimento oficioso) – cfr. artigo 99.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT).
Na verdade, também em processo tributário a actividade inquisitória está limitada aos factos alegados pelas partes e aos do conhecimento oficioso, como decorre dos artigos 99.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e 13.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer”).
Alertamos, ainda, que o juiz não tem que se pronunciar acerca de toda a factualidade invocada pelas partes, devendo seleccionar aquela que se mostre relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida – cfr. artigo 511.º, n.º 1 do CPC. Portanto, o que releva é que as partes tenham invocado factos relevantes para o exame e decisão da causa, que devam considerar-se controvertidos ou necessitados de prova – cfr. artigos 265.º, n.º 3 e 513.º do CPC, bem como os correspondentes actuais artigos 5.º, 410.º e 411.º do CPC.
Nestes termos, serão esses factos alegados que deverão ser seleccionados, tendo em conta, no que agora importa, a questão da errónea quantificação da matéria tributável, relativa aos anos de 2001 e 2002, alegada na petição inicial e reiterada neste recurso.
Logo, improcede o pedido de aditamento de uma nova alínea G1 a G4, nos termos formulados na terceira conclusão.

Na quarta conclusão solicita o Recorrente a reapreciação dos meios de prova, para que se julgue provada a seguinte factualidade:
J1 - O impugnante, atentas as relações privilegiadas de confiança que tinha com os donos de obra, recebeu destes quantias, que se destinaram ao pagamento de subempreitadas realizadas por outros agentes económicos, nomeadamente, serviços de electricidade, canalizações, alumínios, que os subempreiteiros vieram a facturar aos donos de obra.
a)- Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por A. M. P.R., a quantia global de 4.750,96€ correspondentes às facturas constantes de fls. 1, 2, 3-4 do Doc.4 Anexo com a petição de impugnação;
b) - Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por M. S. M., a quantia global de 13.843,04€, correspondentes às facturas constantes de fls. 5, 6, 7, 8-9 do Doc. 4 Anexo com a petição de impugnação;
c) - Pagou, nomeadamente com as quantias entregues por A. J. S. M. L., a quantia global de 14.676,52€, correspondentes às facturas constantes de fls. 10, 11-14, 15, 16 e 17 constantes do Doc. 4 Anexo com a petição de impugnação;
J2 - Essas quantias foram sendo entregues ao impugnante durante os anos de 2001, 2002 e 2003, não sendo possível quantificar os montantes relativos a cada ano, e embora as subempreitadas tenham sido facturadas no ano de 2003, ficou demonstrado, pelas testemunhas arroladas pelo recorrente, que os pagamentos das mesmas, e os pagamentos ao impugnante, não acompanhavam directamente a execução da obra.
J3 – Os valores entregues constantes do RIT, anexo 3, pelos clientes, donos das obras, ao recorrente, por cheque e transferências bancárias, em parte, tiveram por destino os subempreiteiros, que facturaram directamente aos clientes donos das obras.
Concluiu o Recorrente nas suas alegações de recurso que, face à prova produzida, incorreu o tribunal em manifesto erro de julgamento devendo os factos julgados não provados passarem a ser julgados como factos provados.
Efectivamente, a matéria vertida nos pontos da petição de impugnação que foram julgados não provados correspondem, grosso modo, à factualidade indicada supra em J1 a J3.
Para considerar que o julgamento deveria ser diverso (factos provados em vez de não provados) indicou os seguintes meios probatórios: análise crítica do RIT e documentos juntos aos autos, mormente, documentos 4 e 5 juntos com a impugnação, bem como os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas na sessão de 2 de Novembro de 2009, em concreto o depoimento de E. B. M. L. (apelidado de subempreiteiro, electricista), o de J. C. C. (apelidado de subempreiteiro, empresário na área da canalização e do aquecimento central), o de A. J. S. M. L. (dono de uma das obras), o de M. S. M. (dono de uma das obras), mas também o depoimento de J. F. S., que era a contabilista do impugnante e o depoimento de F. A. M. R. – inspector tributário responsável pela acção de inspecção realizada aos anos de 2001 e 2002. Foram transcritas nas alegações de recurso as passagens dos depoimentos que o Recorrente considera determinar julgamento diferente da matéria de facto indicada na factualidade não provada.
O Recorrente pretende, deste modo, demonstrar que o tribunal recorrido errou no julgamento e que provou os factos por si alegados na petição inicial, ou seja, que os valores entregues pelos clientes, donos das obras, ao Recorrente, elencados no anexo 3 ao RIT, por cheques e transferências bancárias, em parte (os identificados proveitos não declarados), tiveram por destino os subempreiteiros, que facturaram directamente aos clientes donos das obras.
Como se referiu no Acórdão do TCA Sul, de 29/05/2014, no âmbito do processo n.º 07219/13, com a reforma processual civil de 2013 foi concretizada, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto, tendo sido alargados os poderes de cognição do tribunal de segunda instância. Porém, como resulta do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, esse poder deve ser exercido com prudência, não bastando a mera discordância das partes ou a divergência do tribunal de recurso com o decidido na primeira instância para que a matéria de facto seja alterada.
Com efeito, não obstante existir agora uma vinculação à modificação das respostas do tribunal de 1.ª instância à matéria de facto, e não uma faculdade como sucedia na lei anterior, tal não significa que seja irrestrita a aplicação desse dever funcional por banda do tribunal de recurso. É que essa modificação só pode ter lugar quando “os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, isto é, quando for irrefutável o erro na decisão da matéria de facto praticado pelo tribunal a quo, pois a natureza impositiva da formulação não deixa margem para dúvidas de que o legislador teve em mente aquelas situações em que é patente a necessidade de modificação da matéria de facto.
O que não é possível é que, a coberto desta norma, a modificação atinja uma amplitude tal que implique todo um novo julgamento de facto, com a reapreciação de toda a prova produzida, a alteração da convicção do julgador a quo e a postergação dos princípios da livre apreciação das provas e da imediação.
Com efeito, o nosso sistema processual consagra o princípio da livre apreciação das provas no artigo 607.º, n.º 5, do CPC, que significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência, o que manifestamente se verifica no caso em apreço.
Por outro lado, o princípio da imediação limita a tarefa de reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, que só pode ser modificada se ocorrer erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi anteriormente considerado, o que também não se verifica no caso presente, pelo que tendo o tribunal a quo exarado os motivos pelos quais não deu credibilidade às testemunhas de cujo depoimento se pretende extrair um resultado probatório diferente, qualquer alteração dos factos significaria violar o princípio acima referido.
Na tese do Recorrente, parte dos pagamentos efectuados pelos donos das obras, devidos pela execução das obras de construção civil das moradias, destinaram-se a pagar subempreitadas facturadas directamente aos donos das obras, tendo sido o Recorrente a efectuar os correspondentes pagamentos, porque aqueles nele depositavam toda a confiança.
Desde logo, os conceitos de empreitada e de subempreitada utilizados nos autos apresentam-se um pouco confusos, dado que, por um lado, parece que os donos das obras somente terão contratado com o aqui Recorrente (empreiteiro), mas por outro lado, terceiros terão emitido facturas em nome dos donos das obras por trabalhos efectuados nas mesmas moradias. Ora, uma das características mais evidentes da subempreitada é precisamente ser o empreiteiro a escolher o terceiro que executará determinados trabalhos de várias especialidades, a negociar e pagar directamente a esse terceiro, sendo natural que tal consubstancie um custo da empreitada que contratou com o dono da obra. Os contornos da situação concreta apresentam-se algo suis generis, tanto mais que resulta da prova testemunhal produzida que era o empreiteiro, aqui Recorrente, que solicitava aos terceiros que executavam trabalhos que facturassem directamente ao dono da obra, embora recebessem o pagamento pelos mesmos do Recorrente. Compreendemos que um sujeito passivo que adoptasse contabilidade organizada tivesse outra facilidade em espelhar na mesma registos de todos os movimentos contabilísticos e que o Recorrente esteve sujeito ao regime simplificado de tributação em 2001 e 2002, legalmente menos exigente, à data, em termos de obrigações acessórias que os contribuintes deviam cumprir. Contudo, não quer dizer, como veremos, que não tivesse obrigações fiscais.
Acresce que os orçamentos elaborados pelo Recorrente e dirigidos a cada dono de obra, ínsitos no processo administrativo a fls. 44, 45, 47, 48, 51 e 52, analisados e considerados pela AT, relativos ao fornecimento de materiais e serviços prestados para realização da construção de cada uma das moradias unifamiliares, demonstram cabalmente ser objecto das empreitadas as obras de construção civil das moradias, aparentemente com todos os acabamentos. Desta forma, a haver as alegadas subempreitadas, então a respectiva facturação teria de ser em nome do empreiteiro.
Tudo isto para afirmar que, desde logo, a natureza jurídica dos negócios que terão sido celebrados (entre donos das obras, empreiteiro, terceiros) se mostra menos clara e deixa dúvidas no julgador que, mesmo perante várias testemunhas a declarar o mesmo, dificilmente são afastadas. De todo o modo, tal poderá ser mais relevante no que tange ao regime do IVA, sendo liquidações de IRS, recordamos, que se mostram questionadas nos presentes autos.
No entanto, admitindo a existência da alegada relação privilegiada de confiança entre o empreiteiro e os donos das obras, revelando um circunstancialismo atípico, não podemos, em rigor, falar de subempreitadas se a facturação respectiva é emitida directamente em nome dos donos das obras; inviabilizando, assim, levar à matéria assente que os valores entregues pelos clientes, donos das obras, ao Recorrente, através de cheques e transferências bancárias, tiveram, em parte, por destino os subempreiteiros.
Ainda assim, sem efectuar qualquer qualificação e tendo em conta que na linguagem corrente muitas vezes se apelida de subempreiteiros os terceiros que executam obras das especialidades, como a parte eléctrica, térmica, de telecomunicações ou de águas e saneamento de um edifício; vejamos se os documentos referidos nas alegações de recurso – doc. n.º 4 e 5 juntos com a petição inicial – imporiam uma decisão diversa da constante da sentença recorrida.
A referida documentação corporiza apenas facturação, mas, como se refere na decisão recorrida, na sua maioria emitida em 2003 [cfr. alínea I) da decisão da matéria de facto], sem que se mostre acompanhada dos respectivos meios de pagamento. Efectivamente, o documento n.º 5 anexo à petição de impugnação consubstancia cópias de dois cheques, mas é totalmente ininteligível a que fim se destinou a respectiva emissão. Somente três facturas em nome do dono da obra “A. J. S. M. L.” foram emitidas em 2002, constando, ainda, uma que foi emitida no ano 2000.
Nesta conformidade, mostra-se inviabilizada a passagem dos factos não provados para os provados da matéria vertida nas alíneas a), b) e c) de J1, dado que a tónica está acentuada no pagamento das quantias correspondentes às ditas facturas.
Acresce referir, relativamente à matéria constante de J2 que se pretende levar ao probatório, não ser possível quantificar os montantes relativos a cada ano. Realmente, ainda que a prova testemunhal tivesse permitido a constatação de que os pagamentos não acompanharam a execução das obras, motivando o facto de a facturação ter ocorrido em 2003, o certo é que a matéria vertida na alínea J) do probatório acaba por infirmar, em parte, tal construção; salientando-se que este concreto ponto da decisão não se encontra impugnado no presente recurso.
Como veremos infra, é fulcral determinar que montantes foram pagos em 2001 e que quantias foram pagas em 2002; o que jamais foi efectuado, qualquer que fosse a via probatória, nos presentes autos.
Quanto à relevância da prova testemunhal produzida, a fundamentação constante da decisão da matéria de facto, apesar de não o explicitar expressamente, acaba por apontar para a descredibilização dos depoimentos ouvidos, com excepção do prestado pela testemunha arrolada pela Fazenda Pública – o inspector tributário que dirigiu a acção inspectiva ao Recorrente. Observa-se, claramente, o destaque dado ao seu depoimento e como foi essencial para a formação da convicção do juiz. De resto, o tribunal “a quo” não valorou os restantes depoimentos, aparentemente, por repetirem uma versão dos factos que não convenceu o Meritíssimo Juiz. Tal é patente pelo enfoque dado na alínea I) do probatório de que somente em sede de impugnação judicial é que o impugnante afirmou que nas obras realizadas houve trabalhos executados directamente pelo impugnante e ainda trabalhos executados por terceiros, mas por conta e em nome dos donos das obras. Os subempreiteiros que trabalharam nas obras facturaram directamente os trabalhos realizados aos donos das obras, contudo nos pagamentos efectuados pelos donos das obras, para terceiros, os meios de pagamento passaram pelo Impugnante. Isto porque como os donos das obras como estavam ausentes, confiavam no impugnante os pagamentos aos subempreiteiros, pelo que quem teve de pagar aos subempreiteiros os trabalhos realizados nas obras foi o Impugnante, ou endossando cheques emitidos pelos donos das obras ou ainda procedendo ao seu depósito e pagando depois em dinheiro.
Contudo, a sentença recorrida erra quando afirma que o impugnante já não podia nesta sede judicial fazer a prova dos factos que alegou na petição inicial, por não os haver carreado para o procedimento administrativo quando teve essa oportunidade, que mais não seja aquando da audição prévia à decisão final que determinou as correcções à matéria tributável.
Entendemos que esses factos que constam da matéria não provada eram susceptíveis de prova no âmbito dos presentes autos. Todavia, o Recorrente não logrou fazê-lo, pois a prova testemunhal, mesmo que seja credível, desacompanhada de quaisquer documentos com algum substrato probatório, é manifestamente insuficiente para convencer o tribunal da realidade dos factos que pretende comprovar, dado que se apresenta genérica, vaga, imprecisa e sem qualquer concretização no tempo dos montantes que terão sido destinados a terceiros (oriundos dos donos das obras), ou seja, em cada um dos anos em apreço – 2001 e 2002.
Nesta conformidade, o recurso da matéria de facto acaba por se resumir tão-somente a uma divergência sobre a valoração da prova, sem identificar e/ou concretizar o vício lógico em que o julgador tivesse incorrido.
Reafirmamos que não só os depoimentos das testemunhas indicadas pelo Recorrente não são de molde a inverter o sentido probatório que foi fixado no tribunal a quo, como, apreciados objectivamente os depoimentos, não se mostra arbitrária ou desproporcionada a conclusão a que chegou em matéria de facto o Meritíssimo Juiz, antes evidencia que foram observadas as regras da experiência, os ditames do bom senso e os princípios de prudência que no caso se impunham.
Assim, a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, está devidamente fundamentada, apoiada no testemunho do inspector tributário (cfr. último parágrafo da motivação da decisão da matéria de facto) e é uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, sendo, por isso, inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
Pelo exposto, improcedem todas as conclusões do recurso concernentes à decisão da matéria de facto.

Estabilizada esta decisão no que tange à factualidade, entremos, agora, na apreciação jurídica das questões colocadas no recurso.
O Recorrente foi submetido a uma acção inspectiva, para aferir o cumprimento das suas obrigações fiscais e se as operações económicas realizadas foram cabalmente declaradas, designadamente, na declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS, no que respeita a rendimentos auferidos nos anos de 2001 e 2002.
Os seus rendimentos foram qualificados como de categoria “B”, no âmbito da actividade exercida de “construção de edifícios”, tendo sido efectuado o enquadramento para efeitos de IRS no regime simplificado de tributação.
Em resultado dos elementos/documentação analisados pelo Serviço de Prevenção e Inspecção Tributária (SPIT), apurou-se que o Recorrente ocultou, nos anos de 2001 e 2002, de forma ilegítima, proveitos e ganhos de €34.329,34 + IVA e de €21.947,84 + IVA, respectivamente, decorrentes da sua actividade de construtor civil. Do relatório de inspecção tributária resulta que o SPIT comprovou que estes valores foram efectivamente recebidos pelo sujeito passivo naqueles períodos e que não se encontram referenciados e relevados nos livros de escrituração e nas correspondentes declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS e Declarações Periódicas de IVA.
A primeira questão que se coloca no presente recurso consiste em saber se a AT motivou cabalmente as correcções aritméticas à matéria tributável do Recorrente nos anos de 2001 e 2002 e que sustentaram as liquidações adicionais de IRS em apreço.
A aplicação do regime simplificado de tributação não se mostra questionada no recurso, mas importa uma abordagem prévia ao imposto e à sua forma de tributação dos rendimentos, com vista a uma melhor compreensão dos elementos recolhidos pela AT e apreciação da sua suficiência para realizar as correcções em crise.
Nos termos do n.º 1 do artigo 1.º do CIRS, o imposto incide sobre o valor anual dos rendimentos das diversas categorias ali discriminadas, valor esse que é reportado a um período anual, segundo a regra geral de englobamento, constante do n.º 1 do artigo 22.º do CIRS: “O rendimento colectável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano, (...)”.
Salientamos, contudo, que uma coisa é o facto tributário e outra é o momento em que determinado rendimento é posto à disposição do respectivo titular, não constituindo o pagamento o próprio facto tributário.
No entanto, casos há em que a própria lei especifica que certos rendimentos só ficam sujeitos a imposto após determinado momento (cfr. o disposto no n.º 6 do artigo 3.º do CIRS, mencionado na fundamentação do relatório de inspecção tributária).
Aliás, neste âmbito, com a fusão das anteriores categorias B, C e D, na actual categoria B de IRS [Referindo-se à reforma do CIRS em que se procedeu a esta fusão, Paulo de Pitta e Cunha, pondera o seguinte: «Dada a heterogeneidade das situações que agora estão abrangidas na categoria alargada, não surpreende que se estabeleçam regras diferentes, em matéria de retenção na fonte e em variados outros aspectos, para cada uma das subcategorias que resultaram desta aglutinação». («ALTERAÇÕES NA TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO: REFORMA FISCAL OU SIMPLES AJUSTAMENTOS?», in Fisco, nº 103/104, p. 5)], e após as alterações introduzidas no artigo 31.º do CIRS, pela Lei n.º 32-B/2002, de 30/12 (OE para 2003), a especialização dos exercícios terá passado a abranger (por força da remissão do artigo 32.º do CIRS para as regras do IRC, incluindo, portanto, o disposto no seu artigo 18.º) rendimentos que ficam sujeitos a imposto desde o momento em que, para efeitos de IVA, seja obrigatória a emissão de factura ou documento equivalente [antes das referidas alterações, distinguia-se, no âmbito dos rendimentos empresariais e profissionais, entre o momento da sujeição a imposto dos rendimentos respeitantes a titulares com contabilidade organizada e que fossem tributados de acordo com essa situação, e o momento da sujeição dos demais rendimentos da categoria B; e a distinção decorria do próprio regime aplicável: os sujeitos passivos com contabilidade organizada estavam abrangidos pelo princípio da especialização de exercícios e os restantes estavam abrangidos pelo princípio da caixa (recebimento)] – cfr. Acórdão do STA, de 31/01/2018, proferido no âmbito do processo n.º 0118/17.
Note-se que, in casu, estão em causa os rendimentos dos anos de 2001 e 2002, portanto, será aplicável a redacção do artigo 3.º, n.º 6 do CIRS anterior à redacção introduzida pelo n.º 2 do artigo 26.º do Orçamento de Estado para 2003 – Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro:
“6 – Os rendimentos referidos neste artigo ficam sujeitos a tributação desde que pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 18.º do Código de IRC para os rendimentos determinados com base na contabilidade”.
Na presente situação, estando o Recorrente englobado no regime simplificado de tributação, resulta claro que os rendimentos de categoria “B” só ficam sujeitos a tributação se lhe for efectuado um pagamento ou colocada à sua disposição uma quantia consubstanciada num ganho adveniente da sua actividade de construtor de edifícios.
Como salienta Rui Duarte Morais (Sobre o IRS, 2ª ed., Almedina, 2008, p. 37 e seguintes. Sobre a matéria, cfr., igualmente, José Guilherme Xavier de Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, 2007, p. 42.), o IRS «tem subjacente uma concepção ampla de rendimento, procurando, ainda que só tendencialmente, fazer coincidir rendimento tributável e rendimento acréscimo», sendo que, por outro lado, da anualidade do IRS decorre que o imposto incide, por regra, em cada ano fiscal, sobre os rendimentos pagos ou postos à disposição dos sujeitos passivos nesse mesmo período. Aqui se manifestando, aliás, o princípio da capacidade contributiva, sendo que, como então salientava André Salgado de Matos (Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) Anotado, 1ª Ed., 1999, Coimbra Editora, p. 247 [anotação ao artigo 24º)] «[n]ão poderia estabelecer-se como regra geral a incidência do imposto sobre os rendimentos a partir do momento em que são devidos, porque este facto não é indício de qualquer capacidade contributiva: um rendimento devido pode nunca vir a ser disponibilizado, e como tal é apenas um rendimento futuro».
De referir, ainda, que a respeito do regime simplificado e da figura do acto isolado, Rui Duarte Morais (Ob. cit., pp. 97-99) pondera, igualmente, o seguinte:
«Essencial neste regime [simplificado] é o facto de o sujeito passivo não ser obrigado a dispor de contabilidade organizada (...)
Existe, ainda, a obrigação de os sujeitos passivos emitirem factura e/ou recibo.
A obrigatoriedade de emitir factura ou documento equivalente releva, também, para a determinação do momento em que ocorre o facto gerador de imposto. Dito de forma simples, podemos considerar dois momentos: aquele em que o pagamento ocorre; aquele em que o crédito se torna líquido (pela emissão da factura ou documento equivalente).
As regras contabilísticas dão relevância ao segundo momento: registam-se créditos e dívidas e não pagamentos. Observa-se, pois, um critério económico no registo quer dos proveitos, quer dos custos. (...)
Assim sendo, nenhuma questão se coloca quanto ao momento em que o proveito se considera verificado quando o sujeito passivo vê o seu rendimento apurado com base em contabilidade organizada.
Porém, no regime simplificado, teremos duas diferentes situações, consoante haja ou não obrigação de emitir factura ou documento equivalente.
Se tal obrigação não existir, o proveito apenas acontece no momento do pagamento ou colocação à disposição da importância em causa (ou seja, no momento em que ocorre a exigência de emissão do recibo).
A obrigação de emitir factura ou documento equivalente decorre das disposições do CIVA, as quais, obviamente, não cabe aqui analisar.»
E no caso da obtenção de rendimento decorrente da prática de acto isolado, «compreende-se a dispensa da maior parte das obrigações acessórias a que, por regra, estão obrigados aqueles que têm rendimentos inseríveis nesta categoria. (...)
Se apenas praticarem "actos isolados" geradores de rendimentos desta categoria, os sujeitos passivos estão dispensados do cumprimento das obrigações acessórias previstas nos art. 112º e seguintes, nomeadamente de efectuar as declarações de início e cessação de actividade, de emitir facturas e recibos de modelo oficial (art. 115º nº 3) - muito embora devam emitir recibo de quitação das importâncias recebidas -, e de possuir livros de registo das operações que efectuam (art. 116º, nº 5).»
Visto que no caso concreto dos autos havia obrigação de emissão de factura por parte do Recorrente, mas é aplicável a redacção do artigo 3.º, n.º 6 do CIRS anterior à redacção introduzida pelo n.º 2 do artigo 26.º do Orçamento de Estado para 2003 – Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que transcrevemos supra, o momento a atender para determinar a obtenção do rendimento, e a consequente sujeição a imposto, corresponde ao do recebimento do valor respectivo.
Desta forma se respeitando, aliás, o mencionado princípio do rendimento acréscimo, bem como (dada a progressividade do IRS, em contraposição com o IRC) até o princípio da capacidade contributiva.
Aliás, também no Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 08/09/2010, no processo n.º 0339/10, se ponderou que «o que releva para efeito da obrigação do imposto é o momento em que nasce o rendimento ou utilização do rendimento, uma vez que só aí existe capacidade contributiva», sendo que «nos contratos de execução duradoura ou diferida, como acontece no casos em que se estabelece o pagamento em prestações de uma indemnização, o facto tributário não é constituído por essa fonte contratual geradora de fluxos financeiros, mas antes pela sucessiva concretização no tempo dos incrementos patrimoniais decorrentes do recebimento das prestações previstas».
Como também se assinala no Acórdão do STA, de 29/11/2006, no processo n.º 827/06 – “É que nem todos os factos tributários são simples e instantâneos. O facto tributário podendo corresponder a uma simples ocorrência instantânea da vida real, é algumas vezes complexo e não se esgota num momento temporal.
De resto, os efeitos dos contratos duradouros - e não só tributários - não acabam no momento em que as partes formalizam o negócio. Os efeitos fiscais, designadamente, os atinentes a impostos anualizados, como é o caso do IRS, produzem-se e só se produzem em cada um dos anos em que, por força da execução do contrato, o sujeito receba rendimentos. (...)
O contrato, integrando o facto tributário, não o esgota, sendo ainda necessário que ocorra a prestação nele prevista. Só quando isso acontece é que fica perfeito o facto tributário. E só então nasce a relação jurídica de imposto.»
Esta argumentação será, igualmente, de ponderar no caso presente, já que a construção das moradias se prolongou por mais que um ano, conforme consta do relatório de inspecção tributária – cfr. alínea D) do probatório.
Vejamos, então, o primeiro vício imputado ao acto impugnado (e à sentença recorrida que o julgou improcedente), relativo à falta de fundamentação (quinta, sexta e sétima conclusões das alegações de recurso).
O Meritíssimo Juiz a quo concluiu que a administração tributária apurou factualismo que lhe permitiu proceder à correcção aritmética da matéria tributável e que o ali impugnante não alegou (nem demonstrou) factos pertinentes em devido tempo que esclarecessem a AT, colaborando com a inspecção tributária, que permitissem considerar que tais valores não correspondiam à realidade e que pudessem pôr em crise as correcções técnicas efectuadas. E o Recorrente contrapõe, basicamente, que era à administração tributária que competia a demonstração de que os recebimentos dos donos das obras efectuados pelo Recorrente eram na totalidade para pagar os trabalhos executados em nome e por conta do Recorrente.
Sobre esta matéria, o que importa referir, desde já, é que o tribunal recorrido não inverteu o ónus de prova consagrado no artigo 74.º da Lei Geral Tributária, porque não deixou de indagar previamente se a administração tributária reuniu (ou não) indicadores suficientes de que o Recorrente efectivamente auferiu esses rendimentos.
Lembramos que depois de a administração tributária reunir tais indicadores, seria a vez de o contribuinte apresentar indicadores de sinal contrário, que evidenciassem o desacerto dessas conclusões ou gerassem dúvida fundada sobre a existência do facto tributário.
Na verdade, o que resulta do artigo 75.º da Lei Geral Tributária é que a apresentação da declaração de rendimentos do contribuinte gera a presunção de verdade dos rendimentos ali declarados e dos respectivos documentos justificativos. Trata-se, no entanto, de uma presunção que o legislador faz assentar na aparência de colaboração que o cumprimento dos valores declarativos indicia e que poderá ser elidida pela verificação de que essa colaboração era meramente aparente e encobre, afinal, a intenção de ocultar rendimentos e a sua verdadeira situação tributária. O que poderá acontecer, designadamente, quando sejam reunidos indícios fundados de que essa declaração ou os respectivos dados de suporte não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo - n.º 2, alínea a), daquele dispositivo legal.
Quando a administração tributária reúne esses indicadores de falta de colaboração, está precisamente a dar cumprimento ao ónus que sobre si recaía e a que alude o referido artigo 74.º. Porque esses indicadores são, em simultâneo, os factos constitutivos do direito a desconsiderar os dados da declaração do contribuinte, que deixam, então, de beneficiar da presunção, e do direito ao imposto não declarado.
Ora, se tais indicadores forem efectivamente reunidos, é evidente que o Recorrente já não pode reconduzir-se à presunção de verdade da sua declaração (porque esta já foi elidida) nem pode remeter para o ónus da administração tributária (porque já foi cumprido). Caberá, então, ao contribuinte provar um facto positivo - o de que os rendimentos dessa categoria correspondem aos valores declarados ou outros valores diferentes dos apurados. Ou de, pelo menos, apresentar e provar a ocorrência de outros factos que constituam também indicadores objectivos, que abalem a consistência dos que a administração tributária reuniu e gerem dúvida fundada sobre a existência ou quantificação do facto tributário – cfr. artigo 100.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (cfr. Acórdão do TCA Norte, de 27/09/2012, proferido no âmbito do processo n.º 885/07.0BEPRT).
Assim, devemos começar por apreciar se os indicadores fornecidos pela administração tributária são, efectivamente, suficientes para sustentar as conclusões a que chegou e, assim, elidir a presunção de verdade da declaração de rendimentos do Recorrente. E se, por conseguinte, andou bem o Meritíssimo Juiz a quo ao concluir que a administração tributária apurou factualismo que lhe permitiu proceder à correcção aritmética da matéria tributável.
Analisado o relatório de fiscalização, para que remetem os factos provados na sentença recorrida, cujo teor aí se encontra parcialmente transcrito, verificamos que os serviços de inspecção tributária concluíram existir ocultação de proveitos nos anos de 2001 e 2002. Para chegarem a tal conclusão, foram consultados os processos de autorização de licenças para obras e/ou alvarás de licenças de construção disponibilizados pelos serviços da Câmara Municipal de C. D. (Vide Relação de Processos de Obras / Licenças de Construção Anexo 1) cujos trabalhos de construção foram da responsabilidade do sujeito passivo.
Com o objectivo de obter conhecimento de entidades externas sobre os trabalhos executados e/ou a executar pelo sujeito passivo em cada obra, a data de início e data de conclusão daqueles trabalhos (reais ou estimativas), bem assim como confirmar e comparar o valor total correspondente aos trabalhos adjudicados / executados (montantes reais ou orçamentados) com as informações/processos registados na câmara municipal (estimativas de custo) e valores declarados pelo sujeito passivo, foram circularizados os proprietários/donos de obra:
1) A. M. P.R., NIF (..), Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 162/01 / Alvará de Lic. de Construção n.° 425/01;
2) A. J. S. M. L., NIF: (…), - Alvará de Licença de Construção n.° 165/00 da Câmara Municipal de C. D.;
3) M. S. M., NIF: (…), - Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 405/00 / Alvará de Licença de Construção n.° 235/01;
4) R. P. A., NIF:(...), - Processo de Obras da Câmara Municipal de C. D. n.° 253/99 / Alvará de Licença de Construção n.° 484/99.
Em resultado dos elementos/documentação analisados pelo Serviço de Prevenção e Inspecção Tributaria (SPIT) pode apurar-se que J. L. F. G. ocultou nos anos de 2001 e 2002, de forma ilegítima, proveitos e ganhos de €34.329,34 + IVA e de €21.947,84 + IVA, respectivamente, decorrentes da sua actividade de construtor civil. Podemos comprovar que estes valores foram efectivamente recebidos pelo sujeito passivo naqueles períodos e que não se encontram referenciados e relevados nos livros de escrituração e nas correspondentes declarações de rendimentos Modelo 3 de IRS e Declarações Periódicas de IVA.
De seguida, concretizam-se as diligências efectuadas junto de cada proprietário de cada moradia a construir, verificando-se que o Recorrente foi o construtor responsável por essas obras, existindo orçamentos anexos ao relatório inspectivo, com as respectivas estimativas de valor para cada construção, bem como a indicação dos meios de pagamento e respectivos valores entregues ao Recorrente por esses donos das obras e indicação das datas de início e de conclusão das mesmas.
Com base nos documentos anexos, para cada proprietário foi, além do mais, explicitado o seguinte no relatório de inspecção:
“(…) 1.1.5. Podemos constatar da análise dos elementos de escrita do sujeito passivo haver evidência de registo de proveitos no montante de €17.535,01 (IVA Não Inc.) no ano de 2001 e de € 20.573,82 (IVA Não Inc.) em 2002. Contudo, por se ter apurado que o montante total de pagamentos efectuados naqueles períodos é superior aos montantes declarados / referenciados nos elementos de escrita e nas declarações fiscais entregues pelo sujeito passivo - para efeitos de IRS / IVA - resulta que há ocultação de proveitos, em 2002, pelo menos de €12.847,65 [€ 12.847,65 = (€56.347,23 - €38.108,82)]. O resultado tributável da Categoria B do Ano de 2002 deve, então, ser acrescido no valor de €12.847,65.(1)
(1) Nota Importante: Deve anotar-se que o sujeito passivo emitiu em Junho a Julho de 2003 diversas facturas em nome do proprietário A. M. P.R. — facturas n.° 14, n.° 15, n.° 16, n.° 19, n.° 20 a n.° 21 - no montante total de €13.253,52. Aqueles montantes respeitam em parte (€ 6.838,52) a pagamentos efectuados até 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados pare efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes. De facto, atendendo ao disposto no n.° 6 do artigo 3° do CIRS os rendimentos empresariais e profissionais (Categoria B) dos sujeitos passivos enquadrados no regime simplificado foram sujeitos a tributação, em sede de IRS, desde que pagos ou colocados a disposição dos respectivos titulares. Por outro lado, nos termos previstos no n.° 1 do artigo 35º do CIVA em caso de pagamentos relativos a prestações de serviços ainda não efectuados, a data da emissão de factura ou documento equivalente coincidirá sempre com a percepção de tal montante.
(…)
1.1.7. Após análise dos livros de registo e dos documentos fiscalmente relevantes do sujeito passivo, com referência aos anos de 2000, 2001 e 2002 (Vide Relação de Facturas e/ou Vendas a Dinheiro Anexo 4), pode verificar-se não haver registo de parte dos montantes pagos pelo proprietário da obra o que configura situações anómalas de ocultação de proveitos no montante de € 18.227,12 com referência ao ano de 2001 [€18.227,12=(€38.799,05 - 20.571,93)] e no montante de €6.740,12 no que respeita ao ano de 2002 [€ 6.740,12 = (€ 29.440,95 - € 22.700,83)]. Deste modo, devem acrescer-se estes rendimentos omitidos ao rendimento líquido da Categoria B dos períodos de imposto correspondentes (Vide Relação de Documentos Comprovativos de Pagamento Anexo 3 - e fotocópias de extractos bancários enviados pelo proprietário da obra, documentação anexa ao processo). (2)
(2) Nota Importante: Anote-se que o sujeito passivo emitiu em Junho de 2003, em nome do proprietário A. J. S. M. L., as facturas n.° 12 e n.° 13 no montante total de €20.330,12. Contudo, aqueles montantes respeitam a pagamentos efectuados até 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados para efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes, conforme estabelece o n.° 6 do artigo 3° do CIRS e o n.° 1 do artigo 35° do CIVA.
(…)
1.1.10. Pode deduzir-se da análise dos livros de registo e dos documentos fiscalmente relevantes do sujeito passivo que, relativamente a obra do Sr. M. S. M., há registos de proveitos obtidos em 2001 no montante de €9.477,16 (IVA não Inc.) e em 2002 de €16.669,77 (IVA não Inc.). Verifica-se, assim, haver ocultação de proveitos no ano de 2001 no valor de €16.102,22 [€ 16.102,22 = (€ 25.579,38 - € 9.477,16)] e em 2002 no valor de €2.360,07 [€2.360,07 = (€19.029,84 - €16.669,77)]. (3)
(3) Nota Importante: Informe-se que o sujeito passivo emitiu em Junho de 2003, em nome do proprietário M. S. M., as facturas n.° 17 e n.° 18 no montante total de € 2.666,64. Porem, aqueles montantes respeitam a pagamentos efectuados ate 2002/12/31 que deveriam ser relevados nos elementos de escrita e declarados pare efeitos de IRS / IVA dos períodos correspondentes, conforme prevê o n.° 6 do artigo 3° do CIRS e o n.° 1 do artigo 35° do CIVA. (…)”
Ora, é precisamente com base nestes elementos recolhidos pela inspecção tributária e partindo desta fundamentação subjacente às correcções à matéria tributável que apreciaremos a actuação da AT e o vício de falta de fundamentação reiterado neste recurso.
Alega o Recorrente, para o efeito, que as conclusões do relatório de fiscalização referem que os pagamentos foram feitos até 31/12/2002, mas não apresenta qualquer critério material para os considerar em 2001 ou em 2002. A AT não indicou na fundamentação de direito o obtido ou pago e a respectiva data da “falta” para poder fazer a competente correcção aritmética. Acrescenta que o artigo 3.º, n.º 6 do CIRS não podia ser combinado com o artigo 35.º do CIVA (à data), não permitindo a imputação proporcional das diferenças entre o facturado e o dinheiro que foi entregue ao Recorrente. Concluindo que continua sem perceber os cálculos que originaram as liquidações impugnadas, daí a falta de fundamentação.
O dever de fundamentação, consagrado no artigo 77.º da Lei Geral Tributária, importa a necessidade de expor, ainda que de forma sucinta, as razões de facto e de direito que motivaram a decisão do procedimento.
Genericamente, compreende-se que foram declarados rendimentos de categoria “B”, correspondentes aos proveitos resultantes da prestação de serviços de construção de edifícios e da venda de mercadorias e produtos necessários à execução das respectivas obras, de montantes inferiores aos pagamentos que os donos dessas obras efectuaram ao Recorrente, nos anos de 2001 e 2002, tendo por referência os valores constantes dos orçamentos elaborados para cada proprietário.
Os valores desses pagamentos estão contabilizados no Anexo 3 do RIT, identificados os respectivos meios de pagamento dos trabalhos efectuados (no que importa, cheques e transferências bancárias) e as datas em que foram efectuados esses pagamentos – cfr. o respectivo elenco no quadro referido.
Até aqui, não resultam dúvidas quanto à diferença de valores que deve ser atendida em relação à declarada, nos anos de 2001 e 2002.
As dificuldades em acompanhar o iter cognoscitivo constante da motivação do relatório inspectivo surgem, contudo, em todas as notas importantes [(1), (2) e (3)] supra transcritas.
Não residem dúvidas, para o imposto em análise – IRS, que o enquadramento jurídico foi efectuado por referência ao disposto no artigo 3.º, n.º 6 do CIRS. Todavia, não é compreensível que se afirme que os montantes vertidos nas facturas identificadas em cada “nota importante”, emitidas em 2003, respeitem a pagamentos efectuados até 31/12/2002 e que deveriam ser declarados para efeitos de IRS nos períodos correspondentes; e, depois, por exemplo, quanto às facturas emitidas em nome do proprietário A. M. P.R. se ter considerado que o pagamento foi efectuado em 2002, dado que, neste caso, somente terá ocorrido ocultação de proveitos no ano de 2002, atentas as correcções realizadas.
Efectivamente, nas restantes “notas importantes” não se especifica quando realmente ocorreram esses pagamentos, podendo ter sido tanto em 2001 como em 2002, dado que os trabalhos nessas moradias decorreram, conforme consta do RIT, nesse período abrangente. Logo, da fundamentação em análise não é possível descortinar, quanto a essas facturas emitidas em 2003, quando foram efectuados os pagamentos, não se alcançando, dos cálculos apresentados para os proprietários A. J. S. M. L. e M. S. M., se tal rendimento foi relevado em 2001 ou em 2002. E sendo em 2002, por que não poderia ser atendido tal valor no cômputo dos rendimentos de 2001?
Tal aspecto assume particular importância devido à redacção do artigo 3.º, n.º 6 do CIRS à data, a que já nos referimos supra. O imposto é anual e tem que ser tributado no ano em que o rendimento foi obtido ou pago. Se nas conclusões do RIT a fundamentação não indica uma data concreta de quando foram pagos os serviços prestados e os bens constantes das facturas emitidas em 2003, então, a AT, nesta parte, não podia ter-se socorrido de correcções aritméticas, porque os rendimentos referidos no artigo 3.º só ficam sujeitos a tributação desde que pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares (n.º 6), sendo fulcral saber quais foram pagos em 2001 e que outros terão sido obtidos em 2002, para se revelarem e se poderem sindicar os períodos correspondentes. Recordamos que, na redacção do artigo 3.º, n.º 6 do CIRS aplicável à data, existe falta de correspondência entre o momento do pagamento e da emissão da factura para efeitos de tributação em regime simplificado, como é o caso do Recorrente.
Além do mais, não se compreende, igualmente, que conste da fundamentação que foi o sujeito passivo, J.L.F.G, que emitiu essas facturas em 2003, quando resulta, claramente, do relatório de fiscalização que esse contribuinte cessou a sua actividade em 27/12/2002.
Aliás, resulta da alínea C) do probatório que em 2003 o impugnante deixou de exercer a actividade em nome individual passando a exercê-la através da sociedade unipessoal. O tribunal recorrido motiva este facto assente também com base nos documentos de fls. 113 a 117, que são as mesmas 10 facturas vindas a referir, emitidas pela sociedade J.L.F.G, Unipessoal, Lda., em 2003.
Portanto, nessas “notas importantes”, os serviços inspectivos assentam a necessidade de proceder a correcções aritméticas à matéria tributável do Recorrente em elementos de outra entidade, de outro sujeito passivo, de quem não se sabe sequer qual o seu regime de tributação.
Nesta parte, por isso, o Recorrente tem razão. A administração tributária não externou as razões que a levaram a concluir o que concluiu.
Todavia, só pode considerar-se em causa, por aqui, a parte da correcção correspondente à diferença entre os pagamentos referentes às 10 facturas emitidas em 2003, mencionadas nas “notas importantes”, e outros pagamentos não declarados, mas cuja data de obtenção conste concretamente no cálculo dos proveitos omitidos em 2001 e em 2002. Pelo que o vício de falta de fundamentação só conduz à anulação da parte da liquidação correspondente à medida do excesso, ou seja, nos valores considerados, constantes dessas facturas emitidas pela sociedade unipessoal, para determinar as omissões de rendimentos, respectivamente em 2001 e em 2002.
Pelo que o recurso merece provimento nesta parte.
No mais, a apreciação da errónea quantificação vertida na conclusão oitava fica prejudicada, pois o tribunal já anulará, por falta de fundamentação, a parte da liquidação que foi influenciada pela consideração das facturas que foram emitidas em 2003 (ficando também prejudicado o conhecimento da décima conclusão das alegações de recurso).

Quanto à nona conclusão, reconduz-se apenas a eventual omissão declarativa de rendimentos que ainda subsista. Mas não poderá proceder, pois o Recorrente não logrou provar que essa parte do rendimento obtido afinal não constitua um efectivo ganho ou tenha resultado das facturas emitidas directamente por terceiros aos donos das obras, em que o Recorrente seria apenas um mero depositário desses valores, conforme decorre da apreciação que fizemos aquando da análise da decisão da matéria de facto. Consequentemente, improcede aqui, nesta parte, o vertido na conclusão décima.

Relativamente à violação de lei, na interpretação que a sentença recorrida efectuou do artigo 59.º da LGT – cfr. décima primeira e última conclusão – não se trata de uma verdadeira questão a apreciar neste recurso.
É verdade que a sentença recorrida faz referência ao dever de colaboração que é recíproco – AT versus contribuinte – mas consubstancia apenas uma menção na fundamentação da sentença recorrida (mais um argumento), que, como já fomos alertando supra, não poderá manter-se na íntegra.
Entretanto, já tomámos conhecimento de todas as questões que se mostravam invocadas na petição inicial e que se reiteraram no presente recurso, por o Recorrente ter entendido que o seu julgamento enfermava de erro.
Assiste, pois, razão ao Recorrente no ponto, que logo na petição inicial alegou, que a Administração Tributária não fundamentou o motivo pelo qual procedeu à liquidação adicional de IRS, de 2001 e 2002, com base nas facturas emitidas em 2003 pela sociedade unipessoal, alegação que, em crítica à sentença recorrida, reiterou no presente recurso.
Assim sendo, o recurso merece provimento nesta parte, improcedendo quanto ao restante, nos termos da fundamentação supra transcrita.


Conclusões/Sumário

I - A reforma processual civil de 2013 concretizou, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto, tendo sido alargados os poderes de cognição do tribunal de segunda instância. Porém, como resulta do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, esse poder deve ser exercido com prudência, não bastando a mera discordância das partes ou a divergência do tribunal de recurso com o decidido na primeira instância para que a matéria de facto seja alterada.
II - A modificação das respostas do tribunal de 1.ª instância à matéria de facto só deve ser efectuada quando for irrefutável o erro na decisão da matéria de facto praticado pelo tribunal a quo.
III - A modificação não deve atingir uma amplitude tal que implique todo um novo julgamento de facto, com a reapreciação de toda a prova produzida, a alteração da convicção do julgador a quo e a postergação dos princípios da livre apreciação das provas e da imediação.
IV - O princípio da livre apreciação das provas contido no artigo 607.º, n.º 5, do CPC, significa que o juiz decide com intermediação de elementos psicológicos inerentes à sua própria pessoa e que por isso não são racionalmente explicáveis e sindicáveis, embora a construção da sua convicção deva ser feita segundo padrões de racionalidade e com uma valoração subjectiva devidamente controlada, com substrato lógico e dominada pelas regras da experiência.
V - O princípio da imediação limita a tarefa de reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, que só pode ser modificada se ocorrer erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi anteriormente considerado.
VI - A mera discordância sobre a valoração da prova testemunhal e sobre a convicção do julgador, sem identificação ou concretização do vício lógico em que este incorreu, não autoriza uma alteração da matéria de facto.
VII - O juiz só pode pronunciar-se sobre factos alegados pelas partes, a menos que a lei preveja o seu conhecimento oficioso – cfr. artigos 264.º do Código de Processo Civil, 99.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e 13.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
VIII – O ónus da prova do direito de liquidar adicionalmente IRS, com base em correcções aritméticas à matéria tributável, cabe a quem invoca o facto constitutivo do direito – cfr. artigo 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária.
IX - Para efeitos de IRS (Categoria B), na redacção do artigo 3.º, n.º 6 do Código de IRS anterior à redacção introduzida pelo n.º 2 do artigo 26.º do Orçamento de Estado para 2003 – Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro - “Os rendimentos referidos neste artigo ficam sujeitos a tributação desde que pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 18.º do Código de IRC para os rendimentos determinados com base na contabilidade”, o momento a atender para determinar a obtenção do rendimento e a consequente sujeição a imposto, corresponde ao do recebimento do valor respectivo, relativamente aos sujeitos passivos enquadrados no regime simplificado de tributação.
X – Estando em causa omissões nas declarações anuais de rendimentos de 2001 e 2002, não basta a AT afirmar que os rendimentos foram pagos ao Recorrente até 31/12/2002. Falta fundamentação ao acto tributário para operar as referidas correcções aritméticas e sustentar as liquidações adicionais de IRS, por se desconhecer quais os proveitos que foram pagos concretamente em 2001 e especificamente em 2002.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência:
a) Revogar a decisão recorrida na parte em que julgou devidamente fundamentada a correcção aos rendimentos e procedeu às liquidações adicionais de IRS, de 2001 e 2002, na parte dessa correcção aritmética à matéria tributável efectuada com base nas 10 facturas emitidas em 2003 pela sociedade unipessoal;
b) Em substituição, anular as liquidações de IRS impugnadas, relativas aos anos de 2001 e 2002, na parte que foram influenciadas e tiveram por base o valor correspondente às referidas facturas emitidas em 2003, bem como as dos respectivos juros compensatórios, com todas as consequências legais.
c) Negar provimento ao recurso, quanto ao mais.

Custas em ambas as instância, pelo ora Recorrente e pela Fazenda Pública, na proporção do decaimento, que se fixa em 50%; sendo que, neste recurso, as custas a suportar pela Fazenda Pública não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Porto, 24 de Outubro de 2019


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